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OAB EXAME DE ORDEM DIREITO PROCESSUAL PENAL Capítulo 01 1 Olá, aluno! Bem-vindo ao estudo para o Exame de Ordem. Preparamos todo esse material para você não só com muito carinho, mas também com muita métrica e especificidade, garantindo que você terá em mãos um conteúdo direcionado e distribuído de forma inteligente. Para isso, estamos constantemente analisando o histórico de provas anteriores com fins de entender como cada Banca e cada Carreira costuma cobrar os assuntos do edital. Afinal, queremos que sua atenção esteja focada nos assuntos que lhe trarão maior aproveitamento, pois o tempo é escasso e o cronograma é extenso. Conte conosco para otimizar seu estudo sempre! Ademais, estamos constantemente perseguindo melhorias para trazer um conteúdo completo que facilite a sua vida e potencialize seu aprendizado. Com isso em mente, a estrutura do PDF Ad Verum foi feita em capítulos, de modo que você possa consultar especificamente os assuntos que estiver estudando no dia ou na semana. Ao final de cada capítulo você tem a oportunidade de revisar, praticar, identificar erros e aprofundar o assunto com a leitura de jurisprudência selecionada. E mesmo você gostando muito de tudo isso, acreditamos que o PDF sempre pode ser aperfeiçoado! Portanto pedimos gentilmente que, caso tenha quaisquer sugestões ou comentários, entre em contato através do email pdf@cers.com.br. Sua opinião vale ouro para a gente! O que você vai encontrar aqui? Recorrência da disciplina e de cada assunto dentro dela Questões comentadas Questão desafio para aprendizagem proativa Jurisprudência comentada Indicação da legislação compilada para leitura Quadro sinótico para revisão Mapa mental para fixação mailto:pdfadverum@cers.com.br 2 Acreditamos que com esses recursos você estará munido com tudo que precisa para alcançar a sua aprovação de maneira eficaz. Racionalizar a preparação dos nossos alunos é mais que um objetivo para o CERS, trata-se de uma obsessão. Sem mais delongas, partiremos agora para o estudo da disciplina. Faça bom uso do seu PDF! Bons estudos 3 SOBRE ESTA DISCIPLINA Daremos início ao estudo da disciplina de Direito Processual Penal. Como bem sabido, a FGV separa seis questões para essa matéria na primeira fase da OAB. Ou seja, por ser matéria de altíssima relevância, o seu estudo é primordial. Dessa forma, este material busca fornecer ao aluno um conhecimento amplo e suficiente, conforme os temas costumam ser cobrados, então, ao final dos capítulos, serão colacionadas questões para treinamento, sempre priorizando aos concursos da área. Vale acrescentar, por fim, que, como se constatará ao longo dos capítulos, os Examinadores do Exame de Ordem, vem cobrando a disciplina de modo abrangente. Deste modo, em que pese alguns temas sejam mais recorrentes, nenhum capítulo deste material deve ser negligenciado. Veja abaixo como se dá a distribuição macro da recorrência dessa disciplina: 4 RECORRÊNCIA DA DISCIPLINA Como dito, sabemos que estudar de forma direcionada, com base nos assuntos objetivamente mais recorrentes, é essencial. Afinal, uma separação planejada pode fazer toda diferença. Pensando nisso, através de estudo realizado pelo nosso setor de inteligência com base nas últimas provas, trouxemos os temas mais abordados nessa disciplina! Ação Penal 12% Jurisdição e Competência 18% Questões e Processos Incidentes 6% Direito Probatório 24% Recursos 24% Ações Autônomas de Impugnação 6% Disposições gerais do Código de Processo Penal 6% Procedimentos 6% DIREITO PROCESSUAL PENAL Ação Penal Jurisdição e Competência Questões e Processos Incidentes Direito Probatório Recursos Ações Autônomas de Impugnação Disposições gerais do Código de Processo Penal Procedimentos 5 TEMAS RECORRÊNCIA Ação Penal Direito Probatório Disposições Gerais do Código de Processo Penal Jurisdição e Competência Recursos Procedimentos Questões e processos Incidentes Ações autônomas de Impugnação 6 Assim, os assuntos de Direito Processual Penal estão distribuídos da seguinte forma: CAPÍTULOS Capítulo 1 (você está aqui!) – Sistemas Processuais. Princípios. Capítulo 2 – Aplicação da Lei Processual Penal. Capítulo 3 – Inquérito policial. Capítulo 4 – Ação penal. Capítulo 5 – Competência Criminal. Capítulo 6 – Das provas. Capítulo 7 – Das prisões. Capítulo 8 – Questões e processos incidentes. Capítulo 9 – Sujeitos e Comunicação dos atos. Capítulo 10 – Processo e Procedimentos. Capítulo 11 – Sentença e Nulidades Capítulo 12 – Recursos Capítulo 13 – Ações Autônomas 7 SOBRE ESTE CAPÍTULO Olá, futuro advogado! Tudo bem? Antes de começar o estudo, precisamos fazer algumas considerações a respeito da apostila de nº 01 do nosso curso, tá? Em primeiro turno, Sistemas processuais e Princípios do Direito Processual Penal NÃO costumam ser cobrados no exame de ordem! -Mas professora, por que incluí-los nas apostilas, então? Bom, como é de conhecimento geral, a banca examinadora tende a ser um pouco imprevisível, e o nosso objetivo é deixar você preparado para exatamente qualquer coisa que aparecer na prova! Então, achamos pertinente abranger o máximo de conteúdo possível, até porque, é um assunto presente no conteúdo programático da disciplina no Edital do EOU! 😊 Inclusive, ao final desta apostila, você encontrará questões de outras carreiras, para um maior aproveitamento e assimilação de conteúdo, portanto, não deixe de respondê-las, tá? Vamos juntos! 8 SUMÁRIO DIREITO PROCESSUAL PENAL ............................................................................................................. 10 Capítulo 1 ................................................................................................................................................ 10 1. Noções Introdutórias. Sistemas Processuais. Princípios. ....................................................... 10 1.1 Noções Introdutórias ........................................................................................................................................ 10 1.1.1 Conceito................................................................................................................................................................... 11 1.1.2 Competência legislativa .................................................................................................................................... 11 1.1.3 Características........................................................................................................................................................ 11 1.2 Sistemas processuais ........................................................................................................................................ 12 1.2.1 Sistema inquisitorial .......................................................................................................................................... 12 1.2.2 Sistema acusatório ............................................................................................................................................. 12 1.2.3 Sistema misto (sistema francês)................................................................................................................... 13 1.3 Princípios ................................................................................................................................................................ 15 1.3.1 Princípio da presunção de inocência (ou da não culpabilidade) .................................................. 15 1.3.2 Princípio do favor rei ........................................................................................................................................18 1.3.3 Princípio do contraditório .............................................................................................................................. 19 1.3.4 Tipos de contraditório ..................................................................................................................................... 20 1.3.5 Princípio da ampla defesa .............................................................................................................................. 20 1.3.6 Princípio da publicidade ................................................................................................................................. 25 1.3.7 Princípio da busca da verdade ..................................................................................................................... 26 1.3.8 Princípio da inadmissibilidade das provas ilícitas ................................................................................ 27 1.3.9 Princípio do juiz natural .................................................................................................................................. 28 1.3.10 Princípio do nemo tenetur se detegere ................................................................................................... 28 1.3.11 Desdobramentos do princípio nemo tenetur se detegere .............................................................. 30 9 1.3.12 Princípio da proporcionalidade .................................................................................................................... 34 QUADRO SINÓTICO .............................................................................................................................. 37 QUESTÕES COMENTADAS ................................................................................................................... 39 GABARITO ............................................................................................................................................... 48 QUESTÃO DESAFIO ................................................................................................................................ 49 GABARITO QUESTÃO DESAFIO ........................................................................................................... 50 LEGISLAÇÃO COMPILADA .................................................................................................................... 52 JURISPRUDÊNCIA ................................................................................................................................... 53 MAPA MENTAL ...................................................................................................................................... 58 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................................................... 61 10 DIREITO PROCESSUAL PENAL Capítulo 1 1. Noções Introdutórias. Sistemas Processuais. Princípios. 1.1 Noções Introdutórias Com a prática de conduta prevista abstratamente como crime (fato típico, ilícito e culpável), surge o direito de punir do Estado, ius puniendi in concreto. Entretanto, o Estado não pode aplicar a pena automaticamente ao infrator, é preciso que seja instaurado um processo judicial para satisfazer a essa pretensão punitiva (nulla poena sine judicio). Pretensão punitiva: é poder do Estado de exigir de quem comete um delito a submissão à sanção penal. Como fica o devido processo legal com a transação penal nos casos de infrações de menor potencial ofensivo? A transação penal e os seus requisitos serão detalhados mais adiante no curso, mas é preciso saber que através desse instituto podem ser aplicadas penas restritivas de direitos e pena de multa ao sujeito antes do recebimento da denúncia. Mesmo quando a transação penal é admitida, não se trata de imposição direta da pena! Nesse caso, é utilizado para a resolução da causa uma forma não tradicional: a solução consensual, sempre mediante a supervisão do judiciário. A satisfação da pretensão punitiva através da persecução penal é uma atividade estatal juridicamente vinculada por padrões normativos que limitam o poder de punir do Estado. Portanto, podemos afirmar que o processo penal serve como instrumento para que o Estado aplique a devida sanção penal ao autor do fato delituoso, sem arbítrios ou coerções, devendo ser entendido como uma salvaguarda da liberdade do réu. 11 Por que é preciso tanto rigor processual para aplicar uma pena? Lembre-se que aplicação do direito penal pode ser muito gravosa para o agente, resultando até mesmo na privação da sua liberdade. Estamos diante do grande dilema do processo penal: o respeito necessário aos direitos fundamentais versus um sistema operante e eficiente no combate ao crime. Na busca do equilíbrio entre os extremos precisamos evitar o hipergarantismo e teorias como o Direito Penal do Inimigo ou como o Direito Penal da Lei e da Ordem. 1.1.1 Conceito O Processo Penal é o conjunto de normas e princípios que regulam a aplicação jurisdicional do Direito Penal, bem como as atividades persecutórias da Polícia Judiciária e a estruturação dos órgãos da função jurisdicional. É ramo do direito público. 1.1.2 Competência legislativa A competência para legislar sobre direito processual penal é privativa da União, podendo ser atribuída aos estados-membros a competência sobre questões específicas de direito local mediante lei complementar. Já em relação ao Direito Penitenciário, afeto à execução penal, a competência é concorrente entre os entes. 1.1.3 Características Autonomia Não é submisso ao direito material, pois possui princípios e regras próprias. Instrumentalidade É um meio para fazer atuar o direito penal material. Normatividade É uma disciplina normativa, de caráter dogmático 12 1.2 Sistemas processuais 1.2.1 Sistema inquisitorial O sistema processual inquisitivo surgiu com o Direito Canônico, na Europa, no século XIII. É caracterizado pela figura do juiz inquisidor, dotado de ampla iniciativa probatória na fase de investigação e na fase processual, acumula as funções de acusar, defender e julgar, comprometendo a sua imparcialidade e objetividade. O procedimento em regra é escrito e sigiloso, sem efetiva participação da defesa, pois o réu é considerado mero objeto da persecução penal sem direito ao contraditório. É incompatível com os direitos e garantias individuais, viola os princípios do Processo Penal, a Constituição Federal de 1988 e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos. 1.2.2 Sistema acusatório Ao contrário do sistema inquisitorial, o sistema acusatório se caracteriza por dividir os sujeitos processuais, colocando a acusação e a defesa no mesmo patamar de condições em relação ao juiz da causa que, agora, é imparcial (ne procedat judex ex officio). Com a divisão das funções de acusar, defender e julgar, o processo acusatório é actum trium personarum. O procedimento acusatório privilegia o princípio da presunção de inocência, pode ser escrito ou oral, em regra público e excepcionalmente com publicidade restrita ou especial. Adota o contraditório como garantia político-jurídica do cidadão, gerando igualdade entre as partes (non debet licere actori, quod reo non permittitur). Para preservar a imparcialidade, o julgador deve adotar uma postura passiva quanto à produção de provas no sistema acusatório, deixando a atividade probatória como encargo das partes. Entretanto, atualmente já se admite que o juiz excepcionalmente possua poderes instrutórios apenas durante a fase processual e de forma subsidiária à atuação das partes. 13 1.2.3 Sistema misto (sistema francês) Tem uma fase processual de instrução preliminar secreta, a cargo do juiz, seguindo o sistema inquisitivo; e outra fase processual pública, em que predomina o contraditório nos moldesdo sistema acusatório. -Mas Professora, QUAL O SISTEMA PROCESSUAL ADOTADO NO BRASIL? Alguns doutrinadores apontam que o sistema processual penal brasileiro é misto porque o inquérito policial, que é inquisitivo por natureza, contamina o sistema acusatório. Esse entendimento, no entanto, é refutável visto que deve ser analisado apenas o processo para classificar o sistema em inquisitivo, acusatório ou misto, e o inquérito policial ocorre na fase pré-processual e ainda é dispensável. Ademais, o inquérito é presidido por autoridade administrativa e, para caracterizar o sistema misto, a fase de investigação deve ser presidida diretamente pelo juiz., que será o mesmo a presidir o julgamento. Definitivamente não é o caso do Brasil. Outros doutrinadores apontam a natureza mista do sistema brasileiro, mesmo desconsiderando a fase de inquérito, com fundamento em alguns poderes instrutórios exercidos pelo juiz. Entretanto, esses poderes de impulso processual não são suficientes para caracterizar o sistema misto, pois só podem ser exercidos de forma supletiva à atividade das partes e durante a fase processual. Ademais, a Constituição Federal de 1988 acolhe o sistema acusatório de forma explícita quando determina a legitimidade privativa do Ministério Público, órgão acusador, para propor a ação penal pública, garante o contraditório, a ampla defesa e a não presunção de culpabilidade. 14 O sistema acusatório pode ser rígido (o juiz JAMAIS toma a iniciativa de provas) ou flexível (as partes produzem provas, mas o juiz tem o poder de complementá-las, de determinar perícias ou a oitiva de testemunhas não requeridas). Portanto, caro OABeiro, podemos classificar o nosso sistema como acusatório não ortodoxo, flexível ou relativo, já que o juiz não é mero expectador no curso do processo penal, podendo, inclusive, determinar a realização de provas. 15 1.3 Princípios 1.3.1 Princípio da presunção de inocência (ou da não culpabilidade) Todo acusado é presumido inocente até que se comprove sua culpabilidade. “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” (art. 5º, LVII, da CF/88). Ou seja, o acusado só pode ser considerado culpado após o término do devido processo legal, durante o qual ele tenha se utilizado de todos os meios de provas possíveis para a sua defesa (ampla defesa) e tenha oportunidade de contestar todas as provas produzidas pela acusação (contraditório). Desse princípio podemos extrair quatro regras: a) Regra probatória: quem acusa tem o ônus de provar legalmente e judicialmente a culpabilidade do acusado. De acordo com o princípio da presunção de inocência, no processo penal não existe presunção de veracidade dos fatos narrados em função da revelia! Não existe CONFISSÃO FICTA no processo penal, nem quando o acusado não contesta os fatos descritos na peça acusatória. 16 Atenção para essa Jurisprudência relevante, futuro advogado: em certas situações, como nos casos de receptação, o STJ exige da defesa o ônus da prova para a comprovação da regularidade da atuação do réu, que deve demonstrar a aquisição legítima do bem que é indicado como fruto de atividade ilícita. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça se firmou no sentido que, no crime de receptação, se o bem houver sido apreendido em poder do paciente, caberia à defesa apresentar prova acerca da origem lícita do bem ou de sua conduta culposa, nos termos do disposto no art. 156 do Código de Processo Penal, sem que se possa falar em inversão do ônus da prova (AgRg no HC 331.384/SC, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 22/08/2017, DJe 30/08/2017). b) Regra de tratamento: o acusado não pode ser tratado como condenado antes do trânsito em julgado final da sentença condenatória (CR, art. 5º, LVII). São exemplos de manifestação da regra de tratamento a vedação de prisões processuais automáticas ou obrigatórias e a impossibilidade de execução provisória ou antecipada da sanção. A execução provisória é aquela que ocorre quando o indivíduo é condenado por um crime, mas contra a decisão condenatória ainda cabe recurso, ou seja, o processo ainda não transitou em julgado. 17 A doutrina que defende a impossibilidade da execução provisória da pena atenta que tal prática violaria o princípio constitucional da presunção de inocência; e a doutrina que defende a possibilidade da execução provisória entende que, quando a decisão penal condenatória é mantida em 2ª instância e o réu interpõe Recurso Especial ou Recurso Extraordinário, ele deve aguardar o julgamento cumprindo a pena imposta, pois os recursos cabíveis não têm efeito suspensivo. Diversas vezes o STF modificou o seu entendimento sobre o assunto. Até fevereiro de 2009, o Supremo aceitava a execução provisória da pena; no julgamento do HC 84078, em 05/02/2009, o Tribunal mudou o seu posicionamento e passou a entender que não era mais possível o início do cumprimento de pena enquanto não transitasse em julgado a decisão condenatória, e esse entendimento vigorou até 2016; em fevereiro de 2016, o STF julgou o HC 126292 voltou a entender que era possível a execução provisória da pena, estabelecendo que quando a sentença penal é confirmada em 2º grau, prolatada em processo que observou todas as garantias do indivíduo, exaure-se o princípio da presunção de não culpabilidade, destacando a importância de equilibrar o princípio da presunção de inocência com a efetividade da jurisdição; entretanto, ao apreciar e julgar as ADCs 43, 44 e 54 em novembro de 2019, o STF retomou a posição no sentido de que para o início do cumprimento da pena é necessário o esgotamento de todos os recursos disponíveis, proibindo a execução provisória da pena. Este último é o entendimento atual, que toma por base o art. 283 do CPP que dispõe: “ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”, considerado plenamente compatível com a CF/88. Ademais, o argumento de que a aplicação do princípio da presunção de inocência nesse caso obstruiria as atividades investigatórias e persecutórias do Estado não prosperou, pois a repressão ao crime não pode transgredir a ordem jurídica e os direitos fundamentais do indivíduo investigado. Essa última decisão deve estabilizar a matéria, pois tem efeitos vinculantes e erga omnes já que foi proferida em sede de ADC. 18 Mesmo com esse entendimento do STF, é possível que o réu seja preso enquanto aguarda o julgamento do recurso? SIM! A prisão do réu deve observar os requisitos da prisão preventiva (art. 312 do CPP), não é um efeito automático da condenação, mas sim uma medida cautelar. c) Regra de julgamento ou valoração das provas; d) Excepcionalidade das medidas cautelares. 1.3.2 Princípio do favor rei É um desdobramento do princípio da presunção de inocência, com as relevantes aplicações práticas: 1) na dúvida, o juiz deve decidir em favor do réu; 2) em caso de empate (o que costuma ocorrer no julgamento colegiado de HC), a decisão que prevalece é aquela em favor do réu. Portanto, existindo conflito entre o jus puniendi do Estado e o jus libertatis do acusado, deve prevalecer (na fase final de julgamento) o jus libertatis. Ou seja, na dúvida, absolve-se o imputado (in dubio pro reo). O princípio do favor rei e o princípio da presunção de inocência são corolários do princípio da igualdade das partes, pois procuram equilibrar a posição vulnerável do réu frente ao poder do Estado na persecução penal. O princípio do in dubio pro reo só incide até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. No processo de revisão criminal,em caso de dúvidas, o juiz deve decidir em favor da sociedade e contra o réu. 19 1.3.3 Princípio do contraditório “Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes” (art. 5º, LV, CF/88). Importante lembrar que o Contraditório é constituído pela garantia de ciência dos atos processuais pelas partes e a possibilidade de contraditar provas e argumentos elencados pela parte contrária no processo (audiatur et altera pars). O contraditório é o direito conferido a ambas as partes de ter ciência dos termos processuais com a possibilidade de contraditá-los. A garantia do contraditório na Constituição Federal estabelece um processo dialético, em que há fiscalização recíproca dos atos processuais pelas partes. Nesse contexto, ganha destaque as formas de comunicação processual – citação, intimação e notificação – e o enunciado da Súmula 707 do STF: “constitui nulidade a falta de intimação do denunciado para oferecer contrarrazões ao recurso interposto da rejeição da denúncia, não a suprindo a nomeação de defensor”. Atenção, OABeiro! Não se aplica o princípio do contraditório na fase de investigação preliminar, pois o art. 5º, LV, da CF/88 menciona que o contraditório deve ser observado em processo judicial ou administrativo, e o inquérito é considerado um procedimento administrativo, que visa colher elementos de informação para fundamentar possível ação penal. Por isso, as evidências colhidas em uma investigação preliminar, em regra, não são consideradas provas. Provas são elementos de convicção produzidos dialeticamente sob o manto do contraditório e da ampla defesa. Uma condenação não pode ser proferida com base exclusivamente em elementos colhidos na fase de inquérito, salvo quando se tratar de prova 20 com valor judicial, como as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas, que serão estudadas adiante. Do princípio do contraditório nasce o direito à participação, possibilidade de oferecer reação, se manifestar contra a pretensão da parte contrária. Mas a mera possibilidade não basta quando esse direito é interpretado à luz da isonomia na busca por igualdade substancial no processo. Portanto, para que tenhamos um contraditório efetivo e pleno, é preciso assegurar aos sujeitos do processo uma participação realmente igualitária considerando as suas desigualdades materiais, e essa missão de igualar os desiguais cabe ao julgador. O ordenamento jurídico impõe que o acusado, ainda que não tenha interesse em contraditar a acusação, tenha a assistência de uma defesa técnica (art. 261 do CPP). Entretanto, não basta a sua presença formal no processo, a exigência de um contraditório efetivo obriga o defensor a participar ativamente da atividade processual, fundamentando suas manifestações. 1.3.4 Tipos de contraditório a) Contraditório direto ou imediato (contraditório para a prova) – é o contraditório praticado durante o ato de produção da prova contraditada, sempre na presença das partes e do juiz. EXEMPLO: prova testemunhal. b) Contraditório mediato ou diferido (contraditório sobre a prova)– é o contraditório adiado ou postergado, exercido depois da produção da prova. EXEMPLO: provas produzidas antecipadamente, não repetíveis, como na interceptação telefônica, em que o réu somente toma ciência da prova e de seu conteúdo depois que foi produzida, oportunidade na qual pode ser exercido o contraditório pela defesa. 1.3.5 Princípio da ampla defesa Os princípios do contraditório e da ampla defesa são complementares, mas não se confundem. O princípio do contraditório torna defesa possível, enquanto o princípio da ampla defesa a torna plena, efetiva. O primeiro garante a informação e o segundo garante a reação 21 da parte. Lembra que o contraditório é uma garantia que se destina a ambas as partes do processo? Pois bem, a ampla defesa se destina apenas ao réu. A ampla defesa no processo penal se manifesta de duas formas: a defesa técnica (processual ou específica) e a autodefesa (material ou genérica), que são complementares. A primeira é realizada por advogado ou defensor público habilitado nos autos, enquanto a autodefesa é exercida pelo próprio acusado e ocorre em três contextos: direito ao interrogatório, direito de presença nos atos processuais e direito à capacidade postulatória autônoma. A autodefesa é um direito do réu, de exercício facultativo, ou seja, não causa prejuízo se ele não quiser exercê-la. Entretanto, uma vez exercida, obriga o magistrado a analisá-la e a se pronunciar sobre ela, sem prejuízo da defesa técnica, sob pena de nulidade absoluta. Para assegurar o exercício da autodefesa, em regra, o acusado deve ser citado pessoalmente para integrar a relação processual, sendo a citação por hora certa e a citação por edital medidas excepcionais. Atenção: se o réu estiver preso é dever do Estado saber a sua localização, não se aplicando a citação por edital. Súmula 351 do STF: “É nula a citação por edital de réu preso na mesma unidade da federação em que o juiz exerce a sua jurisdição”. Ainda, é necessário que o réu seja intimado dos os atos processuais para que possa acompanhá-los (salvo quando há revelia) e das decisões, para que exerça o seu direito de recorrer pessoalmente. Desdobramentos da autodefesa: c) Direito de audiência – é o direito que o acusado tem de expor pessoalmente a sua defesa ao juiz por meio do interrogatório. d) Direito de presença – é o direito que o acusado tem de, juntamente com o seu defensor, acompanhar os atos de instrução processual. Entretanto, o direito de presença do réu não é absoluto. Os direitos fundamentais das testemunhas e das vítimas à vida, segurança, intimidade e liberdade de declarar, devem sempre prosperar quando colidirem com o direito de presença do réu. Caso o direito de presença não 22 possa ser exercido pelo réu, deve ser assegurada a presença de seu defensor e um canal de comunicação livre e reservada entre ele e o acusado. Art. 217 do CPP. Se o juiz verificar que a presença do réu poderá causar humilhação, temor, ou sério constrangimento à testemunha ou ao ofendido, de modo que prejudique a verdade do depoimento, fará a inquirição por videoconferência e, somente na impossibilidade dessa forma, determinará a retirada do réu, prosseguindo na inquirição, com a presença do seu defensor. Como fica o deslocamento do réu preso para acompanhar atos processuais? O Supremo entende que o acusado, embora preso, tem o direito de comparecer aos atos processuais, principalmente os da fase de instrução, sob pena de nulidade absoluta. E se o ato de instrução for praticado em comarca diferente daquela em que o réu se encontra preso? Independentemente do local em que o réu está detido, ele deve ser requisitado para comparecer aos atos processuais. Entretanto, o Supremo entende que, especificamente no caso de realização de audiências deprecadas, a ausência do réu preso causa nulidade relativa do ato, devendo ser comprovada que a requisição seria oportuna e a presença de efetivo prejuízo ao direito de autodefesa do réu. a) Direito à capacidade postulatória autônoma – em alguns momentos do processo penal é concedida ao acusado capacidade postulatória autônoma, como para interpor recursos (art. 577, CPP), impetrar habeas corpus (art. 654, CPP), ajuizar revisão criminal (art. 623, CPP) e formular pedidos na fase de execução da pena (art. 195, LEP). No caso da capacidade postulatória autônoma, o réu tem o direito de dar o impulso inicial. Ou seja, para assegurar a ampla defesa, deve ser garantida a sua assistência técnica nas fases posteriores do processo. Por exemplo, o réu pode interpor apelação contra sentença condenatória, mas precisará de um defensor técnico para apresentar as razões do recurso. 23De forma concorrente, o defensor também tem legitimidade para recorrer. Súmula 705, STF: “A renúncia do réu ao direito de apelação, manifestada sem a assistência do defensor, não impede o conhecimento da apelação por este interposta”. Quando houver colisão da vontade de recorrer entre o advogado e o acusado, temos dois entendimentos: 1. Prevalece a vontade do advogado sobre a do acusado, sob o fundamento de que o defensor é mais preparado tecnicamente para saber a possibilidade ou não de obtenção de procedência; 2. Prevalece a vontade do acusado sobre a do advogado, já que ele é quem vai sofrer os efeitos da condenação, e o fato de não existir reformatio in pejus evitaria qualquer outro prejuízo com o recurso. Entre as teses, a doutrina majoritária entende que deve prevalecer a que for mais benéfica ao réu no caso concreto. Quanto à defesa técnica, destaca-se que também faz parte do princípio do contraditório e do princípio da ampla defesa o direito do réu de escolher o seu próprio advogado. Entretanto, precisamos ter em mente que a defesa técnica é indisponível e irrenunciável, ou seja, caso o réu se mantenha inerte quando intimado para indicar o seu patrocinador, o juiz deverá nomear um advogado dativo ou um defensor público. Art. 261. Nenhum acusado, ainda que ausente ou foragido, será processado ou julgado sem defensor. Parágrafo único. A defesa técnica, quando realizada por defensor público ou dativo, será sempre exercida através de manifestação fundamentada. Súmula 708 do STF: “É nulo o julgamento da apelação se, após a manifestação nos autos da renúncia do único defensor, o réu não foi previamente intimado para constituir outro”. 24 É claro que, se o réu for advogado, ele tem capacidade postulatória para exercer a sua própria defesa técnica, mas atenção: apesar do evidente conhecimento jurídico, juízes e promotores que forem réus em processos criminais não são dotados de capacidade postulatória para exercer a própria defesa técnica, pois os membros do MP e da magistratura são impedidos de exercer a advocacia. Caso não haja Defensoria Pública na comarca, o juiz deve nomear advogado dativo para ser o defensor do réu, com direito a honorários fixados pelo juiz, segundo tabela da OAB e pagos pelo Estado, sendo a recusa injustificada de patrocinar a causa considerada infração disciplinar. Para que se exerça a ampla defesa prevista na CF, não basta a presença formal de um defensor, é necessário que a sua atividade no processo para proteger os direitos do réu seja percebida e motivada. Por exemplo, no caso de um defensor que se manifesta com peças genéricas, que poderiam ser aplicadas em qualquer processo criminal, é possível falar em violação da ampla defesa por não existir defesa técnica plena e efetiva. Nesses casos, cabe ao Ministério Público e ao juiz a fiscalização da atividade do advogado para evitar uma possível nulidade do processo. Súmula 523 do STF: “No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu”. 25 Evidentemente a defesa deve ser exercida sempre em favor do réu, mas isso não quer dizer que o defensor precisa sempre pedir a absolvição. No caso concreto, pode ser que o pedido de absolvição do acusado seja tecnicamente inviável, por exemplo, no caso do réu que confessa. Entretanto, em situações como essa, cabe ao defensor procurar minimizar a sanção, por exemplo, pelo reconhecimento de causa de diminuição de pena. Por fim, é possível que o mesmo defensor patrocine dois ou mais acusados no mesmo processo penal, desde que as teses de defesa não colidam. 1.3.6 Princípio da publicidade O princípio da publicidade processual permite a qualquer cidadão o acesso e a fiscalização dos atos jurisdicionais. É um dos elementos mais importantes do sistema acusatório, além de viabilizar o Estado Democrático de Direito. Art. 93, IX, da CF: todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação; Art. 5º, XXXIII, da CF: todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; Art. 5º, LX, da CF: a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem; Como se observa nos dispositivos acima, a regra é que o processo tenha publicidade ampla (plena, popular, absoluta ou geral), ou seja, os atos processuais devem ser praticados diante das partes e abertos ao público. Por isso, qualquer cidadão pode, por exemplo, acompanhar audiência, consultar processos e obter certidões. Entretanto, a publicidade não é absoluta. Em algumas situações o processo terá uma publicidade restrita (interna, também conhecida como segredo de justiça), em que alguns atos ou todos eles serão realizados e publicados apenas para determinadas pessoas interessadas no 26 feito e seus respectivos procuradores. Essa restrição ocorre quando o interesse público à informação colide com outros interesses importantes que acabam prevalecendo no caso concreto, como a intimidade da vítima de abuso sexual. Decretado o sigilo judicial, somente a própria autoridade que o decretou poderá afastá-lo. Nesse contexto, o STF entende que as CPIs não possuem poder para quebrar o sigilo de processo mediante requisição (MS 27.483/DF). É importante ressaltar que as provas cautelares, mesmo aquelas produzidas no curso do processo, não implicam em publicidade, nem mesmo às partes e seus procuradores. Veja bem, qual seria o sentido de decretar uma interceptação telefônica se o investigado sabe que está sendo interceptado? Essa prática tornaria a medida inócua. 1.3.7 Princípio da busca da verdade A verdade formal é aquela que as partes levam para os autos, enquanto a verdade material é o que de fato aconteceu. Durante muitos anos a doutrina ensinou que no direito civil, que geralmente discute direitos disponíveis, vigorava o princípio do dispositivo, segundo o qual as partes levam as provas ao processo, o magistrado ficava passivo, sem interferir na produção de provas, e julga o processo com base no que ali foi demonstrado, ou seja, segundo a verdade formal dos autos. Como no processo penal em regra discute-se a liberdade de locomoção do acusado, que é um direito indisponível, o juiz seria uma figura com poderes instrutórios e participação ativa na produção de provas em busca da verdade dos fatos, a verdade material, que também é conhecida como verdade substancial ou verdade real. 27 Entretanto, a busca da verdade material como requisito para a realização da pretensão punitiva do Estado passou a ser justificativa para arbitrariedades, pois em nome da verdade tudo era válido. Atualmente a diferença entre verdade real e verdade formal não é mais aceita. Hoje o processo é visto como um meio para efetivar a justiça, independentemente de ser direito disponível ou indisponível. Especificamente no processo penal, entendemos que é praticamente impossível encontrar uma verdade absoluta, por mais contundentes que sejam as provas. Portanto, o que se busca atualmente é a maior aproximação da certeza dos fatos, a busca pela verdade. Até mesmo porque a ação probatória é submetida à algumas restrições, como às provas ilícitas; à leitura de documentos ou exibição de objetos em plenário do júri se não tiverem sido juntados aos autos, com ciência da outraparte, até três úteis antes; ao depoimento de testemunha que tenham ciência do fato em razão da profissão, ofício, função ou ministério... Verdade consensual – a Lei 9.099/95 estabeleceu algumas medidas despenalizadoras que privilegiam a vontade consensual das partes: composição civil dos danos; transação penal; representação da vítima de lesão corporal leve e culposa; e suspensão condicional do processo. 1.3.8 Princípio da inadmissibilidade das provas ilícitas São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos (art. 5º, LVI, da CF). Em um Estado Democrático de Direito, apesar da busca pela verdade material, a sua descoberta não pode ser feita de qualquer forma. Existem limitações aos meios de provas porque eles coexistem com outros direitos. Mesmo em prejuízo da verdade, para que tenhamos um processo justo e que respeita os direitos e garantias fundamentais, as provas obtidas de forma ilícita devem ser expurgadas do processo, sob pena de, aceitas, deslegitimar o sistema processual punitivo. Observe, não tem sentido um processo que visa punir a violação de direitos usar de outra violação para tanto. Aprofundaremos esse assunto no estudo das provas. 28 1.3.9 Princípio do juiz natural O juiz natural é aquele constituído legalmente por regras taxativas de competência. A grosso modo, trata-se do direito do indivíduo de saber, antes de cometer uma conduta criminosa, a autoridade que irá processar e julgar o feito. O princípio do juiz natural contrapõe-se ao juízo de exceção, pois veda que um juiz seja designado especificamente e arbitrariamente para julgar um caso que já aconteceu, assegurando a imparcialidade do julgador e a sua independência. 1.3.10 Princípio do nemo tenetur se detegere Ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo. Através do princípio do nemo tenetur se detegere, o ordenamento jurídico protege o indivíduo contra excessos do Estado na persecução penal, seja na fase investigatória ou na instrução processual, pois veda qualquer medida de coerção física ou moral para que o investigado confesse ou colabore em atos processuais que podem levar à sua condenação. O preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo- lhe assegurada a assistência da família e de advogado (art. 5º, LXIII, da CF). Na nossa Constituição Federal, o princípio nemo tenetur se detegere está previsto expressamente como o direito do preso ao silêncio, mas a sua essência não se limita a isso. Muito mais amplo, esse princípio é uma forma de autodefesa passiva de qualquer indivíduo contra imputação de uma conduta criminosa. A partir de uma interpretação literal e apressada do texto legal podemos imaginar que o princípio só é destinado a tutelar a situação do indivíduo preso. Entretanto, o entendimento 29 mais aceito pela doutrina é o de que o ordenamento jurídico garante o direito de não produzir provas contra si mesmo também ao indivíduo solto, sendo o titular do direito qualquer pessoa que possa se autoincriminar, seja ela suspeita, indiciada, acusada ou condenada. Crime de falso testemunho e a autoincriminação: ao contrário do acusado, a testemunha tem o dever de falar a verdade, sob pena de incorrer no crime de falso testemunho. Entretanto, seria um abuso arrolar uma pessoa como testemunha, com obrigação de dizer sempre a verdade, para obrigá-la a se incriminar. Nesse contexto, o Supremo já decidiu que não configura crime de falso testemunho se o indivíduo na condição de testemunha não revela fatos que podem o incriminar. “Ofende o princípio da não-autoincriminação denúncia baseada unicamente em confissão feita por pessoa ouvida na “condição de testemunha”, quando não lhe tenha sido feita a advertência quanto ao direito de permanecer calada” (STF, 2ª Turma, RHC 122.279/RJ, Rel. Min. Gilmar Mendes, J.12/08/2014, DJe 213 29/10/2014). É mesmo necessária a prévia advertência quanto ao direito ao silêncio? SIM! É uma garantia constitucional que, se desobedecida, torna ilícitas todas as provas obtidas a partir da declaração do investigado, inclusive as provas dela derivadas. Ademais, é necessário que a autoridade que adverte o indivíduo seja clara que o exercício do direito ao silêncio não trará nenhum prejuízo. Não é lícita a gravação clandestina de conversa informal de policiais com o preso quando o este último não consentiu com a gravação e não foi advertido do seu direito ao silêncio. A 2ª Turma do Supremo, ao julgar HC em 2010, enfrentou o seguinte caso: o acusado concedeu uma entrevista e narrou o modus operandi de dois homicídios que estavam sendo 30 imputados a ele. Entretanto, o acusado não foi previamente advertido do seu direito ao silêncio. A defesa alegou a dignidade constitucional expressa do direito ao silêncio, mas o Supremo entendeu que o dever de advertir os investigados dos seus direitos constitucionais é do Poder Público, concluindo não existir nulidade em usar a entrevista concedida espontaneamente pelo paciente como prova no processo penal. Assim, é assegurado a qualquer suspeito, indiciado, acusado ou condenado, solto ou preso, o direito de não produzir provas contra si mesmo e de que o exercício desse direito não poderá usado como prova pela acusação; não será valorado na formação de convicção do julgador; não será usado como fundamento para majorar a sua pena, para decretar prisão cautelar; jamais será extraída presunção em seu desfavor; não caracteriza crime de desobediência. 1.3.11 Desdobramentos do princípio nemo tenetur se detegere Como já mencionado, o princípio do nemo tenetur se detegere não se limita ao direito ao silêncio. Vejamos agora quais são os seus mais importantes desdobramentos: Direito ao silêncio: é o direito de não responder as perguntas da autoridade. É um direito constitucional do acusado, e sua prática não implica em nenhum prejuízo ao investigado; não significa confissão ficta; e não é falta de defesa – ao contrário, pode ser uma estratégia defensiva. Direito de não ser constrangido a confessar a prática de ilícito penal: previsto no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 14, §3º) e na Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (art. 8º, §2º, g, e §3º). 31 Inexigibilidade de dizer a verdade: Existe o direito de mentir? Alguns doutrinadores entendem que existe o direito de mentir porque não há tipificação do crime de perjúrio no nosso ordenamento jurídico. Por outro lado, outra parte da doutrina afirma que o princípio do nemo tenetur se detegere não abarcaria uma conduta antiética e imoral, usando o mesmo raciocínio que aplica à fuga do preso: a fuga também não é considerada crime, mas não podemos dizer que a fuga é um direito do preso! Se assim fosse, seria lícito fugir da prisão! Mas a fuga é prevista como falta grave (LEP, art. 50, II) e não existe punição para a mentira do investigado para não se incriminar, e agora? Podemos dizer que, como a verdade incriminadora não é exigida do investigado, a mentira é tolerada pelo ordenamento jurídico porque na prática não vai gerar nenhum prejuízo ao acusado. A mentira tolerada é a mentira defensiva. Temos que diferenciar a mentira defensiva da mentira agressiva, pois a esfera de proteção dos direitos do investigado que tolera a mentira acaba no limite em que ele passa a invadir a esfera de proteção dos direitos de outra pessoa. A mentira defensiva ocorre quando, por exemplo, o investigado inventa um álibi. Enquanto a mentira agressiva ocorre quando, por exemplo, o investigado imputa a conduta delituosa a terceiro inocente. Nesse caso, se a mentira do investigado deu causa à instauração de investigação policial, processo judicial, investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém que ele sabe ser inocente, o investigado que mentiu responderá por denunciação caluniosa.É possível reconhecer a incidência do princípio do nemo tenetur se detegere quando um segundo delito é cometido para encobrir o primeiro? Por exemplo, quando o agente comete fraude processual para ludibriar a perícia, ele responde pelo primeiro crime que está sendo periciado em concurso com a fraude processual, ou a fraude processual estaria amparada por uma excludente de ilicitude (exercício regular de direito – direito de não produzir prova contra si mesmo)? 32 O princípio em análise não abarca situação como essa em que a produção da prova não depende de atuação direta do investigado. Se fosse assim, matar a testemunha de um crime que você praticou seria exercício regular de direito! Nesses casos o que há é um mero temor de que a verdade seja revelada sobre o crime anterior, que depende de atividade de terceiro e não do sujeito investigado. A proteção do direito de não produzir provas contra si mesmo não abarca a prática de nova infração penal. Por isso, o Supremo entende que o princípio do nemo tenetur se detegere não abrange mentir sobre a identidade pessoal. O fato de o agente se identificar à autoridade com nome falso para esconder maus antecedentes não é direito ao silêncio, é crime de falsa identidade. Súmula 522, STJ: “a conduta de atribuir-se falsa identidade perante a autoridade policial é típica, ainda que em situação de alegada autodefesa”. Direito de não praticar comportamento ativo autoincriminador: quando for necessária uma ação do investigado para a produção da prova é indispensável o seu consentimento. A sua recusa em participar não configura crime de desobediência, desacato, ou qualquer presunção prejudicial. Nesse contexto, o acusado não é obrigado a fornecer padrões vocais para perícia de verificação de interlocutor; material para exame grafotécnico (nada impede que a autoridade judicial determine a apreensão de documentos que possam suprir esse material); e configura constrangimento ilegal a prisão preventiva do indivíduo que se recusa a participar da reconstituição do crime. Atenção: o direito de não produzir provas contra si mesmo, que inclui o direito de não praticar comportamento ativo autoincriminador, não vigora quando o investigado é mero objeto de verificação. Por exemplo, no reconhecimento pessoal é possível a condução coercitiva do indivíduo mesmo que ele não queira participar. Direito de não produzir provas invasivas autoincriminadoras: Exame de sangue, ginecológico, de urina, fecal, de saliva, de DNA usando fios de cabelo e a radiografia são exemplos de intervenções corporais que podem ser realizadas no processo para descobrir circunstâncias fáticas sobre as condições físicas e psíquicas do sujeito, ou objetos escondidos nele. A investigação pode ocorrer por meio das 33 intervenções corporais, que são procedimentos realizados no corpo do investigado, e quando não forem invasivas, podem ser realizadas mesmo sem o consentimento do sujeito e com coação direta se for preciso. Ou seja, quando a prova for invasiva, é necessário o consentimento do sujeito para a sua realização; mas quando a prova for não invasiva, mesmo que o sujeito se recuse a produzi-la, ela ainda poderá ser feita. Olha que curioso: a constituição não estabeleceu reserva de jurisdição para determinar que sejam produzidas intervenções corporais. Portanto, as medidas podem ser determinadas pela autoridade policial, sem necessidade de prévia autorização judicial. Atenção: mesmo com consentimento do sujeito, não é possível submeter alguém a intervenção corporal que ofenda a dignidade da pessoa humana ou que coloque em risco a sua integridade física ou psíquica. Por exemplo, não pode submeter uma grávida a exame de raio- x. Caso do bafômetro: o art. 277 do Código de Trânsito Brasileiro dispõe que o condutor de veículo automotor envolvido em acidente de trânsito, ou que for alvo de fiscalização de trânsito, poderá ser submetido a teste, exame clínico, perícia ou outro procedimento que, por meios técnicos ou científicos, na forma disciplinada pelo Contran, permita certificar influência de álcool ou outra substância psicoativa que determine dependência. A infração administrativa por dirigir sob esse tipo de influência é prevista no art. 165 do CTB; pode ser demonstrada por meio de imagem, vídeo, sinais que indiquem a alteração da capacidade psicomotora ou qualquer outra prova admitida pelo direito; e tem como penalidade multa, recolhimento administrativo de documento de habilitação e retenção do veículo até a apresentação de condutor habilitado. Essas penalidades administrativas também são aplicáveis ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos que demonstrem a sua condição. Veja, no processo penal, por força do princípio da presunção de inocência não é permitido que o ônus da prova seja invertido quando o investigado se recusa a participar da produção de prova invasiva. Claro que no âmbito administrativo o sujeito também não é obrigado a produzir 34 prova contra si mesmo, mas a sua recusa vai gerar a inversão do ônus da prova, ou seja, no caso do art. 165 do CTB, presume-se que o condutor estava sob influência de álcool ou outra substancia psicoativa que determine dependência, cabendo a ele comprovar que isso não é verdade. Vale destacar que o grau de dosagem etílica não mais integra o tipo incriminador da embriaguez ao volante (art. 306 do CTB) desde 2012, portanto, agora o delito pode ser provado não apenas com testes invasivos como o bafômetro, mas também por prova testemunhal ou exame de corpo de delito indireto ou supletivo. É pacífico o entendimento de que a recusa do condutor de realizar procedimentos invasivos como o bafômetro ou exame de sangue não configura crime de desobediência e criminalmente não pode ser interpretada desfavoravelmente ao investigado. 1.3.12 Princípio da proporcionalidade Atenção: o princípio da proporcionalidade NÃO está previsto expressamente na CF. É um fundamento do princípio do devido processo legal (art. 5º, LIV, CF). Esse princípio tem importante incidência na atuação do Estado, pois toda atividade estatal deve ser dotada de razoabilidade, para tutelar os direitos fundamentais dos indivíduos, proibindo possíveis excessos e arbítrios do Poder Público. Para que o princípio da proporcionalidade seja aplicado de forma segura e legítima, deve seguir os pressupostos do princípio da legalidade processual, como pressuposto formal, e o princípio da justificação teleológica, como pressuposto material. A proporcionalidade deve observar o princípio da legalidade processual tendo em vista que, por ele, qualquer medida que restrinja direitos fundamentais deve ser prevista em lei escrita, estrita e prévia (nulla coactio sine lege), o que evita ações arbitrárias e ilegítimas do Estado com o pretexto de alcançar a proporcionalidade. 35 Quando tratamos o princípio da justificação teleológica como pressuposto material da aplicação do princípio da proporcionalidade, significa que devemos legitimar a aplicação da medida através da sua necessidade em relação ao fim que pretendemos alcançar. Além dos pressupostos que a aplicação do princípio da legalidade deve observar para que seja considerada legítima, temos os seguintes requisitos do princípio da proporcionalidade: Requisitos extrínsecos: judicialidade e motivação. Judicialidade é a exigência que os direitos fundamentais só sejam limitados por decisão de um juiz competente – cláusula de reserva de jurisdição. Essa decisão judicial precisa ser motivada, também por se tratar de restrição a direito fundamental. Só com a motivação é que poderá ocorrer impugnação e fiscalização da atividade jurisdicional. Requisitos intrínsecos: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Esses requisitos intrínsecos também são denominados de subprincípios da proporcionalidade,ou chamados de seus elementos. Adequação: também chamado de princípio da idoneidade ou da conformidade. De acordo com o subprincípio da adequação, a medida que restringe direito fundamental é adequada quando for capaz de atingir o fim almejado. Não é adequado adotar uma medida restritiva de direitos fundamentais se ela não for apropriada para alcançar o resultado pretendido. Exemplos: a) se o objetivo é evitar a fuga do acusado, não é adequado decretar a proibição de entrar em contato com determinadas pessoas – essa medida seria qualitativamente inadequada; b) se uma prisão preventiva foi decretada para assegurar a conveniência da instrução criminal, quando a instrução for concluída a medida deve ser revogada – caso não seja, essa medida seria quantitativamente inadequada. Concluindo: notou que no requisito adequação existe uma relação de meio e fim? Pois é, resumindo, para saber se uma medida é adequada basta se perguntar no caso concreto se o meio escolhido contribui para o resultado pretendido. 36 Necessidade: também chamado de exigibilidade ou princípio da intervenção mínima, da menor ingerência possível, da alternativa menos gravosa, da subsidiariedade ou da proibição de excesso. De acordo com o subprincípio da necessidade, dentre todas as medidas que são adequadas ao caso, deve ser adotada aquela que seja menos gravosa, aquela que menos restrinja o direito fundamental. É pelo princípio da necessidade que os órgãos jurisdicionais precisam buscar medidas alternativas que, claro, sejam idôneas a alcançar o fim almejado. Por exemplo, se o fato pode ser provado por outro meio, não há justificativa para autorizar a interceptação telefônica e a sua consequente invasão de intimidade. Proporcionalidade em sentido estrito: por esse subprincípio, impõe-se ao julgador uma ponderação entre o benefício e o ônus que a medida a ser adotada trará. Trata-se de uma relação de custo-benefício da medida – o gravame ao direito fundamental restringido guarda proporcionalidade com a importância do bem jurídico que com a medida será protegido? 37 QUADRO SINÓTICO INTRODUÇÃO CONCEITO Conjunto de normas e princípios que regulam a aplicação jurisdicional do Direito Penal, bem como as atividades persecutórias da Polícia Judiciária e a estruturação dos órgãos da função jurisdicional. É ramo do direito público. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA Privativa da União, podendo ser atribuída aos estados-membros a competência sobre questões específicas de direito local mediante lei complementar. Já em relação ao Direito Penitenciário, afeto à execução penal, a competência é concorrente entre os entes. CARACTERÍSTICAS Autonomia Instrumentalidade Normatividade SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS SISTEMA INQUISITORIAL Juiz inquisitor – apura, acusa e julga; secreto; sem contraditório; sem garantias para o acusado, que é um objeto de investigação, e não um sujeito de direitos. SISTEMA ACUSATÓRIO É o sistema adotado no Brasil. A acusação e a defesa são separadas do órgão julgador e estão no mesmo patamar de igualdade em relação ao juiz; presença do contraditório e da ampla defesa; princípio da inércia do juiz; oralidade e publicidade do processo; princípio da presunção de inocência; imparcialidade do julgador. SISTEMA MISTO Tem uma fase processual de instrução preliminar secreta, a cargo do juiz, seguindo o sistema inquisitivo; e outra fase processual pública, em que predomina o contraditório nos moldes do sistema acusatório. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO PROCESSO PENAL PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA Todo acusado é presumido inocente até que se comprove sua culpabilidade. PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO É a garantia de ciência dos atos processuais pelas partes e a possibilidade de contraditar provas e argumentos elencados pela parte contrária no processo. 38 PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA A ampla defesa no processo penal se manifesta de duas formas: a defesa técnica (processual ou específica) e a autodefesa (material ou genérica), que são complementares. A primeira é realizada por advogado ou defensor público habilitado nos autos, enquanto a autodefesa é exercida pelo próprio acusado e ocorre em três contextos: direito ao interrogatório, direito de presença nos atos processuais e direito à capacidade postulatória autônoma. PRINCÍPIO DA PUBICIDADE Permite a qualquer cidadão o acesso e a fiscalização dos atos jurisdicionais. PRINCÍPIO DA BUSCA DA VERDADE Maior aproximação da certeza dos fatos, a busca pela verdade. Até mesmo porque a ação probatória é submetida à algumas restrições, como às provas ilícitas. PRINCÍPIO DA INADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS Existem limitações aos meios de provas porque eles coexistem com outros direitos. PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL O juiz natural é aquele constituído legalmente por regras taxativas de competência. É direito do indivíduo de saber, antes de cometer uma conduta criminosa, a autoridade que irá processar e julgar o feito. PRINCÍPIO DO NEMO TENETUR SE DETEGERE Ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo. PRNCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE Adequação + necessidade + proporcionalidade em sentido estrito. 39 QUESTÕES COMENTADAS Questão 1 (Instituto Acesso - 2019 - PC-ES - Delegado de Polícia) A referida classificação do sistema brasileiro como um sistema acusatório, desvinculador dos papéis dos agentes processuais e das funções no processo judicial, mostra-se contraditória quando confrontada com uma série de elementos existentes no processo.” (FERREIRA. Marco Aurélio Gonçalves. A Presunção da Inocência e a Construção da Verdade: Contrastes e Confrontos em perspectiva comparada (Brasil e Canadá). EDITORA LUMEN JURIS, Rio de Janeiro, 2013). Leia o caso hipotético descrito a seguir. O Ministro OMJ, do Supremo Tribunal Federal, rejeitou o pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), de arquivamento do inquérito aberto para apurar ofensas a integrantes do STF e da suspensão dos atos praticados no âmbito dessa investigação, como buscas e apreensões e a censura a sites. Assinale a alternativa INCORRETA quanto a noção de sistema acusatório. A) Inquérito administrativo instaurado no âmbito da administração pública. B) A determinação de ofício de instauração de inquérito policial pelo juiz. C) A Instauração de inquérito policial pelo Delegado de Polícia. D) A requisição de instauração de inquérito policial pelo Ministério Público. E) Inquérito instaurado por comissões parlamentares. Comentário: A questão colocou um caso específico, mas na verdade só queria que você respondesse qual das alternativas não é uma característica compatível com o sistema acusatório. Simples né? A iniciativa de instauração de inquérito pelo juiz é uma característica do sistema inquisitivo e não é aceita em nosso processo penal. Ao contrário, as demais alternativas são características do sistema acusatório porque separam o investigador/acusador do órgão julgador, notou? Todas elas são compatíveis com o nosso sistema processual. 40 Questão 2 (CESPE - 2017 - DPE-AL - Defensor Público) No processo penal, as características do sistema acusatório incluem I. clara distinção entre as atividades de acusar e julgar, iniciativa probatória exclusiva das partes e o juiz como terceiro imparcial e passivo na coleta da prova. II. neutralidade do juiz, igualdade de oportunidades às partes no processo e repúdio à prova tarifada. III. predominância da oralidade no processo, imparcialidade do juiz e supremacia da confissão do réu como meio de prova. IV. celeridade do processo e busca da verdade real, o que faculta ao juiz determinar de ofício a produção de prova. Estão certos apenas os itens A) I e II. B) I e IV. C) II e III. D) I, III e IV. E) II, III e IV. Comentário: As assertivas III e IV estão erradasporque a confissão não é meio de prova supremo no processo penal acusatório, que não adota o sistema de prova tarifada (típico do sistema processual inquisitivo); assim como não é permitido ao juiz produzir provas no sistema processual acusatório puro, devendo ter uma postura passiva e imparcial (lembrando que a questão fala sobre os sistemas processuais penais e não propriamente sobre o sistema processual penal brasileiro, que é considerado acusatório mitigado). 41 Questão 3 (CESPE - 2019 - TJ-AM - Assistente Judiciário) Com relação a provas, julgue o próximo item. Provas obtidas por meios ilícitos podem excepcionalmente ser admitidas se beneficiarem o réu. ( ) CERTO ( ) ERRADO Comentário: O princípio da vedação às provas ilícitas no processo penal brasileiro vem sendo relativizado pela aplicação do princípio da proporcionalidade quando o primeiro entrar em conflito com o ius libertatis do réu inocente. Portanto, em benefício da defesa, a prova obtida por meios ilícitos pode ser aceita no processo penal, principalmente se for a única forma de provar a inocência do réu. Questão 4 (FCC - 2019 - MPE-MT - Promotor de Justiça Substituto) Nos termos da Súmula Vinculante n° 11, do Supremo Tribunal Federal, só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros. Durante o parto, em relação às mulheres grávidas, o uso de algemas A) poderá ser substituído por medicamentos que tornem inviável a fuga da mulher grávida. B) deverá ser justificado por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade. C) é vedado pelo Código de Processo Penal. D) não é vedado pelo Código de Processo Penal, mas não é admitido por razões humanitárias. E) é permitido em caso de prisão em flagrante delito ou decretada por autoridade judiciária competente. Comentário: 42 O CPP dispõe no seu art. 292, parágrafo único, que: “é vedado o uso de algemas em mulheres grávidas durante os atos médico-hospitalares preparatórios para a realização do parto e durante o trabalho de parto, bem como em mulheres durante o período de puerpério imediato”. Questão 5 (FCC - 2018 - DPE-MA - Defensor Público) “Um homem acusado de assalto foi morto por linchamento pela população em São Luís do Maranhão. Segundo a Polícia Militar (PM), J.F.B agiu com um comparsa na abordagem de um eletricista em uma parada de ônibus, na Avenida Marechal Castelo Branco" (Portal G1 MA, 10/04/2018). A notícia acima demonstra a NÃO observância do seguinte princípio do processo penal democrático: A) contraditório. B) jurisdicionalidade ou necessidade. C) imparcialidade. D) juiz natural. E) paridade de armas. Comentário: O princípio da jurisdicionalidade garante que o indivíduo só poderá ser julgado pelo Estado, pois a liberdade do indivíduo é matéria submetida à reserva de jurisdição. Quando a população linchou e matou o sujeito, impediu que ele fosse submetido a um processo regular e democrático, ofendendo o princípio da jurisdicionalidade. Questão 6 (VUNESP - 2018 - TJ-SP - Juiz Substituto) São princípios constitucionais processuais penais explícitos e implícitos, respectivamente: 43 A) intranscendência das penas e motivação das decisões; e intervenção mínima (ou ultima ratio) e duplo grau de jurisdição. B) contraditório e impulso oficial; e adequação social e favor rei (ou in dubio pro reo). C) dignidade da pessoa humana e juiz natural; e insignificância e identidade física do juiz. D) não culpabilidade (ou presunção de inocência) e duração razoável do processo; e não autoacusação (ou nemo tenetur se detegere) e paridade de armas. Comentário: O princípio da não culpabilidade (art. 5º, LVII, CF) e da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, CF) são previstos expressamente na Constituição Federal, enquanto o princípio da não autoacusação está implícito como decorrência do direito ao silêncio e o princípio da paridade de armas é uma derivação lógica do princípio do contraditório. Quanto a alternativa “A”, destacamos que a intranscendência das penas está expressamente prevista no art. 5º, XLV, da CF, mas trata-se de um princípio penal, e não processual. Quando a alternativa cita o princípio da motivação das decisões, está correta, pois ele pode ser encontrado expresso no art. 93, IX da CF. A intervenção mínima também é um princípio penal, mas a alternativa está certa quando o coloca como implícito na Constituição. Por fim, a alternativa está correta quando elenca o princípio do duplo grau de jurisdição como princípio implícito. Veja que para eliminar a alternativa “A” era preciso saber a diferença entre os princípios penais e processuais penais. A alternativa “B” está correta quando coloca o princípio do contraditório como previsto na Constituição (art. 5º, XLV), entretanto, a eliminamos porque o princípio do impulso oficial não está expresso, como é afirmado. Ademais, a alternativa também está errada porque o princípio da adequação social é um princípio de direito material (direito penal). Por fim, vale ressaltar que o princípio do favor rei está previsto apenas no art. 386, VII, CPP, ou seja, em sede infraconstitucional. Quanto à alternativa “C”, a dignidade da pessoa humana e o juiz natural não são princípios expressos na Constituição Federal e, ademais, o princípio da insignificância é um princípio 44 de direito penal, e não de processo penal. Por fim, ressaltamos que o princípio da identidade física do juiz está previsto apenas no CPP, em seu art. 399, §2º. Questão 7 (VUNESP - 2018 - MPE-SP - Analista Jurídico do Ministério Público) Em relação aos princípios que regem o processo penal, afirma-se corretamente: A) a Constituição Federal garante expressamente os princípios da independência e da imparcialidade do juiz. B) o recurso extraordinário e o recurso especial têm por função assegurar o duplo grau de jurisdição. C) o direito ao julgamento em prazo razoável está previsto na Constituição Federal e pode ter como termo inicial ato realizado na fase de inquérito policial. D) sobre o princípio da motivação das decisões judiciais, há previsão no CPP quanto à denominada motivação per relationem. E) o art. 20, do CPP, que garante o sigilo das investigações no inquérito policial, não foi recepcionado pela Constituição Federal, que previu expressamente o princípio da publicidade. Comentário: O art. 5º, LXXVIII, da CF garante a razoável duração do processo no âmbito judicial e administrativo. A alternativa “A” está errada porque os princípios da independência e da imparcialidade do juiz não são previstos expressamente na CF, mas apenas na legislação infraconstitucional. A alternativa “B” está errada porque o duplo grau de jurisdição exige um amplo reexame dos fatos e do direito no caso concreto pelo tribunal. Entretanto, não cabe aos Tribunais Superiores rever direitos subjetivos, analisando provas e mérito do processo, em sede de recurso especial ou extraordinário. A alternativa “D” trata da motivação per relationem das decisões judiciais, que não existe expressamente em lei, é admitida apenas pela doutrina e pela jurisprudência. Por fim, a alternativa “E” está errada 45 porque o inquérito policial continua sendo sigiloso e o art. 20 do CPP foi recepcionado pela Constituição de 1988. Questão 8 (CESPE - 2018 - TJ-CE - Juiz Substituto) Acerca dos princípios penais constitucionais e dos direitos fundamentais do cidadão à luz da CF, julgue os itens a seguir. I São princípios processuais penais expressos na CF a presunção de não culpabilidade, o devido processo legal e o direito do suspeito ou indiciado ao silêncio. II O direito processual penal compreende o conjunto de normas jurídicas destinadas a regular o modo, os meiose os órgãos do Estado encarregados do exercício do jus puniendi. III A CF determina que o Brasil se submeta à jurisdição do Tribunal Penal Internacional, porém veda absolutamente a entrega de brasileiro naturalizado a jurisdição estrangeira. IV De acordo com o princípio da irretroatividade da lei processual penal, a regra nova não pode retroagir, mesmo quando eventualmente beneficiar o réu. Estão certos apenas os itens A) I e II. B) I e IV. C) II e III. D) I, III e IV. E) II, III e IV. Comentário: As assertivas I e II estão corretas. A assertiva III está errada porque a Constituição permite a entrega de brasileiro naturalizado à jurisdição estrangeira quando praticou crime comum antes da naturalização e quando for comprovado o seu envolvimento do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins. A assertiva IV está errada porque, em regra, a lei processual penal não retroage, mesmo para beneficiar o réu; mas existe a ressalva da lei mista, ou 46 seja, quando a lei possuir conteúdo processual e material, ela deve retroagir para beneficiar o réu. Questão 9 (FAPEMS - 2017 - PC-MS - Delegado de Polícia) No que tange aos princípios processuais penais constitucionais, assinale a alternativa correta. A) O princípio da ampla defesa se desdobra na defesa técnica e na autodefesa. A primeira indisponível, ainda que acusado seja ausente ou foragido; e a segunda quando realizada de forma negativa implica no silêncio do acusado ou omissão, sendo irrenunciável, pois do contrário poderia acarretar prejuízo ao réu. B) Nos casos de prisão em flagrante, é obrigatória a comunicação de advogado indicado pelo preso e a presença desse profissional no interrogatório do indiciado, em observância ao princípio do contraditório e sob pena de nulidade absoluta de eventual processo judicial. C) O princípio da presunção de inocência ou da não culpabilidade está previsto na Constituição Federal e impõe o dever de tratamento do réu como inocente apenas na dimensão interna do processo, ou seja, atribui ao acusador demonstrar a culpabilidade do acusado e não este sua inocência. D) O princípio do juiz natural não é violado com a previsão de órgão colegiado em primeiro grau de jurisdição para o processo e julgamento dos crimes praticados por organizações criminosas, nem com a convocação de juízes de primeiro grau para compor órgão julgador do respectivo Tribunal, na apreciação de recursos em segundo grau de jurisdição. E) O princípio da motivação das decisões judiciais é corolário do sistema acusatório e deve ser observado em todas as fases processuais, por isso é firme o entendimento dos Tribunais que rechaça a motivação per relationem na decretação da prisão preventiva. Comentário: Primeiramente, a lei 12.694/2012 instituiu o processo e o julgamento colegiado em primeiro grau para crimes praticados por organizações criminosas. Ademais, segundo o 47 entendimento jurisprudencial dominante, não viola o princípio do juiz natural o julgamento por órgão colegiado formado por maioria de juízes convocados. A alternativa “A” está errada porque a autodefesa não é irrenunciável. A alternativa “B” está errada porque a nulidade de ato no inquérito policial não acarreta nulidade do eventual processo judicial respectivo. A alternativa “C” está errada porque o princípio da não culpabilidade também tem uma dimensão externa ao processo. Por fim, a alternativa “E” está errada porque os tribunais aceitam a motivação per relationem, inclusive na decretação de prisão preventiva. Questão 10 (FCC - 2017 - DPE-PR - Defensor Público) Os princípios constitucionais aplicáveis ao processo penal incluem A) indisponibilidade. B) verdade real. C) razoável duração do processo. D) identidade física do juiz. E) favor rei. Comentário: Veja que mais uma vez é necessário que o candidato saiba quais são os princípios previstos na CF. Todos os princípios em questão são relativos ao processo penal, mas apenas o princípio da duração razoável do processo é previsto expressamente no art. 5º, LXXVIII da CF/88. 48 GABARITO Questão 1 - B Questão 2 - A Questão 3 - Certo Questão 4 - C Questão 5 - B Questão 6 - D Questão 7 - C Questão 8 - A Questão 9 - D Questão 10 - C 49 QUESTÃO DESAFIO Indique quais são os sistemas processuais penais Responda em até 5 linhas 50 GABARITO QUESTÃO DESAFIO A depender dos princípios que venham a informá-lo, o processo penal, na sua estrutura, pode ser inquisitivo, acusatório e misto ou acusatório formal. Você deve ter abordado necessariamente os seguintes itens em sua resposta: Inquisitivo Conforme os professores Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar (2017) “No sistema inquisitivo (ou inquisitório), permeado que é pelo princípio inquisitivo, o que se vê é a mitigação dos direitos e garantias individuais, em favor de um pretenso interesse coletivo de ver o acusado punido. É justificada a pretensão punitiva estatal com lastro na necessidade de não serem outorgadas excessivas garantias fundamentais.” Acrescentam que “O princípio inquisitivo é caracterizado pela inexistência de contraditório e de ampla defesa, com concentração das funções de acusar, defender e julgar em uma figura única (juiz). O procedimento é escrito e sigiloso, com o início da persecução, produção da prova e prolação de decisão pelo magistrado. ” Mencionam também que as características desse sistema podem ser encontrados no CPP, eis que no art. 156, inciso I, confere-se ao magistrado a possibilidade de ordenar, de ofício, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida. Acusatório. Os professores Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar (2017) expõe que “o sistema acusatório é o adotado no Brasil, de acordo com o modelo plasmado na Constituição Federal de 1988. Com efeito, ao estabelecer como função privativa do Ministério Público a promoção da ação penal (art. 129, I, CF/88), a Carta Magna deixou nítida a preferência por esse modelo que tem como características fundamentais a separação entre as funções de acusar, defender e julgar, conferidas a personagens distintos. Os princípios do contraditório, da ampla defesa e da publicidade regem todo o processo; o órgão julgador é dotado de imparcialidade; o sistema de apreciação das provas é o do livre convencimento motivado” 51 Misto ou acusatório formal. Ainda conforme os ensinamentos de Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar (2017) “O sistema misto tem raízes na Revolução Francesa, conjunto de movimentos político-sociais cujos ideais se disseminaram pela Europa continental, e possui, como marco legal, o Code d’Instruction criminelle francês de 1808. Caracteriza-se por uma instrução preliminar, secreta e escrita, a cargo do juiz, com poderes inquisitivos, no intuito da colheita de provas, e por uma fase contraditória (judicial) em que se dá o julgamento, admitindo- se o exercício da ampla defesa e de todos os direitos dela decorrentes.” 52 LEGISLAÇÃO COMPILADA Princípios Fundamentais do Processo Penal Súmula 351, STF É nula a citação por edital de réu preso na mesma unidade da federação em que o juiz exerce a sua jurisdição. Súmula 523, STF No processo penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prejuízo para o réu. Súmula 707, STF Constitui nulidade a falta de intimação do denunciado para oferecer contrarrazões ao recurso interposto da rejeição da denúncia, não a suprimindo a nomeação de defensor dativo. Súmula 708, STF É nulo o julgamento da apelação se, após a manifestação nos autos da renúncia do único defensor, o réu não foi previamente intimado para constituir outro. Súmula 522, STJ A conduta de atribuir-se