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Ciência do direito APRESENTAÇÃO Existem duas teorias que direcionam o raciocínio jurídico, são a teoria zetética e a teoria dogmática. Embora com premissas diferentes, tais teorias se complementam para a adequada aplicação do Direito. Para a solução de um conflito, a teoria dogmática utiliza como ponto de partida a norma, “a letra da lei”, enquanto que a teoria zetética busca soluções a partir de reflexões filosóficas ou sociológicas, proporcionando a análise de repercussões mais abrangentes da norma. Nesta Unidade de Aprendizagem, você irá conhecer os fundamentos de cada uma dessas teorias, a fim de diferenciá-las, e compreender a importância da dogmática para a teoria da norma e para as decisões judiciais, que acabam por consolidar do Direito no nosso ordenamento jurídico. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Diferenciar a teoria dogmática da zetética.• Identificar a dogmática analítica como teoria da norma.• Apontar a importância da dogmática da decisão.• INFOGRÁFICO As teorias zetética e dogmática possuem conceitos diferentes, mas que se complementam e permitem pensar o Direito de maneira ampla. Conheça os princípios fundamentais de cada uma das duas teorias. CONTEÚDO DO LIVRO O Direito se desenvolve a partir de diferentes enfoques, sendo a teoria zetética e a teoria dogmática a base para o entendimento do sistema normativo e sua concretização na prática. Neste Capítulo Ciência do Direito, da obra Introdução ao Estudo do Direito, você irá conhecer os conceitos das teorias zetética e dogmática e sua importância para o estabelecimento das normas e aplicação do Direito. Acompanhe um trecho do Capítulo A universalidade do fenômeno jurídico. Boa leitura! Conteúdo: INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Cinthia Louzada Ciência do Direito Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Diferenciar a teoria dogmática da zetética. � Identificar a dogmática analítica como teoria da norma. � Apontar a importância da dogmática da decisão. Introdução Há duas teorias que direcionam o raciocínio jurídico: a teoria zetética e a teoria dogmática. Embora tenham premissas diferentes, essas teorias se complementam para a adequada aplicação do Direito. Para a solução de um conflito, a teoria dogmática utiliza, como ponto de partida, a norma, “a letra da lei”, enquanto a teoria zetética busca soluções a partir de reflexões filosóficas ou sociológicas, proporcionando a análise de repercussões mais abrangentes da norma. Neste capítulo, você vai ler a respeito dos fundamentos de cada uma dessas teorias, a fim de diferenciá-las, e a respeito da importância da dogmática para a teoria da norma e para as decisões judiciais, que acabam por consolidar do Direito no nosso ordenamento jurídico. Teoria dogmática versus teoria zetética Há dois ângulos principais sob os quais o Direito pode ser estudado: por meio da teoria dogmática e por meio da teoria zetética. A teoria dogmática está vinculada ao desenvolvimento da opinião, enquanto a teoria zetética está vinculada à dissolução das opiniões pela investigação, e o seu pressuposto-base é a dúvida. A teoria dogmática é uma forma de enfoque teórico na qual as premissas de argumentação são inquestionáveis, como, por exemplo, a religião. A teoria zetética é analítica e, para solucionar algum problema ou investigar a razão das coisas, questiona, investiga, é cética. O enfoque dogmático é mais fechado, preso a conceito fixos, adaptando os problemas às premissas, enquanto o enfoque zetético dissolve as opiniões e coloca-as em dúvida, exercendo função especulativa explícita e infinita. Quanto à finalidade, podemos afirmar que a teoria dogmática se propõe a refletir sobre uma opinião inquestionável, mas compreendida como dotada de autoridade. Determinados conceitos são aceitos como dogmas e, como tais, transformam-se em objeto de estudo, que não se podem modificar ou ignorar. Frente a isso, a proposta da teoria zetética tem por finalidade o que para a teoria dogmática é vedado: a inquirição, a crítica e a análise de todos os tipos de conteúdo, pressupostos e métodos. A dogmática nos fornece os conceitos e a zetética nos convida a pensar o Direito a partir destes conceitos: Justiça, cidadania, democracia, dignidade, responsabilidade, desenvolvimento, ética, consciência. Tais conceitos cooperam na construção de uma abordagem funcionalista do Direito. As ideias dogmáticas, embora se fixem nas certezas que tornam irrefutáveis, não permite estagnar o seu desenvolvimento inerente. Nessa perspectiva, para manter um sistema coeso e durável de juízos dogmatizados, celebra-se a hermenêutica, cuja relevância se dá na flexibilização dos dogmas impossíveis de serem rejeitados, proporcionando a sua releitura interna sem negá-los. Se o pensamento dogmático elege enunciados fundamentais para serem colocados fora de quaisquer dúvidas, por outro lado, desenvolve-os ininterruptamente, porque não os pode estagnar. O Direito, por sua vez, é mais dogmático. Contudo, as céleres transforma- ções do mundo moderno ordenam, para uma compreensão mais apurada das necessidades humanas, que seja preciso pensar o Direito de acordo com a teoria zetética, sob risco de torná-lo ineficaz. Pensar o Direito requer problematizar a realidade e reformular os conceitos, muitas vezes considerados insuficientes para solucionar as demandas. Se ao Direito convém acompanhar a evolução da socie- dade, é necessário abandonar preconceitos trazidos pelo dogmatismo jurídico. Ao analisar uma demanda jurídica, não se exige exatidão nem evidência inquestionável. Devido à pluralidade de elementos que interferem no com- portamento humano e às situações causadas pelas relações interpessoais, tal postura seria inviável. Ao juiz, cabe valer-se da razoabilidade ao consagrar a norma jurídica. Ciência do Direito2 Atualmente, a dogmática jurídica alude a um esgotamento ideológico do saber jurídico, mas, ao mesmo tempo, permite um possível enquadramento dos seus conceitos à realidade social. Tanto no plano geral de investigações científicas quanto especificamente no âmbito jurídico, zetética e dogmática se complementam, com uma criticando e desconstruindo o conhecimento estabelecido e a outra buscando otimizá-lo para uso prático. No Direito, a teoria zetética se aplica a disciplinas que admitem a busca incessante, a especulação. A Filosofia do Direito, a Sociologia do Direito, a Criminologia, a Medicina Legal e Psicologia Forense são exemplos da teoria zetética. O papel da dogmática para a teoria da norma O estudo da norma jurídica é de fundamental importância, porque se refere a elemento essencial do Direito objetivo. Ao dispor sobre fatos e consagrar valores, as normas jurídicas são o ponto culminante do processo de elaboração do Direito e a estação de partida operacional da dogmática jurídica, cuja função é sistematizar e descrever a ordem jurídica vigente. Conhecer o Direito é conhecer as normas jurídicas no seu encadeamento lógico e sistemático. As normas ou regras jurídicas estão para o Direito de um povo assim como as células para um organismo vivo. Para promover a ordem social, o Direito Positivo deve ser prático, ou seja, revelar-se mediante normas orientadoras das condutas interindividuais. Não é suficiente, para se alcançar o equilíbrio na sociedade, que os homens estejam dispostos à prática da justiça; é necessário que se lhes indique a fórmula de justiça que satisfaça a sociedade em determinado momento histórico. A norma jurídica exerce justamente esse papel de ser o instrumento de definição da conduta exigida pelo Estado. Ela esclarece ao agente como e quando agir. 3Ciência do Direito O Direito Positivo, em todos os sistemas, compõe-se de normas jurídicas, que são padrões de conduta ou de organização social impostos pelo Estado, para que seja possível a convivência dos homensem sociedade. São fórmulas de agir, determinações que fixam as pautas do comportamento interindividual. Pelas regras jurídicas, o Estado dispõe também quanto à sua própria orga- nização. Em síntese, norma jurídica é a conduta exigida ou o modelo imposto de organização social. A dogmática jurídica tem como dogma prefixado a norma jurídica. Tal dogma se constitui de determinadas interpretações da realidade que não devem ser questionadas e, caso o sejam, devem se ater aos parâmetros fixados pelas próprias normas jurídicas, sem prejuízo para a coerência interna do sistema normativo como um todo. A inquestionabilidade dos pontos de partida, contudo, não significa que os dogmas jurídicos sejam interpretações estáticas da conduta social, uma vez que eles precisam ser constantemente revistos a fim de acompanhar a mutabilidade inerente àquela conduta. A dogmática jurídica consiste exatamente no manejo das regras que garantem que esses processos de revisão e atualização permanecerão dentro dos limites fixados pelas próprias normas jurídicas, estabelecendo modos interpretativos e integradores para adaptação da norma ao fato. A dogmática jurídica exerce função relevante não só para o estudo do direito, mas também para a aplicação jurídica. Viabiliza como elemento de controle de comportamento humano, ao permitir a flexibilidade interpretativa das normas e ao propiciar, por suas criações teóricas, a adequação das normas no momento da sua aplicação. A ciência jurídica é um instrumento de viabilização do direito. A dogmática é idem, marcada por uma concepção do direito que conduz a autoridade à to- mada de decisão. A dogmática jurídica tem uma função social ante a relevância do fator social, nos processos de conhecimento. O conhecimento é visto como uma atividade capaz de servir de mediação entre os dados da realidade e a resposta comportamental do indivíduo. Assim, gera expectativas cognitivas, uma vez que as sínteses significativas da ciência garantem a segurança e a certeza das expectativas sociais, pois diminuem os riscos de falha na ação humana. Dessa forma, será possível com um certo grau de certeza, quem agiu corretamente ou incorretamente. A ciência é vista como uma agência de socialização, por permitir a inte- gração do homem e da sociedade em um universo coerente. A função social da dogmática jurídica está no dever de limitar as possibilidades de variação na aplicação do direito e de controlar a consistência das decisões, tendo por base outras decisões. Ciência do Direito4 As expressões norma e regra jurídicas são sinônimas, apesar de alguns autores reser- varem a denominação regra para o setor da técnica e, outros, para o mundo natural. Distinção há entre norma jurídica e lei. Esta é apenas uma das formas de expressão das normas, que se manifestam também pelo Direito costumeiro e, em alguns países, pela jurisprudência. A importância da dogmática da decisão A própria teoria dogmática percebe que deve haver uma constante reformu- lação dos seus conceitos, pois o seu estudo vincula a oposição entre norma e realidade. O processo normativo, portanto, evita que a imposição legalista estatal se torne obsoleta. A positivação do Direito deve ser entendida como característica fundamental da dogmática e responsável pela mutabilidade que a ciência jurídica possui, de acordo com os procedimentos formais adequados. Para entendermos a Dogmática Jurídica contemporânea, é necessário reco- nhecer que ela nasce pelo fenômeno da positivação. Este, como já vimos, é caracterizado pela libertação que sofre o Direito de parâmetros imutáveis e duradouros, de premissas materialmente invariáveis, apresentando uma tendência a um certo formalismo e institucionalização da mudança e da adaptação através de procedimentos cambiáveis, conforme as diferentes situações (FERRAZ JR., 1998, p. 84-85). A lei positivada é a problemática da dogmática, de forma a delinear o problema central dela. Seja qual for o objeto observado, sempre envol- verá uma questão de decidibilidade sobre a legalidade posta. A função da dogmática consiste em prever consequências pragmáticas para todos os casos concretos, de maneira a solucionar uma problemática com a menor perturbação possível. Quando um jurista se depara com um caso concreto litigioso, inicia-se uma investigação jurídica. Para esse processo, então, que há dois métodos de investigação: questionamentos e respostas. Se os questionamentos são mais enfatizados em relação às respostas, adquire-se uma postura crítica, hipotética, problemática. Ao contrário, se as respostas são enfatizadas, são exauridas as dúvidas, predominando a decidibilidade, a ação, afetando materialmente o próprio caso concreto. No primeiro caso, temos a zetética, no outro, a dog- 5Ciência do Direito mática. Enquanto a função da dogmática é ressalvar as opiniões e o próprio ato de opinar, a da zetética é transformar o conceito em dúvida. A função da dogmática não é aprisionar o arbítrio do juiz ao dogma, mas de legitimar a flexibilidade na decisão, de interpretar o que foi estabelecido. A dogmática não consiste na inegabilidade dos seus pressupostos fundamentais, mas depende deles para movimentar o sistema. Trazidas a um grau de menor perturbação social, as incertezas geradas pela complexidade das relações pessoais são controladas pela dogmática, relacionando o que é ou não juri- dicamente possível, tendo na decidibilidade o ápice da liberdade do jurista. Segundo Tércio Sampaio Ferraz Jr. (1998, p. 98), “a Dogmática se esta- belece como um instrumento mediador entre a generalidade das normas e a singularidade dos casos concretos”, permitindo a correta aplicação do Direito ao caso concreto. A dogmática jurídica, portanto, é um modo de viabilizar decisões, com vistas à estabilização da sociedade, simplificando a complexidade objetivando a diminuição da instabilidade social. FERRAZ JR., T. S. Função social da dogmática jurídica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. Leituras recomendadas ADEODATO, J. M. Ética e retórica: para uma teoria da dogmática jurídica. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 31. DINIZ, M. H. Dicionário jurídico. 2. ed. São Paulo: Saraiva, v.2. MOTA, S. Concepções dogmática e zezética do Direito. 2016. Disponível em: <http:// www.recantodasletras.com.br/textosjuridicos/2746476>. Acesso em: 28 set. 2017. SCHIEFLER, G. H. C. Breve introdução ao estudo da dogmática jurídica. 2009. Disponí- vel em: <http://www.investidura.com.br/biblioteca-juridica/resumos/etica/3050>. Acesso em: 28 set. 2017. Ciência do Direito6 Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. Conteúdo: DICA DO PROFESSOR O vídeo a seguir apresenta um panorama sobre as teorias zetética e dogmática, além de indicar sua aplicação na prática cotidiana do Direito. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! NA PRÁTICA Maristela é proprietária de uma loja no shopping da capital e, na última reunião com os lojistas, a administração do shopping comunicou a decisão de proibir a utilização de som e artefatos de iluminação para atrair clientes, pois a música e a luz utilizada por cada loja perturbaria a iluminação e o som ambiente das demais áreas de circulação. Maristela não gostou da nova norma e conversou com seu advogado, que lhe orientou de acordo com o enfoque dogmático, informando-lhe que a regra é totalmente válida, mas que é possível buscar lacunas. Maristela anotou as perguntas propostas pelo seu advogado para questionar a administração do shopping: O advogado fez uso da teoria dogmática, questionando a interpretação da regra e não a norma, o dogma em si, como faria a teoria zetética. O ponto de partida para reflexão e aplicação do direito é a norma já estabelecida. SAIBA MAIS Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Filosofia do direito: Entrevistaem que Técio Sampaio constrói uma linha de pensamento sobre o motivo de estudar filosofia em Direito. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Artigo sobre as teorias zetética e dogmática: O artigo expõe de modo claro e objetivo um tema importante a respeito da Filosofia Jurídica. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Importância da dogmática para as decisões: Artigo que propõe considerações introdutórias acerca da Dogmática Jurídica. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!
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