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GT5 CÂNCER E REGULAÇÃO DO CICLO CELULAR ❖ O câncer é uma doença genética que surge no nível de células somáticas: As alterações genômicas associadas ao câncer vão desde substituições de nucleotídeos únicos até rearranjos, amplificações e deleções cromossômicas em grande escala. Apenas cerca de 1 % dos cânceres está associado a mutações na linhagem germinativa que aumentam a suscetibilidade individual a certos tipos de câncer. Eles resultam do acúmulo de várias mutações - cerca de 6 a 12. ➔ O que é câncer? O câncer é definido como um grande número (até uma centena) de doenças complexas que se comportam diferentemente, conforme o tipo celular do qual se originam. Os cânceres variam quanto à idade de início, à velocidade de crescimento, à capacidade invasiva, ao prognóstico e à capacidade responsiva a o tratamento. Todos os cânceres compartilham duas propriedades fundamentais: 1. a proliferação celular desregulada, caracterizada por crescimento e divisão celulares anormais, 2. as metástases, um processo que permite que as células cancerosas se espalhem e invadam outras partes do corpo. ➔ A origem clonal das células cancerosas: Se originaram de uma célula ancestral comum que acumulou numerosas mutações específicas. Esse é um conceito importante para se entender as causas moleculares do câncer e tem implicações no seu diagnóstico. Numerosos dados sustentam o conceito clonal. ➔ O câncer é um processo de múltiplas etapas que requer múltiplas mutações: Outra indicação de que o câncer é um processo em várias etapas é a demora que ocorre desde a exposição aos carcinógenos (os agentes causadores do câncer) e o aparecimento do câncer. Outro indicativo da natureza multifásica 1 do desenvolvimento do câncer é a observação de que ele frequentemente se desenvolve em etapas progressivas, começando com células ligeiramente aberrantes e progredindo para células cada vez mais tumorgênicas e malignas. Cada etapa da tumorgênese, o desenvolvimento de um tumor maligno, parece resultar de uma ou mais alterações genéticas que progressivamente liberam as células dos controles que normalmente restringem a proliferação e a malignidade. ❖ As células cancerosas contêm defeitos genéticos que afetam a estabilidade genômica, a reparação do DNA e as modificações da cromatina: O alto nível de instabilidade genômica observado em células cancerosas é conhecido como fenótipo mutador. ➔ Instabilidade genômica e reparação deficiente do DNA: A instabilidade genômica das células cancerosas se caracteriza pela presença de defeitos grosseiros como translocações, aneuploidias, perdas cromossômicas, amplificação de DNA e deleções cromossômicas. Em concordância com o conceito do fenótipo mutador no câncer, certos cânceres hereditários são causados por defeitos em genes que controlam a reparação do DNA. A observação de que os defeitos hereditários nos genes que controlam a reparação por excisão de nucleotídeos e a reparação dos erros de pareamento do DNA levam a altas taxas de câncer fornece sustentação à ideia de que o fenótipo mutador é um contribuinte importante para o desenvolvimento do câncer. ➔ Modificações da cromatina e epigenética do câncer: Epigenética é o estudo dos fatores que afetam a expressão gênica de modo herdado, mas sem alterar a sequência nucleotídica do DNA. A metilação do DNA e as modificações das histonas, como a acetilação e a fosforilação, são exemplos de modificações epigenéticas. O total de mutações no DNA é muito menor nas células 2 cancerosas do que nas normais. Ao mesmo tempo, nas células cancerosas os promotores de certos genes ficam hiper metilados. Supostamente essas mudanças resultam em liberação geral da repressão da transcrição dos genes que estariam silenciados nas células normais - inclusive dos proto-oncogenes causadores de câncer (apresentados na Seção 20.4), mas, ao mesmo tempo, em repressão da transcrição de genes que normalmente regulam funções como a reparação eficiente do DNA, o controle do ciclo celular e a diferenciação celular. As modificações nas histonas também estão alteradas com células cancerosas. Nessas células, frequentemente os genes que codificam as acetilases, desacetilases, metiltransferases e desmetilases de histonas estão mutados ou se expressam de modo aberrante. ❖ As células cancerosas contêm defeitos genéticos que afetam a regulação do ciclo celular: A regulação da proliferação celular normal envolve grande número de produtos gênicos que controlam etapas do ciclo celular, a morte celular programada e a resposta celular aos sinais externos para crescimento. Nas células cancerosas, muitos dos genes que controlam essas funções estão mutados ou se expressam de modo aberrante, o que leva à proliferação celular descontrolada. ➔ O ciclo celular e a transdução de sinal: A interfase do ciclo celular é o intervalo entre as divisões mitóticas. Durante esse tempo, a célula cresce e replica seu DNA. Durante G1 , a célula se prepara para a síntese de DNA, acumulando as enzimas e moléculas necessárias à replicação do DNA. A G1 é seguida pela fase S, durante a qual é replicado o DNA dos cromossomos da célula. Durante G2, a célula continua a crescer e a se preparar para a divisão. Durante a fase M, os cromossomos duplicados se condensam, os cromossomos irmãos se separam para pólos opostos, e a célula se divide em duas. As células cancerosas, em contraste, são incapazes de entrar em GO e, em vez disso, repetem o eido continuamente. 3 O processo da transmissão dos sinais de crescimento desde o ambiente externo para o núcleo celular é chamado transdução de sinal. As células cancerosas frequentemente têm defeitos nas vias de transdução de sinais. Às vezes, moléculas transmissoras de sinais defeituosos mandam para o núcleo sinais contínuos de crescimento, mesmo na ausência de sinais externos para crescimento. ➔ O controle e os pontos de controle do ciclo celular: Além de regular o ciclo celular nos pontos de controle, a célula controla a progressão no ciclo celular por meio de duas classes de proteínas: as ciclinas e as quinases dependente de ciclina (CDKs, de cyclin-dependent kinases). A mutação ou a expressão atípica de qualquer um dos genes controladores do ciclo celular pode contribuir para o desenvolvimento de câncer. ➔ O controle da apoptose: As etapas da apoptose são as mesmas para células lesadas e para as que são eliminadas durante o desenvolvimento: o DNA nuclear se torna fragmentário, as estruturas intracelulares se deterioram, e a célula se dissolve em pequenas estruturas esféricas conhecidas como corpos apoptóticos. Na etapa final, os corpos apoptóticos são engolfados pelas células fagocitárias do sistema imune. Uma série de proteases chamadas caspases é responsável pela iniciação da apoptose e pela digestão dos componentes intracelulares. A apoptose é geneticamente controlada no sentido de a regulação dos níveis de produtos gênicos específicos, como as proteínas Bcl2 e BAX poder desencadeá-la ou impedi-la. ❖ Muitos genes causadores de câncer perturbam o controle do ciclo celular: Em células cancerosas, há duas categorias gerais de genes causadores de câncer que estão mutadas, ou têm expressão atípica - a dos proto-oncogenes e a dos genes supressores de tumor. Os proto-oncogenes codificam fatores de transcrição que estimulam a expressão de outros genes, de moléculas de transdução de sinais que estimulam a divisão celular e de reguladores do ciclo celular que movimentam a célula no ciclo. Os seus 4 produtos são importantes para as funções celulares normais, especialmente crescimento e divisão. Quando as células normais ficam quiescentes e param de se dividir, elas reprimem a expressão e a atividade da maioria dos produtos dos proto- oncogenes. Nas células cancerosas, um ou mais proto oncogenes estão tão alterados que a sua atividade não pode ser controlada do modo normal. Quando um proto-oncogene está mutado, ou se expressa de modo aberrante, e contribui para odesenvolvimento de câncer, ele se torna conhecido como oncogene - um gene causador de câncer. Os oncogenes são proto oncogenes que sofreram uma alteração de ganho de função. Em consequência, basta que um alelo do proto-oncogene mute, ou se expresse atipicamente para desencadear um crescimento descontrolado. Portanto, oncogenes produzem um fenótipo dominante de câncer. Genes supressores de tumor são aqueles cujos produtos normalmente regulam os pontos de controle do ciclo celular e dão início ao processo de apoptose. Nas células normais, as proteínas codificadas por esses genes interrompem a progressão do ciclo celular em resposta a um dano no DNA ou a sinais de supressão de crescimento vindos do ambiente extracelular. Quando esses genes supressores de tumor mutam, ou são inativados, as células são incapazes de responder normalmente nos pontos de controle do ciclo celular ou de derivar para a morte celular programada se a lesão do DNA for extensa. ➔ Os proto- oncogenes ras: Alguns dos genes mais frequentemente mutados em tumores humanos são os da família gênica ras. Eles estão mutados em mais de 50% dos tumores humanos. A família gênica ras codifica moléculas de transdução de sinais que estão associadas à membrana celular e regulam o crescimento e a divisão celulares. As proteínas Ras normalmente transmitem sinais da membrana celular para o núcleo, estimulando a célula a se dividir em resposta a fatores externos de crescimento. As mutações que convertem o proto-oncogene ras em oncogene impedem a proteína Ras de hidrolisar GTP em GDP e assim congelam-na em sua conformação "ligada': estimulando a célula a se dividir constantemente. 5 ➔ Os proto-oncogenes cyclin 01 e cyclin E: possível que a superexpressão desses reguladores - chave do ciclo celular, ou a supressão de sua degradação periódica, mantenha as células sempre prontas para uma ciclicidade celular continua, impedindo-as de sair do ciclo celular, de entrar na fase quiescente GO ou de sofrer diferenciação. ➔ O gene supressor de tumor p53: Em cânceres humanos, o gene mais frequentemente mutado é o p53 - mutado em mais de 50% de todos os cânceres. Ele codifica uma proteína nuclear que age como fator de transcrição, reprimindo ou estimulando a transcrição de mais de 50 genes diferentes. Normalmente a proteína p53 é sintetizada de forma contínua, mas degradada rapidamente e, por isso, está presente em baixos níveis nas células. Além disso, a proteína p53 normalmente está ligada a outra proteína, chamada Mdm 2, que tem vários efeitos sobre a p53. Quando Mdm2 se junta à p53, marca-a para ser degradada e sequestra o seu 6 domínio de ativação de transcrição. Ela também impede as fosforilações e acetilações que convertem a proteína na p53 da forma inativa para a ativa. Vários tipos de eventos provocam aumentos rápidos nos níveis nucleares de proteína p53 ativada. Eles consistem em danos químicos ao DNA, quebras de fitas duplas de DNA induzidas por radiações ionizantes e presença de intermediários da reparação de DNA gerados por exposição das células à luz ultravioleta. Em resposta a esses sinais, a Mdm2 se dissocia da p53 , tornando essa mais estável e descerrando seu domínio de ativação da transcrição. A proteína p53 inicia duas respostas diferentes ao dano no DNA: ou a parada do ciclo celular, seguida pela reparação do DNA, ou a apoptose e a morte celular, se o DNA não puder ser reparado. Portanto, células que não possuem p53 funcional são incapazes de deter o ciclo celular nos pontos de controle, ou de entrar em apoptose, em resposta a danos no DNA. Consequentemente, elas prosseguem sem controle através do ciclo celular, independentemente das condições de seu DNA. As células que não têm p53 possuem taxas de mutação elevadas e acumulam tipos de mutações que levam ao câncer. Pela importância do gene p53 para a integridade do genoma, ele frequentemente é mencionado como "guardião do genoma". ➔ O gene supressor de tumor RB1: A perda ou a mutação do gene supressor de tumor RBl ( retinoblastoma 1) contribui para o desenvolvimento de muitos cânceres, inclusive de mama, ósseo, de pulmão e de bexiga. A proteína do retinoblastoma ( pRB) é uma proteína supressora de tumor que controla o ponto de controle Gl /S do ciclo celular. Quando as células estão na fase GO, a proteína pRB não está fosforilada e se liga a fatores de transcrição, tais como o E2F, inativando- os. ❖ As células cancerosas formam metástases, invadindo outros tecidos: Para sair do sítio do tumor primário e invadir outros tecidos, as células tumorais têm de se desligar de outras células e digerir os componentes da matriz extracelular e da lâmina 7 basal, que normalmente rodeiam e separam os tecidos do corpo. A matriz extracelular e a lâmina basal são compostas de proteínas e carboidratos. Elas formam o arcabouço para o crescimento tissular e inibem a migração das células. Nos tumores de alta malignidade, enzimas proteolíticas como as metaloproteínases estão presentes em níveis supranormais e não são suscetíveis aos controles normais conferidos pelas moléculas reguladoras como os inibidores tissulares das metaloproteinases (TIMPs, de tissue inhibitors of metalloproteinases). Assim como os genes supressores de tumores dos cânceres primários, os genes supressores de metástases controlam o crescimento dos tumores secundários. ❖ A predisposição a alguns tipos de câncer pode ser hereditária: A maioria dos genes de suscetibilidade hereditária ao câncer, apesar de ser transmitida de modo mendeliano dominante, não é auto suficiente para desencadear o desenvolvimento de um câncer. Para conduzir a célula à tumorgênese, é preciso, no mínimo, que ocorra mais uma mutação somática, na outra cópia do gene. Além disso, para haver uma expressão completa do fenótipo de câncer, geralmente ainda são necessárias mutações em outros genes. O fenômeno por meio do qual o segundo alelo do tipo selvagem é mutado é conhecido como perda de heterozigosidade. Apesar de a perda de heterozigosidade ser um primeiro passo, essencial para a expressão desses cânceres hereditários, mais mutações, em outros proto- oncogenes o u em genes supressores de tumor, são necessários para que as células tumorais se tornem completamente malignas. 8
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