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Kícila Sabrina T3 - 2022 1º Compreender o metabolismo dos Lípideos Lipídeos são moléculas apolares e por isso não se dissolvem em água. Existem vários tipos de lipídeos. Alguns tipos: • Fosfolipídeos (compositores de membrana) • Glicerídeos (ácido graxo + glicerol) • Cerídeos (ceras) • Esteroides (colesterol) Para que essas moléculas consigam ser transportadas pelo sangue e outros líquidos corporais, precisam estar acopladas a proteínas, formando assim, lipoproteínas (que são mais hidrossolúveis). O nome dessas proteínas que se ligam a essas moléculas de lipídeos, se chama apoproteínas. • Apolipoproteínas/apoprotreínas As apolipoproteínas representam a fração proteica das lipoproteínas. Elas se encontram em constante processo de síntese e degradação e são peças fundamentais na regulação do metabolismo lipídico. Exercem funções específicas na regulação do metabolismo lipídico como cofatores enzimáticos, ligantes para os receptores nas células e tecidos pelo organismo, ou através da manutenção estrutural das partículas de lipoproteínas. As apolipoproteínas são divididas em classes (A, B, C, D e E) quanto à composição, o que consequentemente determina função distinta para cada uma das lipoproteínas. àExistem alguns tipos de lipoproteínas. Elas são classificadas de acordo com a taxa de lipídeos e proteínas. Vamos falar sobre elas: • Quilomícrons Transportam os lipídeos da dieta para serem armazenados no tecido adiposo Composição: - 1 a 2% de proteínas - 85% de triglicerídeos - 7% de fosfolipídio - 6 a 7% de colesterol Os quilomícrons entram nos vasos linfáticos a partir das vilosidades intestinais e são carregados pela linfa até o sangue venoso e, então, para a circulação sistêmica. Sua presença fornece ao sangue uma aparência leitosa, mas eles permanecem no sangue apenas por alguns minutos. Conforme os quilomícrons circulam pelos capilares do tecido adiposo, uma de suas apoproteínas, a apo C2, ativa a lipase endotelial de lipoproteínas, uma enzima que remove os ácidos graxos dos triglicerídios dos quilomícrons. Os ácidos graxos livres são captados pelos adipócitos para a síntese e o armazenamento como triglicerídios e pelas células musculares para a produção de ATP. Os hepatócitos removem os remanescentes dos quilomícrons do sangue por endocitose mediada por receptor, nesse processo outra apoproteína do quilomícron, a apo E, é a proteína de atracação. • Lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL) São formadas pelos hepatócitos, contêm principalmente lipídios endógenos (produzidos no corpo). Composição: - 10% de proteínas - 50% de triglicerídeos - 20% de fosfolipídios - 20% de colesterol As VLDLs transportam os triglicerídios sintetizados nos hepatócitos para serem armazenados pelos adipócitos. Assim como os quilomícrons, elas perdem seus triglicerídios conforme sua apo C-2 ativa a lipase endotelial de lipoproteínas e os ácidos graxos resultantes são captados pelos adipócitos para serem armazenados ou pelas células musculares para a produção de ATP. Conforme elas depositam uma parte de seu conteúdo de triglicerídios nos adipócitos, as VLDLs são convertidas em LDL. • Lipoproteínas de baixa densidade (LDL) Composição - 25% de proteínas - 5% de triglicerídios - 20% de fosfolipídios - 50% de colesterol Elas carregam cerca de 75% do colesterol total no sangue e o entregam às células em todo o corpo para que seja utilizado no reparo das membranas celulares e na síntese de hormônios esteroides e de sais biliares. As LDLs contém uma única apoproteína, a apo B100, que é a proteína de atracação que se liga aos receptores de LDL nas membranas DISPLIDEMIA Problema 03 - AES 14 Kícila Sabrina T3 - 2022 plasmáticas das células do corpo de modo que a LDL possa entrar na célula por endocitose mediada por receptor. Dentro da célula, a LDL é clivada e o colesterol é liberado para atender às necessidades da célula. Uma vez que a célula tenha colesterol suficiente para as suas atividades, um sistema de retroalimentação negativa inibe a síntese de novos receptores de LDL pela célula. Quando presente em quantidades excessivas, a LDL também deposita colesterol dentro e ao redor das fibras musculares lisas das artérias, formando placas gordurosas que aumentam o risco de doença da artéria coronária Por esse motivo, o colesterol contido na LDL, chamado de colesterol LDL, é conhecido como o “mau”colesterol. Como algumas pessoas possuem poucos receptores de LDL, suas células removem a LDL do sangue com menos eficiência e, como resultado, seus níveis plasmáticos de LDL são anormalmente altos e elas estão mais propensas a desenvolverem placas gordurosas. A ingestão de uma dieta com grande quantidade de gordura aumenta a produção de VLDL, que aumenta o nível de LDL e aumenta a formação das placas gordurosas. • Lipoproteínas de alta densidade (HDL) Composição - 40 a 45% de proteínas - 5 a 10% de triglicerídios - 30% de fosfolipídios - 20% de colesterol Elas removem o excesso de colesterol das células do corpo e do sangue e transportam o colesterol para o fígado para que seja eliminado. Como a HDL evita o acúmulo de colesterol no sangue, um alto nível de HDL está associado a menor risco de doença da artéria coronária. Por esse motivo, o colesterol HDL é conhecido como o “bom” colesterol. àDe onde vêm os lipídeos? Existem duas fontes de colesterol para o corpo. Uma parte está presente nos alimentos (ovos, produtos lácteos, carnes de vaca, frango e porco, vísceras e embutidos), porém a maior parte dele é sintetizado pelos hepatócitos. • Uma alta ingestão de gorduras dietéticas estimula a reabsorção da bile contendo colesterol de volta para o sangue, de modo que menos colesterol é perdido nas fezes. • Quando as gorduras saturadas são quebradas no corpo, os hepatócitos utilizam alguns desses produtos para a formação de colesterol. àPara onde vão esses lipídeos? Assim como os carboidratos, os lipídios podem ser oxidados para a produção de ATP. Se o corpo não tem necessidade imediata do uso de lipídios, eles são armazenados no tecido adiposo (depósitos de gordura) espalhado pelo corpo e no fígado. àComo esses lipídeos são armazenados? Uma função importante do tecido adiposo é a remoção de triglicerídios dos quilomícrons e do VLDL e seu armazenamento até que eles sejam necessários para a produção de ATP em outras partes do corpo. Os triglicerídios armazenados no tecido adiposo constituem 98% de todas as reservas energéticas do corpo. Eles são armazenados mais facilmente do que o glicogênio, em parte porque os triglicerídios são hidrofóbicos e não exercem pressão osmótica nas membranas plasmáticas. àComo os lipídeos são utilizados para fornecer ATP/energia? Para que músculos, fígado e tecido adiposo possam oxidar os ácidos graxos derivados dos triglicerídios para a produção de ATP, eles devem primeiro ser separados em glicerol e ácidos graxos, um processo chamado de lipólise. A lipólise é catalisada por enzimas chamadas de lipases. A epinefrina e a norepinefrina aumentam a decomposição dos triglicerídios em ácidos graxos e glicerol. Esses hormônios são liberados quando aumenta o tônus simpático como ocorre, por exemplo, durante o exercício. Outros hormônios lipolíticos incluem cortisol, hormônios tireoidianos e fatores de crescimento insulina-símiles. Ao contrário, a insulina inibe a lipólise. O glicerol e os ácidos graxos resultantes da lipólise são catabolizados por vias diferentes. O glicerol é convertido por muitas células do corpo a gliceraldeído 3-fosfato, um dos compostos formados durante o catabolismo da glicose. Se o conteúdo de ATP na célula for alto, o gliceraldeído 3- fosfato é convertido em glicose, um exemplo de gliconeogênese. Se o conteúdo de ATP na célula for baixo, o gliceraldeído 3- fosfato entra na via catabólica e se torna ácido pirúvico. Os ácidos graxos sãocatabolizados de modo diferente do glicerol e geram mais ATP. O primeiro estágio do catabolismo de ácidos graxos é uma série de reações, chamadas coletivamente de betaoxidação, que ocorre na atriz mitocondrial. As enzimas removem dois átomos de carbono da longa cadeia de átomos de carbono do ácido graxo de cada vez e ligam o fragmento com dois carbonos à coenzima A, formando acetil CoA. A acetil CoA então entra no ciclo de Krebs. Um ácido graxo com 16 carbonos como o ácido palmítico pode gerar até 129 moléculas de ATP em sua oxidação completa por betaoxidação, ciclo de Krebs e cadeia transportadora de elétrons. Como parte do catabolismo normal dos ácidos graxos, os hepatócitos podem retirar duas moléculas de acetil CoA de uma vez e condensá-las, formando ácido acetoacético. Essa reação libera a porção CoA, que não consegue se difundir Kícila Sabrina T3 - 2022 para fora das células. Uma parte do ácido acetoacético é convertida em ácido beta-hidroxibutírico e em acetona. A formação dessas três substâncias, conhecidas coletivamente como corpos cetônicos, é chamada de cetogênese. Como os corpos cetônicos se difundem livremente pelas membranas plasmáticas, eles deixam os hepatócitos e entram na corrente sanguínea. Outras células captam o ácido acetoacético e ligam seus quatro carbonos a duas moléculas de coenzima A, formando duas moléculas de acetil CoA, que podem entrar no ciclo de Krebs para serem oxidadas. O músculo cardíaco e o córtex (porção externa) dos rins usam o ácido acetoacético em detrimento da glicose para a geração de ATP. Os hepatócitos, que produzem o ácido acetoacético, não conseguem utilizá-lo para a produção de ATP porque eles não possuem a enzima que transfere o ácido acetoacético de volta para a coenzima A. àEsses lipídeos podem ser sintetizados pelo nosso organismo? Os hepatócitos e os adipócitos conseguem sintetizar lipídios a partir da glicose ou de aminoácidos por intermédio da lipogênese, que é estimulada pela insulina. A lipogênese ocorre quando os indivíduos consomem mais calorias do que o necessário para a satisfação de suas necessidades de ATP. Excesso de carboidratos, proteínas e gorduras dietéticos têm todos o mesmo destino – eles são convertidos em triglicerídeos. 2º Entender a fisiopatologia da Displidemia – classificação, etiologia, epidemiologia, patogênese, quadro clínico. Conceito Termo técnico que define as alterações da qualidade e quantidade das gorduras no sangue. Famoso colesterol alto ou gordura no sangue. Fator de risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares, esta relacionada com o mecanismo de formação das placas de aterosclerose das artérias do nosso corpo – famosa artérias entupidas, isso é condição previa para infarto do miocárdio e AVC Classificação As dislipidemias podem ser classificadas em hiperlipidemias (níveis elevados de lipoproteínas) e hipolipidemias (níveis plasmáticos de lipoproteínas baixos). Várias são as classificações propostas, dentre as mais importantes temos as que se seguem. • Aumento do colesterol ruim LDL • Aumento de TG trigliceridis • Aumento de LDL + TG – mista • Reducao de HDL – colesterol bom Colesterol - Peça fundamental nas estruturas da membranas celulares - Precursor de hormônios esteroides - Componentes da Bile - Antioxidante – protege as células contra acao de radicais livres - Precursor da Vitamina D Triglicerídeos Armazenamento de energia, cada grama de gordura capaz de gerar 9 calorias de energia Classificação etiológica Tanto as hiper quanto as hipolipidemias podem ter causas primárias ou secundárias: Causas primárias: são aquelas nas quais o distúrbio lipídico é de origem genética. Causassecundárias:adislipidemiaédecorrentedeestilo de vida inadequado, de certas condições mórbidas, ou de medicamentos Kícila Sabrina T3 - 2022 Classificação laboratorial A classificação laboratorial das dislipidemias nesta atualização sofreu modificações, e os valores referenciais e os alvos terapêuticos foram determinados de acordo com o risco cardiovascular individual e com o estado alimentar (Tabela 3). As dislipidemias podem ser classificadas de acordo com a fração lipídica alterada em: • Hipercolesterolemia isolada: aumento isolado do LDL-c (LDL-c ≥ 160 mg/dL). • Hipertrigliceridemia isolada: aumento isolado dos triglicérides (TG ≥ 150 mg/dL ou ≥ 175 mg/dL, se a amostra for obtida sem jejum). • Hiperlipidemia mista: aumento do LDL-c (LDL-c ≥ 160 mg/dL) e dos TG (TG ≥ 150 mg/dL ou ≥ 175 mg/ dL, se a amostra for obtida sem jejum). Se TG ≥ 400 mg/dL, o cálculo do LDL-c pela fórmula de Friedewald é inadequado, devendo-se considerar a hiperlipidemia mista quando o não HDL-c ≥ 190 mg/dL. • HDL-c baixo: redução do HDL-c (homens < 40 mg/dL e mulheres < 50 mg/dL) isolada ou em associação ao aumento de LDL-c ou de TG. Classificação fenotípica (Fredrickson) A classificação proposta por Fredrickson é baseada nos padrões de lipoproteínas associados a concentrações elevadas de colesterol e/ou TG, não sendo considerado o HDL-c. A classificação de Fredrickson tem por base a separação eletroforética e/ou por ultracentrifugação das frações lipoproteicas, distinguindo-se seis tipos. Embora se reconheça a grande contribuição desta classificação, ela é hoje muito pouco utilizada, pois pouco colabora para o conhecimento da etiologia (exceto na disbetalipoproteinemia) ou da decisão terapêutica Dislipidemias de forte componente genético A biologia molecular acrescentou um vasto campo de conhecimento no metabolismo lipídico. Atualmente, foi facilitada a compreensão da influência genética na interação entre lipoproteínas e receptores e na expressão de diversas enzimas. Os principais tipos de dislipidemias com forte componente genético serão apresentados em situações especiais. O lipidograma (eletroforese de lipoproteínas) não é exame rotineiramente solicitado, mas pode auxiliar no diagnóstico da dislipidemia em raras situações. Diagnóstico Exame de sangue: que mostra a medidas das concentrações de Triglicerídeos, colesterol total e frações ® Lipidograma completo (triglicerídeos, colesterol total e frações) não tem necessidade de Jejum Como é possível haver lipídeos no sangue se os lipídeos são insolúveis em ambiente aquoso ? - LIPOPROTÉINAS – conjunto moleculares que contem Lípides + Proteinas = funcionam como meio de transporte no sangue Lípides: TG, Colesterol e Fosfolípides Proteinas: Apolipoproteínas ® APOLIPOPROTEÍNAS: são proteínas quem tem como principal da Solubilidade – para as lipoproteínas plasmáticas – para que elas se discipem no plasma e alcance vários tecidos no corpo • Capazes de ativar enzimas do metabolismo lipídico • Ajudam a manter a integridade estrutural do complexo lipídeo/proteína • Ajudam no reconhecimento de receptores de superfície Dentro das Apoliproproteinas temos subtipos: ® ApoAS - ApoA1 -ApoA2 ® ApoBs - ApoB-48 - APOb-100 ® ApoCs - ApoC 2 -ApoC3 Kícila Sabrina T3 - 2022 O diagnóstico de dislipidemia baseia-se na dosagem dos lipídios séricos: colesterol total, HDL-C e triglicerídeos. A dosagem direta do LDL-C não é necessária, podendo o cálculo ser feito por meio da fórmula de Friedewald [LDL-C = (colesterol total [CT] – HDL-C) – (triglicerídios [TG]/5)], quando o valor dos triglicerídeos for inferior a 400 mg/dL. Para os casos em que o nível dos triglicerídeos for superior a 400 mg/dL, utiliza-se como critério o colesterol não HDL [não HDL-C = CT – HDL-C], cujo alvo é 30 mg/dL acima do alvo de LDL-C (isto é, para pacientes cujo LDL-C alvo for 100 mg/dL, o alvo de não HDL-C será 130 mg/dL). Exames complementares - Frações do colesterol de lipoproteínas de alta densidade (HDL), de baixa densidade (LDL) e de triglicerídeos dosados em jejum - Dosagem de T4 e TSH - Ureia e creatinina - AST,ALT e CPK (monitorar tratamento) Rastreamento É recomendado rastreamento para dislipidemias a partir dos 35 anos para homens e 45 anos para mulheres. Homens com idade entre 20 e 35 anos e mulheres com idade entre 20 e 45 anos que apresentem um único dos fatores de risco abaixo descritos para doença coronariana, também devem ser rastreados: • diabetes; • história prévia de doença coronariana ou doença aterosclerótica não coronariana (ex: aneurisma de aorta abdominal, doença arterial periférica, estenose de artéria carótida); • história familiar de doença cardiovascular em homens abaixo dos 50 e mulheres abaixo dos 60 anos de idade; • tabagismo; • hipertensão; • obesidade. Os exames usualmente solicitados para rastreamento de dislipidemia são Colesterol Total e HDL. Na presença de exame com valores alterados, recomenda-se repeti-lo em outra ocasião. A média dos dois exames deve ser usada para fins de avaliação de risco. Epidemiologia A incidência mundial de doença cardiovascular (DCV) apresentou grande progressão nas últimas décadas, como observado em 1990, com cerca de 14 milhões de casos, e a perspectiva de 25 milhões para 2020 no oriente e ocidente. Estudo brasileiro investigando a presença de dislipidemia em 22.542 indivíduos com mais de 20 anos de idade, atendidos no Hospital das Clínicas da Universidade Estadual de Campinas, demonstrou em adultos (até 60 anos) alterações nos níveis de colesterol total, LDL-C e triglicerídeos em 44%, 38% e 37%, respectivamente, e em 55%, 48% e 41%, respectivamente, em idosos (acima de 60 anos). Os resultados desse estudo mostraram, ainda, que 35% dos adultos e 32% dos idosos apresentavam níveis reduzidos de HDL-C. A dislipidemia combinada (hipercolesterolemia e hipertrigliceridemia) foi também muito prevalente. Em outro estudo nacional, com 81.262 indivíduos, demonstrou-se um valor médio de colesterol dentro dos limites recomendados pela National Cholesterol Education Program (NCEP). Entretanto, analisando indivíduos com um fator de risco para doença coronariana, demonstrou-se que 40% tinham níveis de colesterol acima de 200 mg/dL e 14% apresentavam colesterol maior que 240 mg/dL. Em indivíduos sem fatores de risco, essas porcentagens caíam para 30% e 8%, respectivamente. Kícila Sabrina T3 - 2022 Quadro Clínico As hiperlipidemias, em geral, não apresentam manifestações clínicas. Nos casos mais severos, pode ocorrer a formação de xantomas. Diversos tipos de xantomas podem ser observados e caracterizam as diferentes dislipidemias. O desenvolvimento de xantomas tendinosos e tuberosos, xantelasmas e arco córneo são sinais clínicos característicos das hipercolesterolemias primárias, os quais refletem acúmulo de colesterol em ma- crófagos infiltrados nos tendões e na pele. A hipertrigliceridemia acima de 1.000 mg/dL indica presença de quilomícrons, que podem ser detectados pela observação do plasma leitoso. Xantomas eruptivos nas regiões dorsal e glútea, nos braços, nas mãos e nas coxas, além de hepatoesplenomegalia, pancreatite ou dores abdominais recorrentes são observados com frequência. A presença de xantomas é frequente em quase 50% dos indivíduos portadores da disbetalipoproteinemia familiar, caracterizada pela formação de xantoma palmar, presente de forma plana nas linhas das palmas das mãos, como sinal patognomônico da doença. Xantomas tuberosos ou tu- beroeruptivos também são comuns, além da ocorrência de doença aterosclerótica prematura. Em decorrência da elevação plasmática do LDL colesterol, ocorrem maior captação de LDL, desenvolvimento acelerado de aterosclerose e, con- sequentemente, maior incidência de doença cardiovascular. Salienta-se que, na forma homozigótica da hipercolesterolemia familiar, a ocorrência de manifestação clínica de doenças arteriais isquêmicas dá-se antes dos 20 anos de idade. 3º Descrever o processo de Aterogênese O espessamento e a perda de elasticidade das paredes das artérias são as principais características de um grupo de doenças chamadas de arteriosclerose. Uma modalidade de arteriosclerose é a aterosclerose, uma doença progressiva caracterizada pela formação de lesões chamadas placas ateroscleróticas nas paredes das grandes e médias artérias. A aterosclerose é uma doença inflamatória crônica de origem multifatorial, que ocorre em resposta à agressão endotelial, acometendo principalmente a camada íntima de artérias de médio e grande calibre. A inflamação, uma resposta de defesa do organismo à lesão tecidual, desempenha um papel-chave no desenvolvimento das placas ateroscleróticas. Como resultado dos danos teciduais, os vasos sanguíneos se dilatam e aumentam a sua permeabilidade, e os fagócitos, incluindo os macrófagos, aparecem em grande quantidade. A formação da placa aterosclerótica inicia-se com a agressão ao endotélio vascular por diversos fatores de risco, como dislipidemia, hipertensão arterial ou tabagismo. Como consequência, a disfunção endotelial aumenta a permeabilidade da íntima às lipoproteínas plasmáticas, favorecendo a retenção destas no espaço subendotelial. O depósito de lipoproteínas na parede arterial, processo- chave no início da aterogênese, ocorre de maneira proporcional à concentração destas lipoproteínas no plasma. Além do aumento da permeabilidade às lipoproteínas, outra manifestação da disfunção endotelial é o surgimento de moléculas de adesão leucocitária na superfície endotelial, processo estimulado pela presença de LDL oxidada. As moléculas de adesão são responsáveis pela atração de monócitos e linfócitos para a intimidade da parede arterial. Induzidos por proteínas quimiotáticas, os monócitos migram para o espaço subendotelial, no qual se diferenciam em macrófagos, que, por sua vez, captam as LDL oxidadas. Os macrófagos repletos de lípides são chamados de células espumosas e são o principal componente das estrias gordurosas, lesões macroscópicas iniciais da aterosclerose. Uma vez ativados, os macrófagos são, em grande parte, responsáveis pela progressão da placa aterosclerótica por meio da secreção de citocinas, que amplificam a inflamação, e de enzimas proteolíticas, capazes de degradar colágeno e outros componentes teciduais locais. Outras células inflamatórias também participam do processo aterosclerótico. Os linfócitos T, embora menos numerosos que os macrófagos no interior do ateroma, são de grande importância na aterogênese. Mediante interação com os macrófagos, as células T podem se diferenciar e produzir citocinas que modulam o processo inflamatório local. Diversos mecanismos têm sido propostos para a aterogênese e suas complicações, como a oxidação de lipoproteínas (principalmente lipoproteínas de baixa densidade) e a alteração fenotípica do endotélio vascular, produzindo substâncias quimiotáticas de linfócitos, liberando espécies reativas de oxigênio, promovendo vasoconstrição e reduzindo propriedades antitrombóticas. Kícila Sabrina T3 - 2022 Alguns mediadores da inflamação estimulam a migração e a proliferação das células musculares lisas da camada média arterial. Estas, ao migrarem para a íntima, passam a produzir não só citocinas e fatores de crescimento, como também matriz extracelular, que formará parte da capa fibrosa da placa aterosclerótica. A placa aterosclerótica plenamente desenvolvida é constituída por elementos celulares, componentes da matriz extracelular e núcleo lipídico e necrótico, formado principalmente por debris de células mortas. As placas estáveis caracterizam-se por predomínio de colágeno, organizado em capa fibrosa espessa, escassas células inflamatórias, e núcleo lipídico e necrótico de proporções menores. As instáveis apresentam atividade inflamatória intensa, especialmente em suas bordas laterais, com grande atividade proteolítica, núcleo lipídico e necrótico proeminente, e capa fibrótica tênue. A ruptura desta capa expõematerial lipídico altamente trombogênico, levando à formação de um trombo sobrejacente. Este processo, também conhecido por aterotrombose, é um dos principais determinantes das manifestações clínicas da aterosclerose. • Outra explicação sobre a formação de placas ateroscleróticas. Ela começa quando LDL em excesso do sangue se acumula na camada interna de uma parede arterial (camada mais próxima da corrente sanguínea), os lipídios e proteínas LDL sofrem oxidação (remoção de elétrons), e as proteínas se ligam a açúcares. Além do aumento da permeabilidade às lipoproteínas, outra manifestação da disfunção endotelial é o surgimento de moléculas de adesão leucocitária na superfície endotelial, processo estimulado pela presença de LDL oxidada. Portanto, em resposta, as células endoteliais e de músculo liso da artéria secretam substâncias que atraem monócitos do sangue e os convertem em macrófagos. Os macrófagos então ingerem e ficam tão cheios de partículas de LDL oxidada que assumem uma aparência espumosa quando vistos ao microscópio (células espumosas). As células T (linfócitos) seguem os monócitos até o revestimento interno de uma artéria, onde liberam produtos químicos que intensificam a resposta inflamatória. Juntos, as células espumosas, os macrófagos e as células T formam uma estria gordurosa, o início de uma placa aterosclerótica. Os macrófagos secretam substâncias químicas que fazem com que as células de músculo liso da túnica média de uma artéria migrem para a parte superior da placa aterosclerótica, formando uma capa sobre ela e, assim, compartimentando-a do sangue. Além disso, as células T induzem as células espumosas a produzir fator tecidual (FT), uma substância química que inicia a cascata de reações que resulta na formação de coágulos sanguíneos. Se o coágulo em uma artéria coronária for grande o suficiente, pode diminuir significativamente ou interromper o fluxo sanguíneo e resultar em um infarto agudo do miocárdio por exemplo. àA maior gravidade da aterosclerose está relacionada com fatores de risco clássicos, como dislipidemia, diabetes, tabagismo, hipertensão arterial, entre outros, mas, a nível celular, cristais de colesterol, microfilamentos liberados por neutrófilos, isquemia e alterações na pressão de arrasto hemodinâmico têm sido implicados na ativação de complexo inflamatório, que se associa com ruptura da placa aterosclerótica ou erosão endotelial. àExistem inúmeras evidências de que a hipercolesterolemia contribui para a gênese da aterosclerose principalmente por concentrações elevadas de LDL-c. A partir destas complicações, ocorre interação do fator tecidual da íntima vascular com fator VIIa circulante, levando à geração de trombina, ativação plaquetária e formação do trombo, determinando as principais complicações da aterosclerose, infarto agudo do miocárdio e Acidente Vascular Cerebral (AVC). 4º Estudar as causas genéticas das Dislipidemia e secundárias Dislipidemia é definida como qualquer alteração nos níveis séricos dos lipídios. As dislipidemias podem ser classificadas em hiperlipidemias (níveis elevados de lipoproteínas) e hipolipidemias (níveis plasmáticos de lipoproteínas baixos). Tanto as hiper quanto as hipolipidemias podem ter causas primárias ou secundárias: • Causas primárias: são aquelas nas quais o distúrbio lipídico é de origem genética. As dislipidemias primárias/genéticas associam-se a superprodução e/ou remoção deficiente de lipoproteínas; esta última pode decorrer de anormalidades na própria lipoproteína ou no seu receptor. • Causas secundárias: a dislipidemia é decorrente de estilo de vida inadequado, de certas condições mórbidas, ou de medicamentos As dislipidemias secundárias, estão classicamente associadas a uma ou mais doença de base ou ao seu tratamento. Kícila Sabrina T3 - 2022 àClassificações das dislipidemias primárias Essas dislipidemias primárias podem ser classificadas em 5 tipos: • Hipercolesterolemia Elevação isolada do LDL-c (> 130 mg/dl) • Hipertrigliceridemia Elevação isolada dos TG (> 150 mg/dl, em jejum, ou > 175 mg/dl, sem jejum), que reflete o aumento do volume de partículas ricas em TG, como VLDL, IDL e QM. • Hiperlipidemia mista Valores aumentados tanto de LDL-c (> 130 mg/dl) como de TG (> 150 mg/dl, em jejum, ou > 175 mg/dl sem jejum). Nesses indivíduos, pode-se utilizar também o não HDL-c como indicador e meta terapêutica. Nos casos de TG > 400 mg/dl, quando o cálculo do LDL-c pela fórmula de Friedewald é inadequado, deve-se considerar hiperlipidemia mista se o CT for ≥ 200 mg/dl, • HDL reduzida • HDL elevada Obs.: Hipercolesterolemia, hipertrigliceridemia ou hiperlipidemia mista reflete concentração aumentada de colesterol ou TG isolada ou conjuntamente • Hipercolesterolemia •• • Hipercolesterolemia familiar Fisiopatologia A HF é causada por defeitos genéticos em proteínas-chave envolvidas na síntese do receptor do LDL e sua endocitose, levando à queda da captação celular de LDL e ao aumento de suas concentrações plasmáticas. A HF tem penetrância de quase 100%, o que significa que a metade dos descendentes em primeiro grau de um indivíduo afetado serão portadores do defeito genético e apresentarão níveis elevados de LDL-colesterol desde o nascimento e ao longo de suas vidas, sendo homens e mulheres igualmente afetados. A HF heterozigota tem 3 causas: • Mutações heterozigóticas com perda de função do gene codificador do receptor de LDL (LDLR), com mais de 1.600 mutações descritas na literatura (deleções, missense, nonsense e inserções) e que representam cerca de 85% a 90% dos casos de HF. • Apoliproteína B100 defeituosa familiar: Mutações heterozigotas no APOB, gene que codifica a apolipoproteína B100, afetando o domínio da ligação do receptor de LDL à ApoB100. Resulta de mutação no gene da Apo-B100 que prejudica a ligação da LDL a seu receptor (LDLR), impedindo a formação do complexo LDL/Apo-B/LDLR. • Mutações heterozigóticas com ganho de função no gene da pró-proteína convertase subutilisina/kexina tipo 9 (PCSK9), que codifica a proteína NARC-1, a qual participa do catabolismo do receptor de LDL. Essa é a causa menos comum de HF (5% dos casos), com pouco mais de 20 tipos de mutações descritas até o momento. àQuando se pensar em HF? O ponto de partida para se considerar a possibilidade de HF é: - A presença de LDL-colesterol > 190 mg/dL em adultos ou de colesterol total > 310 mg/dL. - História prévia ou familiar de DAC prematura ou morte súbita - Sinais clínicos característicos, como xantomas tendinosos e arcos corneanos, devem alertar para o diagnóstico de HF. Obs.: A presença de algum grau de arco corneano ocorre em 50% dos indivíduos com HF entre 31 e 35 anos. Espessamento dos tendões ocorre em 63% dos portadores de HF; alterações na ecogenicidade dos tendões estão presentes em 90% dos portadores de HF; xantomas são detectados em 68% dos portadores de HF com mutações do gene LDLR20. Kícila Sabrina T3 - 2022 O diagnóstico de HF baseia-se em 5 critérios: - História familiar - História clínica de DCV prematura, - Exame físico com sinais clínicos de depósitos extravasculares de colesterol - Níveis muito altos de LDL colesterol ou colesterol total plasmáticco em mais de uma medida - E/ou detecção da mutação ou polimorfismos genéticos causadores da HF. Os xantomas tendinosos são mais comumente observados no tendão de Aquiles e nos tendões extensores dos dedos, mas também podem ser encontrados nos tendões patelares e do tríceps. Xantomas são lesões cutâneas eruptivas, de coloração amarelada, geralmente com halo eritematoso e cerca de 2 a 5 mm de diâmetro A pesquisa deve ser realizada não só pela inspeção visual, mas também pela palpação, sendo praticamente patognomônicos de HF. Sua presença contribui com a especificidade diagnóstica, já que ocorrem em menosde 50% dos casos. Podem ser encontrados também xantomas planares intertriginosos, especialmente nas formas homozigóticas. A presença de arco corneano parcial ou total sugere HF quando observada antes dos 45 anos de idade. àSão considerados portadores de HF de maior risco: - Pacientes diabéticos com HF; - Indivíduos com HF tabagistas; - Antecedente de DAC muito precoce em parentes de primeiro grau:paiouirmão<45anoscomDACemãeouirmã<55anos com DAC e presença de lipoproteína (a) elevada (> 60 mg/dL). àRastreamento da HF O rastreamento envolve a determinação do perfil lipídico em todos os parentes de primeiro grau (pai, mãe e irmãos) dos pacientes diagnosticados como portadores de HF. As chances de identificação de outros portadores de HF a partir de um caso-índice são: 50% nos familiares de primeiro grau, 25% nos de segundo grau e 12,5% nos de terceiro grau. à Tratamento A associação entre HF e DAC está bem estabelecida. Os fatores de risco cardiovascular são similares para pacientes com e sem HF (sexo masculino, tabagismo, hipertensão arterial sistêmica, diabetes) e devem ser tratados agressivamente. Deve-se enfatizar, entretanto, que a HF por si só já é um significativo fator de risco cardiovascular. Portanto, as escalas de estratificação de risco (Framinghan, Loyd-Jones, Reynolds) não são apropriadas ou aplicáveis a esses pacientes, que sempre serão considerados de alto risco e, consequentemente, candidatos à terapia com estatinas em altas doses. A indicação do tratamento farmacológico ocorre para portadores de LDL-colesterol > 160 mg/dL, em indivíduos sem manifestação prévia de doença cardiovascular, após aplicação de medidas de estilo de vida saudável. Considerando os elevados valores de colesterolemia basais presentes na HF, a redução de pelo menos 50% obtida com o tratamento medicamentoso é considerada de real valor terapêutico. Entretanto, os pacientes com HF em maior risco, ou seja, com manifestação clínica de aterosclerose coronariana ou equivalente cerebrovascular e/ou periférico, necessitam intensificação do esquema de tratamento para alcançar maiores reduções de LDL colesterol. • Hiperlipidemia familiar combinada (hiperlipidemia tipo 2B) O fenótipo da hiperlipidemia familiar combinada (HFC) varia da hipertrigliceridemia isolada à hipercolesterolemia isolada entre famílias ou indivíduos, sugerindo que a variação do fenótipo lipídico esteja ligada a fatores ambientais. Seu diagnóstico baseia-se no fenótipo e na história familiar. Nesses indivíduos, diminuição de lipoproteína de alta densidade (HDL colesterol) com altos níveis de triglicerídios e LDL é encontrada, especialmente as partículas pequenas e densas. A doença segue padrão autossômico dominante, possivelmente poligênico. Kícila Sabrina T3 - 2022 Em geral, os pacientes com HFC apresentam outros fatores de risco (obesidade central, hipertensão, resistência à insulina, intolerância à glicose). Aliás, a resistência à insulina parece ter papel fundamental nessa dislipidemia, pois a maioria dos seus portadores (até 2/3 dos pacientes) apresenta síndrome metabólica. • Hipercolesterolemia poligênica Causa mais comum de hipercolesterolemia isolada, a hipercolesterolemia poligênica responde por aproximadamente 85% dos casos de hiperlipoproteinemia padrão IIa de Fredrickson. Os pacientes apresentam um catabolismo defeituoso da LDL, associado ao aumento da sua produção, possivelmente por vários polimorfismos em um único nucleotídio, levando a concentrações de LDL-c superiores ao limiar diagnóstico de HF. Não existe uma mutação específica responsável pela hipercolesterolemia, sendo proposta uma causa poligênica. A frequência de parentes em primeiro grau com aumento de colesterol é muito baixa. A hipercolesterolemia poligênica ocorre em indivíduos suscetíveis em associação a fatores ambientais; o CT situa-se em torno de 300 a 350 mg/dl, e não há elevação do TG. O risco de DAC e aterosclerose para portadores dessa condição é alto e, quando associado às causas secundárias de dislipidemias, o quadro pode ser ainda mais grave. O diagnóstico é feito após exclusão de outras causas genéticas de dislipidemias, história familiar ausente (< 10% dos parentes de primeiro grau) e ausência de xantomas tendinosos. •• Hipertrigliceremias •• • Quilomicronemia familiar (hiperlipoproteinemia tipo 1) Também conhecida como síndrome de quilomicronemia, caracteriza-se pela persistência patológica de quilomícrons na circulação após um período de 12 a 14 horas de jejum. Mais comumente, a quilomicronemia é causada pela associação de uma forma genética comum de hipertrigliceridemia combinada com um distúrbio adquirido do metabolismo dos triglicerídios. Destes, o mais comum é o diabetes descompensado, entretanto, o uso de fármacos que aumentem os níveis de triglicerídios também pode estar implicado e deve ser descartado. Está associada à pancreatite, que parece resultar da liberação excessiva de ácidos graxos e lisolecitina dos quilomícrons, excedendo a capacidade ligadora da albumina nos capilares pancreáticos. Os achados de exame físico associam-se, habitualmente, ao grau de hipertrigliceridemia. Clinicamente, a quilomicronemia associa-se a: - Dor abdominal recorrente - Xantomas eruptivos nas nádegas e superfícies extensoras das coxas - Lipemia retinalis, - Hepatoesplenomegalia - Perda transitória de memória. A lipemia retinalis refere-se à aparência róseo- esbranquiçada dos vasos retinianos ao fundo de olho e ocorre em consequência da hiperquilomicronemia sérica, quando os níveis de triglicerídios excedem 3.000 mg/dL. A hepatoesplenomegalia é rapidamente reversível e resulta do acúmulo de triglicerídios nas células do sistema reticuloendotelial. Quando inadequadamente tratada, a quilomicronemia pode resultar em pancreatite aguda e recorrente. O risco de pancreatite é maior na presença de hipertrigliceridemia grave (> 2.000 mg/dL), podendo ser prevenida com a manutenção desses níveis abaixo de 1.000 mg/dL. •• Hiperlipidemia mista •• • Disbetalipoproteinemia Familiar (Hiperlipemia do Tipo 3) Também denominada hiperlipoproteinemia tipo 3, é causada em parte por uma mutação no gene da ApoE, resultando em dificuldade de captação hepática das lipoproteínas que contêm ApoE e redução da conversão de VLDL e IDL em LDL. Na ausência de fatores hormonais, ambientais e genéticos, os remanescentes não se acumulam em quantidade suficiente para causar hiperlipidemia plasmática em jejum. Indivíduos com disbetalipoproteinemia apresentam altos níveis de colesterol total e de triglicerídios (300 a 400 mg/dL), risco aumentado de DAC prematura e doença vascular periférica. Em geral, a dislipidemia típica não se manifesta antes da idade adulta em homens e da menopausa em mulheres. Xantomas palmares, depósitos alaranjados de lipídios em região palmar são patognomônicos, mas não estão sempre presentes. Xantomas tuberoeruptivos são ocasionalmente encontrados em áreas de pressão como joelhos e cotovelos. A presença de disbetalipoproteinemia deve ser suspeitada em indivíduos com colesterol total e triglicerídios elevados (300 a 1.000 mg/dL), porém com HDL-c normal e LDL-c diminuído. LDL-c encontra-se reduzido porque os receptores não estão ocupados com ApoE (que não Kícila Sabrina T3 - 2022 consegue se ligar aos receptores), e observa-se aumento da relação VLDL/triglicerídios padrão (1/2) banda beta larga. XANTOMAS E DISLIPIDEMIAS àClassificações das dislipidemias secundárias Vamos falar um pouco mais sobre essas causas secundárias: àDiabetes Mellitus A resistência à insulina está relacionada com au- mento na concentração de triglicérides, redução de HDL-C e maior formação de LDL pequenas27. A hiper- trigliceridemia, principal característica da dislipidemia da síndrome metabólica e do diabetes mellitus, é causada primariamentepelo aumento da produção de triglicéri- des e apo B-100 pelo fígado, levando à maior formação VLDL28. A secreção de apo B-100 é regulada pela dispo- nibilidade de lípides nos hepatócitos. Se o conteúdo de lípides for escasso, a apo B-100 será degradada com me- nor quantidade de VLDL formada. A resistência à insulina está associada com o aumento da produção de lípides pelas três vias principais: fluxo de ácidos graxos para o fígado proveniente do tecido adiposo, captação hepática de VLDL, IDL e remanescentes de quilomícrons, e síntese hepática de ácidos graxos. Conseqüentemente, há elevação da formação das partículas ricas em triglicérides, maior aporte destas ao fígado e estímulo à produção de lipase lipoprotéica hepática. Dessa forma, o aumento da enzima lipase lipoprotéica hepática contribui ainda mais para a formação de LDL e HDL pequenas. Além disso, a elevação da concentração de ácidos graxos livres no plasma restringe a ação da lipoproteína lipase periférica, pelo fato de sua maior concentração na interface partícula-enzima bloquear a interação da lipoproteína lipase periférica com quilomícrons e VLDL. Outra característica da dislipidemia diabética é a maior concentração de LDL pequenas e mais densas. Essas Kícila Sabrina T3 - 2022 partículas estão associadas à aterogenicidade. A formação de LDL pequenas e densas é dependente da proteína de transferência de colesterol éster, que pro- move a troca de colesterol éster da LDL por triglicérides de VLDL e quilomícrons. O maior conteúdo de triglicérides nas LDL favorece a atividade das enzimas lipoproteína lipase periférica e lipase hepática, gerando as LDL menores e mais densas. As concentrações de HDL-colesterol e apo AI estão caracteristicamente reduzidas nos indivíduos portado- res de resistência à insulina. Essa alteração é decorrente da ação da proteína de transferência de colesterol éster, mediando a troca de colesterol éster da HDL por trigli- cérides das lipoproteínas VLDL e quilomícrons. O catabolismo da apo AI está aumentado no DM tipo 2. Um estudo demonstra que a apo AI dissocia-se da HDL enriquecida de triglicérides e é catabolizada pelos rins àSíndrome nefrótica A alteração mais freqüente na síndrome nefrótica é a elevação na concentração plasmática de LDL-C, às ve- zes acompanhada por aumento na concentração de VLDL. As causas mais prováveis são aumento da pro- dução hepática de VLDL e maior conversão em LDL. à Hipotireoidismo O hipotireoidismo é uma causa comum de hiperlipidemia. A manifestação clássica é a elevação na concentração de LDL- C, mas também pode haver hipertrigliceridemia. A elevação de LDL-C está associada à diminuição da remoção de LDL por causa da menor síntese de receptor de LDL31. O hipotireoidismo também pode reduzir a atividade da lipoproteína lipase periférica, predispondo ao aumento da concentração plasmática de triglicérides àConsumo de álcool A ingestão regular de bebidas alcoólicas pode alterar significativamente o metabolismo dos triglicérides. O álcool é metabolizado basicamente por meio de três vias: catalase, oxidação microssomal e álcool desidrogenase, sendo esta última a via preponderante. A álcool desidrogenase converte o álcool em acetaldeído, que sob ação da acetaldeído desidrogenase é convertido em CO2, H2O e acetil CoA. O acetil CoA é o precursor da síntese de ácidos graxos. Por sua vez, o álcool provoca aumento na concentração de NADH, que inibe a oxidação de ácidos graxos no fígado, elevando a produção de triglicérides e VLDL. A hipertrigliceridemia é a alteração mais freqüente, mas geralmente associada ao aumento de HDL-C, decorrente da menor atividade da lipase hepática àTerapia estrogênica Os estrógenos estimulam a produção de triglicérides, de maneira dose-dependente. O uso de contraceptivos e a terapia de reposição hormonal podem provocar a hipertrigliceridemia. Os estrógenos atuam elevando a produção de VLDL, porém aumentam a remoção de LDL da circulação por maior síntese de receptores de LDL, podendo diminuir as concentrações plasmáticas de LDL-C. 5º Identificar pacientes com alto risco cardiovascular Identificar pacientes com alto risco cardiovascular Conforme os níveis de colesterol total aumentam, o risco de doença coronariana começa a subir. Quando o colesterol total está > 200 mg/dl, o risco de ataque cardíaco dobra com cada aumento de 50 mg/dl no colesterol total. Níveis de colesterol total de 200 a 239 mg/dl e de LDL entre 130 e 159 mg/dl são considerados limítrofes (máximo); o colesterol total acima de 239 mg/dl e o LDL acima de 159 mg/dl são classificados como altos. A proporção entre os níveis de colesterol total e de colesterol HDL prediz o risco de desenvolvimento de doença da artéria coronária. Por exemplo, uma pessoa com níveis de colesterol total de 180 mg/dl e de HDL de 60 mg/dl tem uma taxa de risco proporcional igual a 3. Taxas acima de 4 são consideradas indesejáveis; quanto maior a taxa, maior o risco de desenvolvimento de doença da artéria coronária. Na prática, frente a um paciente com dislipidemia, é importante identificar aqueles que já tiveram algum evento cardiovascular ou doença aterosclerótica clinicamente manifesta. Estes já se enquadram em uma categoria de muito alto risco, sendo necessária uma abordagem mais agressiva na tentativa de prevenir um novo evento (prevenção secundária) • Recentemente, AHA/ACC sugeriu a classificação de risco de um evento cardiovascular em 10 anos através do cálculo com uma ferramenta como: - < 5% (baixo risco) - Entre 5 e < 7,5% (limítrofe ou borderline), - Entre 7,5% e < 20% (intermediário) - ≥ 20% (alto risco) No caso de crianças e adolescentes (até 19 anos de idade), não há necessidade de estratificar o risco cardiovascular, exceto nas situações especiais mencionadas anteriormente Kícila Sabrina T3 - 2022 neste capítulo. Para os adultos jovens entre 20 e 39 anos de idade, é feita a estimativa de risco ao longo da vida (Lifetime ASCVD Risk) Os estudos sobre os benefícios da prevenção primária em pacientes com mais de 75 anos de idade ainda são conflitantes; sendo assim, não se faz necessária a estratificação de risco. *Evento cardiovascular: infarto do miocárdio, AVC; fatal e não fatal. **Doença arterial clinicamente manifesta: SCA (IAM; angina estável ou angina instável; revascularização de coronária) Legenda: SCA: síndrome coronariana aguda DRC: doença renal crônica DAP: doença arterial periférica Algoritmo para estratificação de risco na prevenção primária de eventos cardiovasculares: àDiagnóstico de dislipidemia EXAME: Perfil Lipídico (dosagem dos lipídios plasmáticos) Quem faz? Todo indivíduo com DAC ou outras manifestações de doença aterosclerótica (cerebrovascular, carotídea e da aorta abdominal e/ou dos seus ramos terminais) deve ter perfil lipídico determinado obrigatoriamente, independentemente de idade ou sexo. O perfil lipídico é definido pelas determinações bioquímicas do colesterol total (CT), do HDL-c, do LDL-c e dos TG. Para a coleta de sangue, recomenda-se que o paciente mantenha sua dieta habitual e estado metabólico saudável, não sendo mais necessário o jejum. A justificativa para tal mudança é simples: os TG levam de 8 a 12 horas para voltar aos níveis de jejum, e o homem passa a maior parte do dia em estado pós-prandial. Além disso, estudos têm mostrado que elevações dos TG pós-prandiais se associam com maior risco de eventos cardiovasculares. Atualmente, as novas diretrizes recomendam o jejum apenas em algumas situações específicas: • Quando os níveis de TG sem jejum são maiores que 440 mg/dl (neste caso, um novo exame deve ser realizado) • No acompanhamento de hipertrigliceridemias • Indivíduos em uso de medicações que aumentem TG ou • Após um episódio de pancreatite por hipertrigliceridemia. O diagnóstico de dislipidemia baseia-se na dosagem doslipídios séricos: colesterol total, HDL-C e Triglicerídeos. A dosagem direta do LDL-C não é necessária, podendo o cálculo ser feito por meio da fórmula de Friedewald quando o valor dos triglicerídeos for inferior a 400 mg/dL. Para os casos em que o nível dos triglicerídeos for superior a 400 mg/dL, utiliza-se como critério o coles- terol não HDL [não HDL-C = CT – HDL-C], cujo alvo é 30 mg/dL acima do alvo de LDL-C (isto é, para pacientes cujo LDL-C alvo for 100 mg/dL, o alvo de não HDL-C será 130 mg/dL) Valores de referência para cada um desses lipídeos plasmáticos: CT < 190mg/dl HDL > 40mg/dl LDL < 130mg/dl TG sem jejum < 175mg/dl TG com jejum < 150mg/dl Kícila Sabrina T3 - 2022 6º Estudar o tratamento da Dislipidemia Tratamento Primeiro passo: estratificação do risco de eventos isquêmicos coronarianos. - Alto risco: doença arterial confirmada; ou outras formas clínicas da doença aterosclerótica (doença arterial periférica, aneurisma de aorta abdominal, aterosclerose das carótidas), diabetes; risco > 20% em 10 anos. Objetivo do tratamento: LDL- colesterol <100mg/dl, não HDL <130mg/dl Objetivo em pacientes de risco muito alto: angina instável, pós-IAM e após revascularização do miocárdio: LDL<70mg/dl, não HDL <100mg/dl - Risco intermediário: pacientes com dois fatores de risco, risco em 10 anos entre 10 e 20% Objetivo do tratamento: LDL- colesterol <130mg/dl, não HDL <160mg/dl - Baixo risco: 0 a 1 fatoe de risco: risco < 10 % em 10 anos Objetivo do tratamento: LDL- colesterol <160mg/dl, não HDL <190mg/dl Segundo passo: avaliar a presença de fatores agravantes de risco (quando presentes um ou mais agravantes, reclassificar o paciente para o nível de risco imediatamente superior): - História familiar de doença coronária prematura (parente masculino de 1o. Grau < 55 anos ou feminino < 65 anos) - síndrome metabólica -Micro ou macroalbuminuria (> 30 ) - Hipertrofia ventricular esquerda - Insuficiência renal crônica (creatinina > 1,5mg/dl ou clerance de creatinina < 60 ml/min) - Proteina C reativa de alta sensibilidade > 3 mg/l - Exame complementar com evidência de doença aterosclerótica subclínica • Escore de cálcio coronário > 100 ou > percentil 75 para idade e sexo • Espessamento da artéria carótida (IMT) máximo >1 mm • Índice tornozelo-braquial (ITB) <0,9 Esquema de tratamento Todos os pacientes devem fazer alterações no estilo de vida (dieta, exercício, parar de fumar, perda de peso em caso de obesidade) Pacientes de baixo risco e com LDL-colesterol < 190 mg/dl, iniciar tratamento com modificação no estilo de vida e reavaliar após 6 meses. Caso persistam níveis elevados, iniciar medicamentos. Pacientes de baixo risco e com LDL-colesterol >190 mg/dl, iniciar tratamento medicamentoso Pacientes de risco intermediário, com LDL até 160 mg/dl, iniciar tratamento com modificação no estilo de vida e reavaliar após 3 meses. Se o paciente não atingir a meta (<130 mg/dl) iniciar tratamento medicamentoso. Kícila Sabrina T3 - 2022 Pacientes de risco intermediário, com LDL > 160 mg/dl, iniciar tratamento medicamentoso. Pacientes de alto risco intermediário, com LDL >100 160 mg/dl, iniciar tratamento com modificação no estilo de vida e tratamento medicamentoso desde o inicio. Areavaliação deve ser feita em 3 meses. Nos pacientes com arteriosclerose significativa e nos diabéticos, a meta de LDL <70 mg/dl é recomendada. Tratamento medicamentoso Adultos: estatinas (primeira escolha) Sinvastatina: VO, 10 a 80 mg/dia Pravastatina: VO, 20 a 40 mg/dia Fluvastatina: VO, 10 a 80 mg/dia Atorvastatina: VO, 10 a 80 mg/dia Rosuvastatina: VO, 10 a 80 mg/dia Crianças e gestantes resinas (podem ser associadas às estatinas) Outras alternativas: Colestiramina: VO, 16 a 24g/dia Ezetimiba: VO, 5 a 10mg/dia Ácido nicotínico: VO, 2 a 6 g/dia, conforme a tolerância para pacientes com HDL-colesterol baixo Monitoramento Enquanto o paciente estiver usando medicamentos, determinar os níveis de colesterol (HDL e LDL) e de triglicérides 2 x ao ano. Dosar CPK, TGO e TGP 30 dias após o inicio do tratamento com estatinas e todos os anos O aumento das aminotransferases (TGO e TGP) deve ser > 3 x os valores normais, enquanto CPK >10 vezes Suspender estatinas caso haja dor muscular. Evolução e prognóstico A redução de 1% de colesterol resulta em diminuição de 2% no risco de coronopatia. Tratamento deve ser feito pelo resto da vida do paciente.
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