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Seção 4 SUA PETIÇÃO DIREITO CONSTITUCIONAL 2 Prezado aluno e prezada aluna! Vamos dar prosseguimento ao quarto passo de nosso caso. Vamos nos lembrar do que aconteceu no nosso último encontro? O CASO. Benjamim, é um advogado inscrito na OAB/SP com o número 54321 e muito atuante na cidade de Quiririm do Sul (fictício), localizada na Comarca de Taubaté, no interior do estado de São Paulo. Cidadão exemplar daquela cidade, está em dia com suas obrigações eleitorais e possui o título de eleitor de número 123456. Este ano, uma atitude do prefeito de sua cidade o deixou absolutamente revoltado. Sob a alegação de estarmos em um estado emergencial em razão da pandemia de COVID-19, o Prefeito Sr. Salame decidiu construir um novo estádio de futebol, o terceiro da cidade, e o fez sem qualquer licitação, contratando de forma direta a Empreiteira e Construtora Funeral, de propriedade de seu irmão Luiz Copa. Por meio de um Decreto Municipal (171/2021), o Prefeito contratou o Empreiteira e Construtora Funeral alegando a dispensa de licitação em razão da pandemia e apontou que a empresa era de confiança pessoal dele e que assim deveria iniciar as obras imediatamente, sem qualquer concorrência prévia. A obra teve o valor orçado em R$ 2,5 milhões e consumiu boa parte dos recursos que haviam sido recebidos pelo município para a abertura de vagas hospitalares para o tratamento de doentes com a COVID-19. Seção 4 DIREITO CONSTITUCIONAL Sua causa! 3 Inconformado, Dr. Benjamim levou os fatos ao conhecimento da Câmara Municipal e do Ministério Público, porém nenhuma providência foi tomada. Após quatro meses de absoluta inércia desses órgãos públicos ele decidiu que deveria propor uma ação judicial para anular a ordem do prefeito para a realização dessa obra, em razão da inobservância de normas constitucionais e legais que exigem a realização de licitação para a obras públicas, além da imoralidade que a medida teve em desviar recursos da saúde para essa construção. Pois bem, agora você se lembrou de todos os detalhes. No papel do advogado Benjamim você ingressou com uma Ação Popular na Comarca de Taubaté, requerendo a anulação da medida realizada pelo prefeito e a devolução de eventuais recursos públicos indevidamente recebidos pela Empreiteira e Construtora Funeral, de propriedade de seu irmão Luiz Copa. A ação foi recebida pelo juiz de primeiro grau que mandou citar todos os réus, a Prefeitura de Quiririm do Sul, o Prefeito Salame e a Empreiteira e Construtora Funeral. Após o julgamento de um agravo de instrumento interposto pela Empreiteira e Construtora Funeral, iniciou-se a fase probatória do processo de primeiro grau e constatou-se o efetivo recebimento dos valores totais de R$ 2,5 milhões em favor da empresa. No entanto, somente a parte inicial das obras foi iniciada, com a demolição de algumas poucas construções que foram realizadas por apenas dois funcionários durante cinco dias de trabalho. Em razão disso, a empresa alegou que a devolução de todo o dinheiro acarretaria o enriquecimento sem causa por parte da Administração Pública, devendo ela permanecer com os R$ 2,5 milhões a título de indenização pelos serviços prestados e a quebra da expectativa de contratar com a municipalidade que, segundo ela é um direito líquido e certo seu, não havendo hipótese de revogação do contrato formulado. Com base nisso, o juiz de primeiro grau aceitou as alegações formuladas pela parte e julgou a ação parcialmente procedente, apenas anulando o decreto municipal, mas apontando que o dinheiro recebido deveria permanecer com a Empreiteira a título de indenização pela anulação do contrato. 4 Por fim, em razão da improcedência parcial a sentença condenou Dr. Benjamim ao pagamento de sucumbência no valor de 10% do valor da causa, o valor de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais). Você interpôs um recurso de Apelação contra a sentença do magistrado de primeiro grau, sendo julgado o recurso pela 1ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo. No Acórdão, o TJ reformou a decisão de primeiro grau, determinando que o prefeito Salame e a Empreiteira e Construtora Funeral devolvam aos cofres públicos municipais os valores de R$ 2,5 milhões devidamente corrigidos, porém com a retenção dos valores devidamente utilizados na demolição das construções que existiam no terreno público, que serão objeto de uma futura liquidação judicial, a fim de evitar o enriquecimento sem causa do município em face da empreiteira. Parabéns! Contudo, o Acórdão silenciou totalmente a respeito do segundo pedido formulado na Apelação a respeito do pagamento de sucumbência no valor de 10% do valor da causa, o valor de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais). Vejamos o teor da decisão: “Diante disso, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO, condenando as partes Apeladas, prefeito Salame e a Empreiteira e Construtora Funeral, à devolução aos cofres públicos municipais dos valores de R$ 2,5 milhões devidamente corrigidos, porém com a retenção dos valores devidamente utilizados na demolição das construções que existiam no terreno público, que serão objeto de uma futura liquidação judicial, a fim de evitar o enriquecimento sem causa do município em face da empreiteira”. Agora, tome a medida processual adequada no papel do Dr. Benjamim para sanar essa omissão do Acórdão. ATOS ADMINISTRATIVOS No nosso problema dissemos que o prefeito praticou um ato administrativo ilegal, pois desrespeitava a lei de licitações. Mas você sabe o que é um ato administrativo? Fundamentando! 5 Antes de tudo, o ato administrativo é um ato jurídico. Vamos estudar a definição dada por um grande administrativista brasileiro já falecido, Hely Lopes Meirelles: “O conceito de ato administrativo é fundamentalmente o mesmo do ato jurídico, do qual se diferencia como uma categoria informada pela finalidade pública. É ato jurídico todo aquele que tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos. (...) “Ato administrativo toda manifestação unilateral de vontade da Administração Pública que agindo nessa qualidade tenha por fim imediato adquirir resguardar transferir modificar extinguir e declarar direitos ou impor obrigações aos administrados ou a si própria”1. Essa clássica definição de ato administrativo unilateral delimita com maestria o que são esses atos jurídicos que compõem a maior parte das ações da Administração Pública. São atos praticados pela Administração agindo como tal, isto é, usando de sua função administrativa, seus poderes, sua supremacia sobre os particulares, sob o chamado regime jurídico-administrativo. Assim, não são atos administrativos aquelas atividades que não buscam produzir uma declaração com efeitos jurídicos, como a limpeza de uma rua, por exemplo; ou quando não exercidas sob a função administrativa, como são os atos jurisdicionais (sentenças, acórdãos, despachos) e os atos legislativos (leis). Também não são atos administrativos aqueles praticados sem o regime de direito administrativo, mas sob as regras do direito privado como a emissão de um cheque para pagamento. Requisitos de validade dos atos administrativos. 1 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. atualização por BURLE FILHO, José Emmanuel. 42. ed. / atual. até a Emenda Constitucional 90, de 15.9.2015. - São Paulo: Malheiros, 2016.p. 173. 6 Os atos jurídicos possuem elementos ou requisitos de validade (agente capaz, conforme o art. 1º do Código Civil); objeto lícito, possível, determinado ou determinável; forma prescrita ou não proibida em lei; e, vontade livre, consciente e voluntária do agente. Da mesma forma, os atos administrativos possuem taisrequisitos, mas com peculiaridades próprias do Regime Jurídico Administrativo. São requisitos ou elementos de validade dos atos administrativos: a) Sujeito ou agente investidos de poderes legais denominados competência; b) Objeto ou conteúdo previsto em lei (lícito), certo e possível e moral; c) Forma que consiste na exteriorização do ato administrativo e também as formalidades e procedimentos a serem seguidos para a sua produção; d) Motivo: De fato – o acontecimento no mundo real que desencadeia a ação e – De direito – a previsão normativa que prevê a possibilidade de realização daquele ato; e, d) Finalidade que é o resultado desejado para a prática do ato e sempre deve ser voltado à realização de um interesse público, sob pena do chamado “desvio de finalidade”. CONTROLE JURISDICIONAL DO ATO ADMINISTRATIVO Em razão do Princípio da Separação dos Poderes e do sistema de pesos e contrapesos, o nosso sistema constitucional prevê a aplicação do Princípio da Inafastabilidade do Controle Jurisdicional. Segundo esse princípio, toda lesão ou ameaça a direito está sujeita a controle pelo Judiciário, sendo esse um direito fundamental previsto no art. 5º, inciso XXXV da CF/88. Assim, cabe ao Poder Judiciário o controle jurídico de verificar se o agente público respeitou os limites previstos pela lei para a realização de determinado ato administrativo, apenas sendo excluído dessa análise o chamado MÉRITO do ato, quando houve espaço para a discricionariedade do agente, isto é, quando o ato puder ser praticado com um certo grau de liberdade de escolha pelo administrador. A essa liberdade limitada de escolha damos o nome de discricionariedade que é a possibilidade de escolha dentre as hipóteses legalmente possíveis, de acordo com o juízo de conveniência e oportunidade da autoridade administrativa. 7 Administrar é fazer escolhas, mas o administrador somente pode fazer aquelas previstas em lei. Por exemplo, o administrador pode escolher entre comprar vacinas ou construir hospitais com uma determinada verba destinada à saúde. A escolha de uma ou outra é uma discricionariedade. Mas ele não pode desviar esse mesmo dinheiro para o seu uso pessoal ou de terceiros, pois isso não está previsto em lei. A discricionariedade, portanto, é uma possibilidade de escolha dentre aquelas legalmente possíveis, assim, se ocorrer o desvio dessas hipóteses, mesmo nos atos discricionários poderá ocorrer o controle judicial. SEPARAÇÃO DOS PODERES. Falamos que o controle judicial dos atos administrativos decorre do princípio da Separação dos Poderes, mas o que é isso? A Constituição Federal prevê no artigo 2º que: são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Já vimos no início de nossos estudos que o poder do Estado é um só e decorre da soberania popular. Mas devido à necessidade de coibir o abuso do Poder, Montesquieu nos apresentou em sua obra “O Espírito das Leis”2 um modelo de controle baseado na separação das três funções típicas do Poder estatal: a função de julgar, de legislar e de administrar, isto é, em outras palavras, o Executivo, Legislativo e Judiciário. Para que essa separação ocorra de forma harmoniosa é aplicado um sistema denominado de “freios e contrapesos” ou “check and balances”, que se baseia em uma limitação do poder pelo poder. Ao Poder Legislativo cabe a função de criar as leis que regerão o Estado e todos os cidadãos, por outro lado cabe ao Executivo a administração desse Estado em execução concreta da lei e, ao Judiciário o papel de controle de legalidade e constitucionalidade desses mesmos atos. 2 MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Baron de. O espírito das leis. São Paulo, Martins Fontes, 1996. 8 Se um dos Poderes se sobressai o sistema todo pode ruir, com a concentração de poder em nome de apenas uma pessoa ou órgão haverá o que chamamos de Estado de Exceção como ocorreu no Brasil durante os anos de ditadura militar (de 1 de abril de 1964 e que durou até 15 de março de 1985) em que sucessivos governos militares substituíram os atos de outros poderes legislando através dos chamados Decretos-Leis, fechando o Congresso Nacional e cassando diversos magistrados e outras autoridades, inclusive com a aposentação compulsória dos ministros do Supremo Tribunal Federal, Victor Nunes Leal, Hermes Lima e Evandro Lins e Silva, em 13 de dezembro de 1968. A Constituição de 1988 reinseriu o Brasil em um sistema democrático e previu como um de seus fundamentos, isto é, como um dos alicerces sobre os quais o nosso “edifício” jurídico foi construído, a separação dos poderes evitando assim a preponderância de um deles sobre os demais. Assim, cabe ao Legislador fazer as leis, ao Executivo cumpri-las concretizando as políticas públicas para a população em nome do bem comum e, ao Judiciário controlar a legalidade dos atos, dirimir as lides e fazer o controle de constitucionalidade de atos e normas, como veremos em nosso próximo encontro. tornar efetiva a nossa Constituição. Vamos peticionar! CONSTITUIÇÃO FEDERAL Artigo 2º: são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. PONTO DE ATENÇÃO 9 Com esse conteúdo estamos prontos para a pratica! Qual medida judicial o Dr. Benjamim deve tomar contra uma omissão no julgamento da apelação? Você deverá: 1) Verificar qual o correto endereçamento da sua peça; 2) Apontar corretamente o polo ativo e polo passivo da sua demanda, observando os fundamentos legais; 3) Narrar os fatos que embasam a demanda; 4) Enumerar os requerimentos e pedidos da ação; 5) Datar e assinar a petição. Agora é com você! Mãos à obra!
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