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1 MÓDULO I: DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS ANA LUÍZA A. PAIVA – 5° PERÍODO 2022/2 Objetivos 1. Identificar os fatores predisponentes para tuberculose e sua epidemiologia. 2. Descrever as manifestações clínicas da tuberculose e a sua epidemiologia. 3. Propor a sequência de exames diagnósticos. 4. Propor o tratamento preconizado para essa doença e a profilaxia nos contactantes. 5. Analisar os aspectos sociais da tuberculose e suas implicações na dificuldade diagnóstica e no controle da doença no Brasil. REFERÊNCIAS Ministério da Saúde. Manual de Recomendações para o Controle da Tuberculose no Brasil. 2ª ed., 2019. Ministério da Saúde. Guia de Vigilância em Saúde. Brasília. 5ª ed., 2021. Ministério da Saúde. Recomendações para controle da tuberculose: guia rápido para profissionais de saúde. 2. ed. Brasília, 2021. INTRODUÇÃO E EPIDEMIOLOGIA A tuberculose (TB) é uma doença infecto- contagiosa, crônica, granulomatosa e necrosante causada na maioria dos casos pelo bacilo Mycobacterium tuberculosis, também chamado de Bacilo de Koch (BK). Estima-se que em 2019, no mundo, cerca de 10 milhões de pessoas desenvolveram TB e 1,2 milhão morreram devido à doença. Em relação ao Brasil, o país continua entre os 30 países de alta carga para a TB. Em 2020, o Brasil registrou 66.819 casos novos de TB e em 2019, foram notificados cerca de 4,5 mil óbitos pela doença. No Brasil, de 2011 a 2020 os maiores coeficientes de incidência de TB (acima de 51 casos/100 mil hab.) foram observados nos estados do Rio de Janeiro, Amazonas e Acre. Não há uma epidemia de tuberculose no Brasil, mas concentrações dos casos da doença: pessoas vivendo com HIV, em situações de rua e privadas de liberdade, população indígena, pessoas vivendo em aglomerados ou em situação de pobreza são as mais acometidas pela doença no país. Todos os casos confirmados de tuberculose devem ser notificados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), por meio da ficha de notificação/ investigação. ETIOLOGIA A TB pode ser causada por qualquer uma das 7 espécies que integram o complexo Mycobacterium tuberculosis: M. tuberculosis, M. bovis, M. africanum, M. canetti, M. microti, M. pinnipedi e M. caprae. Tuberculose Problema 05 2 MÓDULO I: DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS ANA LUÍZA A. PAIVA – 5° PERÍODO 2022/2 Em saúde pública, a espécie mais importante é a M. tuberculosis, conhecida também como bacilo de Koch (BK). O M. tuberculosis é fino, ligeiramente curvo, é um bacilo álcool-ácido resistente (BAAR), aeróbio, com parede celular rica em lipídios, o que lhe confere baixa permeabilidade, reduz a efetividade da maioria dos antibióticos e facilita sua sobrevida nos macrófagos. TRANSMISSÃO O Mycobacterium tuberculosis é transmitido por via aérea, quando a pessoa com tuberculose, tanto pulmonar como laríngea, tosse, fala ou espirra, eliminando bacilos no ambiente e infectando pessoas saudáveis. O termo “bacilífero” refere-se a pessoas com TB pulmonar ou laríngea que tem baciloscopia positiva no escarro. Esses casos têm maior capacidade de transmissão, entretanto pessoas com outros exames bacteriológicos como cultura e/ou Teste Rápido Molecular da Tuberculose (TRM- TB) positivos também podem transmitir. Outras vias de transmissão (pele e placenta) são raras e desprovidas de importância epidemiológica. A chance de uma pessoa se infectar após contato com um paciente bacilífero depende da concentração de bacilos expelidos pelo paciente tuberculoso, da intensidade e frequência do contato, de condições ambientais e da resistência natural do indivíduo exposto. O bacilo é sensível à luz solar, e a circulação de ar possibilita a dispersão de partículas infectantes. Com isso, ambientes ventilados e com luz natural direta diminuem o risco de transmissão. O risco de transmissão da TB perdura enquanto o paciente eliminar bacilos no escarro. Com o início do tratamento, a transmissão tende a diminuir gradativamente e, em geral, após 15 dias, ela encontra-se muito reduzida. O risco de adoecimento, depende de fatores endógenos, em especial da integridade do sistema imune. O maior risco de adoecimento para a TB descrito é a infecção pelo HIV. Dentre outros fatores conhecidos, destacam-se a idade menor que 2 anos ou maior que 60 anos e a presença de determinadas condições clínicas (doenças e/ou tratamentos imunossupressores). A infecção prévia pelo M. tuberculosis não confere imunidade e recidivas podem ocorrer. Crianças menores de 10 anos com TB pulmonar geralmente têm baciloscopia negativa e, por isso, costumam ter pouca participação na transmissão da doença. As formas exclusivamente extrapulmonares não transmite a doença. FISIOPATOLOGIA Portanto, a fase inicial da tuberculose (primeiras 3 semanas) no paciente não sensibilizado é caracterizada por proliferação bacilar no interior dos macrófagos alveolares e espaços aéreos com bacteremia e nidação de múltiplos locais. Apesar da bacteremia, a maioria das pessoas nessa fase é assintomática ou apresenta doença similar a uma gripe discreta. Há então, posterior ativação dos receptores da imunidade inata, e uma resposta Th1 é montada após 3 semanas, e essa resposta Th1 irá produzir o IFN-gama, que estimula a destruição do macrófago infectado, destruindo organelas danificadas e patógenos intracelulares como o M. tuberculosis. Porém, essa mesma resposta Th1 que estimula os macrófagos e destrói micobactérias, gera a formação de granulomar e necrose caseosa. Após a infecção primária, 95% dos indivíduos entrarão em estado de latência, que é mantida pelo sistema imunológico ativo e competente - a evidência disso ocorre na reativação da tuberculose em momentos de imunodepressão. Essa reativação da doença em hospedeiro com imunidade pré-existente gera resposta inflamatória intensa, com formação de granulomas caseosos e, posteriormente – caso o pulmão esteja envolvido – de cavitação pulmonar. Devido à inflamação gerada nesse processo, há apoptose intensa, depletando as células T ativas contra o patógeno. 3 MÓDULO I: DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS ANA LUÍZA A. PAIVA – 5° PERÍODO 2022/2 QUADRO CLÍNICO TUBERCULOSE PULMONAR Principais sintomas: • Tosse com duração de 3 semanas ou mais • Febre vespertina • Sudorese noturna • Emagrecimento e cansaço TB pulmonar primária: mais comum em crianças. Geralmente o paciente apresenta-se irritadiço, com febre baixa, sudorese noturna e inapetência. Nem sempre a tosse está presente. TB pulmonar pós-primária ou secundária: mais comum no adolescente e no adulto jovem. Tem como característica principal a tosse seca ou produtiva. Nos casos em que a tosse é produtiva, a expectoração pode ser purulenta ou mucoide, com ou sem sangue. A febre vespertina, sem calafrios, não costuma ultrapassar os 38,5 °C. A sudorese noturna e a anorexia são comuns A ausculta pulmonar pode apresentar diminuição do murmúrio vesicular, sopro anfórico ou mesmo ser normal. TB miliar: refere-se a um aspecto radiológico pulmonar específico, que pode ocorrer tanto na forma primária quanto na forma secundária da TB. É uma forma grave da doença, que é mais comum em pacientes imunocomprometidos, como pessoas infectadas com HIV. Os sintomas como febre, astenia, emagrecimento e tosse ocorrem em 80% dos casos. O exame físico pode mostrar hepatomegalia (35% dos casos), alterações do sistema nervoso central (30% dos casos) e alterações cutâneas do tipo eritemato-máculo-pápulo-vesiculosas (incomum). TUBERCULOSE EXTRAPULMONAR As apresentações extrapulmonares da TB têm seus sinais e sintomas dependentes dos órgãos ou sistemas acometidos. TB pleural: forma mais comum de TB extrapulmonar em pessoasnão infectadas pelo HIV. Ocorre mais em jovens e cursa com dor torácica do tipo pleurítica. Empiema pleural tuberculoso: ocorre ruptura de uma cavidade tuberculosa para o espaço pleural e, por isso, além de líquido no espaço pleural, muitas vezes ocorre também pneumotórax secundário à fístula broncopleural. TB ganglionar periférica: forma mais frequente de TB extrapulmonar em pessoas vivendo com HIV e em crianças. Cursa com aumento subagudo, indolor e assimétrico das cadeias ganglionares cervicais anterior e posterior, além da supraclavicular. TB meningoencefálica: a meningite basal exsudativa é a apresentação clínica mais comum e é mais frequente em crianças abaixo dos seis anos de idade. TB pericárdica: os principais sintomas são dor torácica, tosse seca e dispneia. TB óssea: Atinge mais a coluna vertebral e as articulações coxofemoral e do joelho, embora possa ocorrer em outros locais. A TB de coluna (mal de Pott) afeta mais comumente a coluna torácica baixa e a lombar e seu quadro clínico apresenta-se com a tríade dor lombar, dor à palpação local e sudorese noturna. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL FORMA PULMONAR Na forma pulmonar, o diagnóstico diferencial deve ser feito principalmente com silicose, infecções fúngicas, neoplasias, infecções bacterianas, outras micobacterioses, doenças autoimunes, embolia pulmonar, entre outras. 4 MÓDULO I: DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS ANA LUÍZA A. PAIVA – 5° PERÍODO 2022/2 DIAGNOSTICO Baciloscopia de escarro: deve ser realizada em duas amostras: uma coletada no momento da identificação da pessoa com sintoma respiratório e outra amostra na manhã do dia seguinte, preferencialmente ao despertar. Indicações: sintomático respiratório; suspeita clínica e/ou radiológica de TB pulmonar ou laríngea, independentemente do tempo da tosse; suspeita clínica de TB extrapulmonar; acompanhamento e controle mensal do tratamento. Obs: baciloscopia positiva + quadro clínico compatível com TB consolidam o diagnóstico e fundamentam o início de tratamento da TB. Teste Rápido Molecular para Tuberculose (TRM-TB): está indicado, prioritariamente, para o diagnóstico de tuberculose pulmonar e laríngea em adultos e adolescentes. Detecta o DNA do complexo M. tuberculosis (MTB) e de cepas resistentes à rifampicina. O teste apresenta o resultado em 2 horas, necessitando somente de uma amostra de escarro. Indicações: diagnóstico de casos novos de TB pulmonar e extrapulmonar e na triagem de resistência à rifampicina nos casos de retratamento, de falência ao tratamento da TB ou de suspeita de resistência. Cultura, identificação de espécies e teste de sensibilidade: a cultura é um método de elevada especificidade e sensibilidade no diagnóstico da TB. O resultado da cultura confirma o diagnóstico de micobacteriose, sendo necessária a identificação de espécie para caracterizar se é um caso de TB ou outra micobactéria. O teste de sensibilidade (TS) detecta a resistência dos isolados de Mycobacterium tuberculosis aos medicamentos utilizados no tratamento da TB. Indicações: • Locais com acesso ao TRM-TB: todo caso com diagnóstico de TB por meio de TRM-TB deve realizar cultura e TS, independentemente de apresentar ou não resistência à rifampicina; todo caso com suspeita de TB com TRM-TB não detectado, com persistência do quadro clínico, deverá realizar cultura e TS. • Locais sem acesso ao TRM-TB: nessas situações, o diagnóstico da doença será realizado por meio de baciloscopia. Prova Tuberculínica (PT): inoculação intradérmica de um derivado proteico purificado do M. tuberculosis. Finalidade-> medir a resposta imune celular a estes antígenos. Avaliar contatos assintomáticos de pessoas com tuberculose, uma vez que é utilizada em adultos e crianças no diagnóstico da infecção latente de tuberculose (ILTB) ou na criança que não consegue fazer o escarro. (+ a partir de 2-10 sem após infecção). EXAMES COMPLEMENTARES Radiografia de tórax Deve ser solicitada para toda pessoa com suspeita clínica de TB pulmonar, de forma complementar aos exames laboratoriais. Podem ser observados vários padrões radiológicos sugestivos de atividade de doença, como cavidades, nódulos, consolidações, massas, processo intersticial (miliar), derrame pleural e alargamento de mediastino. Diagnóstico histopatológico É realizado para o diagnóstico das formas extrapulmonares ou nas formas pulmonares difusas de difícil diagnóstico. Lesão sugestiva de tuberculose é o granuloma com necrose caseosa. Não se trata de uma lesão patognomônica de tuberculose; porém, com clínica sugestiva, o tratamento pode ser indicado. 5 MÓDULO I: DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS ANA LUÍZA A. PAIVA – 5° PERÍODO 2022/2 Teste para diagnóstico de HIV Realizar o teste para diagnóstico do HIV em todas as pessoas com tuberculose. TRATAMENTO Os medicamentos antiTB, em geral, interferem no sistema enzimático do bacilo ou bloqueiam a síntese de algum metabólito essencial para o seu crescimento. Os medicamentos devem ser tomados em jejum, pela manhã. Aguardar pelo menos uma hora antes de ingerir algum alimento. O esquema de tratamento da TB de acordo com as recomendações do Ministério da Saúde, compreende 2 fases: a intensiva (ou de ataque), e a de manutenção. Fase intensiva: tem o objetivo de reduzir rapidamente a população bacilar e a eliminação dos bacilos com resistência natural a algum medicamento. Para tal, são associados medicamentos com alto poder bactericida. Fase de manutenção: tem o objetivo de eliminar os bacilos latentes ou persistentes e a redução da possibilidade de recidiva da doença. Nessa fase, são associados 2 medicamentos com maior poder bactericida e esterilizante. Os medicamentos usados nos esquemas padronizados para a TB sensível em adultos e adolescentes são a isoniazida (H), a rifampicina (R), a pirazinamida (Z) e o etambutol (E), sendo 4 medicamentos na fase intensiva e 2 na de manutenção, em dose fixa combinada. Para crianças menores de 10 anos, o tratamento se faz com a rifampicina (R), a isoniazida (H) e a pirazinamida (Z), 3 medicamentos na fase de ataque e 2 na fase de manutenção. PREVENÇÃO CONTROLE DE CONTACTANTES Pessoas infectadas pelo M. tuberculosis que não apresentam TB ativa são identificadas como portadores da Infecção Latente pelo M. tuberculoisis (ILTB ). Recomenda-se o tratamento da infecção latente pelo M. tuberculosis (ILTB) para pessoas infectadas, identificadas por meio da prova tuberculínica (PT) ou Interferon-Gamma Release Assays (IGRA), quando apresentam risco de desenvolver TB. Atenção: antes de efetuar o tratamento da ILTB deve-se: (a) afastar definitivamente a tuberculose ativa (b) realizar a notificação por meio da “Ficha de notificação das pessoas em tratamento de ILTB”. O tratamento da ILTB reduz o risco de adoecimento por TB ativa, e é realizado, preferencialmente, com isoniazida, podendo ser indicado, em alguns casos, o uso de rifampicina ou rifapentina + isoniazida. 6 MÓDULO I: DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS ANA LUÍZA A. PAIVA – 5° PERÍODO 2022/2 Prevenção da infecção tuberculosa em recém- nascidos (RN) Recém-nascidos (RN) expostos a casos de TB pulmonar ou laríngea podem ser infectados pelo M. tuberculosis (MTB) e desenvolver formas graves da doença. Nessas situações, recomenda-se a prevenção da infecção pelo MTB. O RN não deverá ser vacinado com a BCG ao nascer. Recomenda-se utilizar a isoniazida (H) por 3 meses e, após esse período, faz-se a prova tuberculínica (PT). -Se o resultado da PT for ≥ 5mm, a H deve ser mantida por mais 3 meses, completando seis meses de tratamento, e o RN não deverá ser vacinado para BCG, uma vez que já apresenta resposta imune ao bacilo da tuberculose. -Casoresultado da PT < 5mm, a H deve ser interrompida e a vacinação para BCG efetuada. -Caso o RN tenha sido inadvertidamente vacinado, recomenda-se o uso de H por seis meses e não está in dicada a realização da PT . IMUNIZAÇÃO COM BCG A vacina BCG utilizada no Brasil é preparada com bacilos vivos atenuados, a partir de cepas do M. bovis, e apresenta eficácia em torno de 75% contra as formas miliar e meníngea da TB, em indivíduos não infectados pelo M. tuberculosis. O esquema de vacinação corresponde à dose única de 0,05 mL ou 0,1 mL, e deve ser administrada o mais precocemente possível, preferencialmente logo após o nascimento. 7 MÓDULO I: DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS ANA LUÍZA A. PAIVA – 5° PERÍODO 2022/2 A vacina é administrada por via intradérmica, na inserção do músculo deltoide direito A vacina BCG é prioritariamente indicada para crianças de zero a 4 anos, 11 meses e 29 dias, conforme as recomendações a seguir A vacina BCG está contraindicada nas situações elencadas a seguir: • A partir dos 5 anos de idade, nenhuma pessoa deve ser vacinada com BCG (mesmo profissionais de saúde e/ou grupos com maior vulnerabilidade), exceto pessoas contatos de hanseníase. • Indivíduos a partir dos 5 anos de idade portadores de imunodeficiência congênita ou adquirida, mesmo que assintomáticos e sem sinais de imunodeficiência. • Indivíduos acometidos de neoplasias malignas. • Pessoas em tratamento com corticosteroides em dose elevada (equivalente à dose de prednisona de 2 mg/kg/dia, para crianças com até 10 kg, ou de 20 mg/dia ou mais, para indivíduos acima de 10 kg) por período superior a duas semanas. • Pessoas em uso de outras terapias imunodepressoras (quimioterapia antineoplásica, radioterapia, entre outros). • Recém-nascidos de mães que utilizaram, durante os dois últimos trimestres da gestação, drogas imunomoduladoras que atravessam a barreira placentária, tais como anti-TNF (adalimumabe, infliximabe, entre outros).
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