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Julia Paris Malaco Perdas auditivas A classificação quanto ao tipo considera a localização do problema no ouvido e comprometimento da função. Perda auditiva condutiva Como o próprio nome diz, na perda auditiva condutiva o problema está na condução do som, existe alguma dificuldade para receber e/ou encaminhar o som de forma adequada pelo ouvido externo e ouvido médio. Pode ser reversível em muitos casos. Ocorre quando o tímpano foi perfurado, em malformações da orelha, e até mesmo por obstrução por cera, por exemplo. Perda auditiva neurossensorial Na perda auditiva neurossensorial o problema está no ouvido interno, com dano parcial ou total, das células sensoriais (geralmente células ciliadas). O ouvido externo e médio pode estar em perfeito funcionamento, encaminhando adequadamente os sons, mas falta quem codifique os sinais sonoros para o nervo auditivo. Geralmente é irreversível. Ocorre por exemplo em casos de alterações congênitas (desde o nascimento), exposição a sons muito intensos, envelhecimento natural do ouvido, traumatismo craniano. As queixas qualitativas, sobretudo as relacionadas com alterações da percepção au-ditiva, por sua vez, são altamente indicativas da presença de surdez neurossensorial. Os distúrbios auditivos hiperativos, que traduzem sensação aumentada de intensidade sonora, como hiperacusia, recrutamento, fonofobia, distorção sonora e intolerância a sons, são características de envolvimento neurossensorial, com maior conotação senso-rial, indicando lesões localizadas nas células auditivas e nas neurofibrilas, que fazem a conexão com estas células ou nas suas sinapses. Perda auditiva neurosensorial congênita: citomegalovírus, rubéola, etc Perda auditiva neurosensorial adquirida: surdez súbita, caxumba, sarampo, febre lassa, varicela zoster, herpes simples, labirintites bacterianas e fungicas, meningite bacteriana, sifilis Trauma acústico: O trauma acústico (TA) ocorre quando um clique ou múltiplos cliques sonoros com menos de 1 segundo de duração e mais de 140 dB levam a uma perda auditiva ime-diata, de grau variável. O som de alta intensidade e curta duração é o principal res-ponsável pelo TA. O clique sonoro, som de curta duração e banda estreita, nas frequên-cias mais agudas (acima de 3 kHz), é o som mais lesivo ao órgão de Corti, A perda auditiva após TA pode ocorrer de forma permanente (trauma acústico per-manente – TAP) ou completamente reversível em até 24 horas (trauma acústico tempo-rário – TAT). O TA resulta do acometimento das células ciliadas externas e internas em maior ou menor grau, dependendo disso a expressão clínica do trauma. No TAT, lesões com potencial de reversão podem ocorrer como diminuição temporária da elasticidade da membrana basilar; edema e alterações metabólicas intracelulares por exaustão das cé-lulas ciliadas; e edema das terminações nervosas auditivas. No TAP, as lesões irreversíveis incluem ruptura do ducto coclear, disjunção estrutural do epitélio do órgão de Corti, per-da de células ciliadas e degeneração de fibras do nervo coclear. A sintomatologia costuma ser típica, incluindo como queixas principais hipoacusia e zumbido após exposição a som de alta intensidade e curta duração O diagnóstico do TA é baseado nas queixas de hipoacusia e zumbido associado ao evento traumático referido pelo paciente. O exame físico otorrinolaringológico costu-ma ser Julia Paris Malaco normal. Eventualmente podem ocorrer alterações da membrana timpânica, o que é mais frequente quando associado a barotrauma. A audiometria tonal mostra uma perda auditiva usualmente neurossensorial e, me-nos comumente, mista. Tratamento com aines e corticoides, prednisona oral 1mg, dextran, voluven. Ruídos: A perda auditiva induzida pelo ruído é uma diminuição gradual da acuidade auditiva, decor- rente da exposição continuada a elevados níveis de pressão sonora. Caracteriza-se como uma perda auditiva neurossensorial, geralmente bilateral, irreversível e progressiva de acor-do com o tempo de exposição ao ruído. Raramente ultrapassa perda auditiva maior que 40 dB (NA) nas frequências baixas e 75 dB (NA) nas altas; sua progressão cessa com o fim da exposição ao ruído intenso. Manifesta-se, inicialmente, nas frequências de 6, 4 e 3 kHz e atinge um nível máximo nos primeiros 10 a 15 anos de exposição nessas frequências. Além dos sintomas auditivos frequentes, como perda auditiva, zumbido, dificulda-de de compreensão da fala e intolerância a sons intensos, o portador de Pair pode de-senvolver sintomas não auditivos, como ansiedade, dificuldade nas relações familiares, cefaleia, irritabilidade, isolamento, alterações no sono, transtornos vestibulares, digesti-vos, cardiovasculares e hormonais Estados Evolutivos: Estado I – Surdez Latente: Na maioria das vezes, nenhum sinal funcional auditivo é encontrado na sintomatologia e centrado nos sinais extra-auditivos (problemas de sono e de humor). Às vezes, o paciente se queixa de acúfenos intermitentes de timbre agudo ou de um problema de inteligibilidade no ruído, ou ainda de uma sensação de distorção, quando na escuta musical. O audiograma mostra um entalhe na frequência 4 kHz (Fig. 22-2), atingindo ou ultrapassando 30 a 40 dB. As frequências adjacentes são pouco alteradas e a zona frequencial conversacional é respeitada. Estado II – Surdez Iniciante: Os sinais funcionais se encontram reforçados com acúfenos, que se tornam mais frequentes, e queixas de dificuldade auditiva, que aparecem em certas circunstâncias sociais ou profissionais. Na audiometria, o entalhe perceptivo se aprofunda nos 4 kHz, mas se estende principalmente para a frequência 2 kHz (Fig. 22-3). Quando a perda auditiva chega a 30 dB em 2 kHz, a dificuldade funcional é quase constante e se manifesta por alterações de inteligibilidade na conversação, notadamente em ambiente ruidoso. Estado III – Surdez Confirmada: Os acúfenos são frequentes e aumentam o efeito de mascaramento, quando eles se tornam permanentes. Os problemas ou dificuldades de inteligibilidade são evidentes e o isolamento social é importante. A perda audiométrica se estende para as frequências conversacionais, como 1 kHz, mas também em 8 kHz e passa de 30 dB. Estado IV – Surdez Grave: A perda auditiva interessa a todo o espectro frequencial e desde 0,5 kHz. A percepção da fala é difícil e a deficiência social é maior. A cada um destes estados, e quanto mais o indivíduo se encontra exposto ao risco sonoro profissional, o fenômeno de fadiga auditiva vem se juntar à perda auditiva constituída. Perda Auditiva Temporária após Trauma Sonoro: Após um ruído traumatizante, mas que não cause lesão permanente na orelha interna, pode ocorrer um período de fadiga auditiva. A recuperação depende do fim do estímulo e dá-se em até 2 minutos (curta duração) ou até 16 horas (longa duração). O TSA pode ser uni ou bilateral, com surgimento de sintomas imediatamente após o trauma. Hipoacusia: pode ou não ser referida pelo indivíduo, a depender da intensidade e frequências afetadas pela perda auditiva. Acúfenos ou tinnitus: consistem no sintoma mais presente após os TSA. Geralmente assimétrico, de timbre agudo e não pulsátil. Otalgia: imediata após o trauma. Geralmente tem resolução em curto período. Outros sintomas: Hiperacusia dolorosa, Instabilidade, Cefaleia e tensão muscular Julia Paris Malaco https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/prot ocolo_perda_auditiva.pdf Perda auditiva mista Na perda auditiva mista há uma combinação deperda condutiva e neurossensorial, com problemas no ouvido externo e/ou médio e no ouvido interno. A alteração na condução do som pode ser reversível, mas geralmente o problema sensorial é permanente. Ocorre por exemplo em casos de infecções de ouvido crônicas, traumatismos. Perda auditiva neural ou retrotroclear A perda auditiva neural é resultante da ausência ou dano nervo auditivo. É permanente e pode ter resultados limitados com (re)habilitação auditiva, pela falha do nervo auditivo há grande dificuldade na transmissão dos sinais sonoros ao cérebro. Aparelhos auditivos e implantes cocleares não podem ajudar, pois o nervo não é capaz de levar as informações sonoras ao cérebro. Graus de audição Audição normal: Média menor ou igual a 20 dBNA. Pode existir discreta perda sem implicação social. Perda auditiva leve: Média entre 21 e 40 dBNA. Pode ouvir bem voz em intensidade normal, mas tem dificuldade com voz baixa ou distante. A maioria dos ruídos do dia-a-dia são percebidos. Perda auditiva moderada: 1º grau: média entre 41 e 55 dB 2º grau: média entre 56 e 70 dB. A fala é percebida se a voz for alta. A pessoa entende melhor o que está sendo dito se estiver vendo quem está falando. Alguns ruídos do dia-a- dia ainda são percebidos. Perda auditiva severa: 1º grau: média entre 71 e 80 dB 2º grau: média entre 81 e 90 dB. A fala é percebida se a voz é alta e mais próxima do ouvido. Ruídos altos são percebidos. Perda auditiva profunda: 1º grau: média entre 91 e 100 dB 2º grau: média entre 101 e 110 dB 3º grau: média entre 111 e 119 dB. A fala não é percebida. Apenas ruídos muito altos são percebidos. Perda auditiva total: Média acima de 120 dB. Nenhum som é percebido. Exames otorrinolaringológicos Teste de Weber: O diapasão é colocado na linha média do crânio do paciente, que deverá dizer se es-cutou o som na orelha direita, esquerda ou na linha média. Em caso de perda de audição neurossensorial unilateral, o som será escutado no lado da melhor cóclea, ao passo que, nos distúrbios condutivos, acontece o inverso, isto é, o som é escutado no lado da queixa. Teste de Rinne: O diapasão é colocado na mastoide e, em seguida, em frente ao pavilhão auricular. O objetivo é comparar a audição por via óssea (mastoide) e por via aérea (pavilhão auricular). Pacientes com audição normal referem som mais intenso quando o diapasão estiver em frente ao pavilhão auricular. Isso também ocorre nas perdas auditivas neurossensoriais, e esse resultado é rotulado de Rinne positivo. Caso o paciente refira som mais intenso na mas-toide, o distúrbio tem caracaterísticas condutivas, resultado chamado de Rinne negativo. Teste de Bing: O diapasão é colocado sobre a mastoide do paciente; o examinador oclui e abre o meato acústico externo (MAE), alternadamente, com o objetivo de testar o efeito provo-cado por essa oclusão. Pacientes com audição normal ou com perda auditiva neurossen-sorial referem que o som fica mais forte e mais fraco alternadamente, conforme se oclui e se abre o MAE. Esse fenômeno não ocorre nos portadores de alterações condutivas. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/protocolo_perda_auditiva.pdf https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/protocolo_perda_auditiva.pdf Julia Paris Malaco Teste de Schwabach: O diapasão é colocado na mastoide do paciente e do examinador alternadamente, com o objetivo de comparar a audição por via óssea do paciente com a do examinador. Partindo-se do pressuposto de que o examinador tem audição normal, ele escutará por muito mais tempo que o paciente em caso de alteração neurossensorial. Em caso de perda condutiva, o paciente escutará o som por tempo maior que o examinador. Audiometria tonal: Audiometria tonal Avalia os limiares tonais em diversas frequências por via aérea e por via óssea. É útil para definir a intensidade e o tipo de perda de audição. Quanto à intensidade, a perda pode ser classificada em leve, moderada, severa e profunda. Em relação ao tipo, este pode ser neurossensorial, condutivo e misto. A perda neurossensorial é carac-terizada pela alteração da via aérea e da via óssea em iguais proporções Audiometria vocal: Avalia o índice percentual de reconhecimento da fala (IPRF), o limiar de detecção da fala (LRF) ou o limar de detecção de voz (LRV). O critério de normalidade para o IPRF é de 90 a 100% e admite-se que o LRF está normal quando a diferença entre ele e o limiar tonal não é superior a 10 decibéis de nível de audição (dB NA). Na perda de audição decorrente de distúrbio localizado na cóclea, a IPRF encontra-se dentro dos padrões da normalidade. Nas lesões do nervo auditivo e/ou de vias auditivas centrais, o IPRF é rebaixado e não compatível com os limiares tonais. O LRF tem a função de validar os limiares tonais, portanto, quando a diferença entre um e outro for superior a 10 dB NA, é necessário repetir a pesquisa dos limiares tonais. Medidas de imitância acústica: A timpanometria é útil no diagnóstico diferencial das perdas de audição por com-prometimento das estruturas da orelha média (perda condutiva). Nas perdas neuros-sensoriais, geralmente a curva timpanométrica é do tipo A (normal). A pesquisa dos reflexos do estapédio investiga a cóclea, o nervo auditivo e o tronco encefálico. Esse fenômeno é disparado com sons de intensidades 70 dB NA maiores que o limiar tonal. Nas perdas neurossensoriais, é comum o reflexo do estapédio ser disparado com sons de intensidade menores que 60 dB NA do limiar tonal na frequência investigada. Isso significa recrutamento, que indica envolvimento coclear. Na perda neurossensorial severa e/ou profunda, os reflexos do estapédio podem estar ausentes. Quando a lesão se localiza no VIII par, os reflexos ipsilaterais à orelha comprometida e os contralaterais à orelha sã estão ausentes ou presentes com limiares anormalmente elevados, enquanto os reflexos ipsilaterais à orelha sã e os contralaterais à orelha comprometida encontram-se presentes. Nos distúrbios do tronco encefálico, os reflexos ipsilaterais estão presentes bila-teralmente, ao passo que os contralaterais estão ausentes bilateralmente. Otoemissões acústicas: Avaliam a função das células auditivas externas. São úteis também para investigar o sistema auditivo eferente (trato olivococlear) nos casos de envolvimento do nervo auditivo e/ou das vias auditivas centrais. A ausência das otoemissões acústicas (OEA) pode acontecer também nas alterações da orelha externa e média, decorrente da falta de aferência sonora. Portanto, para caracterizar o envolvimento da cóclea, é necessário que componentes condutivos sejam excluídos da hipótese diagnóstica por meio da audio-metria tonal e da timpanometria.7 Eletrococleografia (ECochG): Avalia os potenciais elétricos gerados na cóclea ao transformar a informação sonora em energia bioelétrica. Esses potenciais são: microfonismo coclear, potencial de somação (SP) e potencial de ação (AP). A relação percentual entre a amplitude desses dois potenciais (relação SP/AP) é sensível e específica para o diagnóstico da hidropisia endolinfática, prin-cipalmente nas perdas auditivas neurossensoriais cuja média aritmética dos limiares tonais nas frequências de 500, 1.000, 2.000 e 3.000 Hz seja inferior a 50 dB NA. Nesses casos, va-lores superiores a 35% da relação SP/AP, estabelecida por meio de ECochG transtimpânica empregando-se o estímulo sonoro click, têm 100% de sensibilidade e especificidade Julia Paris Malaco para o diagnóstico da hidropisia endolinfática/doença de Ménière. É um exame útil na investigação da perda auditiva sensorial e imprescindível para o diagnóstico e o acompanhamentoda hidropisia endolinfática. Respostas auditivas de tronco encefálico (ABR): Avaliam neurofisiologicamente o nervo auditivo e a via auditiva no tronco encefá-lico, prestam-se para acompanhar a maturação do sistema nervoso central e são úteis para monitorar o VIII par e o tronco encefálico durante intervenções cirúrgicas na fossa posterior. Nas alterações sensoriais, a ABR encontra-se dentro dos padrões da normali-dade. Quando existe envolvimento neural, o intervalo de latência entre a onda I e onda III – geradas, respectivamente, na porção distal e medial do nervo auditivo – está au- mentado. Nas lesões do tronco encefálico, ocorre aumento do intervalo de latência das ondas III e V, geradas, respectivamente, no núcleo coclear e no colículo inferior. Respostas auditivas de média latência (MLR): Avaliam a via auditiva na transição entre o subcórtex e o córtex cerebral. Os princi-pais geradores da resposta situam-se no tálamo e no córtex auditivo primário. São úteis para monitorar funcionalmente as doenças localizadas nessas estruturas anatômicas.1,5,8 Respostas auditivas de longa latência (P300): Os potenciais exógenos (P1) , N1 e P2) são utilizados para avaliar funcionalmente as alte-rações situadas no córtex auditivo do lobo temporal. A resposta mista N200 auxilia na inves-tigação dos distúrbios da atenção auditiva. O potencial cognitivo (P300) permite confirmar o envolvimento das estruturas relacionadas com o processo de cognição auditiva e comparar a idade cronológica com a idade neurológica. Portanto, é útil para o diagnóstico e o acom-panhamento de ampla gama de alterações neurológicas e psicológicas. Testes subjetivos da função auditiva central: Analisam as funções de localização e lateralização sonora, discriminação auditiva, reconhecimento de padrões auditivos, aspectos temporais da audição, desempenho audi-tivo na presença de sinais acústicos competitivos e desempenho auditivo diante de sinais acústicos distorcidos. São aplicados os testes de índice percentual de reconhecimento de fala, limiar de reconhecimento da fala, testes de fala dicótica, testes de ordenação tempo-ral, testes de interação binaural e testes de fala com baixa redundância. Devem ser reali-zados em pacientes com queixas ou suspeitas de alterações qualitativas da audição, em de transtorno de déficit de atenção/hiperatividade, disfunção auditiva indeterminada (di-ficuldade de ouvir em ambientes ruidosos, com audiograma normal), pacientes afásicos, com doenças neurológicas degenerativas, tontura, epilepsia, naqueles que tenham sido submetidos a corpocalostomia ou remoção de tecido neurológico, com lesão de massa do sistema nervoso auditivo central, lesões traumáticas na cabeça, candidatos a usar prótese auditiva e no acompanhamento da evolução da doença e do tratamento nas situações mencionadas.5,6,9 A avaliação funcional da audição sempre deve incluir a investigação do sistema ves-tibular, independentemente da presença de queixas relativas a distúrbios do equilíbrio corpóreo, em virtude da proximidade anatômica e funcional das estruturas. A investigação laboratorial das perdas auditivas neurossensoriais deve incluir aná- lises sanguíneas e exames de imagem. A construção do roteiro dessa verificação diag- nóstica deve ser elaborado de forma personalizada, com base nos indícios fornecidos pela história clínica e pelos antecedentes pessoais e familiares, no exame físico e nos achados à avaliação funcional do sistema auditivo e vestibular.
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