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teoria dos jogos no proc penal

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Guia CompactoGuia Compacto
do Procedo Processsso Penalo Penal
conforme a Teoria dos Jogosconforme a Teoria dos Jogos
Guia CompactoGuia Compacto
do Procedo Processsso Penalo Penal
conforme a Teoria dos Jogosconforme a Teoria dos Jogos
www.lumenjuris.com.br www.lumenjuris.com.br 
EditoresEditores
João de AlmeidaJoão de Almeida
João Luiz da Silva AlmeidaJoão Luiz da Silva Almeida
ConselConselho Edho Editorialitorial
AdriaAdriano Pno P ilattiilatti
Alexandre Morais da RosaAlexandre Morais da Rosa
Cezar Roberto BitencourtCezar Roberto Bitencourt
Diego Araujo CamposDiego Araujo Campos
Emerson GarciaEmerson Garcia
Firly Nascimento FilhoFirly Nascimento Filho
Frederico Price Frederico Price GrecGrechihi
Geraldo L. M. PradoGeraldo L. M. Prado
Gustavo Sénéchal de GoffredoGustavo Sénéchal de Goffredo
Helena Elias PintoHelena Elias Pinto
Jean Carlos FernandesJean Carlos Fernandes
João Carlos SoutoJoão Carlos Souto
João Marcelo de Lima AssafimJoão Marcelo de Lima Assafim
Lúcio Antônio Chamon Junior Lúcio Antônio Chamon Junior 
Luigi BonizzatoLuigi Bonizzato
Luis Carlos AlcoforadoLuis Carlos Alcoforado
Manoel Messias PeixinhoManoel Messias Peixinho
Marcellus Polastri LimaMarcellus Polastri Lima
Marco Aurélio Bezerra de MeloMarco Aurélio Bezerra de Melo
Marcos ChutMarcos Chut
 Nilo Batista Nilo Batista
Ricardo Lodi RibeiroRicardo Lodi Ribeiro
Rodrigo KlippelRodrigo Klippel
Salo de CarvalhoSalo de Carvalho
Sérgio André RochaSérgio André Rocha
Sidney GuerraSidney Guerra
Conselheiro benemérito: Marcos Juruena Villela Souto (Conselheiro benemérito: Marcos Juruena Villela Souto (in memoriamin memoriam))
Conselho ConsultivoConselho Consultivo
Andreya Mendes de Almeida Scherer NavarroAndreya Mendes de Almeida Scherer Navarro
Antonio Carlos Martins SoaresAntonio Carlos Martins Soares
Artur de Brito Gueiros SouzaArtur de Brito Gueiros Souza
Caio de Oliveira LimaCaio de Oliveira Lima
Francisco de Assis M. TavaresFrancisco de Assis M. Tavares
Gisele CittadinoGisele Cittadino
João Theotonio Mendes de Almeida Jr.João Theotonio Mendes de Almeida Jr.
Ricardo Máximo Gomes FerrazRicardo Máximo Gomes Ferraz
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CEP: 04038-010CEP: 04038-010
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Cristiano Alfama MabiliaCristiano Alfama Mabilia
cristiano@lumenjuris.com.br cristiano@lumenjuris.com.br 
Florianópolis - SCFlorianópolis - SC
Tel. Tel. (48) 9981-(48) 9981-93539353
Folha de Rosto
 Alexandre Morais da Rosa
Doutor em Direito (UFPR);
Professor de Processo Penal da UFSC; Juiz de Direito (TJSC).
dos programas de Mestrado e Doutorado, em Direito,
da UFSC e UNIVALI.
Guia Compacto
do Processo Penal
conforme a Teoria dos Jogos
Editora Lumen Juris
Rio de Janeiro
2013
Créditos
Copyright © 2013 by Alexandre Morais da Rosa
Produção Editorial
Livraria e Editora Lumen Juris Ltda.
Produção de ebook
S2 Books
A LIVRARIA E EDITORA LUMEN JURIS LTDA. não se responsabiliza pela
originalidade desta obra nem pelas opiniões nela manifestadas por seu Autor.
É proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo, inclusive quanto
às características gráficas e/ou editoriais.
A violação de direitos autorais constitui crime (Código Penal, art. 184 e §§, e Lei no 6.895,
de 17/12/1980), sujeitando-se a busca e apreensão e indenizações diversas (Lei no
9.610/98).
Todos os direitos desta edição reservados à Livraria e Editora Lumen Juris Ltda.
Dados internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
Ros788 Rosa, Alexandre Morais da.
Guia compacto do processo penal conforme a teoria dos jogos /
Alexandre Morais da Rosa. — 1. Ed. – Rio de Janeiro : Lumen Juris, 2013.
ISBN 978-85-375-2235-6 (broch.)
1. Processo Penal – Brasil. 2. Teoria dos jogos.
I. Título.
CDD 345.8105
 Agradecimentos
Dedico este Guia aos parceiros de caminhada, em especial aos a lunos da UFSC. Valeu
“Morcegada”, UNIVALI, ao pessoal da 4a Vara Criminal de Florianópolis e da Turma de
Recursos. Aos amigos Jacinto Coutinho, Aldacy Coutinho, Lenio Streck, Aury Lopes Jr, Diogo
 Malan, Júlio Marcell ino Jr, Juliano Keller, Rodrigo Mioto, Jonas Ramos, Marli Modesti, Deise
Krantz, Gláucio Vincentin, Eugênio Pacelli, Rosivaldo Toscano, André Karam Trindade, Rafael
Tomaz de Ol iveira, Clarisse Tessinari, Clara Roman Borges, Marco Marrafon, Sylvio Lourenco
da Silveira Filho, Juarez Tavares, Geraldo Prado, Rubens Casara, Leonardo Costa de Paula,
 Márcio Staffen, Fernanda Becker, Izaura Hack, Aline Gostinsk i, Ana Cláudia Pinho, Gabriel
Divan, Alexandre Matzbacher, Ilidia Oliveira, Alexandre Bizzoto, Elmir Duclerc, Maria
Claudia Antunes de Souza, Jaqueline Quintero, Paulo Ferrarezi, Alexandre Simas Santos,
 Juliano Bogo, Alceu de Ol iveira Pinto, Paulo Cruz, Jorge Andrade, Sérgio Cademartori, Sérgio
Graziano, Nereu Giacomolli, Aramis Nassif, Alice Biachini, Rosberg Crozara, Leonardo de Bem,
 José Antônio Torres Marques, Maurício Zanóide, Ruth e Gabriel Gauer, Álvaro Oxley Rocha,
 Marcelo Carlin, Felipe Amorim Machado, Flaviane Barros, Cristiano Mabilia, Gustavo
Noronha Àvila, Thiago Fabres de Carvalho, Il ton Robl, Chico Monteiro Rocha, Felippe Borring
Rocha, Guilherme Merolli, Salo de Carvalho, Marcelo Pertill e, Marcelo Pizolati, Guilherme
Boes, Giovani Saavedra, Rui Cunha Martins, Aroso LInhares, Adriano Lima, Márcio Rosa,
Leandro Gornick, Maurício Salvadori, Ivan Cavalazzi, Ana Carolina Ceritotti. Não fiquem
bravos. No próximo coloco mais gente!!! Silvia Espósito está correta ao dizer: “Em pleno 2013
ainda vivemos na Lei de Segurança Nacional .”
Em especial para Ana Luisa por me mostrar que se pode amar!
Em fevereiro de 2013.
 Alexandre Mora is da Rosa
Instruções de Uso
1. O Guia Compacto de Processo Penal conforme a Teoria dos Jogos   pretende
aproximar a teoria do processo penal ao que se passa no mundo real. Não se trata de
construção transcendente e imaginária, desvinculada do que acontece nos foros. Daí que
sua estrutura diferencia-se da manualística em geral.  Não é resumido, nem
esquematizado. Muito menos simplificado. É compacto. Indicam-se online[1] as
referências bibliográficas que devem necessariamente ser consultadas para se ter a
dimensão do que se passa. Fornece, assim, elementos para releitura do processo penal
 brasileiro a partir da noção de guerra e da teoria dos jogos.
2. Este Guia Compacto não pretende expor teorias mirabolantes e que se desfazem
na primeira ida ao Fórum, nem aos repositórios de julgados. Também não pretende ser
realista , ou seja, simplesmente acomodar as diversas decisões dos tribunais, em especial
do STF e STJ, fazendo parecer algo harmônico. Esse universo em que os manuais se
apresentam, a saber, expondo os princípios (diversos) e depois repetindo o que se
construiu no século passado acerca das noções de Jurisdição, Ação e Processo, já foi feito.
Alguns muito bem e outros nem tanto. A pretensão desse livro compacto é o de
apresentar uma visão em paralaxe[2] da questão do processo penal a partir da noção de
guerra e da teoria dos jogos.
3. Alguns mais apressados dirão que não é novidade. Sim, há textos que trabalham a
questão, inclusive renomados. Entretanto, na lógica que se pretende estabelecer para o
ensino e prática do processo penal[3] , as noções trazidas serão de conteúdo variado (Rui
Cunha Martins), longe de conceitos eclipsados no imaginário, desprovidosde serventia.
Alguns poderão dizer que se pretende reinventar a roda (processo). É sempre uma
possibilidade de crítica. O tempo dirá!
4. Importante: as questões relativas ao processo penal serão apenas referenciadas.
Deve-se complementar, necessariamente , mediante a leitura de um dos Manuais a seguir:
a) Aury Lopes Jr – Direito Processual Penal. São Paulo: Saraiva, 2013; b) Eugênio Pacelli
de Oliveira. Curso de Direito Processual. São Paulo: Atlas, 2013; c) Paulo Rangel. Direito
Processual Penal. São Paulo: Atlas, 2012; d) Gustavo Badaró. Processo Penal. São Paulo:
Elsevier Campus, 2012; e) Elmir Duclerc. Direito Processual Penal. Rio de Janeiro: Lumen
 Juris, 2011; f) NICOLITT, André. Manual de Proceso Penal. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.
Dentre outras, poucas...
Sumário
Capa
olha de Rosto
Créditos
 gradecimentos
nstruções de Uso
releção
ntrodução
Capítulo 1° Para entender o Processo Penal a partir da Teoria dos Jogos e da Guerra
1. O processo como jogo
2. Teoria dos Jogos
3. O Jogo de Guerra Processual
4. A teoria de processo como jogo processual
Capítulo 2° Por uma leitura garantista do Sistema de Controle Social
1. Para introduzir o Garantismo Penal
2. Garantismo não é Religião: é limitação do Poder Estatal
3. Garantismo Penal e Direito Penal Mínimo
Capí tulo 3° Sistemas e Devido Processo Legal Substancial
1. Para uma noção de Princípio
2. Princípio Acusatório versus Inquisitório: o falso dilema
3. Devido processo legal substancial
4. A Presunção de Inocência
Capítulo 4° Para um Processo Penal Democrático
1. Nova leitura do Processo Penal: o discurso da eficiência
2. Jurisdição revisitada: o lugar do julgador
3. Ação: nova leitura
4. Processo como procedimento em contraditório
Capítulo 5° Subjogos Pré-Processuais e Incidentais (Cautelares, Prisão e Liberdade,
nquérito Policial, Flagrante)
1. Aspectos Preliminares (Denúncia Anônima, Testemunha Protegida, Investigação e
Legalidade)
2. Inquérito Policial (CPP, art. 4° – 23)
3. Prisão em Flagrante
4. Prisão Cautelar como Tática (de Guerra) no Jogo Processual
5. Medidas Cautelares Assecuratórias
6. Busca e Apreensão
7. Interceptação Telefônica
8. Quebra de Sigilo Fiscal e Bancário
Capítulo 6° O Jogo Processual: Lugar, Procedimentos e Nulidades
1. Lugar do Jogo: Competência
2. Regras da Partida: Procedimentos (ordinário, sumário, sumaríssimo, júri, especiais)
3. Subjogo de Nulidades
Capítulo 7° Prova e Decisão: o Resultado do Jogo
1. Subjogo Probatório
2. Decisão Penal como bricolage
Capítulo 8° Prorrogação: Recursos e Ações de Impugnação autônomas
1. Recursos
2. Ações Impugnativas Autônomas
Preleção
É costume começar prefácios com orgulhosas exibições de modéstia – com perdão
do paradoxo (“perdão”? paradoxos não são pecados carentes de perdão). Para não fugir à
tradição, tampouco ao contexto deste livro, declaro solenemente que me sinto como um
gandula de várzea convidado a comentar um gol de Messi. O resultado de uma
experiência dessas tem tudo para ser jocoso. Bem, como jocoso ( jocosus) vem de jogo
( jocus), parece apropriado.
Ora, o que dizer? Que Alexandre Morais da Rosa marcou um golaço! Só que isso é o
“óbvio ululante”. Considerando que “só os profetas enxergam o óbvio” (Nelson
Rodrigues), preciso urgentemente dizer algo a mais, nem que seja errado. Até para não
correr o risco de ter seguidores. Então, vamos lá.
No princípio, era o ego. Assim como na guerra e no jogo, no processo cada um busca
egoisticamente a vitória (desequilíbrio), não a “justiça” (equilíbrio) – Huizinga. A Teoria
dos Jogos diz que esse comportamento egoístico produz um resultado pior para o
conjunto de jogadores.
O detalhe é que há jogadores que não se limitam às suas partidas. É o “populismo
penal” citado neste livro: mídia, políticos, crime organizado, pressões corporativas e
atores forenses. Em defesa de seus interesses (egoísticos, estamentais, de classe etc.),
querem criar condições para que os resultados do conjunto de jogos de seu interesse,
inclusive os alheios, sejam praticamente determináveis ex ante. (Ou não, pois
normalmente tiram proveito profissional do cenário que criticam. Não obstante,
levantam essa bandeira. E é assim que atuam na esfera pública.)
Se isso até pode ser defensável no processo civil sumulado, não o é tão facilmente no
processo penal. Porque o espetáculo da punição (Nietzsche), potencializado pela
sociedade do espetáculo (Debord), faz do processo penal o palco perfeito para o
populismo penal: sua interferência desequilibra ainda mais o jogo, pois tende a temperá-
lo com pânico, como bem observa Alexandre Morais da Rosa, no presente livro. Ou seja,
a demanda populista por segurança alimenta justamente a insegurança. Não à toa, esse
círculo vicioso costuma ser o germe de tendências autoritárias. Há exemplos para todos
os gostos, de Patriot Act a Star Wars.
Insuflada pelo clima de pânico, a turba que cerca o patíbulo forense pede uma
palmatória maior, mas quem garante que ela será usada com “justiça”? Considerando as
“cicatrizes” que ela traz desde sua própria invenção, justificação e produção
(Castoriadis), talvez o próprio tamanho dela seja um fator a considerar. Se uma
palmatória pequena como uma agulha é inócua, como manejar com precisão outra com o
comprimento de um poste? Como aplicar um “corretivo” com isso, sem errar o alvo? Ou
sem esmagar a mão punida? É necessário – novamente – equilíbrio, que gera segurança,
mas não predeterminação do resul tado , que chamaremos aqui de “certeza”. Explico.
Por incrível que pareça, a falta de predeterminação (i.e., a “incerteza”) faz parte do
equilíbrio. Tomemos por exemplo um jogo muito mais constrangido pelos limites
espaciais, temporais e de regras: o xadrez. O primeiro lance das brancas pode resultar em
20 posições distintas: 16 com o movimento de um peão, 4 com o de um cavalo. A mesma
diversidade de posições se repete com o primeiro lance das pretas. Isso significa que,
após esses dois primeiros lances, nada menos que 400 posições diferentes são possíveis.
Com o segundo movimento das brancas, são possíveis 5.362 posições distintas (cf.
Bonsdorff et alii). E assim por diante. Como adivinhar qual delas será jogada? Eis a
incerteza. Num jogo estruturalmente equilibrado como o xadrez, não se tem certeza da
vitória, mas a segurança de que ela não se dará por um lance ilegal ou por injunções
externas – nem sequer essa segurança oferece o jogo processual. Muito pelo contrário.
Claro que, dessas 5.362 posições, boa parte delas não costuma aparecer nos
tabuleiros, porque resultariam de péssimas jogadas (p.ex., 1.P3TR). Ou seja, razões de
ordem estratégica (escolha do tipo de abertura e de defesa) e tática (combinações) criam
padrões de jogo que restringem, na prática, a enorme diversidade de posições previstas
na teoria – ordem no caos? Mesmo assim, continua sendo impossível adivinhar, com
100% de certeza, qual será a posição intermediária (subjogo). Que dirá a posição final.
Daí que cada jogo é único. Bem assim cada processo (como nota Alexandre) – e com
maior razão, dada sua maior complexidade.
É claro que há momentos na partida em que um jogador se vê encurralado, obrigado
não pela busca da melhor estratégia, mas pela posição desfavorável e pelas próprias
regras do jogo, a fazer apenas um movimento forçado (p.ex., após um xeque bem
aplicado). Ou impedido de fazer qualquer novo movimento (xeque-mate; trânsito em
 julgado). Porém, um afunilamento de opções como esse reflete um desequilíbrio
posicional (estratégico) em favor do seu oponente. Permanece viva, portanto, a hipótese
lançada: maior desequilíbrio, maior certeza.
E quando há desnível técnico entre os jogadores? Quanto maior ele for, maior é a
possibilidade de adivinhar não a posição final, que continua insondável, mas o resultado
da partida, que é o que importa. Creio ser desnecessário explicitar o paralelo disso com o
 jogo processual.
Em resumo, o jogo é equilibrado na justa medida em que seu resultado não é
predeterminável. Isso me faz crer que as demandas populistas por um processo penalque assegure um resultado predeterminado, seja ele condenatório ou absolutório, não
conseguem disfarçar o fato de que são demandas de desequilíbrio, i.e., que precisam
deste para impor sua pauta, sua agenda. Essas forças políticas, muitas vezes antagônicas,
não fazem seus lances no varejo. Elas jogam um meta-jogo, muito mais complexo.
Enquanto isso, deixam-nos brincar no tabuleiro processual. Servimos de cobaias, presas à
ilusão – mimicry  – do círculo mágico do jogo (Caillois). Como ratos de laboratório
procurando a saída do labirinto – e o sistema kaiano exige essa metáfora. Quem se
contenta com um fio de Ariadne para encontrar o pedacinho de queijo com que quer ser
recompensado ao final do trajeto (malgrado o risco de topar com o Minotauro), faça um
favor a si mesmo: feche este livro, vá buscar um manual de auto-ajuda processual e seja
feliz. Mas quem quiser olhar acima das paredes do labirinto, procurar o que está
realmente “em jogo” neste laboratório (garantismo ou populismo, democracia ou
eficiência, etc.), parabéns pela escolha: este é seu Guia.
L.A. Becker
Mestre em direito pela UFPR, árbitro de xadrez pela Uniandrade e gandula ad
hoc de futebol-de-botão.
Introdução
1. Perguntaram a um louco que havia perdido a sua chave na floresta, por que estava
a procurando sob a luz do poste da rua, no que ele respondeu: aqui tem mais luz.
Procurar flexibilizar as garantias constitucionais na perspectiva de resolver os problemas
de Segurança Pública é procurar, como o louco, a chave no mesmo lugar. Lugar caolho, a
saber, dos neoliberais.
2. Jacinto Nelson de Miranda Coutinho há muito denuncia a maneira pela qual o
discurso da eficiência , inclusive Princípio Constitucional (CR, art. 37), para os incautos de
plantão, embrenhou-se pelo processo penal em busca da sumarização dos
procedimentos, da redução do direito de defesa, dos recursos, enfim, ao preço da
democracia (Júlio Marcellino). A razão eficiente que busca a condenação “fast-food”
implicou nos últimos anos na “McDonaldização” do Direito Processual Penal: Sentenças
que são proladas no estilo “peça pelo número”. A “standartização” da acusação, da
instrução e da decisão. Tudo em nome de uma “McPena-Feliz”. Nada mais cínico e fácil
de ser acolhido pelos atores jurídico, de regra, “analfabetos funcionais.”
3. A primeira questão, com efeito, a ser enfrentada é a do “ator jurídico analfabeto
funcional”, ou seja, ele sabe ler, escrever e fazer conta; vai até à feira sozinho, mas é
incapaz de realizar uma leitura compreensiva. Defasado filosófica e hermeneuticamente,
consegue ler os códigos, mas precisa que alguém – do lugar do Mestre – lhe indique o
que é o certo. Sua biblioteca é composta, de regra, pela “Coleção de Resumos”, um livro
ultrapassado de Introdução ao Estudo de Direito – desses usados na maioria das
graduações do país –, acompanhado da lamúria eterna de que o Direito é complexo, por
isso é seduzido por Paulo Coelho. Quem sabe, com alguns comprimidos de “prozac” ou
algo do gênero, para, imaginariamente, dar conta. Complementa o “kit nefelibata” – dos
 juristas que andam nas nuvens – com um CD de Jurisprudência ou acesso aos “sites” de
pesquisa jurisprudencial, negando-se compulsivamente a pensar. O resultado disto, por
 básico, é o que se vê: um deserto teórico no campo jurídico, em que cerca de 60% – sendo
otimista – dos atores jurídicos são incapazes de compreender o que fazem. Para além da
“opacidade do direito” (Carcova) e sua atmosférica mito-lógica (Warat), existe uma geléia
de “atores jurídicos analfabetos funcionais”. Esses, por certo, não sabem compreender
hermeneuticamente, porque para isso precisariam saber pelo menos do giro linguístico
(Rorty), isto é, deveriam superar a Filosofia da Consciência em favor da Filosofia da
Linguagem. Seria pedir muito? Talvez. Mas é preciso entender que o sentido da norma
 jurídica (norma: regra + princípio) demanda um círculo hermenêutico  (Heidegger e
Gadamer), incompatível com os essencialismos ainda ensinados na graduação: vontade
da norma e vontade do legislador, tão bem criticados por Lenio Streck.
4. No campo Direito e Processo Penal, a situação é patológica. É que as gerações
antecedentes, a saber, os atuais atores jurídicos (professor, juiz, promotor, procurador,
advogado, delegado, etc), em grande parte, não sabem também compreender. São, na
maioria, “juristas analfabetos funcionais” que pensam que pensam juridicamente e, não
raro, ocupam as cátedras de ensino, incapazes, porque não dominam, de repassar uma
cultura democrática. Estes, portanto, muitos de boa-fé – reconheço –, acreditam que
ensinam Direito, quando na verdade ensinam o estudante de Direito a fazer a “feira da
 jurisprudência”. Esse processo de fazer a “feira da jurisprudência” significa encontrar
uma decisão consolidada, remansosa – como gosta de dizer o “senso comum teórico dos
 juristas” (Warat). É facilitada atualmente pela adoção de posturas totalitárias, como a do
Supremo Tribunal Federal ao editar no seu “site” a Constituição da República
interpretada pelos Ministros! Aplaudida pelos incautos de sempre, este documento é
fascista, porque sob a fachada de informação, esconde interesses inconfessáveis de
“normatização”, de uma “Constituição do Conforto Hermenêutico”. Não foi à toa que a
Emenda Constitucional n. 45 consagrou a Súmula Vinculante, a qual deve ter resistência
constitucional, como quer Lenio Streck, redundando no que aponta como a “baixa
constitucionalização do Direito”.
5. Cabe destacar, também, no campo penal, que com a queda do Muro de Berlim e o
fim da guerra fria, para justificação da opressão, precisou-se de um novo inimigo , não
mais externo , mas interno. Nesse contexto, o discurso de almanaque tornou, por razoável
tempo, a droga o grande bode expiatório  dos males mundiais, justificando, assim, a
intervenção dos “Guardiães Mundiais”, os Estados Unidos da América – EUA – na
preservação do “bem mundial” (Rosa del Omo). Entretanto, com os ataques de 11 de
setembro, o foco modificou-se para os “terroristas” (Walter Russel Mead). Essa figura
oculta, de difícil compreensão, desde uma intolerância ocidental, num mundo
globalizado (Beck), autoriza, pela “necessidade” a suspensão do Estado Democrático de
Direito (Agamben). O desconhecido, o estrangeiro (Julia Kristeva, com base na
psicanálise, sabe que ele atua justamente em nós), o mito, o demônio com nova
roupagem, materializado pelo “terrorista” que funciona como um estereótipo de tudo o
que atrapalha a “paz” da nova “ordem mercadológica neoliberal mundial”.
6. Agamben aponta que o poder encontra-se na “exceção”, a saber, na possibilidade
de que se exclua a regra de aplicação geral e se promova, para o caso, uma outra decisão,
apartada dos Princípios da Legalidade e da Igualdade. Esse poder encontra-se indicado
pela estrutura, segundo a qual existe um lugar autorizado a escolher, que se encontra, ao
mesmo tempo, dentro e fora de uma estrutura jurídica, conforme o pensamento de Carl
Schmi, na interseção entre o jurídico e político. Esta distinção, todavia, entre jurídico e
político precisa ser problematizada, não se podendo colocar, em absoluto,
incomunicáveis, apesar de ocuparem lugares diversos (Zizek e Werneck Vianna). Neste
pensar, segundo Agamben, “o estado de exceção apresenta-se como a forma legal daquilo que
não pode ter forma legal.”  Desta maneira, rompendo com uma concepção platônica de
Verdade e Justiça, bem assim de que a linguagem não é o meio de adequação da
realidade (Heidegger e Streck), o processo ganha um lugar de limite (Fazzalari e Catoni).
U m limite  que cerca, mas não consegue segurar o “poder de exceção”, até porque se
mantido o discurso da salvação, em nome da “bondade dos bons” (Agostinho Ramalho
Marques Neto), vale tudo.
7. Evidentemente que esta afirmação precisa ser adubada com muita empulhação
ideológica – Direito Penal do Inimigo  de Günter Jakobs, ou Teoria das Janelas
Quebradas – importada do aplaudido primeiro mundo. Essa postura Pangloss (Voltaire)
serve, muito bem, aos interesses ideológicosque manipulam os atores jurídicos. Com
estes ingredientes, facilmente instaura-se o processo penal de exceção , cujo fundamento
de conter as mazelas sociais e brindar os privilegiados consumidores com segurança,
encontra antecedente histórico nas ditaduras. Plenos poderes, apreensões de
averiguação, prisão provisória de regra, tortura (psicológica, física e química), tudo passa
a ser justificado em nome de um argumento cínico maior: o “bem comum”, consistente
na segurança de todos, inclusive de quem está sendo apreendido e, eventualmente,
excluído. O Direito de Exceção , em nome do bem dos acusados, e antes da Sociedade,
suspende as garantias processuais, previstas na Constituição da República e nos Tratados
de Direitos Humanos, por entender que elas são um entrave à redenção moral do infrator
e à Segurança Coletiva. Assim é que, seguindo Agamben, é necessário se buscar parar
esta máquina, para que os acusados não se transformem – mais ainda – na figura do
“musulmán” de Auschwitz  retratada por Agamben. Embalados pela necessidade de
conter a (criada) escalada de atos criminal, ou seja, a estrutura cria a exclusão e depois
sorri propondo a exclusão novamente, via sistema penal, e os excelentes funcionários
públicos nefelibatas – tal qual Eichmann –, na melhor expressão Kantiana, cumprem suas
funções, sem limites. Existe uma co-responsabilidade social (Zafaroni-Pierangeli), da qual
somente se pode tangenciar – como de costume – cinicamente. Para esses, no interesse
do acusado, a necessidade  derruba qualquer barreira processual, pois, sabe-se com
Agamben, que a necessidade não tem lei , isto é, não reconhece qualquer limitação,
criando sua própria lei. A construção fomentada e artificial de um estado de risco,
adubada pelo terrorismo, faz com o que o discurso se autorize, em face das ditas
necessidades, a suspender o Estado Democrático de Direito, promovendo uma incisão de
emergência e total.
8. Em nome da claridade  surge a explosão do controle total, lembrando George
Orwell, em seu “1984”. Entretanto, a obscena pretensão de transparência total, em nome
do (dito) interesse público, bem demonstrada na tese de doutorado de Túlio Lima
Vianna, esconde interesses ideológicos obliterados da discussão manifesta. É no latente,
no que marca o “sublime objeto da ideologia”, para usar uma expressão de Zizek, que
desponta o que tocaia. Por isto que estas considerações procuram estabelecer um diálogo
a partir da Economia. A eficiência do controle é compartilhada pela questão dos custos.
A Análise Econômica do Direito Penal – “AEDP” – defendida por muitos, dentre eles
Posner, inclusive uns que se alastram no Brasil, defende que o “crime” precisa, ainda e
necessariamente, atender o critério de custos. O cárcere é caro, custa muito. O RDD –
Regime Disciplinar Diferenciado – é simbolicamente importante para o discurso
totalitário (e inconstitucional), mas não justifica sua universalização por aumentar
despesa. Logo, a pretensão de muitos é o estabelecimento de controles em liberdade, de
toda a sociedade, tornando-se esta num “panóptico digital”. Perceba-se que com isto se
controla, via um simples GPS ou um fone NEXTEL, a localização, por rua, do assujeitado,
por Monitoramento Eletrônico ou mesmo via cartão de crédito e telefone celular, por
suas antenas. Além disso, controla-se onde se esteve e se impede, pensam, as re-uniões
criminosas. Daí é que em nome da eficiência do controle, invoca-se “Tim Maia” e “vale
tudo”. O Direito que procura fazer obstáculo é tornado, em nome da segurança de todos,
reflexivo. Puro embuste.
9. De qualquer forma, isto é evidente, existe um inescondível condicionante
econômico para que a realidade, entendida como os limites simbólicos, seja manipulada
na ambivalência “medo-segurança”, que toca no mais íntimo e estranho do sujeito
(Freud) . Monitorar, registrar e reconhecer , diz Túlio Vianna, para o seu próprio bem,
implica, necessariamente numa versão de Estado Totalitário. A banalização ideológica,
em nome do discurso único do capital, apresenta sob a flâmula sedutora da Liberdade
toda sorte de justificativas para o fenecimento da solidariedade. Com o egoísmo, os
meios, tudo passa a se justificar. As pretensões éticas (bem) e morais (bom) devem se
adaptar às necessidades de um Mercado sem lei, sem limite, cujo muro se avizinha . Sem
limite, por básico, não há desejo. A questão parece ser que a destruição da ficção Estado
abre espaço para a Liberdade  representada pelo Mercado. Nessa ironia de defender a
iberdade  de todos mediante o agigantamento do controle, parece-me, num giro de
linguagem, aplicável plenamente ao discurso neoliberal e suas teorias (Justiça, Direito
Penal do Inimigo, etc..). O Direito Penal, no projeto Neoliberal , possui papel fundamental
na manutenção do sistema, eis que mediante a (dita) legitimação do uso da coerção,
impõe a exclusão  do mundo da vida com sujeitos engajados no projeto social-jurídico
naturalizado, sem que se dêem conta de seus verdadeiros papéis sociais. Acredita-se que
se é um excepcional funcionário público, tal qual Eichmann (em Jerusalém), ou seja, um
sujeito cuja normalidade indicava a “Normalpatia” apontada por L.F. Barros, isto é, no
seu excesso patológico. Esta a submissão alienada é vivenciada dramaticamente pelos
metidos no processo penal.
10. O discurso do ‘determinismo positivista’ é realimentado em face das
condicionantes sociais, reeditando a necessidade de ‘tutelar’ os desviantes –
consumidores falhos, “lixo humano”, como se refere Bauman – mediante prevenção ,
repressão e terapia. O Estado Intervencionista da ‘Nova Escola Penal’ está de volta na sua
missão de defender os cidadãos ‘bons e sadios’ dos ‘maus e doentes’, desenterrando o
discurso etiológico, perfeitamente conveniente para mídia e para classe dominante. Sob o
mote de curar ao mal , tendo a sociedade como um organismo vivo, na perspectiva de
uma vida social sadia, a violência oficial se mostra mais do que justificada: é necessária à
sobrevivência social, ainda mais contra o “terrorista social”.
11. Agamben deixa evidenciado que o poder soberano se apropria do poder de dizer
o direito, podendo o Princípio da Legalidade cercar, sem nunca segurar, por básico, o
sentido que advém de um processo constante de compreensão. Entre texto (fato gráfico)
e norma (produto da interpretação), diz Cordero, existem opções múltiplas que somente
os iludidos de sempre conseguem acreditar, em sua fé inabalável, em sentidos unívocos,
ou seja, em segurança jurídica. O Princípio da Legalidade e a Segurança Jurídica, assim,
são dois presentes trazidos por “Papai Noel” aos felizes “atores jurídicos analfabetos
funcionais” em Direito e que se esgueiram, todos os dias, nos foros deste imenso país. A
sensação que se apresenta, em cada processo penal, é a de que se vive numa fantasia
paranóica, a saber, imaginária: uma farsa. Algo que foi nomeado (por mim) como sendo
Complexo de Truman. Muitos acreditam que o processo é a realidade, perfeitamente
construída para apaziguar a falta nossa de cada dia. Uma fraude para manter os atores
 jurídicos artificialmente felizes. Não há mundo além do processo, do semblante
construído por significantes. É a posição nefelibata. No filme foi preciso arrombar a
porta para se dar conta de que existe mais. Enfim, que existe um mundo para além do
construído artificialmente. Este é o desafio. Zizek, Warat e Mellman falam do homem
sem gravidade , de baixa calorias, que vive por viver, vai – talvez embalado por uma
destas teorias orientais da moda – sem eira nem beira. Mas existem vítimas! Que se
danem – dizem –, não sou eu. Essa lógica “do meu umbigo” move, de regra, os enleados
no processo penal. Uma fraude encenada em que se mantém a pose de democrata, com
muita maquilagem cínica e a vítima, o Homo-Sacer de Agamben, não tem pena, se aplica
pena.
12. As vidas que se escondem nos processos penais, na sua grande maioria, são
irreais para os promotores, advogados e juízes que assistem como se fosse mais um filme
de mau-gosto, protagonizado por artistas que nãomerecem o papel. Deveriam ser
retirados de cena. E são!. É preciso retornar ao que Zizek aponta como o “Deserto do
Real”, saindo do semblante do universo processual artificial construído para que
possamos, como jogadores do processo, esquecer que existem pessoas morrendo. Gente.
Como qualquer um intervenientes do processo. Mas como não se consegue ter a
dimensão do que acontece, dado que o semblante da ficção e suas verdades, para alguns
Real, ocupa o lugar do que se passa.   Esse discernimento entre o real e o ficcional é o
desafio num mundo sem perspectivas que não o “Shopping Center”.
13. Acrescente-se a isto tudo um vagaroso e eficaz processo de cooptação ideológica ,
na linha de Gramsci, dos atores jurídicos, pretensamente participantes da classe média e
do consumo. Sedentos por segurança querem excluir, prender, matar simbolicamente, os
de sempre: o diferente. A perspectiva de que querem acabar com a nossa paz social –
nunca obtidade ou mesmo existente – que transforma o “furtador” – de xampu a carteiras
– no “terrorista” responsável por nossa toda a infelicidade coletiva. Então, cadeia neles!.
Penas mais altas. Exclusão! Mas como não funciona, porque não dá conta, mesmo, surge
a compulsão por mais condenações, prisões, execuções, ideías loucas de castração,
coleiras, Sex offender , apitos....
14. Esses dias, um amigo – o Zé –, pessoa do povo, perguntou-me porque quem é
preso em flagrante não vai direto cumprir pena? Por que o processo? Respondi que
estamos, ainda, numa democracia em que o processo como procedimento em
contraditório (Fazzalari) é o mecanismo democrático para se apurar a responsabilidade
de alguém. Ele me respondeu que não precisa. Entendi a posição dele, até porque um
homem pragmático. No Brasil, essa posição de execução antecipada, embora vedada pela
Constituição, continua sendo a prática. Basta perceber que se homologa flagrante
formalmente em diversas comarcas, nega-se a soltura de meros conduzidos com as
 justificativas mais loucas, tudo em nome da paz da sociedade, como Bush fez para atacar
o mundo, bem sabem os Iraquianos. Isto bem demonstra a estrutura Inquisitória do
Sistema Processual Penal brasileiro que mantém a pose democrática, mas exerce a mais
violenta forma de sequestro preliminar da liberdade . Todavia, quem respira um pouco
de oxigênio democrático, sabe que somente o processo pode fazer ceder, via decisão
transitada em julgado, a muralha da presunção de inocência , justamente porque é a
urisdição a única que pode assim proceder. Ferrajoli bem sabe da impossibilidade de se
extinguir as prisões cautelares (Leandro Goernick). Entretanto, mostra-se intolerável que
as pessoas fiquem presas sem culpa, sem processo, presas pelo que são e não pelo que
fizeram, em processos decorrentes de “furtos de moinhos de ventos”. O processo precisa
de tempo, e tempo é dinheiro. No mundo da eficiência, todavia, quer-se condenações no
melhor estilo dos Tribunais Nazistas. Imediatamente. Sem direito de defesa e
transmitidas ao vivo, com patrocinadores a peso de ouro e muita audiência: plim-plim.  A
fórmula é a de sempre: Juvenal dizia: Pão e Circo. E quando acontecem
prisões/condenações como a de Zé Dirceu e/ou Paulo Maluf a coisa fica pior, porque a
Esquerda Punitiva é caolha, bem sabe Maria Lúcia Karam, não se dá conta de que
relegitima o sistema penal, indica Juarez Cirino dos Santos. “ Agora até o fulano vai preso”.
E se Ele vai preso, com mais razão o “ladrãozinho” de frango de Televisão de Cachorro
também. Então, quando se fala, na EC/45 de prazo razoável para os processos, muitos
aplaudem a novidade, não fosse ela já uma velha disposição Constitucional, aderida ao
corpo dos direitos fundamentais por força do art. 5o, § 2o, da CR/88. Para saber disso,
contudo, seria preciso conhecer os Direitos Humanos, coisa que poucos conhecem... Daí
que a barbárie se instaura e dá no que dá! Mediante um giro de sentido, os nazistas de
plantão passaram a dizer que o a Sociedade (e não o acusado) precisa da decisão num
prazo razoável e por isso a sumarização do processo, com a restrição da defesa. As
alquimias, como fala Aury Lopes Jr, começaram. Inverte-se a lógica em nome do Bem, do
 Justo, lugar sempre empulhador.
15. Demora-se muito para julgar porque fora a esculhambação que são os Juizados
Especiais Criminais , onde vale tudo e se dá um tratamento rápido e inconstitucional a
questões sociais, a saber, dificilmente um Termo Circunstanciado é crime: pode ser briga
entre parentes, vizinhos, xingamentos, latido de cachorro, direito de vizinhança. Mas
como não se têm acesso ao Judiciário no Cível, resta a “queixa” na Delegacia. Um
programa de auditório de mau-gosto, onde os pobres entram com sua ficha de
antecedentes e, até, com o corpo. No juízo comum, denuncia-se falta de pagamento de
imposto, furto de sabonete, calcinha e coisas do gênero. Não sobra tempo, de fato, para o
que importa numa sociedade em que o Direito Penal deveria ser mínimo (Ferrajoli e Salo
de Carvalho). Se for mínimo, contudo, não faz o que é sua função oculta (Baraa):
criminalizar a pobreza, os consumidores falhos, mantendo a “hi-Society” nas suas
coberturas sociais.
16. Alguma coisa anda fora da ordem, dizia Caetano há um tempo. Hoje as coisas já
estão dentro da nova ordem neoliberal mundial, inclusive o processo penal: Sumário,
eficiente. De outro lado, o Conselho Nacional da Justiça, órgão criado para ser o Grande
Irmão de Orwell. Diretamente de 1984 para 2013, começa a fazer seus estragos, apesar de
seu possível papel democrático. Um “denuncismo” sem precedentes, onde não raro
surgem as vaidades afloradas, os narcisismos das pequenas diferenças, diria Freud.
Números, eficiência, empulhação... Para que direito de defesa se tenho que baixar o meu
mapa? Para que ouvida de testemunhas se o processo vai ficar no mapa? O Juiz
Astrólogo: só quer saber de mapa . Ainda mais quando depende da produtividade para
conseguir promoção! A pretensão de transparência e eficiência do Judiciário tornou a
situação extremamente ambígua. Por outro lado, defende-se a formação permanente dos
magistrados via Escolas da Magistratura, as quais escondem o efeito de normatização dos
 juristas analfabetos funcionais e, por outro, não se quer pensamento crítico, mas
cumprimento das decisões do STF e STJ. Eficiência, facilidade, cursos “rápidos de como
fazer uma decisão” para aprender a posição dominante, controlar as idéias e do acesso à
carreira, bem sabia Lyra Filho. Enfim, a docilização, normatização indicada por Foucault.
17. O Processo Penal Democrático , assim, parafraseando Dworkin, precisa ser
levado a sério. O problema fundamental reside no fato de que a justificativa para a
exceção encontra-se encoberta ideologicamente. Acredita-se, muito de boa-fé, a maioria,
de que se está realizando o bem. Salvando a Sociedade de um “Terrorista Social”.
Esqueceu-se de que para o uso do poder existem pelo menos dois limites: o processo e o
ético (Dussel). Exercer uma parcela do poder em face dos acusados é muito mais
tranquilo para os kantianos de sempre, fiéis cumpridores das normas jurídicas, sejam elas
quais forem. Os “acusados-terroristas-sociais” passam a ser uma das faces da vida nua,
isto é, “homo sacer”, a que é matável, mas não sacrificável. Assim, os rostos do poder
encontram-se maleáveis, mutantes, em torno de um lugar pensado para não pensar, mas
para cumprir acriticamente. Os soldados juízes estão aí para aplicar a regra, numa
Filosofia de “Cruz Vermelha” (Cyro Marcos da Silva), rumo a salvação eficiente das almas
destes pobres de espírito. Até quando viverão felizes para sempre? Rever e compreender
a mirada é o desafio, sempre. A tarefa, percebe-se, não é singela, mormente porque é
necessário abjurar o que se acreditou com tanta fé, além de se expor à crítica virulenta
dos iludidos de sempre, cujo véu moral cega qualquer pretensão democrática, já que
acreditam – o Imaginário  deslizando – estar comprando um lugar no céu, na Ilha dos
bençoados. Não se pode ter medo de resistir . É preciso resgatar a Constituição
Originária,na linha de Paulo Bonavides, exercitar o controle de constitucionalidade
difuso e deixar de fazer como todo mundo faz. Porque assistir de camarote o que se passa
com as vítimas do sistema penal não exclui nossa responsabilidade ética com as mortes:
somos co-autores, do nosso lugar, por omissão. Por isso que ao se defender garantias
constitucionais, hoje, o sujeito pode ser preso em flagrante, sem liberdade provisória
diante dos “maus antecedentes”...
18. Quando Georg Lukács foi preso, o policial perguntou se estava armado, tendo
este lhe entregue calmamente a caneta. É preciso que as canetas pesem
democraticamente, mediante processo penal garantista (Ferrajoli) a partir da teoria dos
 jogos. É preciso correr-se riscos, porque preferível perecer pelas extremos do que pelas
extremidades, como aponta Baudrillard.
Capítulo 1°
Para entender o Processo Penal
a partir da Teoria dos Jogos
e da Guerra
1. O processo como jogo
1.1. Em texto clássico – O processo como jogo[4]  – Calamandrei afirmava que
decorar as regras de xadrez não torna o sujeito um grande enxadrista[5] , bem como saber
as regras processuais não o capacita, por si, como grande jogador processual. É claro que
entender de dogmática (crítica) se constitui como pressuposto de atuação adequada. Isso
porque o jogo processual se estrutura em 3 (três) níveis: (a) o das normas processuais; (b)
do discurso lançado processualmente e seus condicionantes internos/externos e, (c) da
singularidade do processo (seu julgador e seus jogadores). Ao mesmo tempo em que a
estrutura é universal  (pelo menos normativamente, ainda que se possa discutir a
aplicabilidade de algumas disposições em face da CR), a singularidade do caso demanda,
no campo penal, a especialidade: cada decisão é uma decisão, não se podendo julgar em
“bloco” no crime.
1. 2. As normas processuais ainda que possam buscar a estabilização das
expectativas de comportamento processual , na sua dinâmica temporal e singular,
acabam ganhando sentidos muitas vezes impensados ou mesmo condicionados a fatores
externos. Esses elementos podem ser vistos desde uma postura estruturalmente (a)
estática e (b) dinâmica, com informação (a) completa ou (b) incompleta . Daí que a
compreensão idealizada do processo penal não se sustenta porque desconsidera as
contingências de cada jogo processual e a complexidade da questão hermenêutica[6]. É
preciso ir adiante e entender o processo penal como jogo dinâmico e de informação
incompleta.  Para além do cumprimento das normas processuais deve existir tática
vinculada à estratégia de conteúdo variado[7] , a saber, por mais que durante a instrução
processual a tese acusatória ou defensiva esteja antecedentemente posta, no decorrer,
diante dos significantes probatórios envolvidos, do contexto processual, dos jogadores,
do acusado, do julgador, cabem novos desígnios [8]. Enfim, as normas processuais
aparentemente apresentam elementos de universalidade, embora se saiba que as
contingências podem alterar os sentidos por diversos fatores (internos e externos)[9]. A
imaginação  enleada pela trama processual penal é de fundamental importância. O Fair
lay (jogo democraticamente limpo) decorre da batalha de habilidades entrecortada nos
autos, não sendo permitido, assim, trapacear[10].
1. 3. Estratégia não é apenas o nível operacional do jogo processual. É mais. Cada ato
do jogo processual existe no contexto de um processo singular no qual existem diversas
táticas (meios de produzir provas, selecionar perguntas, temas, etc.). A sucessão de êxitos
pode terminar na próxima batalha (subjogo), dado que a cada momento a partida pode se
reequilibrar. Há movimento no jogo processual e a batalha não está ganha até o final:
dinamicidade. Assim é que as táticas (o que os jogadores fazem no decorrer da partida) e
a estratégia  (o uso dos resultados no objetivo do jogo) fornecem dupla articulação ,
comunicando-se a todo o tempo.
2. Teoria dos Jogos
2.1. A teoria dos jogos apresenta nova dinâmica de compreensão do processo
penal[11].  O pressuposto é que o sujeito racional  toma (sempre) decisões que lhe são
mais favoráveis, egoísticas, ou seja, as que lhe indicam maiores benefícios. Entretanto,
nem sempre as decisões aparentemente melhores individualmente o são no contexto de
jogos interdependentes , como acontece no Processo Penal, sendo o Dilema do
Prisioneiro  o exemplo teórico de tal modelo. Para se entender a proposta é preciso
estabelecer os lugares do jogo: a) julgador  (juiz, desembargadores, ministros; b)
jogadores (acusação, assistente de acusação, defensor e acusado); c) a estratégia de cada
 jogador (uso do resultado), d) tática das jogadas (movimentos de cada subjogo) e; e) os
ayoffs (ganhos ou retornos) de cada jogador com a estratégia e tática.
2.2. Com efeito, a Microeconomia[12]  busca indicar as expectativas de
comportamento dos sujeitos (escolha racional na busca de maximização de utilidade) a
partir da relação entre fins (alternativos entre si) e meios (de recursos escassos) [13].
Cooter e Ulen afirmam: “O direito frequentemente se defronta com situações em que há poucos
tomadores de decisões e em que a ação ótima a ser executada por uma pessoa depende do que outro
agente econômico escolher. Essas situações são como os jogos, pois as pessoas precisam decidir por
uma estratégia. Uma estratégia é um plano de ação que responde às reações de outras
essoas.  A teoria dos jogos lida com qualquer situação em que a estratégia seja
mportante.”[14] No caso no processo Penal pode ser utilizado para fundamentar tanto
estratégia processual  como tática específica . Aceitar ou não a suspensão condicional do
processo, transação penal, enfim, cotejar as informações e propiciar a tomada de decisões
de maneira a mais informada possível.
2.3. O Dilema do Prisioneiro foi criado por Merrill Flood e Melvin Dresher, em 1950,
com repercussões em diversos campos do conhecimento, também no direito processual.
É apresentado por Robert Nozik da seguinte forma: “Um delegado oferece a dois prisioneiros
que aguardam julgamento as seguintes opões. (A situação é simétrica para os prisioneiros; eles
não podem se comunicar para coordenar as ações em resposta à proposta do delegado ou, se
 puderem, ele não tem nenhum meio para forçar qualquer acordo que possam desejar). Se um
 prisioneiro confessar e outro não, o primeiro é l iberado e o segundo recebe uma pena de 12 anos de
 prisão; se ambos confessarem, cada um recebe uma pena de 10 anos de prisão; se nenhum
confessar, cada um recebe uma sentença de 2 anos.” Pimentel explica: “Qualquer que seja a ação
do outro, cada prisioneiro obtém um resultado melhor para si se confessar, isto é, se não cooperar
com seu parceiro. Imaginemos que o prisioneiro A confesse. O prisioneiro B pode confessar e
ambos pegam 10 anos de prisão, ou não confessar e pegar 12 anos de prisão: o melhor é confessar.
Se A não confessar, B pode confessar e ficar livre, ou não confessar e pegar 2 anos de prisão. Mais
uma vez, o melhor é confessar. O que quer que A faça, o melhor resultado individual para B é 
confessar, isto é, não cooperar e entregar o companheiro. O mesmo raciocínio vale para A. O que
há de paradoxal nesta situação no entanto é que ao buscar o maior benefício individual,
ambos chegam a um resultado pior do que aquele que teriam obtido se tivessem cooperado.
e fato, se ambos confessarem, ambos terão uma pena de 10 anos, e se nenhum dos dois o fizer,
terão uma pena de 2 anos. Há um conflito entre o cálculo do benefício individual e o melhor
resultado coeltivo: se julgarmos que a decisão racional é aquela que leva o maior benefício
individual, dois agentes que tomassem suas decisões seguindo um cálculo racional não
conseguiriam o melhor resultado. Dito de outro modo, se ambos os jogadores confessarem, cada
um irá piorar o resultado obtido do que aquele obtido se não confessar, mas é possível atingir
uma solução melhor para ambos se ambos desistirem de confessar.”[15]
2.4. A não cooperação entre os agentes leva a um resultado pior individualmentedo
que se houvesse a cooperação, isto é, a estratégia dominante é prejudicial. Daí que não se
pode começar ou permanecer numa guerra/jogo por meio de julgamentos aparentemente
racionais, desprovidos de avaliações contingentes das consequências das consequências.
O Dilema do Prisioneiro demonstra que o resultado coletivo não decorre
necessariamente de escolhas individuais egoístas, mas de contingências e interações
inerentes ao jogo processual.[16]
2.5.. A teoria dos jogos para fins desse escrito será utilizada exclusivamente a partir
da noção de “Jogos dinâmicos e de informação incompleta” . Dentre as diversas
classificações, acolhe-se a que se dá em 4 (quatro) modelos: a - jogos estáticos e de
informação completa: analisada todas as possibilidades e informações, a decisão se dará
pelo equilíbrio de Nash, uma vez que jogadores racionais fariam a melhor opção pessoal.
Entretanto, tal situação é confrontada pelo Dilema do Prisioneiro, já que não seria um
ótimo de Pareto, a saber, a melhor racionalidade individual significa resultado
prejudicial para todos; b – jogos dinâmicos e de informação completa : ao contrário de
uma jogada, a sucessão de estágios faz com que etapa – subjogo – exija constante
avaliação das possibilidades e antecipações de sentido, mas acabam, em cada subjogo,
reiterando a opção individual do equilíbrio de Nash, ou seja estratégias não-cooperativas;
c – jogos estáticos de informação incompleta; ainda que apenas um estágio de jogo, não
se sabe a avaliação dos demais jogadores, por exemplo, como acontece nos leilões em que
não sabe o valor que os demais jogadores darão ao bem leiloado. Prevalece a lógica de
Thomas Bayes, a saber, depende da crença nas probabilidades pessoais e morais, então
subjetivas, não exclusivamente racionais/objetivas, e; d – jogos dinâmicos de informação
incompleta: é o modelo que se pretende aplicar ao processo penal, pelo qual se precisa
entender que tipo de jogador  se está enfrentando e qual o julgador  a quem se dirige a
informação do jogo. Na fusão de horizontes de informação representando pelo processo
penal, é importante (saber) antecipar as motivações (objetivas, subjetivas e
inconscientes) dos jogadores e julgador, especialmente no tipo de informação
apresentada e nas surpresas (trunfos) ainda não informados. O resultado depende da
sucessão de subjogos e da informação-prova validamente trazida ao contexto do jogo.
3. O Jogo de Guerra Processual
3.1. Se o processo é uma guerra  autorizada pelo Estado em que o mais forte não
necessariamente ganha, mesmo assim, os fundamentos da Teoria da Guerra[17] podem
ser invocados para se buscar entender a lógica do processo penal desde que vinculadas à
teoria dos jogos[18] , até porque o fundamento da guerra e da pena é o mesmo (teoria
agnóstica da pena[19]). A guerra processual busca o confronto e a vitória , muitas vezes
sem levar em conta os custos e os recursos necessários e disponíveis, especialmente
diante da escassez[20]. Daí que a existência de uma tática bem sucedida pode gerar
espaço para negociação no iter  processual. No decorrer da instrução, diante das
sucessivas jogadas (subjogos), não raro, surge realinhamento dos objetivos possíveis.
3.2. A dinâmica do jogo processual entendido pela metáfora da guerra sustenta algo
e m desequilíbrio. A questão é bem complexa e nessa versão compacta  cabe sublinhar
que no processo penal se instaura modalidade de competição (jogo), na qual se pode
invocar o Equilíbio de Nash e entender o motivo da dificuldade de cooperação. No jogo
processual, de regra, o julgador  e os jogadores[21]  tomam decisões egoístas a partir da
análise de custos e benefícios individuais (payoffs) e não levam em consideração as
consequências das consequências , a saber, as externalidades[22] e prejuízos individuais
(dos demais jogadores) e à coletividade[23].
3.3. A incerteza e opacidade[24]  do campo de batalha processual podem ser
chamados de atritos , como queria Clausewitz, ao exigirem a tomada de posição
estratégica e tática , antecipando os movimentos do jogador. A transformação do
processo em jogo de guerra possibilita entender a pressão externa de personagens,
especialmente do populismo penal[25]: a) mídia – vende o produto crime; b) políticos –
que usam o medo como plataforma política; c) máfia, crime organizado , - lavagem de
dinheiro, tráfico de drogas e pessoas, os quais podem intervir na prova (coação); d)
polícia – para valorizar seu status; e) magistrados, Ministério Público, defensores . Esses
novos jogos penais viciados pelo populismo não servem para estabilizar, mas para
renovar o estado de medo e pânico.  Se sabe que a pena não resolve, nem encaminha a
questão. A crença no aumento de punições e processos penais céleres, sem garantias
processuais, fomenta a sensação de segurança, tão imaginária quanto as histórias
infantis, ainda que vendidas pela mídia delivery e manejadas politicamente. Vende-se o
crime como o sintoma do mal a ser extirpado[26]. É preciso entender a relação entre jogo
processual e política. Sem isso a leitura do processo penal e dos movimentos de
recrudescimento é ingênua. O processo pode cooperar com o controle social. Não pode
ser um aliado de trincheira. Se assim se postar perde a dimensão coletiva de garantia que
a razão exige. É necessária certa autonomia do processo penal. Não se pode condenar
ninguém, em Democracia, em nome de fins políticos ou midiáticos. Daí a função
contramajoritária do processo penal: deve ser o jogo democrático pelo qual se pode, ao
final, se e somente se, cumpridas as normas, aplicar-se uma sanção estatal (Cap. 3o). Do
contrário a trapaça prevalecerá[27].
3.4. Daí que o domínio das normas processuais, ainda que importante para
compreensão do fenômeno processual, depende, ainda, das noções teóricas (penais,
processuais e criminológicas) do julgador  e dos jogadores  envolvidos, não só
formalmente, mas sim materialmente[28]. Poderão ser movidos pela vitória a qualquer
custo – mesmo de provas ilícitas – em nome de um “bem” (dito) maior, por exemplo, a
diminuição da criminalidade, ou pelo acolhimento de função de garantia (defesa dos
direitos individuais). Talvez a assunção alienada da noção de guerra seja verificável
quando o jogador, em nome do resultado, aceita mitigar os princípios da própria guerra,
uma vez que a necessidade de vitória exclui a legalidade impeditiva do êxito. Ainda que
haja vitória, tal qual na trapaça, há mácula democrática. Se o resultado condenar sempre
é o leitmov , pouco resta para impedir a fraude e a ilegalidade[29]. Essa tensão entre
segurança coletiva e direitos individuais não é novidade[30]. De qualquer sorte,
dependerá de escolhas antecedentes a maneira pela qual o julgador e os jogadores se
postarão diante da informação probatória trazida.
3.5. O processo judicial possui a tendência de ficar intenso e o momento de
produção probatória encontra seu ápice[31]. O atrito  como a forma de dificuldades de
informação  faz com que a prova  seja sempre uma exceção e, como tal, inserida numa
lógica singular, sem universalismos. Deve-se, pois, (i) dominar a teoria processual e de
direito penal; (ii) ter-se experiência de jogo (de combate) ou treinamento e (iii) entender
o caráter cambiante do jogo e das sucessivas rodadas (subjogos).
3.6. Parece inevitável que se possa compreender a ação do julgador e dos jogadores
no processo penal como o resultado de uma fusão temporal de horizontes (decisão
 judicial) e perspectivas sobre o(s) mesmo(s) acontecimentos do mundo da vida
(imputação). A racionalidade pública pela qual se apurará a responsabilidade penal do
agente (culpabilidade) é o processo penal[32] , pelo qual os jogadores  (acusador e
defensor) lançarão a estratégia (pretensões de validade) nos subjogos , mediados pelas
normas processuais (regulação da informação-prova), com o fim de obter a vitória
(decisão favorável do julgador).
4. A teoria de processo como jogo processual
4.1. O processo penal, assim, é um jogo assimétrico de informação.  Os jogadores
não possuem, ex ante , todasas informações que comporão o acervo processual ao final da
instrução e há necessidade constante de reavaliações das táticas  utilizadas. No jogo
simétrico os jogadores sabem de antemão o conteúdo das informações existentes. Aqui,
diferentemente, as informações são antevistas, mas somente acontecem na cena
processual, a saber, no decorrer dos subjogos. É certo que as provas periciais e
documentais são elaboradas de forma paralela e/ou antecedente. Mesmo assim, a
valoração – atribuição de sentido – será debatida e consolidada somente no momento da
decisão judicial.
4.2. Nas situações estratégicas, nas quais o jogo não é cooperativo, a situação fica
mais complexa, pois o resultado depende das decisões dos demais jogadores e o
resultado é de conteúdo variável. Assim é que o enfrentamento do processo penal
brasileiro depende de posições antecedentes em relação a noções de Direito, Tipo
Penal[33], Constituição, Princípios, Regras, Norma Jurídica, etc., não se podendo falar
em processo penal idealizado. Embora se tenha regras processuais disposta na CR e no
CPP, em cada processo individualizado, com seu julgador  e seus seus jogadores ,
acontecerá jogo único. As diversas compreensões comporão o fenômeno processual
numa verdadeira fusão de horizontes, naquilo que se chamou de bricolage de
significantes[34] (Cap. 7o).
4.3. No caso do processo penal o jogador-acusador  possui o dever legal de antecipar
às informações que pretende trazer ao jogo, enquanto o jogador-defensor   organiza a
estratégia e táticas a partir dos movimentos do jogador-acusador . Diante de uma ação da
parte, no campo do discurso, abrem-se 3 (três) movimentos táticos[35]: a) silêncio/inação;
b) contra-ataque; c) tangenciar/derivação.  Essa dinâmica se divide em diversos
momentos probatórios e processuais, vinculadas à finalidade. No ponto de partida da
ação penal sabe-se que o jogador-acusador quer a vitória (expectativa de decisão
favorável: condenação), enquanto o jogador-defensor pretende também a vitória
(expectativa de decisão favorável: absolvição). Diante da presunção de inocência,
pressuposto do processo penal democrático, a saber, o acusado larga absolvido, a função
do jogador-defesa é evitar a tomada do “forte”, como nos jogos de guerra, ou seja,
impedir a tomada dos domínios da presunção de inocência. Daí que ao longo da corrida
procesual os subjogos  vão se sucedendo e é preciso antecipar os movimentos
processuais[36] , prevendo, ex ante , táticas críveis[37]. A quantidade e a qualidade das
informações  antes de cada rodada processual (subjogo) implicam em constantes
alterações táticas[38]  e de estratégia[39]. Buscar a Verdade Real “do” e “no” processo
penal é uma forma ingênua e absurda de atuação. O desvelar subjetivo do jogo
processual[40]  apresenta o processo penal dentro do contexto dinâmico e sujeito às
contingências do mundo da vida[41].
4.4. No estabelecimento da dinâmica ataque-defesa a informação é assimétrica . A
acusação como primeiro ataque deve esperar a contra-ofensiva. Nas palavras de guerra a
“tomada do forte” do jogador oponente é a meta. Nesse objetivo, não raro, precisa-se
analisar as possibilidades, adiar a ofensiva, alterar os meios probatórios, cotejando a todo
o momento as melhores oportunidades. Não se trata de um check-list , nem de protocolo
linear. A instabilidade de cada rodada do jogo processual exige jogadores atentos ao
lance do oponente, bem assim a antecipação da antecipação das possíveis jogadas. A
incerteza aqui é inerente ao jogo processual e os cálculos permanentes. A informação é
sempre parcial e vindoura. Depende das rodadas (subjogos). Ao final haverá a
oportunidade de alegações finais, claro, mas isso não impede a existência de surpresas.
Aliás, a surpresa , o benefício do terreno (conhecer o lugar e o julgador onde a partida se
desenrola) e o ataque convergente (focado nos tipos penais objeto da ação penal) se
constituem como elementos necessários à compreensão do fenômeno processual.
Antecipam, por assim dizer, as jogadas possíveis com o objetivo de vitória e a capacidade
de compreensão do julgador. Esse desenrolar se dará pela “informação” incluída no jogo
processual.
4.5. O controle da prova, dos jogadores, das cartas probatórias (informação), do
conteúdo da audiência, da credibilidade, do boato, enfim, dos fatores cambiantes
(significantes) da partida (guerra). A diferença no processo penal é que a acusação larga
na ofensiva, mostrando as cartas que pretende usar no jogo processual, enquanto a
defesa se posta na espera. A acusação procura antecipar os movimentos da defesa,
mitigando eventual álibi, mas mesmo assim a postura é pro-ativa. No decorrer da batalha
probatória, eventual sucesso parcial não necessariamente conduz à vitória, justamente
porque o impacto pode ser revertido pelas jogadas posteriores. Daí que a manutenção
das vitórias parciais (subjogos) deve se dar a todo o momento, transformando a atitude
de ataque em atitude defensiva. Dito de outra forma, obtidos significantes suficientes
para condenação, a juízo do acusador, a postura passa a de defender o universo
probatório já alcançado. A reciprocidade de lugares (ataque e defesa) variam no decorrer
do processo. Ainda que a defesa nada tenha que provar, a assunção de postura passiva
ignora a lógica da guerra. Não se trata de aceitar a carga probatória da defesa na busca da
comprovação da inocência, a qual é pressuposta – o acusado larga absolvido –, dado que é
a acusação que deve provar, no tempo processual, a culpa. A defesa [42]  deve adotar
táticas de resistência  e atacar em dois campos: (i) coerência  e (ii) completude. A
coerência e a completude das jogadas em face da acusação formalizada (imputação), ou
seja, devem no seu todo guardar pertinência narrativa[43]  e não deixar lacunas
suscetíveis de inserir a dúvida ( favor rei). A inserção de atrito na narrativa, instaurando
lacunas, omissões, contradições, dúvidas, obscuridades, parece ser uma das táticas
defensivas, as quais não jogam com a qualidade isolada das jogadas, mas justamente
apontam as contradições de seu conjunto (CPP, art. 386, VII).
4.6. Estratégia , para acusação , é o uso do processo para objetivo da pena, enquanto
para defesa  é o uso do processo para objetivo da absolvição. As estratégias são
simetricamente opostas. Superada a visão da verdade real, o processo como jogo e
inspirado pela guerra acolhe pretensões menos idealizadas e mais próximas da realidade.
O processo penal é o uso do confronto em contraditório para garantia da Democracia . É
o palco onde acontece a guerra de informações , estratégias e táticas com o fim de vencer
o jogo processual. Esperar pelo momento de ação e não sofrer pela ânsia do golpe final.
Ao mesmo tempo que cada jogo processual é singular (único), está inserido na dinâmica
de processos repetitivos. Daí a formação de padrões táticos  que podem não funcionar
pela ausência de cuidado com as informações preliminares e as possibilidades
probatórias. É o meio pelo qual o Estado sustenta o monopólio da força e justifica a
aplicação de pena. Significa a estratégia para se evitar os combates reais, substituídos
pela metáfora de guerra: jogo processual, no qual as táticas de cada batalha (subjogos) se
apresentam.
4.7. A dinâmica caótica do processo impede a linearidade . A fusão de horizontes
apresentada no processo judicial implica no reconhecimento de versão inventada e
corroborada. Jamais o certificado de acontecimento definitivamente comprovado. A
distinção entre Verdade Formal e Material demanda reconhecer em Kant [44] sua origem.
A distinção entre duas formas de verdade forjou o mal entendido. A verdade formal
vinculava proposições a leis do pensamento, falseando a realidade, enquanto a segunda
fundia essas percepções. A teoria da história mostra que fatos tidos como verdadeiros
são controvertidos e que a versão oficial pode se distanciar no que de fato ocorreu,
embora nunca se possa colocar-se uma última e definitiva versão. É claro que o processo
ao ser aparentemente retrospectivo[45]  implica naescolha dos elementos mais
interessantes, os quais restam sublinhados. Sempre, contudo, são parciais e representam
interesses não ditos. É nos jogos de linguagem[46] que o significante probatório ganhará
sentido no contexto em que é invocado.
4.8. O domínio da informação  nos jogos dinâmicos  implica na possibilidade de se
tomar decisões terminativas do processo, ou seja, sem análise do mérito. Reside
 justamente na avaliação da prova possível (informação) a aceitação de benefícios
processuais (conciliação, transação penal, suspensão condicional do processo, delação
premiada[47] , leniência, etc..). Com a informação até então apurada e as expectativas dos
subjogos no horizonte, o jogador pode avaliar quais as implicações de se jogar ou
não[48]. Dependendo do quantum da pena e da quantidade de processos em tramitação,
 bem assim da gestão da Unidade Jurisdicional, pode-se optar pelo processo e se buscar
uma prescrição, como aliás, é a tónica nos processos dos Juizados Especiais
Criminais.[49]  Na estratégia manejada no caso de jogos repetitivos pode acontecer que
com a interação continuada os jogadores possam antecipar os sentidos já dados e
observar novas estratégias ou concessões. Podem transformar, com isso, o jogo em mais
cooperativo ou não.
4.9. Dito de outra forma, o processo penal é um jogo mediado pelo Estado Juiz em
que a fortaleza da inocência, ponto de partida do jogo, é atacada pelo jogador acusador e
defendida pelo jogador defensor, sendo que no decorrer as posturas (ativa e passiva) se
alternam reciprocamente, devido ao caráter dinâmico do processo, a cada rodada
probatória (subjogos) e em face das variáveis cambiantes. O jogador-acusador pretende
romper com a fortaleza da inocência, enquanto a defesa sustenta as muralhas.  Rompido
ou antevisto ou rompimento, bem assim a impossibilidade, por que não negociar?
Constitui-se num jogo de táticas processuais no decorrer do jogo processual guiado por
estratégia dos efeitos pretendidos (pena).
4.10. Em resumo: O processo penal se estrutura como uma modalidade de jogo
processual no qual há (a) conjunto de normas jurídicas; (b) que estabelecem expectativas
de ganho/perda em momentos específicos (recebimento/rejeição da denúncia; absolvição
sumária; produção probatória (informação), condenação/absolvição – em diversas
instâncias), (c) mediante jogadas temporalmente indicadas (denúncia/queixa, defesa
preliminar, alegações finais, recursos, similares), (d) para os quais o Estado Juiz emite
comandos (despachos, interlocutórias, decisões, acórdãos, similares) de vitória/derrota
(total ou parcial).
Capítulo 2°
Por uma leitura garantista
do Sistema de Controle Social
1. Para introduzir o Garantismo Penal
1.1. Embora tenha sido editada uma nova Constituição em 1988 há inescondível
déficit hermenêutico nos campos do Direito e Processo Penal no Brasil. A compreensão
do Direito Penal e Processual válido precisa de realinhamento constitucional do sentido
democrático, uma vez que tanto o Código Penal como o Código de Processo Penal são
documentos editados, na matriz , sob outra ordem constitucional e ideológica, bem assim
porque houve significativa modificação do desenho político criminal contemporâneo[50].
Ademais, a Constituição acolheu os Direitos Humanos em patamar capaz de dar eficácia
imediata no campo de Controle Social[51]. De sorte que há a necessidade de adequação
da própria noção do papel e função do Direito e do Processo Penal diante da
redemocratização do país. E, esse trabalho ainda está sendo realizado, basicamente por
força da (i) baixa constitucionalidade, entendida como a ausência de cultura democrática
no Direito; (ii) necessária superação do aparente dilema entre sistemas acusatório versus
inquisitório; (iii)  herança equivocada de uma imaginária e nefasta “Teoria Geral do
Processo”, quando, na verdade, os fundamentos do processo penal democrático
assumem viés individual e não coletivo, a saber, não cabe “instrumentalidade processual
penal pro societate”[52]; (iv)  difusão de modelo coletivo de “Segurança Pública” que
fomenta uma certa “Cultura do Medo”; (v)  expansionismo do Direito Penal e
recrudescimento dos meios de controle social, a partir da lógica de diminuição dos custos
estatais; (vi) prevalência de teorias totalitárias, como Direito Penal do Inimigo, atreladas
ao discurso da Lei e da Ordem[53].
1.2. Nesse contexto, parece que se mostra necessário repensar as coordenadas
simbólicas do campo do Direito e Processo Penal adotada perspectiva crítica, mas sem se
descolar da realidadae, ou seja, da possibilidade de diálogo entre o saber produzido no
campo da Universidade e o que acontece no plano da prática forense, não na perspectiva
unitária, mas sim de um diálogo proveitoso, em que o ponto de partida seja a realização
do Estado Democrático de Direito[54]. Ainda assim, deve-se superar a noção idealizada
de Jurisdição, Ação e Processo (Cap. 4o), partindo-se da teoria dos jogos (Cap. 1o).
2. Garantismo não é Religião: é limitação do Poder Estatal
2.1. Para o fim de entender a intervenção Estatal se recorrerá ao balizamento
apresentando pelo “Garantismo Penal” de Luigi Ferrajoli [55] , sem que ele se transforme
em Religião[56] , pois é passível de muitas criticas[57]. Partindo de sólida Teoria do
Direito[58], Ferrajoli apresenta quatro frentes para compreensão de sua proposta[59]: (i)
revisão da teoria da validade , diferenciando validade/material e vigência/formal  das normas
 jurídicas; (ii)  distinção entre as dimensões da Democracia entre formal e substancial,
tendo os Direitos Fundamentais como índice; (iii)  ratificação do lugar de garante do
magistrado numa democracia mediante a sujeição do juiz à lei, não mais pela mera
legalidade, mas da estrita legalidade, na qual a validade da norma (princípio e regra)
devem guardar pertinência material e formal com a Constituição da República; e (iv)
revisão do papel critico da ciência jurídica   não mais com a missão exclusivamente
descritiva, mas acrescentando contornos críticos e de projeção ao futuro. Supera, assim, a
noção meramente técnica, a saber, reconhece a responsabilidade do ator jurídico e não de
singelo aplicador da norma.
2.2. Essa perspectiva teórica encontra esteio na Constituição da República dado que
 baseada na dignidade da pessoa humana[60]  e nos Direitos Fundamentais[61] , os quais
devem ser respeitados, efetivados e garantidos, sob pena da deslegitimação democrática
da ação. Em face da supremacia Constitucional  dos direitos indicados no corpo de
Constituições rígidas ou nela referidos (CR, art. 5º, § 2º), como a brasileira de 1988, e do
princípio da legalidade , a que todos os poderes estão submetidos, emerge a necessidade
de garantir esses direitos a todos os sujeitos, principalmente os processados
criminalmente, pela peculiar situação que ocupam. Há filiação à tradição de defesa dos
Direitos Individuais em face do Estado, na linha Iluminista, sem se descurar das
contingências históricas[62].
2.3. Nesse pensar, Ferrajoli aponta quatro classes de direitos: (i) Direitos Humanos,
os quais são os direitos primários das pessoas e concernem indistintamente a todos os
seres humanos; (ii) Direitos públicos , que são os direitos primários reconhecidos somente
aos cidadãos; (iii) Direitos civis , os quais são direitos secundários adstritos a todas as
pessoas humanas capazes de agir, tais como a liberdade de contratar, de negociar, de
escolher e trocar de trabalho, vinculados à autonomia privada, na matriz capitalista de
Mercado; e (iv) Direitos políticos , os quais são direitos secundários reservados
exclusivamente aos cidadãos, no qual se baseia a representação e a democracia
política[63].
2.4. A partir desta matriz e aprofundando a proposta, Ferrajoli propõe quatro teses
em relação aos Direitos Fundamentais: (i) A diferença de estrutura entre Direitos
Fundamentais e Direitos Patrimoniais, dado que os primeiros são vinculados a todos ou a
uma classe de sujeitos, sem exclusão dos demais, enquanto os direitos patrimoniais, pela
sua formulação, excluemtodos os demais que não são titulares. Por certo o acordo
semântico de Direito Subjetivo  tem sido utilizado pelo Direito para ocultar as
caraterísticas antagônicas que subjazem a esta classificação aparentemente homogênea,
mas que esconde uma enorme heterogeneidade. Para comprovar tal assertiva, basta
indicar: direitos inclusivos/exclusivos, universais/singulares,
indisponíveis/disponíveis [64]; (ii) O respeito e implementação dos Direitos Fundamentais
representam interesses e expectativas de todos e formam, assim, o parâmetro da
igualdade jurídica, capaz de justificar a aferição da democracia material . Essa dimensão
não é outra coisa senão o conjunto de garantias asseguradas pelo Estado Democrático de
ireito; (iii) A pretensão supranacional de grande parte dos Direitos Fundamentais, uma
vez que com as declarações internacionais, além do direito interno, uma ordem externa
impõe limites externos aos poderes públicos; (iv) A relação entre direitos e garantias. Os
Direitos Fundamentais se constituem em expectativas negativas ou positivas, as quais
correspondem obrigações de prestação ou proibição de lesão – garantias primárias. A
reparação ou sancionamento judicial constituem em garantias secundárias, decorrentes
da violação das garantias primárias. A inexistência de garantias para efetivação dos
direitos, em suma, leva a uma lacuna que torna os direitos declarados inobservados [65].
2.5. Esse retorno à Teoria Geral do Direito se mostra absolutamente importante
desde que acolhidas as quatro teses, eis que implica revisão da estrutura do Direito
Positivo, com reflexos inafastáveis no Direito Penal e Processual Penal. Revisitada,
portanto, a formulação dos Direitos Fundamentais, restam fixadas as diferenças
marcantes, consistente a primeira na circunstância de que os Direitos Fundamentais são
universais, enquanto os Direitos Patrimoniais são singulares, excludentes dos demais.
Aqui existe um titular determinado; nos Direitos Fundamentais todos o são. Não se
diferencia Direitos Fundamentais pela qualidade ou quantidade, como se procede nos
Direitos Patrimoniais. Os Direitos Fundamentais são inclusivos e formam a base da
igualdade jurídica, enquanto os Direitos Patrimoniais são exclusivos (se eu sou
proprietário da casa, o outro não é). A segunda diferença é, talvez, a mais relevante. Os
Direitos Fundamentais são indisponíveis, inalienáveis, imprescritíveis, invioláveis,
intransigíveis e personalíssimos. Ao contrário, os Direitos Patrimoniais são disponíveis
por sua natureza, negociáveis e alienáveis. Estes se acumulam e aqueles permanecem
invariáveis. Os bens se adquirem, trocam se e se vendem. As liberdades não se trocam
nem se acumulam. O fato de serem indisponíveis impede que interesses políticos e/ou
econômicos violem os Direitos Fundamentais; não se pode vender ou trocar sua
liberdade. O ser humano os possui como tal, sem que lhe seja acrescido. Resultado disso
é que se não pode alienar a vida, a liberdade pessoal ou o direito ao devido processo
legal, por exemplo, mesmo que se queira. Em processo penal não é admitida a confissão
desprovida de outros elementos, como era na Inquisição. A terceira diferença,
consequência da segunda, é que os Direitos Patrimoniais são disponíveis, podendo ser
modificados, extintos, por atos jurídicos. Os Direitos Fundamentais, ao revés, são
reconhecidos ex vi legis , por normas gerais, normalmente de status constitucional. Em
suma, enquanto os Direitos Fundamentais são normas, os Direitos Patrimoniais são
regulados por normas. A quarta diferença consiste em que os Direitos Patrimoniais são
horizontais, os Direitos Fundamentais são verticais, em um duplo sentido. Enquanto
umas são civilistas, privadas, decorrentes de relações intersubjetivas da esfera privada, as
de Direitos Fundamentais são publicistas, do indivíduo para com o Estado. Ademais, há
que se considerar que os Direitos Patrimoniais são disposições de não lesão entre os
particulares; já no caso de Direitos Fundamentais, sua violação repercute na invalidade
de leis e decisões estatais[66].
2.6. A Teoria Garantista  representa ao mesmo tempo o resgate e a valorização da
Constituição  como documento constituinte  da sociedade. Esse resgate Constitucional
decorre justamente da necessidade da existência de um núcleo jurídico
irredutível/fundamental capaz de estruturar a sociedade, fixando a forma e a unidade
política das tarefas estatais, os procedimentos para resolução de conflitos emergentes,
elencando os limites materiais do Estado, as garantias e direitos fundamentais e, ainda,
disciplinando o processo de formação político-jurídico do Estado, aberto ao devir. A
Constituição é uma disposição fundante da convivência e fonte da legitimidade estatal,
não sendo vazio[67] , mas uma coalizão de vontades com conteúdo, materializados pelos
ireitos Fundamentais. A história do constitucionalismo é a progressiva ampliação da
esfera pública de direitos, de conquistas e rupturas . Em outras palavras, a Constituição,
nesta concepção  garantista, deixa de ser meramente normativa (formal), buscando
resgatar o seu próprio conteúdo formador, indicativo do modelo de sociedade que se
pretende e de cujas linhas as práticas jurídicas não podem se afastar, inclusive no âmbito
do Direito e do Processo Penal. Como primeira emanação normativa do Estado, aponta
os limites e obrigações, sem se perder de vista que é no processo de atribuição de sentido
(concretização) que se realiza.
2.7. Assim é que a Constituição da República é a norma maior, sendo o fundamento
de validade material e formal do sistema. Advem disto o fato de que todos os
dispositivos e interpretações possíveis, inclusive o de transformar substantivo em
adjetivo – exclusivamente  –, como acontece com o art. 144, § 4o, da CR, por exemplo,
devem perpassar pelo seu controle formal e material, não podendo ser infringida ou
modificada ao talante dos governantes públicos, mesmo em nome da maioria – esfera do
indecidível –, dado que as Constituições rígidas, como a brasileira de 1988, devem sofrer
processo específico para reforma, ciente, ainda, da existência de cláusulas pétreas. Na
prática, a aplicação de qualquer norma jurídica precisa sofrer a preliminar oxigenação
constitucional [68]  de viés garantista , para aferição da constitucionalidade material e formal
da norma jurídica. É somente assim se dá a devida força normativa à Constituição[69].
3. Garantismo Penal e Direito Penal Mínimo
3.1. No campo do Direito Penal o manejo do poder no Estado Democrático de
Direito deve se dar de maneira controlada, evitando-se a arbitrariedade dos eventuais
investidos no exercício do poder Estatal. Desta forma, para que as sanções possam se
legitimar democraticamente precisam respeitar os Direitos Fundamentais, apoiando-se
numa cultura igualitária e sujeita à verificação de suas motivações, porque o poder
estatal deve ser limitado, a saber, somente pode fazer algo – por seus agentes – quando
expressamente autorizado.[70]
3.2. Assim é que no modelo ideal  de Ferrajoli são indicados onze  princípios
necessários e sucessivos de legitimidade do sistema penal e, desta forma, da sanção [71].
São eles:  pena, delito, lei, necessidade, ofensa, ação, culpabilidade, jurisdição, acusação,
rova e defesa. A ausência de um deles torna a resposta estatal, lida a partir do
Garantismo, ilegítima, constituindo, cada um (dos princípios), condição da
esponsabilidade penal.
São, assim, prescritivas de regras processuais ideais ao modelo garantista sem que o
seu preenchimento in totum obrigue uma sanção; mas o contrário, pois somente com o
preenchimento (de to)das implicações deônticas do modelo é que o sistema está
autorizado a emitir um juízo condenatório[72].
3.3. A classificação divide-se em: a)  garantias penais: “delito”, “lei”, “necessidade”,
“ofensa”, “ação” e “culpabilidade”; e b)  garantias processuais: “jurisdição”, “acusação”,
“prova” e “defesa”. Em sendo a “pena” excluída do rol de garantias, por ser apenas uma
possibilidade ao cabo do processo, o modelo ideal  full   é composto

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