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1 MÓDULO II: SAÚDE DA MULHER ANA LUÍZA A. PAIVA – 5° PERÍODO 2022/1 OBJETIVOS 1. Analisar a sífilis, considerando epidemiologia, fatores de risco, transmissão, fisiopatologia, manifestações clínicas, complicações, diagnóstico, tratamento 2. Explicar a abordagem de uma gestante com sífilis REFERÊNCIAS MINISTÉRIO DA SAÚDE. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Atenção Integral às Pessoas com Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST). Brasília, 2020. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Fluxograma para manejo Clínico das Infecções Sexualmente Transmissíveis. Brasília, 2021. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Boletim Epidemiológico de Sífilis, 2021. HOFFMAN, B.L. et.al. Ginecologia de Williams. 2ª ed. AMGH. São Paulo: ARTMED, 2014. INTRODUÇÃO E EPIDEMIOLOGIA A Sífilis é uma infecção sexualmente transmissível (IST), bacteriana sistêmica, crônica, curável e exclusiva do ser humano. Quando não tratada, evolui para estágios de gravidade variada, podendo acometer diversos órgãos e sistemas do corpo. É uma IST de impacto direto especialmente sobre a saúde reprodutiva e infantil, ocasionando consequências como infertilidade e complicações na gestação e no parto, morte fetal e diversos agravos à saúde da criança. Além disso, um dos impactos indiretos da infecção por uma IST é o aumento do risco de transmissão sexual do vírus da imunodeficiência humana (HIV). Em 2020, foram notificados no Sinan 115.371 casos de sífilis adquirida; 61.441 casos de sífilis em; 22.065 casos de sífilis congênita e 186 óbitos por sífilis congênita. Na estratificação por regiões em 2020, observaram-se 54.586 (47,3%) casos notificados na região Sudeste, 27.201 (23,6%) na região Sul, 15.601 (13,5%) na região Nordeste, 9.744 (8,4%) na região Centro-Oeste e 8.239 (7,1%) na região Norte. Em 2020, a maior parte das notificações de sífilis adquirida ocorreu em indivíduos entre 20 e 29 anos (38,8%), seguidos por aqueles na faixa de 30 a 39 anos de idade (22,5%). A razão de sexos em 2020, foi de 0,7 (7 casos em homens para cada 10 casos em mulheres). Recomenda-se testagem para sífilis em todas as pessoas com exposição sexual de risco. Quando possível, testar a pessoa-fonte ETIOLOGIA E TRASMISSÃO É causada pela bactéria Treponema pallidum, gram-negativa da ordem das espiroquetas. A transmissão ocorre, geralmente, através do contato direto com a lesão infecciosa durante o ato sexual. A transmissibilidade da sífilis é maior nos estágios iniciais (sífilis primária e secundária), diminuindo gradualmente com o passar do tempo (sífilis latente recente/ tardia). Essa maior transmissibilidade explica-se pela riqueza de treponemas nas lesões, comuns na sífilis Sífilis Problema 05 2 MÓDULO II: SAÚDE DA MULHER ANA LUÍZA A. PAIVA – 5° PERÍODO 2022/1 primária (cancro duro) e secundária (lesões muco- cutâneas). As espiroquetas penetram diretamente nas membranas mucosas ou entram por abrasões na pele. Além disso, gestantes que não foram tratadas ou tratadas inadequadamente, a sífilis pode ser transmitida para o feto (transmissão vertical), mais frequentemente intraútero (com taxa de transmissão de até 80%), embora a transmissão também possa ocorrer na passagem do feto pelo canal do parto. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A sífilis é dividida em estágios que orientam o tratamento e monitoramento. › Sífilis recente (primaria, secundaria e latente recente): até um ano de evolução; › Sífilis tardia (latente tardia e terciaria): mais de um ano de evolução. SÍFILIS PRIMÁRIA Tempo de incubação: de 10 a 90 dias (média de 3 semanas). A primeira manifestação é caracterizada por uma úlcera rica em treponemas, geralmente única e indolor, com borda bem definida e regular, base endurecida e fundo limpo, que ocorre no local de entrada da bactéria (pênis, vulva, vagina, colo uterino, ânus, boca, ou outros locais do tegumento), sendo denominada “cancro duro”. Cancro duro em região genital. A lesão primária é acompanhada de linfadenopatia regional (acometendo linfonodos localizados próximos ao cancro duro). Sua duração pode variar muito, em geral de 2 a 8 semanas, e seu desaparecimento independe de tratamento. Embora menos frequente, em alguns casos a lesão primária pode ser múltipla. SÍFILIS SECUNDÁRIA Ocorre em média entre 6 semanas a 6 meses após a cicatrização do cancro. Caracteriza-se por uma doença sistêmica que geralmente inclui erupção cutânea (disseminada e/ou envolvendo as palmas das mãos e as plantas dos pés). Inicialmente, apresenta-se uma erupção macular eritematosa pouco visível (roséola), principalmente no tronco e raiz dos membros. As lesões cutâneas progridem para lesões mais evidentes, papulosas eritemato-acastanhadas, que podem atingir todo o tegumento, sendo frequentes nos genitais. Habitualmente, atingem a região plantar e palmar, com um colarinho de escamação característico, em geral não pruriginosa. Múltiplas pápulas eritematosas escamosas em tronco de paciente com sífilis secundária. Nessa fase, são comuns as placas mucosas, assim como lesões acinzentadas e pouco visíveis nas mucosas. manchas mucosas da sífilis secundária 3 MÓDULO II: SAÚDE DA MULHER ANA LUÍZA A. PAIVA – 5° PERÍODO 2022/1 Mais adiante, podem ser identificados condilomas planos nas dobras mucosas, especialmente na área anogenital. Estas são lesões úmidas e vegetantes que frequentemente são confundidas com as verrugas anogenitais causadas pelo HPV. Alopecia em clareiras e madarose são achados eventuais. O secundarismo é acompanhado de micropoliadenopatia, sendo característica a identificação dos gânglios epitrocleares. São comuns sintomas inespecíficos como febre baixa, mal-estar, cefaleia e adinamia. A sintomatologia desaparece em algumas semanas, independentemente de tratamento, trazendo a falsa impressão de cura. Atualmente, têm-se tornado mais frequentes os quadros oculares, especialmente uveítes. A neurossífilis meningovascular, com acometimento dos pares cranianos, quadros meníngeos e isquêmicos, pode acompanhar essa fase, contrariando a ideia de que a doença neurológica é exclusiva de sífilis tardia. SÍFILIS LATENTE É um período em que não se observa nenhum sinal ou sintoma. O diagnóstico faz-se exclusivamente pela reatividade dos testes treponêmicos e não treponêmicos. A maioria dos diagnósticos ocorre nesse estágio. A sífilis latente é dividida em latente recente (até um ano de infecção) e latente tardia (mais de um ano de infecção). Aproximadamente 25% dos pacientes não tratados intercalam lesões de secundarismo com os períodos de latência. SÍFILIS TERCIÁRIA Ocorre aproximadamente em 15% a 25% das infecções não tratadas, após um período variável de latência, podendo surgir entre 1 e 40 anos depois do início da infecção. A inflamação causada pela sífilis nesse estágio provoca destruição tecidual. Lesão cutânea característica da sífilis terciária É comum o acometimento do sistema nervoso e do sistema cardiovascular. Além disso, verifica-se a formação de gomas sifilíticas (tumorações com tendência a liquefação) na pele, mucosas, ossos ou qualquer tecido. As lesões podem causar desfiguração, incapacidade e até morte. PUPILA DE ARGYLL-ROBERTSON: São pupilas bilateralmente pequenas que não respondem a luz, mas se contraem normalmente para acomodação e convergência, dilata-se ao estímulo midriático e não dilata em resposta a estímulos dolorosos. É um dos sinais mais comuns de tabes dorsalis. ESTÁGIOS DE SÍFILIS ADQUIRIDA MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Primária Cancro duro (úlcera genital) Linfonodos regionais Secundária Lesões cutâneo-mucosas (roséola, placas mucosas, sifílides papulosas, sifílides palmoplantares, condiloma plano, alopecia em clareira, madarose, rouquidão)Micropoliadenopatia Linfadenopatia generalizada Sinais constitucionais Quadros neurológicos, oculares, hepáticos Latente recente (até 1 ano de duração Assintomática 4 MÓDULO II: SAÚDE DA MULHER ANA LUÍZA A. PAIVA – 5° PERÍODO 2022/1 Latente tardia (mais de 1 ano de duração) Assintomática Terciária Cutâneas: lesões gomosas e nodulares, de caráter destrutivo; Ósseas: periostite, osteíte gomosa ou esclerosante, artrites, sinovites e nódulos justa-articulares; Cardiovasculares: estenose de coronárias, aortite e aneurisma da aorta, especialmente da porção torácica; Neurológicas: meningite, gomas do cérebro ou da medula, atrofia do nervo óptico, lesão do sétimo par craniano, manifestações psiquiátricas, tabes dorsalis e quadros demenciais como o da paralisia geral. DIAGNÓSTICO O diagnóstico de sífilis deve ser estabelecido por meio da associação de critérios epidemiológicos, clínicos e laboratoriais. Para o diagnóstico da sífilis, devem ser realizados os testes treponêmico e não treponêmico. TESTES TREPONÊMICOS: são testes que detectam anticorpos específicos produzidos contra os antígenos de T. pallidum; Em 85% dos casos, permanecem reagentes por toda vida, mesmo após o tratamento e, por isso, não são indicados para o monitoramento da resposta ao tratamento. • Testes rápidos (TR): são os mais indicados para início de diagnóstico pois são práticos e de fácil execução, com leitura do resultado em, no máximo, 30 minutos. Podem ser realizados com amostras de sangue total colhidas por punção digital ou venosa. Têm a vantagem de serem realizados no momento da consulta, possibilitando tratamento imediato. • Testes de hemaglutinação (TPHA) e de aglutinação de partículas (TPPA); ensaios de micro-hemaglutinação (MHA-TP) • Teste de imunofluorescência indireta (FTA) • Ensaios imunoenzimáticos (como os testes ELISA) e suas variações, como os ensaios de quimiluminescência (CMIA): possuem elevada sensibilidade e capacidade de automação. TESTES NÃO TREPONÊMICOS: esses testes detectam anticorpos anticardiolipina não específicos para os antígenos do T. pallidum. Permitem a análise qualitativa e quantitativa São utilizados para o diagnóstico (como primeiro teste ou teste complementar) e também para o monitoramento da resposta ao tratamento e controlede cura. A queda adequada dos títulos é o indicativo de sucesso do tratamento. Os testes não treponêmicos mais comumente utilizados no Brasil são o VDRL, o RPR e o USR. Anticorpos anticardiolipinas podem estar presentes em outras doenças. Por isso, é sempre importante realizar testes treponêmicos e não treponêmicos para a definição laboratorial do diagnóstico. Considerando a epidemia de sífilis no Brasil e a sensibilidade dos fluxos de diagnóstico, recomenda-se iniciar a investigação pelo teste treponêmico (teste rápido, FTA-Abs, Elisa, entre outros). As pessoas com teste rápido reagente devem ter amostra coletada para um teste não treponêmico complementar. Entretanto, devido ao cenário epidemiológico atual, recomenda-se tratamento imediato nas seguintes situações: › Gestante; › Pessoa com risco de perda do seguimento; › Caso de violência sexual; › Pessoa com sinais/sintomas de sífilis primária ou secundária; › Pessoa sem diagnóstico prévio de sífilis. 5 MÓDULO II: SAÚDE DA MULHER ANA LUÍZA A. PAIVA – 5° PERÍODO 2022/1 As pessoas com teste rápido não reagente devem ser acompanhadas. Se, durante o seguimento, o exame tornar-se reagente, e diagnosticada sífilis recente, com indicação de tratamento imediato. DIAGNÓSTICO NO RN Todos os RN nascidos de mãe com diagnóstico de sífilis durante a gestação, independentemente do histórico de tratamento materno, deverão realizar teste não treponêmico no sangue periférico. Obs: O sangue de cordão umbilical não deve ser utilizado, pois esse tipo de amostra contém uma mistura do sangue da criança com o materno e pode resultar em testes falso-reagentes. No teste não treponêmico, um título maior que o materno em pelo menos duas diluições (ex.: materno 1:4, RN maior ou igual a 1:16) é indicativo de infecção congênita, É esperado que os testes não treponêmicos das crianças declinem aos três meses de idade, devendo ser não reagentes aos seis meses nos casos em que a criança não tiver sido infectada ou que tenha sido adequadamente tratada TRATAMENTO A benzilpenicilina benzatina é o medicamento de escolha para o tratamento de sífilis, sendo a única droga com eficácia documentada durante a gestação. ESTADIAMENTO ESQUEMA TERAPÊUTICO ALTERNATIVA (EXCETO PARA GESTANTES) SÍFILIS RECENTE: sífilis primária, secundária e latente recente (com até 1 ano de evolução) Benzilpenicilina benzatina 2,4 milhões UI, IM, dose única (1,2 milhão UI em cada glúteo) Doxiciclina 100mg, 12/12h, VO, por 15 dias SÍFILIS TARDIA: sífilis latente tardia (com mais de 1 ano de evolução) ou latente com duração ignorada e sífilis terciária Benzilpenicilina benzatina 2,4 milhões UI, IM, 1x/semana (1,2 milhão UI em cada glúteo) por 3 semanas. Dose total: 7,2 milhões UI, IM Doxiciclina 100mg, 12/12h, VO, por 30 dias NEUROSSÍFILIS Benzilpenicilina potássica/cristalina 18-24 milhões UI, 1x/ dia, EV, administrada em doses de 3-4 milhões UI, a cada 4 Ceftriaxona 2g IV, 1x/dia, por 10-14 dias horas ou por infusão contínua, por 14 dias A benzilpenicilina benzatina é a única opção segura e eficaz para o tratamento adequado das gestantes. Parceria(s) sexual(is): se houve exposição à pessoa com sífilis (até 90 dias), recomenda-se oferta de tratamento presuntivo (independentemente do estágio clínico ou sinais e sintomas), com dose única de benzilpenicilina benzatina 2,4 milhões, UI, IM (1,2 milhão de UI em cada glúteo). Quando o teste de sífilis for reagente, recomenda-se tratamento de sífilis adquirida no adulto, de acordo com o estágio clínico. SEGUIMENTO Gestantes: mensal (até o final da gestação) População não gestante (incluindo PVHIV): a cada 3 meses até o 12º mês (3, 6, 9, 12 meses) Neurossífilis: Exame de LCR a cada 6 meses até a normalização da celularidade e VDRL não reagente. Atualmente, para definição de resposta imunológica adequada, utiliza-se o teste não treponêmico não reagente ou uma queda na titulação em duas diluições em até seis meses para sífilis recente e queda na titulação em duas diluições em até 12 meses para sífilis tardia. A persistência de resultados reagentes em testes não treponêmicos após o tratamento adequado e com queda prévia da titulação em pelo menos duas diluições, quando descartada nova exposição de risco durante o período analisado, é chamada de “cicatriz sorológica” (serofast) e não caracteriza falha terapêutica. CRITÉRIOS DE RETRATAMENTO DE SÍFILIS: REATIVAÇÃO OU REINFECÇÃO São critérios de retratamento e necessitam de conduta ativa do profissional de saúde: › Ausência de redução da titulação em 2 diluições no intervalo de 6 meses (sífilis recente, primária e secundária) ou 12 meses (sífilis tardia) após o tratamento adequado (ex.: de 1:32 para >1:8; ou de 1:128 para >1:32); 6 MÓDULO II: SAÚDE DA MULHER ANA LUÍZA A. PAIVA – 5° PERÍODO 2022/1 OU › Aumento da titulação em duas diluições ou mais (ex.: de 1:16 para 1:64; ou de 1:4 para 1:16); OU › Persistência ou recorrência de sinais e sintomas clínicos.
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