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1 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 Alergia e Imunologia INFECÇÕES DE REPETIÇÃO Introdução: As infecções de repetição são mais comuns em crianças. As infecções respiratórias de repetição apresentam prevalência de 3,5- 32%, as infecções gastrointestinais de repetição apresentam prevalência de 1,2- 26%. Os principais fatores de risco para infecções de repetição na infância são: - Baixo peso ao nascer. - Prematuridade. - Atopia. - Frequentar creches (quanto mais cedo a criança passar a frequentar creches, maior o risco de infecções de repetição). - Tabagismo passivo. - Situação socioeconômica. Aproximadamente 50% das infecções de repetição ocorrem em crianças sem nenhuma doença de base, 30% das infecções de repetição associam-se à atopia, 10% das infecções de repetição associam-se à imunodeficiência primária e, finalmente, 10% das infecções de repetição apresentam outras causas. Os pacientes alérgicos apresentam inflamação crônica da mucosa nasal e/ou brônquica, que atua como porta de entrada para microrganismos, resultando em infecções de repetição. Os principais fatores associados a aumento do risco de alergias em crianças são: - Parto cesáreo. - Ser filho único. - Dieta rica em alimentos processados e/ou ultraprocessados. - Exposição a agentes antissépticos e/ou desinfetantes. - Uso de antibióticos e/ou inibidores da bomba de prótons. Os principais fatores associados à diminuição do risco de alergias em crianças são: - Aleitamento materno. - Dieta rica em alimentos orgânicos (frutas, legumes e verduras). - Consumo de leite não processado. - Contato com animais domésticos (cães e gatos). - Vida na fazenda. - Famílias grandes com grande número de irmãos. - Exposição à grande variedade de microrganismos. Infecções respiratórias de repetição: Aproximadamente 50% das infecções respiratórias de repetição ocorrem em crianças normais. As crianças < 1 ano de idade apresentam 6-8 episódios de infecção respiratória por ano. As crianças > 1 ano de idade apresentam 3-6 episódios de infecção respiratória por ano. A incidência de infecções respiratórias na infância diminui à medida que há aumento da idade da criança, pois o sistema imunológico, imaturo no início da vida da criança, evolui ao longo dos anos, aumentando a eficácia de combate às infecções. Quanto ao tipo de infecção respiratória, as mais frequentes na infância são as infecções de vias aéreas superiores (rinite, sinusite, faringite, amigdalite, laringite), seguidas por otite média aguda e, então, por infecções de vias aéreas inferiores (bronquite, bronquiolite, pneumonia). Quanto às causas de infecções respiratórias na infância, as mais comuns são as virais. Os principais vírus associados a infecções respiratórias em crianças são adenovírus, rinovírus, parainfluenza e vírus sincicial respiratório (VSR). As infecções respiratórias bacterianas são menos frequentes e, muitas vezes, são complicações secundárias a infecções virais. Características imunológicas da infância: A idade de maturação funcional completa dos diferentes mecanismos imunológicos anti-infecciosos na infância são: - Neutrofilia: 6 meses. 2 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 - Sistema complemento: 6 meses. - Função de linfócitos T: 12 meses. - Anticorpos antipolissicarídeos: 2 anos. - Anticorpos IgA de mucosas: 3 anos. - Anticorpos IgG2: 10 anos. - Anticorpos IgA: 12 anos. Quanto ao conteúdo de anticorpos/imunoglobulinas presentes na circulação sanguínea das crianças, observa- se que, ao nascimento, quase 100% dos anticorpos circulantes correspondem à IgG materna. A produção de IgM da criança já se inicia antes do nascimento (intraútero) e aumenta progressivamente após o nascimento. A produção de IgG, IgA e IgE inicia-se principalmente após o nascimento, aumentando progressivamente ao longo dos meses e anos. Entretanto, aos 15 meses de vida, o principal anticorpo presente na circulação sanguínea da criança é a IgM. Quanto à transferência materna de anticorpos, ou seja, à transferência da experiência imunológica materna para o filho, observa-se que, durante a gestação, há transferência de anticorpos IgG maternos por via placentária e que, durante o aleitamento materno, há transferência de anticorpos IgA maternos via leite materno. Assim, quanto mais próximo o bebê nascer do termo, maior a quantidade de anticorpos IgG maternos transferidos para o bebê e menor o risco de infecções após seu nascimento. Além disso, quanto maior o tempo de aleitamento materno do bebê, maior a proteção imunológica contra infecções conferida a ele por meio da transferência de anticorpos IgA maternos. Atopia: A atopia representa a causa de 30% dos casos de infecções de repetição na infância. As principais doenças alérgicas associadas a aumento do risco de infecções respiratórias de repetição na infância são dermatite atópica, rinite alérgica e conjuntivite alérgica, que associam-se a risco aumentado de infecções de vias aéreas superiores (IVAS), principalmente rinossinusites e otite média aguda (OMA). As IVAS causam tosse e sibilância, que são mais intensos em pacientes atópicos. Estes sintomas atópicos, muitas vezes, resultam em diagnósticos incorretos de traqueobronquite e/ou pneumonia bacteriana. Entretanto, como os sintomas não são causados por infecções bacterianas, os pacientes não respondem ao tratamento com antibióticos. As doenças alérgicas podem causar redução do crescimento e do desenvolvimento neuropsicomotor. Na avaliação de crianças com infecções respiratórias de repetição, é muito importante a investigação de doenças alérgicas, devendo ser avaliada história familiar e fatores ambientais (aeroalérgenos que podem desencadear crises alérgicas). O diagnóstico de doenças alérgicas baseia- se em anamnese, exame físico e exames laboratoriais. Os principais achados laboratoriais indicativos de alergia são aumento de IgE total, teste cutâneo (in vivo) para alérgenos suspeitos positivo e teste de IgE alérgeno-específicos (in vitro) positivo. Outras causas de infecções recorrentes na infância: Além da atopia e das imunodeficiências, outras causas de infecções respiratórias recorrentes na infância são: - Anatômicas: → Fissura labial, palatina e/ou laringotraqueal. → Fístula traqueoesofágica. → Cisto broncopulmonar. → Sequestro pulmonar. → Malformações adenomatoides císticas. → Hipoplasia pulmonar. 3 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 → Anel vascular. → Malformação cardiovascular. - Aspirativas: → Incoordenação da deglutição. → DRGE. → Fístula traqueoesofágica. → Corpo estranho. → Fenda laringotraqueal. - Metabólicas: → Fibrose cística. → Deficiência de α1-antitripsina. - Alterações do clearance mucociliar: → Discinesia ciliar. → Fibrose cística. → Displasia broncopulmonar. → Traqueomalácia e/ou broncomalácia. → Exposição a poluentes atmosféricos. → Prematuridade e ventilação mecânica. → Atelectasia. → Bronquiectasia. → Bronquiolite obliterante (associa-se à infecção por adenovírus). - Deficiência de micronutrientes: → Anemia ferropriva: acomete 40-80% dos lactentes no Brasil; associa-se à diminuição da ação bactericida de neutrófilos, à diminuição da proliferação de linfócitos T, à diminuição de anticorpos antipneumocócicos e à diminuição da resposta imunológica às imunizações. → Deficiência de zinco: o zinco atua estimulando a proliferação, a maturação e a diferenciação de linfócitos T; a deficiência de zinco associa-se à diminuição da proliferação de linfócitos T, à diminuição da secreção de citocinas pró-inflamatórias que estimulam a proliferação e a diferenciação de linfócitos T imaturos em linfócitos TH1 (IL-2 e IFN-γ) e à involução do timo; a suplementação de zinco em crianças < 5 anos de idade associa-se à redução da mortalidade por diarreia e pneumonia. Imunodeficiências: As imunodeficiênciasrepresentam a causa de 10% das infecções de repetição na infância. As imunodeficiências classificam-se em: - Primárias: → Representam um grupo heterogêneo de doenças genéticas que afetam funções específicas da imunidade inata e/ou adaptativa. → Causam suscetibilidade aumentada a infecções. → Há > 120 anormalidades genéticas responsáveis por > 200 tipos diferentes de imunodeficiências primárias. → Classificam-se em imunodeficiências predominantemente celulares (linfócitos T), imunodeficiências predominantemente humorais (anticorpos/imunoglobulinas), imunodeficiências combinadas (celular e humoral), imunodeficiências fagocíticas (células da imunidade inata, como macrófagos e neutrófilos) e imunodeficiências associadas ao sistema complemento. - Secundárias: → Desnutrição. → Hipovitaminose A. → Infecção por HIV/AIDS. → Diabetes mellitus. → Nefropatias. → Neoplasias. → Enteropatia perdedora de proteínas. → Drogas: AINES, corticoides, imunossupressores, quimioterápicos. → Imunobiológicos: anti-TNFα. → Doenças autoimunes. → Anemia falciforme. → Esplenectomia. Os principais sinais que devem aumentar a suspeita clínica de imunodeficiências primárias são: - 4 ou mais episódios de otite média aguda no último ano. 4 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 - 2 ou mais episódios de pneumonia no último ano. - Estomatites de repetição ou candidíase > 2 meses. - Abcessos de repetição ou ectima. - 1 episódio de infecção sistêmica grave (meningite, septicemia, etc). - Infecções gastrointestinais de repetição e/ou diarreia crônica. - Asma grave, doença autoimune ou doença do colágeno. - Reação adversa à vacina BCG ou infecção por micobactéria. - Fenótipo clínico sugestivo de síndrome associada à imunodeficiência primária. - História familiar de imunodeficiência.
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