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Tema 2 Sociedade e Contemporaneidade

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26/04/2022 20:52 T002
https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t002 1/14
PARTICIPAÇÃO POLÍTICA
NA ERA DIGITAL:
MOVIMENTOS SOCIAIS
EM REDE E CRISE DA
DEMOCRACIA
REPRESENTATIVA
Prof. Honor de Almeida Neto
https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t001?authuser=0
26/04/2022 20:52 T002
https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t002 2/14
NESTE CAPÍTULO, VOCÊ VAI APRENDER
compreender a relação entre o exercício do poder e a forma de produção e de
disseminação das informações;
perceber as formas de reprodução social e exercício do poder e da dominação
através da violência física e simbólica;
materializar o conceito de rede dinâmica como um “óculos” para entender os
movimentos sociais na sociedade informacional/líquido-moderna;
perceber elementos associados à crise da democracia representativa liberal e à
ruptura entre governantes e governados e seus desdobramentos.
entender o porquê do retorno ao autoritarismo e ao fundamentalismo que se
observa em nível local e global (glocal);
compreender as formas de reprodução social e de transformação social na sociedade
em rede.
INTRODUÇÃO
A partir da compreensão dos códigos que distinguem a sociedade contemporânea em
Rede Dinâmica, fluída, líquida e complexa, traremos alguns exemplos que materializam
esses conceitos e que nos ajudam a entender a dinâmica do nosso tempo. A partir do
pressuposto de que as relações humanas e sociais são relações de poder e de
dominação, as relações de poder na sociedade da informação são colocadas em xeque
frente ao potencial democrático e revolucionário da sociedade em rede, e desse novo
ecossistema informacional, digital. Ou seja, através do controle da informação é possível
senão criar um fato, criar versões diferentes sobre fatos, daí que não existem
sociedades democráticas sem que haja liberdade de imprensa. Prova disso é que
governos autoritários e antidemocráticos governam limitando os espaços de divulgação
de informações, e a censura aos meios de comunicação historicamente sempre foi uma
estratégia eficaz voltada a esse fim.
Ocorre que na Sociedade em Rede e neste novo ecossistema cognitivo em que vivemos
a informação circula sem a mesma possibilidade de controle, de censura. Afinal, todos
nós somos uma mídia, filmando, gravando e postando informações na rede para serem
consumidas e compartilhadas em enorme velocidade e em grande escala. As relações
de poder na sociedade do conhecimento são construídas de forma mais horizontalizada
e menos verticalizada (hierárquica). A informação é hoje mais socializada e reconstruída
https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t001?authuser=0
26/04/2022 20:52 T002
https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t002 3/14
a todo instante, sem um controle central (piramidal).
A forma de mobilização das pessoas via redes sociais e suas características nos
permitem entender que a cultura associada às novas tecnologias é a cultura da
autonomia, muito presente na relação dos jovens (geração internet) em relação às
instituições e aos poderes instituídos da sociedade. Nas palavras de Castells (2012) a
nova cultura da autonomia empodera os jovens e traz a eles felicidade. Traz felicidade,
pois a Internet aumenta duas áreas fundamentais para isso: a sociabilidade e o
empoderamento. Amplia-se o espectro de socialização, as redes de relações que agora
se dão em uma espaço global, bem como o empoderamento dos sujeitos a partir das
novas possibilidades de acesso e disseminação de informações.
As práticas nas redes sociais materializam essa cultura da autonomia que se choca com
a cultura de inúmeras organizações tipicamente modernas (verticais, tradicionais,
rígidas, hierarquizadas, burocráticas, controladoras). Pense em escolas, repartições
públicas, partidos políticos, igrejas, forças armadas, famílias, empresas, dentre outras.
Como forma de materializar essa abstração que é o conceito de Rede Dinâmica, e
efetivamente utilizá-lo como “óculos”, como filtro na aproximação com a realidade
contemporânea, iremos nos reportar a dois fatos relativamente recentes. Não por acaso
esses dois exemplos se dão em nível global e podem ser observados em inúmeros
países do mundo quase que ao mesmo tempo. Refiro-me em primeiro lugar aos
movimentos sociais ocorridos entre 2012 e 2013 e a crise da democracia representativa,
ou seja essa crise de confiança que se observa hoje entre governantes e governados e
coloca em risco o modelo de democracia liberal que temos, sem que haja outro modelo
mais eficaz para substituí-lo. Crise de confiança que, aliás, está na gênese dos
movimentos sociais e que os próprios movimentos ajudaram a radicalizar. Ou seja,
como efeito colateral da crise da democracia observa-se no mundo todo um retrocesso
quanto às conquistas, valores e princípios associados à democracia representativa
liberal, o que abre espaço para o retorno de autoritarismos e fundamentalismos de
todos os tipos.
https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t001?authuser=0
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https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t002 4/14
MOVIMENTOS SOCIAIS EM REDE
DINÂMICA
Em primeiro lugar, se é que você, aluno, ainda lembra (pois a velocidade do tempo se
acentuou), no ano de 2013 eclodiram manifestações populares nas ruas em grandes
proporções no Brasil, na esteira de outros movimentos sociais concomitantes que foram
observados em inúmeros países. Foram movimentos construídos em rede, sem a
liderança tradicional de partidos ou sindicatos, pois a estrutura de uma rede é distinta,
por exemplo, de uma pirâmide. Rede não tem centro, começo, nem fim, tem várias
entradas e várias saídas (ver dimensões desse conceito no INFOGRÁFICO). Sendo assim,
os movimentos sociais que emergiram em 2013 começaram na Internet, que é um
“espaço de autonomia, muito além do controle de governos e empresas que
monopolizavam os canais de comunicação como alicerces de seu poder” (CASTELLS,
2012). Assim, “indivíduos formaram redes [...] uniram-se e sua união os ajudou a superar
o medo, essa emoção paralisante em que poderes constituídos se sustentam”.
Bem de acordo com a velocidade que distingue nosso tempo, “os movimentos
espalharam-se por contágio em um mundo ligado pela Internet caracterizado pela
difusão rápida, viral, de imagens e ideias” (CASTELLS, 2012).
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https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t002 5/14
Movimentos sociais lotam a Avenida Paulista. Fonte: Wikimedia
Como vivemos em uma aldeia global e em rede, poderíamos perguntar: onde
começaram os movimentos? Desenvolveram-se em rede: no mundo árabe, Espanha,
Grécia, Portugal, Itália, Grã-Bretanha, além de Israel e Estados Unidos, Ásia e Brasil,
Tunísia e Islândia. Mas o que há de comum entre todos eles? Observa-se que em todos
os casos, os movimentos ignoraram partidos políticos, desconfiaram da mídia, não
reconheceram nenhuma liderança e rejeitaram toda a organização formal, sustentando-
se na Internet e em assembleias locais”. (CASTELLS, 2012, p. 16)
Dessa forma, aqueles movimentos transformaram o medo em indignação e a
indignação em esperança. Isso porque as relações de poder são constitutivas da
sociedade, pois aqueles que têm o poder constroem as instituições conforme seus
valores e interesses.
E quais as formas de exercer o poder? Pela coerção (violência exercida pelo Estado) e/ou
pela construção de significados na mente das pessoas, mediante mecanismos de
manipulação simbólica, até porque “torturar corpos é menos eficaz que moldar
mentalidades” (CASTELLS, 2012).
https://www.google.com/url?q=https%3A%2F%2Fupload.wikimedia.org%2Fwikipedia%2Fcommons%2F7%2F72%2FABr200613_MCA2268.jpg&sa=D&sntz=1&usg=AOvVaw27-8WCgxrme8dIM35XNMm8
https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t001?authuser=0
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https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t002 6/14
Dominação pela violência física. Fonte: Wikimedia
Pense, por exemplo, que todos os regimescerceadores da liberdade e baseados na
força, na repressão e no autoritarismo foram sempre acompanhados de uma forte
propaganda ideológica, como forma de legitimar a violência física, justificá-la. Se nos
reportarmos à história recente brasileira o próprio golpe militar é denominado de
“revolução” pelos militares e simpatizantes do regime militar, sendo inclusive
comemorado como tal. Essas disputas simbólicas fazem parte do universo da política e
da construção social de significados, presentes em todas as instâncias sociais, pois como
já referimos, as relações humanas e sociais são relações de poder e de dominação.
Como exemplo, podemos nos reportar à questão agrária e os embates entre os
integrantes do MST (Movimento dos Sem Terra) e os proprietários de terra na luta
histórica pela reforma agrária no Brasil. O termo “ocupação”, utilizado pelos integrantes
do MST e pelos simpatizantes, remete à ideia de ocupar algo que pertence
legitimamente ao movimento, aos pequenos agricultores em uma discussão que
envolve, por exemplo, o fim social da terra. Em contraste a essa visão de ocupar algo
https://www.google.com/url?q=https%3A%2F%2Fupload.wikimedia.org%2Fwikipedia%2Fcommons%2F1%2F19%2FWebysther_20130618234820_-_Tropa_de_choque_criando_um_bloqueio_na_Augusta.jpg&sa=D&sntz=1&usg=AOvVaw3g6wy4Y2vZjCivAuVnar5-
https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t001?authuser=0
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https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t002 7/14
, p p , p g
que legitimamente lhe pertence, o termo “invasão” de terra, de forma contrária, remete
à lei que, em uma democracia liberal, garante a propriedade privada e deslegitima,
portanto, o movimento, criminalizando-o. Nessa perspectiva, o “invasor” invade algo que
não lhe pertence e, portanto é um criminoso, alguém a ser contido pela força policial,
pela lei.
Veja que meu intuito aqui não é posicionar-me nessa disputa, nem tampouco induzir
você, aluno, a tomar partido, até porque não é esse o meu papel, mas chamar atenção
para o fato de que, em se tratando de sociedades, tudo é construído, nada é natural,
tudo é produto de disputas em torno de interesses, por vezes antagônicos e por vezes
convergentes, mas sempre por disputas. Essa é uma característica que distingue nossa
sociedade e nossa espécie. A espécie humana é a única espécie que não nasce pronta,
que precisa ser formada e que, sobretudo tem liberdade para escolher como quer viver
em grupo. Lembre-se que o homem constrói a cultura que o constrói, e nessa
construção o papel da informação e do controle da informação é central.
Por isso, não há regime democrático sem liberdade de imprensa e de expressão,
embora também os regimes democráticos lancem mão de propagandas ideológicas
para legitimar seu poder junto às sociedades e à estrutura (as posições) de poder
presente nas sociedades, mas onde há poder há também contrapoder, pois, “esse
processamento mental é condicionado pelo ambiente da comunicação, e a mudança do
ambiente afeta diretamente as normas de construção de significado e, portanto, as
relações de poder” (2012). Como vimos, a comunicação que temos hoje é de “todos com
todos”, uma comunicação em massa, baseada em redes horizontais de comunicação
interativa que, geralmente, são difíceis de controlar por parte de governos ou empresas,
“por isso empresas e governos temem a internet” (idem, 2012). Aqui ilustro o potencial
democrático da Sociedade em Rede nessa relação entre informação e poder.
Porém, se na comparação com ambientes comunicacionais do passado o atual
ecossistema cognitivo em que vivemos chamado ciberespaço, é potencialmente mais
democrático em função da maior dificuldade da censura, é também um espaço
monitorado. A maior liberdade que temos em função desse novo ambiente cobra o
preço da ausência de privacidade. O caso emblemático da divulgação de dados de
espionagem do governo americano sobre governos, empresas e populações no mundo
todo, inclusive nos Estados Unidos e sobre a própria população americana, é prova
disso.
Se informação é fonte de poder imagine o poder que tem uma empresa e/ou um
governo que tem informações privadas de todas as pessoas e instituições do planeta.
Assista a entrevista abaixo de Eduard Snowden e Glenn Greenwald revelando os
bastidores desse fato emblemático e que reforçou mais do que nunca a noção de que
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bastidores desse fato emblemático e que reforçou mais do que nunca a noção de que
vivemos em aldeia global, sem limites de espaço e de tempo e com cada vez menos
privacidade.
Retomando a discussão em torno das manifestações de 2013, cabe indagar a origem
dos movimentos sociais? Afinal, de onde vêm os movimentos sociais? Nas palavras de
Castells (2012), “são a resposta às injustiças de todas as sociedades: exploração
econômica; pobreza desesperançada” (idem). São ainda frutos da “desigualdade injusta;
comunidade política antidemocrática; Estados repressivos; Judiciário injusto; racismo;
xenofobia; negação cultural; censura; brutalidade policial; incitação à guerra; fanatismo
religioso; descuido com o nosso planeta azul; desrespeito à liberdade pessoal; violação
da privacidade; gerontocracia; intolerância; sexismo; homofobia e outras atrocidades
que retratam os monstros que somos nós”.
Se é verdade que o ciberespaço é também um espaço, um lugar, é preciso que um
movimento que ocorre nesse novo lugar agora imaterial materialize-se nos espaços
públicos locais, urbanos, pois “ao assumir e ocupar o espaço urbano, os cidadãos
reivindicam sua própria cidade, uma cidade da qual foram expulsos pela especulação
imobiliária e pela burocracia municipal”. Não é por acaso que observamos de forma
crescente a substituição de espaços públicos voltados ao interesse público (nem do
Estado nem do mercado) por espaços de consumo. Shoppings centers, por exemplo,
não são espaços públicos, são espaços privados e voltados ao consumo e não à
convivência social, embora haja convivência social também nesses espaços, é claro.
Interessante observar o poder de viralização de postagens e mobilizações nas redes
sociais em torno de determinadas causas, determinadas “bandeiras”, a uma velocidade
impensada e atingindo um número expressivo de pessoas. Essa é uma possibilidade
associada a características das novas tecnologias e do grau de comunicação e interação
que engendram. Ou seja, após postada uma mensagem na rede, ela assume “vida
própria”, não tem mais dono, é por natureza imprevisível uma mensagem auto-eco-
organizativa.
Lembro de um caso emblemático que ocorreu justamente nesse período das
manifestações no Brasil, em sala de aula, quando uma aluna expressou sua surpresa e
preocupação com o fato de que, na esteira das mobilizações dos jovens que ocorreram
concomitantemente em diversas cidades do Brasil e do Rio Grande do Sul, ela havia
proposto uma mobilização com o objetivo de qualificar e garantir o transporte de sua
cidade do interior gaúcho até a universidade e de forma gratuita. A aluna relatou que
em poucos minutos havia mais de 100 curtidas, comentários e compartilhamentos e
que, ao longo do dia, na medida em que aumentavam as curtidas e interações a partir
de sua provocação, ela havia arrastado, quase que involuntariamente, uma multidão de
jovens até a frente da prefeitura da cidade para protestar e pressionar Trata se de um
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jovens até a frente da prefeitura da cidade para protestar e pressionar. Trata-se de um
caso sintomático, pois “no Brasil, sem que ninguém esperasse [...] sem líderes e sem
partidos nem sindicatos [...] um grito de indignação contra o aumento do preço dos
transportes reuniu multidões em mais de 350 cidades” (CASTELLS, 2012).
Um dos motivos das manifestações, mas não o único,foi a questão do preço do
transporte público, o Passe Livre, pois “ a mobilidade é um direito universal e a
imobilidade estrutural das metrópoles brasileiras é resultado de um modelo caótico [...]
produzido pela especulação imobiliária e pela corrupção municipal” (idem, anterior), e
ainda na esteira desse processo ”um transporte a serviço da indústria do automóvel,
cujas vendas o governo subsidia” (idem, anterior). O movimento colocou em cheque o
neopatrimonialismo do Estado brasileiro tanto da classe política como das instituições
políticas, modernas, burocráticas, morosas e que usam a democracia a serviço dos
profissionais da política. Exigiu também mais democracia não mais reduzida a “um
mercado de votos em eleições realizadas de tempos em tempos, mercado dominado
pelo dinheiro e pelo clientelismo e pela manipulação midiática” (CASTELLS, 2012).
Por tudo isso, colocou em xeque a classe política pela própria natureza e estrutura do
movimento, em rede dinâmica. Afinal: em uma manifestação sem líderes, ou com
inúmeros líderes, com quem negociar? Quem cooptar? Como comprar o líder? As
lideranças, assim como o próprio movimento, são efêmeras, fluidas. Por essa razão,
essas manifestações pegaram a todos desprevenidos: políticos, mídia, intelectuais
(sobretudo os modernos) e sociedade como um todo: “milhares de pessoas eram ao
mesmo tempo indivíduos e coletivos, sempre conectadas em rede e enredadas na rua,
mão na mão, tuítes a tuítes, post a post, imagem a imagem” (CASTELLS, 2012). Tratou-se
de um movimento dos jovens, da cultura da Internet “[...] que a gerontocracia
dominante não entende e suspeita, quando seus próprios filhos e netos se comunicam
pela Internet e ela sente que está perdendo o controle” (CASTELLS, 2012). Não há
mesmo como ter controle, dado que imprevisibilidade é uma das dimensões da rede
dinâmica, “pois a autocomunicação de massas é a plataforma tecnológica da cultura da
autonomia” (idem, p. 180).
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Assista aqui a entrevista com o cientista político brasileiro Sérgio Abranches, que
aborda as novas formas de manifestação democrática nesse novo ambiente
comunicacional (ciberespaço).
Inúmeras foram as bandeiras desse movimento em rede, bem de acordo com a
diversidade e complexidade que caracterizam nosso tempo: transporte público gratuito;
a corrupção entre o Estado e a especulação imobiliária; o meio-ambiente e a diversidade
(inclusive o direito dos homossexuais); o dinheiro gasto na copa do mundo de futebol; a
PEC 37 (proposta de emenda constitucional); a saúde e a segurança pública; o baixo
salário dos professores, dentre outras.
O movimento contemplava inúmeras bandeiras, inclusive antidemocráticas. Mas havia
https://www.youtube.com/watch?v=_5Fy4FaxE7s
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algo ainda mais em comum: a restrição aos políticos e aos partidos, essas estruturas
políticas tipicamente modernas (hierarquizadas, com ‘caciques’, chefes). Todos disseram
“chega” à política tradicional feita pelos e para os políticos, para a elite econômica aliada
ao Estado em todas as suas formas. Hoje a capacidade de mobilização das pessoas é
espontânea, não depende da permissão de um partido de massa ou de uma central
sindical, como ocorria nas antigas manifestações.
Outro aspecto central à essa análise está ligado à nova visibilidade típica da sociedade
contemporânea. O movimento não foi em nada pautado pela mídia tradicional, aliás, de
pouca importância na vida cada vez mais individualista, customizada e autônoma dos
jovens. Assim, rompe-se o monopólio da opinião e da informação que circula, pois cada
elemento da rede é a mídia, com seu celular ligado e registrando em tempo real os
fatos, retroagindo sobre outros fatos e outras postagens (informações).
Se uma das características principais da rede dinâmica e do nosso tempo é a velocidade,
cabe ressaltar o quão efêmero foram esses movimentos. Construídos em rede e dentro
da lógica da sociedade em rede, caracterizaram-se por serem glocais, em grande escala,
fluídos, flexíveis e velozes, daí que atingiram o país e a imagem das instituições
democráticas como um “tsunami” e desapareceram, e aqui temos um paradoxo. O
movimento que clamava por mais democracia não teve canais democráticos
estabelecidos e capazes de canalizar os inúmeros desejos e as diferentes bandeiras,
demandas (em rede) que se apresentaram. Ocorre que temos instituições
“democráticas” piramidais para atender demandas em rede (horizontais), daí um
aspecto associado à crise do atual modelo político, e que esteve na gênese do próprio
movimento.
O paradoxo é que esse mesmo movimento, que em síntese clamava por mais
democracia, participação e transparência por parte da classe política acabou resultando,
não de forma intencional, mas pela natureza caótica da realidade contemporânea, em
uma arma contra a democracia e seus princípios. No Brasil e no mundo observam-se
revezes quanto aos postulados democráticos como liberdade, tolerância, respeito às
diferenças, aumento da participação da sociedade na distribuição do poder do estado,
direitos humanos, enfim, o respeito às regras do jogo democrático. Observa-se uma
crise no modelo de democracia representativa liberal, uma ruptura na relação entre
governantes e governados, fruto de uma falta de confiança na representatividade da
classe política. Entre os cidadãos que menos apoiam a democracia como sistema de
governo estão os brasileiros (43%) e os mexicanos (38%) (Latinobarômetro, 2017).
Inúmeros são os aspectos que desencadeiam essa ruptura como, por exemplo, o fato
de que dois terços (⅔) da população do planeta acha que os políticos não os
representam; que os governos são corruptos, injustos, burocráticos e opressivos; que os
https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t001?authuser=0
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https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t002 12/14
p ; q g p , j , p ; q
partidos defendem a si próprios, formando uma casta política. Vejam os dados (gráficos)
que demonstram e ratificam a tese da crise da democracia em:
www.zahar.com.br/livro/ruptura.
Castells aponta que há uma ruptura entre governos e governados, isso porque a
democracia por ser representativa só pode existir se as pessoas acreditarem que estão
sendo representadas. Inúmeros aspectos conspiram contra a confiança na classe
política por parte da sociedade. A crise dos partidos políticos, cujo papel é central em
uma democracia representativa, é uma delas, pois os partidos que se profissionalizaram
tornaram-se oligarquias independentemente das ideologias e se afastaram de suas
bases, fazendo com o que sistema (político) passasse a funcionar de forma autônoma e
independente dos cidadãos (CASTELLS, 2018).
Também conspiram contra o modelo as limitações do poder do Estado Nacional para
resolver problemas que são globais, como a própria globalização da economia e suas
crises, que desestruturaram as economias nacionais e locais, ou, ainda, o fato de que os
estados foram transformados em Estado-rede, em nós de uma rede global cujas
decisões estão afastadas da comunidade que elege seus representantes, fato que mina
a confiança nos eleitos, deslegitimando-os (CASTELLS, 2018).
Outro aspecto importante nesse contexto de visibilidade e fim das distâncias é a política
de escândalos da mídia, o que reforça e perpetua a imagem da corrupção da classe
política. Soma-se a isso a crise do emprego que afeta sobretudo os jovens; a ideologia
do consumo, ligada à uma satisfação imediata e tendo o dinheiro como medida do
sucesso. Também as redes sociais e as fake news, que na disputa política personalizam
a política através de ataques pessoais aos candidatos, desconstruindo políticos e a
própria política como uma estratégia eficaz deresolução de conflitos. E, por fim, a crise
de identidade, ligada ao fato de que as pessoas não se veem mais sintonizadas com
esse mundo, e quanto menos controle têm sobre seu estado e o mercado mais se
voltam às suas comunidades de origem, reforçando a xenofobia e a intolerância ao
multiculturalismo e a própria diferença como um todo. Tanto a crise da democracia
como a crise de identidade serão aprofundados nos demais temas desta disciplina, pois
se constituem aspectos importantes associados à dinâmica da sociedade
contemporânea.
Finalizando este capítulo, aponto para a absoluta imprevisibilidade que distingue nosso
tempo e que desafia os intelectuais, e a mudança radical que as novas mediações
trouxeram e vêm instaurando na vida das pessoas e das sociedades, pois “o que é
irreversível no Brasil e no mundo é o empoderamento dos cidadãos, sua autonomia
comunicativa e a consciência dos jovens de que tudo que sabemos do futuro é que eles
o farão” (CASTELLS 2012) Porém tudo está por se definir pois o ciberespaço é também
http://www.google.com/url?q=http%3A%2F%2Fwww.zahar.com.br%2Flivro%2Fruptura&sa=D&sntz=1&usg=AOvVaw0QJUXMJGQhksPrLNjrRRiN
https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t001?authuser=0
26/04/2022 20:52 T002
https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t002 13/14
o farão (CASTELLS, 2012). Porém, tudo está por se definir, pois o ciberespaço é também
uma arena de lutas, de disputas entre forças progressistas e forças conservadoras, cuja
capacidade de reorganização e reestruturação é imensa.
Assim, ao instrumentalizar os alunos e os jovens, sobretudo, a respeito dos códigos que
distinguem nosso tempo nesse diálogo necessário com a ciência, pensamos poder
contribuir para esse fazer e esse novo devir.
INFOGRÁFICO
Google Slides1Info G000003GS001T002
https://docs.google.com/presentation/u/0/?authuser=0&usp=slides_web
https://docs.google.com/presentation/d/1cTkAi5DOKbsHNLM89IJhJ97qBQRHM2NZneotWxvCvJs/present
https://sites.google.com/ulbra.br/g000003gs001/t001?authuser=0
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REFERÊNCIAS
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BONNEWITZ, Patrice. Primeiras Lições sobre a Sociologia de Pierre Bourdieu.
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CASTELLS, Manuel. Ruptura: a crise da democracia representativa liberal. Rio de Janeiro:
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CRÉDITOS
Coordenação e Revisão Pedagógica: Claudiane Ramos Furtado
Design: Luiz Specht
Diagramação: Marcelo Ferreira
Ilustrações: Marcelo Germano / Rogério Lopes
Revisão ortográfica: Ane Arduin
Produzido por Núcleo de Audiovisual e Tecnologias Educacionais (NATE) - ULBRA EAD
Universidade Luterana do Brasil
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