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Linguagem Jornalística para Audiovisual

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OBJETIVOS
Módulo 1
Identificar os elementos constitutivos da linguagem visual
Módulo 2
Reconhecer as ferramentas de análise da linguagem audiovisual
INTRODUÇÃO
Imagens circulam diante de nossos olhos em profusão. Não apenas consumimos, como também produzimos mais imagens do que em qualquer outro momento da história. Mas será que sabemos “ler” imagens? Exploraremos aqui algumas dessas possibilidades de leitura, em um percurso das imagens fixas em direção às imagens em movimento.
Fonte: Jacob Lund/Shutterstock
MÓDULO 1
Identificar os elementos constitutivos da linguagem visual
DIFERENTES TIPOS DE IMAGEM
Fonte: PanyaStudio/ Shutterstock
“Ver” parte do “escolher”. Quando nossos olhos se deparam com imagens, estejamos enxergando o movimento na rua ou as cenas em sucessão exibidas em uma tela, nossos olhos nunca saem do zero. De acordo com a expressão feliz do crítico de arte inglês John Berger (1999), a maneira como vemos as coisas é afetada pelo que sabemos ou acreditamos.
Não há tela branca. Quando vemos, partimos de um quadro de referências já parcialmente preenchido, informado pelos papéis que desempenhamos na sociedade, pelo repertório de informações que carregamos, por nossos hábitos arraigados, pelo nosso modo de navegar em uma cultura (ou em mais de uma).
O que “escolhemos” ver é também resultado das escolhas dos outros: das escolhas dos nossos pais, dos nossos amigos, dos nossos colegas de trabalho, dos nossos professores formais, de nossos guias informais e dos nossos “colegas” de audiência. Prismas e lentes alheias nos educam a escolher o que e como ver, seja por identificação ou por contraste.
Quando vemos um filme e, na sequência, lemos uma crítica da qual discordamos em alguns pontos, revisamos não apenas o conteúdo das nossas próprias impressões, talvez até reforçando-as, mas também calibramos o nosso próprio modo de ver. Quando temos a oportunidade de assistir de novo ao mesmo filme, depois de tomar contato com as impressões dos outros, essa mudança no jeito de enxergar se apresenta de maneira mais óbvia: passamos a direcionar nosso olhar para outras partes da tela, ressaltamos o que antes não ressaltávamos, ignoramos o que antes não ignorávamos – mudamos como intérpretes e também como buscadores. Mas, mesmo que não tenhamos a oportunidade de rever o filme, aquela forma de ver incorporada àquela crítica se agrega à nossa forma de ver, como tantos outros jeitos de ver transmitidos por outros a nós.
Fonte: Fer Gregory/ Shutterstock
Películas de diferentes larguras. | Fonte: Creative Commons CC0/Pxhere
Não vemos sozinhos, nem partimos do nada. Ver envolve, sempre, um “por meio de”, seja qual for o olho que capta de forma primária: o nosso olho natural, no cotidiano, ou o “olho” mecânico ou digital de uma câmera. Mesmo no caso de câmeras com movimentos automatizados, programadas previamente, como é o exemplo de algumas utilizadas em produções de estúdio e de eventos, há uma escolha embutida, seja na concepção do equipamento, na programação, ou na leitura posterior que fazemos do que é captado.
Vemos imagens. No sentido amplo, imagens são representações mentais de objetos externos percebidos pelos sentidos (JAPIASSÚ, MARCONDES, 2001). No que diz respeito ao sentido da visão, vemos a partir dos olhos e processamos no cérebro o que foi visto.
A partir das descrições do professor espanhol Justo Villafañe, podemos considerar que as imagens partem de três dados irredutíveis:
✔ Seleção da realidade (um recorte, por meio da percepção);
✔ Seleção de elementos para representação (entendida como uma “explicitação de 
Quando lidamos com imagens, vendo ou produzindo-as, recortamos a realidade, selecionamos elementos dessa realidade para representação e organizamos esses elementos para compreensão. De acordo com Villafañe (2006), essas imagens têm bases materiais diferentes:
Clique nas barras para ver as informações.
IMAGENS MENTAIS
Tem o cérebro como cenário. Dispensam a necessidade de um estímulo físico. Estão na matriz do conceito de imaginação, entendido como “a faculdade de produzir imagens mentais” (JAPIASSÚ, MARCONDES, 2001). No caso mais típico, são imagens do pensamento, conscientes, mas também podem ter outras fontes, como o sonho e a alucinação, em que o inconsciente desempenha papel importante.
IMAGENS NATURAIS
Partem de uma visualização do entorno. São as imagens do cotidiano, captadas pelo sentido da visão.
IMAGENS CRIADAS
Aplicadas sobre um suporte, com uso de materiais e ferramentas. Dependem de um sistema de registro, mas não da existência de um referente, que pode ou não se apresentar. Inclui a escultura e o holograma (onde a função predominante é de descrição), a pintura realista e a pintura figurativa não realista (A Batalha do Avaí, de Pedro Américo, e Antropofagia, de Tarsila do Amaral: em ambas, a função é artística), os organogramas e as placas de trânsito (função informativa) e a representação não figurativa (Estranho, de Manabu Mabe, em que predomina função de busca, de expressão de um fluxo consciente ou inconsciente), além da animação (função majoritariamente artística ou descritiva), entre outras.
De acordo com a boa definição do Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa/Michaelis, o referente é “o elemento (ser, objeto, ação, qualidade), concreto ou imaginário, da realidade extralinguística” ao qual remete “um signo linguístico, em um discurso ou em determinado contexto”.
IMAGENS REGISTRADAS
Compartilham as características das imagens criadas, mas com um diferencial: têm o caráter de registro, de impressão de um ou mais dados de realidade (a luz e a forma dos objetos, por exemplo). É o caso da fotografia e da captura de imagens em movimento (ambas aproximações e descrições).
Clique nas setas ou arraste para os lados para ver o conteúdo.
Exemplo de imagem criada realista: Batalha do Avaí, pintura histórica de Pedro Américo, 1872-1877, (Coleção do Museu Nacional de Belas Artes/Rio de Janeiro). | Fonte: Wikipédia
Exemplo de imagem criada figurativa não realista: Antropofagia, de Tarsila do Amaral, 1929. | Fonte: Wikiart
Exemplo de imagem criada não figurativa: Estranho, obra do pintor naturalizado brasileiro Manabu Mabe, 1959. Museus Castro Maya. | Fonte: Artsandculture
Que informações as imagens nos oferecem?
O desafio da resposta mora na natureza do objeto. Mesmo que acompanhada de título, legenda ou qualquer texto descritivo, qualquer imagem apresenta um elemento não verbal. Por mais que procuremos cercar esse elemento com palavras, descrevendo, sempre restará algo impossível de conter, de traduzir.
ALFABETISMO VISUAL
No mundo atual, carregado de imagens, há quem defenda a necessidade de um alfabetismo visual. Terá a imagem mais possibilidades de compreensão e interpretação que a palavra? Confira no vídeo a seguir.
Tendemos a encarar a visão como uma experiência direta por estar disponível quase sem esforço pela maior parte das pessoas ao ser acionada quando em estado consciente. Mas mesmo a visão cotidiana é uma aproximação, limitada por aspectos físicos do próprio observador, assim como por questões de perspectiva e contexto.
Se a nossa visão é aproximada, o que dizer da visão dos outros, que chega até nós
mediada em fotos ou vídeos?
Fonte: Lynn Gilbert/Wikimedia commons
Já passamos há muito dos primórdios da fotografia, quando, de acordo com a descrição da escritora e crítica norte-americana Susan Sontag (1933-2004):
O fotógrafo era visto como um observador agudo e isento — um escrivão, não um poeta. Mas, como as pessoas logo descobriram que ninguém tira a mesma foto da mesma coisa, a suposição de que as câmeras propiciam uma imagem impessoal, objetiva, rendeu-se ao fato de que as fotos são indícios não só do que existe, mas daquilo que um indivíduo vê; não apenas um registro, mas uma avaliação do mundo. Tornou-se claro que não existia apenas uma atividade simples e unitária denominada “ver” (registrada e auxiliada pelas câmeras), mas uma “visão fotográfica”, que era tanto um modo novo de as pessoas verem, como uma nova atividade para elas desempenharem.
(SONTAG,2004)
Segundo Dondis (1991), por mais que ver possa ser entendido como acessar uma experiência direta e que consideremos a utilização de dados visuais para transmitir informações como a máxima aproximação que podemos obter com relação à verdadeira natureza da realidade, precisamos ressaltar a palavra aproximação.
Não há leitura incontestável de imagens. A subjetividade é sempre um componente desse esforço. Do mesmo modo que os textos escritos, as imagens permitem diferentes chaves de leitura:
Passe o mouse sobre as imagens.
Leituras denotativas, que operam na superfície do visível: na maçã que parece de fato uma maçã numa pintura, no rosto de criança que é um rosto de criança numa fotografia, num carro em disparada que é um carro em disparada num vídeo.
Nature mort aux pommes, pintura do francês Paul Cézanne, 1891-1892. Metropolitan Museum. | Fonte: Creative Commons/Wikimedia Commons
Leituras conotativas, que operam no sugerido, no não dito, no silenciado e no que é complementado por quem vê: na fome que não aparece assinada na foto de um pedinte, na perda que não surge tatuada na pele de um viúvo com a mão sobre um caixão, no silêncio e na interdição que entendemos a partir da boca fechada com uma fita isolante num protesto.
Protesto no Vancouver BC, Canadá. | Fonte: Michal Urbanek/Shutterstock
DIMENSÕES MORFOLÓGICA, DINÂMICA E ESCALONADA DA IMAGEM
Concentremo-nos nas imagens criadas ou registradas. A questão que nos confronta aqui não é tanto como vemos no correr dos dias, quando vamos comprar pão, mas como podemos ler o que vemos a fim de produzir imagens que comuniquem de maneira mais poderosa. E, nesse processo, vale o alerta do historiador da arte Ernst Gombrich de que nunca houve imagem igual à natureza, afinal toda imagem também se baseia em convenção, como acontece com as letras do alfabeto.
Fonte: Wikimedia
Analisar uma imagem é separar o todo em partes, em elementos de sentido apreensível. Dentre os múltiplos caminhos possíveis, seguiremos aqui o roteiro de Villafañe na Introdução à teoria da imagem (2006). Imagens podem ser decompostas nas seguintes dimensões:
Clique nas barras para ver as informações.
MORFOLÓGICA (ESPAÇO)
• Ponto: o mais simples dos elementos. Pode cumprir função plástica, como no recurso ao pontilhismo por pintores como o impressionista francês do século XIX Georges Seurat, e dinâmica, com a criação de tensões que podem ajudar a guiar os olhos ao longo de uma composição. A disposição de um ou mais pontos pode equilibrar, desequilibrar ou reequilibrar um eixo de visão. Os pontos estão também na base das técnicas de reprodução de imagens – já experimentou escanear e ampliar até o limite uma foto que estava impressa em um livro?
• Linha: elemento polivalente, forma a base da maior parte dos desenhos. Liga pontos, fornece direção, separa áreas, acrescenta volume a figuras e adiciona profundidade a composições.
• Plano: elemento bidimensional limitado por linhas e outros planos. (É diferente de “plano” em seus sentidos cinematográficos, dos quais falaremos adiante.)
• Textura: elemento associado ao aspecto da superfície externa de uma imagem, condicionado em sua manifestação pela escolha prévia do material e da técnica (caso típico: textura na pintura).
• Cor: elemento que resulta diretamente da mediação dos sentidos. Tem múltiplos efeitos sobre a apreensão de uma imagem criada ou registrada. Delimita e organiza espaços, modula intensidade, pontua diferentes qualidades, auxilia na identificação de formas e objetos e evoca outros sentidos através da sinestesia, que é uma relação estabelecida entre sensações de matriz diferente. Por meio dessa relação, uma cor pode evocar um cheiro, um som pode evocar uma sensação de aspereza, uma imagem pode evocar um gosto.
• Forma: aspecto visual e sensível de um objeto ou de sua imagem, cambiável de acordo com sua posição ou seu contexto.
Uma tarde de domingo da ilha de Grande Jatte, quadro do pintor francês Georges-Pierre Seurat, pintado entre 1884-1886; é um dos marcos da técnica do pontilhismo, muito empregada por impressionistas como Seurat. | Sailko/Wikimedia commons
DINÂMICA (MOVIMENTO)
• Temporalidade: representação do tempo real por meio da imagem, seja em uma estrutura de sequência (passado-presente-futuro, início-meio-fim) ou em um contexto de simultaneidade.
• Tensão: assegura o efeito de movimento nas imagens fixas, por exemplo, mediante o jogo entre proporções e orientações dos objetos.
• Ritmo: resultante da alternância entre elementos fortes e fracos em imagens fixas. Nas imagens em movimento, o ritmo é um dado do próprio movimento ou uma função da alternância entre essas imagens.
Fonte: Romas_Photo/Shutterstock
ESCALONADA (QUANTIDADE)
• Dimensão: diz respeito ao tamanho dos objetos em uma composição.
• Formato: proporção entre as bordas de uma imagem.
• Escala: atrela as medidas de objetos contidos em uma imagem às medidas reais ou de referência.
• Proporção: relação entre um objeto e suas partes, assim como dessas partes entre si.
Jogo de linhas, pontos, retas e formas em Vença os brancos com a cunha vermelha, pôster do artista soviético El Lissitzky, 1919./ (Domínio Público). | Fonte: Flick
Ao analisarmos uma imagem, primeiramente devemos lê-la. Quando lemos um parágrafo com atenção, tomamos cuidado para não perdermos uma palavra. Isso também vale para uma imagem fixa ou em movimento.
Na imagem, como já apontado, os elementos visuais são como as palavras – denotando ou conotando. Quanto mais elementos visuais distinguirmos, mais equipados estaremos para montar um mosaico de sentido. A leitura de uma imagem é como um inventário, um estágio preparatório para definir o que foi visto. Essas definições são, como a própria natureza da imagem, aproximações: hipóteses sobre o que vemos e sobretudo acerca da estrutura do que vemos. A partir dessas hipóteses, podemos tentar analisar a organização dos elementos em uma composição, esteja essa composição fixada em uma pintura, na cena de um filme ou em outra plataforma.
O QUE É A LINGUAGEM AUDIOVISUAL?
A resposta à pergunta acima é direta, mas a implicação dela, bem menos. A resposta (direta): a linguagem audiovisual é aquela que se apoia na combinação entre imagens e sons. A implicação: a confusão entre o “visual” (em audiovisual) com as imagens em movimento. Imagens em movimento representam a face mais popular do audiovisual (o grosso da produção do cinema, da TV e das plataformas digitais), mas não são a única face do audiovisual.
Cartaz de La Jetée, do cineasta Chris Marker, 1962. | Fonte: Wikimedia
La Jetée (1962), curta-metragem de ficção científica do cineasta francês Chris Marker, é um contraexemplo de produto audiovisual realizado sem recurso a imagens em movimento. O painel visual do filme é inteiramente composto por imagens estáticas. O resquício de movimento é fornecido pelos efeitos da fotomontagem (sobreposições, fusões, transições, zooms).
Mas deixemos a sala de cinema. Uma apresentação de negócios que recorra a gráficos e sons é, apesar da falta de uma “aura” artística, um produto audiovisual, apoiado, como qualquer outro, no recurso a códigos compartilhados. Isso também vale para uma fotomontagem de aniversário, com uso de imagens estáticas e trilha musical.
Atenção
A linguagem audiovisual pode prescindir, quase totalmente, do elemento verbal, restrito, no máximo, ao título. Uma peça de videoarte em que uma sucessão de homens e mulheres em silêncio, postados contra o pano de fundo de um ventilador ruidoso, olham para a câmera sem tentar piscar é tão audiovisual quanto um filme de aventura ou um telejornal.
ETAPAS DA PRODUÇÃO AUDIOVISUAL
Sigamos no campo das imagens criadas e das imagens registradas e perguntemos:
Como ocorrem essa criação e esse registro?
Imagens criadas ou registradas atestam que alguém viu algo e que aquele alguém recortou a realidade em torno de um objeto ou de objetos de interesse. E essa construção de imagens tem um antes, um durante e um depois, como qualquer processo. Estendendo a terminologia do audiovisual a outros campos de criação eregistro, podemos falar em pré-produção, produção e pós-produção.
Clique nas barras para ver as informações.
PRÉ-PRODUÇÃO
Corresponde à etapa de preparação para a criação ou para o registro: é quando se faz as primeiras escolhas. No audiovisual, corresponde ao momento em que são traçadas estratégias para dispor elementos em quadro, isto é, diante da câmera. Pensa-se na dimensão do espaço (destaques: linhas, cor, textura e forma), na dimensão do movimento e da quantidade – essa última, no geral, manifesta-se nas opções aparentemente técnicas sobre a maneira de captação, com profundo impacto no resultado.
PRODUÇÃO
Responde pelo coração da atividade: criação ou registro em ação. No audiovisual, é o momento que, na maior parte dos casos, demanda a aplicação mais intensiva de recursos. O que foi planejado e traçado na pré-produção toma forma, e essa forma é a única que chegará, mediada, adaptada, à audiência. Como reza um ditado do telejornalismo, aplicável a outros modos de construção de imagens, “há apenas um ponto comum a todas as boas reportagens: elas entram no ar” – o que vira imagem é “a” matéria da análise de imagens, sua história. Não importa o quanto se almejou na pré-produção, na pré-história da imagem: o “aqui e agora” da produção é que delimita os horizontes de uma obra, de um registro.
PÓS-PRODUÇÃO
É nesta etapa que o limite fornecido pelo que efetivamente se cria e se registra fica claro, e o material é organizado e finalizado para apresentação à audiência. No audiovisual, a “ilha”, o espaço da montagem, torna-se o local onde enfim se toma ciência do que foi entregue. O montador, profissional dessa frente, sabe mais do que qualquer outro das possibilidades do material.
O montador deve tentar enxergar apenas o que está na tela, como a audiência fará. Somente dessa maneira as imagens podem se emancipar do contexto de sua criação. Focando na tela, o editor, espera-se, usará os momentos que devam ser usados, ainda que tenham sido gravados sob dificuldade, e rejeitará os momentos que devam ser rejeitados, ainda que tenham custado muito dinheiro e esforço.
(MURCH, 2001)
No livro Num piscar de olhos, o montador norte-americano Walter Murch, editor de filmes como Apocalypse Now, O Poderoso Chefão 2 e 3 e O Talentoso Ripley, faz uma descrição clássica do ato de piscar como um indicador para a intervenção do montador.
De acordo com Murch, a piscada auxilia a separação do pensamento ou constitui um reflexo involuntário que acompanha uma separação de pensamento (MURCH, 2001). Um corte no material audiovisual disponível para edição seria necessário como uma piscada, pontuando a separação de ideias.
Ritmo do piscar de olhos faz parte da teoria da montagem de Murch. | Fonte: PhotoJS/Shutterstock
A inspiração de Murch veio de uma entrevista de 1973 do ator e diretor norte-americano John Huston ao Christian Science Monitor. Na entrevista, o diretor convidou a repórter Louise Sweeney a alternar o olhar entre:
• Uma lâmpada do outro lado da sala;
• Ele mesmo;
• A lâmpada novamente;
• E ele mais u
– Viu o que você acabou de fazer? – perguntou Huston. – Você piscou. Esses são cortes. Depois da primeira olhada, você sabe que não há razão para deslizar o olhar de forma contínua entre mim e a lâmpada, pois você já sabe o que há no meio do caminho. Sua mente cortou a cena. Primeiro, você contempla a lâmpada. Corte. Daí você me contempla.
O que resulta do processo de criação e do processo de registro de imagens?
Clique no botão a seguir.
Resposta
Pensemos em um bilhete numa garrafa. Ao lermos o bilhete, podemos especular o quanto quisermos sobre a escolha do papel e da garrafa, sobre a disposição do texto no papel, sobre as marcas de pressa ou de serenidade na escrita, sobre os sentidos expressos ou ocultos em torno do que se exprime naquelas linhas, até sobre como aquela mensagem chegou até nós (de maneira acidental ou deliberada? Como foi distribuída?).
Fonte: Chamille White/Shutterstock
Juramos ser capazes de adivinhar intenções, estratégias. Mas aquele bilhete, como uma imagem que chega até nós, que nos impacta, agride ou convida, também é reconstruído na recepção, pelo nosso viver. A construção de imagens não se esgota na aplicação, na fixação ou na entrega: ela se desdobra em cada consumo, em cada acesso. Isso é válido para a mais abstrata das pinturas, emancipada de qualquer pretensão aparente de mimese, e para o documentário ou a reportagem mais atrelada ao “real”.
Atenção
O processo de construção de imagens é feito de imagens, inicialmente mentais. Não falamos aqui da mitificada inspiração, da ideia de gênio que supostamente desce com um raio dos céus, mas do disparo mental de vontade, ainda que mínimo, para se criar ou registrar uma imagem.
Antes mesmo de criarmos ou registrarmos, já temos conosco uma imagem, uma projeção que ocupa o lugar do que ainda não existe – é o fruto da imaginação, no sentido original do termo. Essa projeção não tem suporte ou plataforma para além da nossa própria cabeça – o que não a torna menos real, nem menos persistente.
Fonte: Metamorworks/Shutterstock
Aquela primeira imagem mental faz-se presente em nós entre o vislumbre e a expectativa e segue conosco, modificada, confirmada, negada por contraste, rasurada, fragmentada ou testada, inclusive depois das primeiras instâncias de criação e registro. Antes até: o que imaginamos lá atrás, naquela primeira construção mental, resulta também do que vimos, do que vivemos até ali, do nosso histórico como criadores e registradores de imagens.
Das imagens mentais, podemos saltar aos esboços, principalmente nos processos mais complexos de construção de imagens. Estudos permitem a pintores explorar caminhos para a composição, trabalhar pontos, linhas, cores, formas, proporções. Plantas pré-mapeiam cenários para montagem. Croquis permitem o mesmo para o figurino. Storyboards ajudam a quebrar em “quadrinhos” uma cena de um documentário, de um longa de ficção ou de um curta de animação. Imagens ajudam a construir imagens.
Algumas estratégias de construção podem, entretanto, prescindir de um esboço cuidadosamente delineado: seja pela influência de um modelo consolidado, como no caso da reportagem televisiva mais convencional, ou pela adoção de uma estratégia criativa que valorize a espontaneidade e a escrita quase automática de imagens.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
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1. “Uma imagem é uma vista que foi recriada ou reproduzida. É uma aparência, ou um conjunto de aparências, que foi destacada do lugar e da hora em que fez pela primeira vez a sua aparição e foi preservada – por alguns momentos ou por alguns séculos. Toda imagem incorpora uma forma de ver. Mesmo uma fotografia, pois elas não são, como normalmente presumimos, um registro mecânico. Toda vez que olhamos para uma fotografia, nós tomamos ciência, mesmo que de forma fugidia, do fotógrafo selecionando aquela vista dentre uma infinidade de outras possíveis vistas.”
(BERGER, John. Ways of seeing. Londres: The British Broadcasting Corporation & Penguin Books, 1972.)
À luz do texto acima e do conteúdo deste tema, qual afirmação não corresponde a um aspecto da interpretação de imagens?
Não há leitura incontestável de imagens. Sempre há janela para interpretação.
A invenção do cinematógrafo reduziu de forma substantiva a necessidade de interpretar imagens registradas.
Do mesmo modo que os textos escritos, as imagens permitem leituras denotativas e conotativas.
Cada registro ou criação de imagens parte de uma escolha ou de uma série de escolhas, a começar pela escolha de um objeto.
A maneira como vemos as imagens depende também do nosso quadro de referências pessoais.
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2. Qual afirmação descreve mais precisamente a linguagem audiovisual?
A linguagem audiovisual é essencialmente verbal. Sem o predomínio do elemento verbal, é impossível falar sequer em obra audiovisual.
O termo “linguagem audiovisual” cobre apenas a combinação entre imagens em movimento e sons.
Apenas o qualificadocomo arte pode ser entendido como produto do emprego da linguagem audiovisual.
A linguagem audiovisual combina imagens e sons. Não importa para efeito de definição quais imagens e quais sons foram registrados, nem quais usos terão.
O audiovisual só pode ser aceito como tal a partir da captura sincrônica de imagem e som.
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MÓDULO 2
Reconhecer as ferramentas de análise da linguagem audiovisual
O DISCURSO AUDIOVISUAL: ESCULPIR NO TEMPO
Fonte: Gnepphoto/Shutterstock
Assumamos aqui a existência de um discurso audiovisual, com base no jogo entre imagens e sons. Tomemos, antes, “discurso” em um dos seus sentidos mais amplos, o de uma unidade igual ou superior à frase, constituída por uma sequência que forma uma mensagem com um começo, um meio e um fim (ALVES, 2006).
Quando tratamos de discurso, falamos da linguagem posta em ação (BENVENISTE, 1976), ou ainda, do revestimento de formas mais abstratas com conteúdos mais concretos (FIORIN, 1998): do protagonista ao herói adolescente que adquiriu poderes sobre-humanos ao ser picado por uma aranha (Homem-Aranha); do núcleo dramático ao orfanato onde meninas forjam laços de amizade enquanto aguardam a adoção (Chiquititas); do incidente incitante à revelação a um professor de química de um diagnóstico de câncer terminal (Breaking bad).
Diagnóstico de câncer para o professor Walter White é o incidente incitante da série Breaking Bad | Fonte: Pixabay
As muitas histórias do audiovisual se desenrolam no tempo: início, meio e fim. No roteiro, parece claro – mas, até aonde vai o roteiro? O roteiro é um guia de viagem. Não trilha o caminho por ninguém, nem escreve o texto audiovisual – esse, de novo, é escrito por imagens e sons. Mais ainda: o roteiro é um guia de viagem a ser rasurado, revisto e, muitas vezes, rasgado.
O discurso audiovisual, como qualquer outro, tem seus “operadores”, isto é, os recursos de linguagem que encadeiam as partes de um texto. Os operadores de discurso: estabelecem relações de lógica e sentido e relações de espaço e tempo; articulam argumentos e, algumas vezes, evocam que a reprodução de uma realidade ou de um universo é apenas uma reprodução de uma realidade ou de um universo, e não a própria realidade ou o próprio universo. No audiovisual, por definição, os operadores de discurso atuam sobre sons e imagens de forma inter-relacionada, pois, como lembra o cineasta francês Robert Bresson, as obras audiovisuais são escrituras com imagens em movimento e sons (BRESSON, 1988).
Mesmo quando, aparentemente, um operador de discurso incide apenas sobre uma dimensão, o efeito é sempre integrado, pois, no audiovisual, o som e a imagem estão sempre articulados no tempo.
Exemplo
Quando se insere uma trilha sonora que, na aparência, contrasta com a emoção retratada nas imagens (talvez para preparar uma virada, talvez para acentuar uma desconexão, o que costuma ser um recurso nos documentários e nas reportagens especiais), o efeito incide sobre o todo, e nunca sobre a parte, pois consumimos sempre um produto inteiro, em determinado recorte de tempo.
Sobre o tempo: em contraste com o espaço, que só pode ser representado na tela, o tempo do audiovisual pode ser acessado diretamente pelo espectador. Mesmo que o espectador deixe a sala de cinema, troque de canal ou interrompa o vídeo no celular, a janela de consumo contínuo de um conteúdo audiovisual equivale à janela da própria obra.
Fonte: Flickr
Gastou cinco minutos da vida vendo em um site um vídeo de gatos saltando, perseguindo inimigos invisíveis e ignorando seus donos? Aqueles cinco minutos estavam no vídeo original – desde que, claro, você tenha reproduzido em velocidade normal. Parece trivial? Não há correspondente na literatura, na pintura e na escultura. Não por acaso, a dimensão do tempo é apontada como matriz da experiência do audiovisual – e do cinema, em particular. O cineasta soviético Andrei Tarkovski via no tempo a matéria bruta da atividade:
Qual é a essência do trabalho de um diretor? Podemos defini-la como esculpir no tempo. Da mesma maneira que um escultor toma um bloco de mármore e, consciente das características de sua obra acabada, remove tudo que não é parte daquela obra – da mesma forma o cineasta, “de um bloco de tempo”, feito de um enorme e sólido agregado de fatos vividos, corta fora e descarta aquilo que ele não precisa, deixando apenas o que deve ser um elemento do filme acabado, o que se provará como parte integral da imagem cinematográfica.
(TARKOVSKI, 1989)
Por mais precisa que seja a análise técnica, por mais afinado que seja o planejamento, por mais firme que seja o conceito da obra, é só quando rodam câmera e som que o núcleo da atividade se desenrola. Antes dos comandos de “ação!”, “rodou!” ou “vai!”, a obra era só ideia, projeto, formato, pré-roteiro, roteiro, roteiro de gravação, plano de produção, nada próximo da concretude do primeiro take gravado.
Na maior parte dos casos, desejamos, como criadores, que o fio de uma história com imagens e sons se desenrole de modo coerente (exceção feita à busca ativa de um sentido de confusão e desorientação). Isso não significa necessariamente simplificar: mesmo quando decidimos correr o fio narrativo por um labirinto, levando o público de maneira proposital a becos sem saída, queremos que esse trajeto pelo labirinto seja claro. Formatos factuais conhecidos como true crime (crime real), muito presentes e bem-sucedidos na TV a cabo e nos serviços de streaming, fazem exatamente isso – antes de a história se aproximar de um desfecho, um investigador ou um grupo de investigadores exploram caminhos que se mostram infrutíferos. É necessário ser claro até para espalhar armadilhas e arestas, e não há melhor recurso para se fazer claro no audiovisual do que a montagem.
"A questão é que os criadores de numerosos filmes, nos últimos anos [no caso, no fim dos anos 1930], 'descartaram' a montagem a tal ponto que esqueceram até de seu objetivo e de sua função fundamentais: o papel que toda obra de arte se impõe, a necessidade da exposição coerente e orgânica do tema, do material, da trama, da ação, do movimento interno da sequência cinematográfica e de sua ação dramática como um todo. Sem falar no aspecto emocional da história, ou mesmo de sua lógica e continuidade, o simples ato de narrar uma história coesa foi frequentemente omitido nas obras de alguns proeminentes mestres do cinema, que realizam vários gêneros de filme (EISENSTEIN, 2002, grifos do original)."
ELEMENTOS BÁSICOS E OPERADORES DO DISCURSO AUDIOVISUAL
Fonte: Maximmmmum/Shutterstock
Antes de avançarmos, cabe definir algumas unidades do audiovisual, mencionadas até no discurso corrente, mas nem sempre definidas com atenção. Para isso, recorreremos à base apresentada pelo cineasta brasileiro Carlos Gerbase no didático Cinema: O primeiro filme (2012):
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PLANO
É tudo que está entre dois cortes. Previsto no roteiro, adquire sua constituição final na montagem. O plano tem ainda outro sentido no audiovisual, como a função e o resultado visual da distância entre o objeto e a câmera, mediada pelo tipo de lente utilizada.
TOMADA (OU TAKE)
É tudo que a câmera registra, desde o momento em que é ligada até o momento em que é desligada. É uma noção de filmagem. Um mesmo plano pode ser filmado várias vezes, gerando, assim, várias tomadas.
CORTE
É a passagem instantânea entre dois planos.
CENA
Conjunto de planos que acontecem no mesmo lugar. Sempre que a ação muda de lugar, a cena é trocada.
SEQUÊNCIA
Conjunto de planos (ou cenas) que estão interligados pela narrativa. O lugar pode variar, mas a ação tem continuidade lógica.
Ao que complementamos:
ENQUADRAMENTO
Ato ou efeito de delimitar o que a câmera filma ou o que o espectador vê na tela. Na definição do filósofo francês Gilles Deleuze (1983), é a determinação de um sistema fechado, relativamente fechado, que compreende tudo o que está presente na imagem, nos cenários, personagens, acessórios.
Se, nos termos do montador norte-americano Walter Murch,fazer um filme (ou, para nosso interesse aqui, um produto audiovisual) equivale a aprender uma língua estrangeira – “com o detalhe de que é um idioma único falado apenas por aquele filme” (MURCH, 2001), – os operadores de discurso acionados em cada produto se apresentam nos termos desse idioma único. Ao pensarmos um produto audiovisual nesses termos, perguntaríamos, dentre um universo de possibilidades, acerca desse idioma:
Fonte: Beatrice Murch/Wikimedia commons
No discurso audiovisual, alguns dos mais efetivos operadores de discurso são acionados por meio da montagem. A montagem assegura a costura de um produto audiovisual, da reportagem do telejornalismo ao longa-metragem de ficção, do tutorial publicado em um site de vídeos ao documentário que explora os limites narrativos do gênero, disponível no serviço de streaming.
Ilha de edição: o palco da montagem no audiovisual (Creative Commons CC0). | Fonte: Pxhere
O processo começa na ordenação dos planos, que, em geral, chegam desordenados para a ilha de edição. Em um segundo momento, salta à escolha dos planos, em diálogo com o que foi planejado antes da filmagem, com o próprio roteiro ou com o modelo estabelecido de linguagem em determinado segmento (caso das reportagens mais convencionais de telejornalismo).
Roteiro: O “Plano de ataque” narrativo. | Fonte: Olilynch /Pixabay
A escolha de planos está limitada pelo que vem da rua ou do estúdio – o montador, apesar de fazer muito, não realiza milagres, nem inventa planos que deveriam estar lá e não estão. Escolhidos os planos, o montador pode acionar os diferentes operadores de discurso para encadear as partes do texto audiovisual. As intervenções podem incidir, entre outros aspectos, sobre a duração dos planos, a alternância entre planos e os tipos de cortes.
Ao modular a duração dos planos, o montador imprime ritmo a uma sequência:
Uma sucessão de planos curtos, sem respiro, insere um elemento de rapidez e, a depender da história, de expectativa.
Em contraste, os planos mais longos podem acentuar a importância de uma ação e um entorno, além de, em alguns casos, implantar um elemento de desconforto.
No extremo da duração, há o plano-sequência, em que a continuidade que, em outros contextos, seria costurada por diferentes planos e cenas, instaura-se em apenas um plano.
No extremo do extremo, há experimentos como a obra-prima Arca Russa (2002), do cineasta russo Alexander Sokurov, filme que se constitui a partir de um plano único de mais de uma hora e meia, sem corte, sem emenda, pelos meandros do Museu Hermitage, em São Petersburgo – no caminho, atores e atrizes, figurantes, dançarinas e músicos. Ou seja, não um longo trecho do filme em plano-sequência, mas um filme inteiro, do início ao fim, em plano-sequência.
Ao alternar planos filmados com diferentes lentes e distâncias entre objeto e câmera, o montador pode revelar múltiplos ângulos de uma ação ou de um espaço e pode ir além. Pode estabelecer, por exemplo, relações de hierarquia entre objetos ou formas apresentados em dois planos consecutivos – fragmento de uma cena: Plano A, o personagem A filmado de cima para baixo (plongée, “mergulho” em francês), olhando para cima; Plano B, o personagem B filmado de baixo para cima (contra-plongée), de olhar neutro: a colagem dos dois planos funciona como um operador de discurso, estabelecendo uma hierarquia entre o personagem A (talvez um admirador, talvez um detrator) e o personagem B (talvez um admirado, talvez um odiado).
Uso do contra-plongée
Uso do plongée
Fonte: Ensine.me
Na linguagem corrente do cinema, a função e o resultado visual da distância entre o objeto e a câmera, mediada pelo tipo de lente utilizada, são conhecidos simplesmente como planos. Novamente, seguiremos Gerbase em Cinema: O primeiro filme.
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Plano aberto (long shot): A câmera fica distante do objeto, que ocupa uma parte pequena do quadro. Planos abertos ambientam as ações e apresentam um cenário.
Plano médio (medium shot): A câmera fica a uma distância intermediária do objeto, que ocupa uma proporção razoável do quadro, que ainda segue dominado pelo cenário. Planos médios posicionam e expressam movimento.
Plano fechado (close-up): A câmera fica próxima ao objeto, que agora ocupa a maior parte do quadro. O cenário fica nas margens. Planos fechados criam intimidade e dão janela à expressão de emoções e intenções.
Fonte: Ensine.me
Esses são os planos básicos, o início da conversa. Para além da tipologia básica, podemos falar em:
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Plano geral (PG): Variante de plano aberto. Ideal para revelar grandes espaços – internos ou externos.
Plano de conjunto (PC): Variante de plano aberto. Ideal para revelar espaço e objetos ou personagens dignos de destaque.
Plano médio (PM): Composto em torno de uma figura de destaque, geralmente humana, que se revela de corpo inteiro. O espaço entre a cabeça da figura de destaque e a margem superior do quadro é chamado de teto.
Plano americano (PA): A figura de destaque é enquadrada do joelho para cima.
Meio primeiro plano (MPP): A figura de destaque é enquadrada da cintura para cima.
Primeiro plano (PP): A figura de destaque é enquadrada do peito para cima. Também conhecido como close-up ou close. Revela-se como operador de discurso quando, por exemplo, pontua tensão.
Primeiríssimo plano (PPP): A figura de destaque é enquadrada do ombro para cima. Big close-up ou big-close. Também pontua tensão e sentimento.
Plano de detalhe (PD): Enquadra um objeto ou a parte de uma figura, um detalhe de um todo. No caso da figura, o fragmento pode sugerir leituras plásticas por estar tão removido do todo.
Fonte: Ensine.me
Cortes
Ao acionar diferentes tipos de corte, o montador também ativa operadores de discurso. Um corte dito seco, sem fusões entre frames, mais fotográfico, está mais perto da experiência da visão natural – por isso, adere mais ao real. Um corte que se resolva por meio de fusões ou composições simultâneas entre diferentes planos tende mais ao plástico, ao simbólico.
Fonte: guruXOX/Shutterstock
É claro que, de tempos em tempos, as tendências embaralham essas estratégias. No telejornalismo, chegou a ser moda há alguns anos utilizar efeitos de fusão ou dissolução entre diferentes planos, mesmo em reportagens cotidianas. Atualmente, pela natureza do formato e da própria missão da reportagem, essa solução se tornou menos comum, mas ainda pode ser encontrada.
O jump cut, corte brusco de um plano para outro, deixando patente a falta de transição, instaura a descontinuidade como linguagem – no cinema, pontua, por exemplo, delírios de personagens; em plataformas de vídeos na internet, já foi sinônimo de agilidade, quase uma assinatura, tendo se desgastado um pouco com o tempo. Outras soluções de corte tendem mais à estabilidade ao longo do tempo, caso do fade-in (movimento do nada, uma tela toda em preto ou em branco, por exemplo, ao quadro, mais ou menos gradual) e do fade-out (movimento do quadro ao nada, mais ou menos gradual). Vindo do nada, o montador aciona o fade-in para, por exemplo, iniciar uma sequência ou retomar depois de uma parada. O fade-out pode encerrar uma sequência ou, de maneira geralmente menos gradual, inserir uma quebra em uma cena ou sequência.
Para o montador norte-americano Walter Murch, um corte ideal é aquele que respeita uma regra de seis (em parênteses, a proporção de importância que Murch atribuía a cada item):
Mantém-se fiel à emoção do momento (51%)
Avança a história (23%)
Ocorre em um momento ritmicamente interessante (10%)
Leva em consideração a atenção e a provável direção de olhar da audiência (7%)
Respeita a lógica da transposição de uma realidade em três dimensões para um quadro com duas dimensões (5%)
Respeita a continuidade do espaço real, tridimensional, onde as figuras se movem (4%)
(MURCH, 2001, adaptado)
O acionamento dos operadores de discurso pela via da montagem realiza o que Bresson impunha como tarefa para o cinema. Bresson(1988) notava que a imagem se transformava em contato com outras imagens, como uma cor em contato com outras cores. Um azul não é o mesmo azul próximo a um verde, a um amarelo, a um vermelho. Não há arte sem transformação.
Fonte: Unknown author/Wikimedia commons
Imagens que se transformam pelo contato. O todo da montagem é mais do que as suas partes, como afirma Eisenstein:
A justaposição de dois planos isolados através de sua união não parece a simples soma de um plano mais outro plano – mas o produto. Parece um produto – em vez de uma soma das partes – porque em toda justaposição desse tipo o resultado é qualitativamente diferente de cada elemento considerado isoladamente.
(EISENSTEIN, 2002)
De acordo com Eisenstein (2002), em contraste com um quadro, no filme, o olho não pode discernir a sucessão da sequência de detalhes em uma ordem diferente da estabelecida por quem determinou a ordem da montagem.
Ângulos e movimento
Outra porta para o acionamento de operadores visuais é a própria câmera: os ângulos da câmera e os muitos movimentos pela e da câmera. Do ângulo, já falamos de dois (plongée e contra-plongée, o primeiro filmado de cima para baixo e o segundo ao contrário), aos quais se somam outros, todos parametrizados pela angulação da câmera em relação à figura, são eles:
Fonte: Metamorworks/Shutterstock
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Ângulo normal: A câmera se posiciona no nível dos olhos da figura enquadrada.
Ângulo frontal: A câmera se alinha ao centro da figura, de frente. No caso da face humana, o centro é o nariz. Como operador de discurso, pode pontuar tensão.
3/4: É uma entrada diagonal da câmera em relação à figura. Nos manuais, define-se como a posição de 45 graus em relação ao nariz da figura humana. Confere um aspecto de naturalidade e fluxo, em contraste com o mais solene “ficar frente a frente” do ângulo frontal.
Perfil: A câmera aborda a figura pela lateral. No caso da figura humana, a lente está posicionada a 90 graus em relação ao nariz. Como operador de discurso, pode servir de elemento de coordenação ou subordinação entre um “antes” e um “depois”, representados pelo plano anterior e pelo plano posterior. É uma solução de fluxo, que retrata o sujeito em quadro como alguém em uma jornada, rumo a um destino que ainda não está em quadro e que não podemos antecipar de forma plena. O efeito plástico do rosto partido tem um forte eco simbólico: a divisão, o oculto ou a intensidade do querer.
De nuca (ou ângulo traseiro): Filma por trás da nuca da figura. Como operador de discurso, esse ângulo não instaura a subjetividade por si, mas sim o papel do personagem como observador. Algo na linha de: a câmera vê, nós vemos e o personagem vê.
Fonte: Ensine.me
Fonte: Robert Kneschke |Shutterstock
O movimento também é uma porta de entrada para os operadores de discurso no audiovisual. Vejamos:
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movimentos captados pela câmera
movimentos da câmera
Os movimentos do conjunto da câmera também exercem múltiplas funções. Na panorâmica (pan), a câmera se move sobre um eixo para revelar um painel visual, conduzindo o olhar do espectador do visto para o ainda não visto (até aí, no extracampo). Quando o movimento em torno do eixo é vertical, costuma-se chamar a panorâmica de tilt.
No travelling, a câmera se desloca inteira, viaja junto: pode ser por meio de um veículo, ou do próprio cinegrafista, que pode ou não se valer de um suporte de estabilização para evitar a tremulação da câmera que, inclusive, pode constituir um recurso – até mesmo na forma extrema de um “tapa” na câmera: o máximo do desarranjo.
Set de Os Miseráveis (2012); destaque para a grua (o guindaste com a câmera) no lado direito da imagem. | Fonte: Alev Adil/Wikimedia Commons
Ângulos e movimentos servem à narrativa. Em obras de ficção, sobretudo, esse serviço é ditado em sua forma por uma escolha: o plano, a cena, a sequência ou mesmo a obra inteira são filmadas por uma câmera objetiva (uma espécie de narrador visual em terceira pessoa que escreve com imagens e simplesmente está lá vendo tudo) ou por uma câmera subjetiva (um “eu” que sabemos ser um personagem e que compartilha o que vê sob um prisma supostamente pessoal)?
Composição, luz, textura, cor e som
Fonte: S.Narongrit/Shutterstock
Em uma dimensão mais plástica – no sentido corrente, na fotografia –, operam a composição, a luz, a textura e a cor. A pontuação dessas variáveis não é exclusividade das obras de ficção e de outras peças elaboradas, como as de publicidade de primeira linha. Formatos de realidade, documentários e até peças do telejornalismo lidam com esses dados.
No cinema, por exemplo, há elementos de imagem que sugerem a construção – pelo espectador – de outras imagens. Esses elementos, muitas vezes, são sugeridos pelo ângulo e movimento da câmera (quase sempre associado à sonoridade (música, ruído), ou à própria interrupção do som), ou pelo jogo de cores, luzes etc. São elementos implícitos que funcionam como índices, antecipando o desenrolar do enredo. O trabalho de compreensão do espectador passa, assim, pela influência dessas imagens (sugeridas) que atribuem ao texto não verbal o caráter de sua heterogeneidade.
(DE SOUZA, 1997)
Cor, textura e luz são variáveis centrais na fotografia do audiovisual.| Fonte: Kiselev Andrey Valerevich/Shutterstock
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COMPOSIÇÃO
Diz respeito, como no resto da linguagem visual, à disposição dos elementos em quadro: pode ou não sublinhar o tema ou o núcleo da ação retratada. Na composição, incidem o diretor, o diretor de fotografia, o diretor de arte e o cenógrafo, entre outros profissionais. As possibilidades da composição como matriz para a geração de operadores de discurso são ilimitadas.
Uma disposição de elementos em quadro pode estabelecer relações de hierarquia, oposição, disjunção, causalidade, finalidade, entre outras. Na montagem, o somatório das instâncias de composição, uma em cada quadro, pode criar uma espécie de movimento geral, conduzindo o olho em determinada direção (não por acaso, um cineasta como Eisenstein chegava a traçar diagramas de movimento para explicitar a interação entre as instâncias de composição).
Fonte: Matyas Rehak/Shutterstock
LUZ
Dirige ou embaralha a atenção do espectador, pontua qualidades, sugere sensações e, sobretudo, instaura efeitos. Falamos de luz no sentido amplo, a luz como dado fundador do registro das imagens em movimento, para muito além do uso de artefatos de iluminação artificial (que também faz parte dela). A luz que invade tudo sugere algum tipo de arrebatamento. A luz crua, que parece invisível, implanta um sentido de realidade. A luz que exagera as formas em um primeiro plano e obscurece as outras ao fundo soa artística.
Pela luz, percebe-se com mais clareza as passagens: de um ambiente exterior para um ambiente interno e vice-versa; de um momento do dia para outro; de uma estação do ano para outra; de um país para outro; de um núcleo dramático para outro; de uma emoção a outra.
Uso de luz no audiovisual combina fontes naturais com artificiais (Trecho do documentário Morrendo sem saber | Fonte: Dafina Produções
TEXTURA
No audiovisual corresponde a um fenômeno mais complexo do que nas imagens estáticas. Ela não é apenas um efeito da fixação de um material, como a camada externa da tinta sobre um quadro: ela também pode ser o resultado de uma escolha posterior ao registro.
Diferentes formatos e tecnologias de captação de imagem imprimem texturas distintas logo na origem – até lentes sujas podem ajudar nessa impressão, de maneira consciente. Mas a busca de uma textura não se esgota na fase de produção. Na pós-produção, o tratamento de imagem pode inserir novas camadas sobre o material captado, permitindo, por exemplo, que um flashback soe ainda mais antigo, ou que a memória de um sonho resplandeça de modo ainda mais turvo.
Fonte: Ceva/Shutterstock
COR
É uma forma de assinatura narrativa. Os esforços criativos em torno da cor se iniciam logo na pré-produção (pergunta típica:“gravaremos alguma cena em preto e branco?”) e se desdobram na produção (com a escolha de palhetas, figurinos, locações e outros elementos e dados visuais). É na pós-produção, entretanto, que a cor assume o papel definitivo, no retrabalho dos níveis de saturação, contraste e brilho, entre outras variáveis. Em termos mais diretos, é na pós-produção que se chega ao preto, vermelho, azul, verde etc. que o diretor e o diretor de fotografia buscavam desde o início, para realizarem suas visões.
As cores, em si, sussurram:
• Azul caído para o escuro – tende a instaurar frieza.
• Vermelho – força de sentimento, ímpeto, violência.
• Verde – o elemento da natureza, entre outros.
• Amarelo ouro – a riqueza e a ostentação.
• Outros amarelos – podem atirar do relaxamento à inveja, num longo espectro.
• O preto e o branco encheriam capítulos, pela versatilidade.
A lista não se esgota, nem as variações de sentimentos e climas. A cor, enfim, também opera discurso.
Fonte: Authentic travel/Shutterstock
Antes de passarmos à dimensão do som, tratemos de outra via de intervenção sobre as imagens: o videografismo. Em sentido amplo, o termo videografismo cobre uma série de atividades de escrita e desenho sobre imagem, do nível mais simples dos créditos e tarjas que informam a audiência de um telejornal sobre quem fala (e sobre o que se fala) às animações que, em um documentário, ajudam a ilustrar relações e processos complexos.
O videografismo trabalha com e sobre o material captado, mas pode transcender seus limites, não apenas preenchendo as lacunas deixadas na fase de produção, mas também contando a matriz da história – e não apenas o seu apêndice. Em documentários, mas também na ficção com atores, os materiais de videografismo permitem o acionamento sobretudo de operadores de discurso de caráter metaenunciativo, isto é, que comentam, de alguma maneira, a própria enunciação, seja organizando o texto visual, seja complementando-o (KOCH, 2002).
No extremo, já entrando no terreno da animação como gênero ou dos efeitos especiais em que se ancoram as ambições dos filmes de aventura e de super-heróis, devemos levar em conta também o universo das imagens geradas por computador (CGI, na sigla em inglês): naqueles produtos, o CGI cria mundos onde se desenrolam os planos, as cenas, as sequências, os atos, a história.
Falamos até aqui de maneira extensa sobre as imagens em movimento. Agora, tratemos do som. O casamento entre o som e as imagens em movimento num sistema integrado é quase centenário. Antes desse casamento, o som era um corpo externo ao cinema, aplicado nas salas de projeção por meio de uma ação externa (com bandas e orquestras ao vivo, além de execuções de fonogramas). A partir da união entre as duas dimensões, no fim da década de 1920, o espectro de possibilidades do cinema como forma de arte se expandiu significativamente – a TV, em contraste, já nasceu com som.
No discurso audiovisual, o som tem função expressiva, seja pela música, pela voz, pelo som direto e pelos efeitos sonoros, que produzem som onde não havia. Todas essas formas de entrada têm potencial de atuarem, em cada instância, como operadoras de discurso, introduzindo, acentuando, contrapondo, desdobrando. No entendimento de cineastas como Robert Bresson, o som reteria, inclusive, o poder de evocar até mais do que a imagem.
Exemplo
Um exemplo do poder de evocação do som é o seu uso como elemento preparatório de uma ação. Inseridos antes da imagem, um fragmento de som direto, uma narração em off ou um efeito sonoro estimulam o espectador a imaginar o que virá (extracampo) – um jogo de adivinhação de resultados quase sempre instantâneos.
ANÁLISE DO DISCURSO AUDIOVISUAL
E se, como pontuou Susan Sontag, logo ficou claro, depois dos primórdios da fotografia, que não havia uma atividade simples e unitária denominada “ver”, no audiovisual, tampouco há uma visão unitária, menos ainda inequívoca. As visões do audiovisual são tantas quantas forem as visões incidentes para a produção de uma obra – e, nas obras mais complexas, a quantidade de visões em interação pode passar das dezenas. Como podemos ler o produto, seja ele uma reportagem de um telejornal ou um longa-metragem de ficção? Procurando traços e padrões da escrita com imagens e sons e olhando para o entorno.
A tarefa não é simples:
Para cada cena, diálogo, frase, luz, imagem, enquadramento mencionados, há diversas nuances além daquelas que tentamos desvendar. O discurso é o resultado de um conjunto de fatores, e a sua separação em categorias é uma necessidade metodológica para o auxílio da análise. Na verdade, todavia, elas estão juntas, misturam-se, fundem-se e se confundem, tornando esse processo ainda mais misterioso.
(ALVES, 2011)
Plongée extremo, ângulo também conhecido como zenital. | Fonte: Pexels/Pixabay
Repassamos aqui elementos da escrita audiovisual, com foco no que vemos e ouvimos, e atenção também ao que é sugerido para além do quadro. Procuramos nessa escrita os operadores: os nós e os eixos de uma engrenagem sempre única, sempre nova. Mas esse estudo precisa ser acompanhado por outro, o da análise de discurso.
E do que falamos quando invocamos a análise de discurso?
De discursos como palavras em movimento (ORLANDI, 2001) e das relações entre eles e a realidade (social):
Enquanto outras metodologias trabalham para entender ou interpretar a realidade social como ela existe, a análise do discurso busca desmascarar a forma em que ela é produzida.
(PHILLIPS; HARDY, 2002)
O discurso revela – sempre em contextos: de produção, circulação, controle e consumo, entre outros. Para analisar plenamente o discurso audiovisual, precisamos traçar também as condicionantes de suas diferentes expressões, seus gêneros e formatos.
Se o cinema é uma indústria, a linguagem cinematográfica não pode ser entendida sem uma investigação sobre a organização dessa indústria e sobre suas conexões materiais e políticas com outras indústrias e instituições. E mais: quem consome? Há valores partilhados entre os consumidores de um nicho?
Fonte: StunningArt/Shutterstock
Isso vale para a TV (aberta ou fechada), que, na maioria dos mercados, sofre algum tipo de regulação: quais são as regras do jogo? Qual é o poder de barganha dos donos de canais? O quanto se regula efetivamente? No caso específico do telejornalismo, com quem dialogam os responsáveis pelas apurações e pautas? No caso de reportagens e coberturas com alguma matriz temática de conflito social, há mais do que a fonte primária do Estado e sua versão oficial? Não é possível analisar a produção de um programa noticioso com ênfase em violência sem traçar como a imprensa e a polícia se relacionam como instituições. Como diferentes poderes de ocultar e revelar se combinam? Que vozes são amplificadas? Que vozes são estruturalmente silenciadas no processo?
As respostas transcendem a esfera dos conteúdos tomados isoladamente. Estão na estrada que se abre entre a enunciação (o uso da linguagem para a produção de um enunciado qualquer) e o consumo, assim como em todas as suas esquinas no meio do caminho: nas esquinas da sociedade, da cultura, da economia, da política, dos costumes. Concentramo-nos aqui em apontar como piscam os semáforos e o que dizem as placas no trecho inicial daquela mesma estrada. É um início, ou um pouco mais do que isso.
ANALISANDO O DISCURSO AUDIOVISUAL
Por que escolher ou priorizar uma cor, um corte, um ângulo?
Veja exemplos da análise de elementos e operadores do discurso audiovisual.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
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1. Dentre os elementos indicados abaixo, quais são usados em uma análise da linguagem audiovisual?
I. Planos e ângulos
II. Cortes e movimento
III. Planejamento e orçamento
IV. Composição e som
I, II e III
II, III e IV
III, IV e I
I, II e IV
I e II
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2. A análise de discurso aponta sua lente para os espaços onde a linguagem se apresenta em movimento, em ação. No caso do audiovisual, não é diferente: analisar seus conteúdos passapor analisar também os contextos em que se dão a produção, a circulação, o controle e o consumo.
Qual estratégia de pesquisa não se adequaria a uma análise de discurso de debates televisivos entre candidatos à Presidência?
Estudo restrito ao que é expressamente dito pelos atores envolvidos.
Análise prévia da concentração de propriedade dos meios de comunicação.
Investigação sobre os hábitos da audiência que acompanha os debates.
Estudo de fundo sociológico sobre as equipes que produzem os debates.
Estudos dos condicionantes sociais e culturais das diferentes expressões utilizadas.
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Comentário
CONCLUSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Realizamos aqui uma jornada em torno da imagem. Das imagens naturais às criadas, das imagens fixas às imagens em movimento, listamos elementos básicos e ressaltamos o imperativo da interpretação: seja qual for a imagem, sempre a interpretamos (e de maneiras imprevisíveis).
Pleiteamos a existência de um discurso audiovisual, e logo passamos a apontar, dentre os elementos visuais e sonoros desse discurso, os agentes recorrentes de encadeamento de narrativas. Como exercício, exploramos o conceito de operadores de discurso, corrente na análise de textos escritos.
Destacamos a montagem, o papel da câmera, dos dados plásticos, como luz, cor e textura, e encerramos com uma breve discussão sobre o papel do som no discurso audiovisual.
Por fim, a título de apontamento de caminhos futuros, realizamos uma breve descrição dos horizontes da análise de discurso para demonstrar que não basta apenas analisar enunciados e narrativas em si – é preciso sempre se reportar um contexto que precisa ser revelado.
PODCAST
Agora, o professor David Butter encerra o tema falando sobre a linguagem jornalística no audiovisual.
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REFERÊNCIAS
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GERBASE, C. Cinema: O primeiro filme. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 2012.
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SONTAG, S. Sobre fotografia. São Paulo: Companhia das letras, 2004.
SOUZA, T.C.C., Discurso e imagem: Perspectivas de análise não verbal, Comunicação apresentada no 2º Colóquio Latino-americano de Analistas de Discurso, La Plata e Buenos Aires, 1997.
TARKOVSKI, A. Sculpting in time. Austin: University of Texas Press, 1989.
VILLAFAÑE, J. Introducción a la teoria de la imagen. Madri: Ediciones Pirámide, 2006.
EXPLORE+
Conheça o site do Primeiro Filme, projeto de referência para introdução ao audiovisual.
Assista ao filme Arca Russa (2002), gravado em único plano-sequência.
Também vale procurar a tese de doutorado Dimensões argumentativas do discurso fílmico: Projeções retóricas na tela do cinema, de Carolina Assunção e Alves, que se baseia em uma análise detalhada do filme O Poderoso Chefão II (1974) por meio das ferramentas da Retórica.
O Glossário de termos técnicos do cinema e do audiovisual, utilizados pela Ancine/Versão 1.32, disponível online, também é uma importante referência.
Veja ainda os documentários brasileiros Cidadão Boilesen (2009) e Democracia em preto e branco (2014), dois exemplos de obras em que o videografismo ocupa espaço de destaque na narrativa.
Outra recomendação é a série documental Bandidos na TV (2019), sobre os bastidores sombrios de um programa de TV que se alimentava da violência para fazer sucesso.
CONTEUDISTA
David Butter
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