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Autor: Prof. Fernando Henrique Cavalcante de Oliveira Colaboradora: Profa. Elizabeth Nantes Cavalcante Organização do Estado Professor conteudista: Fernando Henrique Cavalcante de Oliveira Doutor em Filosofia e História da Educação pela Universidade Estadual de Campinas. Mestre em Ciências da Religião pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Especialista em Docência do Ensino Superior pela Unicesumar. MBA em Gestão de Projetos pela Unicesumar. Pós-graduado lato sensu em Administração de Negócios pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Especialista em Gestão Educacional pela Unicesumar. Licenciado em Pedagogia pela Unicesumar. Licenciado em História pelo Claretiano Centro Universitário. Bacharel em Direito pela Universidade Paulista. Licenciado em Filosofia pelo Claretiano Centro Universitário. Licenciado em Letras Português/Inglês pela Unicesumar. Bacharel em Odontologia pela Universidade Federal de Alagoas. Professor da Universidade Paulista. Pesquisador nas áreas de educação e tecnologias em EaD, educação, filosofia, história e ciências humanas e sociais. Professor com experiência por quinze anos em EaD e vinte anos em ensino presencial nos cursos de graduação e pós-graduação. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) O48o Oliveira, Fernando Henrique Cavalcante de. Organização do Estado / Fernando Henrique Cavalcante de Oliveira. – São Paulo: Editora Sol, 2021. 160 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230. CDU 34(20) U510.98 – 21 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Graduação Unip Interativa – EaD Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcello Vannini Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático – EaD Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Deise Alcantara Carreiro – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Lucas Ricardi Willians Calazans Sumário Organização do Estado APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................9 INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................................ 10 Unidade I 1 AS ORIGENS DO ESTADO MODERNO ...................................................................................................... 11 1.1 Definindo conceitos ............................................................................................................................ 11 1.2 Características do Antigo Regime ................................................................................................. 13 1.3 Exemplos de Estados Absolutistas ................................................................................................. 16 1.3.1 Povo .............................................................................................................................................................. 20 1.3.2 Território ..................................................................................................................................................... 21 1.3.3 Poder Político ............................................................................................................................................ 22 1.3.4 Governo ...................................................................................................................................................... 24 1.3.5 Forma de Estado ...................................................................................................................................... 25 1.3.6 Formas de governo ................................................................................................................................. 26 2 TEORIA GERAL DO ESTADO E ORIGEM DO ESTADO ........................................................................... 27 2.1 Justificação do Estado ........................................................................................................................ 29 2.2 Teoria do Estado.................................................................................................................................... 29 2.3 Origem do Estado ................................................................................................................................. 30 3 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO ESTADO ......................................................................................................... 33 3.1 O Estado grego ...................................................................................................................................... 34 3.2 O Estado romano .................................................................................................................................. 35 3.3 O Estado medieval ............................................................................................................................... 38 3.3.1 Feudalismo ................................................................................................................................................. 39 3.4 O Estado medieval e a Igreja romana .......................................................................................... 39 3.4.1 Santo Agostinho e São Tomás de Aquino..................................................................................... 40 4 DAS MONARQUIAS MEDIEVAIS ÀS MONARQUIAS ABSOLUTAS .................................................. 40 4.1 A doutrina de Maquiavel ................................................................................................................... 40 4.2 O absolutismo monárquico .............................................................................................................. 40 4.3 Escritores da Renascença .................................................................................................................. 41 4.4 John Locke e a reação antiabsolutista ......................................................................................... 41 4.5 O liberalismo na Inglaterra ............................................................................................................... 42 4.6 América do Norte ................................................................................................................................. 42 4.7 França ........................................................................................................................................................ 43 4.8 Declaração dos direitos fundamentais do homem ................................................................. 43 4.9 O Estado liberal, seus erros e sua decadência ........................................................................... 44 4.10 O Estado Evolucionista .................................................................................................................... 45 Unidade II 5 OS ESTADOS MODERNOS E AS FORMAS DE GOVERNO NO MUNDO MODERNO E CONTEMPORÂNEO .......................................................................................................................................... 46 5.1 Conceito................................................................................................................................................... 46 5.2 Liberalismo e o Estado ........................................................................................................................ 47 5.3 Consequências do liberalismo ......................................................................................................... 47 5.4 Consequências reais do liberalismo .............................................................................................. 48 5.5 A decadência do liberalismo ............................................................................................................ 50 5.6 Considerações sobre o liberalismo ................................................................................................ 51 5.7 A reação antiliberal .............................................................................................................................. 58 5.7.1 O socialismo e a Revolução Russa ................................................................................................... 58 5.8 Considerações finais sobre o Estado Socialista Russo ........................................................... 60 5.9 Reação antiliberal e antimarxista .................................................................................................. 61 5.9.1 O fascismo e a sua doutrina ............................................................................................................... 61 5.10 Organização do Estado fascista ................................................................................................... 62 5.11 O Estado Nazista Alemão ................................................................................................................ 63 5.12 O totalitarismo do tipo fascista ................................................................................................... 67 6 FORMAS DE ESTADO ...................................................................................................................................... 67 6.1 Estados imperfeitos e perfeitos ...................................................................................................... 68 6.2 Estados simples e compostos .......................................................................................................... 68 6.3 Estado federal ........................................................................................................................................ 70 6.3.1 Estado federal ........................................................................................................................................... 71 6.4 O federalismo no Brasil ...................................................................................................................... 72 6.5 Entes federativos .................................................................................................................................. 76 6.5.1 União ............................................................................................................................................................ 76 6.5.2 Estados-membros ................................................................................................................................... 77 6.5.3 Municípios ................................................................................................................................................. 77 6.5.4 Distrito Federal ......................................................................................................................................... 78 6.6 Territórios ................................................................................................................................................. 78 6.7 Intervenção Federal (União para os Estados, Distrito Federal e municípios) ............... 78 6.8 Intervenção Estadual (Estados nos Municípios) ...................................................................... 79 6.9 Formas de governo .............................................................................................................................. 80 6.9.1 Formas de governo no pensamento de Aristóteles .................................................................. 80 6.9.2 Monarquia e República ........................................................................................................................ 81 Unidade III 7 PODER JUDICIÁRIO ......................................................................................................................................... 97 7.1 Ética .........................................................................................................................................................101 7.2 Magistratura .........................................................................................................................................102 7.3 STF (Supremo Tribunal Federal) e STJ (Superior Tribunal de Justiça) ............................105 7.3.1 Supremo Tribunal Federal – STF ......................................................................................................105 7.3.2 Superior Tribunal de Justiça – STJ..................................................................................................106 7.4 Justiça do Trabalho ............................................................................................................................107 7.5 Justiça Eleitoral ...................................................................................................................................111 7.6 Tribunal Superior Eleitoral – TSE ..................................................................................................112 7.7 Justiça Militar ......................................................................................................................................115 7.8 Justiça Comum ....................................................................................................................................121 7.8.1 Justiça Federal comum .......................................................................................................................121 7.8.2 Organização ............................................................................................................................................121 7.8.3 Tribunais Regionais Federais (TRFs) ...............................................................................................121 7.8.4 Criação ......................................................................................................................................................121 7.9 Ministério Público ..............................................................................................................................124 7.9.1 Definição ................................................................................................................................................. 124 7.9.2 Composição ............................................................................................................................................ 124 7.9.3 Carreira ..................................................................................................................................................... 125 7.9.4 Requisitos ................................................................................................................................................ 125 7.9.5 Atribuições funcionais ....................................................................................................................... 125 7.9.6 Garantias ................................................................................................................................................. 125 7.9.7 Vedações ..................................................................................................................................................126 7.9.8 Denominações ....................................................................................................................................... 126 7.9.9 Chefia ........................................................................................................................................................ 126 7.9.10 Referências Legislativas .................................................................................................................. 126 7.10 Polícia ....................................................................................................................................................127 7.10.1 Conceito ................................................................................................................................................ 127 7.10.2 Segurança Pública ............................................................................................................................. 127 7.10.3 Organização ......................................................................................................................................... 127 7.10.4 Organograma ...................................................................................................................................... 127 7.10.5 Polícia Administrativa ...................................................................................................................... 128 7.10.6 Polícia Judiciária ................................................................................................................................ 128 7.10.7 Corpo de Bombeiros ......................................................................................................................... 129 7.10.8 Carreira .................................................................................................................................................. 129 8 ADVOCACIA .....................................................................................................................................................130 8.1 Sociedade de advogados .................................................................................................................137 8.2 Deveres e sanções disciplinares ....................................................................................................140 8.3 Tributação e orçamento na Constituição de 1988 ...............................................................145 8.3.1 Tributação ............................................................................................................................................... 146 8.3.2 Limitações constitucionais ao poder de tributar .................................................................... 148 8.3.3 Competência tributária ......................................................................................................................151 8.3.4 Repartição das receitas ..................................................................................................................... 153 8.4 Fundamentos da ordem econômica ...........................................................................................153 8.5 A Constituição Cidadã e a nova ordem social ........................................................................154 8.6 Assembleia Nacional Constituinte de 1987-1988 ................................................................155 8.7 Processo constituinte e Regimento Interno ............................................................................155 8.8 Redação e promulgação da Constituição de 1988 ..............................................................156 9 APRESENTAÇÃO A presente disciplina faz parte do conjunto do curso de Direito da Universidade Paulista (UNIP), bem como traz em sua bagagem um repertório importante para a compreensão de nossa constituição, como democracia, liberdades civis, república, formas de governo e sistema eleitoral, denotando para o leitor não apenas um conteúdo extenso para a composição disciplinar, mas muito mais para a construção de um conhecimento multidisciplinar que possibilite pontes e diques para o diálogo entre vários saberes disciplinares da área de humanas e de outras áreas da academia. Partiremos estabelecendo um diálogo com a origem do Estado Moderno, denotando na história o processo evolutivo e de construção desse Estado e como ele se configura em continentes, povos e culturas distintas da nossa, de matriz ocidental, de premissa filosófica judaico-cristã e permeada pelo pensamento do mundo greco-romano. Na sequência, trabalharemos conceitos da República e os poderes constituídos em nossa Carta Constitucional, visando comparar, a partir de suas definições, realidades distintas do que acontece em nosso território e em outros povos, seja da América, da Europa ou do próprio Oriente Médio, com visões de mundo distintas de nosso modelo republicano, democrático e marcado pela conquista dos direitos humanos positivados, chamados aqui de fundamentais. Desafiamos você a galgar mais um degrau em seu processo de formação, seja pelo conteúdo, seja pelos valores tão necessários de cidadãos e cidadãs que priorizarão cumprir a ênfase de um valor republicano em seu sentido etimológico, acima dos interesses privados, fazendo legitimar de fato o seu conceito republicano: res publica (coisa pública). Considerando-se que será você quem administrará seu próprio tempo, nossa sugestão é que se dedique ao menos três horas por semana para esta disciplina, estudando os textos sugeridos e as videoaulas e realizando os exercícios de autoavaliação. Uma boa forma de fazer isso é já ir planejando o que estudar, semana a semana. Sucesso nessa nova etapa e bons estudos! 10 INTRODUÇÃO Falar sobre a organização do Estado é identificar de fato a necessidade de refletir acerca da origem desse Estado moderno e contemporâneo, apontando elementos como seu nascedouro e forças políticas, sociais e econômicas, as quais somadas contribuíram para sua eclosão e constituição, e, ainda, identificar os elementos necessários de fato para uma república, monarquia ou democracia ser estabelecida na sociedade contemporânea. Um exemplo evidente disso está no fato de nós, povo brasileiro, vivenciarmos uma Carta Constitucional que aponta para o seu povo, uma República Federativa constituída de unidades federativas que juntas compõem a União, e não explicarmos a um simples inquiridor do cotidiano o conceito e a definição de tais palavras e o que elas implicam para a nossa realidade. Estudar os povos do crescente fértil, do Egito, da Grécia e de Roma até o advento do cristianismo e do próprio islamismo é transitar na história da humanidade e se permitir contemplar momentos de rupturas, crises, avanços e retrocessos nos desdobramentos políticos e sociais de cada povo, atentando para as realidades vividas ali e questionadas ou assimiladas democraticamente. 11 ORGANIZAÇÃO DO ESTADO Unidade I 1 AS ORIGENS DO ESTADO MODERNO Um dos termos mais utilizados no universo jurídico em especial por palestrantes, estudantes de Direito e autoridades em geral, é o termo “Estado”, a partir do discurso, Estado democrático de Direito. Esse termo Estado tão comumente empregado em nosso cotidiano jurídico e social requer de cada leitor e ouvinte das práticas discursivas, uma reflexão à luz da etimologia (origem da palavra), bem como da conjuntura política e social que a sociedade europeia se utilizou mediante as ideias dos iluministas, bem como o desdobramento da Revolução Francesa. O Estado é um organização destinada a manter, pela aplicação do Direito, às condições universais de ordem social. E o Direito é o conjunto das condições existenciais da sociedade, que ao Estado cumpre assegurar. A forma de organização política que caracteriza a nossa época é chamada Estado. Não é raro ouvir designar o termo de Estado moderno ou Estado Nacional. Quem se utiliza dessa nomenclatura utiliza o termo “Estado”para outras formas de organização política que existiram anteriormente, e por isso, podem-se utilizar do nome, moderno, nacional, democrático etc. Dessa maneira são antecedentes do Estado moderno ou nacional, o Estado absolutista, o Estado medieval e o Estado antigo. Aqui em nosso material utilizaremos os dois termos Estado moderno ou Estado, visando o emprego de ambos como termos sinônimos, para fins de esclarecimento e apontamentos. É importante considerar que o termo Estado é um conceito jurídico, enquanto país é uma conceito geográfico. O nome do país pode ou não coincidir com o nome do respectivo Estado: por exemplo, Espanha é nome de país e de Estado, enquanto no Brasil é somente nome de país- conforme a Constituição de 1988, o nome do Estado brasileiro é República Federativa do Brasil. Em segundo lugar, pátria também não tem significado jurídico; trata-se de um conceito que denota sentimentos de ordem afetiva e pertinente a um determinado lugar. Seu uso é fundamentalmente retórica. 1.1 Definindo conceitos Estado Assim sendo, a soberania territorial é exercida pelo Estado brasileiro. Perceba que esse termo, com “E” maiúsculo, difere-se do estado (com “e” minúsculo), que é apenas uma unidade federativa ou uma província do país. O Estado é, portanto, um conjunto de instituições públicas que administra um território, procurando atender os anseios e interesses de sua população. Dentre essas instituições, podemos citar as escolas, os hospitais públicos, os departamentos de política, o governo e muitas outras. 12 Unidade I Nação Por outro lado, o conceito de Nação, por sua vez, também possui suas diferenças e particularidades em relação aos demais termos supracitados. Nação significa uma união entre um mesmo povo com um sentimento de pertencimento e de união entre si, compartilhando, muitas vezes, um conjunto mais ou menos definido de culturas, práticas sociais, idiomas, entre outros. Assim sendo, nem sempre uma nação equivale a um Estado, ou a um país ou, até mesmo, a um território, havendo, dessa forma, muitas nações sem território e sem uma soberania territorial constituída. Diferenças entre Estado e Nação É necessário, contudo, estabelecer a diferença entre Estado e País. Enquanto o primeiro é uma instituição formada por povo, território e governo, o segundo é um conceito genérico referente a tudo o que se encontra no território dominado por um Estado e apresenta características físicas, naturais, econômicas, sociais, culturais e outras. No nosso caso, o Brasil é o país e a República Federativa do Brasil é o Estado. Território Território significa os limites que delimitam ou separam um território do outro formando várias fronteiras em todo mundo, essas delimitam o mundo em mais de 190 países, os territórios são concebidos através de acordos ou conflitos, esses são estabelecidos de acordo com os interesses socioeconômicos e culturais. A partir das divisões dos países formam-se variadas culturas, entende-se por cultura o conjunto de conhecimentos humanos adquiridos a partir das relações sociais ao longo do tempo e que são passadas para as gerações subsequentes, é o aspecto que mais caracteriza os grupos humanos. Alguns elementos são determinantes na composição de qualquer cultura, seja ela arcaica ou moderna, os elementos que mais demonstram a identidade cultural são, principalmente, a língua e a religião. O Estado moderno surgiu em decorrência de um processo complexo, paralelo ao desenvolvimento de um novo modelo de sociedade, uma sociedade predominantemente urbana, assentada sobre uma base capitalista e orientada por valores individualistas e leigos. Esse Estado moderno foi precedido por um sistema feudal aliado ao poder papal e dos reis, e pelo Antigo Regime dos reis absolutistas que mediante ao seus desgastes políticos, sociais e religiosos, mediados pelas ideias humanistas, protestantes, burguesas e iluministas desaguou na Revolução Francesa outorgando à sociedade um Estado democrático de Direito, reconhecendo o poder do povo para o povo mediante a escolha desses para seus representantes no congresso e governantes no executivo. Os desdobramentos sociais e políticos enviesados pela economia possibilitaram a instauração do Estado moderno como resultado de um momento crucial da histórias onde forças históricas e grupos sociais somatizaram e possibilitaram tal fase, ação e construção simultaneamente na sociedade europeia. 13 ORGANIZAÇÃO DO ESTADO O Antigo Regime é a denominação do sistema político e social da França anterior à Revolução Francesa (1789). Durante o Antigo Regime, a sociedade francesa era constituída por diferentes estados: clero, nobreza e burguesia. No degrau mais alto estava o rei, que governava segundo a Teoria do Direito Divino na qual afirmava que o poder do soberano era concedido por Deus. O termo foi aplicado depois da revolução para diferenciar os dois tipos de governo. 1.2 Características do Antigo Regime Política A política do Antigo Regime se caracterizava pelo absolutismo. Este consistia na concentração da autoridade política sobre o rei com o apoio da teoria do direito divino, desenvolvida pelo filósofo Jean Bodin. Existia uma assembleia que reunia os três estados, mas esta só podia ser convocada quando o rei decidisse. O último rei a governar a França durante o Antigo Regime foi Luís XVI (1754-1793), da dinastia Bourbon, que morreu na guilhotina. Economia Durante o Antigo Regime, vigorava o mercantilismo, um conjunto de normas econômicas onde o Estado organizava e intervinha na economia. Segundo as ideias mercantilistas, a riqueza de um país estava baseado no monopólio, na acumulação de metais e na regulação da economia pelo Estado. Sociedade A sociedade do Antigo Regime se dividia em estamentos compreendidos entre clero, nobreza, burguesia e camponeses. O clero e a nobreza eram livres de impostos que recaíam sobre burgueses e camponeses. Por sua parte, o rei governava sob a teoria do direito divino centralizando as decisões do executivo, legislativo e judiciário. Para isto, ele era apoiado pela Igreja Católica. Primeiro Estado O primeiro Estado era representado pelo clero. A França era um país católico e à Igreja cabia os registros de nascimento e falecimento, a educação, os hospitais, e, claro, a vida religiosa dos franceses. A Igreja exercia forte influência sobre o governo porque várias figuras do alto clero, como cardeais, bispos e arcebispos, eram conselheiros do rei. Entretanto, havia o baixo clero, que atuava nas zonas rurais e pequenas cidades e que não possuíam bens. A Igreja estava isenta de impostos e era proprietária de terras e imóveis. Desta forma, conseguiu acumular grande riqueza. No entanto, o Rei interferia nos assuntos eclesiásticos e aproveitava das cerimônias religiosas para reafirmar seu poder como representante de Deus na Terra. 14 Unidade I Segundo Estado O segundo Estado era constituído pela nobreza, pessoas com títulos hereditários e que ocupavam cargos importantes no governo. Os nobres eram proprietários de terras e viviam exaltando luxo. A fim de não rivalizarem com o poder do rei, haviam sido cooptados pelo monarca para viverem em Versalhes, na corte francesa. A nobreza se dividia conforme a antiguidade dos seus títulos, pois alguns nobres os haviam recebido na época das Cruzadas. Por sua parte, havia nobres que eram antigos burgueses que conseguiram chegar a essa condição por terem comprado títulos de nobreza ou por se casarem com nobres que estavam empobrecendo. Assim como o clero, não pagavam impostos e acumulavam cargos no governo francês. Terceiro Estado Na base da sociedade francesa estavam as pessoas comuns, o terceiro Estado, que correspondia a 95% da população. Nessa classe, estavam os burgueses, ricos comerciantes e profissionais liberais. Nessa camada também estavam os camponeses e criados dos nobres, que enfrentavam dificuldades para manter condições mínimas de sobrevivência, como alimentação e vestuário. Sobre o terceiroEstado recaía pesada tributação e era o único dos estados que pagava impostos. O Iluminismo e o Antigo Regime O Iluminismo foi um movimento intelectual francês ocorrido entre os séculos XVII e XVIII e que questionava o modelo econômico, social e político da Idade Média. Para eles, nada de bom aconteceu nesta época e os iluministas a classificaram como “Idade das Trevas”. Apoiado em uma nova visão a respeito de Deus, da razão, da natureza da humanidade, o iluminismo teve significativa influência sobre o pensamento revolucionário. Os iluministas defendiam que os objetivos da humanidade são o conhecimento, a liberdade e a felicidade. Além disso, queriam um governo onde os poderes estivessem divididos e o papel do soberano fosse limitado. A partir de 1787, a velha organização política e social francesa começou a ser questionada através das ideias iluministas. Também contribuíram para isto a crise financeira na qual a França mergulhou após o fracasso das colheitas de trigo nos anos de 1787 e 1788, e os gastos militares na Guerra de Independência dos Estados Unidos. O fracasso no campo não impediu o aumento da cobrança de impostos ao terceiro estado, que passa a exigir melhores condições sociais e a reforma do governo. O rei convocou a Assembleia dos Estados Gerais para encontrar uma solução para a crise financeira. Contudo, tanto o primeiro, como o segundo estado não aceitavam abdicar os privilégios e integrar o regime de recolhimento de tributos. 15 ORGANIZAÇÃO DO ESTADO O desenho da revolução ocorria com a organização da burguesia e do baixo clero, que conseguiram a instituição da monarquia constitucional. A Revolução Francesa e o fim do Antigo Regime A Revolução Francesa provocou o fim do Antigo Regime na França e posteriormente, na Europa. A burguesia estava ressentida da exclusão do poder e rejeitava os últimos vestígios do anacrônico feudalismo. Por sua parte, o governo francês estava à beira da falência; o aumento da população elevou proporcionalmente o descontentamento com a falta de alimentos e o excesso de impostos. No contexto ideológico, as ideias iluministas defendiam uma nova ordem e a teoria do direito divino deixou de ser aceita. A figura do Antigo Regime exaltando a pessoa do Rei com centralização do poder sobre um homem via diametralmente contra a ideia do Iluminista, Montesquieu, que afirmava sobre a tripartição dos poderes, permitindo não mais o poder nas mãos de um homem, mas sobre instituições democráticas constituídas de civis eleitos pelo povo e indicados indiretamente pelos governantes no caso do judiciário. O Estado absolutista é um regime político surgido no fim da Idade Média. Também chamado de absolutismo se caracteriza por concentrar o poder e autoridade no rei e de poucos colaboradores. Nesse tipo de governo, o rei está totalmente identificado com o Estado ou seja, não há diferença entre a pessoa real e o Estado que governa. Não há nenhuma Constituição ou lei escrita que limite o poder real e tampouco existe um parlamento regular que contrabalance o poder do monarca. Tal ato por si só já nos aponta o perigo de um poder sem limites e punições frente ao abuso desse poder para com os seus súditos. O Estado Absolutista surgiu no processo de formação do Estado Moderno ao mesmo tempo que a burguesia se fortalecia. Durante a Idade Média, os nobres detinham mais poder que o rei. O soberano era apenas mais um entre os nobres e deveria buscar o equilíbrio entre a nobreza e seu próprio espaço. Durante a transição do feudalismo para o capitalismo houve a ascensão econômica da burguesia e do Mercantilismo. Era preciso outro regime político na Europa centro-ocidental que garantisse a paz e o cumprimento das leis. Por isso, surge a necessidade de um governo que centralizasse a administração estatal. Desta maneira, o rei era a figura ideal para concentrar o poder político e das armas, e garantir o funcionamento dos negócios. Nesta época, começam a surgir os grandes exércitos nacionais e a proibição de forças armadas particulares. Nesse momento, a figura do rei era o ideal para esse contexto, o que não será posteriormente quando as tensões da burguesia, nobres e realidades econômicas e sociais, marcadas pela pobreza e incompetência para tratar dos reais desafios dessa sociedade, exigiam mudanças, o que será experimentado na Revolução Francesa, legando esse Estado Moderno que possibilitasse essa nova ordem social tão desejada. 16 Unidade I Saiba mais Conheça mais sobre o Estado Absolutista no artigo a seguir: BEZERRA, J. Estado Absolutista. Toda Matéria, 15 maio 2019. Disponível em: https://www.todamateria.com.br/estado-absolutista/. Acesso em: 1º mar. 2021. 1.3 Exemplos de Estados Absolutistas Ao longo da história, com a centralização do Estado Moderno, várias nações passaram a formar Estados Absolutistas. Eis alguns exemplos a seguir. França Considera-se a formação do Estado francês sob reinado dos reis Luís XIII (1610-1643) e do rei Luís XIV (1643-1715) durando até a Revolução Francesa, em 1789. Luís XIV limitou o poder da nobreza, concentrou as decisões econômicas e de guerra em si e seus colaboradores mais próximos. Realizou uma política de alianças através de casamentos que garantiu sua influência em boa parte da Europa, fazendo a França ser o reino mais relevante no continente europeu. Este rei acreditava que somente “um rei, uma lei e uma religião” fariam prosperar a nação. Deste modo, inicia uma perseguição aos protestantes. Inglaterra A Inglaterra passou um longo período de disputas internas devido às guerras religiosas, primeiro entre católicos e protestantes e, mais tarde, entre as várias correntes protestantes. Este fato foi decisivo para que o monarca concentrasse mais poder, em detrimento da nobreza. O grande exemplo de monarquia absolutista inglesa é o reinado de Henrique VIII (1509-1547) e o de sua filha, a rainha Elizabeth I (1558-1603) quando uma nova religião foi estabelecida e o Parlamento foi enfraquecido. A fim de limitar o poder do soberano, o país entra em guerra e somente com a Revolução Gloriosa estabelece as bases da monarquia constitucional. Portugal O absolutismo em Portugal começou ao mesmo tempo que se iniciavam as Grandes Navegações. A prosperidade trazida com os novos produtos e os metais preciosos do Brasil foram fundamentais para enriquecer o rei. O reinado de Dom João V (1706-1750) é considerado o auge do estado absolutista português, pois este monarca centralizou na coroa todas as decisões importantes como a justiça, o exército e a economia. O absolutismo em Portugal duraria até a Revolução Liberal do Porto, em 1820, quando o rei Dom João VI (1816-1826) foi obrigado aceitar uma Constituição. 17 ORGANIZAÇÃO DO ESTADO A afirmação do poder secular dos reis e Imperadores contra o poder espiritual dos papas tem um significado verdadeiramente transcendente no pensamento ocidental, na medida em que se separam os poderes político e religioso. As ideias humanistas desaguando nos ideias da Reforma Protestante e no Iluminismo permitiram uma intensa reflexão dessa sociedade medieval que transita para um mundo moderno em um período de três séculos, legando os ideais das liberdades civis e de um Estado laico, livre da religião para uma atuação mais voltada para a sociedade civil e de esfera pública. A filosofia do final da Idade Média acaba por distinguir perfeitamente esses dois domínios (religioso e político), ao ponto que no nascedouro da Revolução Francesa, a separação se estabelece entre o domínio do político da esfera do religioso. Em resposta ao processo de expansão do capital no continente europeu, manifestando-se pela necessidade de haver uma unificação do poder, com maior centralização e concentração de forças, o Estado foi firmado como este guia a fim de que os interesses de classe estivessem mais equilibrados. O Estado centralizado, no contexto do século XV, era atinente aos propósitos do absolutismo. O rei, como salvaguarda da soberania, nãopoderia sofrer restrições sob pena de o poder central não se ver mais como poder concreto. Para este fim, foram desenvolvidas algumas instituições e modulações sociais e culturais: • Unificação da língua e exigência de uma moeda comum (símbolos nacionais). • Formação de uma burocracia profissional, com destaque para a administração racional do poder central. • Organização de um poder militar capaz de reunir as forças públicas. • Centralização política e monopólio legislativo. • Oficialização de comunicados e informes gerais, institucionais, a fim de que houvesse uma maior regulamentação/regularização (a normatização leva à normalização). • Definição de um sistema tributário como requisito para manter a arrecadação regular de fundos necessários à manutenção do Estado e de seu aparato organizacional. Paulo Henrique Gonçalves Portela também defende a ideia de que são três os elementos constitutivos do Estado: território, povo e governo soberano. O estudo do Estado... parte também do exame de seus três elementos essenciais... o território, o povo e o governo soberano (...) O governo soberano, também chamado de “poder soberano”, é a autoridade maior que exerce o poder político do Estado (...) a soberania é o atributo do poder estatal que confere a este poder o caráter de superioridade frente a outros núcleos de poder que atuam dentro do Estado, como as famílias e as empresas... (PORTELA, 2015, p. 168-169). 18 Unidade I Outro autor que sustenta uma teoria de três elementos formadores do Estado é Sahid Maluf: população, território e governo. No tocante à sua estrutura, o Estado se compõe de três elementos: a) população; b) território; c) governo (...) A condição de Estado perfeito pressupõe a presença concomitante e conjugada desses três elementos, revestidos de características essenciais: população homogênea, território certo e inalienável e governo independente (MALUF, 1998, p. 23). Já Hans Kelsen defende uma teoria de quatro elementos formadores do Estado: território, povo, poder e tempo ou período de existência. A doutrina tradicional distingue três “elementos” do Estado: seu território, seu povo e seu poder (...) É característico da teoria tradicional considerar o espaço – território –, mas não o tempo, como um “elemento” do Estado. No entanto, um Estado existe não apenas no espaço, mas também no tempo, e, se consideramos o território como um elemento do Estado, então, temos que considerar também o período de sua existência como um elemento do Estado (KELSEN, 1998, p. 299 e 314). Por sua vez, Dalmo de Abreu Dallari também sustenta que os componentes do Estado são quatro: ordem jurídica, finalidade, povo e território. Em face de todas as razões até aqui expostas, e tendo em conta a possibilidade e a conveniência de acentuar o componente jurídico do Estado, sem perder de vista a presença necessária dos fatores não jurídicos, parece-nos que se poderá conceituar o Estado como a ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo situado em determinado território. Nesse conceito se acham presentes todos os elementos que compõem o Estado, e só esses elementos. A noção de poder está implícita na de soberania, que, no entanto, é referida como característica da própria ordem jurídica. A politicidade do Estado é afirmada na referência expressa ao bem comum, com a vinculação deste a um certo povo, e, finalmente, a territorialidade, limitadora da ação jurídica e política do Estado, está presente na menção a determinado território (DALLARI, 2012, p. 122). Por sua vez, Celso Ribeiro Bastos expressa uma teoria de cinco elementos do Estado: povo, território, governo, ordem jurídica/leis e poder. No nosso Curso de teoria do Estado e ciência política tivemos o ensejo de definir o Estado como a “organização política... resultante de um povo vivendo sobre um território delimitado e governado por leis que se fundam num poder não sobrepujado por nenhum outro externamente e supremo internamente...” (BASTOS, 1990, p. 7). 19 ORGANIZAÇÃO DO ESTADO Também Antônio Sebastião de Lima sustenta uma teoria de cinco elementos do Estado, classificados em duas categorias: elementos materiais, que são quatro; e um elemento formal, que é o direito constitucional. Dessa forma, para esse autor, os cinco elementos formadores do Estado são: povo, território, governo, finalidade e direito constitucional. O Estado, produto da cultura humana, sociedade política, instituição política... tem matéria e forma. Os elementos essenciais que lhe dão existência são o povo, o território, o governo e a finalidade. Esses elementos, em conjunto, são a estrutura do Estado, a sua constituição material. As regras que estabelecem os vínculos de organização e funcionamento entre esses elementos são a constituição formal do Estado, o seu direito constitucional escrito ou consuetudinário (LIMA, 1998, p. 35). Da sua parte, Platão, na sua obra A República, também menciona a existência de sete elementos formadores do Estado: (1) povo ou conjunto de habitantes; (2) território; (3) poder; (4) governo; (5) princípios de justiça; (6) ordem jurídica: constituição, leis e costumes; (7) finalidade: conferir educação e os maiores benefícios ao povo. Vejamos: Um Estado nasce... das necessidades dos homens (...) o conjunto dos habitantes recebe o nome de cidade ou Estado (...) O território do Estado precisa ser estendido (...) Teremos, pois, de cortar para nós uma fatia do território vizinho (...) os que governam não devem ser amantes do poder (...) não são vãs quimeras o que dissemos sobre a cidade e seu governo, e sim coisas que, embora difíceis, são realizáveis – mas realizáveis unicamente de maneira que descrevemos, isto é, quando haja na cidade um ou vários governantes que... tenham... na mais alta estima o reto e as honras que dele dimanam, prezando como a maior e mais necessária de todas as coisas o justo... cujos princípios serão exaltados por eles ao organizarem a cidade (...) a justiça é em si mesmo o maior dos bens (...) para educá-los de acordo com seus próprios costumes e leis... para que o Estado alcance no mais breve espaço de tempo a felicidade e possa conferir os maiores benefícios ao povo que se rege por tal constituição... (PLATÃO, 1996, p. 37, 39, 42, 157 e 173). Assim, considerando todos os elementos sugeridos por todos esses autores, teremos que os elementos constitutivos do Estado são: • População. • Povo. • Território. • Tempo. • Poder político. 20 Unidade I • Governo. • Finalidade. • Recursos. • Princípios de justiça. • Ordem jurídica. • Capacidade de manter relações com outros Estados. 1.3.1 Povo Formado por indivíduos-cidadãos com dignidade de pessoas humanas, isto é, no dizer de Kant, por pessoas consideradas sempre como fins e nunca apenas como meios (KANT, 2001, p. 69-70), e chamado também de cidadania, o povo é a dimensão humana e humanizadora do Estado. No Estado social e democrático de direito, ou, simplesmente, Estado democrático de direito, o povo é o titular do seu poder soberano (princípio da soberania popular), como o proclamou Rousseau, e o titular do seu governo democrático (princípio do governo popular): o governo democrático (a democracia) é governo do povo, pelo povo e para o povo, como o afirmou Abraham Lincoln. Dessa forma, o conjunto de pessoas vinculadas juridicamente a um determinado Estado se denomina povo. Por sua vez, esse vínculo jurídico que liga as pessoas a um Estado denomina-se nacionalidade. De forma particular, a Constituição do Estado democrático de Direito brasileiro de 1988 registra isso nos incisos I, II e III, e parágrafo único do seu art. 1º, Título I: Título I – DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS Art. 1º A República Federativa do Brasil constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos: I – a soberania; II – a cidadania; III – a dignidade da pessoa humana; [...] Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitosou diretamente, nos termos desta Constituição. 21 ORGANIZAÇÃO DO ESTADO Nesse sentido, o verdadeiro Estado democrático de direito (Estado do povo, pelo povo, com o povo e para o povo, como diriam Rousseau e Lincoln) é um empreendimento ético-jurídico-político originado, construído e desenvolvido pelo seu componente humano e para o seu componente humano: o povo, formado por indivíduos-cidadãos com dignidade de pessoas humanas. Por seu componente humano e para o seu componente humano, o verdadeiro Estado democrático de direito é, pois, também, um Estado ético, humano e humanizador. É pelo povo e para o povo que o Estado existe. O povo é, pois, o componente criador, gestor, empreendedor, construtor e beneficiário do Estado democrático de direito. Há autores que, considerando o elemento humano como o mais importante e fundamental do Estado, conceituam o Estado como: “conjunto de habitantes” (PLATÃO, 1996, p. 39); “universalidade dos cidadãos” (ARISTÓTELES, 1998, p. 41); “multidão unida numa só pessoa” (HOBBES, 2000, p. 144); “pessoa pública formada pela união de todas as demais” (ROUSSEAU, 1996, p. 22); “associação constituída por cidadãos iguais” (RAWLS, 1997, p. 230); “povo politicamente organizado”; “O Estado somos nós” etc. 1.3.2 Território É o elemento espacial do Estado. É o espaço no qual e sobre o qual o Estado afirma seus direitos de soberania e governo. Esse espaço tem várias dimensões: (a) espaço territorial: solo e subsolo; (b) espaço fluvial: rios e lagos; (c) espaço aéreo; (d) espaço marítimo: mar territorial, plataforma continental, alto mar; (e) espaço ficto: embaixada, navios e aeronaves. Num verdadeiro Estado democrático, o território, além de espaço jurídico e político, é também espaço moral, ético e humano, pois é nesse espaço que vive seu elemento humano, seu empreendedor, criador, governante e soberano: o povo e os indivíduos-cidadãos com dignidade de pessoas humanas que compõem o povo, ente coletivo moral, ético e humano. Além do mais, o território é também fonte de recursos naturais e ou materiais do Estado. Pode-se dizer que o território é o espaço geográfico dentro do qual o Estado exerce seu poder. Território é o âmbito de validade da ordem jurídica estatal. Daí se dizer que o território do Estado está protegido pelo princípio da impenetrabilidade ou impermeabilidade. Essa impermeabilidade tem um significado positivo e outro negativo: o positivo é o significado de que toda pessoa que se encontra no território do Estado está sujeita à autoridade; negativo é o significado de que não pode ser exercida dentro do território uma autoridade que não derive do próprio Estado. Estado e Direito Internacional Essa última observação traz à baila o problema da relação entre o Direito do Estado e o Direito Internacional, enfrentando por três teorias diferentes: • Primado da ordem jurídica estatal: sustenta que, a rigor, só existe o Direito do Estado, inexistindo caráter vinculante nos pactos e convenções internacionais. 22 Unidade I • Primado da ordem jurídica internacional: não apenas reconhece a vinculatividade do direito internacional, como ainda lhe atribui predominância face ao direito do Estado. • Teoria dualista: parte do pressuposto de que os sujeitos vinculados pelo Direito Internacional são os Estados, não os cidadãos dos Estados. Assim para que uma norma internacional alcance validade interna, é necessária a sua transformação em norma do direito interno. Delimitação do território A delimitação precisa do território é uma característica do Estado moderno e decorre do caráter singular que caracteriza a noção de soberania- que como vimos, não reconhece poder igual ou superior no seu espaço de exercício. A territorialização do Estado suscita a questão das fronteiras, que só então passaram a ser precisamente delimitadas. A soberania do Estado se estende ainda ao mar territorial. Território e ciberespaço É de se notar que foi a tecnologia que complicou o exercício da soberania em relação ao espaço aéreo – transformando os aviões em meio de transporte corriqueiro e criando satélites e veículos espaciais – e ao mar territorial – criando de um lado, armas de longuíssimo alcance e, de outro, meios para exploração econômica do mar e do seu subsolo. Como se faz para exercer soberania em um espaço virtual? As respostas, precisamos encontrar... 1.3.3 Poder Político É o componente energético e coercitivo do Estado, a energia ou força coercitiva do Estado. Num Estado democrático de direito, como foi visto, o titular do poder político é o povo, a cidadania, os indivíduos-cidadãos como coletividade. O poder do Estado tem as seguintes características: (1) é soberano ou supremo, isto é, possui a qualidade (ou atributo) da soberania ou supremacia; (2) é um, só um, uno, indivisível, indelegável, inalienável e imprescritível. A qualidade da soberania é tão inerente ao poder do Estado que ela é considerada como sendo o próprio poder soberano ou supremo do Estado. Vejamos isso em quatro pensadores da soberania ou poder supremo ou soberano do Estado: Aristóteles, Bodin, Hobbes e Rousseau. O poder supremo do Estado como sinônimo de soberania já está em Aristóteles: O governo é o exercício do poder supremo do Estado. Esse poder só poderia estar ou nas mãos de um só, ou da minoria, ou da maioria das pessoas (...) A principal dificuldade consiste em saber a quem deve caber o exercício da soberania (ARISTÓTELES, 1998, p. 105 e 149). 23 ORGANIZAÇÃO DO ESTADO Para Jean Bodin, autor francês, considerado o primeiro a tratar da soberania de forma sistemática, ela, a soberania, tendo as características de indivisibilidade, indelegabilidade, irrevogabilidade e perpetuidade, é o poder absoluto ou supremo do Estado. Paulo Bonavides, na sua obra Ciência Política, nos lembra disso: A soberania é una e indivisível, não se delega a soberania, a soberania é irrevogável, a soberania é perpétua, a soberania é um poder supremo, eis os principais pontos de caracterização com que Bodin fez da soberania... um elemento essencial do Estado (BONAVIDES, 2003, p. 160). Também para Hobbes o poder do Estado é poder soberano, que ele, ressaltando sua característica de indivisibilidade, chama também de “soberania”, “o maior dos poderes humanos”, “poder comum”, “grande autoridade”: O maior dos poderes humanos é aquele que é composto pelos poderes de vários homens, unidos por consentimento numa só pessoa, natural ou civil, que tem o uso de todos os seus poderes na dependência da sua vontade: é o caso do poder de um Estado (...) Portanto não é de admirar que seja necessária alguma coisa mais, além de um pacto, para tornar constante e duradouro seu acordo: ou seja, um poder comum que os mantenha em respeito, e que dirija suas ações no sentido de benefício comum. A única maneira de instituir um tal poder comum... é conferir toda a sua força e poder a um homem ou a uma assembleia de homens, que possa reduzir suas diversas vontades, por pluralidade de votos, a uma só vontade (...) à multidão assim unida numa só pessoa chama-se Estado, em latim, civitas. É esta a geração daquele grande Leviatã, ou antes... daquele Deus mortal (...) Aquele que é portador dessa pessoa chama-se soberano, e dele se diz que possui poder soberano (...) o poder soberano é conferido mediante o consentimento do povo reunido (...) É evidente que quem é tornado soberano não faz antecipadamente nenhum pacto (...) E se fizer tantos pactos quantos forem os homens, depois de ele receber a soberania esses pactos seriam nulos (...) Portanto é inútil pretender conferir a soberania através de um pacto anterior (...) Quando se confere a soberania a uma assembleia de homens, ninguém deve imaginar que um tal pacto faça parte da instituição (...) a grande autoridade é indivisível, e é inseparavelmente atribuída ao soberano (...) o poder soberano inteiro (que já mostrei ser indivisível) tem que pertencer a um ou mais homens, ou a todos...” (HOBBES, 2000, p. 83, 143-147,150 e 153). Do seu lado, Rousseau, quem colocou o poder soberano ou soberania nas mãos do povo, afirmando as suas características de indivisibilidade e inalienabilidade, chama a soberania também de “força comum”, “poder absoluto”, “autoridade soberana”: 24 Unidade I Do pacto social (...) “Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja com toda a força comum a pessoa e os bens de cada associado, e pela qual cada um, unindo-se a todos, só obedeça, contudo, a si mesmo e permaneça tão livre quanto antes”. Esse é o problema fundamental cuja solução é fornecida pelo contrato social (...) esse ato de associação produz um corpo moral e coletivo composto de tantos membros quantos são os votos da assembleia, o qual recebe, por esse mesmo ato, sua unidade, seu eu comum, sua vida e sua vontade. Essa pessoa pública, assim formada pela união de todas as demais, tomava outrora o nome de Cidade, e hoje o de República ou de corpo político, o qual é chamado por seus membros de Estado quando passivo, soberano quando ativo e Potência quando comparado a seus semelhantes. Quanto aos associados, eles recebem coletivamente o nome de povo e se chamam, em particular, cidadãos, enquanto participantes da autoridade soberana (...) o poder soberano não tem nenhuma necessidade de garantia em face dos súditos (...) Dos limites do poder soberano (...) o pacto social dá ao corpo político um poder absoluto sobre todos os seus, e é esse mesmo poder que, dirigido pela vontade geral, recebe, como ficou dito, o nome de soberania (...) Pela mesma razão por que é inalienável, a soberania é indivisível (ROUSSEAU, 1996, p. 20-24, 34-39). Para Rousseau, então, da mesma forma que para Bodin e Hobbes, o poder do Estado, o poder soberano ou soberania é indivisível. Quanto ao titular do poder soberano ou soberania, porém, Rousseau opõe-se a Bodin e Hobbes. Para Bodin e Hobbes o titular da soberania é um indivíduo: o monarca, o príncipe. Já para Rousseau, o dono, o titular do poder soberano ou soberania é o povo, a cidadania, os cidadãos como coletividade. Num verdadeiro Estado democrático de direito, porém, a soberania (ou poder soberano ou supremo) popular não é mera força coercitiva, mas é também, principalmente, soberania humana e humanizadora, pois é o poder do povo soberano, seu elemento humano, povo formado por indivíduos-cidadãos com dignidade de pessoas humanas. Em razão disso, a soberania do povo é também soberania justa (socialmente justa, essencialmente), dialógica, cooperativa, pacífica e pacificadora, isto é, soberania ética ou moral, pois ela se autolimita, autorregula e autogoverna pelos princípios éticos ou morais da justiça social. 1.3.4 Governo O Governo – terceiro elemento do Estado – é uma delegação de soberania nacional, no conceito metafisico da escola francesa. É a própria soberania posta em ação, no dizer de Esmein. Segundo a escola alemã, é um atributo indispensável da personalidade abstrata do Estado. Positivamente, é o conjunto das funções necessárias à manutenção da ordem jurídica e da administração pública. Dessa forma, o governo seria apenas uma das instituições que compõem o Estado, com a função de administrá-lo. Os governos são transitórios e apresentam diferentes formas, que variam de um lugar para outro, enquanto os Estados são permanentes. 25 ORGANIZAÇÃO DO ESTADO Sendo assim, governo é o conjunto das funções necessárias à manutenção da ordem jurídica e da administração pública. Deve ser soberano, ou seja, absoluto. No plano interno o poder soberano não encontra limites jurídicos. Já no plano internacional a soberania estatal encontra limites no princípio da coexistência pacífica das soberanias estatais. 1.3.5 Forma de Estado Os Estados são divididos conforme indicado a seguir. Estados unitários São aquelas formas estatais clássicas, em que se identificam grupos populacionais e território tradicionais, com governo nacional único, não importando o grau de descentralização interna dos órgãos que o constituem. Exemplo: Brasil. Estados compostos Trata-se de uma pluralidade de Estados, perante o direito interno, mas que se projeta na esfera jurídica internacional como uma unidade. • Estado federal: é constituído por Estados-membros conservando autonomia e personalidade jurídica de direito público interno. Todavia, a soberania estatal e a personalidade jurídica de direito internacional concentram-se num mesmo ente central (União). Podem se formarem por agregação ou por segregação. Agregação são Estados pré-existentes que renunciam à própria soberania para aglomerarem-se sob nova formação comum, que passará a ser detentora única da personalidade de direito público externo. Exemplos: EUA; Segregação o Estado é formado pela descentralização de um Estado unitário em vários centros de competência autônomos. Exemplo: Brasil. • Estado confederal: caracteriza-se pela reunião permanente de Estados independentes e soberanos, geralmente com a finalidade de defesa externa e paz interna. A reunião é precedida por tratado internacional, reservando-se a cada um dos Estados o desligamento a qualquer tempo da confederação. Exemplo: Sérvia e Montenegro. Estado unitário Sociedade de estados Puro Descentralizado administrativamente Descentralizado administrativa e politicamente Confederação Federação Formas de estado Figura 1 26 Unidade I 1.3.6 Formas de governo Classificação de Aristóteles As formas de governo dividiam-se entre normais e anormais. • Normais: aquelas cujo objetivo era o bem da comunidade. Ainda podem se subdividir em: — Monarquia: o governo de uma só pessoa. — Aristocracia: o governo de uma classe restrita. — Democracia: o governo de todos os cidadãos. • Anormais: aquelas que visavam somente a vantagens para os governantes. — Tirania: forma corrompida de monarquia, governo legítimo, mas injusto; governo que não respeita princípios constitucionais; exercício despótico do poder. — Oligarquia: forma corrompida de aristocracia. Governo em que o poder fica concentrado em mãos de uma classe aristocrática. — Demagogia: forma corrompida de democracia. Estado corrupto da democracia. Classificação de Maquiavel Governo da minoria • Monarquia: forma de governo que se caracteriza pela presença dos seguintes fatores: vitaliciedade do governante; hereditariedade como mecanismo de sucessão governamental; a irresponsabilidade do monarca pelos atos que praticar; e a ausência de representatividade popular. Subdivide-se em: — Monarquia absoluta: em que os poderes reais são ilimitados. — Monarquia de estamentos (ou monarquia de braços): na qual o poder é descentralizado e delegado. — Monarquia constitucional: aquela em que o monarca só exerce funções limitadas, geralmente restritas ao âmbito do Poder Executivo. 27 ORGANIZAÇÃO DO ESTADO • Ditadura: governo exercendo arbitrária e absolutamente o Executivo e o Legislativo e, excepcionalmente, também o Judiciário. Governo da maioria • República: caracterizada pela temporariedade, o governo deve ser exercido por tempo determinado, ainda que prevista a reeleição; eletividade, com exigência de eleições periódicas; responsabilidade dos agentes públicos; e representatividade popular. Sistema de governo • Sistema presidencialista: encontra-se esse sistema nos países cuja forma de Governo é a República; Presidente da República exerce o Executivo acumulando as funções de Chefe de Estado e Chefe de Governo; investidura e o exercício do mandato do Presidente independem da vontade do Legislativo; Legislativo não se sujeita a dissolução e seus membros são investidos em mandato com termo certo; divisão e independência entre os Poderes; e plano de governo é estabelecido e observado sem a influência do Legislativo, salvo no tocante à posterior prestação de contas. • Sistema parlamentarista: encontra-se nos países que adotaram a forma de governo a Monarquia constitucional; Poder Executivo é dividido entre a chefia do Estado (exercida pelo monarca ou pelo Presidente)e a chefia do Governo (de atribuição do Primeiro-Ministro); Chefe do Estado nomeia ou indica o Primeiro-Ministro; Primeiro-Ministro é quem nomeia ou indica os demais Ministros; o governo deve confiança ao Parlamento, quebrada a confiança, formalizada por uma moção de desconfiança ou voto de censura (ambos de deliberação do Parlamento), é dissolvido o governo; e o Chefe do Estado poderá dissolver o Parlamento e convocar novas eleições. • Sistema diretorial: nesse sistema, as funções executiva e legislativa concentram-se em uma só entidade (Assembleia). Exemplo União Soviética 2 TEORIA GERAL DO ESTADO E ORIGEM DO ESTADO São inúmeras as teorias que visam explicar o momento de formação do estado, destacam -se três: A primeira determina que o Estado exista desde sempre assim como a própria sociedade, visto que, a organização social em que vivemos permeada por poder e autoridade delimita o comportamento dos indivíduos. A segunda teoria propõe que primeiro surgiu a sociedade, e que só depois, para atender às necessidades ou às conveniências dos grupos sociais apareceu a figura do Estado, que formou-se em momentos diferentes de cada lugares, surgindo de acordo com as condições concretas de cada lugar. A terceira posição é aquela que só admite como Estado a sociedade política dotada de certas características muito bem definida. Nessa concepção, o Estado pode ser visto como conceito histórico concreto quando do surgimento da ideia e da prática da soberania, o que ocorre no século XVII. É 28 Unidade I possível, segundo alguns autores, determinar o ano do nascimento do Estado, que seria 1648, quando foi assinada a paz de Westfália. Alguns consideram ainda a paz de Westfália como o ponto de separação entre o Estado Medieval e o Estado Moderno, e em cujos tratados foram fixados os limites territoriais resultantes das guerras religiosas. Dessa maneira, destaca-se como características do estado a existência de poder organizado, território, povo e soberania. Exemplo de aplicação Reflita sobre as teorias naturalistas e contratualistas na origem do Estado. As teorias naturalistas afirmam que o Estado formou-se de forma espontânea. Apesar de não serem coincidentes, apresentam como ponto comum a ideia de concepção natural do Estado. • Origem familial ou patriarcal: estas teorias situam o núcleo social fundamental na família e afirmam que cada família primitiva se ampliou e deu origem a um Estado. • Origem em atos de força, de violência ou de conquista: essas teorias sustentam, em síntese, que a superioridade de força de um grupo social permitiu-lhe submeter um grupo mais fraco, nascendo o Estado dessa conjunção de dominantes e dominados. • Origem em causas econômicas ou patrimoniais: o Estado teria sido formado para se aproveitarem os benefícios da divisão do trabalho, integrando-se as diferentes atividades profissionais, caracterizando-se, assim, o motivo econômico. Destaca-se aqui Engels que além de negar que o Estado tenha nascido com a sociedade, afirma que ele “é antes um produto da sociedade, quando ali se chega a determinado grau de desenvolvimento.” Uma de suas principais obras, “A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado”. • Origem no desenvolvimento interno da sociedade: segundo estas teorias, o Estado é um germe, uma potencialidade, em todas as sociedades humanas, as quais, todavia, prescindem dele enquanto se mantêm simples e pouco desenvolvidas. É o próprio desenvolvimento espontâneo da sociedade que dá origem ao Estado. Existem também as teorias que sustentam a formação contratual dos Estados. Seus adeptos têm em comum a crença de que foi a vontade de alguns homens, ou então de todos os homens, que levou à criação do Estado. De maneira geral, os adeptos da formação contratual da sociedade é que defendem a tese da criação contratualista do Estado. 29 ORGANIZAÇÃO DO ESTADO ORIGEM DO ESTADO As teorias sobre a origem do Estado são resultantes de racioncínios hipotéticos, entre eles se destacam: • teorias da origem familiar; • teorias de origem patrimonial; • teorias da força. Nessas teorias o problema da origem do Estado é equacionado sob o ponto de vista histórico-sociológico. Figura 2 2.1 Justificação do Estado As principais teorias de justificação do Estado estão indicadas a seguir: • Teoria do direito sobrenatural: para essa teoria, o estado foi fundado por Deus, o rei é ao mesmo tempo sumo-sacerdote, representante de Deus na ordem temporal e governador civil. Exemplos: Tibete – faraós no Egito – imperadores na china. • Teoria do direito divino providencial: para essa teoria o Estado é de origem divina, porém por manifestação providencial da vontade de Deus. O poder vem de Deus m as não por manifestação visível e concreta de sua vontade, mas, sim, através do seu povo, o poder vem de Deus em abstrato. Os homens conformando-se com a vontade divina, devem reconhecer e acatar a vontade do estado. Dotados de livre-arbítrio no seu procedimento, os homens organizam os governos, estabelecem as leis e confirmam as autoridades nos cargos e ofícios, sob a direção invisível da providência divina sempre presente. São representantes dessa teoria, Santo Agostinho e São Tomás de Aquino. • Teorias racionalistas: são denominadas teorias racionalistas, todas aquelas que justificam o Estado como de origem convencional, isto é, como produto da razão humana. Encontram-se dentre elas, as teorias contratualistas – para eles, o estado nasceu de um acordo utilitário e consciente entre os indivíduos. 2.2 Teoria do Estado O conceito de Estado não é unívoco, visto que pode ser examinado sob os ângulos filosófico, político e estritamente jurídico. O conceito filosófico, delineado por Georg Hegel (1770-1831), evidencia que o Estado deduziria a realidade da ideia de uma ética, consistente na síntese do espírito absoluto, a partir da dialética entre a família (tese ou espírito subjetivo) e a sociedade (antítese ou espírito objetivo), de arte que “o Estado seria uma realidade da vida ética, da vontade substancial, em que a consciência mesma do indivíduo se eleva a comunidade e, portanto, ao racional em si e para si”. 30 Unidade I O conceito sociológico, desenhado por Max Weber (1864-1920), expressa que o Estado detectaria o monopólio da força física legítima, consubstanciado na institucionalização da violência pelo aparato estatal, de maneira que “o Estado seria um agrupamento de dominação que apresenta caráter institucional e que procurou, com êxito, monopolizar, nos limites de um território, a força física legitima como instrumento de domínio e que, tendo esse objetivo, reuniu nas mãos dos dirigentes os meios materiais de gestão”. O conceito estritamente jurídico, desenvolvido por Georg Jellinek (1851-1911), exprime que o Estado deteria o poder político, constituído sobre determinado território e dirigido a certa população, de sorte que “ o Estado seria um fenômeno histórico no qual certa população, assentada em determinado território, e dotada de um poder originário de mando”. 2.3 Origem do Estado A origem do Estado e o fundamento do poder político são motivos de divergência entre correntes doutrinárias. • Teoria da origem patriarcal: elaborada por Robert Filmer, defende a sociedade política como resultado da ampliação ao desenvolvimento da sociedade humana. Os patriarcas sucessivos tinham por seu direito de paternidade uma autoridade real sobre os filhos. Este domínio sobre o mundo inteiro, que Adão exercia para obediência e do qual as patriarcas desfrutavam coma se o tivessem recebido dele para transmissão legítima, se igualava, por suas dimensões e por sua amplitude, a soberania absoluta de todos os monarcas que existiram desde a criação. • Teoria da origem patrimonial: elucidada par Friedrich Engels, defi ne a sociedade política coma resultado da garantia da propriedade e da sociedade humana. Em outras palavras, a riqueza passa a ser valoriza da e respeitada como bem supremo. Os homens vivem em sociedadeporque precisam uns dos outros para sobreviver. O Estado nasce para proteger os homens e suas propriedades. Além disso, o Estado teria sido formado para se aproveitarem dos benefícios da divisão do trabalho, integrando-se as diferentes atividades profissionais, caracterizando-se, assim, o motivo econômico. • Teoria do desenvolvimento interno da sociedade: aquelas sociedades que atingem maior grau de desenvolvimento e alcançam uma forma complexa têm absoluta necessidade do Estado, e então ele se constitui. É o próprio desenvolvimento espontâneo da sociedade que dá origem ao Estado. • Teoria da força: a superioridade de força de um grupo social permitiu que este submetesse um grupo mais fraco, nascendo o Estado dessa conjunção de dominantes e dominados. Além das teorias abordadas sobre a formação originária do Estado, a criação deste pode se dar por formação derivada, mediante: • Fracionamento: quando uma parte do território se desmembra e passa a constituir um novo Estado, seja por meios pacíficos ou violentos. 31 ORGANIZAÇÃO DO ESTADO • União: quando há uma união de Estados, constituindo-se apenas um. • Teoria do contrato social: a teoria contratualista, da origem convencional da sociedade humana, teve sua gênese mais remota nas especulações filosóficas dos sofistas, de senvolvendo-se na Idade Média através da Escola Espanhola. Identificou se com o jusnaturalismo a partir de Hugo Grotius, que deu as bases doutrinárias desenvolvidas pelos filósofos do século XVII. Em Emmanuel Kant atingiu o contratualismo uma sólida precisão científica. No mundo moderno foi Thomas Hobbes o mais destacado expositor da ideia do pacto social. Mas Hobbes partia do pressuposto de que o homem, em estado de natureza, era de uma ferocidade instintiva impeditiva da convivência pacífica. Vivia em estado de luta permanente. 0 homem é o lobo do homem – foi sua máxima. Consequentemente os homens realizaram o pacto voluntário constitutivo do Estado, delegando cada um, ao governo organizado, a totalidade dos seus direitos naturais de liberdade e autodeterminação. Convencionaram todos a sua submissão física e espiritual ao poder diretivo, em benefício da paz social e da segurança de todos. Daí a sujeição total do homem ao Estado e o absolutis- mo necessário do poder soberano. Os chamados “contratualistas” são os filósofos que defendiam que o homem e o Estado fizeram uma espécie de acordo - um contrato - a fim de garantir a sobrevivência. O ser humano, segundo os contratualistas, vivia no chamado Estado Natural (ou estado de natureza), onde não conhecia nenhuma organização política. A partir do momento em que o ser humano se sente ameaçado, passa a ter necessidade de se proteger. Para isso, vai precisar de alguém maior e imparcial, que possa garantir seus direitos naturais. Assim, o ser humano aceita abdicar sua liberdade para se submeter às leis da sociedade e do Estado. Por sua parte, o Estado se compromete em defender o homem, o bem comum e dar condições para que ele se desenvolva. Esta relação entre o indivíduo e o Estado é chamado de contrato social. Thomas Hobbes Thomas Hobbes nasceu em 1588 e faleceu em 1679, na Inglaterra. Assim pôde testemunhar as mudanças políticas inglesa durante as revoluções burguesas. Para Hobbes, os homens precisavam de um Estado forte, pois a ausência de um poder superior resultava na guerra. O ser humano, que é egoísta, se submetia a um poder maior, somente para que pudesse viver em paz e também ter condição de prosperar. Não por acaso, Hobbes chama o “Estado” de Leviatã, um dos nomes que o diabo recebe na Bíblia, com o propósito de reforçar que é a natureza perversa do homem que o faz buscar a união com outros homens. O Estado, por sua parte, terá o dever de evitar conflitos entre os seres humanos, velar pela segurança e preservar a propriedade privada. Desta maneira, somente o rei, que concentra o poder das armas e da religião, poderia garantir que os homens vivessem em harmonia. 32 Unidade I Contrato Social sob a ótica de John Locke John Locke nasceu em 1632 e faleceu em 1702, na Inglaterra. Sua vida discorreu no mesmo período da Revolução Inglesa que redefiniu o poder monárquico britânico. Segundo Locke, o homem vivia num estado natural onde não havia organização política, nem social. Isso restringia sua liberdade e impossibilitava o desenvolvimento de nenhuma ciência ou arte. O problema é que não existia um juiz, um poder acima dos demais que pudesse fiscalizar se todos estão gozando dos direitos naturais. Então, para solucionar este vazio de poder, os homens vão concordar, livremente, em se constituir numa sociedade política organizada. O homem poderá influir diretamente nas decisões políticas da sociedade civil seja através do exercício da democracia direta ou delegando a outra pessoa seu poder de decisão. Este é o caso da democracia representativa, na qual os cidadãos elegem seus representantes. Por sua parte, o Estado tem como fim zelar pelos direitos dos homens tais quais a vida, a liberdade e a propriedade privada. Jean-Jacques Rousseau Jean-Jacques Rousseau nasceu na Suíça, em 1712 e faleceu na França, em 1778, onde passou a maior parte de sua vida. Ao contrário de Hobbes e Locke, Rousseau vai defender que o homem, no seu estado natural, vivia em harmonia e se interessava pelos demais. Para Rousseau, a vida numa sociedade em vias de industrialização não favoreceu os homens no seu aspecto moral. À medida que o desenvolvimento técnico foi ganhando espaço, o ser humano se tornou egoísta e mesquinho, sem compaixão pelo seu semelhante. Por sua vez, a sociedade tornou-se corrupta e corrompia o ser humano com suas exigências para suprir a vaidade e o aparentar daquela sociedade. Desta maneira, Rousseau relaciona o aparecimento da propriedade privada com o surgimento das desigualdades sociais. Assim, era preciso que surgisse o Estado a fim de garantir as liberdades civis e evitar o caos trazido pela propriedade privada. As ideias de Rousseau serão aproveitadas por vários participantes da Revolução Francesa e também, posteriormente, ao longo de todo século XIX pelos teóricos do socialismo. Vejamos o esquema abaixo em resumo com as ideias propostas acima com seus conceitos e visões de mundo acerca do Contrato Social: 33 ORGANIZAÇÃO DO ESTADO Quadro 1 Filósofo Thomas Hobbes John Locke J.-J. Rousseau Natureza humana O homem é egoísta. O homem é bom, mas faz a guerra para se defender. O homem é bom, porém a propriedade o corrompeu. Criação do estado Evitar a destruição mútua. Proteger a propriedade e assim fazer o homem progredir. Preservar a liberdade civil e os direitos dos homens. Tipo de governo Monarquia absoluta, mas sem a justificativa do Direito Divino. Monarquia parlamentarista, sem a justificativa do Direito Divino. Democracia direta. Influência Teria do Direito Moderno. Revolução Inglesa e Constituição Americana. Revolução Francesa e comunismo. Citação “O homem é o lobo do homem.” “Onde não há lei, não há liberdade.” “A natureza fez o homem feliz e bom, mas a sociedade deprava-o e torna-o miserável.” 3 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO ESTADO O Estado é uma organização destinada a manter, pela aplicação do Direito, as condições universais da ordem social. Desde o aparecimento como organização, o Estado vem sempre evoluindo. Sobre a evolução histórica, fala-se na chamada lei dos três estados, formulada por Augusto Comte – cada manifestação do pensamento humano passa sucessivamente por três graus teóricos: o estado fictício ou teológico, o estado metafísico ou abstrato e o estado positivo ou científico. Queiroz Lima adotou essa doutrina da seguinte forma: • O Estado primitivo foi teocrático, isso se explica pelas teorias do direito divino sobrenatural. • Surge a noção metafísica do Estado, deslocando para a vontade do povo a origem do poder soberano. • Segue-se a noção positiva do Estado, no qual a soberania decorre das próprias circunstâncias objetivas, da lei ou da concepção
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