Prévia do material em texto
1 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 Neurologia DISTÚRBIOS DO MOVIMENTO Introdução: O sistema extrapiramidal é responsável por realizar o controle dos movimentos (coordenação e planejamento de atividades motoras complexas), sendo capaz de estimular e de inibir os movimentos. O sistema extrapiramidal é formado por tálamo, gânglios/núcleos da base e cerebelo. O principal neurotransmissor associado ao sistema extrapiramidal é a dopamina, que, no SNC, é produzida pela substância nigra, localizada no mesencéfalo. A disfunção do sistema extrapiramidal causa distúrbios do movimento. Os gânglios/núcleos da base são formados por núcleo lentiforme (globo pálido e putâmen), núcleo caudado, substância nigra e núcleo subtalâmico. O núcleo caudado e o putâmen são considerados, segundo a função, como uma unidade, o neoestriado. O neoestriado representa a via de entrada dos circuitos dos gânglios da base, apresentando como principal aferência o córtex motor e as áreas associativas. A substância nigra classifica-se em pars compacta e pars reticulata. O neoestriado também recebe aferência da substância nigra pars compacta, que libera o neurotransmissor dopamina. A dopamina, ao ligar-se a receptores D1, excita os neurônios do neoestriado, e, ao ligar-se a receptores D2, inibe os neurônios do neoestriado. O globo pálido e a substância nigra pars reticulata representam a via de saída dos circuitos dos gânglios da base, apresentando projeções em direção ao tálamo que, por sua vez, apresenta projeções em direção ao córtex motor, ao córtex pré-motor e à área motora suplementar. A conexão entre o complexo neoestriado + substância nigra pars compacta e o complexo globo pálido + substância nigra pars reticulata é realizada por via direta e por via indireta. A via direta inibe o complexo globo pálido + substância nigra pars reticulata e a via indireta estimula o complexo globo pálido + substância nigra pars reticulata. A estimulação do complexo globo pálido + substância nigra pars reticulata causa inibição do tálamo, já a inibição do complexo globo pálido + substância nigra pars reticulata causa estimulação do tálamo. O controle dos movimentos realizado pelo sistema extrapiramidal baseia-se em estimulação ou inibição do tálamo. A estimulação do tálamo estimula o movimento e a inibição do tálamo inibe o movimento. A ativação da via direta inibe o complexo globo pálido + substância nigra pars reticulata, o que estimula o tálamo, estimulando o movimento. A ativação da via indireta estimula o complexo globo pálido + substância nigra pars reticulata, o que inibe o tálamo, inibindo o movimento. O neurotransmissor dopamina, ao ligar-se a receptores D1, estimula a via direta e, ao ligar-se a receptores D2, inibe a via indireta e, portanto, facilita o movimento. Assim, o excesso de dopamina causa distúrbios hipercinéticos, devido à hiperestimulação da via direta, e a falta de dopamina causa distúrbios hipocinéticos, devido à hipoestimulação da via direta. O distúrbio hipercinético também pode ser causado por lesão da via indireta, assim como o distúrbio hipocinético pode ser causado por lesão da via direta. Os distúrbios do movimento classificam-se em hipercinéticos e hipocinéticos. Os distúrbios hipercinéticos são representados por atetose, balismo, coreia e distonia. Os distúrbios hipocinéticos apresentam como protótipo o parkinsonismo e a principal doença associada é a Doença de Parkinson. Parkinsonismo: O parkinsonismo é o distúrbio hipocinético que caracteriza-se por presença de ≥ 2 dos seguintes achados clínicos: bradicinesia, 2 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 rigidez, tremor e instabilidade postural. O parkinsonismo pode ser causado por acidente vascular cerebral (AVC), Doença de Parkinson, drogas/medicamentos, outras doenças neurodegenerativas (parkinsonismo atípico), toxinas, trauma cranioencefálico (TCE), tumores, etc. As principais causas de parkinsonismo atípico, ou seja, de parkinsonismo associado a doenças neurodegenerativas, exceto a Doença de Parkinson, são atrofia multissistêmica, degeneração corticobasal, demência com corpos de Lewy e paralisia supranuclear progressiva. O principal achado clínico do parkinsonismo é a bradicinesia. O diagnóstico do parkinsonismo é clínico e baseia-se em presença de bradicinesia associada a ≥ 1 dos seguintes achados clínicos: - Rigidez. - Tremor. - Instabilidade postural. A bradicinesia é definida como a pobreza de movimentos e a lentificação para a iniciação e a execução de movimentos, automáticos e voluntários, na ausência de paresia e/ou paralisia. A amimia (ausência de mímica facial) ou a hipomimia (diminuição de mímica facial) também são manifestações da bradicinesia. Outras manifestações da bradicinesia são alterações de marcha (marcha em bloco, realizada a passos curtos, com perda do balanço normalmente associado dos braços), alterações de postura (imobilidade, rigidez), alterações de mobilidade do tronco (dificuldade em levantar-se da cadeira e de sair do automóvel), alterações da fala (hipofonia e monotonia da fala/voz), alterações da escrita (escrita lenta), além de alterações observadas para a realização de movimentos complexos, como deglutir, escovar os dentes, vestir-se, etc. Os pacientes também podem apresentar sialorreia, devido à disfagia e à perda do tônus muscular da face. A rigidez associada ao parkinsonismo (síndrome extrapiramidal) caracteriza-se por rigidez plástica, ou seja, por resistência aumentada à movimentação passiva da articulação durante todo o movimento, diferentemente da rigidez espástica associada à síndrome piramidal, que caracteriza-se por resistência aumentada à movimentação passiva da articulação apenas durante o início do movimento (rigidez em canivete). A rigidez plástica associada ao parkinsonismo é denominada rigidez em roda denteada, que caracteriza-se por períodos de liberação intermitente durante a movimentação passiva da articulação. Os pacientes com parkinsonismo comumente apresentam postura em flexão, que inicia-se nos braços e dissemina-se progressivamente por todo o corpo. O aumento do tônus muscular mantém a cabeça e o tronco inclinados para frente, a coluna vertebral em cifose torácica e os punhos, cotovelos, quadris e joelhos flexionados, resultando, ao caminhar, em marcha em bloco, com o corpo inclinado para frente, o que altera o centro de gravidade, aumentando o risco de quedas. Os pacientes com parkinsonismo também apresentam instabilidade postural, causada por perda dos reflexos posturais, que dependem da propriocepção articular e muscular, do sistema vestibular e da visão. A alteração do centro de gravidade e a perda dos reflexos posturais causa instabilidade postural, aumentando o risco de quedas. A instabilidade postural de manifestação precoce associa-se ao parkinsonismo atípico. O tremor pode manifestar-se em ação ou em repouso. O tremor de ação manifesta-se quando há ação de algum grupo muscular e classifica-se em: - Cinético: → Simples: tremor que manifesta-se de forma homogênea ao longo de todo o movimento. → Intencional: tremor que inicia ou piora ao final do movimento, à medida que o paciente aproxima-se do alvo. O tremor simples é característico dos tremores cerebelares. O tremor intencional é característico dos tremores cerebelares e do tremor essencial. Na suspeita clínica de tremor cerebelar, pode-se realizar o Teste de Romberg e o Pull Test, com o objetivo de identificar a presença de distúrbio de equilíbrio associado. 3 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 → Tarefa-dependente: tremor que manifesta-se apenas durante a realização de determinadas tarefas, como escrever, pintar, tocar instrumentos musicais, etc. - Postural: → Postura-dependente: tremor que manifesta-se quando há ação de determinado grupo muscular. → Postura-independente: tremor que manifesta-se quandohá ação de diferentes grupos musculares. O tremor também classifica-se em assimétrico e simétrico. Os tremores muito assimétricos sugerem a presença de lesões estruturais do SNC, como tumores. Os tremores muito simétricos sugerem a presença de distúrbios metabólicos e/ou de tremor secundário ao uso de drogas/medicamentos. O tremor que manifesta-se em ação e em repouso de forma assimétrica é sugestivo de tremor rubral, ou seja, de tremor causado por lesão de cerebelo, mesencéfalo e/ou ponte. O tremor associado ao parkinsonismo, especialmente à Doença de Parkinson, caracteriza-se como tremor de repouso assimétrico, que inicia-se unilateral e evolui para o lado contralateral, tornando-se bilateral, mas ainda assim assimétrico. Doença de Parkinson: A Doença de Parkinson é definida como a doença neurodegenerativa crônica e progressiva que caracteriza-se por perda de neurônios dopaminérgicos da substância nigra da via nigroestriatal. A doença apresenta causa multifatorial, dependendo de fatores ambientais e genéticos. Os principais fatores associados à fisiopatologia da Doença de Parkinson são exposição a neurotoxinas ambientais, produção de radicais livres, alterações mitocondriais, predisposição genética e envelhecimento cerebral. A doença cursa com morte de neurônios dopaminérgicos da substância nigra, resultando em diminuição da liberação do neurotransmissor dopamina no neoestriado para estimular a via direta e inibir a via indireta do sistema extrapiramidal, causando diminuição dos movimentos (bradicinesia), que representa a característica clínica principal da Doença de Parkinson. Os neurônios sobreviventes da substância nigra apresentam inclusões citoplasmáticas eosinofílicas denominadas corpos de Lewy, que representam a característica patológica principal da Doença de Parkinson. A incidência da Doença de Parkinson aumenta com a idade, sendo mais comum após os 50 anos de idade. Quando a doença manifesta-se antes dos 50 anos de idade, é denominada Doença de Parkinson precoce. A prevalência da doença é de 2-5% na população mundial, sendo mais comum em homens do que em mulheres. Acredita-se que a cafeína e o tabaco sejam fatores de proteção ao desenvolvimento da doença, enquanto a exposição a herbicidas e a pesticidas sejam fatores de risco ao desenvolvimento da doença. A Doença de Parkinson apresenta fases assintomáticas ou sintomáticas pré-clínicas que antecedem o aparecimento dos sintomas motores em até 20 anos. As principais manifestações clínicas que antecedem os sintomas motores da Doença de Parkinson são ansiedade, depressão, distúrbios do sono REM, distúrbios do olfato, distúrbios do paladar e constipação intestinal. As manifestações clínicas que antecedem os sintomas motores na Doença de Parkinson devem-se à degeneração e ao acúmulo dos corpos de Lewy no bulbo olfatório e no tronco cerebral. À medida que a doença evolui, há degeneração e acúmulo dos corpos de Lewy nos neurônios da substância nigra, causando os sintomas motores e, em fases avançadas da doença, nos neurônios do córtex cerebral, causando demência, com comprometimento 4 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 da linguagem, da memória e de outras funções cognitivas. Além disso, à medida que a doença avança, há o desenvolvimento de manifestações como distúrbios urinários e hipotensão ortostática/postural. O diagnóstico da Doença de Parkinson é essencialmente clínico. Entretanto, o único exame capaz de confirmar o diagnóstico da doença é o estudo anatomopatológico. Assim, na prática clínica, o diagnóstico baseia-se em critérios clínicos e em realização de exames complementares para excluir diagnósticos diferenciais, principalmente parkinsonismo atípico e parkinsonismo secundário. Os critérios diagnósticos do Banco de Cérebros de Londres são: - Bradicinesia associada à presença de ≥ 1 dos seguintes achados clínicos: → Rigidez. → Tremor de repouso (4-6 Hz). → Instabilidade postural não causada por alteração cerebelar, vestibular, visual ou disfunção proprioceptiva. Na Doença de Parkinson, o tremor geralmente manifesta-se apenas em repouso, desaparecendo durante o movimento, quando há ativação de algum grupo muscular. Entretanto, o tremor reaparece imediatamente após o fim do movimento, sendo denominado tremor reemergente. O tremor de repouso representa a manifestação clínica inicial da Doença de Parkinson em até 80% dos pacientes. Na Doença de Parkinson, a instabilidade postural representa achado clínico tardio, que manifesta-se aproximadamente 4-5 anos após o aparecimento dos sintomas motores. - Presença de ≥ 3 dos seguintes critérios clínicos adicionais: → Início unilateral e assimétrico. → Presença de tremor de repouso. → Evolução progressiva dos sintomas. → Assimetria persistente que acomete principalmente o lado de início da doença. → Boa resposta à levodopa (melhora clínica de 70-100%). → Resposta à levodopa por 5 anos ou mais. → Discinesia induzida por levodopa. → Evolução clínica de 10 anos ou mais. Os critérios clínicos de exclusão do diagnóstico de Doença de Parkinson, que aumentam a suspeita de outras causas de parkinsonismo (diagnósticos diferenciais), são: - História de AVCs recorrentes. - História de TCE grave. - História de encefalite. - Crises oculares. - História de uso de antipsicóticos. - Remissão espontânea dos sintomas. - ≥ 1 familiar afetado. - Sintomas exclusivamente unilaterais por, no mínimo, 3 anos. - Paralisia supranuclear do olhar. - Sinais e sintomas cerebelares. - Disfunção autonômica precoce. - Demência precoce, com comprometimento de linguagem e de memória. - Reflexo cutâneo-plantar extensor (Sinal de Babinski) e/ou outros sinais e sintomas piramidais. - Evidência de hidrocefalia comunicante ou de tumor cerebral em neuroimagem. - Ausência de resposta à levodopa em altas doses. A avaliação funcional dos pacientes com Doença de Parkinson pode ser realizada por meio da escala de Hoehn e Yahr. Escala de Hoehn e Yahr 0 Nenhum sinal de doença 1 Doença unilateral 1,5 Doença unilateral e axial 2 Doença bilateral sem déficit de equilíbrio 2,5 Doença bilateral com déficit de equilíbrio leve 3 Doença bilateral com instabilidade postural 5 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 4 Incapacidade grave, mas ainda é capaz de caminhar ou permanecer de pé 5 Incapacidade grave, estando restrito à cama ou à cadeira de rodas Os principais diagnósticos diferenciais da Doença de Parkinson (parkinsonismo primário) são: - Parkinsonismo secundário: → Parkinsonismo induzido por drogas/medicamentos: antipsicóticos típicos, antipsicóticos atípicos, antieméticos e procinéticos, antivertiginosos, antiarrítmicos (amiodarona), anticonvulsivantes (ácido valproico), estabilizadores de humor (lítio), etc. → Toxinas. → Distúrbios metabólicos, como hipoparatireoidismo. → Infecções: encefalites, HIV, neurossífilis. → Acidente vascular cerebral (AVC). → Trauma cranioencefálico (TCE). → Hidrocefalia de pressão normal. → Tumores cerebrais. - Parkinsonismo atípico: → Atrofia multissistêmica. → Degeneração corticobasal. → Demência com corpos de Lewy. → Paralisia supranuclear progressiva. → Tremor essencial. Os principais sinais de alerta para o diagnóstico diferencial de parkinsonismo atípico são: - Alto risco de quedas e instabilidade postural precoces. - Baixa resposta ou ausência de resposta à levodopa. - Bradicinesia e rigidez simétricas. - Ausência de tremor. - Apraxia. - Mioclonias. - Fenômeno da “mão alienígena”. - Dificuldade no olhar conjugado para baixo. - Distonia facial. - Perda precoce de reflexos posturais. - Disfagia precoce. - Rigidez espástica. - Demência ou alucinações precoces. - Disfunção autonômica grave e precoce. O tratamento da Doença de Parkinson é sintomático. Atualmente, não há drogas capazes de modificaro curso da doença, ou seja, de desacelerar o processo degenerativo dos neurônios dopaminérgicos da substância nigra da via nigroestriatal. As principais classes de medicamentos disponíveis para o tratamento da Doença de Parkinson são: - Anticolinérgicos: biperideno; causam diminuição da concentração do neurotransmissor acetilcolina, resultando em diminuição dos movimentos associados às vias extrapiramidais; eficazes em pacientes que apresentam tremor de repouso intenso, principalmente em jovens sem déficit cognitivo, devendo ser evitados em pacientes muito idosos; os principais efeitos adversos são boca seca, constipação intestinal, retenção urinária, visão borrada, declínio cognitivo e psicose; os anticolinérgicos são contraindicados em casos de glaucoma de ângulo fechado, miastenia gravis, obstrução intestinal e retenção urinária. → Biperideno 2-16 mg/dia dividido em 2-3 tomadas diárias. - Antiglutamaérgicos: amantadina; causam diminuição da concentração do neurotransmissor excitatório glutamato nas vias extrapiramidais, resultando em diminuição da estimulação do globo pálido e, consequentemente, em aumento da estimulação do tálamo, estimulando o movimento; eficazes em diminuir a bradicinesia nas fases iniciais da Doença de Parkinson, principalmente em pacientes com sintomas leves; os principais efeitos adversos são ansiedade, insônia, declínio cognitivo, psicose e sintomas anticolinérgicos. → Amantadina 50-200 mg/dia dividido em 2 tomadas diárias. - Inibidores da monoaminoxidase (IMAO) tipo B: rasagilina, safinamida e selegilina; 6 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 causam inibição da enzima monoaminoxidase tipo B (MAO-B), que degrada o neurotransmissor dopamina no SNC, e aumentam a recaptação de dopamina na fenda sináptica, resultando em aumento da concentração de dopamina no SNC, inclusive na substância nigra da via nigroestriatal; eficazes em diminuir os sintomas nas fases iniciais da Doença de Parkinson, principalmente em pacientes com sintomas leves; os principais efeitos adversos são sedação/sonolência, confusão mental, excitação, insônia, tremores, mioclonias, convulsões, disfunção sexual, aumento de apetite, ganho de peso, hipotensão ortostática/postural e sintomas anticolinérgicos; a associação com outras classes de antidepressivos, como ISRS, aumenta o risco de causar síndrome serotoninérgica. → Selegilina 2,5-20 mg/dia dividido em 2 tomadas diárias. - Agonistas dopaminérgicos: bromocriptina e pramipexol; estimulam diretamente receptores dopaminérgicos no neoestriado, apresentando meia-vida mais longa que a levodopa; eficazes em qualquer fase da doença, mas geralmente indica-se a droga em casos moderados a graves; os principais efeitos adversos são hipotensão ortostática, síncope, taquicardia, discinesias e psicose; os agonistas dopaminérgicos são contraindicados em casos de glaucoma de ângulo fechado e de transtornos psicóticos. → Bromocriptina 1,25 mg/dia dividido em até 4 tomadas diárias. → Pramipexol 0,75-3,0 mg/dia dividido em 2- 3 tomadas diárias. - Levodopa: substância precursora da dopamina que, ao atravessar a barreira hematoencefálica, é metabolizada pela enzima dopa-descarboxilase central, transformando-se em dopamina, que liga-se aos receptores dopaminérgicos no neoestriado, estimulando o movimento; a levodopa representa a droga mais eficaz no tratamento da Doença de Parkinson, com alívio de 100% dos sintomas durante os primeiros anos de tratamento (período de “lua de mel” da Doença de Parkinson); a levodopa é eficaz em qualquer fase da doença, mas, em geral, indica-se a droga em casos moderados a graves; os principais efeitos adversos são anorexia, náuseas, vômitos, taquicardia, arritmias cardíacas, sedação/sonolência, confusão mental, ansiedade, depressão, excitação, insônia e psicose; à medida que a doença avança, geralmente após 5-10 anos de tratamento, há aumento da incidência de discinesias associadas ao uso da levodopa, havendo necessidade de fracionar a dose da medicação e/ou de adicionar outras drogas ao tratamento (agonistas dopaminérgicos e/ou amantadina); a levodopa é contraindicada em casos de glaucoma de ângulo fechado e de transtornos psicóticos; os efeitos adversos gastrointestinais, que devem-se à ação da enzima dopa- descarboxilase periférica, presente na mucosa do trato gastrointestinal, podem ser minimizados com a combinação da levodopa com inibidores da dopa-descarboxilase periférica, tais como benserazida e carbidopa. → Levodopa + Benserazida. → Levodopa + Carbidopa. - Inibidores da catecol O-metiltransferase (COMT): entacapone; inibição da enzima COMT, que metaboliza a levodopa, aumentando os níveis séricos da levodopa; indicados para pacientes em uso de levodopa que ainda apresentam sintomas motores e/ou que apresentam discinesias associadas ao uso de levodopa a longo prazo; os principais efeitos adversos são diarreia, alteração de coloração da urina (laranja), psicose e piora das discinesias. → Entacapone 200 mg em associação a cada dose de levodopa. O tratamento da Doença de Parkinson sempre deve ser iniciado com a menor dose possível de medicação e, sempre que possível, em monoterapia. Nunca deve-se associar 2 drogas da mesma classe, ou seja, que apresentam o mesmo mecanismo de ação. Ao longo do tempo, o tratamento medicamentoso da Doença de Parkinson pode tornar-se ineficaz, com aumento da incidência de efeitos adversos, tais como discinesias e flutuações dos sintomas motores. O uso de antipsicóticos representa importante causa de parkinsonismo 7 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 secundário, resultando em piora dos sintomas da Doença de Parkinson, e, portanto, devem ser evitados em pacientes com a doença. Entretanto, à medida que a Doença de Parkinson avança, pode haver o desenvolvimento de demência, caracterizada por presença de sintomas psicóticos, como alucinações e delírios, havendo necessidade de uso de antipsicóticos para o controle desses sintomas. Nestes casos, recomenda-se o uso de clozapina ou quetiapina, que causam menos efeitos adversos extrapiramidais. A associação entre anti-hipertensivos e levodopa associa-se a risco aumentado de hipotensão ortostática/postural. A escolha do tratamento mais indicado ao paciente com Doença de Parkinson depende de várias características, como: - Idade do paciente. - Gravidade dos sintomas parkinsonianos (leves, moderados ou graves). - Status cognitivo do paciente. - Comorbidades do paciente. - Tolerabilidade à medicação. - Condições financeiras do paciente. Em pacientes que apresentam sintomas leves, com mínimo impacto nas atividades de vida diária, indica-se o uso de anticolinérgicos (biperideno), antiglutamaérgicos (amantadina) ou inibidores da monoaminoxidase tipo B (rasagilina, selegilina). Em pacientes que apresentam sintomas leves a moderados ≤ 65 anos de idade, indica-se o uso de agonistas dopaminérgicos (pramipexol) ou levodopa. Em pacientes que apresentam sintomas leves a moderados > 65 anos de idade e em pacientes que apresentam sintomas moderados a graves de qualquer idade, indica-se o uso de levodopa. Assim, sempre que o paciente com Doença de Parkinson apresentar impacto importante nas atividades de vida diária, recomenda-se o uso de levodopa, que representa o tratamento mais eficaz para o controle dos sintomas parkinsonianos. A levodopa, sempre que possível, deve ser associada a inibidor da dopa-descarboxilase periférica (benserazida, carbidopa) e/ou a inibidor da COMT (entacapone), com o objetivo de diminuir a incidência de efeitos adversos associados ao uso da medicação. O tratamento cirúrgico da Doença de Parkinson deve ser considerado em pacientes que apresentam boa resposta à levodopa, mas que apresentam efeitos adversos intoleráveis, principalmente discinesias, e em pacientes que apresentam tremor incapacitante refratário ao tratamentomedicamentoso. O tratamento cirúrgico não cura a Doença de Parkinson, mas representa alternativa eficaz para o controle dos sintomas da doença. O tratamento cirúrgico realizado é a terapia de estimulação cerebral profunda no tálamo e/ou no subtálamo em casos de discinesias bilaterais e/ou tremor incapacitante, que baseia-se em implantação de um dispositivo no cérebro que emite ondas elétricas capazes de aliviar os sintomas. Outra alternativa de tratamento cirúrgico é a palidotomia (ressecção cirúrgica do globo pálido), indicada em casos de discinesias unilaterais. O tratamento do parkinsonismo medicamentoso baseia-se em suspender o medicamento que está causando os sintomas extrapiramidais no paciente. O uso de biperideno para prevenir o desenvolvimento de parkinsonismo medicamentoso em pacientes que estão em uso de antipsicóticos não apresenta evidências na literatura. Atualmente, o uso da medicina nuclear por meio da realização do exame de cintilografia de perfusão cerebral com TRODAT (radioisótopo) possibilita diferenciar a Doença de Parkinson de outras formas de parkinsonismo (atípico e secundário). Quando o TRODAT é captado no exame, há indicação de que a via nigroestriatal está preservada, excluindo o diagnóstico de Doença de Parkinson, que caracteriza-se por degeneração de neurônios dopaminérgicos da via nigroestriatal.