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ANÁLISE DA SENTENÇA DA BOATE KISS

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ANÁLISE DA SENTENÇA DA BOATE KISS – Uma discussão a cerca do poder 
de punir. 
 Sandra Mara Dobjenski1 
No dia 10 de dezembro de 2021, quatro réus foram condenados pelo 
incêndio da Boate Kiss em Santa Maria. O fatídico acidente ocorreu em 27 de 
janeiro de 2013, quando a Boate sediava uma festa universitária denominada 
“Agromerados”. No palco, se apresentava a banda Gurizada Fandangueira, quando 
um dos integrantes disparou um artefato pirotécnico cujas centelhas atingiram parte 
do teto do prédio, que era revestido de espuma, que pegou fogo. O incêndio se 
alastrou rapidamente, causando a morte de 242 pessoas e deixando mais de 636 
feridos. 
Esta foi a segunda maior tragédia no Brasil em número de vítimas em um 
incêndio, sendo superado apenas pelo o episódio do Grande Circo Norte-Americano, 
que ocorreu em 1961, em Niterói no estado do Rio de Janeiro, que vitimou o 
inacreditável número de 503 pessoas, e teve características semelhantes as do 
incêndio ocorrido na Argentina, em 2004, na casa noturna República Cromañón. 
Rotula-se também como o quinto maior desastre da história do Brasil, o maior do Rio 
Grande do Sul, o de maior número de mortos nos últimos 50 anos e o terceiro maior 
desastre em casas noturnas no mundo. 
Logo se iniciaram as investigações para a apuração das responsabilidades 
dos envolvidos, dentre eles os donos da casa noturna, Elissandro Callegaro Spohr e 
Mauro Londero Hoffmann que eram sócios, Marcelo de Jesus dos Santos, vocalista 
da banda Gurizada Fandangueira, Luciano Bonilha Leão, auxiliar do grupo musical e 
dos representantes do poder público. Este fato desencadeou um debate nacional 
sobre a segurança e o uso de efeitos pirotécnicos em ambientes fechados com 
grande quantidade de pessoas. As responsabilidades da fiscalização dos locais 
também foram debatidas em todos os tipos de mídia. As imprensas nacionais e 
mundiais se manifestaram de diversos modos, que variaram de mensagens de 
 
1
 Pesquisadora do Grupo de Estudos Máximo Pavarine (GEMP).Pós Graduanda em Direito penal 
econômico – Centro Universitário UNINTER. Especialista em Direito Penal e Criminologia – Centro 
Universitário UNINTER. Bacharela em Direito – Faculdade Curitibana. Especialista em Direito 
educacional – Centro Universitário UNINTER. Licenciada em Pedagogia – Centro Universitário 
Bagozzi (UNIBAGOZZI). Proprietária e idealizadora da Sd JurisAdv. 
solidariedade às famílias e amigos, a críticas sobre as condições das boates no país 
e a omissão das autoridades. 
O inquérito policial apontou inúmeros responsáveis pelo fato, mas apenas 
alguns foram denunciados pelo Ministério Público (MP) à Justiça , dentre eles os 
sócios da Boate Kiss, o vocalista da banda Gurizada Fandangueira e o auxiliar da 
banda. Foi instaurado o processo, ou seja, materializou-se o jus puniendi (direito de 
punir) e se iniciou a oitiva dos depoimentos como preparação para o julgamento, 
entretanto parentes dos mortos e sobreviventes temiam que a impunidade fosse à 
tônica do evento criminoso. De fato, os servidores civis e militares, bem como as 
autoridades públicas, corriam pouco risco de sofrerem punições, fato que realmente 
se enfatizou. 
Por inquérito policial, se compreende o conjunto de diligências (atos 
investigatórios) realizado pela polícia judiciária (civil e federal); com o objetivo de 
investigar as infrações penais e colher elementos necessários; para que se possa 
ser proposta a ação penal que nada mais é do que o direito de provocar o Estado na 
sua função jurisdicional para a aplicação do direito penal objetivo em um caso 
concreto. Também é o direito do Estado, único titular do “jus puniendi”, de atender a 
sua pretensão punitiva. A ação penal é um direito autônomo, abstrato, subjetivo e 
público. 
O júri da Boate Kiss teve início em 01 de dezembro de 2021. Passaram pelo 
plenário do 2º andar do Foro Central 28 depoentes, dos quais, 12 vítimas, 13 
testemunhas, pessoa capaz, estranha ao feito, chamada a juízo para depor o que 
sabe sobre o fato litigioso. A testemunha reproduz acontecimentos passados retidos 
em sua memória, desde o momento em que presenciou o fato litigioso ou dele 
tomou conhecimento. Três informantes, pessoa que fornece voluntariamente à 
polícia ou à justiça informações relativas a atividades suspeitas, criminosas ou 
proibidas pelas autoridades, tanto de pessoas como de organizações. 
Inicialmente, seriam ouvidas 34 pessoas, mas cada parte (acusação e 
defesa) abriu mão de oitivas, audição de uma testemunha ou daqueles que se 
encontram envolvidos no processo que está sendo julgado. O artigo 400 do Código 
de Processo penal (CPP) prevê a regra da oitiva das testemunhas arroladas pela 
acusação antes das testemunhas arroladas pela defesa. Essa sequência somente 
pode ser alterada se houver concordância de ambas as partes, ou, de acordo com o 
próprio artigo, quando ocorrer oitiva de testemunha por carta precatória.2 
Os interrogatórios dos réus começaram na noite do dia oito de dezembro. 
Sendo que o interrogatório do acusado constitui um ato processual de grande 
relevância e, por esse motivo, encontra-se rigidamente regulado em lei, com 
previsão no Título VII, Capítulo III do CPP. É ato personalíssimo do acusado de 
infração penal em queixa-crime, equivalente à denúncia oferecida pelo MP só que 
utilizada apenas por particular, nos casos em que o interesse da vítima prepondera 
sobre o interesse público, utilizada para os casos de ação penal privada e é 
apresentada em juízo pelo próprio ofendido ou representante legal, por meio de um 
advogado ou denúncia prevista no Art. 41 do CP sendo interposta para os crimes 
que devem ser processados por meio de ação penal pública, cuja o titular é o 
representante do MP, sendo este indagado sobre os fatos que lhe são imputados na 
peça acusatória (denúncia ou queixa crime), e conduzido pelo juiz competente, o 
qual se valorará das palavras do réu para formar seu convencimento de forma sólida 
e convincente. 
A maioria das mortes foi relacionada às lesões causadas pelas 
queimaduras. Contudo, a principal causa mortis de indivíduos expostos a incêndios 
ocorre devido a males causados pela inalação de fumaça. Em certas situações, 
cerca de 80% dos óbitos são por inalação de vapores e produtos químicos, 
principalmente monóxido de carbônico e cianeto. 
O grande vilão da história, apontado por laudos técnicos como a causa de 
100% das mortes dos estudantes, junto com o monóxido de carbono, foi o tão 
mencionado cianeto, que é uma substância encontrada na natureza e também é um 
produto da atividade humana, que foi liberado na queima do isolamento acústico, 
isolamento este muito usual em toda a cidade, uma vez que, inúmeras vezes, casas 
vizinhas das boates da cidade, formalizaram reclamações nos órgãos competentes 
relatando o barulho emitido por estas. 
 A forma usada, na maioria dos locais que emitiam som, era isolar com uma 
espuma de colchão. Não só para minimizar os efeitos do som, mas também por 
pedidos dos DJs e bandas, porque aumentava a qualidade dos sons graves e 
agudos, a nitidez e ainda eliminava o eco. Kiko, como era conhecido Elissandro, 
 
2
 BRASIL. Código de Processo penal. Decreto lei 3.689 de 03 de outubro de 1941. Manoele. 
Barueri. São Paulo. 2016. 
mandou instalá-la com esse intuito, mas a espuma era ineficiente para o propósito 
pretendido, logo foi removida quando executaram o projeto acústico na boate. 
Contudo, foi novamente instalada, por exigência dos DJs e músicos, para impedir o 
eco de som. Os órgãos de fiscalização não notaram a instalação dessa espuma 
inadequada. Sendo que a fiscalização do município não era treinada para 
reconhecê-la e mesmo o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do RioGrande do Sul só através de alguma denúncia tomava conhecimento desse material. 
Quanto ao Corpo de Bombeiros, apenas vistoriavam as instalações inerentes a 
combate a incêndio, como por exemplo, iluminação e saídas de emergência e 
hidrantes entre outros. Lixeiros encontraram enormes quantidades destas espumas 
próximas às casas que a tinham instaladas. Segundo a imprensa, dois deles 
relataram ter coletado 50 sacos para vender às recicladoras. 
Assim os réus Elissandro Callegaro Spohr, Luciano Augusto Bonilha Leão, 
Mauro Londero Hoffmann e Marcelo de Jesus dos Santos foram condenados por 
homicídio qualificado prescrito no Artigo 1213 do Código Penal (CP) parágrafo 2º que 
denota ser qualificado o ato de matar alguém quando o responsável pelo crime tem 
a intenção de matar por um motivo específico, quer sejam envenenamento, 
encomenda de assassinatos com recompensa, emprego de explosivos ou fogo, 
tortura, asfixia, emboscadas, entre outros. BRASIL (2016, p.46) 
A condenação veio de acordo com a denúncia, peça inicial da ação penal 
pública que é apresentada pelo MP, proferindo como crime homicídio com dolo 
eventual, aquele que ocorre quando o agente age ou deixa de agir, conhece do risco 
de produzir um resultado danoso a um bem jurídico penalmente tutelado através de 
sua conduta e se conforma caso este venha a acontecer, ou seja, o agente prevê 
que seus atos tenham um resultado ruim, mas segue em frente assumindo o risco 
de que algo ocorra, demonstrando não se importar com o resultado. 
Entretanto, durante toda a sessão plenária ocorreu à discussão a cerca do 
dolo eventual e da culpa consciente, quando o crime ocorre quando a pessoa sabe 
que há um risco, mas acha que esse risco não vai se materializar porque ela é muito 
boa no que faz ou por qualquer outro motivo, de forma simplificada, o sujeito prevê 
 
3
 BRASIL. Código Penal. Decreto Lei 2.848 de 07 de dezembro de 1940. Manole. Barueri. São 
Paulo. 2016. 
 
um resultado ruim, mas não acredita que vá acontecer. A diferença é tênue como se 
pode observar. 
O dolo eventual tem se tornado cada vez mais comum nos tribunais, mas é 
muito difícil de ser comprovado. E o ônus da prova é sempre de quem acusa. 
Ônus da prova consiste no indivíduo estar incumbido do dever de comprovar 
o seu interesse e os fatos que o favorecem em um processo. A princípio, aquele que 
afirma tem dever de sustentar suas alegações. 
A denúncia por dolo eventual foi baseada nas ações dos réus durante o 
incêndio. A promotoria entendeu que, mesmo que os sócios não tivessem acendido 
o sinalizador que causou o incêndio, eles instalaram o isolamento acústico 
inadequado, permitiram a superlotação da boate, não providenciaram extintores de 
incêndio em quantidade adequada. 
Fato este que foi comprovado na fase investigatória devido a inúmeros erros 
e omissões que foram apurados tais como: Documento emitido pelos bombeiros que 
foi usado como Plano de Prevenção e Combate a Incêndio (PPCI), em 26 de junho 
de 2009. Este documento era emitido de forma quase que automática, uma vez que 
o sistema era eletrônico e simplesmente emitia um relatório do que deveria ser 
instalado, conforme informações dadas pelos próprios clientes. Não existia status de 
Alvará. Apesar das fragilidades desse documento, o primeiro alvará de incêndio foi 
concedido pelo Corpo de Bombeiros, em agosto de 2009, com vigência de um ano; 
Alvará este emitido após inspeção e verificação do local conforme a planta anexada 
no plano. A casa iniciou suas atividades em 31 de julho de 2009, somente com o 
alvará de incêndio, sem o alvará de localização da prefeitura, só emitido em 2010. 
De agosto de 2010 a agosto de 2011, a Kiss ficou sem o alvará dos bombeiros, que 
só foi renovado em nove de agosto de 2011. Sendo que o alvará estava novamente 
vencido na data do fato. 
A empresa de engenheira responsável pelo PPCI disse ter elaborado o 
plano conforme uma planta-baixa, em 2009, mas não acompanhou a execução das 
obras. Em 1º de agosto de 2009, devido à falta do alvará de localização, a boate foi 
notificada para fechar as portas. Pelo menos quatro vezes, entre agosto e dezembro 
de 2009, em vez de ser fechada, a boate foi somente multada, fato este que retrata 
a falta de imperícia dos órgãos fiscalizadores. 
Sem que o alvará fosse expedido e com a boate em funcionamento, as 
multas foram aplicadas sucessivamente. Em 14 de abril de 2010, depois de oito 
meses de funcionamento o alvará de localização foi finalmente expedido. 
Em 09 de abril de 2012 a fiscalização da prefeitura fez uma vistoria e 
descobriu que o alvará de incêndio estava prestes a vencer, além disso, as 
investigações mostraram que a boate não tinha saídas de emergência adequadas e 
muitas vítimas foram impedidas de sair pelos seguranças, que obedeciam à ordem 
de um dos donos, que temia que as pessoas não pagassem as contas. 
Diante de tais apontamentos é necessária a justificativa de que o Estado é 
um ente dotado de personalidade jurídica de direito público, possuindo prerrogativas 
frente ao particular. A personalidade jurídica é definida como a ideia de que uma 
pessoa, seja física (pessoa natural), seja jurídica (empresa, ente público, associação 
sem fins lucrativos) tenha capacidade de adquirir direitos e contrair deveres na 
sociedade (direito civil). 
 Tais poderes destinados aos Estados visam garantir o bem comum, onde o 
mais importante é a coletividade, em supressão, muitas vezes, dos direitos 
individuais. Dessa forma não se justifica a condenação de quatro pessoas físicas 
que perante o Conselho de sentença e a população leiga arcaram sozinhas com um 
dano pessoal, para garantir o bem da sociedade. Foi com este intuito, que a 
Constituição da República Federal (CR), em seu artigo 37, §6º disciplinou a 
responsabilidade civil do Estado pelos danos causados por seus agentes ao 
particular, garantindo assim que os cidadãos lesados por uma atividade estatal 
pudessem ser ressarcidos e indenizados pelos prejuízos sofridos BRASIL (1988, 
p.39)4. Dessa forma o não indiciamento do Poder Público, frente à catástrofe que 
assolou Santa Maria não foi aceitável. 
Voltando a discussão a cerca do dolo indireto eventual, consagrado no 
art. 18, inciso I, do CP, este significa que o sujeito não quer (diretamente) produzir 
certo resultado, entretanto prevê a sua possível ocorrência e assente/consente na 
sua produção, manifestando indiferença quanto ao bem jurídico em questão5. 
 
4
 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Texto promulgado em 05 de outubro 
de 1988. Senado Federal. Brasília. 1988. 
5
 BRASIL. Código Penal. Decreto Lei 2.848 de 07 de dezembro de 1940. Manole. Barueri. São 
Paulo. 2016. 
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10637924/artigo-18-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10637890/inciso-i-do-artigo-18-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940
Para BITTENCOURT (2012, p.354)6 haverá dolo eventual quando o agente 
não quiser diretamente a realização do tipo, mas a aceitá como possível ou até 
provável, assumindo o risco da produção do resultado. 
Dessa forma, em síntese, pode-se dizer que o dolo indireto eventual se 
perfaz quando presentes os elementos: 
a) o sujeito quer praticar a conduta, mas não quer diretamente o resultado 
criminoso; 
b) representa a possibilidade de ocorrência do resultado; 
c) atua com desprezo (ou indiferença) frente à possibilidade de ocorrência 
do resultado. Todos esses requisitos são cumulativos. 
FRAGOSO e HUNGRIA (1983, p.122)7 compreendem que assumir o risco é 
alguma coisa mais que ter consciência de correr o risco: é consentir previamente no 
resultado, caso venha este, realmente a ocorrer 
Em linguagem popular, pode-se concluir que há dolo eventual quando o 
sujeito diz parasi mesmo: “que se dane”! “Eu não quero o resultado, mas se ocorrer 
que se dane”! Nas hipóteses de homicídios dolosos eventuais - o autor pensa 
consigo mesmo: “Eu não quero matar, mas é possível que morram; se morrerem, 
paciência”! 
Dessa forma a doutrina prevê a aplicação dos institutos do dolo eventual e 
da culpa consciente, entretanto, é notório a diferenciação de ambos sendo que em 
caso a caso deve ser analisada a tenacidade, fato este que não vem ocorrendo na 
atualidade. 
 São vários os fatores contribuintes para que isto ocorra, como o fomento da 
violência, o clamor público, a pressão exercida pela mídia e a sensação de 
impunidade que se alastra na sociedade. A análise do crime é importante para 
definir essa questão. Deste modo, o presente estudo tem como objetivo contribuir 
diretamente na analise de qual forma vem sendo aplicada nos julgamentos, visto 
que, atualmente tais institutos estão sendo tratados de maneira trivial, não dando 
importância para a devida análise sobre a real intenção do agente e as 
circunstâncias do crime, por questão de mera conveniência, enquanto deveria estar 
sendo aplicado com base nos pilares da justiça. 
 
6
 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de Direito Penal: parte geral. Volume 01. 17ª edição. São 
Paulo: Saraiva. 2012. 
7
 FRAGOSO, Heleno Cláudio; HUNGRIA, Nélson. Comentários ao Código Penal. volume: 01. 6ª 
edição. Rio de Janeiro: Forense. 1983 
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/1033702/c%C3%B3digo-penal-decreto-lei-2848-40
Assim sendo busca-se contribuir para que tal instituto (dolo eventual) seja 
aplicado de forma mais cautelosa, apenas nas hipóteses em que for comprovado 
que o agente agiu assumindo o risco, de maneira a ter consentido com o resultado. 
O caso se tornou polêmico e de comoção nacional, visto a intensa cobertura 
dos meios de comunicação, as análises infundadas e a quantidade de vítimas. 
Diante desse fato ocorreu o desaforamento do julgamento, ou seja, o julgamento foi 
submetido a foro (local) estranho ao delito. 
O desaforamento trata-se de um procedimento exclusivo do Tribunal do Júri 
o qual só poderá ser decretado após a preclusão da pronúncia, fase em que ocorre 
a acusação oferecida para encaminhar o acusado a julgamento perante o júri, a 
preclusão consiste na perda do direito de se manifestar num processo, 
principalmente devido ao fato de não ter exercido a sua manifestação no momento 
correto e da forma prevista. 
Em síntese os julgamentos ocorrem nas cidades onde os crimes 
aconteceram, mas, no caso da Boate Kiss, foi transferido para Porto Alegre, e 
ganhou o número 001/2.20.0047171-0, esse fato é o que se denomina no DP de 
desaforamento, ocorrendo em casos de grande comoção e repercussão, para que 
os jurados não sejam influenciados. 
Santa Maria é uma cidade pequena, muita gente perdeu alguém na tragédia, 
dificilmente seria um júri isento, explica FARAH (2021)8 
Na sessão plenária os representantes de acusação e defesa, utilizaram de 
ferramentas técnicas e emocionais para converter 04 dos 07 jurados a favor da sua 
tese e a decisão proferida pelo magistrado Orlando Faccini Neto, foi uma afronta ao 
Direito Penal, pois em 43 páginas, o magistrado trata não só do caso concreto, mas 
também do que diz respeito aos julgamentos pelo tribunal do júri. E ao final, Faccini 
Neto cita o habeas corpus preventivo, que é um mecanismo aplicado quando ainda 
existe apenas uma ameaça ao direito. Nesse caso, qualquer pessoa física que se 
achar ameaçada de sofrer lesão a seu direito de locomoção tem direito de fazer um 
pedido de habeas corpus (HC), esse instituto é denominado remédio constitucional e 
a pessoa assolada por ele é chamada de “paciente”. Fato este que levou os agentes 
no processo terem sua prisão evitada. 
 
8
 FARAH, Renan. Boate Kiss: dolo eventual ou culpa consciente?. Jornal Jurid. 2021. Disponível 
em: https://www.jornaljurid.com.br/noticias/boate-kiss-dolo-eventual-ou-culpa-consciente. Acesso em: 
27/12/2021. 
 
https://www.jornaljurid.com.br/noticias/boate-kiss-dolo-eventual-ou-culpa-consciente
Os réus no processo criminal respondiam por homicídio simples que é o 
crime que se refere à ação de matar alguém sem agravantes cruéis (qualificadoras) 
ou sem domínio de violenta emoção (privilegiado) em número de 242 vezes 
consumado pelo número de mortos, tipo penal integralmente realizado, ou seja, 
quando o tipo concreto amolda-se perfeitamente ao tipo abstrato, assim 
o crime restará consumado com a morte da vítima; e 636 vezes tentado pelo número 
de feridos, crime que ocorre quando o agente inicia a execução do delito, mas este 
não se consuma por circunstâncias alheias à sua vontade. 
A sentença de Faccini condenou os sócios Elissandro Spohr, a 22 anos e 
seis meses de prisão por homicídio simples, praticado com dolo eventual e Mauro 
Hoffmann, a 19 anos e seis meses de prisão por homicídio simples, praticado com 
dolo eventual. Na interpretação do magistrado os sócios determinaram a instalação, 
em paredes e no teto da boate, de espuma altamente inflamável, olvidando 
indicações técnicas de uso que, em sua condição empresarial, deveriam obedecer. 
Mais do que isso, empreenderam a contratação de show musical no qual era cediça 
a utilização de artefatos similares a fogos de artifício, sem prestar a devida 
informação sobre os riscos associados à conjugação destes dois fatores. Portanto, 
contribuíram num grau excepcional com a situação de perigo que culminou na 
causação dos danos verificados. Isto para não dizer do fato que aceitaram, sem 
controversas, manter a casa noturna com lotação demasiada, sem que tivessem 
atuado no sentido de viabilizar adequadas condições de evacuação, em casos de 
necessidade. Tudo no processo, ademais, corrobora a ideia de que coadunaram 
com a atuação de funcionários sem os treinamentos obrigatórios, e, no ensejo dos 
fatos da denúncia, chegaram a, ainda que genericamente, e no início do 
desdobramento do evento, ordenar aos seguranças para que impedissem a saída de 
pessoas do recinto, acaso não demonstrado o pagamento das despesas de 
consumo na boate. Tal conjunto de atos, no somatório tendente ao desfecho 
intensamente fatal que promoveu, de forma a encerrar elevado grau de 
censurabilidade. Com efeito, sendo os acusados imputáveis, ou seja, aquele que 
possui a capacidade de entender o caráter criminoso do seu ato e de determinar-se 
de acordo com esse entendimento - sendo, pois, a vontade livre do homem o 
fundamento da imputabilidade, de maneira a auferirem lucros em contrapartida a 
falta de segurança, tornando dessa maneira indiscutível a consciência da ilicitude do 
comportamento, viabilizando juízo desfavorável sobre essa circunstância9. 
 Já Marcelo de Jesus, vocalista da banda foi condenado a 18 anos de prisão 
por homicídio simples, praticado com dolo eventual e Luciano Bonilha, auxiliar da 
banda condenado a 18 anos de prisão por homicídio simples, praticado com dolo 
eventual. Na prolatação de Faccini ambos contribuíram igualmente quanto ao grau 
de censura acentuado. Não obstante conhecendo o local do fato, onde já haviam 
atuado, acionaram os artefatos pirotécnicos que sabiam, ou no mínimo deveriam 
saber, serem destinados a uso em ambientes externos, sendo que um destes foi 
direcionado para o teto da boate, de modo leviano e insensível, o que deflagrou, a 
queima do revestimento inflamável. A importância causal desta conduta, para a 
produção de tamanho número de mortes, é inequívoca e o peso elevado das 
consequências deve ser suportado por aqueles cujo comportamento foi mesmo 
decisivo para a eclosão das mortes. Sem contar que teriam saído do local sem 
alertar o público acerca do fogo e da necessidade de evacuação, dando à vida dos 
frequentadores nenhuma importância e egoisticamente buscando preservar a sua. 
De modoque a reprovabilidade é intensa, sendo os acusados imputáveis e sendo-
lhes, fortemente, exigido comportamento diferente daquele que adotaram por 
ocasião da efemeridade.10 
A decisão proferida pelo Conselho de Sentença, formado por sete jurados 
(seis homens e uma mulher), causou uma revolta no mundo jurídico. Não se trata de 
uma indignação simplesmente de advogados, pois, se fosse, poderia ser tomada 
como um corporativismo de classe. Longe disso. É uma revolta de advogados, de 
delegados de polícia sérios e honestos juridicamente, de promotores de justiça 
comprometidos com a ordem jurídica, enfim, é uma indignação de operadores do 
Direito comprometidos com o Direito e com a Justiça, que não utilizam seu caráter e 
conhecimento acadêmico e intelectual como moeda de troca para enaltecer o ego e 
a vaidade à custa da destruição de mais quatro famílias. Será que diante da tragédia 
ocorrida ainda era necessário causar mais dor? 
 
9
 BRASIL. Sentença Condenatória Caso Boate Kiss. Poder Judiciário. Rio Grande do Sul. 2021. 
Disponível em: https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-
kiss.pdf. Acesso em: 04/01/2022. 
10
 BRASIL. Sentença Condenatória Caso Boate Kiss. Poder Judiciário. Rio Grande do Sul. 2021. 
Disponível em: https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-
kiss.pdf. Acesso em: 04/01/2022. 
 
https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-kiss.pdf
https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-kiss.pdf
https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-kiss.pdf
https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-kiss.pdf
Seria razoável encarcerar quatro réus, punir quatro famílias, para diminuir 
um pouco a dor daqueles que perderam seus entes queridos, visto que a dor 
daqueles que perderam alguém na tragédia nunca irá desaparecer ou sequer terá 
respaldo monetário que as supra, sendo que a indenização por danos morais e 
materiais tal como precede a Carta Magna em seu Art. 5º, V e X apontam a 
legalidade desta para aqueles que de alguma forma sofreram danos. 
Dessa forma os representantes das vítimas em esfera civil solicitaram a 
título indenizatório o valor de 03 milhões de reais por morte e de 300 mil reais por 
vítima internada. Estes números foram obtidos baseando-se nas idades atuais e da 
quantidade de anos de vida perdidos, ou seja, porque muitos anos de vida produtiva 
em potencial foram tirados das vítimas. Este processo seria movido contra os sócios 
da casa e contra os músicos. 
Os pedidos de indenizações foram dirigidos aos órgãos públicos, prefeitura e 
estado, bem como aos sócios da boate e ainda aos fabricantes das espumas. Os 
dependentes financeiros das vítimas pleiteariam uma liminar de antecipação de 
tutela em caráter de urgência, concomitante à ação principal. 
A tutela antecipada pode ser concedida liminarmente ou não. Se, depois que 
a parte contrária se manifestar, o juiz deferir o pleito, terá ele proferido uma decisão 
por meio da qual antecipou a tutela, mas não se tratará de uma decisão liminar. 
A Defensoria Pública acionou três dos seus núcleos especializados, para 
além de obter as indenizações, pleitear junto ao estado assistência médica e 
psicológica integral para as vítimas, sendo que conforme informado pela própria 
Defensoria os indiciados já estariam com 05 imóveis e uma conta no valor de mais 
de 500 mil reais bloqueados. Porém estes bens não seriam suficientes para 
satisfazer as ações indenizatórias, o que acarretaria a necessidade de obter o 
recebimento a partir da responsabilidade objetiva do Estado. 
É fato que a responsabilidade do Poder Público não existirá ou será 
atenuada quanto a conduta da Administração Pública não der causa ao prejuízo ou 
concorrem outras circunstâncias que possam afastar ou mitigar 
sua responsabilidade 
Com a adoção da responsabilidade objetiva, o cidadão (3º prejudicado) 
deixa de se situar em uma posição de fragilidade perante o Estado, pois agora a 
responsabilização independe da demonstração da culpa, e a simples demonstração 
de nexo causal entre a ação (ou omissão) do Estado e o prejuízo já é o suficiente 
para existir o direito de indenização. 
O pedido foi motivado diante das conclusões resultantes de investigações da 
Polícia Civil, que apontaram que houve negligência por parte da Prefeitura de Santa 
Maria e do Corpo de Bombeiros (Estado do Rio Grande do Sul) na fiscalização da 
casa noturna, permitindo seu funcionamento em condições inadequadas de 
segurança. Conforme as informações divulgadas pelo jornal Folha de São Paulo, a 
Prefeitura, que, em 19/04/2012, concedeu alvará de localização para a Boate Kiss, 
tinha conhecimento das irregularidades do local desde o ano de 2009, tendo 
inclusive realizado avaliação da boate por arquiteto próprio, embora não tivesse 
tomado nenhuma providência diante das falhas de segurança verificadas. 
Considerando o porte da tragédia, que resultou em 242 vítimas fatais, as 
ações foram propostas contra a Prefeitura de Santa Maria e ao Estado do Rio 
Grande do Sul, visto que os proprietários, ainda que eventualmente condenados, 
não teriam condições de arcar com todas as indenizações. 
Nos casos em que há conduta omissiva do Estado, ou seja, quando o 
agente faz alguma coisa que estava proibido, fala-se em crime comissivo; quando 
deixa de fazer alguma coisa a que estava obrigado, tem - se um crime omissivo, o 
Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem entendido que a responsabilidade civil é 
subjetiva, e tem resguardo na regra dos artigos 186 e 927 do Código Civil (CC), 
devendo ser comprovada a relação de causalidade entre a omissão do Estado e o 
dano sofrido por aquele que pleiteia a indenização (o Estado deveria ter agido, mas 
não o fez). 
A responsabilidade subjetiva é o dever de indenizar os danos causados 
diante de uma ação ou omissão, dolosa ou culposa, devendo estarem presentes 
quatro elementos: culpa ou dolo, ato ilícito, dano, nexo de causalidade. No Código 
Civil, a responsabilidade subjetiva é a regra. 
Essa é a hipótese da Boate Kiss, uma vez que a tragédia ocorreu pela não 
fiscalização adequada do estabelecimento. A responsabilidade somente é objetiva, 
isto é, não depende de dolo ou culpa estatal, conforme previsão do artigo 37, 
parágrafo 6º, da Constituição, quando o dever de indenizar tem origem no nexo 
causal entre o ato administrativo e o prejuízo ao particular. 
Conforme informe do Império do Direito em 09 de setembro de 2015 foi 
julgada a primeira ação cível referente ao incêndio ocorrido na Boate Kiss, sendo 
que a decisão, proferida pela 1ª Vara Cível - Fazenda Pública condenou a empresa 
responsável pela Boate ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de 
R$ 20.000,00, para cada um dos autores. Por outro lado, julgou improcedentes os 
pedidos em relação ao Município de Santa Maria e ao Estado do Rio Grande do Sul. 
Segundo a sentença, restou amplamente caracterizado o dever de indenizar 
por parte da empresa, ante a falha na prestação do serviço. 
Havia superlotação na casa noturna, os extintores não funcionaram, havia 
somente uma saída de emergência e a espuma de vedação acústica utilizada era 
inadequada e tóxica. Soma-se a tudo isso a responsabilidade da Boate em impedir a 
utilização de artefatos pirotécnicos no interior do local, os quais certamente exporiam 
os frequentadores a risco. 
Ainda que a atitude de disparar o artefato tenha partido de um dos 
integrantes da Banda “Gurizada Fandangueira”, em se tratando de entidade privada, 
não há exclusão da responsabilidade por culpa exclusiva de terceiro, uma vez que o 
grupo foi contratado pela casa noturna. 
Na culpa exclusiva de terceiros compete à parte autora a prova da existência 
do fato, do dano e do nexo de causalidade entre eles, cabendoà parte ré, em 
contraposição, a prova de eventual causa excludente da responsabilidade, como 
a culpa exclusiva da vítima. 
O ato ilícito, neste caso, configura fortuito interno, ou seja, conceito jurídico 
bastante utilizado no âmbito das relações de consumo. Trata-se em linhas gerais do 
dever dos empreendedores de arcarem com as avarias decorrentes da própria 
atividade desenvolvida que venham a trazer prejuízos inesperados para o 
consumidor, assim sendo deve a empresa responder pelos danos gerados, segundo 
a teoria do risco do empreendimento que leciona que todo aquele que se disponha a 
exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos 
eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de 
culpa. 
Entendimento diverso foi dado à responsabilização do Estado do Rio Grande 
do Sul (Corpo de Bombeiros) e do Município de Santa Maria. Ainda que tenha 
ocorrido, de fato, omissão do Poder Público, que deixou de fiscalizar as condições 
de funcionamento da empresa – nas quais havia flagrante descumprimento das 
normas de prevenção de incêndio, de lotação etc., houve rompimento do nexo de 
causalidade, vínculo fático que liga o efeito à causa, ou seja, é a comprovação de 
que houve dano efetivo, motivado por ação, voluntária, negligência ou imprudência 
daquele que causou o dano, diante do ato exclusivo e absolutamente independente 
de terceiro. 
A causa juridicamente relevante para produção do resultado danoso foi à 
utilização do artefato pirotécnico pela Banda no interior do estabelecimento, que 
acarretou o incêndio do forro, o qual era constituído de material altamente inflamável 
e tóxico. Desta forma, segundo a decisão, ainda que o Poder Público tivesse 
promovido à fiscalização de forma eficiente e estivessem cumpridas todas as 
exigências legais, com todos os alvarás válidos, não haveria como se inferir que o 
incêndio não teria ocorrido ou que as proporções seriam reduzidas. 
Dessa forma, tem-se que o Estado e o Município, falharam no seu dever de 
fiscalizar e eventualmente interditar a “Boate Kiss”, e que tal falha enseja 
responsabilidade política dos dois entes, e também eventual responsabilidade 
administrativa e/ou penal dos agentes envolvidos – mormente se restar de fato 
demonstrada atuação dolosa e/ou fraudulenta de algum servidor. 
Na responsabilidade administrativa, penal e civil constantes do direito 
administrativo disciplinar as comissões e a autoridade têm o dever legal de 
comunicar às autoridades competentes quando se deparar com indícios de 
cometimento de crimes, ilícitos cíveis, por ventura, cometidos pelo servidor, acusado 
em processo disciplinar. 
Todavia, tal conduta dos Entes Públicos não gera dever de indenizar em 
razão da ausência de nexo de causalidade direto com o evento danoso, 
simplesmente porque terceiros agiram ativamente e com suas condutas deram 
causa ao resultado, logo, são esses terceiros que deverão arcar com as reparações 
respectivas. 
Diante do ato exclusivo de terceiro, houve rompimento do nexo de 
causalidade entre o dano e as condutas dos agentes públicos municipais e 
estaduais, isento o Estado do Rio Grande do Sul e o Município de Santa Maria do 
dever de indenizar. 
Com base nos mesmos fundamentos, ocorreu a condenação solidariamente 
de todos os sócios da Boate Kiss ao pagamento de indenização por danos morais 
aos pais de uma das vítimas fatais do incêndio, no valor de R$ 50.000,00 para cada 
um, totalizando R$ 100 mil reais para o casal.11 
Em decorrência de Responsabilidade solidária, havendo pluralidade de 
devedores, o credor pode cobrar o total da dívida de todos ou apenas do que achar 
que tem mais probabilidade de quitá-la. Todos os devedores são responsáveis pela 
totalidade da obrigação. O devedor que pagar o total deve receber dos demais a 
parte que pagou por eles. 
Essa foi uma forma que a Justiça abriu precedentes para futuras 
indenizações a famílias de vítimas. 
É fato que a condenação na esfera criminal para os familiares das vítimas é 
efêmera e sutil, para os réus é permanente e lancinante. Essa dor é uma chama 
ardente e que consome tudo o que for lançado nela. Uma dor que será perpetuada 
pela eternidade. 
Entretanto, é notório que o processo que lançou os quatro réus no rol dos 
culpados não será suficiente para aplacar tamanha dor. Nada será suficiente. Se 
fossem condenados todos os envolvidos direta ou indiretamente no fato, ainda assim 
não seria suficiente. Se fossem torturados todos e se fosse aplicada a pena de 
morte posteriormente, ainda assim não seria suficiente. 
Cabe ao Direito, em especial ao Direito Penal ajustar as expectativas para a 
condenação justa, concreta, visando o todo e não somente a parte, uma justiça que 
não seja influenciada pelos olhos de uma mídia que condena sem resquícios 
verídicos de forma a causar frustrações e descréditos aos operadores do direito de 
forma a afetar a confiança no sistema de justiça. 
Nem mesmo sob o enfoque de um utilitarismo voltado a satisfazer o anseio 
vingativo e compreensivelmente humano, mas irracional de quem perdeu um familiar 
seria possível concordar com uma condenação como a que ocorreu. Do ponto de 
vista jurídico, não há justificativa nenhuma para tal feito. 
O magistrado Orlando Faccini Neto enfatizou em sua tese condenatória que 
a fundamentação para a fixação da pena se fundamentou desde sempre na 
 
11
 BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Processo 
027/1.13.0005563-4 (CNJ:.0010923-91.2013.8.21.0027) – Juíza prolatora Eloisa Helena Hernandez 
de Hernandez. 2015. Disponível em: https://emporiododireito.com.br/leitura/boate-kiss-e-condenada-
ao-pagamento-de-indenizacao-por-danos-morais-a-vitimas-do-incendio-ocorrido-em-santa-maria-rs. 
Acesso em 04/01/2022. 
 
https://emporiododireito.com.br/leitura/boate-kiss-e-condenada-ao-pagamento-de-indenizacao-por-danos-morais-a-vitimas-do-incendio-ocorrido-em-santa-maria-rs
https://emporiododireito.com.br/leitura/boate-kiss-e-condenada-ao-pagamento-de-indenizacao-por-danos-morais-a-vitimas-do-incendio-ocorrido-em-santa-maria-rs
imputação do dolo eventual. Dessa forma o juiz cita JESUS que fundamenta a pura 
culpabilidade aquele que “retira o dolo da culpabilidade e o coloca no tipo penal”, o 
que indicaria que “relaciona-se com a teoria finalista da ação”, ou melhor, naquela 
em que a infração penal só se constitui com conduta tipificada, antijurídica e 
culpável. A conduta é composta de ação/omissão somada ao dolo perseguido pelo 
autor, ou à culpa em que ele tenha incorrido por não observar dever objetivo de 
cuidado. 
Faccini continua se utilizando das palavras de ESTEFAM, que enfatiza que 
mediante a perspectiva de que no âmbito do sistema finalista se identificou a 
natureza puramente normativa da culpabilidade, a qual passou a ser composta de 
imputabilidade, possibilidade de compreensão da ilicitude da conduta e de exigir do 
agente comportamento distinto. Sendo complementado por BITENCOURT, que 
assevera que uma das mais caras contribuições do finalismo é a extração do âmbito 
da culpabilidade de todos aqueles elementos subjetivos que a integram até então e, 
assim, dando origem a uma concepção normativa pura da culpabilidade. 12 
Dessa forma a prolatação levou em consideração o descrito no Art. 59 do 
CP que determina que o juiz atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à 
conduta social, a personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e 
consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá 
conforme seja necessário e suficiente para a reprovação e prevenção do crime13, 
dessa forma o juiz, dentro dos limites estabelecidos pelo legislador (mínimo e 
máximo, abstratamente fixados para a pena), deve eleger o quantum ideal, valendo-
se do seu livre convencimento (discricionariedade), embora com fundamentada 
exposição do seuraciocínio (juridicamente vinculada). 
Assim sendo o magistrado quando expôs a culpabilidade, a resumiu como a 
reprovação pessoal que se faz contra o autor pela realização de um fato contrário ao 
Direito, embora houvesse podido atuar de modo diferente de como o fez, o que, 
assim, significaria que a reprovação pessoal contra o agente do fato fundamenta-se 
na não omissão da ação contrária ao Direito ainda e quando podia havê-la omitido. 
 
12
 BRASIL. Sentença Condenatória Caso Boate Kiss. Poder Judiciário. Rio Grande do Sul. 2021. 
Disponível em: https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-
kiss.pdf. Acesso em: 28/12/2021. 
13
 BRASIL. Código Penal. Decreto Lei 2.848 de 07 de dezembro de 1940. Manole. Barueri. São 
Paulo. 2016 
https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-kiss.pdf
https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-kiss.pdf
Professores da Universidade de São Paulo (USP) como Ana Elisa Bechara, 
professora de Direito Penal, e Maurício Dieter professor da área de criminologia, 
observam a controversa acusação do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP), 
apontando crime doloso contra a vida (intencional) e que levou o caso a júri popular. 
A professora Ana Elisa segue a linha apresentada pela defesa e vê confusão 
entre as figuras de dolo e culpa no caso, de acordo com a docente a tragédia 
poderia ter sido evitada (ou seja, há responsabilidade), mas tem uma análise técnica 
da qual não se pode fugir. Quando se passa por cima dos conceitos técnicos de 
Justiça para julgar conforme uma ansiedade da sociedade, se abre uma porta 
perigosa, a do arbítrio, de cada um, de maneira que o julgamento poderá ser 
efetuado de maneira subjetiva, não de acordo com o conhecimento técnico. Num 
caso como esse, quando se diz que essas pessoas conheciam o resultado morte 
como muito provável e ficaram indiferentes, se está dizendo que elas eram, no 
mínimo, suicidas.14 
É fato que a vontade do agente é de suma importância para que se possa 
classificar sua conduta, de forma culposa ou dolosa, uma vez que, nas infrações, o 
agente assume o risco de seus atos. 
O professor Dieter segue na mesma linha sustentando que o problema 
principal não vigora na distinção entre dolo e culpa, fazendo a consideração de que 
em uma prova de DP, o gabarito do caso da boate Kiss, provavelmente, seria 
incêndio com resultado morte, sendo que tal crime não seria competência do tribunal 
do júri, mas sim julgado por um juiz comum, com pena de seis a doze anos. 
Acrescenta ainda que as evidências apresentadas indicam que não houve dolo 
eventual pelos acusados.15 
Tanto no dolo eventual ou culpa consciente, o agente no recebimento da sua 
pena, terá na sua aplicação uma punição severa ou branda por parte do Estado. 
Dessa forma a sustentação do professor Dieter vai de desencontro com o 
que foi exposto pelo magistrado em sua tese quando salienta que quando se fala na 
intensidade do dolo se aborda a cerca do dolo direto ou de dolo eventual. Para o 
 
14
 BRASIL. Sentença Condenatória Caso Boate Kiss. Poder Judiciário. Rio Grande do Sul. 2021. 
Disponível em: https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-
kiss.pdf. Acesso em: 28/12/2021. 
 
15
 BRASIL. Sentença Condenatória Caso Boate Kiss. Poder Judiciário. Rio Grande do Sul. 2021. 
Disponível em: https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-
kiss.pdf. Acesso em: 28/12/2021. 
https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-kiss.pdf
https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-kiss.pdf
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magistrado o dolo não se estrutura em termos puramente descritivos e não deixa de 
revelar um estado de indiferença ou de desinteresse frente aos valores comportados 
pelo Direito. Neste contexto, ademais, a indiferença aparece como um critério a ser 
tomado em conta para a sempre difícil distinção entre o dolo eventual e a culpa 
consciente16. 
Assim sendo, para o juiz a ausência de oposição interna do autor frente à 
lesão do bem jurídico, quando essa, a lesão, afigura-se o dolo eventual. 
Percebeu-se dessa forma que à bancada da Defesa, lutou com todas as 
suas forças, tentando evitar a injustiça e salvar o Direito, mas mesmo assim a 
Defesa, que é sempre a última trincheira contra o abuso punitivo, sucumbiu, e com 
ela caiu o Direito, e isso gerou fraturas sérias nos pilares que sustentam o Tribunal 
do Júri como Instituição democrática no Brasil. 
O que se viu do lado contrário, por parte da acusação, foram teses vaidosas, 
hipócritas, uma acusação despreparada tecnicamente. Viu-se um promotor falar em 
“teoria do domínio do fato” para tentar justificar o, porquê certos réus não foram 
incluídos na denúncia. Sendo que a teoria reconhece a figura do autor mediato, 
desde que a realização da figura típica, apresente-se como obra de sua vontade 
reitora, que é reconhecido como o “homem de trás”, e controlador do executor. 
Esse promotor sequer sabe o que é a teoria do domínio do fato, pois, se 
soubesse, teria vergonha do que disse, visto que a teoria referida não é teoria 
probatória, mas limitativa do poder punitivo; é teoria que pressupõe culpa formada, 
atua no “pós” e não na “pré” apuração da culpa (sentido lato). 
Foi abordada a teoria da cegueira deliberada como mero subterfúgio teórico 
e falso para levar os jurados a incorrer em erro. 
Sendo a teoria da cegueira deliberada ou instruções de avestruz (ostrich 
instructions) definida por SOARES (2019, p. 06) como instituto do direito criminal 
que, por meio da ampliação do espectro conceitual de autor e partícipe de delitos, 
possibilita a responsabilização criminal daqueles que, deliberadamente, evitam o 
 
16
 BRASIL. Sentença Condenatória Caso Boate Kiss. Poder Judiciário. Rio Grande do Sul. 2021. 
Disponível em: https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-
kiss.pdf. Acesso em: 28/12/2021. 
 
https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-kiss.pdf
https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-kiss.pdf
conhecimento sobre o caráter ilícito do fato para o qual concorrem, ou acerca da 
procedência ilícita de bens adquiridos ou movimentados.17 
Além do mais, se viu uma promotora passar “vergonha jurídica” por se fazer 
de desentendida e violar o direito ao silêncio durante o interrogatório de um dos 
réus. Viu-se a utilização de imagens de corpos das vítimas como instrumento 
apelativo para cegar os jurados. O sangue que ofusca as vistas ocultou a realidade e 
as consequências da decisão. 
Uma insensibilidade sem tamanho com os familiares presentes, uma 
crueldade sem limites. Viu-se também um advogado, atuando como assistente de 
acusação, violar os direitos dos réus, indo na contramão do que todos os operadores 
do direito juram quando recebem a licença: atuar com ética, defender a Constituição, 
defender a Ordem Jurídica. 
Um show de horrores. Se injustiça fosse um tipo penal, a bancada da 
acusação deveria responder a título de dolo direto, sabiam o que estavam fazendo. 
Não eram tolos, foram maldosos, insanos. 
O resultado quatro réus condenados por homicídio com dolo eventual, 
enfatizado pelo magistrado como imensa gravidade, ficando até mesmo difícil supor 
a possibilidade de que fatos assim ocorram sob a modalidade do dolo direto, visto 
que a produção da morte de tão vasto número de indivíduos, quando o agente quer 
diretamente o resultado, muitas vezes se convola noutros tipos penais, como seja o 
terrorismo– conceituado pela lei 13.260/2016 em seu Art. 2º como uma prática por 
um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões 
de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando 
cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a 
perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública18·; o genocídio 
definido pela lei 2.889/1956 em seu Art. 1 como quem, com a intenção de destruir, 
no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso19, e outros 
envolvendo um conjunto tão plural de vítimas, o que quase permitirá dizer que em 
situações catastróficas e de produção da morte de um expressivo número de 
pessoas o dolo eventual já é, ele mesmo, o elemento subjetivo de maior gravidade, 
 
17
 SOARES. Juscelino Oliveira. A teoria da cegueira deliberada e sua aplicabilidade aos crimes 
financeiros. Revista Acadêmica Escola Superior do Ministério Público do Ceará. 2019 
18
 BRASIL. Lei Antiterrorismo – lei 13.260 de16 de março de 2016. Disponível em: 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13260.htm. Acesso em 28/12/2021. 
19
 BRASIL. Lei 2.889 de 1º de outubro de 1956. Disponível em: 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l2889.htm. Acesso em: 28/12/2021. 
https://pt.wikipedia.org/wiki/Xenofobia
https://pt.wikipedia.org/wiki/Discrimina%C3%A7%C3%A3o
https://pt.wikipedia.org/wiki/Preconceito
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13260.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l2889.htm
porquanto se de dolo direto se tratasse muito provavelmente se estaria diante de 
outros modelos de crimes. Faccini Neto enalteceu que nenhum julgador, será capaz 
de colocar-se na mente de quem atuou criminalmente para, daí, inferir qual teria sido 
o seu elemento subjetivo. 
O fato é que os réus deveriam ser condenados por homicídio culposo que é 
aquele quando uma pessoa mata outra sem a intenção, quando a culpa é 
inconsciente. As causas do homicídio culposo são norteadas pela negligência, 
imprudência ou imperícia. Não era preciso absolver, simplesmente tipificar a ação 
corretamente. Às vezes a razão não está nos extremos, mas no meio. 
Para MARTELO FILHO (2020, p. 469) o “o dolo é um juízo, e não um objeto 
de valoração”; de maneira que a imputação do dolo nunca é, portanto, um simples 
derivado de processos psicológicos.20 
Para o julgador a questão do dolo é uma atribuição, entretanto se faz 
necessário a menção de que a conduta foi única, sendo que o DP se debruça sobre 
a conduta, não considerando, para aferir a responsabilidade a título de dolo ou culpa 
o número de mortes, pois isso é feito num segundo momento, na dosimetria de 
pena. A culpa não se convola em dolo pelo elevado número de resultados, mas sim 
pela ação do agente. 
O dolo eventual e culpa consciente é algo difícil de entender, o erro é 
compreensível. Não são formas tão complicadas que justifiquem uma decisão tão 
equivocada. As teses foram bem, muito bem, explicadas em plenário. 
Partindo-se da dicção legal, no dolo eventual o agente “assume o risco” de 
produzir o resultado. A redação legal é precária, pois há assunção de um risco, do 
ponto de vista fático, tanto no dolo eventual quanto na culpa consciente. Assim se o 
agente pega seu carro e sai de sua casa com pressa para chegar em determinado 
local e passa um semáforo que estava fechado para ele, este esta assumindo a 
possibilidade de atropelar e matar alguém. 
Se isso ocorrer, não é possível dizer, por si só, que o agente agiu com dolo 
eventual porque “assumiu o risco”. O dolo eventual exige mais que assumir o risco 
de produzir um resultado: é necessário se conformar com o resultado caso venha 
ocorrer, ser indiferente com relação a ele. É essa INDIFERENÇA quanto à produção 
do resultado que permite distinguir o dolo eventual da culpa consciente. 
 
20
 MARTELETO FILHO, Wagner. Dolo e risco no Direito Penal. Fundamentos e limites para a 
normtivização. São Paulo: Marcial Pons, 2020, 
Aqui precisa ficar claro que a mera previsão do resultado (aquilo que pode 
acontecer) não define que o crime é doloso, porque tanto no dolo (direto ou 
eventual), quanto na culpa (com exceção da culpa inconsciente), a previsão está 
presente. 
A cerca do veredicto é necessário se salientar que não se pode culpar o 
Conselho de Sentença, que é soberano, entretanto é necessário se salientar que 
esses juízes leigos não conhecem a justiça de forma plena e pior ainda veem com 
uma opinião pré-formada pela imprensa que teima em condenar e julgar sem a 
devida técnica. Também não se pode deixar de lembrar que a soberania carrega 
consigo a noção de responsabilidade, de imparcialidade. 
O Conselho não é culpado pelo erro, mas em certa medida são 
responsáveis pela injustiça praticada, pois poderia, terem decidido de outra forma se 
dominassem técnica, leis e a realidade dos fatos, sem a intromissão dos meios de 
comunicação. Então como diferenciar dolo eventual e culpa consciente para 
cidadãos leigos, sem o temido e incompreendido juridiquês? 
Seria necessário o questionamento se os réus poderiam prever que acionar 
o dispositivo pirotécnico em local fechado poderia ocasionar fogo, “os réus poderiam 
prever que em caso de fogo as pessoas poderiam morrer?” 
Somente assim poderia ocorrer a compreensão de que tais argumentos não 
definem uma conduta como dolosa (dolo eventual), ou seja, aquela conduta em que 
a pessoa age intencionalmente para alcançar um resultado. A conduta dolosa se 
diferencia da culposa, que é aquela em que não se tem a intenção de se chegar ao 
resultado, mas isso decorre de um comportamento negligente, imprudente ou não 
feito com a habilidade apropriada. 
Algumas situações deveriam ter sido analisadas com mais esmero pelo Júri 
e que poderiam ter levado a uma decisão mais justa e correta tais como: Será que 
naquele dia todos (sócios, músico, roadie) saíram de suas casas em direção à Kiss 
sabedores de que o dispositivo pirotécnico seria acionado, que poderia dar início ao 
fogo causando um incêndio que mataria centenas de pessoas, e foram indiferentes 
com relação a isso? Os quatro réus tinham amigos e conhecidos lá dentro da boate. 
Será mesmo que eles eram indiferentes com relação à morte dessas pessoas? Mais 
que isso, os réus que estavam lá dentro eram indiferentes com relação às suas 
próprias vidas? Eles tinham família, eram indiferentes com relação aos seus? Eram 
indiferentes se iriam retornar aos seus lares? Eram indiferentes com seus suicídios? 
Afinal todos os réus eram primários, ou seja, aquele agente que não havia 
sido anteriormente condenado por sentença transitada em julgado. Seu conceito é 
na verdade a antítese daquele que define réu reincidente, ou seja, o réu já 
condenado por sentença transitada em julgado. Não possuíam antecedentes, não 
possuíam qualquer envolvimento com o Poder Judiciário na esfera penal. Nas 
palavras de Celso Delmanto em seu Código Penal Comentado: São os fatos 
anteriores de sua vida, incluindo-se tanto os antecedentes bons como os maus. 
Dessa forma por mera vontade de matar eles quiseram dar novo rumo às suas vidas 
e agir como assassinos? Claro que não. 
Ali tudo era uma festa, como muitas outras realizadas pelos acadêmicos e 
pelos donos da boate, as pessoas se divertiam. Os músicos queriam entreter as 
pessoas e a pirotecnia seria uma forma de potencializar o divertimento, haja vista 
que tal artifício é utilizado pelos mais renomados artistas brasileiros. 
É notório que ocorreu imprudência, negligência e imperícia que se diferem 
na ação tomada pelo agente. Assim, na imperícia e na imprudência o agente tem 
uma atitude comissiva, ou seja, de ação. Na imperícia, o agente faz sem ter a 
habilidade necessária, enquanto que na imprudência o agente faz sem o cuidado 
devido.Já na negligência a atitude é omissiva, posto que o agente deixe de fazer 
algo que seguramente deveria fazer, dessa forma como acreditar que o músico e o 
roadie saíram de sua casa levando consigo um sentimento de indiferença com 
relação à morte de centenas de pessoas? 
O fato é que antes do acidente da na Boate Kiss não existia fiscalização 
adequada por parte do Poder Público. Prefeituras, Bombeiros e MP não 
fiscalizavam. Quando havia algum tipo de fiscalização era feita “só pra inglês ver”. A 
de se ver que após o incêndio muitas regras foram modificas nas casas de show em 
todo o país, para encobrir as falhas dos Poderes e órgãos públicos, a única postura 
que entenderam adequada foi uma escolha covarde, uma escolha de quem não tem 
coragem para enfrentar a opinião pública e os familiares das vítimas e assumir sua 
parcela de responsabilidade, uma escolha de fazer uso de bodes expiatórios, de 
bois de piranha. 
Jogar quatro réus aos tubarões se equipara a Roma antiga quando os reis 
jogavam cristãos para serem devorados por leões no Coliseu. O importante era 
entreter o povo para mantê-lo sob controle. O tempo passa e a tática continua sendo 
a mesma. Antes, contudo, se dilacerava só o corpo dos infortunados, agora o corpo 
e a alma. Hoje a morte vem a prazo, em parcelas anuais de encarceramento em 
prisões medievais. Infelizmente a população ainda não evoluiu. O choro de um 
injustiçado não comove mais. No íntimo se prefere pensar que o erro decorrente de 
uma injustiça não é um erro da comunidade em geral, mas sim de quem acusou; de 
quem julgou; um efeito colateral do Sistema, um dano que se pode absorver, isso é 
um erro, afinal todos são corresponsáveis, pela injustiça praticada em 10/12/2021 e 
se esse julgamento não for anulado a população será testemunha ocular do mais 
grave erro judiciário do Brasil. 
O magistrado enfatiza que a culpabilidade dos acusados é elevada, por ser 
intenso o elemento subjetivo com que agiram; mesmo sendo o dolo eventual, 
permite um juízo desfavorável no nível da aplicação da pena, juízo que não está 
limitado por uma ideia de que necessariamente haveria de ser menos gravoso do 
que o oriundo de um caso cometido com dolo direto21. Para o juiz se utilizando das 
palavras de GUNTHER (2002, p. 219) a vítima, ou seus familiares, são reconhecidos 
como alguém que não padeceu de um mero infortúnio ou fatalidade, e sim uma 
conduta ilícita, reprovada pela coletividade22. 
O fato é que os meios de comunicação exaltaram o caso, afirmando que 
Elissandro Spohr, popularmente conhecido como Kiko, tinha a intenção de usar sua 
casa noturna para alavancar sua carreira na música. Sendo assim, ele buscava 
sempre um público de jovens universitários, incentivando-os a organizarem suas 
festas para angariarem fundos de formatura em sua boate. Kiko divulgava o evento 
e contratava os músicos e as bandas, repassando uma comissão para os 
estudantes proporcional ao da venda de ingressos, gerando assim uma corrida dos 
formandos atrás de clientes. Nesses moldes, de 3 a 4 festas por semana eram 
realizadas na boate, nos valores médios de 15 a 25 reais por pagante. A casa 
estava lotada na data do fato, por esta razão, ótimo custo-benefício para 
universitários da UFSM. 
O apelo midiático foi tanto que Santa Maria se tornou manchete no mundo 
inteiro. A imprensa internacional noticiou o ocorrido com destaque. A CNN, umas 
das principais redes de televisão dos Estados Unidos e do mundo, relatou tragédia 
tanto na televisão como na Internet, afirmou que o mundo não aprendeu com os 
 
21
 https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-kiss.pdf 
22
 GÜNTHER, Klaus. Die symbolische-expressive Bedeutung der Strafe: eine neue Straftheorie 
jenseits von Vergeltung und Prävention?. In: Festschrift für Klaus Lüdersen zum 70. Geburtstag 
am 2 Mai 2022. Baden-Baden: Nomos Verlagsgesellschaft, 2002. 
https://www.migalhas.com.br/arquivos/2021/12/B2D28CB95C2B9B_sentenca-caso-kiss.pdf
erros do passado. Já o Clarin, jornal argentino, comparou o incêndio com a da Boate 
em sua capital, que vitimou fatalmente 194 pessoas e deixou inúmeras feridas. El 20 
País, o principal jornal da Espanha, veiculou o incidente como um dos piores da 
história do Brasil. 
As principais emissoras de televisão do Brasil tiveram toda a sua 
programação alterada para poder passar cada detalhe do fato em suas coberturas. 
Algumas delas obtendo mais de 15% de aumento em suas audiências na região 
metropolitana de São Paulo, segundo o site de notícias R7 da rede Record. 
A atuação midiática, diz respeito à colisão entre a liberdade de imprensa, e 
consequente direito à informação, e outros diversos direitos garantidos pela ordem 
constitucional ao acusado, como a presunção de inocência e o direito à honra e à 
intimidade, dentre outros. 
Para enfatizar tal afirmativa cita-se que o Jornal Nacional, exibido em 28 de 
janeiro de 2013, tratou a tragédia da Boate Kiss, com uma edição de cerca de 50 
minutos, divididos em 04 blocos, dando destaque para a prisão de 04 pessoas 
envolvidas no incêndio, depoimentos exclusivos dos músicos falando como tudo 
aconteceu, análise e suspeita contra o Corpo de Bombeiros, o início do enterro das 
vítimas, o atendimento das vítimas nos hospitais, além de depoimentos de parentes 
e sobreviventes, uma simulação de como o fogo se propaga em um ambiente com o 
material que revestia a boate foi simulada. Tais meios se referem ao imediatismo e 
ao sensacionalismo midiático que transformam a notícia em informação como meio 
de adquirir audiência e furos jornalísticos. 
A Tragédia da Boate Kiss tornou-se um episódio marcante, já que além de 
promover a comoção pública por conta propriamente dos fatos em si, ademais entra 
para a memória do jornalismo brasileiro pelas particularidades da sua cobertura, 
como o interagendamento com as redes sociais. 
É notório que em tempos de tecnologia avançada, a instanteidade dada às 
notícias e as ferramentas que atribuem “poder” aos internautas, tornam-se fatores 
primordiais para a dissipação dos mais distintos fatos noticiosos. Se as redes sociais 
nascem com o intuito de viabilizar as relações humanas, por sua vez, com o advento 
das redes sociais digitais, os vínculos humanos deixam de ser propriamente físicos e 
ganham um novo tipo de status relacional, o ciberespaço, também conhecido como 
ambiente virtual. 
No caso da Boate Kiss, os meios de comunicação não apenas 
desempenharam papel para o convívio virtual, mas contribuíram na diversidade de 
conteúdo disposto sobre o ocorrido. Considerando-se alguns aspectos fundamentais 
acerca do episódio, por exemplo, o fato de ser uma cidade interiorana, o horário, o 
dia, a quantidade de vítimas fatais. 
Os celulares e smartphones registraram os mais diversos momentos 
daquela tragédia. Enquanto algumas somente fizeram gravações tidas como 
“amadoras”, outras optaram pelas redes sociais como instrumento tanto de obter 
cliques ou likes quanto de serem elementos propagadores de fatos, gerando um 
verdadeiro reality show da vida real. 
A abertura do Fantástico daquela data foi um composto de imagens dos 
instantes iniciais do pós-incêndio. Com apelo emotivo forte que emocionaram uma 
sociedade e que posteriormente influenciariam no desaforamento do caso para 
Porto Alegre e na opinião emitida pelo Conselho de Sentença. 
Segundo Kleber professor da Universidade de Santa Cruz do Sul enaltece à 
dimensão política entrelaçada ao acontecimento trágico que vitimou 242 jovens, e 
feriu outros tantos, numa noite que seria de festa. 
Dessa forma o professor de processo penal da PUCRS, Felipe Oliveira em 
entrevista para o site G1 sustenta que independentemente dos desdobramentos, 
este tribunal de júri já causa impactos na justiça brasileira. A decisão oriunda do 
julgamento terá peso muito grande em termos históricos. Um fatoextremamente 
triste e que entra para a história do judiciário. 23 
O advogado Fabiano Clemente em entrevista para o mesmo site fundamenta 
dolo eventual como uma terminologia para quando os acusados sabem que suas 
ações podem causar a morte e, mesmo assim, assumem este risco. Ele pratica uma 
ação, prevê a ocorrência do resultado e assume o risco, se desimportando do que 
vier a acontecer. Se costuma dizer que, no dolo eventual, o sujeito está indiferente.24 
 
23
 BECK, Matheus. Especialistas explicam o tribunal do júri da boate Kiss: 'Já entrou para a 
história jurídica do Brasil'. G1. Rio Grande do Sul. 2021. Disponível em: https://g1.globo.com/rs/rio-
grande-do-sul/noticia/2021/11/29/especialistas-explicam-o-tribunal-do-juri-da-boate-kiss-ja-entrou-
para-a-historia-juridica-do-brasil.ghtml. Acesso em: 05/01/2022. 
24
 BECK, Matheus. Especialistas explicam o tribunal do júri da boate Kiss: 'Já entrou para a 
história jurídica do Brasil'. G1. Rio Grande do Sul. 2021. Disponível em: https://g1.globo.com/rs/rio-
grande-do-sul/noticia/2021/11/29/especialistas-explicam-o-tribunal-do-juri-da-boate-kiss-ja-entrou-
para-a-historia-juridica-do-brasil.ghtml. Acesso em: 05/01/2022. 
 
https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2021/11/29/especialistas-explicam-o-tribunal-do-juri-da-boate-kiss-ja-entrou-para-a-historia-juridica-do-brasil.ghtml
https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2021/11/29/especialistas-explicam-o-tribunal-do-juri-da-boate-kiss-ja-entrou-para-a-historia-juridica-do-brasil.ghtml
https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2021/11/29/especialistas-explicam-o-tribunal-do-juri-da-boate-kiss-ja-entrou-para-a-historia-juridica-do-brasil.ghtml
https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2021/11/29/especialistas-explicam-o-tribunal-do-juri-da-boate-kiss-ja-entrou-para-a-historia-juridica-do-brasil.ghtml
https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2021/11/29/especialistas-explicam-o-tribunal-do-juri-da-boate-kiss-ja-entrou-para-a-historia-juridica-do-brasil.ghtml
https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2021/11/29/especialistas-explicam-o-tribunal-do-juri-da-boate-kiss-ja-entrou-para-a-historia-juridica-do-brasil.ghtml
O fato é que a literatura e a ficção por vezes se tornam realidade. Nos livros 
de romance policial, muitas vezes, a narrativa se confunde com casos cotidianos, 
que se acompanha pelas páginas de jornais e redes de TV. Uma mídia que incita, 
entra na casa das pessoas, coloca a sua versão dos fatos sem a devida 
preocupação com os aspectos legais do crime. A busca pela audiência é incessante, 
e assim os meios de comunicação não poupam esforços para tornar um fato real em 
um roteiro novelístico. 
Dessa forma o jurista e professor da de Direito da Unisinos, Lênio Streck, 
não teve dúvidas: os quatro réus que respondiam por homicídio simples com dolo 
eventual no caso da boate Kiss seriam condenados. “É crônica de uma condenação 
anunciada”, afirma.25 
Streck deixa claro que sua opinião quanto ao desfecho não implica que seja 
favorável ou contrário à sentença proferida pelo juiz Orlando Faccini Neto, que 
presidiu o júri. Reforça que se dá em termos de constatação, percepção e 
experiência. “Esse é um caso que envolve todas as condições adversas da 
natureza, é o julgamento mais triste e mais dramático da história brasileira”.26 
Ribeiro em artigo para o âmbito Jurídico enfatiza que a condenação não 
deriva de fatores especulativos a cerca do caso, entendendo que a sentença causou 
revolta até mesmo nos meios de comunicação, visto que os veículos de 
comunicação não conseguem na boate Kiss, fazer o mesmo “estardalhaço” que foi 
visto no caso dos irmãos Cravinhos (que executaram o assassinato aos pais de 
Suzane Von Richtofen, planejado pela filha do casal) ou do caso Nardoni (em que o 
pai e a madrasta da menina Isabela Nardoni, então com cinco anos, foram 
condenados pela morte da criança, jogada do sexto andar de um edifício em São 
Paulo). “O caso da boate Kiss é difícil de lidar, é uma tragédia que intimida, como se 
fosse um holocausto, é constrangedor para o ser humano”. Para o autor “o conceito 
de sociedade de espetáculo não se aplica num caso dessa dimensão.”27 
 
25
 RIBEIRO, Roberto. Julgamento da boate Kiss foi crônica de uma condenação anunciada”, diz 
jurista. Âmbito Jurídico. 2021. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/uncategorized/boate-kiss-
leniostreck/. Acesso em: 05/01/2022. 
26
 RIBEIRO, Roberto. Julgamento da boate Kiss foi crônica de uma condenação anunciada”, diz 
jurista. Âmbito Jurídico. 2021. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/uncategorized/boate-kiss-
leniostreck/. Acesso em: 05/01/2022. 
27
 RIBEIRO, Roberto. Julgamento da boate Kiss foi crônica de uma condenação anunciada”, diz 
jurista. Âmbito Jurídico. 2021. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/uncategorized/boate-kiss-
leniostreck/. Acesso em: 05/01/2022. 
 
https://ambitojuridico.com.br/uncategorized/boate-kiss-leniostreck/
https://ambitojuridico.com.br/uncategorized/boate-kiss-leniostreck/
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https://ambitojuridico.com.br/uncategorized/boate-kiss-leniostreck/
https://ambitojuridico.com.br/uncategorized/boate-kiss-leniostreck/
https://ambitojuridico.com.br/uncategorized/boate-kiss-leniostreck/
A maioria das vítimas eram estudantes, quase na totalidade da UFSM, 
Universidade Federal de Santa Maria, que interrompeu todas as suas atividades 
acadêmicas até o dia 1º de fevereiro de 2013. Até 31 de janeiro, 143 pessoas 
estavam hospitalizadas com pneumonite química na cidade, com mais de 70 em 
condições críticas. Esta patologia é gerada pela inalação de vapores tóxicos e 
resulta na falta de ar, muitas vezes levando a vítima à morte. Progressivamente o 
número de internados crescia, pois os sintomas levam horas para aparecerem. O 
estresse pós-traumático das vítimas foi outra sequela tardia do ocorrido. 
Inúmeros boatos surgiram nas redes sociais do tipo teoria da conspiração. 
Alguns postaram sobre o Holocausto, pois havia a coincidência das datas de 27 de 
janeiro, data da tragédia gaúcha e de homenagens às vítimas do holocausto. 
Alegavam que teria sido um evento premeditado. Para justificar tais alegações 
internautas juntaram vários indícios para fundamentar sua teoria, como: caveira em 
chamas no cartaz da festa; Die Young, a última música executada; uma 
sobrevivente disse ter visto uma mulher de vermelho sorrindo; as portas foram 
lacradas pelos seguranças; só um dos membros da banda morreu; a banda teria 
anunciado o incêndio no Facebook, antes do show, em um post, que após foi 
removido, meras insanidades. 
Dessa forma pode-se afirma que a efetividade do clamor público, obrigava o 
judiciário a tomar alguma atitude, pois a imprensa atribuiu a culpa ao legislativo, por 
deixar defasar as leis, entretanto é preciso a compreenção de que a defasagem das 
leis já vem de longa data, mas é preciso que os operadores do direito analisem o 
caso concreto, emitam fundamentações, sejam imparciais, interpretem os pontos 
obscuros de parágrafos e incisos para prolatar uma sentença de cunho justo 
coerente e coeso para todas as partes envolvidas. 
O advogado Rubens Decoussau Tilkian, sócio do escritório Decoussau 
Tilkian Advogados em entrevista para o Migalhas sustenta ser tarefa fácil encontrar 
os limites da imprensa responsável, principalmente em situações de repercussão 
nacional e internacional, em que os chamados "furos jornalísticos" se sobrepõem ao 
dever e aos limites de transmitir informação. Nesse contexto, há nítida e inegável 
colisão de direitos fundamentais constitucionais; de um lado, o que protege a 
liberdade de expressão (inciso IV, do artigo 5º e artigo 220 da CR), sendo vedada a 
censura (§ 1º, art. 220 da CR) e, de outro, os direitos e garantias intrínsecosao 
indivíduo, a saber, a intimidade, a privacidade, a honra, a imagem e o nome (inciso 
V e X, do artigo 5º, da Constituição da República Federativa e artigos 11, 12 e 17, do 
Código Civil).28 
Frente ao poderio que adquiriu no mundo contemporâneo, a imprensa deve 
agir com a virtude da razão: a prudência. Precisa ser ética e limitar-se a veicular 
somente informação de interesse público, sem juízo de valor e sem qualquer caráter 
sensacionalista, esses últimos para simplesmente atrair a curiosidade popular e 
prestigiar o interesse econômico em detrimento dos valores básicos que sustentam 
um Estado democrático de direito. 
A mídia com objetivo de alcançar audiências cada vez maiores veicula o 
crime e a violência de um modo recorrente, como se fossem produtos à venda aos 
expectadores que, na lógica do comércio e da obtenção de lucro, tornam-se 
consumidores. Para vencer a forte concorrência do mercado, muitas vezes a mídia 
apela ao sensacionalismo ao informar a ocorrência de determinados crimes, 
impondo assim, um discurso criminológico fundamentado no medo, que é capaz de 
mexer com o lado emocional das pessoas. 
O contrato de informação midiática, é, em sua base, marcado pela 
contradição entre a finalidade de fazer saber, que deve buscar um zero grau de 
espetacularização da informação, satisfazendo a seriedade que se espera da mídia, 
ao produzir efeitos de credibilidade; e a finalidade de fazer sentir, escolhendo-se 
estratégias apropriadas à encenação da informação e satisfazendo a emoção ao 
produzir efeitos da dramatização. CHARAUDEAU (2012, p.12)29 
É evidente que o incêndio da boate Kiss jamais será esquecido, visto a 
inegável importância social, pública e familiar, um marco na história, que como no 
caso do Ed. Joelma e Andraus que alterou legislação e tecnologias na prevenção de 
incêndio na época. Este pareceu de proporções maiores, que os do passado, isto 
devido à globalização que os meios de comunicação a alcance de todos 
proporciona, notícia em tempo real, exarcebação de conteúdos, condenação pelos 
meios de comunicação que não são dotados de técnicas. 
 
28
 TIKIAN, Rubens Decoussau. Incêndio em Santa Maria/RS Advogado comenta os limites de 
atuação da imprensa em casos de grande comoção. Tragédia na boate Kiss serve de 
combustível para a cobertura maciça dos veículos de comunicação. Migalhas. 2013. Disponível 
em: https://www.migalhas.com.br/quentes/172048/advogado-comenta-os-limites-de-atuacao-da-
imprensa-em-casos-de-grande-comocao. Acesso em: 05/01/2022. 
 
29
 CHARAUDEAU, P. Discurso das mídias. São Paulo: Contexto, 2012. 
https://www.migalhas.com.br/quentes/172048/advogado-comenta-os-limites-de-atuacao-da-imprensa-em-casos-de-grande-comocao
https://www.migalhas.com.br/quentes/172048/advogado-comenta-os-limites-de-atuacao-da-imprensa-em-casos-de-grande-comocao
Fica evidente que a mídia, não só a local como a mundial, como sempre fez 
seu papel de polemizar ao máximo, apontar culpado e induzir o poder público a 
adotar medidas emergenciais como forma de solucionar e prevenir novos 
acontecimentos. Foi esta mídia a principal motivadora, da condenação de quatro 
réus, de quatro famílias e pior da espetacularização de milhares de vidas. 
E no final desta história, ocorreu a condenação de quatro réus, de quatro 
famílias, um rechaço ao DP que ficará na memória dos operadores do Direito que 
buscam a plenitude da defesa no Estado democrático de direito.

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