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1 Referência: aula da prof. Aureliana Conceito São blastomas originados do epitélio de revestimento das vilosidades coriônicas (trofoblasto). Essa estrutura vai constituir o trofoblasto, que mais tarde iremos chamar de placenta. A imagem abaixo é para se ter uma ideia. Temos a placenta, que é um anexo obstétrico. Os anexos podem ser do ponto de vista embriológico e obstétrico. Quando falamos de placenta, estamos falando de anexo obstétrico. Do ponto de vista embriológico, quem dá origem à placenta é o cório frondoso. A placenta tem origem extraembrionária. A parte extraembrionária do óvulo vai formar o trofoblasto, que do ponto de vista embriológico é o cório. O cório frondoso, junto com uma membrana chamada de decídua basal, vai constituir a placenta. Aspectos epidemiológicos • 120 mil novos casos por ano • 10% a 20% evoluem para as formas persistentes (TTG – tumores trofoblásticos gestacionais). • Evolução fatal em 12 meses, se não tratada • Detecção precoce leva à indicação de tratamento com QT, em que se responde muito bem, com até 97% de cura, no caso das formas persistentes – tumores trofoblásticos. • Brasil: 1/275 gestações Nomenclatura 1. Classificação clínica da doença trofoblástica gestacional • Benigna: mola completa e mola parcial. • Maligna: tumores trofoblásticos gestacionais (mola invasiva, coriocarcinoma e tumor invasivo no sítio placentário). o Não metastática o Metastática A doença metastática pode ter um bom prognóstico ou mau prognóstico. 2. Síndromes trofoblásticas • Síndrome da Mola Hidatiforme o Síndrome da Mola Completa (MHC) o Síndrome da Mola Parcial (MHP) • Tumor Trofoblástico Gestacional (TTG) 2.1 Síndrome da Mola Hidatiforme A imagem abaixo mostra uma placenta com transformação molar – é um tumor. Perceba que existem vesículas ao invés de cotilédonos placentários e tecido esponjoso da placenta. É uma transformação total ou parcial do ovo em pequenas vesículas translúcidas, cheias de líquido claro. Quando a transformação ocorre em toda a placenta, chamamos de mola completa, se for só em uma parte, dizemos que é parcial. Histologicamente, temos anormalidades das vilosidades coriônicas, que consistem em graus variados de proliferação trofoblástica e edema do estroma viloso. Essas doenças trofoblásticas gestacionais benignas são comuns no primeiro trimestre, fazendo parte da síndrome hemorrágica do primeiro trimestre. Uma outra coisa que faz parte da síndrome da mola hidatiforme são os cistos tecaluteínicos dos ovários (20 a 90%). Pelo maior volume de tecido trofoblástico, haverá maior produção de HCG – quanto maior a massa, maior a 2 produção de HCG. Isso estimula o ovário, que responde produzindo cistos simples e anecoicos, mas às vezes bastante volumosos. 2.1.1 Mola completa É um ovo anômalo, destituído de embrião ou feto, caracterizado por perda de vascularização vilosa. A imagem acima mostra apenas placenta tomada por essa degeneração hidatiforme. Há uma hiperplasia trofoblástica generalizada. Todo o tecido é tumor. O cariótipo é diploide (tem que saber isso). Possui potencial de invasão local em 15% dos casos e disseminação à distância em 4%. A origem é androgenética, então tem apenas cromossomos paternos. Temos um ovo anucleado, na maioria das vezes, onde entra um espermatozoide 23X, mas que por algum motivo sofre processo de reduplicação, formando um embrião 46XX, porém só com carga paterna. Vai gerar uma mola homozigótica, que é a maior parte dos casos, Pode acontecer, com menos frequência, de em um ovo anucleado, sem carga genética, entrar um espermatozoide 23X junto com um 23Y ou um 23X com outro 23X. Se entrar dois 23X, vai dar um 46XX; se for um 23Y junto, fica 46XY, que vai ter a mola completa heterozigota. Na maioria das vezes, a carga cromossômica é 46XX (90% dos casos). Lembrando que é tudo paterno. 2.1.2 Mola parcial Temos uma parte de tumor e uma parte fetal. Vai haver um ovo anômalo, no qual permanecem elementos embrionários ou fetais e placenta exibindo vilosidades hidrópicas. O ovo é cromossomicamente alterado, então uma parte da placenta é placenta mesmo, mas a outra é toda hidrópica, cheia de vilosidades e vesículas. As alterações hidatiformes são focais e o cariótipo é triploide. Temos 2 “sets” de cromossomos paternos e 1 de cromossomo materno. O ovo não é mais anucleado. Forma zigoto triploide (69XXX, 69XXY, 69XYY). A origem, portanto, é diândrica. O ovo não é mais anucleado, pois tem carga cromossômica 23X. Dentro dele, entra um espermatozoide, que já pode estar duplicado (46XX ou 46XY), então o ovo fecundado é 69XXX ou 69XXY. Esse processo é o mais comum, sendo denominado “diandria”, mas também é possível haver “dispermia”. Este último ocorre quando um óvulo 23X é penetrado por dois espermatozoides, cada um com sua carga, formando um zigoto triploide. Aspectos anatomopatológicos 1. Macroscopia 1.1 Mola completa • Vesículas com aspecto em “cachos de uva” • Ausência de embrião ou feto • Cistos tecaluteínicos 3 1.2 Mola parcial • Vesículas e vilos normais • Presença de embrião, feto ou cavidade amniótica Acima, temos: (M) massa tumoral com transformação hidrópica, contendo vesículas, (A) feto e (P) placenta normal. 2. Microscopia 2.1 Mola completa • Degeneração hidrópica e edema do estroma viloso generalizados; • Ausência de vasos sanguíneos nas vilosidades tumefeitas; • Proliferação do epitélio trofoblástico em grau variável; • Ausência de feto ou âmnio. 2.2 Mola parcial • Degeneração hidrópica e edema do estroma viloso localizados; • Proliferação do epitélio trofoblástico focal; • Presença de tecido embrionário ou fetal. Diagnóstico 1. Quadro clínico • Hemorragias precoces, indolores, contínua ou intermitente, repetitivas e progressivas: é diferente do sangramento do abortamento, em que a paciente tem a dor de contração. • Dor lombar contínua • Hiperêmese: lembrar que o HCG está bem alto, então é um estímulo para a formação de uma massa trofoblástica muito grande. Pode abrir o quadro com hiperêmese. • Sialorreia e emagrecimento • Hipertensão: pré-eclâmpsia (aumento da pressão e proteinúria). Normalmente, dá diagnóstico de pré-eclâmpsia nas 20-22 semanas, mas nesse caso, o diagnóstico é mais precoce. • Cistose ovariana • Hipertiroidismo (tireotoxicose): o HCG tem uma fração muito parecida com o TSH, podendo o organismo interpretar errado. • Embolização trofoblástica: muito raro de acontecer, mas uma vesícula dessa pode invadir o vaso materno, levando à formação de êmbolos. • Eliminação espontânea de vesículas: acontecia mais antigamente, hoje em dia não mais, porque o diagnóstico é bem mais precoce. 2. Exame físico • Palpação: útero aumentado de volume – não compatível com a IG, ausência de partes fetais. • Ausculta: pode achar ou não, dependendo se é completa ou parcial. • Toque: cérvice extremamente amolecida e formação precoce do segmento inferior; fundo de saco anterior proeminente (porque o útero está mais cheio do que o esperado). 3. Exames complementares 3.1 Dosagem da gonadotrofina coriônica: é dosagem diagnóstica e prognóstica. O nível sérico é maior que o esperado para a IG, sendo o parâmetro mais importante para o acompanhamento pós-molar. Deverá ser realizado sempre no mesmo laboratório (porque há uma diferença 4 muito grande na leitura do hormônio entre os laboratórios). • O nível plasmático de hCG é diretamente proporcional à quantidade de tecido trofoblástico presente no organismo. 3.2 Ultrassonografia • Mola completa: cavidade uterina preenchida por imagem heterogênea; ausência de embrião/feto, saco amniótico e vesícula vitelínica; cistose ovariana. Esses pontos pretos na imagem abaixo, do lado esquerdo,são as vesículas. Na imagem direita, temos um ovário com grandes cistos dentro dele. Acima, grande massa ocupando o útero, contendo diversas vesículas anecoicas. Abaixo, do lado direito, cistose ovariana. Lembrar que a conduta do cisto ovariano não é cirúrgica, quando retira o tumor de tecido trofoblástico, os cistos regridem. • Mola parcial: córion frondoso espesso; vesículas na massa placentária; presença de embrião/feto, saco amniótico ou vesícula vitelina; cavidade amniótica com restrição de crescimento intrauterino; malformações fetais múltiplas (triploidia). A placenta tem que ser uniforme, porém a ultrassom abaixo mostra vesículas nela. Além disso, também é vista uma parte embrionária. Na imagem anterior, o cursor da professora mostra exatamente uma área de cavidade amniótica bem ao lado da placenta cheia de vesículas (degeneração hidrópica). 4. Resumo do diagnóstico: anamnese, exame físico, títulos de hCG sérico, USG transvaginal com doppler. Pensando em metástases, pede raio-x de tórax, TC ou RNM de crânio, tórax abdome e pelve. Sangramento ou vômitos excessivos no primeiro trimestre são indicações de USG. Esse quadro clínico sugere diagnóstico de mola, gestação múltipla ou anomalia fetal. • Pacientes com sangramento de primeiro trimestre, beta-hCG e com muitos vômitos = pensar em MOLA. • Sem BCF ou hCG > 80000 UI/ml = MOLA. 5 Tratamento • Esvaziamento: AMIU, curetagem. • Histerectomia: pacientes com prole constituída, não deseja tratamento clínico. • Imunoglobulina anti-Rh: se paciente Rh negativo com parceiro Rh positivo ou desconhecido. Seguimento • Dosagem de hCG semanal: faz até os níveis do hormônio se tornarem indetectáveis. Pede duas amostras com intervalos semanais. • Dosagem de hCG mensal durante 6 meses: quando se torna indetectável. • Dosagem de hCG a cada 2 meses por mais 6 meses. O ideal é que a mulher não engravide durante o período de seguimento, para não confundir com recidiva. Para isso, ela deve fazer uso de contraceptivo confiável. Se a queda de hCG foi logarítmica, pode engravidar após 6 meses do seguimento. Se gestação, deve-se solicitar hCG e US precocemente. Após 6 semanas de fim da gestação, faz hCG novamente. Tumor trofoblástico gestacional O quadro clínico é praticamente o mesmo, exceto se a paciente apresentar metástases. 1. Mola invasora (corioadenoma destruens) Há um supercrescimento trofoblástico excessivo, que invade a parede do útero, até a camada de miométrio. Muitas vezes invade peritônio, paramétrio e abóbada vaginal. São localmente invasivos, com menor tendência a metástases à distância que o coriocarcinoma. • Macroscopia: vesículas invadindo o miométrio, nódulos violáceos intramiometriais ou metástases vilositárias à distância. • Microscopia: células trofoblástica entremeadas por fibras miometriais, manutenção do padrão viloso. 2. Coriocarcinoma Há predisposição do trofoblasto normal para crescimento invasivo e erosão dos vasos sanguíneos muito exagerada. É uma massa de crescimento rápido, invadindo músculos e vasos sanguíneos uterinos, causando hemorragia e necrose. As metástases se desenvolvem precocemente: pulmões (75%), vagina (50%), vulva, rins, ovários, cérebro, intestino. Os cistos tecaluteínicos estão presentes em até 1/3 dos casos. • Macroscopia: tumor vermelho escuro ou púrpura, irregular e friável. O útero fica com nódulos escuros e irregulares. No centro do nódulo, há necrose (em preto). Abaixo, à esquerda, tumor da vulva, por metástase de coriocarcinoma. À direita, tumor invadindo o colo uterino (descobre por biópsia). • Microscopia: hiperplasia de células trofoblástica (cito, sincício e trofoblasto intermediário), desorganização do padrão viloso, necrose e hemorragia central. 3. Tumor trofoblástico no sítio placentário Origina-se, obrigatoriamente, do sítio de implantação placentária após uma gravidez a termo ou um abortamento. 6 Histologicamente, células predominantemente citotrofoblásticas, e a coloração imuno-histoquímica revela muitas células produtoras de hLP (lactogênio placentário) e algumas de hCG. Lembrando que nos outros tumores, há produção apenas de hCG, esse aqui produz também o hLP. Os níveis de gonadotrofina são baixos. Esses tumores são relativamente insensíveis à quimioterapia, ao contrário de todos os outros tumores já vistos. Portanto, o prognóstico não é bom. • Quadro clínico: a hemorragia é o sinal mais comum, sendo um sangramento irregular, após puerpério imediato e associada à subinvolução uterina. A lesão metastática pode ser a primeira indicação (tosse, hemoptise, tumores vaginais ou vulvares). Doença metastática • Pulmonar (80%): no momento do diagnóstico, o acometimento pulmonar é visível em radiografias torácicas de 80% das pacientes com TTG metastático. Os sintomas envolvem dor torácica, tosse, hemoptise, dispneia ou lesão assintomática visível ao raio x de tórax. • Vagina (30%): os locais mais acometidos são fórnices e região suburetral. A paciente vai apresentar sangramento irregular ou corrimento purulento, com odor fétido (devido à necrose). As lesões são muito vascularizadas, havendo hemorragia quando biopsiadas. • Hepática (10%): demora no diagnóstico (descobre na doença avançada, pois não é muito comum haver metástase para fígado). Manifesta-se com dor epigástrica ou no quadrante superior direito. As lesões podem ser hemorrágicas, por ruptura hepática, levando à hemorragia intraperitoneal exsanguinante. • Sistema nervoso central (10%): ocorre na doença avançada e, geralmente, há acometimento pulmonar e/ou vaginal concomitante. A paciente apresenta déficits neurológicos focais agudos. Diagnóstico O reconhecimento da possibilidade de lesão é o fator mais importante no diagnóstico. • Determinação da gonadotrofina coriônica: platô de hCG em três semanas ou mais; aumento de mais de 10% por duas semanas ou mais; persistência de hCG detectável por 6 meses ou mais, após esvaziamento uterino; diagnóstico histológico de coriocarcinoma. • Evidência radiológica (metástase pulmonar) • Toda paciente que faz esvaziamento (mesmo que seja aborto), faz biópsia. Toda e qualquer curetagem deve ser enviada para estudo histopatológico. Manejo Depende de qual é o tumor e do estadiamento. • Exame clínico: avaliar metástase vaginal. • Título sérico semanal de hCG • Hemograma, coagulograma, ureia, creatinina, testes de função hepática. • Função tireoidiana • Estadiamento o Raio X de tórax o TC ou RNM de crânio: suspeita de metástase cerebral. o TC de fígado • Curetagem: se houver sangramento uterino. Pode ser negativa se a doença estiver invadindo parede. • Cintilografia: se doença persistente ou resistente à quimioterapia. Estadiamento I. Doença localizada no útero II. Tumor invade anexos e/ou vagina; não sai da pelve III. Metástase pulmonar IV. Metástase em qualquer outro local Fator de risco (OMS) vs. estadiamento (FIGO) 7 • Pontuação ≤ 6: doença de BAIXO risco. Indica monoquimioterapia. • Pontuação ≥ 7: doença de ALTO risco. Indica poliquimioterapia. Monoquimioterapia • Metotrexato o 0,4 mg/kg IM por 5 dias. Repetido a cada 2 semanas. o 1,0 mg/kg/dia IM, 4 doses; associado a ácido folínico 0,1 mg/kg/dia o 50 mg/m² IM semanal • Actinomicina-D o 1,25 mg/m² a cada 2 semanas. o 12 mcg/kg IV diariamente por 5 dias. Repetido a cada 2 semanas. o Pacientes com disfunção hepática. Poliquimioterapia • EMA-CO: etoposídeo, metotrexato, actinomicina- D, ciclofosfamida e vincristina. o Menor risco de toxidade que MAC (metotrexato, actinomicina, cytoxan). o Risco de leucemia o Ciclos são repetidos até remissão o Primeiro valor de hCG indetectável = 3 ciclos adicionais. • EMA-EP: etoposídeo, platinum.• EMA-PA: cisplatina, adriamicina. As pacientes devem esperar 12 meses após término da quimioterapia antes de engravidarem. A detecção precoce do TTG, seguida da adequada quimioterapia, promove a cura da doença, com preservação da capacidade reprodutiva. .
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