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1 CENTRO UNIVERSITÁRIO FAVENI CONTEÚDO E METODOLOGIA DA HISTÓRIA GUARULHOS – SP 2 SUMÁRIO 1 CONHECIMENTO HISTÓRICO COMO FERRAMENTA NO PROCESSO FORMATIVO ........................................................................................................... 5 2 A IMPORTÂNCIA DE APRENDER HISTÓRIA NA INFÂNCIA ............................. 9 2.1 História como ferramenta de capacitação para a vida .................................... 12 3 ATIVIDADES E ESTRATÉGIAS PARA O ENSINO DE HISTÓRIA NAS DIFERENTES ETAPAS DA ESCOLARIDADE ...................................................... 15 3.1 Estratégias de ensino ...................................................................................... 16 4 O ENSINO DE HISTÓRIA A PARTIR DA HOMOLOGAÇÃO DA BNCC ............ 23 4.1 Competências específicas de história para o ensino fundamental .................. 25 4.2 O ensino de história e a construção do sujeito ................................................ 27 4.3 O tempo e o espaço ........................................................................................ 29 4.4 Objetivos e conteúdos ..................................................................................... 30 5 UNIDADES TEMÁTICAS E DESENVOLVIMENTO DE HABILIDADES ............. 33 5.1 O que são as habilidades na BNCC? .............................................................. 33 5.2 O que são unidades temáticas? ...................................................................... 36 6 PROPOSTAS DE AVALIAÇÃO DA BNCC COM FOCO NO ENSINO DE HISTÓRIA...............................................................................................................38 6.1 Formas de avaliação ....................................................................................... 40 7 TEMPO, TEMPORALIDADE E ENSINO DE HISTÓRIA .................................... 43 8 COMO CONSTRUIR A NOÇÃO DE TEMPO HISTÓRICO JUNTO AOS ALUNOS.................................................................................................................46 8.1 Estratégias e metodologias ............................................................................. 47 9 A IMPORTÂNCIA DOS MEIOS FAMILIAR E SOCIAL PARA A CONSTRUÇÃO DA NOÇÃO DE TEMPO ....................................................................................... 51 10 HISTÓRIA LOCAL: EM BUSCA DE UMA DEFINIÇÃO .................................... 54 3 10.1 História local como “história menor” .............................................................. 59 11 HISTÓRIA LOCAL E A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE DOS ALUNOS .......... 61 12 COMO TRABALHAR A HISTÓRIA LOCAL NA ESCOLA ................................ 62 12.1 Estratégias e metodologias ........................................................................... 65 13 O LIVRO DIDÁTICO DE HISTÓRIA ................................................................. 67 13.1 O livro didático como fonte histórica .............................................................. 69 13.2 O livro didático como material de apoio ao ensino de história ....................... 71 14 LIVRO DIDÁTICO ENQUANTO PRODUTO CULTURAL................................. 74 15 USO DO LIVRO DIDÁTICO NA AULA DE HISTÓRIA ..................................... 76 16 HISTÓRIA E CRITICIDADE ............................................................................. 79 17 HISTÓRIA VERSUS ESTÓRIA ........................................................................ 82 18 HISTÓRIA E PODER ....................................................................................... 85 19 POR UMA “NOVA IDADE ANTIGA”? ............................................................... 87 20 AFINAL, QUAL É A IDADE DAS TREVAS? ..................................................... 91 21 HISTÓRIA LÍQUIDA? A QUESTÃO DA HISTÓRIA NOS TEMPOS DAS MUDANÇAS...........................................................................................................94 22 PATRIMÔNIOS HISTÓRICOS DA HUMANIDADE NAS AULAS DE HISTÓRIA...............................................................................................................98 23 CIDADANIA, DIVERSIDADE CULTURAL NO ENSINO DE HISTÓRIA ......... 100 24 IDENTIDADE CULTURAL E DIVERSIDADE RELIGIOSA NO ENSINO DE HISTÓRIA.............................................................................................................103 4 Prezado aluno! O grupo educacional Faveni, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 5 1 CONHECIMENTO HISTÓRICO COMO FERRAMENTA NO PROCESSO FORMATIVO Quais são as potencialidades do conhecimento histórico no processo formativo da infância? Como conhecer a história permite uma formação melhor, que proporcione às crianças bases sólidas para a construção de si mesmas como indivíduos e sujeitos conscientes de seu valor como cidadãos e agentes da história? Observemos, primeiramente, que o homem e as sociedades buscam formas de preservar suas histórias para a posteridade. Isso ocorre desde a Idade da Pedra, como o comprovam as pinturas rupestres, petróglifos, hieróglifos e outros sistemas e representação de experiências e agência humana no mundo. Isso dá- -se também por meio de lendas, mitos, histórias de finalidade moral ou ética, narrativas orais, desenhos, narrativas escritas, representações do cotidiano e festas em objetos (sagrados ou profanos), elementos simbólicos, crenças e rituais. Nas diversas formas pelas quais o saber histórico é constituído e transmitido de geração a geração ao longo do tempo, proporciona-se a manutenção dos saberes acumulados por gerações anteriores. Ademais, responde-se ao temor que os homens têm desde a antiguidade: ter seus nomes apagados da História (como ocorreu com faraós egípcios). Temor este que também aparece com relação à descendência ou, antes, à ausência dela. O Antigo Testamento impõe normas como a obrigação de gerar o filho do irmão na cunhada, caso este não tenha deixado descendentes (GÊNESIS, 38: 8–9). No caso do patriarca bíblico salvo por Deus de Sodoma e Gomorra com as duas filhas, mas sem herdeiros masculinos, isso resulta no embebedamento do pai pelas próprias filhas para gerar descendência (GÊNESIS, 19: 30–38). No caso dos romanos, aqueles que aos 60 anos tivessem herdeiros podiam adotar um indivíduo já adulto para continuar sua casa e nome (ADOÇÃO…, 2013). Antes disso, os gregos já obrigavam o casamento em certa idade, sendo severas as penas para o descumprimento dessa obrigação (SANTOS, 2019). Todos esses e muitos outros homens temiam por sua história, pela história de seus clãs, famílias e tribos. Todos buscavam alguém a quem transmitir seu 6 legado, fosse ele financeiro, intelectual, profissional ou religioso. Todos os fatores citados e muitos outros demonstram a necessidade inerente ao homem de narrar suas histórias e conhecimentospara as gerações posteriores. Esses fatores dizem respeito a como o homem se reconhece como parte de algo maior: a sociedade em que vive, sua cultura. Por isso, em todas as épocas, a História se fez presente como elemento essencial para o entendimento do homem sobre si mesmo, sua cultura e o mundo a sua volta. O homem vive a História todos os dias e escolhe determinados fatos para registrar para a posteridade. Ele conta a História para manter suas tradições, perpetuar seus conhecimentos, e rememorar suas experiências, construindo-se como sujeito, ente social e cultural (ALVES, 2019). Segundo o entendimento de Marc Baldó, “[…] a história tem uma função social: dar aos cidadãos elementos de crítica e reflexão sobre o presente, embora com uma perspectiva histórica” (LLOPIS, 2014, p. 3, tradução nossa). A primeira coisa que o conhecimento da História proporciona a alguém é a aprendizagem sobre si mesmo, de suas origens e raízes culturais. Quem eu sou tem a ver com a minha história pessoal. Como eu vou agir em relação ao mundo tem a ver com meu conhecimento sobre ele. A História, disciplina aprendida nas escolas, não exclui nem esgota o conhecimento e o saber históricos do ser humano. No entanto, a estruturação dos assuntos históricos por meio da disciplina, ao levar o aluno a atentar para o processo histórico, permite que este se conscientize de seu papel de agente histórico para que atue consciente e intencionalmente na História. O que é a História? De maneira bastante simplificada, podemos dizer que, como disciplina, é o estudo das ações do homem no tempo e no espaço. É a disciplina que busca registrar os atos dos homens em diversas culturas, épocas, lugares e contextos, preservando-os como conhecimento para a posteridade, mas igualmente utilizando-se destes registros e interpretando-os no presente para melhor vivê-lo. Também pode ser mobilizada para planejar o futuro, valendo-se das experiências históricas para evitar ou reduzir problemas e erros. Pensando na História como ciência que estuda as ações humanas nas diversas culturas e temporalidades, é possível perceber que conhecê-la significa ter o poder de saber o que já foi realizado ou tentado pelo homem ao longo dos 7 milênios, de tal forma que conhecer a experiência anterior permita ao ser humano aperfeiçoá-la ou deixá-la de lado por seus resultados. Pode-se, ainda, criar algo novo (ALVES, 2019). Todas as culturas, de alguma forma — ainda que difusa ou não estruturada —, produzem vestígios materiais e representam suas atividades e histórias, seja por meio de pinturas rupestres, petróglifos, desenhos e pinturas nas pedras, objetos e instrumentos. Narram seus feitos e crenças por via de lendas e mitos, ditados, representações, comemorações, superstições. Por meio da oralidade ou da escrita. Ter uma história é ter um norte, saber quem se é, de onde se vem, ainda que essa história não seja a que está nos livros. É necessário ao homem saber sua história, ter ideia de suas origens, conhecer sua cultura para saber quem é, o que é e o que deseja ser. A História vem sendo passada oralmente de geração a geração desde tempos muito antigos, muito antes e mesmo depois da invenção da escrita. Embora a disciplina seja assunto acadêmico e escolar e construa sua narrativa a partir de estudos e pesquisas rigorosos, utilizando-se de métodos e técnicas apropriados, ela jamais alcançará o conteúdo total da história da humanidade. Ao produzir a escrita da História, os historiadores são obrigados a fazer escolhas que incluem alguns fatos, objetos, sujeitos, lugares e contextos, sendo, no entanto, obrigados a deixar de fora uma quantidade imensa de outras Histórias. Essas são contadas, relembradas ou esquecidas, ficam nas memórias ou se perdem no que tange ao universo acadêmico-disciplinar. Porém, essas mesmas histórias que não cabem nos livros permanecem de alguma forma nos sujeitos que as vivem, que as escutam, que as assistem. Esses sujeitos da História, que encontram suas identidades primárias a partir da história familiar e comunitária, as estruturarão de outra forma ao tomarem posse de outros conhecimentos históricos, ampliando os itens que dão forma a sua construção identitária e conscientizando-se de seu papel ativo: agentes capazes de fazer a diferença em sua própria história, em sua comunidade, seu município, seu país, etc. 8 Júlio Aróstegui, na obra La investigación histórica: teoria y método (1995), reflete sobre a questão da História como disciplina acadêmica e escolar resultante de pesquisa, construída com método e pautada em teorias; já a história real cotidiana é aquela que ocorre o tempo todo em todos os lugares em que o homem atua. Segundo o entendimento do autor: A história é, em última análise, a “qualidade temporal” que têm tudo o que existe e também, em consequência, a manifestação empírica, quer dizer, que pode ser observada, da tal temporalidade. Dado que “ser” ou “ter” história é algo que caracteriza todo ser humano, todo ser social, a investigação sobre a natureza da história é, igualmente, sobre a natureza da sociedade. Muitas teorias do social, ainda que não todas, se fundamentam na absoluta indissociabilidade entre o social e o histórico (ARÓSTEGUI, 1995, documento on-line, tradução nossa). Isso posto, é necessário lembrar que o homem é um ser social, mesmo que não seja consciente disso. No que diz respeito à educação e ao ensino de História para crianças, utilizar-se de suas vivências e suas experiências, e partir destas para a inserção de outros conhecimentos históricos, comparando- -os, correlacionando- os ou contrapondo-os conforme o caso, é uma forma de chamar a atenção do educando e quebrar alguns preconceitos existentes, inclusive entre professores. É possível, portanto, demonstrar: Que a História não trata somente do passado, mas do presente — porque ocorre agora, neste instante na vida de todos — e do futuro — porque conhecê-la permite preparar-se para ele; Que estudar História não se trata apenas de decorar nomes, datas e grandes eventos, mas de compreender os processos que nela se dão; Que todos são sujeitos e fazem parte da História, mesmo que seus nomes não estejam nos livros; Que todos podem escolher atuar de forma consciente e cidadã na história ou apenas se deixarem viver como sujeitos passivos na História, o que não deixa de ser uma escolha; 9 Que estudar História tem a ver com a vida, com a própria cultura, com o meio social em que se vive, e que todos esses fatores estão em transformação, seja ela rápida ou muito lenta; Que não há inércia na História; Que estudar e conhecer a História tem a ver com conhecer a si mesmo, com construir-se como sujeito, com não ficar à mercê de terceiros, mas tornar-se senhor de sua história pessoal. Quando se reconhecem todas essas faculdades que o conhecimento da História proporciona ao ser humano, é possível constatar as imensas e importantíssimas potencialidades formativas que se abrem para os alunos a partir da aquisição desses conhecimentos e da consciência histórica que eles produzem nas pessoas enquanto sujeitos histórico e agentes da própria história. 2 A IMPORTÂNCIA DE APRENDER HISTÓRIA NA INFÂNCIA O ensino da História na infância tem importância fundamental, não somente quando se trata da História ensinada na escola, mas, igualmente, daquela história familiar e comunitária que as crianças apreendem desde o berço. Educação é mais do que aquilo que se aprende na escola de forma institucionalizada, estruturada e formal. Educação ocorre desde o berço. Educação histórico-cultural diz a cada um quem se é relação ao mundo, mas também prepara o indivíduo para agir como sujeito de sua própria história (ALVES, 2019). A educação histórica informal acontece nas práticas cotidianas, em casa e nas reuniões de família, por meio das históriase casos contados pelos adultos que estão guardados na memória familiar (comunitária ou local) por gerações e são repassados às crianças no dia-a-dia, seja como curiosidade, lembrança ou com o propósito de manter tradições familiares para incentivar ou evitar comportamentos ou buscando evitar comportamentos. Platão, em A República (2001), já explicita como ocorrem os processos educativos na Atenas de sua época, da educação informal à formal, por meio do diálogo entre Sócrates, Glauco e Adimanto: “ (…) não 10 compreendes — disse eu [Sócrates] — que primeiro ensinamos fábulas às crianças? Ora, no conjunto, as fábulas são mentiras, embora contenham verdades. E servimo-nos de fábulas para as crianças antes de as mandarmos ao ginásio” (PLATÃO, 2001, p. 65). Mais adiante, em diálogo com Adimanto, Sócrates complementa a ideia com prescrições referentes à importância da educação: “— (…) Os preceitos que lhes impomos [a crianças e jovens], (…), não são como poderia julgar-se, nem numerosos nem grandiosos, mas todos muito reduzidos, desde que guardem a grande norma proverbial, ou melhor, uma norma que não é grande, mas adequada. Qual é a ela? — perguntou. — A instrução — respondi [Socrates] — e a educação. Efetivamente, se tiverem sido bem-educados e se tornarem homens comedidos, facilmente perceberão tudo isto [diversos pontos levantados anteriormente], assim como outras questões que de momento deixamos a margem” (PLATÃO, 2001, p. 116, grifo nosso). A ideia de educação como parte da construção do sujeito não é nova, como pode ser visto no excerto citado. A humanidade sempre buscou educar para a sobrevivência física em primeiro lugar, e para a sobrevivência cultural e para as normas sociais em seguida, visando, ainda que de forma inconsciente, à reprodução e à conservação da cultura e da sociedade. Há registros de educação formal desde tempos muito antigos: Xenofonte, por exemplo, trata disso em Ciropédia (a educação de Ciro) (1990), e Platão na República (2001), o primeiro contando como se dá a educação entre aquele povo; o segundo pensando na educação ideal que a cidade-república deveria dar aos seus cidadãos. A Academia de Platão e o Liceu de Aristóteles são exemplos de centros de ensino formal na antiguidade. O mesmo se pode dizer da Biblioteca de Alexandria. Essas escolas preparavam os jovens para a vida a partir do conhecimento sobre sua cultura, História, Ciências Naturais e Artes (conceito que, nessa época, diz respeito também aos ofícios), incluindo as relativas à Medicina, ao preparo físico e à guerra. A educação histórica escolar, levada a cabo pela disciplina História, estende-se a tempos, espaços, contextos e temas mais diversificados que os normalmente ligados à História pessoal, familiar e comunitária, embora parta destes em direção a processos mais amplos. Segundo a base nacional comum curricular (BNCC): 11 O exercício do “fazer história”, de indagar, é marcado, inicialmente, pela constituição de um sujeito. Em seguida, amplia-se para o conhecimento de um “Outro”, às vezes semelhante, muitas vezes diferente. Depois, alarga- se ainda mais em direção a outros povos, com seus usos e costumes específicos. Por fim, parte-se para o mundo, sempre em movimento e transformação. Em meio a inúmeras combinações dessas variáveis — do Eu, do Outro e do Nós —, inseridas em tempos e espaços específicos, indivíduos produzem saberes que os tornam mais aptos para enfrentar situações marcadas pelo conflito ou pela conciliação (BRASIL, 2018, p. 397–398). O ensino de História tem papel fundamental na educação desde a infância, tendo em vista que aparelha a criança com conhecimentos para a vida como sujeito ativo da própria história, cidadão consciente, indivíduo capaz de pensamento crítico e comportamento ético, conhecedor de sua responsabilidade para consigo e com o mundo à sua volta. Esse é um entendimento e uma predição da BNCC no que diz respeito à educação e à construção do sujeito. Ela determina as competências específicas referentes ao ensino da História para o ensino fundamental. O desenvolvimento dessas competências elencadas na BNCC é parte fundamental da constituição do sujeito histórico pleno capaz de construir uma sociedade melhor. 12 2.1 História como ferramenta de capacitação para a vida Ao proporcionar aos educandos conhecimentos que retratem a vida do homem ao longo do tempo nos diferentes espaços geográficos em que convive e interfere, através das diversificadas culturas que a humanidade foi capaz de construir ao longo dos séculos, o ensino da História propicia a ampliação da visão de mundo das crianças pelo acesso à diversidade cultural e social das formas de vida humana. Dessa forma, no ensino de História hoje: […] entre os saberes produzidos, destaca-se a capacidade de comunicação e diálogo, instrumento necessário para o respeito à pluralidade cultural, social e política, bem como para o enfrentamento de circunstâncias marcadas pela tensão e pelo conflito (BRASIL, 2018, p. 398). 13 O ensino da História também é fundamental no que diz respeito às questões identitárias do sujeito, seja para confirmá-las ou negá-las, ou ainda para entretecê- las. Ennes e Marcon (2014) classificam as questões identitárias a partir de quatro “processos identitários”, que envolvem: Os atores sociais de algum modo articulados a grupos; Os motivos de disputas de pertencimento ou não a tais grupos; Os elementos morais e normativos que regulam o meio pelos quais estes atores entram em interação pelo que disputam; Os contextos históricos e sociais nos quais são produzidas e, ao mesmo, contribuem para a produção de identidades. Todos os elementos elencados demonstram que o estudo da História e da cultura compõem a fundamentação e a legitimação do valor identitário. São exemplos desse uso da História como fundamentação identitária: os processos construção de identidades nacionais, justificativas de fundamento e legitimidade religiosas, reconstrução e reafirmação de identidades étnicas. Chamamos atenção para as colocações de Stuart Hall (2002), que classifica as identidades a partir de três concepções: a do sujeito iluminista, a do sujeito sociológico e a do sujeito pós-moderno, sendo que este último, ao contrário dos anteriores, é fragmentário em termos de identidade. Esse sujeito pós-moderno se torna identitariamente fragmentário em função da multiplicidade de identidades que a pós-modernidade gerou (nacionais, raciais, culturais, de gênero, etc.) O sujeito iluminista de Hall (2002) é centrado, racional, sabe de seu lugar no mundo e atua pelo contrato social, enquadrando-se em um dado grupo de pertença identitária. O sujeito sociológico reconhece seu lugar “dentro” e “fora” do grupo “interno e “externo” a ele; a identidade do sujeito sociológico se constitui a partir das interações entre o sujeito e a sociedade. O sujeito pós-moderno, por sua vez, sofre uma crise de “pertencimento”, não por falta de um grupo no qual se reconhecer e identificar, mas pelas múltiplas identidades em que se fragmenta. Para Hall (2002), a perda de uma “identidade mestra” provocou contradições que afetam o sujeito tanto externa 14 quanto internamente. Essa identidade pós-moderna é, portanto, diferenciada das anteriores no que tange à constância; por sua característica múltipla e fluida, relaciona-se ao mesmo tempo com diversos grupos identitários e culturais, de modo que o sujeito vivencia uma “[…] permanente socialização e adaptação a novos contextos” (BRANDÃO, 2015, documento on-line). É aqui, mais uma vez, que a História é fundamental para a composição identitária e para a legitimação desses diversos grupos. É nela e por meio dela que se buscam as origens e alicerces sobre os quais se constituem historicamente as identidades. A eclosão de diversos grupos identitários faz parte destemomento Histórico em que a aceitação das diferenças, da diversidade cultural e do respeito pelos Direito Humanos estão no centro das disputas e das atenções. Segundo Brandão (2015, documento on-line), “[…] práticas de preservação do patrimônio cultural passaram a ser apropriadas como instrumento de construção de cidadania e afirmação social de identidades de grupos que demandam visibilidade social e acesso a direitos”. Os conhecimentos históricos adquiridos se tornarão ferramentas que o educando utilizará para observar, questionar, analisar, interpretar e compreender a vida. Eles o influenciarão no que tange ao seu agir no mundo, para que o faça de forma consciente e intencional. Utilizando-se dos conhecimentos adquiridos nas aulas de História, pode o educando capacitar-se para o uso do pensamento comparativo, reflexivo, analítico e crítico em relação à vida e aos eventos passados e presentes. Assim, ele pode decidir conscientemente, de forma ponderada, sobre suas ações de forma embasada pelos conhecimentos adquiridos, planejar as atitudes e ações que deseja tomar de forma a moldar um futuro melhor e a atingir seus objetivos pessoais. A História também proporciona ferramentas de construção, fundamentação e legitimação das identidades, tanto internas quanto externas, dos grupos que compõem a sociedade e nos quais o educando se inscreve. O conhecimento da História proporciona o embasamento necessário à constituição de um sujeito histórico crítico, ético, atuante, consciente de sua agência histórica e da importância de sua atuação cidadã na sociedade em que vive (ALVES, 2019). 15 3 ATIVIDADES E ESTRATÉGIAS PARA O ENSINO DE HISTÓRIA NAS DIFERENTES ETAPAS DA ESCOLARIDADE O processo de ensino-aprendizagem, para ter os melhores resultados, exige planejamento, constante pesquisa e aprimoramento no que tange aos métodos e técnicas de ensino, revisão e atualização de conteúdos e organização da inserção dos ensinamentos de forma gradual e contínua, respeitando a maturidade de educando. Com relação ao assunto, a BNCC prevê divisões por faixa etária para a educação infantil e por período anual escolar para o ensino fundamental, determinando, para cada uma dessas divisões, o mínimo conteúdo a ser introduzido no universo instrucional e formativo do educando. No que tange à área de Humanidades e à História o título “o eu, o outro e o nós” aparece tanto para a educação infantil quanto para o ensino fundamental, porque está presente na vida desde o nascimento até a vida adulta. Na educação infantil, A BNCC propugna o uso da internacionalidade educativa para o ensino, que é dividido em cinco unidades denominadas campos de experiências: “o eu, o outro e o nós”; corpo, gestos e movimentos; traços, sons, cores e formas; escuta, fala, pensamento e imaginação; espaços, tempos, quantidades, relações e transformações. O campo de experiências que nos interessa particularmente neste capítulo é o “o eu, o outro e o nós” que, assim como os demais, é dividido por faixa etária da seguinte forma: bebês (zero a um ano e seis meses), crianças bem pequenas (um ano e sete meses a três anos e onze meses) e crianças pequenas (quatro a cinco anos e onze meses). Esse título “o eu, o outro e o nós”, inclui como veremos nos trechos citados da BNCC, a seguir, uma série de aprendizagens relacionadas ao campo disciplinar da História e das Ciências Humanas (1º trecho — EI) e se repete nas unidades temáticas do ensino fundamental (2º trecho): O eu, o outro e o nós — É na interação com os pares e com adultos que as crianças vão constituindo um modo próprio de agir, sentir e pensar e vão descobrindo que existem outros modos de vida, pessoas diferentes, com outros pontos de vista. Conforme vivem suas primeiras experiências sociais (na família, na instituição escolar, na coletividade), constroem percepções e questionamentos sobre si e sobre os outros, diferenciando- se e, simultaneamente, identificando-se como seres individuais e sociais. Ao mesmo tempo que participam de relações sociais e de cuidados 16 pessoais, as crianças constroem sua autonomia e senso de autocuidado, de reciprocidade e de interdependência com o meio. Por sua vez, na Educação Infantil, é preciso criar oportunidades para que as crianças entrem em contato com outros grupos sociais e culturais, outros modos de vida, diferentes atitudes, técnicas e rituais de cuidados pessoais e do grupo, costumes, celebrações e narrativas. Nessas experiências, elas podem ampliar o modo de perceber a si mesmas e ao outro, valorizar sua identidade, respeitar os outros e reconhecer as diferenças que nos constituem como seres humanos (BRASIL, 2018, p. 40). O exercício do “fazer história”, de indagar, é marcado, inicialmente, pela constituição de um sujeito. Em seguida, amplia-se para o conhecimento de um “Outro”, às vezes semelhante, muitas vezes diferente. Depois, alarga- se ainda mais em direção a outros povos, com seus usos e costumes específicos. Por fim, parte-se para o mundo, sempre em movimento e transformação. Em meio a inúmeras combinações dessas variáveis – do Eu, do Outro e do Nós —, inseridas em tempos e espaços específicos, indivíduos produzem saberes que os tornam mais aptos para enfrentar situações marcadas pelo conflito ou pela conciliação (BRASIL, 2018, p. 397–398). Sobre a intencionalidade educativa, o BNCC aponta que: […] consiste na organização e proposição, pelo educador, de experiências que permitam às crianças conhecer a si e ao outro e de conhecer e compreender as relações com a natureza, com a cultura e com a produção científica, que se traduzem nas práticas de cuidados pessoais (alimentar- -se, vestir-se, higienizar-se), nas brincadeiras, nas experimentações com materiais variados, na aproximação com a literatura e no encontro com as pessoas (BRASIL, 2018, p. 39). O campo de experiências denominado “espaços, tempos, quantidades, relações e transformações” também se comunica com a História, na medida em que ensina ao aluno da educação infantil sobre elementos e conceitos fundamentais da História e das Ciências Humanas. Para transformar as orientações em prática, os professores utilizam métodos, técnicas e estratégias de ensino. 3.1 Estratégias de ensino Estratégia pode ser entendida como exploração e aplicação de meios a partir das condições disponíveis para atingir os objetivos do binômio ensino- aprendizagem. No mundo globalizado e tecnológico em que estamos vivendo, o uso de estratégias de ensino que acompanhem a realidade dos alunos e do próprio mundo se faz necessário para facilitar a construção do conhecimento. 17 A primeira estratégia de ensino que um professor deve utilizar é a que traz para si e para seu assunto disciplinar a atenção e o interesse do aluno. Alunos aprendem aquilo que os interessa, ou que os leva à realização de suas metas. Muitas vezes, e não somente com crianças, o “aprendizado” é superficial, servindo apenas para “obter boas notas” e “passar de ano”, sendo esquecido imediatamente após o alcance do objetivo. Esse tipo de “aprendizado”, seja decorado, memorizado ou superficialmente lembrado, não é uma aprendizagem real porque não interessa ao educando: não desperta sua curiosidade ou sede de saber. Que fazer para ter a atenção do aluno? Várias podem ser as respostas e estas se relacionarão com o projeto pedagógico de cada instituição, com a metodologia de ensino escolhida, com a característica de cada professor e de cada turma e aluno. Enfim, um sem número de opções e variantes. As estratégias de ensino são como ferramentas que se utilizam para captar e manter a atenção e o interesse do aluno. Para Moreira (2014, p. 19): As atividades/estratégias de ensino são definidas como situações variadas, criadas pelo educador para oportunizar aos educandos a interação com o conhecimento. O profissional seleciona as estratégias de ensino e as utiliza comomeio de intervenção para uma boa qualidade de envolvimento dos alunos com a aprendizagem considerando os objetivos educacionais, indicações verbais ou escritas sobre o comportamento individual ou coletivo da turma, o tempo disponível para a execução das tarefas e o ambiente físico (MOREIRA,2014) Serão sugeridas, a seguir, algumas estratégias de ensino da História para diferentes etapas da escolaridade. Essas estratégias podem ser utilizadas de forma intensificada e aprofundada em etapas posteriores às que são indicadas, de acordo com a maturidade de cada turma. O ensino híbrido, abordagem pedagógica que trabalha com a realização de atividades por meio das tecnologias digitais de informação conjuntamente com as tradicionais atividades presenciais, também é eficaz. A seguir, você verá uma listagem com diversas estratégias pedagógicas de fomento ao aprendizado ativo, descritas em detalhes por Camargo e Daros, na obra A sala de aula inovadora — estratégias pedagógicas para fomentar o aprendizado ativo (2018). Nem todas as estratégias descritas pelos autores em seu livro podem ser utilizadas com alunos da educação infantil e dos anos iniciais do ensino 18 fundamental. Muitas, porém, podem ser utilizadas ou adaptadas. Algumas delas podem e são utilizadas, seja da forma descrita pelos autores, seja de forma adaptada. Com relação aos alunos da educação infantil, a orientação é que, de acordo com a faixa etária, sejam utilizados jogos e brincadeiras, ensinando a partir da interatividade e da intencionalidade para atender às orientações contidas na BNCC. A seguir, estão elencadas as estratégias mais comuns (ALVES, 2019). 19 Com crianças menores, a construção da árvore genealógica (mãe, pai e irmãos). Uso da música e seus compassos como marcadores de tempo (SILVA; FREZZA, 2010). Linhas do tempo referentes às atividades da rotina escolar. Realização de quadros que especifiquem de forma visual a rotina escolar (por exemplo, dia de lanche comunitário, dia de contação de histórias, dia de Educação Física, etc.). Prática de brincadeiras que utilizem termos relativos a tempo e espaço. (Exemplo: “Mamãe posso ir?” Brincadeira que ensina sobre a relação distância-tempo, perto-longe, maior e menor em termos espaciais.) Produção de eventos comemorativos, cívicos, religiosos, pessoais, simbólicos, que envolvam a participação da criança no “fazer acontecer” (aqui, envolve-se a criança na construção de enfeites, desenhos e pinturas sobre o tema). A utilização de jogos de montagem, jogos de tabuleiro, passatempos, palavras cruzadas podem ocorrer nas diversas fases do ensino, variando o tipo de jogo de acordo com a turma. Palavras cruzadas, caça-palavras e charadas podem ser usados com crianças desde a fase pré-escolar. Idem para passatempos com figuras que se relacionam. A melhor forma de chamar a atenção dos alunos para assuntos históricos é partir de seus interesses ou de seus comentários e vivências cotidianos. É a partir de questões do presente que se vai dirigir a atenção dos alunos para assuntos do passado, correlacionando-os. Deve-se relacionar à História às situações do presente que estejam entre os elementos do cotidiano que interessam aos alunos, demonstrando como a História é presente no próprio ser e fazer do aluno e de sua família. Vejamos algumas estratégias para introduzir o ensino, a consciência da historicidade e a reflexão sobre a História entre os educandos nos anos iniciais do 20 ensino fundamental, não esquecendo que, para cada turma e fase escolar, planeja- se uma proposta estratégica pedagógica diferenciada. O elemento lúdico deve ser utilizado sempre de forma que se enquadre na maturidade de cada grupo. Estão elencadas, a seguir, as estratégias que podem ser usadas para essa fase dos anos iniciais (ALVES, 2019). A árvore genealógica — ampliada em relação à educação infantil, incluindo avós, bisavós e colaterais. Construção de linhas do tempo: individuais, rotinas escolares, ou comemorativas. Criação coletiva de rotina/horário escolar, uso do calendário com marcação dia a dia da passagem do tempo, produção e exposição de quadro comparativo de aprendizado do tempo contado em horas, dias, anos, etc. Historiando expressões. As expressões faladas no cotidiano podem render uma série interessante de aprendizados históricos a partir de sua contextualização inicial e acompanhamento de suas modificações de sentido no tempo. Escutar as expressões utilizadas pelos alunos e contextualizá-las, caso tenham modificado o sentido ao longo do tempo, explicar o sentido original e o atual. Para crianças maiores: partir da confecção das árvores genealógicas e construir o equivalente em termos de profissões dos pais, avós, bisavós e das mulheres. Levantar a questão das mães que trabalham (fora ou para fora) e que não trabalham (do lar). Se trabalhavam ou ainda trabalham, o que faziam/fazem em casa, na rua, em empresas ou um pouco de cada. Quanto tempo ficam fora? Nos 2º e 3º anos, podem ser feitos projetos relativos às profissões, aos serviços, aos comércios e às indústrias existentes na comunidade. Pode-se solicitar que os alunos entrevistem pessoas, buscando conhecer suas histórias pessoais e profissionais, e que 21 escrevam sobre elas, indicando qual a importância que aquele trabalho tem para a comunidade. Nos 4º e 5º anos do ensino fundamental, no que tange a migrações e culturas, relacionar os membros da família às suas origens. Que hábitos culturais permanecem, quais foram deixados de lado ou adaptados? E quanto às vestimentas tradicionais, quais foram conservadas, deixadas de lado/esquecidas ou são utilizadas pontualmente em festa e datas específicas? Que pratos são típicos de cada região ou povo? Aqui, se pode projetar atividades de pesquisa por vários meios: entrevista, busca em revistas, jornais, fotografias, internet (ALVES, 2019). Fontes podem ser apresentadas e trabalhadas em sala de aula: fotografias, filmes, desenhos, pinturas, artigos de jornal ou revistas, que deverão ser correlacionadas com mapas referentes às diversas temporalidades. Os recursos da tecnologia de informação, como mídias diversas, games e pesquisa eletrônica são ferramentas de grande poder atrativo para as crianças. Trabalho em campo. Visitas à museus, indústrias, fazendas, sítios, locais históricos. Os trabalhos em campo, em diferentes lugares e contextos, proporcionam uma gama enorme de possibilidades. Principalmente no ensino fundamental, podem encantar as crianças — sair da sala de aula, conhecer novos lugares, objetos e pessoas, aprender de forma diferenciada. Devem, na sequência, ensejar comentários, debates, narrativa individual ou coletiva, oral ou escrita, referentes tanto à experiência quanto ao conteúdo apreendido. Uso da música, dança, moda e culinária como elementos instigadores da curiosidade e captadores da atenção. Podem ser relacionados a fatos históricos, origens, usos e costumes. Participação em eventos externos: teatro, cinema, dança, feiras, etc. 22 A produção de feiras, jornais, blogs, museus escolares temporários, semanas da História, etc. Eventos que envolvam os alunos (se possível, suas famílias e membros da comunidade), tornando-os não apenas espectadores, mas planejadores participativos que dão ideias sobre os temas e buscam elementos para compor os conteúdos, vendo-se como construtores. Também é uma estratégia que pode ser utilizada nos diversos anos do ensino fundamental. Esses são alguns exemplos de estratégias que podem ser utilizadas para ensinar História, devendo ser adaptadas ao contexto de cada escola e comunidade, à faixa etária e ano escolar das crianças, e às especificidades do público para o qual estão voltadas (indígenas, quilombolas, estudantes da educação especial,rural ou urbana). (ALVES, 2019) Por fim, concordamos em parte com a afirmação de Moreira (2014), quando aponta para a responsabilidade do professor quanto ao planejamento estratégico do ensino. Segundo ela, como, por que e o que ensinar devem ser planejados constantemente, porque: […] as estratégias no ato de ensinar podem influenciar os valores pela aprendizagem significativa ou superficial, pela aprendizagem competitiva ou cooperativa, pela necessidade de dialogicidade ou individualidade, podendo interferir na qualidade motivacional empregada pelo aluno (MOREIRA, 2014, p. 92). No entanto, outros fatores afetam o processo de ensino-aprendizagem, como: as condições oferecidas pelo estabelecimento escolar aos professores e alunos, os recursos disponíveis (humanos, tecnológicos e pedagógicos), o ambiente e condições em que vivem os educandos, o envolvimento e comprometimento dos pais e familiares. Enfim, professores podem e devem organizar estratégias para melhor ensinar História ou qualquer outra disciplina, mas o contexto em que o realizam tende a interferir no resultado. 23 4 O ENSINO DE HISTÓRIA A PARTIR DA HOMOLOGAÇÃO DA BNCC Para a BNCC, no ensino fundamental, as ciências humanas dividem-se em duas disciplinas: história e geografia. Elas dialogam entre si, trabalhando a interdisciplinaridade e a transversalidade de temas com diferentes áreas. Tanto a transversalidade quanto a interdisciplinaridade foram contempladas pela BNCC, normatizando, assim, o que já era previsto pelas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs). Na área das ciências humanas, em especial na história, a presença da transversalidade e as relações interdisciplinares são uma constante, visto que tudo tem história e que a história perpassa tudo e todos. Diferentemente dos componentes curriculares das demais disciplinas, que têm as mesmas unidades temáticas do primeiro ao nono ano, na história essas unidades temáticas não são repetidas. Cada ano tem uma unidade temática diferente. (ALVES, 2019) Nos anos iniciais do ensino fundamental, a BNCC objetiva a valorização das experiências lúdicas de aprendizagem em articulação com vivências trazidas da educação infantil. Ela recomenda que tal articulação inclua a previsão da sistematização progressiva dessas experiências no que tange ao desenvolvimento pelo educando de novos modos de se relacionar com o mundo. Também está em jogo a ampliação de sua capacidade de leitura e formulação de hipóteses sobre fenômenos, bem como a ampliação de sua capacidade de testar, refutar e concluir sobre dado assunto. A ideia é que o aluno seja agente da construção de conhecimentos. A ação pedagógica nos dois primeiros anos do ensino fundamental tem como foco principal a alfabetização. Sua finalidade é garantir oportunidades amplas para o que o educando possa apropriar-se do sistema de escrita alfabética em articulação com o desenvolvimento de outras habilidades de leitura e escrita, ampliando seu conhecimento de códigos e signos. No que diz respeito à história, isso pode ser trabalhado com a apresentação de signos e códigos de diversas culturas e em diferentes épocas (BRASIL, 2018a). Por meio da “[...] consolidação das aprendizagens anteriores e da ampliação das práticas de linguagem e da experiência estética e intercultural das crianças” (BRASIL, 2018a, p. 58), dá-se a 24 progressão do conhecimento. Os projetos pedagógicos devem levar em conta o que as crianças ainda precisam aprender (o currículo), assim como suas expectativas e interesses. No ensino fundamental, expande-se a autonomia intelectual. O educando começa as compreender as normas e toma interesse pela vida social. Ele passa a interagir com sistemas mais amplos, que tratam das relações dos sujeitos entre si e também das relações dos sujeitos com a natureza, a história, a cultura, o ambiente e as tecnologias. As relações com o mundo se ampliam, resultando em experiências que desenvolvem a oralidade, bem como os processos de percepção, compreensão e representação. Elas se expandem nos sentidos cognitivo, psicoemocional e psicomotor. Ao observar o mundo, o educando tenta alcançá-lo, buscando fazer coisas novas. Após aprender a reconhecer a si mesmo e ao outro como individualidades, o educando é instado a pensar sua relação com os diversos grupos sociais dos quais participa: familiar, escolar, religioso, amigos da rua, vizinhos, etc. O terceiro termo, “nós”, é então trabalhado. As experiências dos educandos advindas de suas relações com os grupos nos quais se inserem são previstas pela BNCC. Elas são indicadas como oportunidades por meio das quais as temáticas da disciplina podem ser trazidas para a sala de aula, promovendo a observação, o questionamento, a comparação, a compreensão, o aprendizado e a análise dos assuntos referentes à disciplina. Na Figura 1, a seguir, você pode ver as competências gerais elencadas pela BNCC (ALVES, 2019). 25 4.1 Competências específicas de história para o ensino fundamental No ensino da história, a ideia é partir das experiências vividas pelas crianças em seu cotidiano e relacioná-las com a história. Valoriza-se tanto a história do educando, de sua família e da comunidade quanto a história mais ampla, em seu aspecto de disciplina escolar e conteúdo. O educador deve relacionar fatos do presente com diferentes eventos do passado e compará-los. A seguir, você pode ver as competências específicas de história para o ensino fundamental (ALVES, 2019). 1. Compreender acontecimentos históricos, relações de poder e processos e mecanismos de transformação e manutenção das estruturas sociais, políticas, econômicas e culturais ao longo do tempo em diferentes espaços para analisar, posicionar-se e intervir no mundo contemporâneo. 26 2. Compreender a historicidade no tempo e no espaço, relacionando acontecimentos e processos de transformação e manutenção das estruturas sociais, políticas, econômicas e culturais, bem como problematizar os significados das lógicas de organização cronológica. 3. Elaborar questionamentos, hipóteses, argumentos de proposições em relação a documentos, interpretações e contextos históricos específicos, recorrendo a diferentes linguagens e mídias, exercitando a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos, a cooperação e o respeito. 4. Identificar interpretações que expressam visões de diferentes sujeitos, culturas e povos com relação a um mesmo contexto histórico e posicionar-se criticamente com base em princípios éticos, democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários. 5. Analisar e compreender o movimento de populações e mercadorias no tempo e no espaço e seus significados históricos, levando em conta o respeito e a solidariedade com as diferentes populações. 6. Compreender e problematizar os conceitos e procedimentos norteadores da produção historiográfica. 7. Produzir, avaliar e reutilizar tecnologias digitais de informação e comunicação de modo crítico, ético e responsável, compreendendo seus significados para os diferentes grupos ou estratos sociais (ALVES, 2019). 27 4.2 O ensino de história e a construção do sujeito A BNCC privilegia como objetivo principal para os anos iniciais do ensino fundamental a atenção e o amparo educacional para a construção do sujeito. No que diz respeito à área de ciências humanas, em especial ao domínio da história, a construção do sujeito deve começar a partir do reconhecimento do “eu”, do “outro” e do “nós”. Veja: [...] um dos importantes objetivos de História no Ensino Fundamental é estimular a autonomia de pensamento e a capacidade de reconhecer que os indivíduos agem de acordo com a época e o lugar nos quais vivem, de forma a preservar ou transformar seus hábitos e condutas. A percepção de que existe uma grande diversidade de sujeitos e histórias estimula o pensamento crítico,a autonomia e a formação para a cidadania (BRASIL, 2018a, p. 398). Na fase da vida em que as crianças se encontram entre o final da educação infantil e os primeiros anos do ensino fundamental, elas começam a se dar conta de que são diferentes umas das outras. Elas começam a desenvolver a percepção e a consciência do “eu” individualizado e do “outro” diferenciado. A consciência do “eu” e do “outro” é inicialmente constituída pela identificação de diferenças (“ser diferente do outro me individualiza”) e de semelhanças (“o outro é humano como eu”). Ao reconhecer-se como um “eu” — indivíduo diferenciado —, o educando também aprende a reconhecer o “outro” em sua singularidade. Posteriormente, reconhece também o “nós” presente nos diversos conjuntos formados pelo seu “eu” e pelos outros indivíduos pertencentes a cada grupo social em que transita ou com os quais convive. Em geral, as crianças já chegam ao ensino fundamental com algumas dessas habilidades de diferenciação desenvolvidas. Meninos e meninas sabem que são fisicamente diferentes. Também percebem que dentro de seu círculo mais próximo gostos, interesses e lugares sociais são diferenciados. No entanto, essas ações e conhecimentos não são resultados de reflexão, e sim de constatação. A educação histórica deve incentivar o educando no desenvolvimento dos processos de observar, investigar, inquirir, enumerar, distinguir, questionar, compreender, classificar e analisar diferenças e semelhanças entre ele e seus 28 colegas, auxiliando na construção do sujeito. É possível trabalhar isso exemplificando situações e fatos históricos por meio e a partir das relações vividas pelo educando com pessoas pertencentes a outros grupos, faixas etárias, sujeitos com diferentes ocupações e visões de mundo. Isso permite que as crianças ampliem seu universo de conhecimento (ALVES, 2019). O ensino da história nessa etapa também objetiva proporcionar o conhecimento de códigos e signos diferentes, de modo que o educando possa identificar as diversas formas de comunicação possíveis por meio deles. O ideal é desenvolver a percepção do aluno com relação às modificações sofridas pelos códigos e signos conforme a cultura em que se inserem, revelando a forma como são utilizados pelas diversas sociedades e mesmo seu uso dentro de uma dada sociedade. Também é fundamental: Exercitar a interpretação por meio da leitura de textos, objetos, mitos, obras artísticas ou literárias, com uso de imagens, revistas, jornais, anúncios, inscrições em muros, etc.; Incentivar a ampliação do vocabulário e a capacidade argumentativa, seja na construção e na defesa de hipóteses, seja na sua refutação; Levar o educando a investigar as relações entre textos, objetos, paisagens e pessoas; Estimular a identificação de hipóteses sobre os mais diversos assuntos; Demonstrar que sobre um dado assunto, tema ou fato podem existir diferentes pontos de vista, posicionamentos e interpretações; 29 Com relação às fontes, perguntar: quem escreveu o texto? Quando escreveu? Com que finalidade? Para ou contra quem ou o que foi escrito? Em que situação pessoal estava o escritor quando o fez? A construção do sujeito é edificada a partir da relação entre os objetivos e os conteúdos previstos para o ensino de história pela BNCC. A Base recomenda partir de uma definição básica da história (para o aluno) como uma disciplina que estuda a ação do homem ao longo do tempo sobre o espaço e em dado contexto. E também como uma disciplina que estuda a relação do homem com a natureza e com os outros homens ao longo do tempo e em diferentes espaços (ALVES, 2019). 4.3 O tempo e o espaço A BNCC afirma que é necessário propiciar o desenvolvimento da cognição, da comunicação e da socialização do educando de forma que ele venha a compreender paulatina e gradativamente conceitos fundamentais para as ciências humanas, em especial os conceitos essenciais para o ensino de história. Entre tais conceitos, estão o de tempo, o de espaço e o de contexto. O conteúdo deve simplificar a compreensão de tempo e espaço, aplicado a um contexto, tendo como referência inicial a comunidade de pertencimento. A ênfase das aprendizagens está na compreensão do tempo e do espaço a serviço do conhecimento, partindo das referências ao universo próximo do educando e remetendo às suas relações com a família e outras comunidades de pertencimento (ALVES, 2019). Conceitos como tempo podem ser introduzidos a partir das divisões dos dias da semana, das horas em que o aluno executa esta ou aquela tarefa, das festas religiosas ou civis que ocorrem em sua comunidade. O conceito de espaço pode ser 30 trabalhado a partir do próprio espaço ocupado pelo aluno em sala de aula (seu corpo, sua mochila, sua carteira escolar, etc.), na sequência remetendo ao espaço ocupado e vivido da sala de aula, da escola, da casa, do bairro, etc. 4.4 Objetivos e conteúdos Para o primeiro ano do ensino fundamental, a BNCC contempla conteúdos que dizem respeito ao universo pessoal do aluno, levando-o a indagar e identificar o seu lugar no mundo. Além disso, o educando deve: Descrever os papéis das pessoas em seu grupo familiar; Identificar os diferentes papéis que podem ser exercidos pelos sujeitos na sociedade; Reconhecer as diferentes posições ocupadas por si e pelos outros em seu grupo social; Distinguir as fases da sua vida e aprender a reconhecer diferentes temporalidades (passado, presente e futuro); Conhecer as datas festivas cívicas, religiosas ou profanas e seu significado. No segundo ano, os conteúdos contemplam a comunidade, as formas variadas de registrar as experiências da comunidade, o trabalho e as formas de sustentabilidade desenvolvidas pela e na comunidade (De que vivem? Em que trabalham?). Outro objetivo é levar o educando a indagar sobre a história da comunidade, de si mesmo e do outro. Além disso, ele deve reconhecer sua relação com a comunidade e com seus outros membros. O educador também precisa instigar o aluno a buscar conhecer a história por relatos orais das pessoas sobre o lugar onde vivem e sobre as outras pessoas que dele fazem parte (ALVES, 2019). No terceiro ano, os alunos são levados a indagar, observar e refletir sobre as pessoas e os grupos que compõem a cidade e o município, o lugar em que vivem. Entram em jogo questões como estas: quais são os grupos sociais? As pessoas 31 fazem parte de vários grupos sociais ou apenas de um? Os grupos sociais se limitam ao lugar/comunidade onde vive o educando ou ampliam os limites das comunidades para o município, a cidade, etc.? Alcançam o mundo mais distante por meio dos meios de comunicação (TV, rádio, telefone, internet, etc.)? Além disso, os alunos aprendem a noção de espaço público e privado, podendo exercitar tal conhecimento por via do mapeamento dos espaços públicos existentes no lugar onde moram (ALVES, 2019). No quarto ano, as crianças aprendem sobre as transformações e permanências nas trajetórias dos grupos humanos, bem como os fluxos e refluxos do movimento migratório ao longo do tempo e os espaços em que se desenvolvem. Os alunos devem: Observar o entorno e descobrir as mudanças no espaço e nas pessoas, bem como as ações das pessoas e grupos que levaram a essas mudanças; Observar e refletir sobre a circulação das pessoas, dos produtos (comércio) e das culturas; Identificar as transformações produzidas pelo homem no ambiente natural e seus resultados; Analisar as questões históricas relativas às migrações, seus motivos. No quinto ano, o último dos anos iniciais, os conteúdos se referem à formação dos povos, à passagem do nomadismo ao sedentarismo, à organização social e política, inserindo no universo do educando a noção de Estado. Os alunos passam a reconhecer: O papel exercido pelasreligiões e culturas na formação dos povos antigos; Conceitos como cidadania, diversidade cultural e respeito às diferenças sociais, culturais e históricas, que devem ser descritos, analisados e abordados em relação às vivências no cotidiano; 32 Processos de produção, de hierarquização, de construção de memória e patrimônio (seja material ou imaterial). Segundo Silva Junior (2016), deve-se ensinar história de forma que os alunos se apropriem dos saberes históricos e os relacionem com a vida prática. Para mobilizar os alunos, devem ser usadas várias fontes e imagens. É indicado: Levar os alunos à exploração e à análise de noções de tempo a partir de diferenciadas fontes históricas; Utilizar fontes disponíveis em diferentes linguagens; Descolar o ensino da história do Brasil do eurocentrismo, aportando conhecimentos sobre outros povos de culturas e saberes diferentes, porém de mesmo valor histórico para os contextos que representam; Apresentar conteúdos que sejam afins com as realidades e necessidades sociais e com os contextos vividos pelos educandos. Em suma, o ensino de história nos anos iniciais do ensino fundamental objetiva capacitar o aluno para observar, questionar e interpretar o mundo à sua volta partindo de elementos do presente e relacionando-os ao passado. O estudante deve desenvolver competências necessárias para compreender processos e fenômenos sociais, políticos e culturais. A ideia é que ele atue de forma responsável, ética e autônoma com relação aos processos e fenômenos culturais, sociais e políticos, reconhecendo diversidades, respeitando as diferenças sociais e culturais e o ambiente. Em suma, o aluno deve conhecer e interagir na sociedade por meio do uso de diversos códigos e meios de comunicação. 33 5 UNIDADES TEMÁTICAS E DESENVOLVIMENTO DE HABILIDADES 5.1 O que são as habilidades na BNCC? As habilidades são a expressão das aprendizagens essenciais a serem asseguradas aos alunos nos diversos contextos escolares. Elas trabalham com diferentes graus de complexidade. A BNCC expressa em seu texto o direito ao conhecimento e à obtenção de aprendizagens essenciais para que o indivíduo possa enfrentar o mundo atual (ALVES, 2019). A Base Nacional Comum Curricular aponta dois tipos de habilidades a serem trabalhados sistematicamente. São eles: as habilidades intelectuais e as habilidades socioemocionais dos educandos. Elas devem ser trabalhadas durante todo o período educacional básico, de forma continuada e intencional, contribuindo para a construção de um sujeito autônomo, capaz de pensamento crítico. Em síntese, elas devem desenvolver o espírito investigador do aluno. O educando deve ser formado eticamente para a valorização dos direitos humanos, o respeito ao ambiente e à coletividade. Também deve ser fortalecido quanto a valores sociais como solidariedade, protagonismo e participação. Além disso, deve ser competente para praticar a crítica sistemática da ação humana, das 34 relações sociais, das relações de poder, das produções de conhecimentos e saberes. O papel da escola é contribuir para a formação de um sujeito que exerça sua cidadania e reconheça seu papel de agente de modificação do mundo. Nos textos referentes às habilidades, a BNCC faz assertivas que são constituídas por: Verbos — são indicadores do processo cognitivo referente àquela (s) habilidade (s) necessária (s) à efetiva aprendizagem do conteúdo; Complementos dos verbos — indicam o objeto de conhecimento a ser trabalhado e apresentam o conteúdo a ser mobilizado para que a habilidade se desenvolva; Modificadores do verbo ou do complemento — especificam a aprendizagem esperada ou explicitam o contexto no qual está inserido o fato (BRASIL, 2018a). As habilidades a serem desenvolvidas estão indicadas nas unidades temáticas. Cada título de unidade temática contém os objetos de conhecimento a serem trabalhados e a indicação da (s) habilidade (s) que deve (m) ser desenvolvida (s) durante a unidade. Alguns objetos de conhecimento pressupõem mais de uma habilidade e comportam conteúdos diversos. A norma não impede que outros conteúdos e/ou habilidades sejam trabalhados, apenas indica os conteúdos e habilidades mínimas e essenciais à aplicação correta de cada parte da unidade temática. No quadro a seguir, veja um exemplo. Ele se refere ao ensino de história no 2º ano (BRASIL, 2018a). A seguir, veja as indicações contidas nas habilidades. 35 Selecionar e compreender: verbos indicadores de processos cognitivos envolvidos no desenvolvimento da habilidade — nessa unidade temática, com esse determinado objeto de conhecimento. Objeto de conhecimento e indicação do conteúdo a ser trabalhado por meio dessa habilidade: o significado de objetos e documentos pessoais como fontes de memórias e histórias. Objeto de conhecimento e indicação do conteúdo a ser trabalhado por meio dessa habilidade: o significado de objetos e documentos pessoais como fontes de memórias e histórias. Um exemplo prático pode facilitar a sua compreensão. Considere que, para determinada aula, o professor solicita que os alunos tragam fotografias ou documentos como as identidades de membros da família. É possível demonstrar uma série de significados contidos nesses objetos. Supondo que um aluno leve a carteira de identidade de um de seus pais, quais serão os significados dos dados ali contidos? O que indicam? Para quem significam? Que memórias os nomes, datas e locais ali escritos evocam? Que relações estão inscritas em tal documento? (ALVES, 2019) A partir das respostas, é possível comparar o documento (identidade) com documentos de identificação utilizados em outras épocas, por outros órgãos ou em outros países, etc. Cabe ao professor ter fotos ou slides, ou mesmo exemplares à mão para possibilitar a comparação entre os documentos e a identificação pelos alunos dos dados solicitados, verificando quais são comuns a todos os documentos e quais são específicos de alguns. Para além disso, também podem ser explorados formatos, texturas e outros indicadores de temporalidades e espacialidades distintas (ALVES, 2019). Como você pode notar, é preciso ligar o conteúdo ao verbo e ao modificador. Você deve planejar a aula com foco no desenvolvimento das habilidades que resultam e atendem ao desenvolvimento das sete competências específicas da matéria e das 10 competências gerais elencadas pela BNCC. Nesse 36 processo, é fundamental refletir sobre a aplicação do conteúdo no cotidiano, de forma a efetivamente proporcionar ao aluno o desenvolvimento cognitivo e socioemocional esperado. Na Figura 2, a seguir, você vai ver como reconhecer o significado dos códigos alfanuméricos indicadores das habilidades a serem desenvolvidas em cada unidade temática proposta pela BNCC. É importante saber decodificá-los, pois poderão aparecer em documentos diversos ou provas. Eles indicam: o nível de ensino a que pertencem, o ano a que se referem dentro do nível, a disciplina e a posição da habilidade na numeração sequencial do ano ou bloco de anos (BRASIL, 2018a). 5.2 O que são unidades temáticas? As unidades temáticas, no âmbito da BNCC, são formadas por objetos do conhecimento agrupados em uma unidade de estudo cujo tema principal é descrito por elas. Elas expressam um arranjo possível entre diversos outros que poderiam ter sido realizados. 37 Há uma relação entre as diversas habilidades que compõem as unidades. Tais habilidades, como você viu, são noções essenciais que permitem aos alunos alcançar o nível de compreensão necessário para a aprendizagem dos objetos de conhecimento pertencentes a cada unidade temática. Por isso, as unidades se estruturam em segmentos que ampliam o conhecimento de forma espiral. No caso da história, há unidades diferenciadaspara cada ano. Cada unidade temática e seus respectivos objetos de conhecimento necessitam e/ou trabalham a partir da evolução e do desdobramento de certas habilidades. Esses elementos são trabalhados conjuntamente para o desenvolvimento das competências gerais da BNCC e das competências específicas da história. 38 6 PROPOSTAS DE AVALIAÇÃO DA BNCC COM FOCO NO ENSINO DE HISTÓRIA No subtítulo “Base Nacional Comum Curricular e Currículos”, é possível identificar uma comunhão de princípios e valores entre a Base e os currículos conforme orientações da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) e das DCNs. A BNCC reconhece o compromisso da educação com a formação e o desenvolvimento humano global nas dimensões: intelectual, física, afetiva, social, ética, moral e simbólica. Isso indica a complementaridade existente entre a BNCC e os currículos enquanto asseguradores das aprendizagens essenciais definidas para cada etapa educacional básica (ALVES, 2019). No que diz respeito à avaliação, a BNCC (BRASIL, 2018a, p. 17) propõe: “construir e aplicar procedimentos de avaliação formativa de processo ou de resultado que levam em conta os contextos e as condições de aprendizagem, tomando tais registros como referência para melhorar o desempenho da escola, dos professores e dos alunos”. Não há no documento proposta de criação de nenhum tipo de avaliação específica para as áreas de história ou de ciências humanas, seja em termos de avaliar o processo formativo do aluno, seja no quesito da avaliação em larga escala. Na verdade, a norma não menciona que concepção avaliativa é esperada, nem para a disciplina de história, nem para as demais. Com referência às avaliações, o Governo Federal sancionou o Decreto nº. 9.432, de 29 de junho de 2018, que regulamenta a Política Nacional de Avaliação e Exames da Educação Básica. Segundo o texto do Decreto (BRASIL, 2018b, documento on-line): Art. 2º São objetivos da Política Nacional de Avaliação e Exames da Educação Básica: I – diagnosticar as condições de oferta da educação básica; II – verificar a qualidade da educação básica; III – oferecer subsídios para o monitoramento e o aprimoramento das políticas educacionais; IV – aferir as competências e as habilidades dos estudantes; V – fomentar a inclusão educacional de jovens e adultos; e VI – promover a progressão do sistema de ensino. Art. 3º São princípios da Política Nacional de Avaliação e Exames da Educação Básica: 39 I – igualdade de condições para o acesso e a permanência do estudante na escola; II – garantia do padrão de qualidade; III – garantia do direito à educação e à aprendizagem ao longo da vida. Em seu artigo 4º, o decreto afirma que: integram a Política Nacional de Avaliação e Exames da Educação Básica: I – o Sistema de Avaliação da Educação Básica — Saeb; II – o Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos — Encceja; e III – o Exame Nacional do Ensino Médio — Enem. Nos arts. 5º, 6º e 7º, o texto refere-se individualmente aos exames e suas finalidades. No art. 8º, determina as responsabilidades do Ministério da Edu cação (MEC) e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) ante o previsto no decreto. Já no art. 9º, remete às fontes de financiamento para a implementação e a execução do previsto na lei. As propostas de avaliação elencadas pelo INEP (FINI, 2017) remetem à necessidade de que as matrizes de avaliação recebam referências curriculares claras. A ideia é que o currículo (implícito ou explícito) seja a base teórica sobre a qual se constrói a avaliação. São previstos dois tipos de avaliação: avaliação em larga escala e a avaliação da aprendizagem processual e formativa. As avaliações podem ser realizadas em diversos níveis: nacional, estadual, municipal e em sala de aula. Os resultados das avaliações em larga escala devem ser utilizados por professores de forma contextualizada e referenciada à matriz processual pela qual as avaliações foram realizadas. É preciso evitar problemas com o uso incorreto. Faz-se necessário perceber, identificar claramente a diferença entre os objetivos, metodologias e resultados obtidos pelas avaliações em larga escala e aqueles utilizados para a avaliação da aprendizagem processual e formativa dos alunos. No primeiro caso, avalia-se o sistema e o currículo; no segundo, o aluno (ALVES, 2019). O modo como proceder em relação às avaliações processuais formativas é uma lacuna não preenchida pela BNCC. E também ainda não desenvolvida com relação às revisões necessárias nas matrizes de avaliação. Deixado em aberto no 40 texto, esse elemento permite diversas interpretações, inclusive as que reduzem a avaliação à mera aplicação de certos procedimentos e sua associação apenas aos resultados. Pode-se presumir, pela intenção geral declarada no documento, que tal interpretação é incorreta, dado que a norma prevê o envolvimento e a participação das três esferas do poder, das famílias e da comunidade na composição do currículo, em suas especificidades regionais ou relativas às modalidades do ensino. Isso permite que as avaliações sejam preparadas para atender às necessidades avaliativas específicas de cada modalidade ou unidade/rede de ensino. A própria norma prevê as adequações curriculares. É possível presumir, portanto, que as avaliações formativas também são contempladas pelas adequações. Estas devem ser realizadas com base nos currículos e nos pressupostos indicados pela BNCC quanto às competências gerais e específicas e às habilidades e conteúdo a serem desenvolvidos em cada estágio. 6.1 Formas de avaliação São previstas duas formas de avaliação da educação. Uma é de cunho geral, chamada avaliação de larga escala. Ela é realizada nas esferas estadual, federal e internacional, com ênfase nas competências (saberes mais globais que exigem mais habilidades). A segunda é denominada avaliação de aprendizagem processual e formativa. É realizada em geral no ambiente escolar e, como o próprio nome anuncia, está voltada para a análise das aprendizagens essenciais elencadas para cada ano do processo formativo do educando. A seguir, você pode conhecer melhor cada uma delas (ALVES, 2019). Avaliação de larga escala Aplicadas a universos mais amplos do que a sala de aula, as avaliações em larga escala proporcionam condições de monitoramento do rendimento geral de uma rede ou sistema de ensino. Elas também são úteis para a computação de 41 dados e a construção de indicadores que, combinados a outras variáveis sociais e educacionais, permitem uma visão mais ampla da situação educacional. Para a construção dos indicadores, podem ser aproveitados dados resultantes de estudos populacionais ou amostrais. São exemplos de avaliações educacionais em larga escala: Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA), Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e Prova Brasil. A avaliação de larga escala tem por objetivo proporcionar ao Ministério da Educação e demais órgãos educativos informações a serem utilizadas na construção e na execução de políticas educacionais, assim como na fiscalização de sua implementação e cumprimento. A partir da BNCC, essas avaliações devem ser construídas de acordo com determinações expressas nos objetivos de aprendizagem descritos no texto da Base, no que se refere a competência gerais, competências específicas, conteúdos temáticos e objetos de aprendizagem. Cabe ressaltar que as competências, sejam elas gerais ou específicas, são construídas a partir do desenvolvimento das habilidades e de sua relação com os conteúdos. Efetivada a homologação da BNCC e a sua implantação, o esperado é que as matrizes de referência avaliativa sejam revistas e adequadas à norma (ALVES, 2019). A finalidade avaliativa foi contemplada pela BNCC por meio da descriçãoe da ordenação dos objetivos e habilidades a serem desenvolvidos. O formato desenvolvido permite que os textos referentes às habilidades sejam convertidos em descritores sobre os quais serão criadas as questões avaliativas de diversos graus de dificuldade. As questões serão pré-testadas de forma a “calibrar os itens” e, depois, reunidas em um banco de itens. Avaliação da aprendizagem processual e formativa Diferentemente da avaliação anterior, as referências da avaliação da aprendizagem processual e formativa devem ser construídas a partir da descrição detalhada das habilidades desenvolvidas no processo construtivo de determinados conhecimentos. A construção dessa matriz processual deve servir ao professor no 42 dia a dia. A ideia é que ele possa utilizar instrumentos diferentes para acompanhar o desenvolvimento de seus alunos. Diferentes divisões temporais para o ano letivo (bimestre, trimestre, semestre) podem ser indicadas a partir dessa matriz processual, permitindo adequações. A avaliação processual formativa tem três funções básicas: investigativa, de acompanhamento, tradicional ou somativa. Elas se referem respectivamente ao momento inicial do ano letivo, a todo o ano letivo e às temporalidades divisórias e/ou finais do ano letivo (bimestre, semestre, etc.). No que diz respeito às avaliações de aprendizagem processual e formativa, em princípio seu propósito e seu alcance são mais restritos em comparação com a avaliação de larga escala. A avaliação da aprendizagem processual e formativa serve principalmente para mensurar o desenvolvimento dos alunos e avaliar o aprendizado em sala de aula. Seus resultados permitem que professores e coordenadores repensem metodologias e técnicas de ensino de forma a facilitar o aprendizado do aluno. Ela também promove o acompanhamento do desenvolvimento dos educandos e auxilia no ajuste e na adaptação do conteúdo e da forma de compartilhá-lo com os alunos. (ALVES, 2019) Luckesi (2000) refere-se à necessidade de não confundir avaliação com exame. Veja como o autor se posiciona sobre o assunto: A avaliação da aprendizagem não é e não pode continuar sendo a tirana da prática educativa, que ameaça e submete a todos. Chega de confundir avaliação da aprendizagem com exames. A avaliação da aprendizagem, por ser avaliação, é amorosa, inclusiva, dinâmica e construtiva, diversa dos exames, que não são amorosos, são excludentes, não são construtivos, mas classificatórios. A avaliação inclui, traz para dentro; os exames selecionam, excluem, marginalizam (LUCKESI, 2000, p. 17). Embora não esteja descrito na norma, a BNCC parece contemplar a ideia de uma avaliação continuada focada mais nas competências desenvolvidas pelo educando do que no conteudismo. Quando o assunto é história, a compreensão dos processos históricos é prioridade em relação ao antigo conceito de ensino bancário praticado pela escola tradicional. Mais importante do que decorar nomes, datas e fatos históricos pontuais é que o aluno desenvolva as habilidades e competências necessárias para investigar, comparar, refletir e analisar fatos do passado e do 43 presente. Mais importante do que avaliar a capacidade de memorização do educando é avaliar o seu desenvolvimento cognitivo e socioemocional. Você deve ter em mente que a BNCC é um documento muito recente e que ainda está em fase de implantação. As escolas, redes e sistemas de ensino ainda terão de adequar seus currículos aos ditames da norma, de forma a pôr em prática suas exigências. Há todo um movimento em prol das mudanças nas formas de avaliação da aprendizagem. Tal movimento busca repensar antigas práticas de medição de fundo conteudista, pautadas antes na memorização do que no entendimento dos conhecimentos. A variação dos instrumentos de avaliação e da forma como são mensurados é um passo entre muitos que vêm sendo dados nesse sentido (ALVES, 2019). 7 TEMPO, TEMPORALIDADE E ENSINO DE HISTÓRIA A compreensão do tempo e da temporalidade é fundamental no ensino de história. Afinal, o próprio entendimento da história pressupõe uma concepção 44 temporal. Um dos principais desafios enfrentados pelos professores é fazer com que os alunos extrapolem a compreensão natural e física do tempo, que utilizam de forma pragmática para se orientar e que se relaciona a padrões de medida de intervalos e durações. O ensino de história deve permitir que os alunos compreendam o tempo como uma criação cultural e histórica, como produto de sociedades em diversos momentos e espaços (BAUER, 2018). O tempo histórico compreende o tempo cronológico, institucionalizado em calendários. Tal tempo possibilita referenciar os fatos segundo critérios de anterioridade e posterioridade, de sucessão e simultaneidade. Porém, extrapola a cronologia e a linearidade e abarca diferentes níveis e ritmos de durações temporais. A apreensão da noção de duração permite aos alunos estabelecer relações de continuidade e descontinuidade, de rupturas e permanências, favorecendo o aprendizado das relações entre passado, presente e futuro em cada momento histórico. Isso possibilita a compreensão da relação que cada sociedade mantém com o seu passado e com a projeção do futuro. Quanto à duração e aos ritmos das mudanças, Braudel (1978) estabeleceu uma diferenciação entre: Fenômenos de curta duração — fatos com datas e lugares determinados, marcados pela fugacidade; Fenômenos de média duração — relacionados a conjunturas, cujas mudanças se apresentam mais lentamente; Fenômenos de longa duração — que ocorrem em um tempo marcado pela continuidade e pela permanência, em que as transformações são quase imperceptíveis. Assim, a aprendizagem do tempo histórico pode ser aferida quando o aluno se reconhece como um sujeito histórico, capaz de situar-se no mundo em que vive, em suas diferentes esferas (família, comunidade, região, país, mundo). E, da mesma forma, quando ele consegue compreender o tempo como um conjunto de experiências, vinculadas à diversidade das manifestações culturais. 45 Os currículos de história, da educação básica ao ensino superior, passando pelos livros didáticos e pelos planos de ensino dos professores, geralmente explicitam uma compreensão temporal em que passado, presente e futuro apresentam-se de forma cronológica e linear, com princípios de sucessão e progresso. Ainda que a iniciativa de realizar uma “história integrada” seja uma característica dos livros didáticos mais recentes, essa integração se dá apenas por sincronicidade, já que os assuntos abordados na história geral e na história do Brasil muitas vezes não se relacionam. A periodização, nesse e em muitos outros casos, segue orientada por uma cronologia política marcada por tempos uniformes e sucessivos, em que as rupturas e as continuidades não são explicitadas. A abordagem do processo histórico a partir de um eixo espaço-temporal eurocêntrico (pense na divisão quadripartite da história — antiga, média, moderna e contemporânea — e nos episódios históricos a que ela faz referência), caracterizada por um processo evolutivo, homogêneo e sequencial, tem sido um dos fatores para que os alunos não se compreendam como sujeitos históricos, parte integrante e agente das mudanças e transformações da sociedade. Também é por isso que para muitos a história é o estudo do passado e pressupõe a “decoreba” de datas, fatos e nomes (BAUER, 2018). A historiografia moderna compreendia o passado a partir da percepção de um tempo linear, com marcos fixados em uma anterioridade em relação ao presente, caracterizando uma concepção de progresso e de evolução, transmutada para a compreensão do tempo histórico. Até a metade do século XX, então, a história reafirmava esse tipo de percepção de temporalidade e de passado: um passado imutável no tempo. Essa foi uma das principais ferramentas
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