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Microbiologia|Izabel Feitosa SALMONELLA O gênero Salmonella pertence à família Enterobacteriaceae e consiste de bacilos Gram-negativos, não formadores de esporos, anaeróbios facultativos, geralmente móveis por flagelos peritríqueos. Quanto ao metabolismo, as salmonelas são capazes de utilizar o citrato como única fonte de carbono, não produzem oxidase, indol, acetoína; produzem catalase, sulfeto de hidrogênio (H2S), não hidrolisam ureia, mas descarboxilam lisina e ornitina. Espécies e sorotipos A classificação atual divide o gênero em duas espécies: S. enterica e S. bongori. A partir do esquema de Kaufmann & White, podemos dividir as salmonelas em sorovares, tendo por base a composição antigênica das salmonelas com relação aos seus antígenos somático (O), flagelar (H) e capsular (Vi). Os antígenos O caracterizam os sorogrupos de Salmonella. Por esta razão, o mesmo antígeno O é comum a vários sorotipos de Salmonella. Só existe um tipo sorológico de antígeno Vi, sendo este antígeno encontrado apenas em três sorotipos de Salmonella (S. Typhi, S. Paratyphi C e S. Dublin). Os antígenos flagelares de natureza proteica podem ocorrer em duas fases, denominadas 1 e 2; a maioria das salmonelas possui flagelos de fase 1 e fase 2 (bifásicas). A mudança de uma fase para outra é explicada pelo funcionamento dos seus genes H1 e H2, responsáveis pela síntese dos flagelos de fase 1 e de fase 2, respectivamente. Fatores de virulência 1. FÍMBRIAS→ as salmonelas apresentam um grande repertório de fímbrias, as quais podem estar associadas à adesão em diferentes células epiteliais e possivelmente à matriz extracelular. As mais frequentes incluem: A. Fímbria tipo 1 B. Fímbria fina agregativa C. Fímbria plasmidial D. Fímbria longa polar 2. PROTEÍNAS EFETORAS SECRETADAS→ a Salmonella é capaz de injetar proteínas no interior de células eucarióticas, onde elas irão desempenhar diversas funções (apoptose das células, sobrevivência, multiplicação). A maioria destas proteínas são injetadas no citosol das células do hospedeiro por meio de dois sistemas de secreção do tipo III. O primeiro sistema, codificado pela ilha SPI-1, secreta proteínas efetoras que causam um rearranjo do citoesqueleto (actina), o que leva ao engolfamento da bactéria para o interior da célula. Após a invasão, a destruição das células M e dos enterócitos permite com que a bactéria entre em contato com os macrófagos residentes no tecido. Uma vez em contato com os macrófagos a proteína SipB é secretada, induzindo a piroptose (morte celular com inflamação) dessas células. O segundo sistema secreta proteínas efetoras que permitem a bactéria sobreviver e multiplicar nos macrófagos. Além destas, este sistema também secreta chaperoninas, proteínas reguladoras e as proteínas que fazem parte do translocon. 3. RCK (Resistance to complement killing) → a proteína de membrana externa que interfere com a formação do MAC (membrane attack complex), constituído pelas proteínas C5b-C9, fazendo com que a Salmonella resista à ação do sistema complemento. 4. LIPOPOLISSACARÍDEO→ protege a bactéria da ação letal de defensinas e também do complemento. Devido às longas cadeias laterais do antígeno O, a membrana interna da bactéria não consegue ser alcançada pelo MAC. 5. ENZIMA SUPERÓXIDO DISMUTASE→ essa enzima tem a função de interceptar formas reativas de oxigênio produzidas pela resposta imune inata do hospedeiro. Ela cataliza a formação de peróxido de hidrogênio a partir do superóxido; hidroperoxidases, oxido-redutases e a indução de sistemas de reparo. 6. ANTÍGENO Vi→ consiste no principal antígeno de superfície de S. Typhi, protegendo a bactéria dos mecanismos da imunidade inata do hospedeiro. Por meio da cápsula, ele impede a opsonização mediada por anticorpo e aumenta a resistência da salmonela à ação do sistema complemento. 7. FLAGELINA→ foi demonstrado recentemente que a flagelina das salmonelas estimula a secreção de IL-8 pelas células epiteliais. Esta ação se manifesta depois que a proteína entra na célula, sendo injetada por um sistema de secreção semelhante ao tipo III. Todavia, a presença de flagelinas também aumenta a capacidade de locomoção das bactérias, conferindo-lhes maior poder de invasão. de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas Microbiologia|Izabel Feitosa 8. ShdA (shedding)→ produto do gene shdA, é uma proteína de superfície que se liga à de fibronectina (proteína da Matriz extracelular- MEC), o que é importante para o processo de adesão e colonização do ceco, além da excreção prolongada da Salmonella nas fezes. O gene shd está presente no cromossoma dos sorotipos de S. enterica subespécie I, mas ausente dos sorotipos das demais subespécies e de S. bongori. Determinantes genéticos dos fatores de virulência Os genes de virulência das salmonelas podem ser cromossômicos e plasmidiais, o que determina uma maior ou menor virulência. Nos plasmídeos, há genes que conferem um aumento no crescimento intracelular da bactéria, resistência ao sistema complemento (proteína Rck), citotoxicidade para macrófagos. Mas a maioria dos genes de virulência são cromossômicos e estão localizados em ilhas de patogenicidade (SPI-1, SPI-2, SPI-3, SPI-4 e SPI-5), importantes para codificar fatores de virulência envolvidos na invasão da célula hospedeira, sobrevivência, replicação. De modo geral, a expressão de vários genes de virulência é multifatorial e regulada por fatores impostos ao patógeno nos microambientes do hospedeiro. Entre as condições ambientais que afetam a capacidade da Salmonella de invadir a célula hospedeira citam-se os níveis de oxigênio, osmolaridade, estado de crescimento bacteriano e pH. Por exemplo, em concentrações baixas de oxigênio S. Typhimurium é mais invasiva do que em anaerobiose. Patogênese De modo geral, a patogênese das infecções por Salmonella tem sido basicamente estudada com S. Typhimurium. Este sorovar geralmente causa uma gastroenterite autolimitada em adultos saudáveis. As salmonelas penetram no organismo por via oral, através da ingestão de alimentos ou água contaminada, ou ainda através do contato com um portador. A bactéria atravessa a barreira ácida do estômago e vai se localizar no íleo terminal e cólon, onde evade as múltiplas defesas do intestino, para ganhar acesso ao epitélio. A Salmonella possui uma resposta adaptativa de tolerância a ambientes ácidos que ajudam sua sobrevivência em ambientes como o estômago. Ao fazer contato com a mucosa intestinal, elas aderem ao epitélio por meio de suas fímbrias. As salmonelas podem mediar a invasão direta dos enterócitos, entretanto, elas parecem explorar preferencialmente as células M das microvilosidades intestinais. Estas células são especializadas na apresentação de antígenos a partir do lúmen intestinal, através de um processo de pinocitose. A partir das células M, ocorre um processo de transcitose e a salmonela atinge a região da submucosa, onde entra em contato com os fagócitos. O processo de invasão pode também ocorrer através das células dendríticas ou, ainda, por meio do rompimento das tight junctions que unem os enterócitos, direcionado a bactéria até a região da submucosa. O mecanismo de invasão celular envolve uma série de proteínas que são injetadas na célula epitelial por meio do aparelho secretor tipo III. Essas proteínas desestabilizam as tight junctions e o citoesqueleto de actina, formando ondulações na superfície da membrana da célula eucariótica, o que leva ao engolfamento da bactéria para o interior da célula. A desestabilização das junções celulares permite a transmigração de polimorfonucleares (PMNs) para a superfície apical e o escoamento do líquido paracelular, permitindo o acesso da bactéria à superfície basolateral. A salmonela endocitada passa então a residir e a proliferar dentro de um vacúolo, que consegue invadir a célula vizinha por meio de transcitose pela a membrana basolateral. Simultaneamente,ocorre o recrutamento e transmigração de fagócitos da submucosa para o lúmen intestinal. Este processo está associado com a produção de citocinas pró-inflamatórias (TNF-α e IL-8). Após atravessar o epitélio, a bactéria é engolfada pelos fagócitos, especialmente macrófagos. Uma vez em contato com macrófagos, a proteína SipB é secretada, induzindo a morte dessas células. Esta etapa é importante para a sobrevivência bacteriana, já que o recrutamento adicional de fagócitos facilita a sua disseminação através do sistema reticuloendotelial, atingindo órgãos, tais como, fígado e baço, onde a bactéria prolifera preferencialmente. Gastroenterite A gastroenterite é uma infecção aguda da mucosa intestinal, causada pelas salmonelas não tifoides. Em adultos sãos, é frequentemente chamada de intoxicação alimentar. Os pacientes apresentam febre aguda inicial, cólicas, dor abdominal, náuseas, de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas Microbiologia|Izabel Feitosa vômitos e diarreia com ou sem sangue, associada com uma inflamação do intestino grosso. A diarreia está associada à transmigração dos neutrófilos e destruição das camadas superficiais da mucosa, que ocorre a partir das interações da salmonela com as células epiteliais. A infecção humana por salmonelas não tifoides é limitada ao intestino (inflamação aguda), seguida de uma diarreia inflamatória autolimitada. Febre tifoide A febre tifoide (e paratifoide) é uma doença sistêmica invasiva causada exclusivamente pelos patógenos humanos S. Typhi e S. Paratyphi A e B. As manifestações clínicas incluem febre, dor de cabeça, dor abdominal, diarreia transitória ou constipação e a infecção pode levar a danos respiratórios, hepáticos, no baço e/ou neurológicos fatais. Trata-se de uma infecção sistêmica que se inicia na mucosa intestinal. Assim, após a adesão da bactéria à mucosa intestinal, por meio das fímbrias, ocorre a transcitose. Há invasão de macrógagos residentes, células da Placa de Peyer, linfonodos mesentéricos e a infecção se difunde. Todavia, na febre tifoide, praticamente não ocorre inflamação, o que explica a capacidade invasora da salmonela. A febre tifoide ocorre mais comumente em crianças do que em adultos, apresentando-se geralmente como uma febre prolongada (10 a 14 dias), dor de cabeça, desconforto abdominal e letargia generalizada. A bactéria se multiplica no baço e fígado, sendo em seguida liberada na corrente sanguínea levando a sintomas inespecíficos, tais como, calafrios, diaforese, tontura, anorexia, tosse, fraqueza, dor de garganta e dores musculares são frequentes antes do início da febre. Diagnóstico O método mais usado continua sendo a cultura com identificação posterior da colônia isolada. O sangue e secreções são geralmente semeados em meios líquidos e sólidos, como ágar sangue. As fezes devem ser sempre semeadas em meios seletivos inclusive cromogênicos (ágar MacConkey, ágar SS, ágar Eosina-Azul de Metileno, etc). A identificação dos sorovares envolve a utilização de antissoros específicos. Outros métodos de diagnóstico incluem provas sorológicas e a pesquisa direta da salmonela no material clínico por métodos imunológicos e moleculares. Tratamento e controle As infecções por Salmonella são geralmente autolimitadas. A administração de antibióticos no tratamento das gastroenterites nem sempre acelera a recuperação clínica, por outro lado, os antibióticos são recomendados para as salmoneloses com complicações sistêmicas. No caso das infecções por S. Typhi, o uso de antibióticos é primordial no tratamento dos pacientes com febre tifoide ativa e naqueles ditos portadores (vesícula biliar) e tem sido dificultado em função do crescente aparecimento de amostras resistentes a antibióticos. Deste modo, drogas como o cloranfenicol, sulfametoxazol-trimetoprim, ampicilina ou amoxilina têm sido substituídas, atualmente, pelas cefalosporinas de terceira geração e as fluoroquinolonas. Entretanto, a resistência a quinolonas já foi descrita em surtos e em casos endêmicos na Ásia. Além disto, a resistência transferível à cefalosporina de terceira geração, ceftriaxone, parece estar emergindo. A gastroenterite causada por S. Typhimurium pode ser evitada com o manuseio correto dos alimentos. Por outro lado, um esforço enorme tem sido feito para desenvolver uma vacina contra a febre tifoide. Epidemiologia O homem é o único reservatório natural de S. Typhi e S. Paratyphi A, B e C. Os maiores responsáveis pelas infecções de origem alimentar são S. Enteritidis e de S. Typhimurium. A transmissão da Salmonella para o homem geralmente ocorre pelo consumo de alimentos contaminados, embora a transmissão pessoa a pessoa possa ocorrer, particularmente, nos hospitais, ou ainda, através do contato com animais infectados, principalmente entre veterinários e trabalhadores de granjas e fazendas. Os produtos alimentícios de origem animal, como carne, leite e ovos, constituem os veículos mais comumente incriminados na transmissão desses micro--organismos para o homem. Outro mecanismo de transmissão para o homem consiste na contaminação através do contato com animais de estimação exóticos, tais como lagartos, cobras, salamandras, sapos, iguanas, além de tartarugas, patos e pintos. de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas de Lucas
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