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2018 História e teoria da arquitetura, urbanismo e Paisagismo i Prof. Carla Wille Kielwagen Copyright © UNIASSELVI 2018 Elaboração: Prof. Carla Wille Kielwagen Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. 712 K47h Kielwagen, Carla Wille História e teoria da arquitetura, urbanismo e paisagismo I / Carla Wille Kielwagen. Indaial: UNIASSELVI, 2018. 193 p. : il. ISBN 978-85-515-0128-3 1.Arquitetura Paisagista. I. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. III aPresentação Caro acadêmico! Seja bem-vindo ao Livro de Estudos da disciplina de História e Teoria da Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo I, o primeiro de um conjunto de disciplinas que irá inseri-lo no universo da História e Teoria do curso de Arquitetura e Urbanismo. O repertório de ideias de um arquiteto e urbanista está profundamente ligado a sua curiosidade e espírito explorador. Uma das fontes mais ricas de ideias na profissão é sua própria história: conhecer a história das artes, da arquitetura, do urbanismo e do paisagismo, bem como as teorias desenvolvidas ao redor do mundo por diferentes autores de diversas correntes de pensamento, é tarefa contínua de qualquer profissional do espaço que esteja comprometido com a qualidade de sua própria produção projetual e/ou teórica. Por esta razão, os estudos desenvolvidos ao longo desta disciplina, e das duas disciplinas que dão sequência a ela, são fundamentais para uma compreensão ampla da problemática profissional de um arquiteto e urbanista. Este livro, de um modo geral, investiga tanto o surgimento da arquitetura ocidental, tratando principalmente das civilizações europeias da antiguidade clássica, quanto introduz o estudante ao universo da arquitetura, urbanismo e paisagismo não ocidentais, apresentando o surgimento da arquitetura na Ásia, principalmente na região do Oriente médio, e também no norte da África. A jornada da humanidade no Planeta Terra pode ser descrita a partir de diversos pontos de vista: antropológico, sociológico, ambiental, político e religioso são alguns exemplos de abordagens possíveis. Quando contamos a História de determinado lugar ou civilização, normalmente dispendemos mais energia a detalhar os aspectos que mais nos interessam. Este livro, particularmente, se ocupará de contar a história da origem da humanidade do ponto de vista de suas estratégias de ocupações territoriais, de suas organizações citadinas e modos de planejar, executar e habitar os espaços. Além disso, focará também nas manifestações artísticas dos povos ao longo da história, relacionando a Arte e a Arquitetura para melhor explicar os fenômenos de transformação da arquitetura, cultura e urbanismo das cidades. Para iniciar os nossos estudos, na Unidade 1, uma introdução ao surgimento da humanidade se faz necessária, para contextualizar o conceito de ‘abrigo’ e explicar o modo de pensar do homem primitivo, suas motivações e prioridades. Ainda nessa unidade, aborda-se as características das primeiras construções humanas, bem como o surgimento da arte. A unidade se desenvolve apresentando algumas das primeiras civilizações organizadas em cidades do planeta, concentrando-se na Mesopotâmia e no Egito neste primeiro momento. IV A Unidade 2, por sua vez, adentra o universo da Antiguidade Clássica principalmente na Europa, culminando em explanações detalhadas a respeito de duas das mais ilustres referências de Arquitetura até a atualidade: Grécia e Roma, bem como seus precursores e influências. A Unidade 3, por fim, quebra a cronologia que vinha sendo seguida até a Unidade 2, e explora a História da Arquitetura de algumas outras civilizações importantes para a formação do Arquiteto e Urbanista, como a islâmica, que se manifestou principalmente em diversos países do Oriente Médio, a Índia Antiga e países do sudeste da Ásia, e também a China e o Japão. Para finalizar, é importante que você, acadêmico, use de certa imaginação para bem compreender a arquitetura e o urbanismo que nos antecederam. É preciso saber colocar-se no lugar de nossos antepassados e fazer um certo esforço para pensar como eles. Não há possibilidades de uma boa compreensão desta arquitetura de tempos longínquos sem este esforço: julgar a arquitetura, a estética e os arranjos urbanos do passado utilizando nossos valores contemporâneos seria fatal ao objetivo inicial, que é compreender sua Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo. Portanto, mantenha a mente aberta e vamos começar! Bons estudos! Prof.ª Carla Wille Kielwagen V Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA VI VII UNIDADE 1 - AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA ................................ 1 TÓPICO 1 - PRÉ-HISTÓRIA: A IDADE DA PEDRA ....................................................................... 3 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 3 2 CONTEXTO HISTÓRICO .................................................................................................................. 4 3 PRIMEIRAS MANIFESTAÇÕES ARTÍSTICAS E CULTURAIS ................................................ 5 4 O ABRIGO E OS ASSENTAMENTOS NAS SOCIEDADES PRIMITIVAS ............................. 6 5 CONSTRUÇÕES MEGALÍTICAS .................................................................................................... 10 RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 15 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 16 TÓPICO 2 - PRIMÓRDIOS DA ARQUITETURA: MESOPOTÂMIA .......................................... 17 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 17 2 CONTEXTO HISTÓRICO .................................................................................................................. 17 3 MANIFESTAÇÕES ARTÍSTICAS E CULTURAIS NA MESOPOTÂMIA ............................... 19 4 NASCIMENTO DAS CIDADES E DA ARQUITETURA ............................................................ 22 4.1 POVOSSUMÉRIOS, ACADIANOS E NEOSSUMÉRIOS .......................................................... 23 4.2 POVOS BABILÔNICOS, HITITAS E ASSÍRIOS .......................................................................... 28 4.3 CIVILIZAÇÃO PERSA .................................................................................................................... 31 RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... 34 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 36 TÓPICO 3 - PRIMÓRDIOS DA ARQUITETURA: EGITO ............................................................. 37 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 37 2 CONTEXTO HISTÓRICO .................................................................................................................. 37 3 MANIFESTAÇÕES CULTURAIS E ARTÍSTICAS ........................................................................ 39 4 AS CIDADES E A ARQUITETURA DO EGITO ............................................................................ 42 4.1 MASTABAS E PIRÂMIDES ........................................................................................................... 42 4.2 TEMPLOS EGÍPCIOS ...................................................................................................................... 47 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 52 RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 55 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 57 UNIDADE 2 - ANTIGUIDADE CLÁSSICA: GRÉCIA E ROMA ................................................... 59 TÓPICO 1 - OS PRECURSORES DOS GREGOS ............................................................................. 61 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 61 2 CULTURAS EGEIAS ............................................................................................................................ 61 2.1 MINOICOS ....................................................................................................................................... 62 2.2 MICÊNICOS ..................................................................................................................................... 66 RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 71 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 72 sumário VIII TÓPICO 2 - O LEGADO DA GRÉCIA ............................................................................................... 73 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 73 2 CONTEXTO HISTÓRICO .................................................................................................................. 73 3 MANIFESTAÇÕES ARTÍSTICAS E CULTURAIS ........................................................................ 74 4 ARQUITETURA GREGA .................................................................................................................... 77 4.1 AS ORDENS CLÁSSICAS .............................................................................................................. 77 4.2 ARQUITETURA DA GRÉCIA ARCAICA ................................................................................... 79 4.3 ARQUITETURA DA GRÉCIA CLÁSSICA .................................................................................. 81 4.4 A ARQUITETURA DA GRÉCIA HELENÍSTICA ....................................................................... 83 5 CIDADES GREGAS ............................................................................................................................. 87 5.1 ATENAS ............................................................................................................................................ 88 5.2 CIDADES HELENÍSTICAS ........................................................................................................... 91 RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... 92 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 94 TÓPICO 3 - OS PRECURSORES DOS ROMANOS ......................................................................... 95 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 95 2 ETRUSCOS ............................................................................................................................................ 95 RESUMO DO TÓPICO 3 .....................................................................................................................100 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................101 TÓPICO 4 - O LEGADO DE ROMA ..................................................................................................103 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................103 2 CONTEXTO HISTÓRICO ................................................................................................................103 3 MANIFESTAÇÕES CULTURAIS E ARTÍSTICAS ......................................................................104 4 ARQUITETURA ROMANA .............................................................................................................106 4.1 ARQUITETURA DA REPÚBLICA ROMANA ..........................................................................108 4.2 ARQUITETURA DO IMPÉRIO ROMANO ...............................................................................113 5 CIDADES ROMANAS ......................................................................................................................118 5.1 POMPEIA ........................................................................................................................................119 5.2 ROMA .............................................................................................................................................121 ATIVIDADE COMPLEMENTAR .......................................................................................................124 RESUMO DO TÓPICO 4 .....................................................................................................................126 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................128 UNIDADE 3 - OUTRAS CIVILIZAÇÔES: ISLÃ, ÍNDIA, SUDESTE DA ÁSIA, CHINA E JAPÃO ..............................................................................................................................129 TÓPICO 1 - ISLÃ ...................................................................................................................................131 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................131 2 CONTEXTO HISTÓRICO ................................................................................................................1313 MANIFESTAÇÕES ARTÍSTICAS E CULTURAIS ......................................................................132 4 ARQUITETURA ISLÂMICA ............................................................................................................134 5 CIDADES ISLÂMICAS .....................................................................................................................142 RESUMO DO TÓPICO 1 .....................................................................................................................145 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................147 TÓPICO 2 - ÍNDIA ANTIGA E SUDESTE DA ÁSIA ....................................................................149 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................149 2 CONTEXTO HISTÓRICO ................................................................................................................149 3 MANIFESTAÇÕES ARTÍSTICAS E CULTURAIS ......................................................................150 4 ARQUITETURA .................................................................................................................................152 IX 4.1 TEMPLOS E MONUMENTOS HINDUS E BUDISTAS NA ÍNDIA .......................................153 4.2 ARQUITETURA BUDISTA E HINDUÍSTA NO SUDESTE DA ÁSIA ...................................157 5 CIDADES DA ÍNDIA ANTIGA ......................................................................................................160 RESUMO DO TÓPICO 2 .....................................................................................................................164 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................166 TÓPICO 3 - CHINA E JAPÃO .............................................................................................................167 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................167 2 CHINA ..................................................................................................................................................167 2.1 ARQUITETURA ............................................................................................................................169 2.2 PLANEJAMENTO URBANO CHINÊS ......................................................................................175 2.3 PAISAGISMO .................................................................................................................................178 3 JAPÃO ...................................................................................................................................................179 3.1 ARQUITETURA .............................................................................................................................180 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................186 RESUMO DO TÓPICO 3 .....................................................................................................................189 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................192 REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................193 X 1 UNIDADE 1 AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS Esta unidade tem por objetivos: • apresentar as origens da civilização humana, das cidades e o surgimento da arquitetura; • introduzir o acadêmico ao universo das reflexões teóricas acerca da Histó- ria da Arquitetura, do Urbanismo e do Paisagismo; • contextualizar e compreender as primeiras construções e assentamentos humanos do período pré-histórico; • contextualizar e compreender as principais características atreladas ao sur- gimento da Arquitetura e das cidades na antiga Mesopotâmia; • contextualizar e compreender as principais características atreladas à Ar- quitetura e às cidades do antigo Egito. Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – PRÉ-HISTÓRIA: A IDADE DA PEDRA TÓPICO 2 – PRIMÓRDIOS DA ARQUITETURA: MESOPOTÂMIA TÓPICO 3 – PRIMÓRDIOS DA ARQUITETURA: EGITO 2 3 TÓPICO 1 UNIDADE 1 PRÉ-HISTÓRIA: A IDADE DA PEDRA 1 INTRODUÇÃO O período que denominamos como pré-história inicia por volta de 35000 a.C. e se encerra em aproximadamente 3000 a.C., ao leste do Mediterrâneo, e depois de 2000 a.C. em partes da Europa ocidental. É chamado de pré-história justamente por tratar do período anterior ao surgimento da escrita, ou seja, um período no qual não se registravam, ainda, relatos sobre os acontecimentos e motivações dos homens e mulheres que habitavam a Terra. Na ausência de relatos por escrito, os historiadores e arqueólogos são obrigados a fundamentar suas conclusões em objetos, como cerâmicas e outros utensílios domésticos, normalmente fragmentados, encontrados em toda a Europa, Ásia e África. Atualmente, com as novas tecnologias, como a que utiliza carbono 14 radioativo para datação de objetos, é possível estabelecer com maior segurança uma linha do tempo para esses artefatos. Outras tecnologias também vêm sendo utilizadas e recentemente muitas novas descobertas foram feitas e antigas hipóteses revisadas. É possível que você, acadêmico, pense ser pouco produtiva a tarefa de estudar arquitetura e urbanismo dentro desse contexto tão arcaico dos primórdios da civilização, por pensar que arquitetura realmente interessante seja um feito recente, e que esta época de construções sem arquitetos nada tenha a lhe ensinar. Apesar disso, ao adentrar o universo das formações dos primeiros assentamentos humanos e cidades, torna-se impossível não perceber a relação entre as preocupações dos construtores pré-históricos e nós mesmos, e assim conseguimos perceber a origem das nossas escolhas quando se trata de habitar e de viver a cidade, escolhas estas que permearão toda a nossa jornada através da História da Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo. É, portanto, fundamental para nossos estudos que possamos compreender como tudo começou e o que nos levou a ser a espécie de construtores e modificadores do espaço natural que somos. UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA 4 2 CONTEXTO HISTÓRICO Em primeiro lugar, é importante estabelecer que o início da humanidade é marcado por condições sociais primitivas. A sobrevivência era o motor propulsor de qualquer atividade humana de então, e era em nome dela que se tomavam decisões sobre onde morar, como morar e como se organizar em grupo para conseguir alimentos, proteger-se das intempéries e evitar predadores. Por esses motivos, não existia propriamente uma ‘arquitetura’, tampouco existia esta palavra. O que ocorria era uma resposta humana a ambientes específicos em que as pessoas viviam, utilizando abrigos naturais (cavernas) ou construindo abrigos a partir de materiais disponíveis, com pouco ou nenhum planejamento e sem intenção de que fossem muito duráveis, como fazemos na contemporaneidade. Outro aspecto a se considerar é que esse período é temporalmente longo, são mais de 30 mil anos de História de desenvolvimento. Por outro lado, é uma época de mudanças lentas, portanto, aqui serão narrados apenas os acontecimentos mais notáveis relativos ao ponto de interesse deste livro, a Arquitetura. Para melhor abordar a pré-história e organizar seu estudo, os historiadores normalmente dividem a sua História em três períodos principais: o Paleolítico,o Mesolítico e o Neolítico. O Paleolítico, ou Idade da Pedra Lascada (aproximadamente 2.6 milhões - 10.000 a.C.), foi marcado pela habitação de cavernas, espaços que eram, muitas vezes, disputados com animais selvagens. As famílias ou agrupamentos humanos paleolíticos eram nômades, ou seja, estabeleciam-se em um local apenas até que suas fontes de alimentos se esgotassem, para então partir em busca de um novo local para habitar onde houvesse abundância de alimentos. Para se alimentar, caçavam animais, pescavam e coletavam frutos e raízes. Utilizavam instrumentos feitos de ossos e pedras, e tinham linguagem muito pouco desenvolvida. Apesar disso, foi ainda nessa época que surgiu a Arte Rupestre, mais conhecida como as pinturas nas cavernas, que podem ser consideradas uma forma de comunicação primitiva, que demonstrava as preocupações e anseios dos seres humanos. O Mesolítico, ou Idade Média da Pedra (aproximadamente 12.000 a 8.000 a.C.), foi um período intermediário quando grandes avanços foram alcançados em relação à segurança e à sobrevivência, por exemplo, o domínio do fogo. Este virou fonte de calor para proteger as pessoas no frio, possibilitou o cozimento dos alimentos, iluminação no período noturno, bem como a grande utilidade de espantar animais de presença indesejável. Outros grandes avanços foram a domesticação dos animais e o desenvolvimento da agricultura. A partir dessas mudanças surgiu a necessidade de habitações fixas e os seres humanos ganharam mais controle em relação à sua alimentação e modo de vida. TÓPICO 1 | PRÉ-HISTÓRIA: A IDADE DA PEDRA 5 Já o período Neolítico, também conhecido como Idade da Pedra Polida (aproximadamente 10.000 – 3.000 a.C.), foi marcado pelo desenvolvimento da metalurgia. Com a confecção de lanças, ferramentas e machados foi possível elevar o nível da caça e tornar a produção agrícola mais eficiente. Com excedentes de alimentos e a sedentarização, as comunidades cresceram e surgiu a necessidade de trocas com aldeias vizinhas, dando origem a um comércio primitivo. NOTA Sedentarização é quando um povo deixa de ser nômade, isto é, deixa de passar a vida mudando de lugar, para se fixar em local próprio. Esse processo é possibilitado a partir das práticas agrícolas. 3 PRIMEIRAS MANIFESTAÇÕES ARTÍSTICAS E CULTURAIS Por volta de 40.000 anos a.C., durante o período que chamamos de Paleolítico Superior, surgiram as primeiras manifestações artísticas de que se tem conhecimento, em forma de gravuras ou pinturas em paredes, tetos ou outras superfícies no interior de cavernas, mas foi apenas recentemente que pesquisadores puderam confirmar que essas pinturas tinham sua origem na Pré-história. A arte pré-histórica é denominada de Arte Rupestre, e é basicamente composta por representações gráficas, através de símbolos, sinais e outros desenhos, utilizando sangue de animais, extrato de folhas e fragmentos de rochas. As pinturas representavam nas paredes de cavernas, grutas ou rochedos, os eventos cotidianos vividos pelas pessoas da época: seus hábitos como danças, rituais, lutas corporais e, principalmente, a caça. Há estudos que indicam que a Arte Rupestre era dotada de um significado especial para o homem primitivo: acredita-se que eles pensavam que a representação de uma caça bem-sucedida se refletiria na realidade, atraindo um bom resultado. Além das pinturas, os artistas do Paleolítico Superior realizaram também trabalhos em escultura. Predominam nas estatuetas as figuras femininas de seios volumosos e ventre saltado. Muitos estudiosos atribuem a essas “vênus” paleolíticas certos fins ritualísticos relacionados à fertilidade feminina. Estudos etnológicos recentes sobre comunidades primitivas sugerem também que estas estatuetas possam ser representações de divindades ou espíritos protetores de animais e homens, que tinham o objetivo de assegurar o sucesso da caça. UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA 6 FIGURA 1 – PINTURA NA COVA DAS MÃOS, CAVERNA NA PROVÍNCIA DE SANTA CRUZ, ARGENTINA FONTE: Disponível em: <http://volubillis.hol.es/2016/01/02/empreintes-et-traces- magiques-monotypes/>. Acesso: 24 ago. 2017. FIGURA 2 – MULHER NUA (VÊNUS DE WILLENDORF), DE WILLE NDORF, ÁUSTRIA. 28.000–25.000 a.C. CALCÁRIO, 11,1cm. FONTE: Disponível em: <http://biomoreno.blogspot.com. br/2010/05/mulher-na-pre-historia.html>. Acesso: 26 ago. 2017. 4 O ABRIGO E OS ASSENTAMENTOS NAS SOCIEDADES PRIMITIVAS O homem paleolítico, por dezenas de milhares de anos, viveu sem a ciência da construção e a arte da arquitetura. Modificava apenas superficialmente o ambiente natural, já que se deslocava pelo território com frequência, como nômade. TÓPICO 1 | PRÉ-HISTÓRIA: A IDADE DA PEDRA 7 O ambiente natural, por sua vez, era bastante hostil e por ele desconhecido. Por isso, o sentido de ‘abrigo’ origina-se da necessidade de proteger-se do imenso mundo externo, seus predadores e mistérios. Os abrigos eram, naquele tempo, os lugares que a natureza oferecia: uma caverna natural, uma gruta, uma reentrância nas rochas ou algumas peles sobre uma estrutura de madeira. No início do século XXI é difícil imaginar um tempo em que o único arquiteto era Deus, ou os deuses, e em que as muitas raças que dividiam o mundo não tinham necessidade nenhuma de arquitetura – ou, pelo menos, não em sua imaginação consciente. Na verdade, havia espécies de insetos e pássaros que construíam casas mais refinadas do que as dos nossos antepassados caçadores e coletores. Apesar do que os teóricos europeus do século XVIII queriam nos fazer crer, as origens da arquitetura não tiveram nenhum início místico e não houve uma única maneira de construir abrigos, como casas ou locais de culto. A arquitetura surgiu da primeira moldagem consciente de lares, monumentos e cidades, há cerca de oito ou nove mil anos, ou, como disse o arquiteto alemão Ludwig Mies van der Rohe, “quando dois tijolos foram bem sentados juntos” (GLANCEY, 2001). Já o homem neolítico, mais conhecedor dos recursos oferecidos por aquele mesmo mundo hostil, não possuía mais apenas um abrigo natural, mas transformava o ambiente ao seu redor de acordo com um projeto humano. Os primeiros assentamentos da humanidade surgiram no leste europeu como um sistema de apoio à sobrevivência de núcleos familiares ou clãs (FAZIO, 2011). Se um grupo de pessoas viviam juntas era possível oferecer assistência mútua na coleta de alimentos, na caça, na divisão dos cuidados com crianças e na proteção de suas habitações, território e família contra possíveis inimigos e predadores. No planalto central da atual Ucrânia foram encontradas cabanas que datam de 14000 a.C., portanto as mais antigas das quais se tem notícia. A maior delas foi construída de ossadas de mamutes e toras de pinheiro, revestida de peles de animais. Tinha forma de cúpula e resquícios de uma fogueira central. Também foram recentemente descobertas cabanas revestidas de pele de cerca de 12000 a.C., próximo à cidade de Moscou. A maior delas, medindo por volta de 12,0 × 4,0 metros em planta baixa, possuía formato irregular, com três cones de galhos de árvores inclinados, aberta no topo para que a fumaça de três fogueiras pudesse escapar. Os sistemas estruturais utilizados nestas construções eram elementares, mas as funções das construções atendiam a diferentes necessidades, como abrigar famílias e animais domésticos, depositar alimentos produzidos para durarem uma estação completa, armazenar utensílios para o cultivo etc. A organização das aldeias neolíticas ficou recentemente mais evidente para os arqueólogos, como mostra a Figura 3. UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA 8 FIGURA 3 – PLANTA DA ALDEIA NEOLÍTICA DE HALLSTATT, NA ALEMANHA FONTE: Benevolo (2007) As escavações de sítios urbanos indicam que os agrupamentos maiores surgiram muito depois. A existência de assentamentos urbanos dependia de excedentes agrícolas, então seu surgimento ocorreu lentamente, emtempos diferentes, nas diversas partes do mundo. Duas das mais antigas comunidades urbanas de que se tem notícia foram Jericó, Israel (cerca de 8000 a.C.), e a cidade mercantil de Çatal Hüyük (6500–5700 a.C.), na Anatólia, parte da atual Turquia. Jericó era um assentamento murado, com uma muralha de pedra de até oito metros de espessura, abrangendo uma área de aproximadamente quatro hectares. As habitações eram cabanas circulares de barro com coberturas possivelmente cônicas. Os residentes eram agricultores e caçadores. Furos das estacas Traçado do recinto fortificado Alicerces dos muros Limite das escavações Fogueiras TÓPICO 1 | PRÉ-HISTÓRIA: A IDADE DA PEDRA 9 FIGURA 4 – RECONSTRUÇÃO HIPOTÉTICA DE JERICÓ, CERCA DE 7000 a.C. FONTE: Disponível em: <https://pt.slideshare.net/zeknust/o-surgimento-da- agricultura-e-do-estado>. Acesso: 17 nov. 2017. Çatal Hüyük não era tão protegida quanto Jericó. Era um denso agrupamento de habitações sem ruas. Os acessos às moradias se davam pelas coberturas, enquanto aberturas altas nas paredes serviam para ventilar os interiores. As paredes eram de tijolo de barro e a estrutura era de madeira. Entre as casas havia santuários sem janelas, contendo decorações com motivos de búfalos e estatuetas de mulheres. Essas representações parecem indicar que os temas da arte rupestre – caçadas e fertilidade – não foram abandonados por esta sociedade urbana primitiva. FIGURA 5 – PERSPECTIVA ARTÍSTICA DAS EDIFICAÇÕES, ÇATAL HÜYÜK, ANATÓLIA, CERCA DE 6500 - 5700 a.C. FONTE: Fazio (2011, p. 30) UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA 10 No oeste europeu, a transição entre os abrigos primitivos aos assentamentos urbanos se deu de forma um pouco mais lenta. Apesar disso, seguiu a mesma lógica: se antes as comunidades eram caçadoras/coletoras, posteriormente tornaram-se agrícolas e, portanto, fixaram-se em um local favorável e cresceram sob o comando de um rei-sacerdote. 5 CONSTRUÇÕES MEGALÍTICAS Outro tipo de construção surgiu no oeste europeu, utilizando grandes pedras (megálitos ou megalitos) assentadas no solo. Muitas dessas construções eram edificadas como túmulos para as classes mais altas da sociedade, e às vezes como observatórios astronômicos. Na Espanha e na França, ainda antes de 4000 a.C., eram construídos túmulos de alvenaria de pedra seca (assentada sem argamassa), com coberturas de abóbadas rudimentares. Um dos primeiros túmulos encontrados por arqueólogos data de 4200 a.C., e fica em Er-Mané, Carnac, na Bretanha - França. Assim como muitos outros monumentos funerários, esse foi estabilizado por uma camada de cobertura de terra. FIGURA 6 – TÚMULO MEGALÍTICO, ER-MANÉ, CARNAC, BRETANHA, FRANÇA, CERCA DE 4200 a.C. FONTE: Fazio (2011, p. 30) No território em que atualmente se localiza a Irlanda também foram encontrados muitos sítios arqueológicos de túmulos megalíticos. De acordo com os estudiosos do tema, as construções de túmulos comunitários parecem ter sido tanto uma manifestação de reverência pelos ancestrais quanto um modo de demarcar território, já que escolhiam para as construções quase sempre terrenos bem localizados e elevados. TÓPICO 1 | PRÉ-HISTÓRIA: A IDADE DA PEDRA 11 Algumas das câmaras mortuárias eram imensas e provavelmente levaram muitos anos para serem construídas. Isso porque a tecnologia disponível era a de ferramentas de cobre ou bronze para trabalhar as pedras, e não havia veículos com rodas ou animais de carga para o transporte das pedras. Ainda assim, seus construtores antigos organizaram uma força de trabalho suficiente para mover pedras que chegam a pesar cinco toneladas. Um bom exemplo é o túmulo com galeria funerária de Newgrange, no Condado de Meath, na Irlanda, edificado por volta de 3100 a.C. Uma colina de terra de 11 metros de altura cobre a câmara mortuária, assim o peso do solo dá estabilidade aos megálitos que a compõem. A fachada de pedra de Newgrange foi reconstruída pelos arqueólogos. Na imagem a seguir é possível observar a abertura retangular sobre a porta, abrindo caminho para a luz do Sol. As formas em espiral na pedra que bloqueia a passagem direta talvez representem o Sol. A antiga porta de pedra está visível à direita da abertura. A construção como um todo está cuidadosamente orientada para que, nos cinco dias junto ao solstício de inverno, a luz do Sol nascente entre pela porta e pela abertura retangular superior, se arraste pela passagem e ilumine a câmara mortuária por cerca de 15 minutos. FIGURA 7 – ENTRADA DO TÚMULO COM GALERIA FUNERÁRIA DE NEWGRANGE, CONDADO DE MEATH, IRLANDA, CERCA DE 3100 a.C. FONTE: Fazio (2011, p. 31) A construção de monumentos megalíticos também serviu a outros propósitos. De acordo com pesquisadores, algumas civilizações primitivas criavam também locais para realizar rituais ou cerimônias evocativas, funcionando como templos primitivos. UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA 12 A construção mais famosa da pré-história é megalítica e muito visitada por turistas na atualidade: Stonehenge, localizada na Planície de Salisbury, sudoeste da Inglaterra, de cerca de 2900 – 1400 a.C. FIGURA 8 – VISTA ATUAL DE STONEHENGE, PLANÍCIE DE SALISBURY, INGLATERRA, CERCA DE 2900 – 1400 a.C. FONTE: Fazio (2011, p. 33) Atualmente, sabe-se que houve, pelo menos, três fases de construção na obra de Stonehenge, nas quais círculos de pedra foram adicionados, e por vezes removidos, deixando marcações no solo. Em 2900 a.C. iniciou-se a primeira fase de construção, com a escavação de diques circulares concêntricos, enquanto um ângulo de visualização do horizonte, a nordeste, foi demarcado a partir do centro até chegar a uma pedra vertical pontiaguda chamada de Heel Stone. Somente 500 anos depois, cerca de 2400 a.C., 82 pedras de dolerita, pesando por volta de duas toneladas cada, foram trazidas de pedreiras das montanhas de Pressely, no País de Gales (mais de 300 km de distância do terreno), e erguidas em um anel duplo de 38 pares, com seis pedras extras definindo o eixo de acesso a nordeste. Mais tarde as pedras de dolerita foram removidas (suas marcações no solo são chamadas de furos Q e R). A terceira e última etapa de construção ocorreu com o transporte de 35 lintéis e 40 pedras sarcen, pesando por volta de 20 toneladas cada. Estas também foram erguidas formando unidades de três em três pedras (duas verticais e uma horizontal, fechando um pórtico ou trilito), distribuídas em forma de U. Muitos não acreditam ser possível que a humanidade, no estágio de desenvolvimento em que se encontrava, pudesse ter construído uma obra como Stonehenge. Uma série de teorias possíveis sobre o caso foram criadas, e muitas explicações alternativas à construção desta obra são debatidas com frequência ainda na atualidade. TÓPICO 1 | PRÉ-HISTÓRIA: A IDADE DA PEDRA 13 Apesar disso, experimentos recentes, como o transporte e a montagem de um trilito na escala de Stonehenge mostraram que seria possível executar esta obra naquele período com a força de 130 pessoas, usando alavancas e planos inclinados, um trenó, plataformas de madeira e cordas reforçadas. FIGURA 9 – PLANTA BAIXA, STONEHENGE, PLANÍCIE DE SALISBURY, INGLATERRA, CERCA DE 2900–1400 a.C. FONTE: Fazio (2011, p. 33) Não há divergências apenas a respeito do modo como Stonehenge foi construída. Os pesquisadores também diferem em opinião a respeito da função da construção, ou seja, de que modo as pessoas a utilizavam. Uma das explicações mais acatadas como verdade provém do arqueoastrônomo Gerald Hawkins, que procurou demonstrar que Stonehenge era um grande observatório para se determinar os solstícios (fazendo surgir o calendário anual) e prever eclipses lunares e solares. Independente da falta de consenso a respeito de como ocorreu a edificação dessa obra e para que servia, ela representa o ápice da capacidade de construção e observação científica da pré-história, sendo provavelmente seu maior símbolo.Heel stone Avenida Círculo de pedras sarcen Furos Q e R (localização das doleritas) Colina sul Trilitos Furos Y Furos Z Furos Aubrey Colina norte Dique UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA 14 FIGURA 10 – TRILITO DE STONEHENGE FONTE: Disponível em: <http://www.esacademic.com/dic.nsf/ eswiki/1298751>. Acesso: 27 ago. 2017. NOTA Trilito - Pórtico de pedra formado por duas pedras verticais com uma terceira apoiada sobre elas. 15 Neste tópico, você aprendeu que: • A pré-história foi um longo período, anterior ao surgimento da linguagem escrita. No início da Idade da Pedra a humanidade era nômade e vivia de coleta e caça. Os agrupamentos humanos se moviam pelo território, portanto, não construíam seus abrigos para serem duráveis, muitas vezes utilizando cavernas, grutas e estruturas simples de madeira e peles como abrigo. • Enquanto o homem pré-histórico pouco modificava o ambiente natural e não construía ainda seus próprios abrigos, apenas utilizava o que estava à disposição na natureza, podemos dizer que ainda não existia a Arquitetura. • Com o desenvolvimento da agricultura primitiva surgiram os primeiros assentamentos humanos. As construções, embora simples, passaram a ser um pouco mais duráveis, construídas de ossadas de mamutes e toras de pinheiro, revestidas de peles de animais. • A Arte Rupestre é composta por representações gráficas, utilizando sangue de animais, extrato de folhas e fragmentos de rochas. As pinturas representavam nas paredes de cavernas, grutas ou rochedos, os eventos cotidianos vividos pelos povos pré-históricos. • Çatal Hüyük (6500–5700 a.C.), um dos primeiros assentamentos da humanidade, era constituído por um conjunto de casas aglomeradas, com pátios internos para iluminar e ventilar todos os cômodos e entrada pela cobertura. • No oeste europeu as construções megalíticas eram em sua grande maioria túmulos, por vezes observatórios astronômicos. Stonehenge é a obra mais famosa desse período, e há divergências entre os pesquisadores sobre o modo como sua construção foi realizada. RESUMO DO TÓPICO 1 16 1 Durante a Idade da Pedra, mais especificamente no período Neolítico, o homem desenvolveu novas técnicas e aprimorou sua forma de construir e passou a modificar mais intensamente o ambiente natural. O modo de vida que surgiu a partir destas transformações persistiu durante séculos, talvez milênios. Sobre este período, analise as afirmações a seguir e classifique-as como Verdadeiras ou Falsas: ( ) O monumento de Stonehenge, um dos principais registros históricos da arquitetura, é remanescente do período neolítico ou da pedra polida e localiza-se ao sul da Inglaterra, sendo integrado por menires, trilitos, dólmens e cromeleques, elementos formados por pedras na vertical sobre as quais são assentadas lajes. ( ) A cidade mercantil de Çatal Hüyük (6500–5700 a.C.), um dos primeiros assentamentos humanos do planeta, era constituída por um conjunto de habitações amontoadas com poucas passagens entre elas. As casas possuíam amplas janelas e para acessá-las descia-se uma escada a partir da cobertura. ( ) Ferramentas de ferro e bronze foram um dos motivos pelos quais os túmulos construídos pelo homem neolítico se tornaram cada vez maiores, e sua construção se tornou muito mais rápida. ( ) A existência de assentamentos dependia de excedentes agrícolas, para que então um povo pudesse se tornar sedentário. Seu surgimento ocorreu rapidamente em todas as partes do mundo assim que se desenvolveram técnicas agrícolas. Agora, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) F, F, V, V. b) ( ) V, F, F, V. c) ( ) V, V, F, F. d) ( ) F, V, V, F. AUTOATIVIDADE 17 TÓPICO 2 PRIMÓRDIOS DA ARQUITETURA: MESOPOTÂMIA UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO A linguagem escrita surgiu no Oriente Médio, onde hoje estão o Iraque e o Irã. Desenvolvida pelos sumérios por volta de 3500 a.C., gerou grandes transformações: uma nova era se iniciou para os seres humanos, que com esta nova ferramenta puderam iniciar o registro de sua cultura, suas ideias, religiões, descobertas e, claro, sua história. O local reservado para tão importante acontecimento, a antiga Mesopotâmia, é conhecido por suas terras férteis e está localizado entre dois rios: Tigre e Eufrates. É em torno da história destes rios que podemos montar um panorama do que foi a cultura da civilização mesopotâmica. Em torno de 3000 a.C., outro centro de civilização formou-se no nordeste da África, nas margens do Rio Nilo, no Egito. Os dois agrupamentos, o Egito e a Mesopotâmia, são denominados os berços da história e da arquitetura ocidental. Apesar de termos em nossa mente fortes referências relacionadas à Mesopotâmia, como as histórias judaico-cristãs de dilúvios e da Torre de Babel, pouco sabemos sobre o modo de vida daquela população, pois este não foi tão explorado pela literatura e cinema ocidentais, como as culturas egípcia, grega e romana foram. Além disso, atualmente, a região do Oriente Médio sofre com constantes conflitos. Por essas razões, fique atento para o que vem a seguir, e quem sabe ao fim deste tópico teremos uma melhor compreensão desta região e possivelmente veremos os acontecimentos recentes sob nova luz. 2 CONTEXTO HISTÓRICO A Mesopotâmia abarca uma área de aproximadamente 800 km de extensão e 480 km de largura. Ao Sul, faz fronteira com o Golfo Pérsico. UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA 18 O sistema fluvial Tigre-Eufrates, também chamado de Crescente Fértil, nos dias modernos, corresponde a aproximadamente a maior parte do atual Iraque e Kuwait, além de partes orientais da Síria e de regiões ao longo das fronteiras Turquia–Síria e Irã–Iraque. Os Rios Tigre e Eufrates correm para o golfo separadamente. O Eufrates tem sua nascente nas montanhas do leste da Turquia. O Tigre, mais a leste ainda, tem sua nascente no mesmo local, mas percorre um curso d’água mais rapidamente em função dos seus muitos afluentes nas montanhas de Zagros. Por essa razão, o Tigre era menos navegável e, portanto, preterido em relação ao Eufrates no que se refere aos assentamentos junto às suas margens. As primeiras civilizações organizadas em comunidades independentes na região da Mesopotâmia ficaram conhecidas como cidade-estado. Cidade- Estado é um agrupamento independente, que possui seu próprio governo. As cidades-estados se estabeleceram no local considerado mais apropriado, nas margens dos Rios Tigre e Eufrates. Além de ser um território quase plano, o Crescente Fértil, ao fim da Era Glacial, cobriu-se de uma vegetação rala. A planície era cultivável nas proximidades dos rios e suas nascentes. Lá cresciam, naturalmente, diversas plantas frutíferas. Além disso, o terreno plano favorecia as comunicações e as trocas de mercadorias. As culturas mesopotâmicas progrediram através da exploração de seus rios. Além de extrair deles o máximo possível, construíram nesses rios elaborados canais de irrigação, em que cultivaram plantações suficientemente abundantes para permitir o armazenamento de grãos excedentes. O suprimento de comida, relativamente estável e abundante, permitiu o crescimento das populações urbanas e o surgimento de um dos pontos-chave da urbanização, a especialização, ou seja, o surgimento de funções além daquelas relacionadas à alimentação. Os especialistas daquele período incluíam sacerdotes, mercadores, artesãos, artistas e arquitetos. O surgimento das especialidades deu margem para o desenvolvimento de diversos aspectos da humanidade presentes em nossa cultura até a atualidade. Com a ausência da preocupação constante de conseguir comida para garantir a sobrevivência, através da figura do sacerdote, desenvolveram-se as religiões e as noções de fé. Através do acúmulo de alimentos e o surgimento de sistemas de trocas e de mercadores, desenvolveu-se o comércio, e com isso, as noções de economia e de propriedade. O surgimento de artesãos, artistas e arquitetos, porsua vez, fez surgir o artesanato, a arte e a arquitetura, que em crescente refinamento e complexidade levaram o ser humano a iniciar uma busca pelo belo, bem como a expressar sua visão de mundo e de sua cultura. TÓPICO 2 | PRIMÓRDIOS DA ARQUITETURA: MESOPOTÂMIA 19 Na Mesopotâmia, os excedentes agrícolas eram controlados pelos governantes das cidades, que eram representações vivas do deus ou dos deuses locais. Administravam as terras, os despojos de guerra e as riquezas geradas a partir do trabalho da população; também registravam as informações e os números que dirigiam a vida das comunidades, defendiam o território dos inimigos através da construção de muralhas e criação de exércitos, bem como construíam templos para a adoração aos deuses. Foi nesse período, então, que se estabeleceu a relação hierárquica governante-governados, que é a base das nossas cidades até a atualidade. NOTA Segundo os autores da Bíblia, era no Crescente Fértil que se localizava o Jardim do Éden, pois o sistema fluvial irrigava o território de modo a formar uma paisagem exuberante, e de acordo com eles, esta era a aparência que o paraíso deveria ter. 3 MANIFESTAÇÕES ARTÍSTICAS E CULTURAIS NA MESOPOTÂMIA A escrita primitiva foi fundamental para o desenvolvimento das primeiras civilizações. Foi criada, em primeiro lugar, como uma forma de documentar e dar suporte às transações governamentais das primeiras comunidades. Com a linguagem escrita foi possível transmitir mais facilmente os conhecimentos de geração para geração, bem como possibilitou o nascimento da burocracia. A língua mais antiga de que se tem conhecimento é o sumério. Criada a partir de pictogramas simples, a escrita cuneiforme parece ter sido utilizada pela primeira vez por volta de 3100 a.C. O nome ‘cuneiforme’ é utilizado para referenciar tipos de escrita feitas com ajuda de objetos em formato de cunha, como é o caso do sumério. Posteriormente, surgiu o uso da escrita para o que chamamos de literatura. As primeiras histórias escritas narravam as lendas, conquistas e derrotas da civilização humana. Neste sentido, podemos dizer que ocorreu um grande avanço cultural. Uma das mais famosas obras literárias desse período é a chamada Epopeia de Gilgamesh. O herói dessa saga mesopotâmica foi possivelmente o rei da cidade suméria de Uruk no início do terceiro milênio a.C. A fama desse rei o tornou um deus após a morte, tendo sido tema de muitos poemas e narrativas. Na Epopeia, o deus Anu cria Enkidu como rival de Gilgamesh. Após lutarem, tornam-se amigos, em uma ambiguidade entre amizade e rivalidade, que pode ser percebida em muitas estórias posteriores, tornando-se tema comum às narrativas heroicas. UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA 20 FIGURA 11 – TÁBUA V DO ÉPICO DE GILGAMESH, EM ESCRITA CUNEIFORME. RECENTEMENTE DESCOBERTO. IRAQUE. 11 X 9.5 X 3 CM, ARGILA FONTE: Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:The_Newly _Discovered_Tablet_V_of_the_Epic_of_Gilgamesh._Meeting_Humbaba,_with_ Enkidu,_at_the_Cedar_Forest._The_Sulaymaniyah_Museum,_Iraqi_Kurdistan. jpg> Acesso: 29 ago. 2017. Em relação à civilização pré-histórica, pode-se dizer que os povos mesopotâmicos também realizaram um grande avanço em relação às outras manifestações artísticas, como a pintura, a escultura e o artesanato. De um modo geral, a arte mesopotâmica tinha como temas principais a história, a política, a religião, as forças da natureza e as diversas conquistas dos povos que habitaram o local até o século VI a.C., ou seja, até a conquista dos persas. Os materiais mais utilizados para a produção da arte mesopotâmica eram a argila, o adobe, a terracota, a cerâmica, o cobre, o bronze, o basalto, o ouro, a prata, o estanho, o alabastro, o junco, o marfim e, ainda, diversas pedras preciosas. Pelo fato de que a arquitetura mesopotâmica foi a mais desenvolvida das artes desse período, sendo marcada pela monumentalidade e imponência das formas, a escultura e a pintura possuíam quase sempre uma finalidade decorativa, ou seja, elas eram feitas para adornar os espaços arquitetônicos, os monumentos e os túmulos. Muitas pinturas e mosaicos eram produzidos para adornarem os exteriores e os interiores de templos e palácios. Utilizavam diversas cores (com maior incidência do preto, branco, vermelho e amarelo) e conchas em mosaicos para retratar sua realidade. Um bom exemplo desta refinada arte é o Estandarte de Ur, o mais antigo mosaico conhecido. Este foi encontrado ao sul da atual Bagdá, região onde se encontrava a antiga cidade de Ur. Estima-se que tenha aproximadamente 4500 anos. TÓPICO 2 | PRIMÓRDIOS DA ARQUITETURA: MESOPOTÂMIA 21 FIGURA 12 – ESTANDARTE DE UR. BAGDÁ. ATUALMENTE PARTE DA COLEÇÃO DO MUSEU BRITÂNICO. 21 CM DE ALTURA POR 50 CM DE COMPRIMENTO FONTE: Disponível em: <https://ahistoriadoseculo.org/2015/04/28/o-incrivel-estandarte- de-ur/>. Acesso: 29 ago. 2017. O artefato recebeu o nome de estandarte por supor-se que ficava no topo de um poste, como se fosse uma bandeira. A peça é de madeira e contém quatro painéis que retratam cenas do cotidiano sumério. Os dois maiores se destacam e receberam nomes de acordo com seus conteúdos. Um se chama Guerra, por trazer cenas de batalha; e o outro, chamado Paz, por retratar um banquete. Por fim, também podemos afirmar que a escultura mesopotâmica tinha como objetivo principal o ornamento dos espaços arquitetônicos. Assim como a pintura, seguia o padrão realista e/ou naturalista. Sua principal característica era a ausência de movimento, ou seja, as imagens eram rígidas, estáticas. Ainda que algumas fossem produzidas em pedra, a maioria delas era feita em argila, as quais retratavam seres humanos, mitológicos, animais e deuses, normalmente em uma vista frontal, em pé ou sentados. UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA 22 FIGURA 13 – ESCULTURA BABILÔNICA – A RAINHA DA NOITE FONTE: Disponível em: <https://www.todamateria.com.br/arte- mesopotamica/>. Acesso em: 29 ago. 2017. 4 NASCIMENTO DAS CIDADES E DA ARQUITETURA Com o estabelecimento das práticas agrícolas em um solo favorável, os povos da Mesopotâmia se fixaram e criaram as primeiras cidades e nelas ergueram moradias, templos, santuários e palácios permanentes. O nascimento da cidade foi, portanto, concomitante ao nascimento da arquitetura. De certo modo, já naquele período definiu-se um modo de vida urbano que perdura até a atualidade, ao qual frequentemente nos referimos como ‘civilização’. Esta palavra, inclusive, origina-se do latim civis, que significa cidadão ou habitante da cidade. De forma geral, a História da Mesopotâmia refere-se a um longo e conturbado período, no qual diversos povos, em momentos distintos, conquistaram territórios, construíram cidades e obras grandiosas de arquitetura que representaram o seu auge. As cidades-estados lutavam entre si para repartir a planície irrigada pelos dois rios, conflitos que limitavam o desenvolvimento econômico, situação muito similar à que vivemos hoje em dia em diversas partes do mundo. Para melhor compreender as diversas civilizações que se sucederam neste vasto e rico território, bem como relacioná-las a diversos acontecimentos e descobertas importantes para a humanidade, observe a cronologia no quadro a seguir: TÓPICO 2 | PRIMÓRDIOS DA ARQUITETURA: MESOPOTÂMIA 23 QUADRO 1 – CRONOLOGIA MESOPOTÂMIA Final da Idade da Pedra: 6000 - 5000 a.C. Invenção do arado e desenvolvimento da agricultura. 5000 a.C. Primeiras aldeias/ Cultivo de cerais/ Uso de cerâmica. Idade dos Metais: 3000 a.C. Início do período chamado 'Idade do Bronze'. Surgimento da escrita e do sistema de numeração. Civilização Suméria e as primeiras cidades. 2500 a.C. Sargão da Acádia unifica a Mesopotâmia/ Civilização Acadiana. 2000 a.C. Surgimento da civilização Assíria. Invasão dos Hititas. 1900 - 1200 a.C. Império Paleobabilônico. 1200 a.C. Fim da dominação assíria e do Reino Babilônico. 1100 a.C. Destruição doImpério Hitita. Reino de Nabucodonosor/ Início do Segundo Império Babilônico. Nasce o Reino de Israel. 700 a.C. O caos é instalado pelo território: 'Reino dos Medos'. 600 a.C. Na Babilônia: Reino de Nabucodonosor II. 550 - 331 a.C. Início do reinado persa. 331 a.C. Alexandre Magno derrota os persas e conquista a Mesopotâmia. FONTE: A autora 4.1 POVOS SUMÉRIOS, ACADIANOS E NEOSSUMÉRIOS Os responsáveis pela primeira civilização urbana do planeta, que existiu entre o período de 4000 até 2350 a.C., foram os sumérios. A Suméria tinha seu centro religioso e político dedicado a servir aos deuses inspirados em elementos naturais. Os sumérios também acreditavam que toda a sua existência era governada por esses deuses, que os sujeitavam a mudanças climáticas imprevisíveis e que por isso deveriam ser adorados e obter do povo sua completa fidelidade. Sabe-se que as cidades sumérias, no início do II milênio a.C., já eram bastante grandes, e surgiram ao redor de um núcleo de santuários e depósitos de alimentos. Os templos, muitas vezes monumentais, possuíam altares e nichos que continham estátuas. O território da cidade era dividido em propriedades individuais entre os habitantes, e o campo era administrado pelo governante em prol da coletividade, sempre com a ajuda das divindades. UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA 24 A cidade de Ur media cerca de 100 hectares e abrigava dezenas de milhares de habitantes. Era circundada por um muro e um fosso que, pela primeira vez, separava o ambiente da cidade, fechado, do ambiente natural. O campo ao redor da cidade também passa a ser transformado com as pastagens e pomares, bem como pelos canais de irrigação. Sendo assim, grandes mudanças na paisagem começam a ser realizadas por mãos humanas, pela primeira vez. Eridu, a cidade mais antiga, continha um templo que era inicialmente pequeno, mas que foi gradativamente sendo ampliado pelos sumérios. Por volta de 3800 a.C., o Templo de Eridu era significativamente maior, encontrava-se sobre uma plataforma e era formado por uma sala de altar retangular com câmaras laterais menores. Já a cidade de Tepe Gawra, ao norte, organizava-se ao redor de uma acrópole (parte mais alta da cidade) com dois templos, um santuário e habitações. Pilastras reforçavam as paredes de adobe da construção. NOTA Adobe - Tijolos secos ao sol, um material obtido facilmente colocando-se lama em moldes e deixando secar ao sol por várias semanas A maioria das edificações sumérias foi construída com paredes de adobe, ou seja, pouco resistentes ao clima. A consequência é que a maior parte das ruínas a que temos acesso hoje se resumem a fundações e partes inferiores de paredes. Apenas as edificações importantes eram construídas para ter mais durabilidade, e colocadas sob plataformas para elevá-las do solo. As plataformas também adicionavam uma certa formalidade às construções, como pode ser observado no Templo Branco, de Uruk (no atual território do Iraque), construído entre 3500 a 3000 a.C. TÓPICO 2 | PRIMÓRDIOS DA ARQUITETURA: MESOPOTÂMIA 25 FIGURA 14 – RECONSTRUÇÃO DA ACRÓPOLE, TEPE GAWRA, SUMÉRIA (IRAQUE), CERCA DE 3800 A.C. FONTE: Fazio (2011, p. 36). FIGURA 15 – VISTA DO TEMPLO BRANCO, URUK, MESOPOTÂMIA (IRAQUE), CERCA DE 3500–3000 A.C. FONTE: Fazio (2011, p. 36). Por volta de 2350 a.C., povos de linguagem semita conquistaram a civilização suméria. Eles eram oriundos das cidades de Sipar e Akkad – de onde veio o nome “acadiano”. De acordo com estudiosos, eram liderados por um rei militar e não apenas por uma classe de sacerdotes, como ocorria em outras civilizações. Sargão da Acádia foi o primeiro grande unificador da Mesopotâmia e seus feitos tiveram algumas consequências para as cidades. Uma das novidades foi a cidade-palácio, onde a estrutura dominante não era mais o templo, e sim o palácio do rei. Esta configuração foi repetida por outros reis ao longo dos séculos seguintes, fossem eles sumérios, assírios ou persas. UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA 26 O império acadiano perdurou por apenas 200 anos. Por volta de 2150 a.C. foram derrotados pelos gutis, um grupo de tribos advindas das regiões montanhosas do Irã. Quando a influência militar dos gutis diminuiu, um século depois, alianças políticas similares às existentes entre as primeiras cidades-estados sumérias voltaram a ocorrer, surgindo um período que pode ser chamado de Neossumério (2150 – 2000 a.C.). Nesta fase, as formas dos templos urbanos se desenvolveram, assim como a ideia de alocá-lo sob uma elevação, uma colina artificial escalonada chamada de Zigurate. Construídos, geralmente, com tijolos secos ao sol e solidarizados com betume, feixes de junco ou corda, os zigurates eram revestidos por um pano externo de tijolos cozidos, resistentes a intempéries. Sobre sua base retangular, o zigurate subia com muros inclinados para dentro numa série de plataformas sucessivas, terminando num templo alto, no topo. Uma escadaria central dava acesso ao templo. (Os elementos assim distribuídos no centro de uma forma simétrica e alinhados na direção de um mesmo ponto são conhecidos como axiais.) Os zigurates eram projetados para elevar os templos até os deuses, permitindo que esses descessem dos céus e garantissem a prosperidade da comunidade. Simbolicamente, o zigurate também pode ter representado as montanhas de onde os sumérios vieram. Para que os deuses se sentissem em casa nas planícies do vale aluvial, os sumérios e seus sucessores na Mesopotâmia talvez tenham buscado recriar seus antigos lares nas montanhas. A elevação do templo bem acima do vale também podia refletir o desejo de proteger o conjunto sagrado das enchentes; o certo é que dava a ele destaque visual em relação à cidade (FAZIO, 2011, p. 35). Um dos únicos exemplares deste tipo de construção que ainda conserva parte de seus detalhes de arquitetura é o Zigurate de Ur (cerca de 2100 a.C.). Templo dedicado a Nanna, deus da Lua, erguia-se acima de uma cidade com cerca de 350 mil pessoas como uma montanha artificial. O acesso ao topo era realizado por uma grande escadaria cerimonial central, e duas escadarias laterais. Observando a figura a seguir, podemos identificar suas três longas escadarias que conduzem à entrada. Sua forma é imponente, mesmo que os níveis superiores do templo hoje não passem de uma pilha de destroços. Calcula-se que a altura original era de mais ou menos 21 metros, com uma base de aproximadamente 60 x 45 metros. Há pesquisadores que sugerem que havia árvores plantadas em cada nível do zigurate, de modo que teria lembrado uma montanha decorada pela natureza. TÓPICO 2 | PRIMÓRDIOS DA ARQUITETURA: MESOPOTÂMIA 27 FIGURA 16 – ZIGURATE DE UR, MESOPOTÂMIA (IRAQUE), CERCA DE 2100 A.C. (PARCIALMENTE RECONSTRUÍDO NA DÉCADA DE 1980 PELO GOVERNO IRAQUIANO) FONTE: Imagem disponível em < http://www.barbuza.com/view.php>. Acesso: 31 Jan. 2018. Diferente dos complexos de templos grandiosos, as moradias das pessoas comuns eram bem mais humildes. Ficavam em bairros densos, como verdadeiros aglomerados de casas com poucas ruas, e seguiam uma lógica ortogonal, com tipologia composta por pátios internos que forneciam luz e ar a todos os cômodos ao seu redor. Até hoje são regularmente construídas casas dessa tipologia em cidades do Mediterrâneo e do Oriente Médio. FIGURA 17 – PLANTA DA CIDADE DE UR, MESOPOTÂMIA (IRAQUE), CERCA DE 2100 A.C, COM AMPLIAÇÃO DE ÁREA RESIDENCIAL Zigurate Muro em torno do recinto sagrado 500m 50m 1500 ft 150 ft Área residencial Área residencial Portão fortificado Muralha da cidade FONTE: Fazio (2011, p. 38) Para melhor compreender como funcionavam os aglomerados, observe a Figura 17. Na ampliação da área residencial, as áreas hachuradas (em cinza) representam os pátios internos e as ruas de acesso. UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA 28 É bastante notável o efeito labiríntico do conjunto residencial em contrastecom os amplos espaços abertos das outras áreas da cidade representadas na planta geral. Por outro lado, essa forma de ocupar o espaço garantia segurança e privacidade, pois as casas sempre se voltavam para seus pátios internos, e não para a rua. 4.2 POVOS BABILÔNICOS, HITITAS E ASSÍRIOS Em 1800 a.C. iniciou-se uma nova fase para a Mesopotâmia: a dinastia Amorita, da cidade-estado da Babilônia, dominou o território. O rei mais famoso desse período foi Hamurabi (1728–1686 a.C.). A ampliação de algumas cidades que se tornaram as capitais de impérios começou a ocorrer, sendo a Babilônia a primeira supercidade a surgir, de dimensão comparável às metrópoles modernas. Esta não era apenas onde se concentrava o poder político, mas também as rotas comerciais. Um dos mais famosos zigurates do mundo antigo é deste período, e por nós conhecido como Torre de Babel. Provavelmente foi a mesma edificação que conhecemos como Templo de Etemenanki, na Babilônia. A Torre de Babel teria sido uma estrutura escalonada, com sete níveis sobre uma base quadrada com 90 metros de lado. Relata-se que teria sido erguida acima do Palácio de Nabucodonosor. Este, por sua vez, ficou famoso pelos lendários Jardins Suspensos, uma das Sete Maravilhas do mundo antigo. Embora não saibamos a exata aparência destes jardins, inúmeros artistas ao longo da História se arriscaram a representá-lo, como no exemplo da próxima figura. Apesar da existência prévia de outras grandes cidades no Crescente Fértil, acredita-se que a Babilônia foi a primeira capital planejada no planeta. Era formada por um grande retângulo de 2500 por 1500 metros, e parece ter sido traçada com regularidade geométrica, já que as construções eram em ângulos retos, tanto os templos e palácios quanto as habitações, e as ruas de largura constante. A cidade era fortificada (no interior de muralhas), e se erguia em ambas as margens do Eufrates, que era cruzado por uma ponte que fazia parte de uma grande avenida que atravessava a cidade, o templo principal e o complexo palaciano. O portão de Ishtar marcava a entrada norte desta avenida, e era bastante decorado e colorido. Esse portão foi restaurado e encontra-se hoje no interior de um museu, em Berlim, tendo sido removido de seu lugar original. TÓPICO 2 | PRIMÓRDIOS DA ARQUITETURA: MESOPOTÂMIA 29 FIGURA 18 – IMAGEM CRIATIVA SOBRE OS EVENTUAIS JARDINS SUSPENSOS DA BABILÔNIA FONTE: Autor desconhecido. Disponível em: <http://edukalife.blogspot. pt/2013/02/17-hanging-gardens-of-babylon.html> Acesso em: 27 ago. 2017. FIGURA 19 – MAQUETE ELETRÔNICA DA CIDADE DA BABILÔNIA EM APROXIMADAMENTE 2000 a.C. FONTE: Disponível em: <http://www.kadingirra.com/babylon.html>. Acesso em: 23 nov. 2017. UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA 30 FIGURA 20 – O PORTÃO DE ISHTAR (RESTAURADO), BABILÔNIA (IRAQUE), 605 – 563 a.C. ATUALMENTE EM MUSEU EM BERLIM FONTE: Disponível em: <http://imrikzsofia.hu/a-civilizacio-bolcsoje-a-politeizmustol-a- monoteizmusig-kulturtorteneti-vazlat> Acesso em: 27 ago. 2017. Em 1830 a.C., os hititas subjugaram a Babilônia e dominaram o norte da Mesopotâmia. Mais ao sul, os assírios – também de linguagem semita – assumiram o comando e estabeleceram capitais em Calah (hoje chamada de Nimrud), Dur-Sharrukin (Khorsabad) e Nínive (Kuyunjik). As cidades fortificadas construídas para cada capital refletem as constantes preocupações com guerras e invasões de seus reis. Um bom exemplo das principais características da arquitetura e do planejamento urbano assírio foi Khorsabad, a cidade real construída por Sargão II, cerca de 720 a.C. O palácio de Khorsabad ocupava um platô a 15 metros acima do nível do solo. Um zigurate de base quadrada se elevava em sete níveis. O mesmo sistema de pátios internos para iluminar e ventilar cômodos ao seu redor foi utilizado no palácio. Imagens de touros com cabeças humanas em alto relevo decoravam as entradas do palácio. No interior, outros motivos em relevo representavam exércitos em marcha, conquistando territórios e saqueando cidades, enfatizando o poder assírio. Nota-se, claramente, nestas escolhas o uso da arte e da arquitetura para evidenciar o poder do governo, característica que se tornaria bastante comum, como iremos verificar na sequência em nossos estudos. TÓPICO 2 | PRIMÓRDIOS DA ARQUITETURA: MESOPOTÂMIA 31 FIGURA 21 – VISTA DO ALTO DA CIDADELA DE KHORSABAD, CIDADE FUNDADA POR SARGÃO II NOS ARREDORES DE NÍNIVE (721 – 705 A.C.) FONTE: Disponível em: <oi.uchicago.edu/research/projects/excavations-khorsabad>. Acesso em: 28 ago. 2017. DICAS Cidadela – é o nome dado a qualquer tipo de fortaleza ou fortificação construída em ponto estratégico de uma cidade, objetivando sua proteção. A cidadela, muitas vezes, inclui parcial ou totalmente um castelo ou palácio existente na cidade. Em relação às técnicas construtivas das civilizações mesopotâmicas, pode-se dizer que ainda eram bastante simples: paredes de adobe com pouco uso de madeira e pedra. Em termos de estruturas, a arquitetura ainda engatinhava, no sentido de que apesar de algumas construções terem sido grandiosas em termos de escala, eram pouco refinadas estruturalmente, tanto quanto as mais simples habitações. 4.3 CIVILIZAÇÃO PERSA Os persas fundaram o primeiro grande império do mundo, e chegaram em seu auge no ano de 539 a.C. Eram governados por Ciro II. Por volta de 525 a.C. já haviam expandido seu território por toda a Mesopotâmia, Ásia Menor e até o Egito. Em um espaço de tempo de um século, apenas a península grega escapou de sua dominação. UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA 32 A cultura dos persas era influenciada por todas as civilizações que subjugaram, característica que fica explícita na arte e na arquitetura, que continha elementos egípcios, hititas e esculturas de temática animal mesopotâmica, o início de uma ideia de fusão estilística. A arquitetura se tornou mais livre na forma, mais decorativa e um pouco mais leve a partir dessa mistura de identidades. As ruínas da cidadela de Persépolis talvez sejam a maior contribuição dos persas à História da Arquitetura, sendo que o maior monumento dessa era foi o Palácio de Persépolis. A cidade foi fundada em 518 a.C. como capital cerimonial, enquanto Susa era a capital administrativa, e Pasárgada o centro da corte. O palácio era formado por vários edifícios, e foi construído basicamente todo em pedra. Era utilizado, principalmente, para cerimônias de Ano Novo e início da primavera. A sala do trono do rei Xerxes, chamada de Salão das Cem Colunas, era o maior espaço coberto do palácio, com capacidade para abrigar, aproximadamente, 10 mil pessoas. Colunas de pedra com capitéis duplos esculpidos na forma de touros e leões sustentavam a cobertura. Em 331 a.C. o domínio persa chegaria ao fim com as conquistas de Alexandre, o Grande. Este acabou chegando até a Índia com seus exércitos, para onde levou artesãos persas, que lá permaneceram. E foi assim que a arquitetura persa se tornou uma das principais influências da arquitetura de pedra primitiva da Índia, como veremos mais adiante neste livro. TÓPICO 2 | PRIMÓRDIOS DA ARQUITETURA: MESOPOTÂMIA 33 FIGURA 22 – PLANTA BAIXA DO PALÁCIO, PERSÉPOLIS, PÉRSIA (IRÃ), CERCA DE 518 a.C. FONTE: Fazio (2011, p. 39) Salão das Cem Colunas (salão de audiências de Xerxes) Escada do terraço Pequeno palácio de Dário Salão de audiências de Dário Palácio de Xerxes 34 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que: • O surgimento da linguagem escrita cuneiforme e o desenvolvimento agrícola foram os marcos que desencadearam uma série de mudanças socioculturais que fizeram emergir civilizações urbanas com quem compartilhamos uma série de coisas em comum até hoje. • O Egito e a Mesopotâmia são considerados os berços da história e da arquitetura ocidental, pois foi nesses locais que os primeiros agrupamentos humanos surgiram. • As primeiras civilizações organizadas em comunidades urbanasindependentes na região da Mesopotâmia ficaram conhecidas como cidades-estados. Cidade- Estado é um agrupamento independente, que possui seu próprio governo. • As culturas mesopotâmicas progrediram através da exploração de seus rios, nos quais construíram elaborados canais de irrigação, em que cultivaram plantações suficientemente abundantes, permitindo o crescimento das populações urbanas e o surgimento da especialização. • O surgimento de artesãos, artistas e arquitetos, por sua vez, deu vida ao artesanato, à arte e à arquitetura, que em crescente refinamento e complexidade levaram o ser humano a iniciar uma busca pelo belo, bem como a expressar sua visão de mundo e de sua cultura. • Além da literatura que se originou da língua escrita, outras formas de expressão artística mesopotâmicas eram a pintura, o mosaico e a escultura. A arte mesopotâmica tinha como temas principais a história, a política, a religião, as forças da natureza e as diversas conquistas dos povos que habitaram o local. • De forma geral, a História da Mesopotâmia refere-se a um longo e conturbado período, no qual diversos povos, em momentos distintos, conquistaram territórios, construíram cidades e obras grandiosas de arquitetura que representaram o seu auge. • As cidades sumérias, no início do II milênio a.C., já eram bastante grandes, e surgiram ao redor de um núcleo de santuários e depósitos de alimentos. Os templos, muitas vezes monumentais, possuíam altares e nichos para a alocação de estátuas. • Os zigurates eram construções típicas dos mesopotâmicos: colinas artificiais escalonadas sob as quais eram alocados os templos urbanos; era típico, também, o uso do tijolo de adobe. 35 • Já as moradias das pessoas comuns ficavam em bairros densos, como verdadeiros aglomerados de casas com poucas ruas, com tipologia composta por pátios internos que forneciam luz e ar a todos os cômodos ao seu redor. • A ampliação de algumas cidades que se tornaram as capitais de impérios começou a ocorrer, sendo a Babilônia a primeira supercidade a surgir, de dimensão comparável às metrópoles modernas. • As cidades típicas de então eram, geralmente, fortificadas, contando com uma cidadela que objetivava a proteção do território e das pessoas que nele habitavam. • A cultura dos persas era influenciada por todas as civilizações que dominaram, característica que fica explícita na arte e na arquitetura, que continha elementos egípcios, hititas e esculturas de temática animal, o início de uma ideia de fusão estilística. A arquitetura se tornou mais livre na forma, mais decorativa e um pouco mais leve a partir dessa mistura de identidades. 36 1 Leia o seguinte trecho do livro “História das sociedades, das comunidades primitivas às sociedades medievais”: "À grande transformação econômica da Idade do Bronze dá -se o nome de Revolução Urbana. Essa revolução correspondeu à passagem das comunidades agrícolas autossuficientes para cidades, com comércio e artesanato especializado. A agricultura continuou como a principal atividade econômica, mas a economia, antes agrícola e pastoril, ganhou maior diversidade e complexidade com a multiplicação dos ofícios ou profissões e com o estabelecimento de um sistema regular de trocas. Assim, por volta de 3000 a.C., o Egito, a Mesopotâmia e o Vale do Indo já não eram mais um conjunto de aldeias de agricultores autossuficientes, mas constituíam Estados, com uma complexa organização social." FONTE: AQUINO, R. S. et al. História das sociedades, das comunidades primitivas às sociedades medievais. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1980, p. 77-78 (Adaptado). Agora, assinale, dentre as opções abaixo, a única que NÃO pode ser considerada uma característica da Revolução Urbana que culminou na formação da Civilização Mesopotâmica por volta de 3000 a.C.: a) ( ) O surgimento da linguagem escrita cuneiforme. b) ( ) A metalurgia do bronze e confecção de ferramentas. c) ( ) O modo de produção escravista que gerava força de trabalho para o campo. d) ( ) A arquitetura monumental, com destaque para os "zigurates". e) ( ) O sistema de Cidades-Estados independentes. AUTOATIVIDADE 37 TÓPICO 3 PRIMÓRDIOS DA ARQUITETURA: EGITO UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Ao contrário do que ocorre em relação ao Oriente Médio, a cultura ocidental em que vivemos é bastante rica em imagens sobre o Egito antigo. Existem muitos filmes temáticos sobre o assunto, bem como literatura e outras modalidades artísticas. Há um fascínio pelos seus faraós e criativas especulações a respeito de suas múmias e pirâmides. O fato é que, independentemente de teorias conspiratórias e fantasias cinematográficas, a civilização egípcia, homens e mulheres comuns do Vale do Nilo, produziram arte e arquitetura espetaculares, coerentes e com seus próprios princípios. Este talvez seja o principal motivo para serem lembrados e referenciados até os dias de hoje. É importante ter em mente que as datas citadas ao longo deste tópico, quando se trata de história egípcia, especialmente no caso de faraós específicos das primeiras dinastias, são sempre aproximadas, pois ainda são debatidas por pesquisadores. 2 CONTEXTO HISTÓRICO O Egito é dominado por um grande rio, o Nilo, que nasce nos planaltos de Uganda, passa pelo Sudão e pela Etiópia, atravessando mais de 3.200 km antes de desembocar no Mar Mediterrâneo, ao norte. Nas proximidades do rio, a agricultura é favorecida pelo clima quente e pelos depósitos anuais de matéria orgânica proveniente de enchentes, que tornam os campos férteis. No auge das dinastias egípcias, as margens do vale continham campinas bem servidas em animais de caça e pântanos. Essas áreas, por sua vez, eram rodeadas por desertos, que protegiam as cidades de invasores. Este talvez seja um dos motivos pelos quais as cidades egípcias não eram fortificadas, ao contrário das mesopotâmicas. Dois centros urbanos com culturas levemente diferentes surgiram ainda na pré-história: o Baixo Egito, no Delta do Nilo, e o Alto Egito, no vale ao sul. 38 UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA HUMANIDADE E DA ARQUITETURA A cultura que surgiu nas margens do Nilo era majoritariamente agrícola, em contraste com os densos assentamentos mesopotâmicos. A organização da vida egípcia se baseava na inundação anual e no ritmo cíclico das estações. Todos os anos a inundação fazia o vale florescer. Nessa época do ano os egípcios produziam alimentos que deveriam durar toda a estiagem que viria na sequência, chamada de estação seca, até o ano seguinte. Seguindo essa ordem natural, a civilização conseguiu a façanha de se manter estável por mais de dois mil anos. Por volta de 3000 a.C., Menes, o faraó do Alto Egito, unificou pela primeira vez o Alto e o Baixo Egito e estabeleceu a cidade de Mênfis como capital. O faraó era visto pela população como o representante do deus dos faraós na Terra: era ao mesmo tempo soberano secular e a personificação de Hórus, a divindade com cabeça de falcão. Ao falecer, o faraó passaria a ser identificado com Osíris, o pai de Hórus e senhor do submundo. Outro deus presente na teologia egípcia é Rá, o deus-sol, cujo símbolo era uma pedra cônica posteriormente estilizada como pirâmide. Acredita-se que o uso das formas piramidais no topo de pedras (obeliscos) ou na própria edificação (pirâmides) era um símbolo da conexão entre o faraó e Rá. Uma das características mais marcantes dos povos egípcios desde os primórdios dessa civilização é a relação quase obsessiva com a vida após a morte. Inúmeros monumentos funerários e túmulos foram erguidos e inscrições foram feitas para corroborar esse fato. O foco nessas obras era quase sempre o mesmo, tratar da transição entre a vida e a morte. Os egípcios acreditavam que no pós-vida uma força vital (ka) se unia com a manifestação física (ba), para se tornar o espírito (akh). Elaborados rituais eram performados dentro de túmulos com o objetivo de garantir o sucesso da transição para o pós-vida. Para isso era considerada
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