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Definição: Ferimentos são lesões resultantes da perda da integridade tecidual, provocados por algum agente traumático, podendo apresentar sangramento, exposição de estruturas nobres como nervos, tendões, ossos e vísceras. CLASSIFICAÇÃO Estrutural - Abertos: acometem a pele ou a mucosa e podem estar associados também a lesão do tecido celular subcutâneo, de músculos e a p o n e u r o s e s , c r i a n d o s o l u ç ã o d e continuidade do meio externo com o meio interno - Fechados: a integridade da pele é mantida, podendo haver lesões sobre os órgãos internos, grandes vasos e músculos, que se caracterizam, à inspeção, como equimoses e hematomas Profundidade - Superficiais: acometem a pele (ou mucosas), o tecido celular subcutâneo, podendo atingir a aponeurose e até mesmo a musculatura, dependendo da sua localização, desde que não causem lesões a estruturas nobres (ossos, tendões, nervos, cartilagens, vísceras e vasos terminais); exemplos: queimaduras de 1º grau, ferimentos de polpa digital, escoriações - P r o f u n d o s : a c o m e t e m o s p l a n o s aponeuróticos e musculares que apresentam íntimo contato com estruturas nobres; ex.: queimaduras de 3º grau com acometimento ósseo/tendíneo, lesões fac ia i s com comprometimento intraorbital/oral/nasal ABORDAGEM DO PACIENTE - Avaliação em sala com iluminação adequada - Anamnese sucinta, procurando identificar o agente traumático e as condições do evento - Exame físico objetivo, buscando fatores desencadeantes/agravantes - O tratamento de um ferimento não deve ser prioritário, quando existirem outras lesões que possam colocar em risco a vida do paciente - De fundamental importância é a classificação dos ferimentos abertos quanto à natureza do agente causador, à complexidade e no nível de contaminação presente CLASSIFICAÇÃO DOS FERIMENTOS ABERTOS Quanto à natureza do agente causador - Incisos: causados por instrumentos cortantes Agente traumático: faca, navalhas, lâminas de barbear e pedaços de vidro Bordas regulares, nítidas e lineares - Contusos: Agente traumático: pedra, barra de ferro, palmatória, cassetete Bordas irregulares e retraídas, além de apresentarem pontes dérmicas As escoriações (ou erosões epidérmicas ou abrasão) são fer imentos contusos superficiais, provocadas pelo deslizamento do agente vulnerante sobre a pele, causando arrancamento da epiderme e exposição da derme • Retilíneas - instrumentos pontiagudos • Curvilíneas - unhas • Em pinceladas - cascalho • Em placa - asfalto • Apergaminhadas - nos sulcos dos enforcamentos CC II 1 Glendha Malta A. FERIMENTOS SUPERFICIAIS - Perfurantes: Agente traumático: prego, agulha, alfinete Profundidade maior que seu diâmetro Pode ser classificado como superficial, profundo, penetrante ou transfixante - Perfuroincisos: apresentam gume e ponta; ex.: peixeiras, punhais - Perfurocortantes: projéteis de arma de fogo - Perfurocontusos: 2 ou + ângulos, bordas irregulares, pontes de tecido; ex.: dentes, enxada, machado Quanto ao grau de contaminação - Limpos: Produzidos em ambiente cirúrgico, sem manipulação dos sistemas digestório, respiratório e geniturinário - Limpo-contaminados/potencialmente contaminados: algum grau de contaminação bacteriana e cujos primeiros cuidados se iniciam em até 6 h após o trauma - Contaminados: contato com terra, asfalto, material fecal e as mordeduras; e/ou cujos primeiros cuidados se iniciam 6 h após o trauma - Infectados : apresentam prol i feração bacteriana, com a presença de pus, tecidos desvitalizados e odor característico Quanto à complexidade - Simples: não apresenta sinais de infecção nem perda de substância - Complexos: mostram sinais de infecção, esmagamento e até avulsão tecidual com perda de substância CUIDADOS COM O FERIMENTO - Tratamento específico para cada tipo de ferimento - Se necessário, realizar exames de imagem - RM é contraindicada em pacientes com trauma orbitário, até que a possibilidade de corpo estranho metál ico tenha sido previamente descartada pela tomografia, em função do risco de avulsão desse material pelo campo magnético, aumentando a lesão tecidual - Superficiais fechados: Resfriar com gelo, imobilizar e elevar o membro, analgesia, se necessário gel à base de heparina sódica para acelerar absorção de coágulos - Superficiais abertos: tem como objetivo principal seu fechamento, seja ele por sutura ou 2ª intenção; dependerá do grau de contaminação, do agente causador, do tempo de evolução e a localização - Limpo-contaminados com suprimento sanguíneo adequado: em indivíduos sadios, está adequado o fechamento primário/1ª intenção (síntese na admissão do PA) - Contaminados e/ou infectados: Habitualmente, não devem ser suturados, devendo-se aguardar a cicatrização por 2ª intenção Pode acarretar em retração cicatricial, que diminui a amplitude de movimento quando em articulação Uma vez que não evoluiu com infecção, e iniciada a formação do tecido de granulação, proceder com fechamento por 3ª intenção - Causados por pregos: não devem ser suturados (tétano), aguardar por 2ª intenção - Causados por arma de fogo/mordedura: Não é real izado rot ineiramente o fechamento 1º, podendo-se proceder ao por 3ª intenção Se mordedura na face, pode suturar pois essa região é bem vascularizada (menor risco de infecção); optar por pontos simples espaçados, para que eventuais coleções sejam drenadas - É importante que o fer imento seja cuidadosamente limpo e irrigado com solução salina - Para a antissepsia, pode ser usado a PVPI degermante ou a clorexidina CC II 2 Glendha Malta A. - O uso de água oxigenada, apesar de muito difundido na prática clínica, desvitaliza tecidos íntegros por meio de necrose celular - Com exceção da cocaína, os anestésicos locais causam algum grau de vasodilatação Utilizá-los associados ao vasoconstritor epinefrina, promovendo aumento da duração do seu efeito, diminuição da sua toxicidade e do sangramento, além de reduzir a dose necessária Evitar essa associação em pacientes hipertensos e em locais com circulação terminal Em função do risco de efeitos sistêmicos, devem ser tomados os cuidados para que esses fármacos não sejam administrados no interior de vasos, atingindo a circulação sistêmica - Caso não se tenha conseguido efetuar preparo adequado do ferimento com irrigação de solução salina em função da dor, é possível, após a anestesia, completar a limpeza cuidadosa da região; também é nesse momento que se procede à hemostasia, ao desbridamento e à retirada de corpos estranhos - Atenção quando contato com resíduos Síntese - Deve ser feita por planos - Nos ferimentos superficiais, os músculos devem ser suturados com fios finos e absorvíveis, preferencialmente com fios de poliglactina 4-0 ou 5-0 - Os cotos são aparados rente aos nós, que deverão ser invertidos, isto é, voltados para as camadas mais profundas, para evitar a sua extrusão através da linha de sutura da pele - O tecido celular subcutâneo deve ser suturado da mesma maneira, assim como a subderme, o que garantirá cicatrizes estéticas - A síntese da pele pode ser feita, a critério do cirurgião, com pontos simples ou contínuos, por me io de sutura i n t radérmica , dependendo do loca l , do grau de contaminação, da tensão e da existência de bordas regulares; prefere-se o fio de nylon variando de 3-0 a 6-0 - Ferimentos limpo-contaminados na face p o d e m s e r f e c h a d o s c o m su tu ra s intradémicas; em pálpebra e de supercílio, utilizam-se fios mais finos, como o 6-0 e o 5-0 - Fer imentos de polpas digita is são normalmente suturados com pontos simples e fios mais calibrosos, como o 3-0 - A escolha do fio de nylon está apoiada em sua propriedade de desenvolver menor r e a ç ã o t e c i d u a l , e m b o r a f i o s d e poliglecaprona, como o Monocryl®, também possam serusados (vantagem de ser absorvível, embora cause mais reação) - Normalmente, os pontos são retirados entre o 7º e o 21º dia após sutura, dependendo da região Em ferimentos da face, opta-se pela retirada precoce, uma vez que seu rico aporte vascular otimiza a cicatrização Em outras regiões, os pontos devem permanecer até o 14º dia Caso tenha sido realizada uma sutura intradérmica, pode-se aguardar até 21 d i a s , p o i s e s s e t i p o d e s í n t e s e habitualmente não deixa marcas em “espi- nha de peixe”. Além disso, após esse período, a retirada dos pontos é menos dolorosa e o fio é mais facilmente tracionado Profilaxia - A antibioticoprofilaxia e a antibioticoterapia s istêmica não substituem a l impeza cuidadosa, nem o respeito aos princípios cirúrgicos - O uso de antibióticos está indicado em ferimentos decorrentes de mordeduras, nas lesões produzidas por arma de fogo, nos f e r i m e n t o s c o n t a m i n a d o s o u c o m vascularização comprometida, nos ferimentos complexos, naqueles su-jeitos a infecções por clostrídios e nas fraturas expostas CC II 3 Glendha Malta A. - Pacientes com imunidade comprometida devem receber profilaxia com antibióticos - A antibioticoterapia está indicada para o tratamento de ferimentos infectados - A via utilizada depende da gravidade da lesão, sendo a via parenteral utilizada nos casos mais graves FERIMENTOS EM REGIÕES ESPECÍFICAS Couro cabeludo - Os ferimentos superficiais do couro cabeludo sem perda de substância são de fácil tratamento e normalmente são fechados com pontos simples, utilizando fios de náilon 3-0 - Se pequena perda tecidual, suturas realizadas sob tensão podem acarretar alopecia, decorrentes da má vascularização das suas bordas - Ferimentos com moderada perda tecidual devem ser tratados com a confecção de retalhos, mediante ampla dissecção do escalpo do seu plano profundo e confecção de incisões paralelas na gálea - Mesmo em casos de grandes avulsões do couro cabeludo, estando o periósteo íntegro e a vascularização preservada, podem ser confeccionadas lâminas de enxertos cutâneos a partir da pele do próprio paciente, seja ela proveniente de outras regiões (dorso, coxas, abdome), seja aproveitando-se estampilhas retiradas do retalho acidentalmente descolado do seu leito Face - Pesquisar possíveis lesões no nervo facial - Investigar a presença de ferimentos na língua e avulsão de dentes - Lesões do ducto parotídico podem estar presentes e devem ser abordadas Pálpebras - Devem ser suturados, principalmente os que prejudicam a cobertura ocular, o mais precoce possível, pois as pálpebras podem d e s e n v o l v e r e d e m a r a p i d a m e n t e , dificultando sua reconstrução - Ferimentos que acometem apenas a pele devem ser irrigados com solução salina, cautelosamente desbridados e suturados com nylon 5-0 ou 6-0 - Deve-se preferir, manter tecidos com risco de evoluir para necrose total a ressecar aqueles que possam recuperar a viabilidade e serem essenciais para a reconstrução final - Ferimentos que acometam as camadas muscular e tarsal são considerados profundos, podendo estar associados a lesão dos ductos lacrimais e do músculo elevador da pálpebra Nariz - Os pequenos ferimentos superficiais da pele devem ser tratados com regularização das bordas e sutura com nylon 4-0 ou 5-0 - O reposicionamento dos tecidos deve ser feito com cuidado para evitar futuras retrações e distorções - Os hematomas, principalmente quando contíguos com cartilagem, devem ser drenados - Os ferimentos da mucosa devem ser suturados com fio absorvível (poliglactina) 4-0 e tamponados durante 24h a 48h - É importante ressaltar que, além do caráter estético, o atendimento dos ferimentos nasais deve enfatizar, principalmente, a função respiratória Orelhas - Estar atento à presença de hematomas (retração cicatricial a absorção da cartilagem subjacente) - Cura t i vos compress i vos devem se r confeccionados, moldando-se os sulcos auriculares; caso contrário, haverá a formação de fibroses, que irão deformar a CC II 4 Glendha Malta A. orelha afetada, resultando no aspecto “em couve-flor” - Coleções infecciosas decorrentes do uso de piercings são muito frequentes e devem ser prontamente drenadas e tratadas com antibiótico de amplo espectro Lábios - Os ferimentos que atingem toda a espessura labial devem ser suturados por planos - Nas camadas mucosa e muscular são utilizados fios absorvíveis (poliglactina) 4-0 com nós invertidos - Na pele, pontos simples de nylon 4-0 ou 5-0 - Especial atenção deve ser dada à linha de transição mucocutânea, uma vez que mínimos desalinha-mentos de até 1 mm são perceptíveis nessa região - Para evitar essa deformidade, a sutura do lábio deve ser iniciada na linha de transição mucocutânea, evitando, posicionar o ponto exatamente sobre essa linha, o que pode evoluir com hiperemia local pemanente, alterando o contorno labial Extremidades digitais - Ferimentos profundos devem ser tratados por especialistas - Ferimentos superficiais podem ser tratados somente com sutura em pontos simples (náilon 3-0) ou podem requerer a confecção de retalhos ou de enxertos cutâneos, quando há perda de substância - O tratamento dos hematomas subungueais pequenos é feito com gelo local e analgesia - Hematomas > 3 mm de d iâmetro, acompanhados de dor pulsátil, devem ser drenados a partir da confecção de uma janela na unha - Para o tratamento de hematomas maiores, a unha deve ser excisada, mesmo porque esses casos são geralmente acompanhados de laceração do leito ungueal - Solicitar radiografias das pontas digitais nas incidências posteroanterior e perfil, para avaliar a presença de fraturas associadas - As lacerações do leito ungueal são habitualmente suturadas com pontos simples de fio absorvível 6-0 - A unha deve ser reposicionada e fixada proximal e lateralmente com náilon (4-0 ou 3-0), para prevenir deformidade ungueal COMPLICAÇÕES - Podem ser decorrentes de vários fatores, tais como o grau de contaminação dos ferimentos, a desvascularização da pele remanescente ou a perda de substância, a formação de hematoma, além de condições intrínsecas ao paciente - A infecção é uma das complicações mais temidas e, quando diagnosticada, deve ser tratada com a retirada dos pontos da pele, drenagem da secreção, desbridamento dos tecidos desvitalizados e antibioticoterapia - Vários recursos terapêuticos auxiliares já foram propostos, com a finalidade de promover a cicatrização em ferimentos que evoluem com complicações (oxigenoterapia hiperbárica, curativos a vácuo, açúcar, mel e óleo de babaçu) PROFILAXIA DO TÉTANO - Causado pela ação de endotoxinas do Clostridium tetani - Se manifesta clinicamente com febre baixa (ou ausente), hipertonia muscular e espasmos paroxísticos - A transmissão ocorre pela introdução dos esporos em uma solução de continuidade da pele ou de mucosas - O período de incubação é extremamente variável, de 1 dia a alguns meses - São considerados como porta de entrada os ferimentos contaminados por terra e fezes de animais ou humanas - As queimaduras e as mordeduras por animais, os ferimentos perfurantes, aqueles CC II 5 Glendha Malta A. produzidos por armas brancas ou por projéteis de arma de fogo também constituem risco para o desenvolvimento do tétano - Consideram-se ferimentos com risco mínimo para o tétano aqueles superficiais, sem a presença de corpos estranhos ou de tecidos desvitalizados - Indica-se o uso da imunoglobulina humana antitetânica ou, na sua indisponibilidade, do soro antitetânico, em pacientes que apresentem ferimento com alto risco para o tétano associado a história vacinal incerta, ou que tenham recebido menos de 3 doses - A necess idade de apl icar a vacina antitetânica também varia de acordo com as características das lesões, estando indicadaem todos os casos de ferimentos de alto risco para o tétano, exceto nos pacientes que tenham recebido o esquema completo de vacinas há menos de 5 anos - Já nos casos de ferimentos com risco mínimo para o tétano, a vacina está indicada para os pacientes com quadro vacinal incompleto ou incerto e naqueles que receberam a última dose há mais de 10 anos Fonte: Cirurgia de Ambulatório, SAVASSI- ROCHA, 2013 CC II 6 Glendha Malta A.
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