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DIREITOS HUMANOS 2020 Elton Rodrigo da Silva ESTUDO DO SER HUMANO CONTEMPORÂNEO ESTUDO DO SER HUMANO CONTEMPORÂNEO 2020 Camila de Oliveira Casar Douglas Ochiai Padilha Luiz Augusto de Mattos Osmar Ponchirolli Paulo Moacir Godoy Pozzebon PRESIDENTE Frei Thiago Alexandre Hayakawa, OFM DIRETOR GERAL Jorge Apóstolos Siarcos REITOR Frei Gilberto Gonçalves Garcia, OFM VICE-REITOR Frei Thiago Alexandre Hayakawa, OFM PRÓ-REITOR DE ADMINISTRAÇÃO E PLANEJAMENTO Adriel de Moura Cabral PRÓ-REITOR DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO Dilnei Giseli Lorenzi COORDENADOR DO NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - NEAD Renato Adriano Pezenti GESTOR DO CENTRO DE SOLUÇÕES EDUCACIONAIS - CSE Fernando Rodrigo Andrian CURADORIA TÉCNICA Mônica Bertholdo DESIGNER INSTRUCIONAL Abner Pereira de Almeida REVISÃO ORTOGRÁFICA Giovana Stimpel Amaral PROJETO GRÁFICO Impulsa Comunicação DIAGRAMADORES Daniel Landucci CAPA Jean dos Santos Mendonça © 2020 Universidade São Francisco Avenida São Francisco de Assis, 218 CEP 12916-900 – Bragança Paulista/SP CASA NOSSA SENHORA DA PAZ – AÇÃO SOCIAL FRANCISCANA, PROVÍNCIA FRANCISCANA DA IMACULADA CONCEIÇÃO DO BRASIL – ORDEM DOS FRADES MENORES CAMILA DE OLIVEIRA CASARA Mestre em Filosofia – Ética e Política, pela Universidade Federal do Paraná (2012). Gra- duada em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Paraná (2008). DOUGLAS OCHIAI PADILHA Doutor em Sociologia, na modalidade sanduíche, pela Universidade Federal do Paraná e pela Université Paris Ouest Nanterre La Défense. Mestre em Sociologia pela UFPR (2008) na linha de pesquisa Ruralidades e Meio Ambiente. Graduado em Ciências So- ciais pela UFPR (2005), atuando principalmente nas seguintes áreas: sociologia am- biental, sociologia rural, teoria ator-rede, nova sociologia econômica e redes de movi- mentos sociais. Atualmente, é professor na FAE Centro Universitário. LUIZ AUGUSTO DE MATTOS Doutor em Teologia Moral pela Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção (2000). Mestre em Teologia Dogmática pela Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção (1984); e em Teologia pelo Centro Universitário Assunção (2009). Graduado em Estudos Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (1976); em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1981); e em Geografia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (1976). Atualmente, é professor do Instituto Teológico de São Paulo, da Universidade São Francisco e da UNISAL. As- sessor da CRB Regional de São Paulo, membro e coordenador da equipe interdiscipli- nar CRB Nacional. Também é assessor de dioceses e congregações religiosas. OSMAR PONCHIROLLI Doutor em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina. Mes- tre em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina. Gradu- ado em Filosofia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Dom Bosco (1988); e em Teologia pela Studium Theologicum (1994). Atualmente, é professor da FAE Centro Universitário. Professor pesquisador do grupo Economia Política do Poder em Estudos Organizacionais e Observatório Interdisciplinar em Economia Política do Poder. Pes- O AUTOR PAULO MOACIR GODOY POZZEBON Mestre em Lógica e Filosofia da Ciência (Área de Concentração Filosofia Política) pela Universidade Estadual de Campinas (1995). Licenciatura Plena em Filosofia pela Pon- tifícia Universidade Católica de Campinas (1985). Atualmente, é professor da Pontifícia Universidade Católica de Campinas e da Universidade São Francisco. Tem experiência na área de Filosofia, com ênfase em Metodologia da Pesquisa Científica e do Trabalho Científico e Filosofia Política, atuando principalmente nos seguintes temas: metodologia científica, educação, filosofia política, ética e filosofia. Possui também experiência na área de gestão. quisador na linha de epistemologia e teoria crítica; complexidade e redes em estudos organizacionais. Líder do grupo de pesquisa sobre Teoria do Reconhecimento e Orga- nizações da FAE Centro Universitário. SUMÁRIO Caixas de destaque ....................................................................................................... 7 UNIDADE 01: O Ser Humano e a Formação Cultural do Ocidente: Modernidade, Pós-Modernidade e Globalização ..................................................................................8 1. A mordernidade: surgimento e transformações ...................................................... 9 2. A questão da pós-modernidade: a sociedade pós-industrial e a cultura pós-moderna ..13 3. A globalizção e suas principais características e a crítica do conhecimento........ 20 UNIDADE 02: Expressões e Processos do Conhecimento e o Humano como ser Multi- facetário e Relacional ...................................................................................................28 1. Informações e conhecimentos ..............................................................................28 2. O humano - quem é ele? .......................................................................................40 UNIDADE 03: Ecologia e Pensamento Ecológico: Questões Ecológicas e Educação Ambiental........................................................................................................... ...........54 1. Reconhecendo os desafios ambientais..................................................................54 2. Educação ambiental...............................................................................................57 3. O desenvolvimento sustentável ............................................................................58 4. Consumo, pobreza e meio ambiente ....................................................................61 5. Ameaças ambientais .............................................................................................63 6. Riscos ambientais .................................................................................................65 UNIDADE 04: Dimensões Políticas, Sociais e o Fenômeno Religioso ........................70 1. A política: seu nascimento e transformações ........................................................70 2. O fenômeno religioso ............................................................................................77 Importante entender! É um espaço dedicado a entender os conceitos centrais do conteúdo. Para refletir Espaço para questionamento sobre o assunto. Situação hipotética para reflexão e compreensão sobre o tema estudado. Exemplo Momento para se apresentar uma situação real do assunto trabalhado. Leis Lei ou artigo de extrema importância para o aprofundamento do aluno. Leitura fundamental Livros e textos imprescindíveis para o desenvolvimento da aprendizagem do aluno. Sugestão de leitura Apresentação de leituras interessantes para o aluno, relacionadas ao tema. Relembre Pontos fundamentais que guiarão o aluno. São nortes que o ajudarão a interpretar o texto. Curiosidades Fato, acontecimento histórico ou ponto curioso relacionado ao tema abordado. Saiba mais Livros e textos imprescindíveis para o desenvolvimento da aprendizagem do aluno. Glossário Termos e siglas específicas sobre o tema tratado na unidade. Pesquise Apresentação de fontes para que o aluno explore mais o conteúdo abordado. Serão apresentados: livros, sites, reportagens, dissertações, vídeos, revistas, etc. significado das CAIXAS DE DESTAQUE O Ser Humano e a Formação Cultural do Ocidente: Modernidade, Pós-Modernida- de e Globalização 8 1 UNIDADE 1 O SER HUMANO E A FORMAÇÃO CULTURAL DO OCIDENTE: MODERNIDADE, PÓS- MODERNIDADE E GLOBALIZAÇÃO INTRODUÇÃO Esta Unidade de Estudo abordará os tópicos sobre o surgimento e as transformações da modernidade, a sociedade pós-industrial e a cultura pós-moderna, e as caracterizações da globalização. Veremos que o surgimento e o desenvolvimento de um período histórico específico e importantíssimo, chamado modernidade, atinge a todos nós de maneiras diversas,desde a organização de nossas instituições sociais mais básicas como família, religião etc. às nossas concepções políticas. A todos aqueles e aquelas que desejam for- mar consciência crítica e reflexiva sobre suas vidas e os contextos sociais, econômicos, culturais e políticos em que estamos submersos, recomendamos a leitura atenta desta Unidade de Estudo. Estudaremos a modernidade, com suas características marcantes, acontecimentos principais e, como sempre, suas idiossincrasias fundamentais. Assim, apresentaremos logo no início algumas das transformações históricas cabais para definir este período, como o Renascimento e a Revolução Industrial. Longe de serem apenas fatos históricos, esses dois eventos marcam o surgimento de uma nova mentalidade social: surge um novo modo de vida, de produção, de se relacionar e co- nhecer o mundo. A relevância do renascimento e da revolução industrial é inegável para entendermos as transformações pelas quais passou o mundo. De maneira definitiva, nada mais será como antes após estes acontecimentos. Em seguida, para nos aprofundarmos e entendermos ainda mais sobre os efeitos da modernidade, essa interessante época histórica, apresentaremos algumas ideias de um importante sociólogo inglês chamado Anthony Giddens. Este pensador é responsável por um dos mais relevantes estudos sobre o tema; suas ideias são apresentadas em seu livro: As Consequências da Modernidade, de 1991. Conhecer um pouco das ideias trabalhadas neste livro contribuirá, e muito, para ampliar as possibilidades de entendi- mento do período denominado modernidade. Estudaremos, também, as principais características da globalização: como surge, por que se intensifica, os elementos mais importantes responsáveis pela sua intensificação a partir dos anos 1980, e as consequências desse processo na definição de novas iden- tidades serão algumas das abordagens. O objetivo desta Unidade de Estudo é modesto: esperamos que você possa agu- çar seu olhar para as transformações sociais que o envolve e circunda muitas vezes de maneira invisível e natural, mas, mesmo assim, irreversível. Esperamos, 9Estudo do Ser Humano Contemporâneo 1ainda, que a leitura aqui proposta aguce suas indagações e desperte seu olhar para as principais consequências da modernidade. A caracterização da história em períodos, como Antiguidade, Idade Média e Modernidade, sempre foi assinalada por determinados acontecimentos, que engendram certas rupturas com a ordem anterior, faz sentido quando se pensa em modificação da vida social, política, cultural, religiosa em uma parte do mundo, isto é, na Europa. Continentes como Ásia, Oceania e América foram posteriormente influenciados pelo modo de vida europeu; isto quer dizer que outras partes do mundo, embora já conhecidas, mantinham estruturas de pensamento, organização social, política e religiosa diversas. Portanto, as transformações aqui narradas só farão sentido para o continente euro- peu, o que não invalida a curiosidade e a necessidade de conhecimento sobre este tema. Esta parte do globo foi e será continente de irradiação de um modo de orga- nização social, política, econômica que arrebata todos os outros. Será em função da importância e da influência deste continente na constituição das outras partes do mundo que apresentaremos as características principais da chamada modernidade. A despeito das diversas possibilidades de entendimento sobre o surgimento da modernidade pelos historiadores, o Renascimento e a Revolução Industrial representam marcos históricos importantes e contribuem para solapar um modo de vida e possibilitar a irrupção de outro. 1.1 RENASCIMENTO 1. A MODERNIDADE: SURGIMENTO E TRANSFORMAÇÕES O período que se convencionou denominar como “modernidade” envolve uma série de acontecimentos no campo da política, da cultura, da religião etc. Entre os historiadores, não há consenso quanto a datas formais para o início deste período. O que se pode afir- mar, portanto, é que o início da modernidade engloba uma série de transformações que modificam radicalmente a vida de uma parte do mundo, mais especificamente, a Europa. Vista de Florença/Itália. Praça Piazzale Michelangelo. Fonte: 123R F. O período que será agora tratado re- presentou uma transformação impor- tantíssima para a humanidade. O Re- nascimento irá inaugurar uma nova fase de conhecimento e descoberta que influenciará decisivamente o oci- dente. Vamos entender por quê. O Ser Humano e a Formação Cultural do Ocidente: Modernidade, Pós-Modernida- de e Globalização 10 1 Novas doutrinas religiosas, que propuseram leituras interpretativas dos tex- tos sagrados, surgiram como forte contribuição às mudanças e ao estabele- cimento de outra mentalidade. A partir do século XVI o movimento denomi- nado de Reforma Protestante questionava o poder clerical. Este movimento foi fundamental para que o “novo homem” redescobrisse a possibilidade do questionamento baseado na própria razão. “O conhecimento deixa de ser encarado como uma revelação, resultante da contemplação e da fé, para voltar a ser, como o fora para os gregos e romanos, o resultado de uma bem conduzida atividade do pensamento” (COSTA, 2005, p. 30). Isso pode ser afirmado porque muitas mudanças importantes ocorreram na Europa a partir do século XV; e estas mudanças serão as bases para a estrutura das socie- dades contemporâneas. A estrutura da sociedade feudal já não dava mais conta das transformações sociais, econômicas e políticas que assolavam a Europa. Esta estrutura, agrária em sua essência, mantinha nas mãos da nobreza e do clero o poder econômico e político. O desenvolvimento das ciências, portanto, pode ser entendido como resultado destas transformações em curso na Europa renascentista. 01. Estrutura feudal 03. Doutrinas religiosas 04. Desenvolvimento da ciência O Renascimento, mais do que a maioria dos diversos momentos históricos susci- ta grandes controvérsias. Há quem veja nesse movimento filosófico e artístico o momento de ruptura entre o mundo medieval – com suas características de so- ciedade agrária, estamental, teocrática e fundiária – e o mundo moderno urbano, burguês e comercial (COSTA, 2005, p. 28). Foram as expansões marítimas (com a circumnavegação da África e o des- cobrimento da rota para as Índias e América), os excedentes de produção e o desenvolvimento de atividades comerciais, que contribuíram fortemente para que este sistema entrasse em colapso. Assim, tornou-se cada vez mais presente uma nova mentalidade: mais laica e mais centrada em preo- cupações materiais e, principalmente, no homem. 02. Expansões marítimas 11Estudo do Ser Humano Contemporâneo 1 O crescimento das cidades, do comércio, e, sobretudo, das transações co- merciais engendradas pelas terras recémdescobertas na América obrigaram o homem medieval a “abrir mão” de velhas estruturas explicativas e dar lugar ao novo e surpreendente mundo que agora se estabelecia. Foi neste cenário que a forma de produção e organização política se modificou para sempre. 05. Crescimento das cidades 1.2 REVOLUÇÃO INDUSTRIAL – O PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO Os séculos subsequentes às mudanças iniciais não foram menos turbulentos. Uma nova maneira de se produzir, a partir do século XVII foi inaugurada: a riqueza passou a ser oriunda de indústrias e grandes máquinas, estas estavam geralmente alocadas em cidades grandes e superpopulosas; pertenciam a uma nova classe economicamente poderosa denominada burguesia industrial, ao passo que eram operadas por uma também recente classe social, denominada proletariado. Neste período, chamado de Revolução Industrial, o trabalho e a estrutura social ganharam contornos radicalmente novos. O conhecimento científico aperfeiçoou as técnicas de produção: aumentan- do a produtividade das máquinas e os lucros, e diminuindo o uso da mão de obra. Este período ficou marcado pelo fenômeno da maquinofatura. Fonte: 123R F. O que era produzido manualmente pelos artesãos passoua ser feito por máquinas, aumentando muito o volume de produção de mercadorias. Anthony Giddens, um importante pensador inglês sobre o tema da modernidade, pode nos ajudar a entender melhor esta fase histórica por meio da seguinte afirmação: O Ser Humano e a Formação Cultural do Ocidente: Modernidade, Pós-Modernida- de e Globalização 12 1 Como podemos perceber, Giddens nos esclarece sobre a radicalidade da mudança tra- zida pela nova forma de viver e se organizar da Europa. Esta nova fase trouxe também consequências importantes para os séculos seguintes. Será com base nas principais ideias deste autor sobre as caracterizações e perigos trazidos pela modernidade, que iniciaremos o segundo tópico desta Unidade. 1.3 OS EFEITOS DA MODERNIDADE Em seu livro de 1991 chamado As Consequências da modernidade, Anthony Gid- dens caracteriza este período histórico e apresenta os principais efeitos da modernida- de para o mundo ocidental. O autor a define da seguinte maneira: “Modernidade refere-se a estilo, costume de vida ou organização social que emergiram na Europa a partir do século XVII e que ulteriormente se tornaram mais ou menos mun- diais na sua influência” (GIDDENS, 1991). Isto é, um período em que a maneira de organização das instituições sociais, políticas e econômicas passam a operar diferentemente da anterior e paulatinamente vão sendo incorporadas por todo o mundo. As principais características das novas instituições da modernidade que se diferenciam do período anterior, segundo Giddens, serão: o ritmo de mudança, o escopo da mudan- ça e a natureza intrínseca das instituições modernas. Vamos entender mais especificamente cada uma delas: A Revolução Industrial do final do século XVIII e do XIX transformou radicalmente as condições materiais de vida e os modos de ganhar dinheiro para sempre, tra- zendo com isso, pelo menos inicialmente, muitos problemas sociais novos, como a superlotação urbana, a falta de saneamento e as doenças que a acompanham, e a poluição industrial em uma escala sem precedentes (GIDDENS, 2012, p. 63). O ritmo de mudança Natureza intrínseca das instituições modernas 01 03 02 Fonte: Giddens (1991) Escopo da mudança Segundo Giddens (1991), alguns tipos de organização social não se encontram em outras épocas históricas, apenas na modernidade. É o caso do estado-nação, a necessidade de grandes fontes produtoras de energia, o surgimento da mercadoria e do trabalho assalariado. Isto é, o alvo das mudanças trazidas pela modernidade por intermédio do uso da tecnologia mais incisivamente, partes do globo são colocadas em conexão e as transfor- mações sociais acontecem em todo o planeta. A rapidez com que as mudanças acontecem na modernidade é extrema; isso pode ser entendido como resultado do desenvolvimento da tecnologia, porém esta movimentação também é observada em outras esferas. 13Estudo do Ser Humano Contemporâneo 1Prosseguindo em sua caracterização da modernidade, Anthony Giddens ressalta a im- portância que alguns debates adquirem neste período. As preocupações com o meio ambiente e a instrumentalização da natureza como fonte geradora de riqueza eco- nômica são discussões que só farão sentido no contexto moderno. O autor entende que foi somente neste contexto histórico específico que as “forças de produção” adquiriram um potencial tão destrutivo em relação ao meio ambiente. Outro tema de relevância para entender a modernidade será a ascensão de episódios de totalitarismo. “O governo totalitário combina poder político, militar e ideológico de forma mais concentrada do que jamais foi possível antes da emergência dos estados-na- ção modernos” (GIDDENS, 1991, p. 18). Ainda no que diz respeito ao ineditismo do poderio e desenvolvimento das forças militares na modernidade, Anthony Giddens afirma que a junção entre inovação industrial e poder militar remete à própria origem da industrialização moderna. Isto é, tendo a indústria e as inovações tecnológicas neste período se desenvolvido de maneira tão eficiente e comple- mentar, tais inovações não deixariam de se estender às forças militares da modernidade. Neste sentido, este autor sugere que as análises que se empreendam sobre a modernidade se esforcem para abarcar não somente as mudanças e avanços da modernidade, como também os perigos e riscos que este período carrega no seio de suas características mais essenciais. Avançaremos agora para o tópico 2 que aborda os temas sobre a pós-modernidade, a sociedade pós-industrial e a cultura pós-moderna. 2. A QUESTÃO DA PÓS-MODERNIDADE: A SOCIEDADE PÓS- INDUSTRIAL E A CULTURA PÓS-MODERNA Abordaremos agora um dos temas mais fascinantes e envolventes da contemporanei- dade: a pós-modernidade. Compreender o que a constitui e quais as suas consequên- cias para o mundo de hoje é uma das tarefas que aqui nos propomos. Iremos caracterizar a pós-modernidade, de onde surgiu e qual o seu campo de estudos origi- nário e apresentaremos as principais transformações que possibilitaram a pós-modernidade, como o desenvolvimento das tecnologias da informação e a consequente sociedade em rede. Você poderá enxergar claramente que a realidade que o cerca está permeada pelos efeitos da pós-modernidade, pois as consequências da sociedade em rede nas rela- ções de produção e nos movimentos sociais fazem parte, mesmo que de maneira indi- reta, da vida de qualquer cidadão do século XXI. Não poderíamos deixar de apontar para a questão da desterritorialização como um dos grandes temas da pós-modernidade. Uma das suas principais transformações, a redefini- O Ser Humano e a Formação Cultural do Ocidente: Modernidade, Pós-Modernida- de e Globalização 14 1 ção de fronteiras e territórios, será esclarecida e debatida como manifestação das novas relações sociais, políticas e econômicas que a pós-modernidade trouxe para o mundo. 2.1 A PÓS-MODERNIDADE: CARACTERIZAÇÃO Definir pós-modernidade exige um esforço bastante grande, pois este termo não se originou no campo das ciências humanas e filosofia; ele começa a ser empregado pri- meiramente no campo das artes visuais. A partir da perspectiva pós-moderna, já não se buscariam mais critérios universalmente válidos para a arte (como por exemplo, as formas, cores e texturas consideradas boas ou más, belo ou feio); regras ou normas não poderiam ser entendidas para toda a pro- dução artística mundial. Esta proposta de entendimento dos fenômenos da realidade, nascida nas artes visuais, expande-se rapidamente para outras áreas do conhecimento como uma nova forma de compreensão do mundo e das relações sociais; um novo paradigma para caracterizar as sociabilidades contemporâneas e as modificações pro- fundas trazidas pelas transformações do século XXI. “A pós-modernidade passou a designar uma nova proposta de produção artística que, por sua ideologia contestadora, associou-se à quebra de valores e de normas de com- portamento que caracterizou o homem contemporâneo, especialmente nos grandes centros urbanos” (COSTA, 2005, p. 232). O conceito de pós-modernidade, para esta área do conhecimento, caracteriza- va uma nova forma de entendimento das produções artísticas pautada no rompi- mento de paradigmas da Modernidade. Sydney Opera House, Austrália. Patrimônio Mundial da Unesco. A pós-modernidade passa a ser o termo usado, então, para denominar rupturas com modelos e padrões de entendimento que são postos em xeque no momento em que o mundo passa a conviver com intensas e profundas mudanças. Para Jurgen Habermas, havia um “projeto da modernidade” que consistia: Fonte: 123R F. a. na crença inquestionável à ciência; b. na libertação do homem por meio do domínio total da natureza; c. no desenvolvimento da racionalidade a ponto de superar mi- tos, religião e superstição. 15Estudo do Ser Humano Contemporâneo 1 Exemplos são Robert Venturi, Aldo Rossi, James Corbett, entre outros. O período denominado pós-moderno, seria, portanto, o momento em que o “projetoda modernidade” passa a ser questionado e superado (HARVEY, 2007, p. 23). Sendo assim, a pós-modernidade, tendo nascido nas artes visuais, pode ser empregada para entendermos os novos hábitos, costumes, formas de vida e movimentos sociais im- pregnados pelas mudanças sociais, econômicas, políticas e tecnológicas do século XXI. Para muitos estudiosos da contemporaneidade, entre eles o sociólogo inglês An- thony Giddens (2012), estamos diante de uma nova sociedade: mais plural e di- versificada. Isso se deve, em grande parte, ao poder dos meios de comunicação incidindo na vida dos seres humanos, trazendo-lhes informações, valores e ideias de várias partes do mundo muito rapidamente. Em uma quantidade incontável de filmes, vídeos, programas de televisão e sítios da internet, as imagens circulam ao redor do mundo. Temos contato com muitas ideias e valores, mas eles têm pouca conexão com a história das áreas em que vivemos ou, de fato, com nossas próprias histórias pessoais. Tudo parece constantemente em fluxo (GIDDENS, 2012, p. 81). O pensador inglês chama a atenção para o fato de que na pós-modernidade os meios de comunicação permitem a troca de informações e imagens com rapidez e eficiência jamais experimentadas. Isso incide decisivamente em diversos aspectos das relações sociais, da economia e da política do século XXI. Para que essa transformação toda fosse possível, alguns acontecimentos foram cru- ciais no decorrer do século XX. Entenderemos melhor do que estamos falando nos tópicos seguintes, ao abordarmos as transformações fundamentais que possibilitaram o advento da pós-modernidade. 2.2 A SOCIEDADE EM REDE O desenvolvimento dos meios de comunicação, da informática e da automação impactou definitivamente a maneira tradicional de articulação e cooperação em todo o planeta. A rapidez na produção, nas trocas comerciais e nos fluxos financeiros, nos diz Cristina Cos- ta (2005, p. 234), “deu à economia um ritmo impensável anteriormente”, transformando em mercadoria aquilo que passa a circular pelas redes de comunicação: a informação. Para o sociólogo espanhol Manuel Castells (2013), o desenvolvimento das tecnologias da informação e da internet fortaleceu as redes entre diferentes pessoas e organiza- ções em lugares extremamente distantes no globo terrestre. Para ele, as redes são as formas de organização que definem nossa era; informações podem ser recebidas ime- diatamente em qualquer parte do mundo, não existindo necessidade da presença física dos envolvidos (GIDDENS, 2012, p. 579). O Ser Humano e a Formação Cultural do Ocidente: Modernidade, Pós-Modernida- de e Globalização 16 1 “A introdução da nova tecnologia permitiu que muitas empresas ‘re- projetassem’ sua estrutura organizacional, tornando-se mais des- centralizadas, e reforçando a tendência para tipos menores e mais flexíveis de empresas, inclusive o trabalho em casa” (GIDDENS, 2012, p. 579). David Harvey (2007), geógrafo britânico e um dos grandes estudiosos do impacto da tecnologia da informação nos processos produtivos, afirma que as transformações no processo produtivo sob a influência dos avanços tecnológicos caracteriza o período denominado de acumulação flexível. Esse novo modo de organizar a produção se caracteriza pela flexibilização dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos produzidos e dos padrões de consumo. Surgem nesse contexto muitos outros setores de produção, bem como novas maneiras de fornecimento dos serviços financeiros, novos tipos de mercados, e, principalmente, muita inovação comercial, tecnológica e organizacional, nos explica Harvey (2007, p. 140). O impacto da tecnologia da informação e sua consequente transfor- mação nas relações sociais pode ser sentido em diferentes espaços e maneiras. Desde as novas formas e processos de produção, isto é, na organização das estruturas de trabalho na contemporaneidade, chegan- do até às reivindicações sociais, ou seja, na maneira como os novos movimentos sociais se articulam e tomam corpo, a pós-modernidade exerce sua influência. A pós-modernidade permeia a maneira de se produzir: muito mais rápida e descartável; suscetível aos fluxos do mercado e das influências culturais distantes; desterritorializa- da e segmentada em diferentes espaços e países. Como também permeia as formas de reivindicação e afirmação de desejos e identidades, isto é, os movimentos sociais. Nos tópicos seguintes, abordaremos melhor esses dois impactos. A Influência das Redes nos Processos de Produção Uma das consequências de tal transformação pode ser sentida nos processos produtivos, isto é, na maneira de se produzir sob a influência da informática e da automação que passa a ser radicalmente diferente. O resultado disso aparece nas novas estruturas organizacionais, mais descentralizadas e flexíveis. Cada vez mais, empresas estão ligadas em redes e se relacionam com a economia global; esse processo torna mais difícil a sobrevivência de uma organização comercial – seja pequena ou grande – se não fizer parte de uma rede. O grande catalisador dessa transformação são os meios de comunicação, mais espe- cificamente, a internet. 17Estudo do Ser Humano Contemporâneo 1A acumulação flexível traz como resultados imediatos o aumento dos empregos e oportunidades de empreendimentos no chamado “setor de serviços”, assim como par- ques industriais em países de industrialização tardia ou capitalismo periférico, como Brasil, Índia e África do Sul. Como consequência do aumento da produção pelas novas tecnologias, a maneira de explorar o mercado e oferecer mercadorias também se modifica. A acumulação flexível confere “uma atenção muito maior às modas fugazes” e mobi- liza “todos os artifícios de indução de necessidades e de transformação cultural” para induzir o consumo a uma forma efêmera e descartável. Atrelado a esse processo, o relacionamento com os produtos (com significativa vida útil menor) produzidos passa a ser mais fugaz e caracteriza, portanto, uma “estética pós-moderna que celebra a di- ferença, a efemeridade, o espetáculo, a moda e a mercadificação de formas culturais” (HARVEY, 2007, p. 148). Cristina Costa (2005, p. 235) corrobora a visão de Harvey e salienta que “a informatização acabou gerando modificações radicais nos processos produtivos, levando a uma reengenharia industrial com a adoção cres- cente de sistemas automatizados”. A Influência das Redes nas Movimentações Sociais Outra face da influência das redes no mundo contemporâneo pode ser sentida na ma- neira de organização das mais recentes movimentações sociais. Manuel Castells, em seu livro Redes de indignação e esperança – Movimentos sociais na era da inter- net (2013) analisou o impacto das novas tecnologias da comunicação em protestos recentes da primeira década do século XXI, especialmente aqueles acontecidos no mundo árabe e alguns países da Europa. Para este autor, as redes sociais na contem- poraneidade se constituíram como espaços de autonomia, capazes de levar os sujeitos além do controle de governos e empresas. Com a intensificação da comunicação em redes trazida pelas novas tecnologias da informação, há a consequente produção de novos entendimentos sobre fatos, eventos, políticas, relações sociais etc. Nesse sentido, Castells afirma que as redes de comunicação (as famosas redes sociais) são, em certa medida, temidas por governos e instituições de poder, pois são capazes de construir novas formas de pensamento, direcionar atitudes, construir significados e mobilizar agentes sociais, sejam eles individuais ou coletivos. Portanto, nos esclarece este autor, as modifica- ções nas formas de comunicação afetaram definitivamente as relações de poder. “As redes de poder o exercem sobretudo influenciando a mente humana (mas não apenas) mediante as redes multimídia de comunicação de massa. Assim, as redes de comunicação são fontes decisivas de construção do poder” (CAS- TELLS, 2013, p. 12). Capazes de operar novos significadossobre as mais diferentes relações e provo- car reações inesperadas e irreversíveis, os movimentos sociais são definitivamente O Ser Humano e a Formação Cultural do Ocidente: Modernidade, Pós-Modernida- de e Globalização 18 1 Fonte: 123R F. “A autonomia da comunicação é a essência dos movimentos so- ciais, ao permitir que o movimen- to se forme e possibilitar que ele se relacione com a sociedade em geral, para além do controle dos detentores do poder sobre o poder da comunicação” (CAS- TELLS, 2013, p. 16). Ainda nas considerações de Manuel Castells sobre a influência das redes nas novas movimentações sociais, o pensador espanhol afirma que o poder pode estar se deslo- cando dos Estados-Nações para novas alianças e coalizões não governamentais. Estas relações não pertencentes a nenhum território, mais fluidas e inconstantes, podem ser lidas como resultantes da sociabilidade típica da pós-modernidade. A influência da tecnologia nas relações sociais, econômicas e políticas dá origem a uma sociedade muito mais integrada e diversificada. Este fenômeno, aqui chamado de desterritorialização, será fundamental para entender o que é e quais as consequências da pós-modernidade nas relações sociais do século XXI, que abordaremos a seguir. 2.3 A DESTERRITORIALIZAÇÃO Se uma das características marcantes da pós-modernidade se faz sentir nos novos movimentos sociais, os quais passam a não necessitar mais de encontro físico entre todos os seus partici- pantes, então entendemos que a desterritorialização é uma das faces da pós-modernidade. Segundo Cristina Costa (2005, p. 237), a desterritorialização seria “a perda da impor- tância do território nacional e a transnacionalização da economia”, bem como “as novas alianças que unem blocos regionais mais amplos, enfraquecendo as fronteiras nacio- nais e a circunscrição do Estado” (COSTA, 2005, p. 237). Nesta perspectiva, os territórios, as fronteiras e as vizinhanças necessitam de constante redefinição. São típicas desse processo, as constantes migrações humanas ao redor do globo terrestre, motivadas pelas mais diferentes causas: guerras, desastres naturais, alianças políticas, atividades econômicas etc. Anthony Giddens (2012, p. 467) rotula o século XXI como “a era da migração”, isto porque a intensificação da migração global após a Segunda Guerra Mundial, e espe- Não se faz mais necessário que as novas movimentações sociais sejam alocadas em uma sede física, com uma escala hierárquica definida entre indivíduos e encontros pe- riodizados entre seus membros. Basta que os manifestantes estejam organizados em rede e se identifiquem em suas dificuldades e reivindicações. fomentados pelas informações mais imediatas e diversificadas possíveis, aptos a articular ações conjugadas nos mais distantes lugares do globo ao mesmo tempo. 19Estudo do Ser Humano Contemporâneo 1 Fronteira entre Grécia e a FYRON (antiga República Iugoslava da Macedônia). A partir de agora, mais abstratos e difíceis de definir, os territórios nacionais, as fron- teiras, os nacionalismos e as idiossincrasias culturais passam a ser constantemente cificamente em anos mais recentes, trouxe questões políticas e de governança muito sérias para todo o mundo. Inegável, portanto, é a multiplicidade de dados culturais e influências étnicas que permeiam as sociedades atingidas por este processo. Tanto os países alvos de imigrantes – geralmente pela prosperidade econômica (como Alemanha, França, Inglaterra) – quanto aqueles que “cedem” seus indivíduos a outros espaços (como Síria ou Haiti) – mais prósperos ou menos violentos e intolerantes – veem no fenômeno da desterritorialização uma mescla de culturas e tradições que atin- gem em cheio os sujeitos e definem novas identidades e relações sociais. Constituem exemplos de alguns desses espaços de desterritoriali- zação os campos de refugiados, as colônias de imigrantes, multina- cionais e empresas de capital misto, nos esclarece Cristina Costa (2005, p. 237). Fonte: 123R F. O Ser Humano e a Formação Cultural do Ocidente: Modernidade, Pós-Modernida- de e Globalização 20 1 reelaboradas sob uma perspectiva diversificada, múltipla e transnacional que traz a pós-modernidade. Entender esse fenômeno contemporâneo irreversível se faz uma das tarefas mais instigantes e complexas do pensamento social. 3. A GLOBALIZAÇÃO E SUAS PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS E A CRÍTICA DO CONHECIMENTO Este tópico trata de uma das questões mais comentadas e polêmicas da contempora- neidade: a globalização. Tema profícuo entre filósofos, sociólogos, economistas entre outros profissionais interessados em entender os meandros que regem a vida social, política e cultural do século XXI, este assunto sempre traz posições contrárias e favorá- veis capazes de despertar as discussões mais acaloradas. Ainda no intuito de lhe fornecer maior subsídio para as discussões e problematizações acerca do tema, propomos uma investigação sobre a questão da ampliação das frontei- ras, processo inevitável da globalização. Abordaremos a formação dos blocos econômi- cos e a consequente e dramática questão da imigração no século XXI. Finalizamos nosso debate apresentando a proposta de uma governança global como saída pensada por alguns estudiosos para os problemas gerados em função de uma internacionalização das fronteiras. Esperamos contribuir para o despertar de uma cons- ciência crítica e reflexiva acerca do tema e levantar ainda mais possibilidades de discus- sões que busquem a construção de um mundo mais justo e humano para todos. 3.1 GLOBALIZAÇÃO: CARACTERIZAÇÕES Nos noticiários, artigos de jornais, conversas informais e tantos outros espaços que permeiam nosso cotidiano ouvimos falar sobre a globalização. Esse termo se tornou palavra-chave para definir as novas relações no mundo contemporâneo, tanto para os debates sociológicos e filosóficos quanto para os econômicos e políticos. De uma maneira geral, o termo “global” se refere aos caminhos que as políticas econômicas e sociais do mundo capitalista vêm trilhando a partir da década de 1980. “A globalização refere-se ao fato de que estamos cada vez mais vivendo em um mesmo mundo, de modo que os indivíduos, grupos e nações, se tornaram cada vez mais interdependentes”. (GIDDENS, 2012, p. 102). Muitos estudiosos do assunto tratam da globalização como uma significativa perda de poder do Estado Nacional e do mercado interno, o que acarreta trocas comerciais e fi- nanceiras internacionais intensas e confere muito poder às instituições supranacionais, isto é, corporações, bancos e empresas multinacionais. No entanto, podemos afirmar que, relacionada às profundas transformações econômicas, acompanhamos uma re- viravolta nas relações culturais, sociais e tecnológicas entre os países a partir dessa época. Giddens (2012) corrobora essa ideia ao afirmar que: 21Estudo do Ser Humano Contemporâneo 1 Assim, a globalização não se restringe às novas dinâmicas econômicas e políticas, ela envolve outros tantos aspectos sociais capazes de alterar profundamente sociedades inteiras. Somos levados a crer, portanto, que a globalização é processo multidimensio- nal, ou seja, seus impactos e consequências podem ser sentidos em diversos âmbitos da vida dos indivíduos no século XXI. Tendo em vista a possibilidade de entendermos melhor essas transformações, propomos uma reflexão sobre o funcionamento atual e as possibilidades futuras da globalização en- quanto nova forma de ordenação das relações sociais, econômicas e políticas da atualidade. Para isso, explicaremos a seguir alguns dos fatores que contribuíram para a globalização. A Tecnologia das Comunicações e da Informação O desenvolvimento das tecnologias da comunicação e da informação pode ser apon- tado como um dos aspectos fundamentais para a intensificação da globalização na contemporaneidade. Isto porque elas aumentaram, em muito, a velocidade e o alcance das trocas sociais entre os indivíduos por todo o mundo. Nos anos seguintes à SegundaGuerra Mundial, esta disseminação da informação sofreu grande transformação. Ela foi facilitada por vários avanços na estrutura das telecomu- nicações do planeta como o desenvolvimento de um sistema de cabos mais eficiente e menos caro e o desenvolvimento tecnológico dos satélites de comunicações, que a partir da década de 1960 expandem as comunicações internacionais. A partir de então, grandes quantidades de informação podem ser comprimidas e transferidas por meio digital. Nos lares, empresas, escritórios de qualquer país com infraestrutura de comunica- ções mais desenvolvida, as pessoas estão interconectadas, recebendo e mandando informações em tempo real para qualquer indivíduo ao redor do globo terrestre. Isso acarreta uma transformação na concepção do tempo e do espaço substancial aos envolvidos nesses processos. Um indivíduo em Tóquio recebe documentos, envia imagens e vídeos em tempo real a outro em São Paulo, graças ao desenvolvimento da tecnologia dos satélites. “Embora as forças econômicas sejam uma parte integral da globalização, seria erra- do sugerir que elas a produzem sozinhas. A união de fatores políticos, sociais, cul- turais e econômicos cria a globalização contemporânea” (GIDDENS, 2012, p. 102). Os Fluxos Internacionais e Transformações das Identidades As trocas de informações possibilitadas pela tecnologia da comunicação permite a in- terconexão entre indivíduos no mundo todo. Esse fenômeno, para além das trocas já mencionadas, faz com que as pessoas estejam mais conscientes e se identifiquem mais umas com as outras em problemas globais do que no passado. O Ser Humano e a Formação Cultural do Ocidente: Modernidade, Pós-Modernida- de e Globalização 22 1 A primeira A segunda é que indivíduos no mundo todo passam a entender que suas responsabilida- des vão além de suas fronteiras nacionais. Desastres naturais, guerras, fome e injustiças de toda ordem passam a ser vistas como problemas de alçada inter- nacional, dignos de ação e intervenção. diz que indivíduos no mundo todo buscam, cada vez mais, forjar sua identidade em fontes além de seu Estado-Nação. As identidades culturais locais passam por transformações profundas, e um habitante da Irlanda do Norte, por exemplo, pode se identificar culturalmente com um da França. A ideia da identificação patriótica dos indivíduos com seu Estados-Nação está em xeque à medida que as políticas em níveis globais e regionais se orientam para além das fronteiras geográficas. Anthony Giddens (2012) afirma que, embora a globalização seja fomentada por grandes trocas econômicas e desenvolvimento tecnológico, ela pode ser sentida nas relações mais cotidianas. As transformações são vistas nas formas como as instituições sociais mais elementares, como família, papéis sociais, identidades pessoais, relações de tra- balho, sexualidade etc., são afetadas e reconfiguradas. Neste sentido, para o autor, a globalização inaugura um período de ascensão do individualismo. “Em condições de globalização, enfrentamos uma tendência a um novo individu- alismo, no qual as pessoas devem agir ativamente para construir suas próprias identidades” (GIDDENS, 2012, p. 116). À medida que nos deparamos com transformações profundas nos mais elementares pilares de sustentação da vida em sociedade, e tradições e costumes antigos já não fa- zem mais sentido, é preciso que sejamos capazes de alterar a maneira como pensamos a nós mesmos e surjam novos padrões identitários. Um exemplo claro das possibilidades trazidas pela tecnologia da comu- nicação está na mo bilização de milhares de pessoas em manifestações políticas e culturais. Movimentos como a chamada Primavera Árabe (grandes insurreições nos países árabes, a partir de 2009, quando mi- lhares de pessoas saíram às ruas contra governos ditatoriais, inicia-se na Líbia e se expande para vários países vizinhos); ou o Greenpeace (importante Organização Não Governamental que luta pelas questões ambientais), entre outros, podem ser classificados como ações que buscam agir para além de seus territórios nacionais e são possíveis graças à internet. Explicaremos o fato das trocas de informações facilitadas pela tecnologia a partir de duas dimensões. 23Estudo do Ser Humano Contemporâneo 1Os Fatores Econômicos Dada a importância que a tecnologia da informação confere às identidades individuais e a promoção de novas formas de comunicação, não podemos deixar de salientar que os processos econômicos são cruciais para que a globalização atinja os patamares do século XXI. Cada vez mais a economia global se orienta para as atividades ligadas à tecnologia da informação, isto é, softwares de computador, mídia, produtos do entrete- nimento e serviços baseados na internet. Segundo Anthony Giddens (2012, p. 106), a globalização é orientada “por atividades que não têm peso e são intangíveis”. A forma predominante da economia contemporânea passa a ser a rede entre diversas ativi- dades que cruzam as fronteiras geográficas, tornando as empresas cada vez mais flexíveis e dispersas em suas hierarquias e atividades. É necessário fazer parcerias e participar de redes de distribuição mundial para estar presente nos negócios do mundo globalizado. A Ampliação das Fronteiras Os processos de integração regional que se delinearam em meados do século XX es- tão diretamente ligados ao desenvolvimento do capitalismo globalizado. Novos blocos econômicos surgiram e um novo patamar de integração entre os países foi possível. Nesse tópico, abordaremos as características principais da formação de blocos econô- micos e suas principais consequências; assim como abordaremos a imigração. Os Blocos Econômicos Dentro do sistema internacional de comércio na contemporaneidade, a formação de blocos econômicos passa a ser assunto de primeira ordem para os países que desejam estar inseridos na economia mundial. Esse fenômeno pode ser definido como um pro- cesso político entre dois ou mais países para limitar, total ou parcialmente, as barreiras comerciais entre eles. Esse fato contribui muito para a internacionalização das econo- mias, e, consequentemente, para o processo globalizador. A constituição de um bloco econômico é a principal política de inte- gração regional para criar e ampliar espaços inter ou supranacionais que permitam maior complementaridade, intercâmbio e incremento da capacidade competitiva dos países-membros em relação ao resto do mundo. (SILVA, 2013, p. 294) No entanto, o processo integrador das economias globais assume também as diferenças eco- nômicas e políticas entre os países. Serão justamente essas diferenças entre os envolvidos que representará um dos principais problemas enfrentados pela formação dos blocos econômicos (por exemplo: União Europeia, Mercosul, Nafta, entre outros), símbolos da globalização. A Imigração No contexto dos blocos econômicos, as fronteiras são bastante livres e sem impedimen- tos quando o que circula são as mercadorias. No entanto, quando se trata de pessoas, O Ser Humano e a Formação Cultural do Ocidente: Modernidade, Pós-Modernida- de e Globalização 24 1 especialmente aquelas vindas dos países de economias periféricas, como África, Amé- rica Latina e Ásia, as fronteiras já não são tão desimpedidas. Restrições à entrada de imigrantes e políticas restritivas são formas contem- porâneas de segregação espacial e consequente elemento fundamental de distinção social. “A possibilidade de se deslocar tornou-se um elemento fundamental para dis- tinguir as classes sociais em nível global, não só pelos meios com os quais se movimentam, mas também, ou principalmente, pelas segregações e restrições espaciais que isso acarreta”. (BAUMAN apud SILVA et al., 2013, p. 295). Idomeni, Grécia. Fronteira entre a Grécia e a FYROM. Fonte: 123R F. Atrelada à face positiva e transformadora das relações sociais que a globalização pro- mete, está sua face perversa e excludente. Para que o ideal de integração da globali- zação se realize, é necessário abandonarantigas tradições e posições nacionalistas. “O nacionalismo tranca as portas, arranca as aldravas e desliga as campainhas, declarando que apenas os que estão dentro têm direito de aí estar e acomodar-se de vez” (BAUMAN, 2001, p. 203). Neste sentido, podemos afirmar que um dos grandes desafios que se impõem às novas relações entre os países é a questão da imigração e circulação de pessoas em busca das promessas e benefícios do capitalismo globalizado. Uma Governança Global é Necessária No processo da globalização, o avanço tecnológico serve para a promoção da circula- ção de capitais e mercadorias, no entanto, este processo não é homogêneo e igualitá- rio. Àqueles países em que o capitalismo ainda é subdesenvolvido (por exemplo: Brasil, Índia, Chile), sobra apenas a transferência dos lucros aos países do capitalismo central (por exemplo: Estados Unidos, Inglaterra). Já a circulação humana é restrita e proble- mática, como visto no tópico anterior. É por isso que os efeitos negativos da globalização podem ser sentidos principalmente nas regiões de capitalismo periférico onde a instalação de grandes multinacionais ex- plora a força de trabalho regional muitas vezes de maneira injusta, como por exemplo, pagando salários cada vez mais baixos, por muitas vezes mantendo os trabalhadores em condições análogas à escravidão, aproveitando-se da pouca organização sindical dos 25Estudo do Ser Humano Contemporâneo 1 Os efeitos do aquecimento do planeta, da dissemi nação de do- enças, da regulamentação de mercados financeiros instáveis e dependentes internacional mente, são exemplos de problemáticas que surgem em função de uma nova ordem econômica, política e social que é a globalização. Fonte: 123R F. trabalhadores desses países, e ainda, valendo-se das isenções fiscais oferecidas por líderes desses países para que instalem suas fábricas nesses locais. Também é possível sentir os efeitos negativos da globalização nas consequências ao meio ambiente desses países, em que o processo de dilapidação dos recursos naturais se mostra insustentável. Por esses motivos, muitos estudiosos da globalização falam em estabelecer uma gover- nança global. Esta proposta visa abordar de maneira global problemas que são criados e têm consequências num nível global. Para a resolução destes entraves gerados pela internacionalização das relações, cada vez mais se propõe que as soluções para estes se dê num nível global. Segundo Gi- ddens (2012, p. 117), o estabelecimento de uma governança global pode ajudar “a promover uma ordem mundial cosmopolita, na qual regras e padrões transparentes para o comportamento internacional, como a defesa dos direitos humanos, sejam esta- belecidos e observados”. CONCLUSÃO Nesta Unidade de Estudo abordamos os temas: modernidade, sociedade pós-indus- trial e cultura pós-moderna, e globalização. Vimos que o período que chamamos de modernidade se refere a transformações importantes em todas as instituições sociais: desde as relações de trabalho, até a política e a economia. O Renascimento, como fato importante e cabal trouxe uma nova maneira de o homem enxergar a si e o mundo em que vive, enquanto que a Revolução Industrial mudou radicalmente a ordem produtiva da vida econômica e alterou para sempre os modos de produção. Autores importantes da sociologia, como Anthony Giddens e Cristina Costa, elaboraram reflexões sobre este período histórico e o caracterizaram a partir da rapidez das mudan- ças. Para oinglês Anthony Giddens, é preciso estar atento para as consequências que a modernidadeacarreta para vida do planeta como um todo, como o impacto das transfor- mações no meioambiente, o totalitarismo e a associação entre poder militar e industrial. Estudamos também os temas relacionados à pós-modernidade. Evidentemente todos nós já ouvimos os termos pós-modernidade, vida pós-moderna, amores pós-moder- nos em algum momento de nossas conversas mais banais. No entanto, a Unidade de O Ser Humano e a Formação Cultural do Ocidente: Modernidade, Pós-Modernida- de e Globalização 26 1 Estudo apresentada forneceu aspectos e características desse fenômeno de modo mais complexo e aprofundado. Passamos pelas principais faces da pós-modernidade: suas características, a importância das tecnologias da informação e a consequente sociedade em rede, e a ideia de desterritorialização. Ao abordarmos a questão das redes, não pudemos nos furtar do impacto disso nas relações de produção e nas mo- vimentações sociais. Todos esses aspectos se dispuseram a agregar dados e possibilidades de entendimen- to da realidade do século XXI a você que está disposto a captar de maneira crítica e reflexiva a realidade em que estamos todos inseridos. Ao longo desta Unidade, também procuramos elucidar aspectos importantes acerca do tema da globalização. Passamos pelas suas características principais, pelos fatores cruciais para que alcançasse os níveis do século XXI, pela importância da tecnologia da informação e do desenvolvimento da internet nesse processo. Também salientamos o papel da economia e a formação dos blocos econômicos como grandes catalizadores da globalização tal como temos hoje. Tratamos do problema da imigração e de como a globalização pode ser perversa com aqueles países considerados como capitalismo periférico. Por fim, apontamos como saída para estes entraves o sonho da governança global, que, para muitos estudiosos, é a possibilidade mais plausível para os problemas criados pela internacionalização das fronteiras. Esperamos que os elementos aqui apresentados tenham fomentado uma nova e mais complexa maneira de enxergar o fenômeno que atinge a todos os cidadãos e todas as cidadãs do mundo contemporâneo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001. 2. CASTELLS, Manuel. Redes de indignação e esperança: Movimentos sociais na era da internet. Rio de Janeiro: Zahar, 2013. 3. COSTA, Cristina. Sociologia: introdução à ciên- cia da sociedade. São Paulo: Moderna, 2005. 4. GIDDENS, Anthony. Sociologia. Porto Alegre: Penso, 2012. 5. ______. As consequências da modernidade. São Paulo: Unesp, 1991. 6. HARVEY, David. Condição pós-moderna. São Paulo: Loyola, 2007. 7. SILVA, Afrânio et al. Sociolo- gia em movimento. São Paulo: Moderna, 2013. 27Estudo do Ser Humano Contemporâneo 1 28 2 Expressões e Processos do Conhecimento e o Humano como ser Multifacetário e Relacional UNIDADE 2 EXPRESSÕES E PROCESSOS DO CONHECIMENTO E O HUMANO COMO SER MULTIFACETÁRIO E RELACIONAL INTRODUÇÃO Nesta Unidade abordaremos os tópicos sobre as formas e os processos do conheci- mento e sobre o ser humano, destacando a dimensão biológica, a inteligência, a lingua- gem, a cultura, a historicidade, a alienação e a busca do transcendente. Na época em que vivemos, diferentemente das anteriores, abundam informações. Che- gam até nós turbilhões diários de informações. Nem todas são exatas, verdadeiras e re- levantes. Muitas vezes temos a sensação de que recebemos informações em excesso, que mais nos confundem do que esclarecem. Muitas delas truncadas, grosseiramente simplificadas, cuja fonte não é conhecida, que podem ter sido divulgadas com a inten- ção de iludir as pessoas, não com a intenção de lhes auxiliar a conhecer e compreender a realidade em que vivem. Outras tantas vezes as informações nos chegam apenas como entretenimento, modeladas (e distorcidas) para provocar emoções e divertimento, não para a ajudar elaborar conhecimentos. Você já deve ter experimentado isso e provavelmente percebeu que a dificuldade é separar informações verdadeiras e não verdadeiras, informações relevantes e meros truísmos que nos ocupam a mente e o tempo. Cada vez mais, é necessário discernir entre as informações que podem nos ser úteis e as que podem nos iludir. Nesta Unidade, queremos trabalhar alguns conceitos e algumas distinções que podem nos ajudar na tarefa de filtrar informações e construir conhecimentos. 1. INFORMAÇÕESE CONHECIMENTOS Informações não são conhecimentos. Essa é a primeira distinção que devemos fazer. Informações são registros de algumas características de fatos, objetos ou processos que detectamos no mundo.Conhecimentos são conjuntos de informações organizadas, articuladas e interpretadas, que nos ajudam a compreender uma parte da realidade natural, social ou cultural do mundo em que vivemos. Pense numa lista telefônica (daquelas antigas, enormes e impressas em papel fininho). Você tem nela uma grande quantidade de informa- ções, mas, por si só, a lista não representa conhecimento. Para trans- formar aquelas informações em conhecimentos sobre a cidade a que se refere essa lista, você precisa analisar essas informações, estabe- 2 29Estudo do Ser Humano Contemporâneo lecer relações entre elas e interpretar seu significado. Só assim você saberá se a cidade é populosa ou não, se é rica ou pobre, antiga ou jovem, que tipos de empresas possui, se seus serviços de saúde e de educação estão bem distribuídos ou não. Todos os dias somos bombardeados por uma enorme quantidade de informações. Jor- nais, revistas, TV, Internet, rádio, redes sociais... Não nos faltam informações. Na verda- de, as temos em excesso. Isso cria um dos grandes desafios de nosso tempo: filtrar essas informações, separando relevantes e irrelevantes, verdadeiras e falsas, úteis e inúteis. A análise das formas de conhecimento, que empreenderemos nesta Unidade, apresen- ta algumas ferramentas para ajudá-lo a enfrentar o desafio de fazer o exame crítico das informações que recebemos. 1.1 AS FORMAS DO CONHECIMENTO Ao longo da História, os seres humanos criaram variadas formas de conhecer. São modos diferentes de usar sua capacidade intelectual, de articular ideias, imagens, ra- ciocínios, sentimentos. Todas as formas de conhecimento – senso comum, mito, ide- ologia, ciência, tecnologia, filosofia, religião, arte, entre outras – atendem de maneiras diferentes à necessidade humana de conhecer e compreender o mundo e o próprio ser humano. Analisaremos nesta Unidade apenas algumas dessas formas. Senso Comum O senso comum pode ser entendido de duas formas distintas, mas que são complementares: 01 Como Fenômeno Social Em todos os grupos sociais percebemos a existência de informa- ções que circulam continuamente entre seus membros, formando um cabedal comum, isto é, conhecido por todos. Esse cabedal con- tém normas de comportamento social, fatos históricos, lendas, su- perstições, informações científicas popularizadas, valores morais, crenças religiosas, modos de fazer coisas e organizar a vida, mitos, ideologias políticas, representações do que seja o mundo e a socie- dade etc. Tudo isso misturado, num conjunto pouco organizado e muitas vezes contraditório. Esse cabedal, entretanto, é da máxima importância, pois permite a comunicação entre os membros do gru- po social e, consequentemente, facilita a interação e a cooperação entre eles. O senso comum forma uma visão de mundo, isto é, uma representação, uma imagem de como é o mundo, que é a primeira referência que temos do mundo que nos cerca e é a referência que as pessoas usam como orientação para a vida cotidiana. 30 2 Expressões e Processos do Conhecimento e o Humano como ser Multifacetário e Relacional 02 Como forma de organizar os conhecimentos: Numa outra abor- dagem, o senso comum é também uma maneira de conhecer, isto é, um modo de lidar com informações e elaborar conhecimentos. O senso comum elabora conhecimentos de modo assistemático, fragmentário e superficial. Isso porque o senso comum é muitas ve- zes portador de uma atitude crédula e acrítica, que se satisfaz com as aparências, que aceita opiniões somente porque foram emitidas por supostas autoridades do saber, que admira as opiniões mais chocantes. Podemos resumir afirmando que o senso comum não examina seus conhecimentos: não pergunta pela origem das infor- mações, não pergunta por sua veracidade, ou pelos interesses que eventualmente podem promover a divulgação de fatos distorcidos. Vale atentar para esta característica do senso comum: toda informação que se torna senso comum, isto é, que se dissemina na sociedade e é repetida em toda parte, come- ça a ser tomada como verdadeira. É como um boato maldoso: depois que se difunde, ninguém mais se lembra de onde veio, quem o proferiu e com que interesse. Tornou-se senso comum, todos o repetem como se fosse verdadeiro. O que vou comer na lanchonete, se levarei ou não agasalho ao sair de casa, se é moralmente certo ou errado o gesto que pretendo rea- lizar para uma pessoa, em que candidato pretendo votar, tudo isso é geralmente avaliado por meio de critérios extraídos do senso comum. Podemos resumir afirmando que o senso comum não examina seus conhecimentos: não pergunta pela origem das informações, não per- gunta por sua veracidade, ou pelos interesses que eventualmente po- dem promover a divulgação de fatos distorcidos. O exame do conhecimento é tarefa constante para todos aqueles que não se satisfa- zem com aparências e buscam a verdade. Por isso, apesar de sua enorme importância na vida cotidiana de indivíduos e coletividades, não podemos nos limitar a aceitar e reproduzir os conteúdos superficiais do senso comum. Mito Mitos são também uma maneira de conhecer, que a humanidade vem utilizando desde a mais remota antiguidade até hoje. Trata-se de uma forma de conhecimento baseada 2 31Estudo do Ser Humano Contemporâneo fundamentalmente na compreensão intuitiva dos fatos, que é apresentada, em geral, sob o formato de uma história. Essa narrativa apresenta, muitas vezes a saga de um herói, a origem do cosmos ou dos deuses, a origem do ser humano, das raças e dos povos, entre outros temas. Os mitos são criados, anônima e coletivamente, para explicar o mundo em que vi- vemos, especialmente os acontecimentos que nos amedrontam. Essa explicação não segue critérios racionais, muito menos científicos, mas ensinam, por meio do compor- tamento dos personagens da narrativa, a solução dos enigmas da vida, a identidade do grupo social e o modo correto de se conduzir. Todos os povos criam seus mitos e os utilizam para compreender os mistérios da vida e do mundo. No cinema americano encontramos, onipresente, o mito do he- rói. Na história política brasileira é recorrente o mito do salvador da pátria. Nas tradições religiosas de origem hebraico-cristã, em papel fundante o mito da origem do povo. Nas tradições indígenas muitas vezes encontramos mitos da origem dos ali- mentos e das ferramentas. É importante observarmos que os mitos estão presentes em nossa vida, mesmo que não os percebamos. Nós os tomamos como ex- plicações válidas, até o momento em que novas informações nos fazem adotar outras explicações, mais afeitas às ciências ou à ra- cionalidade pragmática. Apenas quando as primeiras explicações são recusadas como inválidas, percebemos que são explicações míticas. O exemplo a seguir apresenta um caso assim. UM MITO CONTEMPORÂNEO Alguém já lhe contou a história seguinte? Ela já foi muito difundida no Brasil há algumas décadas. Apesar de ser uma explicação mítica, foi aceita como válida por amplos setores da sociedade brasileira: “O Japão é um país muito pequeno, que fica do outro lado do mundo. Durante a Segunda Guerra Mundial, foi inteiramente destruído. Mas os japoneses foram tão esforçados, disciplinados e trabalhadores, que rapidamente reconstruíram tudo e ainda se tornaram um dos países mais ricos do mundo”. Essa narrativa surgiu nos anos 1960, quando o Japão experimentou um cresci- mento econômico muito forte e impressionou o mundo todo com seus trens-ba- la, automóveis baratos e aparelhos eletrônicos. 32 2 Expressões e Processos do Conhecimento e o Humano como ser Multifacetário e Relacional Visto a partir do Brasil, o “milagre econômico japonês” parecia incompreensí- vel e, sobretudo, assustador. O Japão não tinha sido inteiramente destruído, inclusive por duas bombas atômicas?Como os japoneses conseguiram essa façanha? O que eles faziam de especial para chegar tão longe? Desconhecendo os fatores econômicos e geopolíticos que favoreceram a re- construção do Japão, inclusive a enorme cooperação norte-americana, os bra- sileiros recorreram à consciência mítica, que forneceu uma explicação – intui- tiva, mas fundamentada na realidade: a tradição japonesa de valorização do esforço, do trabalho e da disciplina. E o que os brasileiros têm a ver com esse mito? Como essa narrativa, criada por brasileiros, pode se referir à identidade dos brasileiros? A resposta parece estar em uma espécie de contraposição muda: �o Japão é um país muito pequeno, o Brasil é um país com imenso território; �o Japão foi inteiramente destruído durante a Segunda Guerra Mundial, o Brasil sempre se ufanou por não ter guerras em seu interior; �o Japão foi reconstruído e se tornou rico por meio do trabalho e do esforço de seus cidadãos, o Brasil ainda não chegou lá. Ideologia Desde Destutt de Tracy e Karl Marx, no século XIX, o fenômeno da ideologia tem des- pertado interesse e inúmeros teóricos já se manifestaram sobre o tema, formulando concepções das mais variadas. Com base nas ideias do filósofo polonês Adam Schaff (1913-2000), apresentamos uma concepção ampla de ideologia, que nos fornece uma interessante ferramenta para elaborar a crítica do conhecimento. De acordo com esse pensador, podemos definir ideologia como um conjunto de opiniões, baseadas em um conjunto de valores ad- mitidos, pelo qual um grupo organizado afirma sua identidade e seus interesses (SCHAFF, 1968). A ideologia é concebida, então, como uma visão de mundo sistematizada (ao contrário do senso comum, que é uma visão de mundo desorganizada), modelada pelos interesses do grupo que a elaborou, que atua afirmando a identidade do grupo, controlando as divergên- cias de seus membros e difundindo por toda a sociedade a visão de mundo desse grupo. A ideologia pode atuar como instrumento crítico de desvelamento da realidade, num contexto em que o grupo que a formula se encontra em situação de subordinação ou 2 33Estudo do Ser Humano Contemporâneo de oposição ao grupo dominante. Contudo, a ideologia se torna falsa consciência e obstáculo à compreensão da realidade sempre que está a serviço da dominação e, por conseguinte, dos interesses de ocultação do real. Os mecanismos utilizados pela ideologia para ocultar a realidade foram estudados por Marilena Chauí (2008. p. 113.). Os principais são: 01. Naturalização 02. Inversão de causa e efeito 03. Universalização de interesses 04. Ocultação de informações Faz com que os processos provocados pela intervenção humana sejam interpre- tados como resultantes de fenômenos naturais; Em geral faz com que as vítimas de um processo social violento ou excludente apareçam como seus causadores; Maneira pela qual os interesses do grupo dominante são apresentados como interesses de todos os membros da sociedade; Informações que, se reveladas, destroem a coerência do discurso ideológico e evidenciam seu propósito ocultador. FONTE: Aranha e Martins (1993, p. 37) Na vida cotidiana e na vida civil, em todos os debates de cunho político, econômico social ou cultural, estão presentes as ideologias, ora ocultando a realidade, ora forçando seu desvelamento. Não existe um “lugar” ou um tipo de discurso ideologicamente neutro. A ideologia só pode ser vencida pelo esforço crítico de perceber, em cada caso, em cada ponto de discussão, os interesses que estão moldando o discurso e deformando a percepção da realidade. É uma tarefa indispensá- vel e permanente. Ciência É muito importante examinarmos também a ciência. Trata-se da forma de conhecimento mais prestigiosa dos últimos séculos. Dela se esperam conhecimentos verdadeiros e uma explicação científica tende a ser aceita como verdadeira e incontestável. 34 2 Expressões e Processos do Conhecimento e o Humano como ser Multifacetário e Relacional Dessa forma, o formidável poder explicativo da ciência nunca será capaz de esclarecer toda a realidade, nem de afirmar a existência ou inexistência de Deus, a justiça, a bele- za e muitos outros temas. Não poderá substituir outras formas de conhecimento, como a filosofia, ou a experiência religiosa, mas poderá conviver com elas e mesmo cooperar, pesquisando em seu campo próprio e com seus métodos específicos os aspectos bási- cos dos fenômenos que interessam também a essas formas de saber. A ciência foi buscada, desde a antiguidade Clássica, como um ideal de conhecimento certo e seguro, que permitisse superar as limitações do senso comum e do mito. Contu- do, somente a partir da Revolução Científica do Século XVII (protagonizada por Galileu Galilei, entre outros), estruturou-se o tipo de saber que hoje denominamos ciência. Sendo assim, na escala de tempo da história da humanidade, esse é um acontecimento recente. Seu enorme sucesso e suas conquistas se devem à adoção de um método baseado na experimentação. Com ele, a ciência moderna foi mais longe e mais fundo que a maior par- te das formas de conhecimento. Atualmente, a ciência abrange os estudos da natureza, do ser humano, da sociedade e da cultura. A ciência tem limitações, contudo. Sua capacidade de conhecer vai somente até onde é possível fazer experimentações, ou constatações empíricas. Muitas coisas importantes ficam de fora do conhecimento científico: O campo dos valores éticos e estéticos: A arte: O campo da fé: pois a ciência não discute valores (o cientista é quem deve ter valores éticos); que é também uma forma válida (e indispensável) de interpretar a realidade; que continua a mover a humanidade; As profundezas da alma humana: E os voos mais altos da razão: reveladas nos mitos e na arte; em que a filosofia ultrapassa a ciência e tematiza a própria razão. 2 35Estudo do Ser Humano Contemporâneo Como Podemos Caracterizar o Conhecimento Científico? O conhecimento produzido pela ciência pretende ser, acima de tudo, objetivo. Objetivo é o conhecimento que traduz as características do objeto (a coisa) que está sendo co- nhecido. É, portanto, um conhecimento fiel à realidade, evitando distorções introduzidas pela subjetividade do cientista. O conhecimento científico é também organizado e coerente, sem contradições nem la- cunas que o invalidem. Nisto difere do senso comum, que é um conjunto desorganizado de opiniões. É também metódico, isto é, segue com rigor um método científico, evitando saltos, “chutes” e “achologia”. É racional, isto é, exprime-se em conceitos e relações lógicas e pode ser compreendido por meio da razão humana. É testável, isto é, pode ser submetido à experimentação e, por meio dela, corroborado ou refutado. O conhecimento científico pretende ser válido, isto é, capaz de descrever e explicar fenômenos com objetividade, sem pretender constituir verdade definitiva. De fato, os cientistas sabem que seu conhecimento é falível e, frequentemente, uma teoria deve ser abandonada em favor de outra porque aquela permite explicar fenômenos que a primeira não explica. O que são, então, as teorias científicas? São modelos que pretendem descrever o funcionamento dos fenômenos, isto é, são maquetes da realidade, que nos ajudam a compreendê-la. Nunca são, porém, repre- sentações completas e infalíveis da realidade. Técnicas e Tecnologia Técnicas são as formas que a humanidade foi criando, ao longo da história, para trans- formar materiais naturais nos bens de que tinha necessidade. Foram assim inventados, por exemplo, a agricultura e a pecuária; ali- mentos como o pão, os queijos, o vinho e demais bebidas alcoólicas; a fundição de metais; a edificação com madeira e/ou pedra etc. Por sua vez, a tecnologia surgiu com a ascensão da ciência moderna, no final do século XVIII. Os cientistas da época procuravam explicar com ajuda da ciência o funcionamen- to das técnicas tradicionais. Com isso, abriram caminho para o aperfeiçoamento dessas técnicas por meiodo conhecimento científico e para sua utilização na indústria. Surgiu assim a eletrônica e a microeletrônica, a informática e todo o aparato que hoje utiliza- mos nas telecomunicações e no processamento de informações. Ciência e tecnologia atuam em mão dupla: o conhecimento científico abre caminho para o desenvolvimento de tecnologias e a tecnologia dá meios à ciência para o apro- fundamento das pesquisas. Essa relação é tão profunda que atualmente alguns setores preferem usar o termo “tecnociência”, ao invés de “ciência e tecnologia”. 36 2 Expressões e Processos do Conhecimento e o Humano como ser Multifacetário e Relacional A tecnologia desempenha papéis fundamentais em nossa sociedade. O mais nobre é com certeza a criação de novos medicamentos e aparelhagens que facilitam o diagnóstico e o tratamento de doenças. Entretanto, os produtos de uso doméstico (eletroeletrônicos, quími- cos, alimentícios), do setor automobilístico ou de transportes, do setor agropecuário, entre outros, transformam incessantemente a econo- mia, pois ora dão maior eficiência e produtividade aos métodos de produção, ora criam produtos que introduzem facilidades novas e dis- seminam novos comportamentos. Isso sem mencionar a área militar, onde novas tecnologias bélicas (armas, comunicação e transporte) tendem a ser decisivas na guerra. Por essa razão, o desenvolvimento de novas tecnologias é preocupação constante de muitos países. Dessa maneira, é fácil entender que o principal papel da tecnologia tem sido o de esti- mular a economia com novos e melhores produtos, cujo surgimento leva à substituição de produtos anteriores e força a realização de novos investimentos. A tecnologia se tornou um dos principais motores da economia capitalista. Contudo, seu uso deve ser dirigido e, quando necessário, limitado, pela atuação responsável de cientistas e de toda a sociedade. Filosofia Também a filosofia é um modo especial de elaborar conhecimentos. A própria palavra filosofia o denuncia: no grego antigo, filo + sofia equivale a amor pela sabedoria, isto é, uma busca contínua, amorosa e empenhada do conhecimento em direção à sabedo- ria. Mas esta explicação não nos basta atualmente. Como modo de conhecer, a filosofia pode ser compreendida como reflexão radical, ri- gorosa e de conjunto sobre problemas que a realidade em que vivemos nos apresenta (SAVIANI, 1983). Afirmar que a Filosofia é reflexão significa afirmar que a razão (nossa capacidade de raciocinar) é o instrumento mais importante para a compreensão da rea- lidade. Mas não é qualquer tipo de reflexão que pode ser chamada de filosófica. �deve ser radical, na medida em que desce às raízes dos proble- mas enfrentados; �deve ser rigorosa, quando utiliza de procedimentos com lógi- ca e metodologia, indispensáveis para o desenvolvimento reto e seguro da razão, bem como da percepção das racionalidades no real; �deve, finalmente, ser abrangente, na medida em que procura focar seus objetos nos contextos que lhes dão sentidos e nas circunstâncias que interagem com os seres humanos. 2 37Estudo do Ser Humano Contemporâneo Os objetivos desta reflexão são variados e diversos, conforme os diferentes autores e correntes da filosofia. Observe a seguir: Filosofia a) um conjunto de conhecimentos que visa fornecer explicação fundamental de todas as coisas; b) a tentativa de encontrar sentidos que expliquem radicalmente a realidade huma- na, sua inserção no mundo e suas possibilidades existenciais; c) a busca pelos fundamentos concretos da realidade, bem como a busca pelas possibilidades de conhecê-la; d) a busca do direcionamento racional das ações humanas, na ação e na ética, e da construção racional do mundo humano. Vale uma palavra sobre a necessidade e a importância da filosofia. O senso comum a considera inútil. Entretanto, apoiada na reflexão rigorosamente racional, a filosofia permite ao homem se distanciar do mundo cotidiano, do agir imediato, dos sentidos preconcebidos e impostos pelas ideologias. Este distanciamento permite: �a retomada crítica dos fundamentos da ação individual e coletiva; �a crítica do pensamento relativista ou mesmo dogmático, tão frequentes no senso comum; �a crítica da especialização fragmentadora das ciências, da es- treiteza da razão instrumental sacralizada pela tecnologia. Tabela 01. Diálogo entre a Filosofia e outras formas do conhecimento CIÊNCIAS PROFISSÕES E TECNOLOGIA FÉ E A TEOLOGIA De fato, no diálogo com a ciên- cia, a filosofia se apropria de conhecimentos científicos que lhe permitem melhor aproximação do real, enquanto as ciências se enriquecem com a discussão dos fundamentos e do alcance dos conhecimentos construídos. Às profissões e tecnologias, a filosofia traz a discussão ética e metodológica das finalidades e dos meios da ação, do trabalho e do próprio conhecimento científico. Com a fé e a teologia, a filosofia pode empreender riquíssimo diálogo, no qual se alcança uma esfera mais ampla de significa- ção da experiência humana e de sua relação com o ser e com o Criador. Com as artes, a filosofia dialoga em busca do belo, do ser e do fazer. FONTE: O autor (2017) 38 2 Expressões e Processos do Conhecimento e o Humano como ser Multifacetário e Relacional Na filosofia reside a possibilidade de o homem transcender a situação dada e não esco- lhida, reside nela a possibilidade de o homem se tornar capaz de projetar o efetivamen- te novo e direcionar livremente seu destino. Pelo exercício do pensamento radicalmente crítico, a filosofia permite elaborar a refle- xão sobre os fundamentos e limites da ciência, das tecnologias e das profissões e de todas as formas do conhecer. A filosofia permite diálogo construtivo com todas as modalidades do conhecimento. Mas também se opõe, criticamente, à ciência que pretende explicar o real pela negação de tudo o que não recai sob seus instrumentos; contrapõe-se às ideologias que mascaram a realidade, às tecnologias que pretendem prescindir da finalidade humana, às aborda- gens ingênuas e redutoras, que entorpecem o senso comum. A filosofia pode cooperar construtivamente com todas as modalidades do conhecimento que exerçam suas funções sem ultrapassar o grau próprio de seu saber. 1.2 EM BUSCA DE UMA COMPREENSÃO CRÍTICA Infelizmente não temos à nossa disposição a alternativa de adotar uma forma única e suficiente. Todas as formas de conhecimento nos são necessárias: A ciência é indispensável. Trata-se do mais bem-sucedido empreendimento humano na área do conhecimento e seu papel é insubstituível para a compreensão do mundo em que vivemos, de tudo o que envolve a vida humana e mesmo para a compreensão de nós mesmos. É a forma de conhecimento que permite a elaboração de tecnologias, que se tornaram indispensáveis à conservação da vida humana. Contudo, não nos basta a ciência. As demais formas do conhecimento são também necessárias para a vida humana atual. O senso comum: Os mitos, tem papel importantíssimo nos grupos sociais, pois as opiniões e significados que faz circular permitem o entendimento mútuo entre indivíduos. já o vimos, são um esforço, permanente e nunca abandonado, para compreen- der os mistérios que nos cercam. Como nos situamos diante de todas essas formas de conhecimento? Qual delas tem mais razão no que afirma, no que nega ou no modo como procede? 2 39Estudo do Ser Humano Contemporâneo As ideologias proporcionam unidade e mobilização de grupos sociais. A filosofia busca compreensão crítica e radical da realidade humana e das próprias for- mas de conhecimento. Todas essas formas de conhecimento têm sua importância e atendem à irrenunciável necessidade humana de conhecer. Na vida cotidiana, utilizamos todas essas formas, ora isoladamente, ora mesclando-as. Todas elas, cada uma a seu modo e para momen- tos distintos, podem nos ser úteis na busca da compreensão mais profunda da realida- de humana e do mundo que nos cerca. Isso não significa aceitar,
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