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Compras e Negociação Rodrigo Médici Cândido 20 4. NEGOCIAÇÃO Todas as pessoas, sejam elas físicas ou jurídicas, negociam em algum momento de sua existência. Algumas dessas pessoas negociam mais vezes, o que as torna mais experientes, práticas, estrategistas. Outras, negociam menos, o que não significa que tenham menos sucesso na negociação ou que não consigam obter o traquejo necessário para a realização de uma boa negociação. O fato é que o conhecimento de princípios e estratégias de negociação permite aos indivíduos uma assertiva orientação para que consigam fechar um bom acordo. 4.1 Princípios da negociação Zenaro (2014) descreve a negociação como um conjunto de estratégias e táticas utilizadas com o propósito de atingir um acordo agradável sobre diferentes ideias e necessidades, buscando um equilíbrio dos interesses entre as partes envolvidas, de modo que ambas obtenham satisfação. O autor descreve que, diante de tantos casos onde a ética é deixada de lado, negociar com ética é o caminho para os melhores resultados ao longo do tempo. Lewicki, Saunders e Barry (2014) destacam que as debatedores sobre a ética nos negócios muitas vezes confundem o que é ético com o que é prudente, prático e permitido. Agir com ética significa atuar apropriadamente conforme algum padrão de conduta moral; ser prudente envolve a sensatez, com base na tentativa de entender a eficácia da tática e as consequências que pode trazer ao relacionamento com o outro; ser prático é aquilo que o negociador pode desencadear em dada situação e a permissão tem relação com o que a lei define como prática aceitável. A negociação faz parte do cotidiano e está por toda parte. Mesmo que alguns indivíduos pareçam negociadores natos, ela é fundamentalmente uma competência analítica e comunicacional que pode ser adquirida por qualquer pessoa. Indissociáveis à negociação são as habilidades técnicas, que envolve o conhecimento de processos e táticas para a negociação, e as habilidades interpessoais, que representam o conjunto de capacidades que uma pessoa tem para se relacionar com outras pessoas. Os negociadores devem possuir elevado conhecimento acerca de estratégias de negociação, aprendendo a utilizar cada uma delas nas situações em que se aplicam. Para isso, leva-se em conta dois aspectos básicos: a importância do relacionamento e a 21 importância dos resultados. Ao cruzar-se esses aspectos, obtém, basicamente, três tipos de resultados: Tipos de resultados Descrição Ganha-ganha Estratégia colaborativa, na qual ambas as partes envolvidas na negociação obtêm aquilo que desejam de forma satisfatória, apesar de os objetivos serem diferentes. O resultado é que as partes tenderão a realizar novas negociações no futuro e estabelecer relações estratégicas. Ganha-perde Estratégia competitiva, resultado no qual apenas um componente sai vencedor e o outro não obtém aquilo que deseja, o que gera frustração e, eventualmente, o abandono ou o encerramento de uma parceria. Quando uma parte percebe que sai da negociação em desvantagem e chega a resultados indesejados, essa parte tende a não desejar realizar novos negócios. Perde-perde Não há acordo entre as partes envolvidas na negociação, ambas saem frustradas do processo e dificilmente tenderão a se relacionar no futuro. Os bons negociadores, independente do setor de atuação e do item negociado, destacam- se por possuírem características em comum, como gostar do que faz, o seu entusiasmo, o bom humor, a facilidade de estabelecer relacionamentos, a proatividade, a preocupação em manter-se atualizado e informado sobre os mais diversos assuntos, em especial aqueles relacionados ao seu setor de atuação e ao produto ou serviço que comercializa, a criatividade e a lógica na argumentação, o gosto por desafios e a preparação e planejamento prévio. Lewicki, Saunders e Barry (2014) destacam que o planejamento é o ponto central da negociação e que acaba por definir os seus resultados. O processo de dar e receber, apesar de ser importante, fica em segundo plano. Um outro fator que merece atenção, segundo Zenaro (2014), é a comunicação. O sucesso de uma negociação está diretamente relacionado com a capacidade de os negociadores transmitirem e receberem ideias, imagens e impressões de toda ordem. A comunicação não se resume ao que se fala e ao que se ouve, é preciso captar o significado e não apenas as palavras. Muitos são os negociadores que falam antes de pensar, impõem observações, não 22 dão oportunidade aos outros de falar, não estabelecem contato visual, apresentam desequilíbrio emocional, utilizam palavras inadequadas ou vícios de linguagem e desconhecem do assunto tratado. Essas questões impõem uma barreira à comunicação, sendo que, nesse processo, deve-se escutar atentamente o outro, demonstrar respeito e aceitação, estabelecer empatia com o interlocutor e fazer comentários descritivos e nãoavaliativos. As barreiras levam à perda de clientes e impossibilidade de negociações futuras. Para Zenaro (2014), três são as variáveis, além da comunicação, que condicionam o processo de negociação, independente do que se esteja negociando: poder, tempo e informação. O poder deve ser entendido como um meio para se atingir algum fim, que permite mudar a realidade e alcançar os objetivos propostos. O poder pode ser pessoal, da moralidade, da atitude, da persistência, da capacidade persuasiva, do especialista, da posição, da legitimidade, dos riscos, do compromisso, de identificação, de recompensa e de punição. O tempo é uma variável essencial no processo de negociação e o limite de tempo é definido por quem negocia. A informação é outra variável importante para a obtenção de detalhes de quem será envolvido no processo, já que a negociação se desenrolará mais rápido, evitará falsas expectativas, se encaminhá para o ganha-ganha e permitirá o conhecimento até pessoal das partes, garantindo um relacionamento duradouro. 4.2 Negociação Estratégica A negociação, segundo Ferreira (2013), pode ser primal ou cognitiva. Toda negociação primal, estimulada pela sua natureza competitiva, leva a uma solução do tipo soma-zero, onde nada é agregado e o ganho de uma parte geralmente ocorre em detrimento da outra. Por intermédio da negociação cognitiva, no entanto, é possível se beneficiar do impulso inato para formação de vínculos, que atua em favor do estabelecimento de cooperação entre as partes. O negociador cognitivo terá autocontrole para focalizar as suas energias no atendimento dos seus interesses e da outra parte, somar valor ao que está sendo discutido e elaborar opções criativas de ganhos mútuos. Uma negociação, nas palavras de Zenaro (2014), é como um jogo no qual estratégias e táticas são combinadas rumo ao fechamento de um acordo. A grande questão, então, é: como fechar o acordo? A negociação estratégica envolve saber efetuar a pergunta correta, para a pessoa correta, no momento correto, com um pensamento positivo de que o negócio será fechado. Esse aspecto envolve a motivação. 23 A negociação estratégica ainda envolve o saber fazer (know-how) e o conhecimento daquilo que se negocia, seja utilizando a persuasão para demonstrar uma característica diferenciadora de um produto, seja mencionando clientes e compradores relevantes ou seja reforçando os casos de sucesso. De modo geral, para que a negociação seja bem conduzida, segundo Martinelli (2015), o negociador deve possuir algumas habilidades essenciais, a saber: concentrar-se nas ideias, discutir proposições, saber falar e ouvir, colocar-se no lugar da outra parte, separar relacionamentos dos interesses, proporcionar alternativas, interpretar o comportamento humano e ser objetivo. Esses fatores, quando identificados nos negociadores, garantem uma negociação eficaz.4.2 ESTRATÉGIAS E PLANEJAMENTO O planejamento é condição essencial para o bom desempenho em uma negociação. Conforme aponta Zenaro (2014), “o planejamento deve envolver o maior número de questionamentos possíveis, que vão desde questões pessoais sobre o outro negociador até o conhecimento sobre o negócio e o objeto de negociação em si”. Segundo Pessoa (2009), assim como um conhecimento superficial pode ser perigoso, “uma preparação que tem um foco muito estreito ou somente uma maneira para alcançar o acordo pode também ser arriscada”. Isso significa que um indivíduo deve se preparar para negociar com a reunião de informações acerca de suas expectativas, metas, interesses e alternativas, mas sem deixar de considerar a os interesses da outra parte envolvida na negociação. Sequencialmente, deve-se proceder com uma autoavaliação e com a obtenção de conhecimento sobre o contexto. Lewicki, Saunders e Barry (2014) concordam com o apontamento apresentado, de forma que a preparação é uma das boas práticas na negociação. Além disso, cabe os negociadores o dever de conhecer a estrutura básica de uma negociação, no sentido de entender se estão diante de uma negociação essencialmente distributiva, integrativa ou uma combinação das duas, adotando as estratégias e táticas mais adequadas. Aos negociadores, também cabe a tarefa de identificar e trabalhar a melhor alternativa para um acordo negociado, o chamado BATNA (best alternative to a negotiated agreement), o que fará com que acordos sejam mais facilmente obtidos. Abandonar a negociação é uma opção aos negociadores, já que a maioria das negociações tem por objetivo alcançar um resultado concreto, não simplesmente fechar um mero 24 acordo. Quando as opções de acordo não são satisfatórias, seguir com elas pode implicar em prejuízos. Mesmo assim, na prática, essa situação muitas vezes acontece, já que os negociadores muitas vezes se concentram tanto no fechamento de um acordo, que perdem de vista sua verdadeira meta, que é atingir um bom resultado. Eventualmente, pode acontecer, um endurecimento da negociação, que pode estar ligado a diversos fatores. Dentre esses fatores, por exemplo, cita-se a presença da chefia de algum dos envolvidos durante a negociação. Isso pode fazer com que esse negociador queira transmitir uma imagem de pessoa forte e impressionar o chefe. Logo, o chefe é considerado um fator intangível. Outra situação comum que envolve o fator intangível no processo de negociação é a bonificação, que pode explicar o comportamento mais agitado de um vendedor, por exemplo, que será beneficiado caso a negociação seja concretizada. Quanto mais nova uma empresa é no mercado, maior a desconfiança. De maneira oposta, quanto mais tempo no mercado, mais experiente e capaz é uma empresa. Esse aspecto ajuda a explicar a reputação. Começar uma negociação com uma boa reputação é essencial e os negociadores devem se manter atentos para protegê-la. Porém, muito cuidado deve ser direcionado a esse fato, já que a reputação é altamente sensível e qualquer deslize pode destruir a reputação de uma empresa. As pessoas envolvidas na negociação tendem a ver o mundo de uma perspectiva própria e definem o que é racional ou justo da maneira mais vantajosa para elas. A racionalidade e a justiça são, portanto, relativas. A conscientização dessa relativização tende a facilitar o processo de acordo ganha-ganha. Um bom negociador é um negociador que aprende a cada processo, constantemente, que estão cientes da existência de diferentes variáveis e características que fazem com que uma negociação nunca seja igual a outra. Rever uma negociação recém-concluída e o aprendizado obtido eleva o patamar do profissional. CONCLUSÃO Negociamos desde quando nascemos. O nosso cotidiano é uma negociação e os resultados alcançados em nossas metas não devem ser creditados ao curso natural de nossas vidas. Entender a negociação como um processo de comunicação entre pessoas é fundamental para o sucesso de um acordo, seja ele pessoal ou profissional. A assertividade e adequação da estratégia adotada dependem, em grande parte, do conhecimento dos princípios da negociação, prerrogativa exclusiva dos seres humanos. 25 Muitos são os livros, artigos, blogs e seminários acerca da temática negociação. Esses artefatos são importantes e ricas fontes de obtenção de conhecimento, uma espécie de guia para a execução das atividades do negociador e para a sua busca de melhoria contínua. Nunca é demais refletir acerca dos caminhos que podem ser seguidos e que possibilitam a harmonização do conjunto de interesses dos indivíduos, quase sempre divergentes. REFERÊNCIAS FERREIRA, Gonzaga. Negociação: como usar a inteligência e a racionalidade. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2013. LEWICKI, Roy J.; SAUNDERS, David M.; BARRY, Bruce. Fundamentos de negociação. 5. ed. Porto Alegre: AMGH, 2014. MARTINELLI, Dante P. Negociação empresarial: enfoque sistêmico e visão estratégica. 2. ed. Barueri, SP: Manole, 2015. PESSOA, Carlos. Negociação aplicada: como utilizar as táticas e estratégias para transformar conflitos interpessoais em relacionamentos cooperativos. São Paulo: Atlas, 2009. ZENARO, Marcelo. Técnicas de negociação: como melhorar seu desempenho pessoal e profissional nos negócios. São Paulo: Atlas, 2014.
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