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Urinálise INTRODUÇÃO A urina é formada pelos rins e seus principais constituintes são água, ureia, ácido úrico, creatinina, sódio, potássio, cloreto, cálcio, magnésio, fosfatos, sulfatos e amônia. Em 24 horas, o organismo excreta cerca de 60 gramas de materiais dissolvidos, dos quais metade corresponde à ureia. Em determinadas situações patológicas, algumas substâncias são encontradas, como glicose, proteínas, corpos cetônicos, porfirinas e bilirrubinas em grandes quantidades. Além dessas substâncias, algumas células podem fazer parte de sua composição, como células epiteliais escamosas, uroepiteliais e tubulares renais. As células epiteliais escamosas revestem a uretra dos homens e mulheres e a vagina das mulheres, são as células mais comuns e numerosas na urina. A hidratação do indivíduo está diretamente relacionada com a concentração de urina a qual varia de acordo com a cor. De 1 a 3 o indivíduo encontra-se hidratado, de 4 a 6 à sinal de atenção em relação à hidratação; de 7 a 8 à indicam a desidratação. EXAMES DE URINA • Urina tipo I; • Urina 24 horas; • Urocultura. O exame de urina 24 horas deve ser solicitado quando é necessário avaliar as concentrações exatas das substâncias urinárias, visto que essas são secretadas em concentrações variadas ao longo do dia, assim, é necessário a coleta ao longo de 24 horas. Antes de iniciar este procedimento, o paciente deve esvaziar sua bexiga e essa urina é desprezada, tendo início aproximado às 8 horas da manhã, assim, toda a urina feita a partir do primeiro esvaziamento é coletada até as 24 horas seguintes, incluindo a última urina que deverá ser realizada por volta das 8 horas da manhã. O recipiente, após as coletas, deve ser mantido sob refrigeração durante todo o período de coleta. Em algumas dosagens na urina de 24 horas em que apenas a refrigeração não basta, faz-se necessário a adição de conservantes químicos. Para que esse teste seja preciso, é de extrema importância que toda a urina feita nesse período seja coletada e cronometrada. • Exame de características físicas (cor, aspecto, odor e gravidade/densidade); • Exame químico ou bioquímico (pH, proteínas, glicose, cetonas, sangue, bilirrubina, nitrito, esterase leucocitária e urobilinogênio; • Urocultura; • Análises de estruturas microscópicas no sedimento. Urina tipo I Na atualidade, o exame de rotina completo de urina (urina tipo I) ou urinálise pode receber diferentes denominações, tais como exames simples de urina, uroanálise, elementos anormais e sedimento (EAS), 3 A+S (albumina, açúcar e acetona, + sedimento), entre outras. São incluídos os exames físicos, químicos e microscópio da urina, que são realizados (desde a etapa da coleta e transporte da amostra até a Beatriz Loureiro interpretação dos resultados) de acordo com a padronização técnica do CLSA’88 para permitir que os resultados sejam confiáveis e comparáveis. Esse exame apresenta duas vantagens principais: (1) a amostra de urina pode ser obtida facilmente por métodos não invasivos; (2) é possível obter muita informação sobre o estado de funcionamento do metabolismo do corpo, do fígado e dos rins. Além disso, esse exame fornece indícios da presença de doenças ou de infecção do trato urinário por meio de testes simples, confiáveis e baratos. COLETA DE URINA A padronização da coleta de urina (fase pré- analítica) é muito importante. As amostras de urina são obtidas pela técnica de coleta do jato médio, uso de saco coletor adesivo para crianças, por sonda vesical ou punção suprapúbica quando necessários. O procedimento mais usual para coleta de urina consiste em: 1. O uso de um recipiente limpo, seco e estéril no caso de urocultura; 2. A coleta do jato médio após cuidados de higiene; 3. Antes da coleta, a genitália externa (homens e mulheres) deve ser higienizada, com solução antisséptica suave (se a pessoa coletar em casa, o ideal é a lavagem das genitálias); 4. Durante a coleta, o jato inicial é desprezado, o jato médio é coletado no frasco e o jato final também é desprezado; 5. O ideal é que a amostra de urina seja examinada imediatamente após a micção, visto que após 6h em temperatura ambiente pode ocorrer contaminação por bactérias, dissolução de células e cilindros e alteração do equilíbrio ácido-básico. Se não for possível examinar imediatamente a amostra, manter a urina sob refrigeração, ou então recomenda- se a fixação da amostra com preservante. EXAMES DE CARACTERÍSTICAS FÍSICAS Cor Variação de cor na urina normal é determinada pela concentração desta, a qual varia de amarelo pálido a amarelo âmbar escuro, de acordo com a quantidade dos pigmentos urocromo, urobilina e uroeritina. Há alguns fatores que podem alterar essa coloração, como a dieta, uso de medicações e produtos químicos presentes em doenças. A urina de cor pálida ou incolor é muito diluída e pode ser decorrente do aumento no consumo de líquidos, medicamentos diuréticos ou diabetes. A urina de cor vermelha indica a presença de hemácias (hematúria), hemoglobina livre (hemoglobina), mioglobina (mioglobinúria), e a cor pode variar de rosa a preta, dependendo da quantidade de hemácias ou pigmentos. Outra causa de urina castanho-escuro ou preta consiste em alcaptonúria, distúrbio em que o ácido homogentísico é excretado na urina, isso ocorre devido ao distúrbio no catabolismo de tirosina e fenilalanina pela ausência da enzima ácido homogentísico. Pacientes com icterícia obstrutiva excretam a bilirrubina através da urina, o que confere uma cor castanho amarelado ou verde amarelado, isso ocorre devido ao pigmento biliverdina, produto oxidado da bilirrubina. Beatriz Loureiro Aspecto Em geral, a urina é transparente, entretanto, pode turvar-se em decorrência da precipitação de fosfatos amorfos em urina alcalina ou de uratos amorfos em urina ácida. Fosfatos amorfos são precipitados brancos que se dissolvem mediante a adição de ácido e os uratos amorfos apresentam cor rosa dos pigmentos urinários e se dissolvem quando a amostra é aquecida. Essa pode se apresentar turva em decorrência da presença de leucócitos, hemácias, células epiteliais ou bactérias. O muco pode acarretar em um aspecto brumoso, e as gorduras ou linfa acarretam em aspecto leitoso. Odor Apesar de não ser relatado em muitos laudos, pode ter um significado importante, por exemplo, a presença de cetonas exibe um odor adocicado ou frutoso, a urina com odor de xarope de bordo é indicativo da doença da urina em xarope de bordo (distúrbio metabólico congênito), entre outras causas. Gravidade específica Esse exame compara a densidade da urina com a densidade da água, o que pode avaliar se os rins estão diluindo a urina. A densidade da urina normal de 1.005 a 1.035. Exame de características físicas Será considerado normal quando apresentar odor sul generis, cor amarelo citrino, aspecto límpido e densidade entre 1005 a 1035. Lembrando que a densidade da água é 1000, a densidade será baixa (valores mais próximos de 1005) quando a urina estiver diluída e hipotônica, resultado que pode indicar hipervolemia, hipertensão arterial, aumento de pressão intracraniana, volume excessivo de soro endovenoso ou insuficiência renal crônica que podem reduzir a densidade para valores anormais em casos graves. Quando a urina está concentrada, ela tem cor e cheiro mais fortes e terá densidade elevada (valores próximos ou maiores que 1035), podendo estar associada a vômitos e diarreias, febre, diabetes mellitus, glomerulonefrite e insuficiência cardíaca congestiva. A presença de quantidade excessiva de solutos como glicose, ureia e contraste radiológico eleva a densidade para valores anormais. A turvação na urina pode indicar infecção do trato urinário, presença excessiva de proteínas, sedimentos, cristais e células. A urina escura (marrom) ou vermelha e anormal, pode indicar infecçãorenal, presença de sangue ou urobilinogênio na urina. EXAME BIOQUÍMICO Esse exame normalmente é feito com uma tira reagente para sua realização, é uma tira estreita de plástico com campos com cores diferentes afixados, sendo que cada um contém reagentes para uma reação distinta e a realização de vários testes simultâneos. As cores geradas após o contato da urina nos campos são comparadas visualmente a um espectro de cores em quadros coloridos e são específicos para cada marca. Para garantia de um resultado fidedigno, a embalagem que armazena as fitas não deve ser mantida em refrigerados nem a temperatura superior a 30°C, assim como exposição solar, calor, substâncias voláteis e umidade. A urina deve ser testada em temperatura ambiente, caso a amostra tenha sido refrigerada, deve voltar a temperatura ambiente para realizar o teste. A fita deve ser totalmente imersa na urina e após cerca de cinco minutos retirada, limpar o excesso da parte de trás com papel, ler no quadro de cores do fabricante (o que pode ser lido em equipamentos semiautomatizados ou totalmente automatizados) e anotar os resultados obtidos para os parâmetros analisados de pH, proteínas, glicose, cetonas, sangue, bilirrubina, nitrito, esterase leucocitária e urobilinogênio. Dependendo do fabricante das fitas, pode ser expresso de cruzes (negativo, positivo + até ++++) ou concentrações aproximadas em mg/dL. Beatriz Loureiro pH Os rins controlam o equilíbrio eletrolítico ácido- básico mantendo o pH do sangue. Para manter o pH do sangue em torno de 7,4, o rim varia o pH da urina para compensar a dieta e os produtos do metabolismo, assim, esse é controlado de acordo com a concentração de H+ livre, logo, se essa concentração aumenta, o pH da urina diminui e ao contrário aumenta podendo variar de 4,6 a 8,0, mantendo-se em média de 6,0. O valor considerado normal é de 5,5 a 6,5, porém não há um valor anormal para urina, podendo essa se manter ácida ou alcalina, cabe ao médico associar o valor do pH com outro dado para saber se há algum problema. Proteínas As proteínas são indicadores muito sensíveis de função glomerular e tubular dos rins. Os rins eliminam uma pequena quantidade diária considerada normal de proteínas (visto que uma de suas funções é manter as proteínas plasmáticas em níveis normais), e são aquelas que tem baixa massa molecular. Após a filtração, as proteínas são reabsorvidas nos túbulos, assim os rins excretam menos de 150 mg a cada 24 horas, ou seja, 20 mg/dl, valor esse não detectável no exame de urina. Normalmente, as proteínas que são excretadas contêm uma mucoproteína chamada de Tamm- Horsfall, e essa forma a matriz da maioria dos cilindros urinários. Os valores de referência vão de 10 a 140 mg/dl. Glicose Os açúcares não são componentes normais na urina e são filtrados no glomérulo e reabsorvidos nos túbulos proximais para evitar a perda de carboidrato, esse mecanismo é eficiente, porém quando a glicose plasmática ultrapassa 180 mg/dl, a capacidade de reabsorção é excedida e os açúcares passam para a urina. Está presente em casos de hiperglicemia, ou seja, indivíduos diabéticos. Cetonas Em condições normais, os compostos acetoacetato, hidroxibutirato e acetona (corpos cetônicos) não são encontrados na urina, os quais são formados excessivamente em decorrência de distúrbios do metabolismo de carboidratos e lipídios, como em indivíduos diabéticos em que há intenso catabolismo de ácidos graxos. As cetonas são encontradas na urina quando há excesso na corrente sanguínea. A produção excessiva de cetonas na urina (cetonuria) está relacionada ao diabetes mal controlado, alcoolismo, jejum, desnutrição e dietas com elevados níveis de proteínas. Sangue Pode surgir na urina após passagem pelo filtro glomerular, através das células tubulares ou entre elas, ou por inflamação ou trauma na mucosa do trato urinário inferior. A hematúria (presença de sangue na urina) é classificada em glomerular e não glomerular, de acordo com a origem do sangramento. A presença de hemácias dismórficas, proteinúria intensa, cilindros hemáticos são indícios de hematúria glomerular. Além da presença de sangue, pode ocorrer a presença de hemoglobina livre (hemoglobinúria) decorrente da hemólise e, ainda, a mioglobinúria decorrente da proteína heme de músculos estriados. A hemoglobinúria pode ser identificada quando o plasma se encontra vermelho e a urina vermelha, Beatriz Loureiro já a mioglobinúria quando o plasma se encontra límpido e a urina vermelha. Bilirrubina A bilirrubina é um produto da degradação da hemoglobina e seu transporte do sangue ao fígado depende da albumina, assim, a bilirrubina livre ou não conjugada não é filtrada pelos glomérulos. Porém, a bilirrubina conjugada (não está ligada à proteína) é excretada do fígado e encontrada em quantidades muito pequenas na corrente sanguínea, é facilmente filtrada através do glomérulo e excretada na urina sempre que os níveis plasmáticos estiverem elevados. Uribilinogênio É um produto da bilirrubina excretada no intestino pelos ductos biliares e pela ação de bactérias intestinais é transformada em urobilinogênio, sendo uma parte excretada na urina e a maior parte do fígado para o intestino. Sua concentração está relacionada ao aumento de bilirrubina. É útil no diagnóstico de doenças hepáticas, obstrução intestinal e alteração da flora bacteriana. Nitrito É um teste muito útil na detecção precoce de bacteriúrias significantes e assintomáticas. Bactérias capazes de causar infecções do trato urinário, como a Escherichia coli, espécies de Enterobacter, Citrobacter, Klebsiella e Proteus, produzem enzimas que fazem a redução de nitrato a nitrito. Para a avaliação adequada, a urina deve permanecer na bexiga pelo menos quatro horas, dessa forma, a primeira urina da manhã é ideal para esse teste. Sendo indicado pela positividade do teste. Esterase leucocitária É útil para detecção de leucócitos na urina, sendo o leucócito mais comum encontrado, o neutrófilo, o qual, normalmente, pode aparecer em quantidades baixas. Assim, o número aumentado de neutrófilos em geral indica infecção do trato urinário, sendo indicada pela positividade do teste. A pesquisa de infecções também inclui a análise do pH, proteínas e nitrito. ALTERAÇÕES NO EXAME QUÍMICO As alterações no exame químico podem estar relacionadas com o desenvolvimento de doenças. Como a seguinte relação: • Bilirrubina (dano hepático, icterícia obstrutiva ou obstruções biliares); • Urobilinogênio (dano hepático, icterícia hemolítica, ou alterações na microbiota intestinal); • Corpos cetônicos (anomalias metabólicas, intenso catabolismo de ácidos graxos, indicação de cetoacidose); • Glicose (detecção e monitoramento de diabetes); • Proteínas (doenças do trato urinário); • Sangue (infecções graves do trato urinário); • pH (útil na relação com outros parâmetros); • Nitrito (infecção bacteriana dos rins ou trato urinário); • Leucócito (doenças do trato urinário e inflamação renal); • Densidade (concentração dos rins). Beatriz Loureiro ANÁLISE DE ESTRUTURAS MICROSCÓPICAS NO SEDIMENTO O exame microscópico do sedimento urinário é de extrema importância no exame de urina, principalmente quando os achados físicos e químicos estão anormais. A avaliação do sedimento urinário identifica células como os eritrócitos, leucócitos e células epiteliais, os cilindros, cristais e microrganismos. Além das células e outras substâncias encontradas, na microscopia é possível ver a presença de muco, que é uma proteína fibrilar produzida tanto pelo epitélio tubular renal quanto pelo epitélio vaginal, não tem significado clínico e quando em excesso pode estar associado à contaminação vaginal. As alterações físicas e químicas na urina podem afetar a morfologia do sedimento urinário, assim, uma urina concentrada apresenta células crenadas,ao contrário, se diluída em geral causa lise das células e em urinas muito alcalinas, eritrócitos, leucócitos e cilindros podem sofrer lise. Em relação à análise do sedimento urinário, a presença de células epiteliais escamosas no sedimento urinário indica contaminação, e a presença de células epiteliais de transição é normal, exceto quando se apresentam em grandes quantidades e anormais. A presença de leucócitos e hemácias em pequenas quantidades por campo de leitura é considerada normal, ao contrário, pode estar associada à alguma patologia. Os cilindros são formados nos túbulos distais e nos ductos coletores e não são detectados no sedimento normal, por esta razão a presença de cilindros geralmente indica doença renal. Já os cristais, sua presença é comum, visto que se trata de uma formação decorrente da precipitação de sais da urina submetidos a variações de pH, temperatura ou concentração, o seu significado clínico é limitado. Os cristais que se formam normalmente na urina são constituídos de oxalato ou fosfato de cálcio e uratos amorfos (urina ácida) ou carbonato de cálcio, biurato de amônio e fosfato amorfo (urina alcalina), porém são considerados anormais cristais como os de cistina, que indicam risco de cálculos renais e os de estruvita (magnésio- amônio-fosfato ou fosfato triplo), provocadas por bactérias como Proteus ou Klebsiella. Cristais de tirosina indicam uma condição rara de prognostico ruim chamada de leucinose ou doença da urina de xarope de bordo (DXB), porque a urina tem cheiro de açúcar queimado. É uma doença genética que oferece risco de desenvolvimento de retardo mental grave se não for tratada com dieta rigorosa sem proteínas animais. Outros cristais anormais são os de urato ou acido úrico presente em pacientes com gota ou neoplasias como leucemia, os de colesterol e de bilirrubina que podem indicar doença hepática. Os cilindros possuem significado clínico quando presentes, dessa forma, é importante conhecê-los. Hialinos: têm origem na secreção tubular e estão relacionados com a glomerulonefrite, pielonefrite, doença renal crônica, estresse e exercícios físicos. Hemáticos: são hemácias ligadas à matriz proteica e estão relacionados com a glomerulonefrite e exercícios físicos intensos. Leucocitários: são leucócitos ligados à matriz proteica e estão relacionados à pielonefrite e nefrite intersticial aguda. Bacterianos: são bactérias presas à matriz e estão relacionados com a pielonefrite. Beatriz Loureiro Células epiteliais: são células ligadas à matriz e estão relacionados com lesão no túbulo renal. Granulares: são decorrentes da desintegração de cilindros leucocitários e estão relacionados com a glomerulonefrite, pielonefrite, estresse e exercícios físicos. Céreos: são cilindros hialinos e granulares e estão relacionados com a estase do fluxo urinário. DIAGNÓSTICO DE ITU: UROCULTURA Bacterioscopia Consiste em se preparar, a partir da amostra de urina, uma lâmina corada pelo método de Gram para identificação da bactéria no microscópio. Urocultura Método utilizado para pesquisa e isolamento de agente patogênico de infecções do trato urinário. Tem a vantagem de existir diversos meios seletivos para as diferentes bactérias Gram negativas ou Gram positivas, do tipo aeróbios ou anaeróbios facultativos, além de fungos e leveduras. ITU: é uma das mais frequentes infecções bacterianas que pode acometer o ser humano, sendo mais predominante entre adultos e mais frequentes no sexo feminino. As ITUs podem ser classificadas de acordo com o local em que se instala, bem como sua gravidade. A infecção urinária pode comprometer somente o trato urinário baixo, o que especifica o diagnóstico de cistite, podendo ser sintomática ou não. Habitualmente, as cistites são infecções não complicadas. Caso afete simultaneamente o trato urinário inferior e superior, utiliza-se a terminologia infecção urinária alta, também denominada pielonefrite. Estas são mais complexas, estando frequentemente associadas com a presença de cálculos renais. Tanto a infecção urinária baixa como a alta podem ser agudas ou crônicas e sua origem pode ser comunitária ou hospitalar. A ITU recorrente é caracterizada pela presença de dois ou mais episódios de ITU em seis meses ou três ou mais episódios ao ano após a cura da primeira infecção e ocorre em aproximadamente 30 a 50% das mulheres que desenvolvem o quadro de cistite aguda. Fatores que influenciam: • Comportamentais: fatores de risco comportamental, como frequência de relação sexual, coito anal seguido de coito vaginal e uso de espermicida (em especial quando na utilização conjunta ao diafragma), associadas com infecção urinária recorrente. • Anatômicas: algumas anormalidades anatômicas também predispõem à infecção urinária, como distância entre a uretra e ânus, presença de cistocele, prolapso uterino e retocele. Além disso, mulheres na pós- Beatriz Loureiro menopausa apresentam maior risco de infecção recorrente por alterações mecânicas e outros fatores fisiológicos. O diagnóstico das ITUs se dá pela análise clínica juntamente com a anamnese do paciente realizada pelo médico, quando este, normalmente, encontra um quadro de disúria, urgência miccional, polaciúria, nictúria e dor suprapúbica. A infecção do trato urinário alto, que habitualmente se inicia como um quadro de cistite, é habitualmente acompanha de febre, calafrios e de dor lombar, uni ou bilateral. Essa tríade: febre mais calafrios mais dor lombar está presente na maioria dos quadros de pielonefrite. Não é possível fechar o diagnóstico com o exame de rotina, servindo este apenas para o rastreio e para apontar indícios de infecção do trato urinário e algumas doenças metabólicas. Os casos de infecções do trato urinário (ITU) são confirmados através da realização de urocultura para a identificação e isolamento do microrganismo patogênico, sendo muitas vezes acompanhado do antibiograma para testar a sensibilidade ou resistência do microrganismo aos antibióticos, útil para orientar o tratamento mais adequado. UROCULTURA A urocultura é um procedimento realizado em um meio de cultura com uma amostra da urina do paciente para identificar o crescimento bacteriano. A urina para urocultura deve ser obtida a partir do jato médio da primeira urina da manhã e colhida com auxílio de técnicas assépticas, preferencialmente em período de não vigência de antibioticoterapia. Apesar de a primeira urina da manhã conter potencialmente maior população de bactérias devido ao maior tempo de incubação, a sintomatologia exuberante da ITU com elevada frequência urinária dificulta esta medida. Desta forma, a urina de qualquer micção pode ser valorizada desde que obtida com um intervalo de, no mínimo, duas horas após a micção anterior, período que corresponde ao tempo de latência para o crescimento bacteriano, para que se evitem falsos negativos. O meio sólido ou em ágar e o mais econômico e amplamente utilizado para urocultura, o meio usual e o CLED (cistina lactose deficiente em eletrólitos que é um meio rico contendo lactose e cistina permitindo diferenciar Gram positivos de Gram negativos fermentadores de lactose (alteram a cor verde do ágar para amarelo impedindo crescimento do véu de Proteus e favorecendo o crescimento de colônias anãs. De acordo com a padronização de cada laboratório, pode se optar por semear em ágar sangue e ágar MacConkey em vez de CLED, havendo a disposição placas duplas CLED MacConkey. Agora um ponto importante a cultura negativa e liberada como ausência de crescimento bacteriano nas condições utilizadas para o teste. Quando ocorre crescimento de três ou mais agentes em urina de jato médio, considera se a possibilidade de contaminação e indica se nova cultura com outra amostra. Mas atenção em urina coletada por punção supra púbica, dois microrganismos podem indicar poli infecção.Resultados Para o diagnostico de bacteriúria, deve ser considerado um numero superior a 105 colônias/ml de urina, mas esse critério pode variar de acordo com a situação em relação ao paciente, sexo e uso de algum tipo de medicamento, principalmente antibióticos. Por isso esse diagnóstico é alvo de questionamentos para caracterização de uma ITU. Uma urocultura é considerada positiva quando, após este mesmo tempo, é possível identificar mais que 100.000 colônias de bactérias, chamadas de unidades formadoras de colônias (UFC). Por sua vez, uma urocultura é considerada negativa quando, após 48-72 horas de incubação da urina Beatriz Loureiro em meio de cultura, não se observa crescimento de colônias de bactérias. Por fim, é importante considerar que valores abaixo de 10.000 UFC são considerados contaminações de coleta. Há, entretanto, algumas observações a serem feitas: 1. Se o paciente estiver tomando antibióticos, estes podem inibir o crescimento das bactérias, e mesmo um resultado com menos de 100.000 UFC deve ser sempre valorizado; 2. Em homens, o risco de contaminação é menor, portanto, valores maiores que 10.00 UFC já devem ser valorizados; 3. Quando crescem bactérias da família Pseudomonas, Klebsiella, Entorobacter, Serratia ou Moraxella, o resultado deve ser levado em conta mesmo com contagens menores que 100.000 UFC. CASO CLÍNICO Amostra de uma mulher de 25 anos, sexualmente ativa, a qual relatou dor durante a micção e a cor da urina levemente rosada. O exame físico da urina relatou cor rosada, aspecto normal, odor normal e densidade de 1020. O exame químico evidenciou pH de 6,0, proteínas positivas, hemácias positivas, leucócitos positivos e nitrito positivo. A análise de sedimento urinário mostrou a presença de seis hemácias por campo, flora bacteriana presente, muito muco e leucócitos incontáveis. Dentro do contexto da análise urinária, qual o provável diagnóstico da paciente e quais os dados laboratoriais que o levaram a esse diagnóstico? Resolução O provável diagnóstico da paciente é de infecção bacteriana e os dados que fazem com que se chegue a esse diagnóstico são: a sintomatologia da paciente, a qual relata dor ao urinar e coloração rosada na urina. Além da sintomatologia, os dados que confirmam a suspeita são: cor rosada da amostra, hemácias positivas (dado que explica a cor da urina rosada), leucócitos positivos (indicativo de infecção) e nitrito positivo (é um teste muito útil na detecção precoce de bacteriúrias significantes e assintomáticas, algumas espécies de bactérias convertem nitrato a nitrito), a presença de seis hemácias por campo (confirma a cor encontrada e evidencia que não está normal a urina), flora bacteriana presente (confirma o resultado), muito muco e leucócitos incontáveis (confirma a infecção e deduz-se que a infecção é grave). CASO CLÍNICO O paciente de 65 anos relatou ao médico emagrecimento e sede excessiva. O médico então solicitou exames de sangue e de urina tipo 1. Após coletar as amostras no laboratório, essas foram encaminhadas para análise. A amostra de urina apresentou odor adocicado ou frutoso, e positividade para glicose e cetonas. Dentro desse contexto, qual a provável alteração que esteja ocorrendo no paciente? Resolução De acordo com dois sintomas apresentados pelo paciente e com as alterações laboratoriais, urina com odor adocicado devido ao aumento de cetonas, as quais são formadas excessivamente em decorrência de distúrbios do metabolismo de carboidratos e lipídios, por exemplo, em indivíduos diabéticos em que há intenso catabolismo de ácidos graxos, e ao aumento de glicose, a qual se apresenta na urina quando os valores plasmáticos estão acima de 180 mg/dl e a capacidade de reabsorção é excedida e os açúcares passam para a urina, pode-se inferir que este paciente esteja com diabetes, a qual será confirmada pelo exame de sangue e outros exames específicos. CASO CLÍNICO Certo dia, Julia, de 62 anos, chegou ao hospital, reclamando de dores e queimação na hora de urinar. Fazia menos de dois meses que ela tinha encerrado um tratamento com antibióticos para uma infecção urinaria que a deixou muito abatida. Beatriz Loureiro Julia começou a pensar que o tratamento talvez não tivesse sido adequado, mas como havia melhorado bastante talvez fosse uma nova infecção. Realizando a consulta médica constatou- se temperatura axilar de 38°C, pulso com 130 bpm, pressão arterial de 76 x 32 mmHg, frequência respiratória de 24 mpm (movimentos por minuto) apresentando uma certa letargia, mas agitação quando era abordada. Foi administrado soro fisiológico e os exames laboratoriais mostraram contagem de leucócitos de 17 000 /mm 3 com 67% de neutrófilos, 3% de bastonetes e 24% de linfócitos, e o exame de urina apresenta ++/+4 de esterase leucocitária, nitrito negativo e traços de sangue, com microscopia de 50 leucócitos por campo ou 100.000 leucócitos por mL e 3.000 hemácias por mL e abundante flora bacteriana. Observamos um caso muito sugestivo de infecção do trato urinário (porém com uma gravidade maior devido a hipotensão e letargia observadas). A paciente poderia estar em choque devido a infecção? Estaria mais grave dessa vez por ser uma recorrência da infecção urinaria? Nesse caso, quais os cuidados que Julia deveria tomar? Como deve ser feito o diagnostico e tratamento de uma infecção de repetição do trato urinário dessa gravidade? Resolução Fica bem evidente a situação dessa paciente em estado de choque que pode ter sido causada por uma sepse de foco urinário e nesse caso, uma urosepse gerando um quadro de síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SIRS), isto é, uma hipotensão que causou perfusão tecidual inadequada. É essencial tentar determinar a causa subjacente e, assim, fazer o tratamento apropriado. Ela não tem história de hemorragia ou de perda de grande volume de sangue de modo que o choque hipovolêmico é improvável. Além disso o choque hipovolêmico e o choque cardiogênico causam intensa vasoconstrição periférica, resultando em extremidades frias e pegajosas. As extremidades dessa paciente estão quentes e bem perfundidas (embora de modo inapropriado) apesar da hipotensão, o que sugere forma distributiva de choque. Com a contagem alta de leucócitos com formas imaturas e com os achados na urina é mais provável choque séptico como consequência de ITU. As ITUs são comuns nos idosos, acometendo tanto adultos debilitados como adultos sadios. De fato, entre as infecções mais comuns em pacientes com mais de 65 anos, as ITUs são superadas apenas pelas infecções respiratórias. Os fatores de risco que contribuem para a alta incidência de ITU nos idosos e nos pacientes institucionalizados incluem incontinência, história de ITU previa, déficit neurológico, imunossupressão, desnutrição e doenças associadas. Esses fatores podem causar anormalidades funcionais no trato urinário ou alterar as defesas contra infecções. Além disso a hospitalização frequente expõe esses pacientes a patógenos nosocomiais e à instrumentação invasiva, como sondas de demora. Em casos de pacientes que apresentam ITU recorrente, o acompanhamento ambulatorial se faz necessário devido ao risco aumentado que esse paciente pode ter, e quando esse acompanhamento não for possível, deve se tomar medidas que possam amenizar a infecção recorrente. Assim, pudemos ver um quadro de ITU recorrente associado a uma urosepse que levou Julia ao hospital para tratamento. O diagnostico para ITU foi confirmado devido a diversos fatores em conjunto, como os achados laboratoriais, leucocitose e alterações na urina, além do quadro clinico sugestivo. CASO CLÍNICO Paciente do sexo masculino refere que, sem sentir coisa alguma antes, há cerca de cinco dias começou a experimentar fortes dores na forma de cólica na região lateral esquerda, irradiando para a virilha. O paciente ainda diz que a dor não melhoracom repouso e em nenhuma posição, apresentando uma piora progressiva no quadro. Nos dois últimos dias começou a apresentar calafrios, com febre de 39,5oC. Relata que havia Beatriz Loureiro ocorrido essa mesma dor na forma de cólica duas vezes antes, e que a urina tinha saído avermelhada, parecida com sangue. No exame físico, o paciente apresenta um regular estado geral devido a dor, porém corado e hidratado. O pulso estava em 120 bpm e a pressão arterial em 120 x 60 mmHg, frequência respiratória normal e temperatura corpórea em 38,3°C. Os membros superiores e inferiores apresentavam boa perfusão periférica, com pulsos simetricamente palpáveis e sem edemas. O paciente apresentou os seguintes resultados de exames laboratoriais hemoglobina: 13 g/ Dl, hematócrito 38%, leucócitos totais 15.000, plaquetas 250.000 mm3. • Exames bioquímicos: ureia 50 mg/ dL, creatinina 1,3 mg/ dL, Na (138 mEq /L, K (potássio) 5,0 mEq /L. • Exame de urina 1: pH 6,0, numero de hemácias 500.000 mm3, leucócitos 300.000 mm3. • Urocultura: 100.000 colônias com identificação positiva para E coli • Urografia excretora: deformidade calicial a direita. Moderada dilatação pielocalicial e ureteral a esquerda, correspondendo a uma imagem circular radiopaca. Presença de falha de enchimento em grupo calicial superior esquerdo. UROGRAFIA EXCRETORA O exame serve para a avaliação dos rins e das vias urinárias. • Preparo para urografia excretora O preparo para urografia excretora deve incluir jejum de 8 horas e limpeza intestinal com laxantes orais ou enemas de acordo com a indicação do médico. • Como é feita a urografia excretora A urografia excretora é feita com o indivíduo deitado de barriga para cima e sem anestesia, sendo que é feito um raio x abdominal antes do início do exame. Depois, é injetado um contraste iodado na veia que é rapidamente eliminado pela urina, permitindo observar todo o trato urinário desde os rins até à uretra. Para isso, são feitos outros raio x um logo após a injeção do contraste, outro 5 minutos depois e outros dois, 10 e 15 minutos mais tarde. Além disso, o médico, dependendo do problema que está a ser estudado, pode pedir um raio x antes e depois de esvaziar a bexiga. Durante a urografia excretora, o paciente pode sentir calor no corpo, sabor metálico na boa, náuseas, vômitos ou alergia devido ao uso do contraste. CASO CLÍNICO Para a investigação desse caso um tanto complicado, algumas questões são levantadas: qual será a hipótese diagnostica para ele? Quais os sinais ou sintomas que levam ao diagnóstico? Qual a conduta e o tratamento a ser adotada? Quais orientações podem ser dadas para esse paciente? Beatriz Loureiro Resolução Podemos ver que se trata de uma infecção urinaria pela rápida progressão que houve nos últimos dois dias e pela presença de febre o que pode agravar um pouco mais a situação: uma cistite não tem como característica comum provocar febre no paciente, mas uma pielonefrite, sim. Na cistite, o paciente normalmente apresenta ardência e urgência ao urinar, dificuldade de segurar a urina, vontade de urinar mesmo com a bexiga vazia, sensação de peso na barriga, presença de sangue na urina. Quando o paciente começa a apresentar febre baixa e dor lombar também pode ser cistite, porém, sempre que esses sintomas surgirem deve se pensar também em pielonefrite, principalmente se a febre for alta e vier acompanhada de vômitos, perda de apetite e mal estar geral. O paciente também apresenta uma leucocitose, e com os resultados do exame de urina 1 e da urocultura, fica claro que ele tem uma infecção urinaria e que a situação pode ser complicada, pois ha risco de ser uma pielonefrite. Você também percebeu a informação de uma imagem radiopaca na uretra, com falha de enchimento em cálice esquerdo? Nesse caso é bem provável que estejamos diante de uma situação de litíase (calculo renal), o que explica as fortes dores sentidas pelo paciente cinco dias atrás. Algumas pessoas podem apresentar excesso de sais minerais na urina, e mesmo com a ingestão de grande volume de água a formação de pedras continua ocorrendo principalmente pela presença de íons cálcio que, quando produzidos ou excretados em grande quantidade, podem se precipitar. Normalmente a ingestão de líquidos em volumes normais ou quantidade maior pode diluir os íons precipitantes na urina e, com isso, evitar a formação de cálculos renais. A cólica renal, sintoma de litíase ocorre quando um cálculo renal de cerca de 4 mm se aloja na região do ureter, causando obstrução e dilatação do sistema urinário, produzindo uma dor muito intensa na região lombar. Ao contrario das dores da coluna, que melhoram com repouso e pioram a movimentação, a cólica renal dói intensamente, independentemente da posição do paciente, podendo vir acompanhada de náuseas e vômitos. Sangue na urina e frequente e ocorre por lesão direta do calculo no ureter. Para o tratamento desse paciente deve se pensar nos dois problemas que foram apresentados. Como há uma sugestão de pielonefrite, será necessária internação hospitalar para administração de antimicrobianos de amplo espectro juntamente com medicação analgésica para aliviar a dor da cólica renal, além de observar se ocorre a saída espontânea do calculo ou se será necessário algum outro tipo de intervenção (uma litotripsia por exemplo, que pode ser extracorpórea). INTERPRETAÇÃO DE DOENÇAS RENAIS As doenças renais podem ser diagnosticadas por meio das dosagens bioquímicas de eletrólitos, do pH e de diversos produtos do metabolismo, como a ureia e a creatinina. Existem métodos de avaliação do Índice de Filtração Glomerular e da eficiência dos rins para livrar nosso organismo de certas substâncias, processo chamado de depuração ou clearance renal. Quando os rins não funcionam bem, diversas substâncias se acumulam no sangue, tais como a ureia e a creatinina, e que, dependendo do grau da lesão e de sua localização (nos glomérulos ou nos túbulos), pode haver perda de proteínas, albumina, hemácias, sódio, além de falhas na produção de urina e de sua função excretora. Nesse momento, entra em ação a Bioquímica, pois a maioria dos exames para avaliação da função renal são realizados por meio de dosagens, no sangue ou na urina de diversos elementos químicos. MÉTODOS LABORATORIAIS Em algumas clinicas e hospitais, o exame de perfil bioquímico de rotina para avaliação da função Beatriz Loureiro renal inclui, além da dosagem dos eletrólitos, a dosagem de creatinina, de glicose e de BUN nitrogênio ureico sanguíneo, Blood Urea Nitrogen que, no Brasil, é dosado como ureia. Quando os rins não funcionam adequadamente, os compostos nitrogenados, que deveriam ser eliminados pela urina, acumulam se no sangue e pode haver perda de glicose pela urina na ausência de diabetes mellitus o que torna essas dosagens muito úteis para o diagnóstico de doenças renais. UREIA A ureia é formada no fígado como resultado do metabolismo de proteínas. O excesso de aminoácidos é convertido em ureia que fica no sangue, e a sua concentração pode ser medida. A medida de ureia na urina deve ser feita em urina de 24 horas, havendo uma série de recomendações a serem seguidas para evitar que as bactérias causem a sua degradação na amostra. A ureia na urina tem como valor de referencia 10g/24 horas a 35g/24 horas. CREATININA A creatinina é produto de excreção do fosfato de creatina, que é uma substancia armazenada nos músculos como fonte de energia para a contração muscular. A sua quantidade no sangue varia de acordo com a massa muscular, havendo valores de referencia diferentes para crianças, idosos, adultos, jovens, homens ou mulheres. A creatinina é livremente filtrada nos rins e sua concentração no sangue aumenta em casos de distúrbios renais desequilíbrio hídrico e choque circulatório sendo que, diferentemente da ureia ou BUN, cuja excreção é afetadapela dieta, por uso de esteroides anabolizantes e desnutrição, a concentração de creatinina não é afetada por dietas ou hormônios. É considerado o melhor marcador da função renal e é um teste sensível que pode detectar o mal funcionamento dos rins na ausência de qualquer sintoma em geral, quando se detecta níveis de creatinina elevada, quase 50% da função dos rins pode estar comprometida (lembre-se de que temos dois rins). A dosagem de creatinina esta incluída nos testes de Medicina Preventiva, sendo a dosagem simultânea de creatinina e ureia importante para diferenciar quando uma azotemia (acúmulo de compostos nitrogenados no sangue) é de origem pré renal (dieta rica em proteínas ou excesso de massa muscular) ou renal (problema de excreção na urina). DEPURAÇÃO OU CLEARANCE DE CREATININA PARA AVALIAÇÃO DO ÍNDICE DE FILTRAÇÃO GLOMERULAR Sabe-se que os dois rins filtram em media 180 litros de sangue por dia, ou, aproximadamente, de 90 ml a 125 ml por minuto, sendo essa a taxa de filtração glomerular ou Ritmo de Filtração Glomerular (RFG) normal. Esse parâmetro pode ser avaliado em um individuo por meio de um teste conhecido como teste da depuração ou clearance, que, no método mais exato, usa como indicador uma substância exógena chamada de inulina, que é livremente filtrada, não é reabsorvida nem secretada nos túbulos de forma que tudo o que aparece na urina foi proveniente da filtração. Um método invasivo, por conta da necessidade de injetar na circulação essa substância, podendo ser perfeitamente substituído pelo método da depuração da creatinina endógena, que é menos invasivo. TAXA DE FILTRAÇÃO GLOMERULAR Uma vez que a creatinina produzida endogenamente é liberada nos líquidos corporais a uma taxa constante e os valores plasmáticos são mantidos dentro de limites estreitos, e uma vez que os rins filtram a creatinina livremente, existe quase um equilíbrio entre a quantidade filtrada e a quantidade que aparece na urina. A única imprecisão nesse método é gerada pela secreção tubular de creatinina, que faz com que os valores do volume de sangue livre (depurado) da creatinina em um determinado período de tempo Beatriz Loureiro seja superestimado em cerca de 25%. Essa imprecisão será maior quanto menor for o Ritmo de Filtração Glomerular. Para calcular a depuração de creatinina, basta colher toda a urina produzida preferencialmente em 24 horas, colher uma amostra de sangue preferencialmente na metade do período de tempo e calcular a depuração, utilizando a seguinte fórmula: • Em que U = creatinina na urina (mg/dL); • P = creatinina no plasma (mg/dL); • Volume = volume de urina em 24 horas; 1440 = fator de correção 24 horas x 60 minutos). Esse valor devera ainda ser corrigido, utilizando se um nomograma peso x altura superfície corporal, em que é possível transformar os valores de peso e altura do paciente em m2 de superfície corporal. Depois, basta fazer os cálculos para corrigir o valor de depuração encontrado para o padrão de 1,73 m2. Atualmente para maior exatidão desse calculo, foram introduzidas na formula, conhecida como padronização/calibração pelo estudo MDRD Modification of Diet in Renal Disease fatores de correção para a idade e gênero feminino. Essa fórmula dispensa a medida de creatinina na urina de 24 horas e fornece valores da Taxa de Filtração Glomerular em mL /1,73 m2. Constantemente vão surgindo novos conhecimentos, como: 1. Novos biomarcadores (por exemplo, a cistina) melhores do que a creatinina para monitorar doença renal aguda ou crônica. 2. Proteinúria microalbuminúria e dismorfismo eritrocitário, que podem ser usados para diagnóstico e prognóstico das doenças renais. Os valores de referência para o clearance de creatinina de forma simplificada são: • Crianças 70 a 140 mL /1,73 m2 • Homens 85 a 125 mL /1,73 m2 • Mulheres 75 a 115 mL /1,73 m2 É importante saber disso porque, de acordo com a Sociedade Brasileira de Nefrologia, quando os valores obtidos do paciente estão abaixo de 60 mL /1,73 2 o diagnóstico é de insuficiência renal crônica. Os estágios da insuficiência renal são classificados, de acordo com os valores de clearance de creatinina (em ml/min/1,73 m2 da seguinte forma: • Estágio I - clearance maior do que 90 porém com alguma doença de risco como diabetes, hipertensão ou rins policísticos, existe risco de desenvolver insuficiência renal. • Estágio II - clearance entre 60 e 89 é considerado uma fase pré insuficiência renal. • Estagio III – clearance entre 30 e 59: é a fase de insuficiência renal crônica confirmada, com sintomas diagnosticáveis. Nessa fase, as complicações começam a aparecer: os rins não produzem a eritropoietina em quantidade suficiente e começa a haver anemia progressiva por falta de produção de glóbulos vermelhos pela medula óssea, ocorre desmineralização e lesões ósseas por elevação do hormônio paratireoide ano e queda da produção de Vitamina D (hormônios que controlam a quantidade de cálcio nos ossos), além do desequilíbrio hidroeletrolítico. • Estágio IV – clearance entre 15 e 29: esta e a fase pré-dialise com acidose, elevação do potássio, anemia estabelecida, aumento do risco de doenças cardíacas e fraqueza. • Estágio V – clearance menor do que 15: fase de insuficiência renal terminal, em que os sintomas da uremia e a progressão do quadro podem levar o paciente a óbito por edema pulmonar. Podem ocorrer arritmias cardíacas, crise convulsiva e ate coma. Beatriz Loureiro Os principais marcadores de lesão renal são a proteinúria, albuminúria ou microalbuminúria e hematúria. Esses parâmetros podem ser detectados em exames de triagem como o exame de rotina de urina usando tiras reagentes, sendo necessária uma avaliação confirmatória ou mais detalhada. A albuminúria e microalbuminúria são definidas como a presença de 30 mg a 300 mg de albumina em amostra de urina de 24 horas. É um sinal de lesão renal diabética ou da hipertensão arterial. A hematúria, na pratica clinica, deve ser avaliada por meio de analise microscópica, para pesquisa de dismorfismo eritrocitário (hemácias deformadas de diversos tipos), tornando possível discriminar entre a causa glomerular e não glomerular da hematúria. O achado de 80% de hemácias dismórficas pode ser usado para confirmar o diagnostico de hematúria glomerular. DESEQUILÍBRIO ÁCIDO-BÁSICO DA INSUFICIÊNCIA RENAL Os rins desempenham uma função importante para a manutenção do equilíbrio acidobásico. Eles são capazes de eliminar ácidos orgânicos metabolizáveis originados de proteínas, carboidratos e lipídeos da dieta que o fígado metaboliza, gerando grande quantidade de íons hidrogênio (da oxidação dos aminoácidos sulfurados) e alcalis (da oxidação de ânions orgânicos). Os rins removem, ainda, os ácidos orgânicos não metabolizáveis (como o acido glicurônico e o hipúrico), assim como os ácidos inorgânicos. A capacidade de os rins removerem os ácidos do sangue depende do mecanismo tubular de secreção de íons hidrogênio, que é também o mecanismo regenerativo de bicarbonato, pois, no processo, para cada íon hidrogênio eliminado na urina, um íon bicarbonato é recuperado para o sangue. Esse mecanismo de reabsorção do bicarbonato e de eliminação de ácidos fica prejudicado na doença renal crônica, resultando em acidose chamada de metabólica. Outras condições que causam acidose, como a uremia (acúmulo de acido úrico no sangue) ou cetoacidose diabética, sobrecarregam o rim, piorando o quadro. Existem duas formas principais de desequilíbrio acidobásico causado por doença renal: a insuficiência renal estágio V e a acidose tubular renal (por perda de bicarbonato). O diagnóstico da acidose é feito por gasometria arterial. O sangue é coletado de uma artéria (braquial ou femoral e, eventualmente a ulnar) ou de uma veia, em certas condições. Em caso de recém nascido, pode se optar por artérias do couro cabeludoou artéria umbilical. A coleta é feita segundo recomendações do CLSI (Instituto de Normas Clinicas e Laboratoriais), com seringa plástica própria para gasometria preparada com heparina de lítio jateada na parede e a medida é feita imediatamente, com a própria seringa, no aparelho analisador de gases. O analisador de gases e eletrólitos usa tecnologia de eletrodos íon seletivos para medir diversos eletrólitos e o pH, além dos gases O2 (oxigênio) e gás carbônico (CO 2 cujas concentrações são expressas em pressão parcial de gases (pO2 e pCO2 cuja unidade de medida é milímetros de mercúrio (mmHg). GASOMETRIA A interpretação do resultado da gasometria é feita considerando as complexas inter-relações metabólicas (geração de ácidos e falha renal na recuperação de bicarbonato) e respiratórias, e Beatriz Loureiro aumento de pCO2 por deficiência de ventilação pulmonar). Tem-se como referência a equação: É possível concluir que a doença renal crônica e o distúrbio de absorção tubular de bicarbonato causam a acidose metabólica, com pH menor do que 7,30 e pCO2 baixa (mostrando compensação respiratória) e é confirmado pela detecção de níveis de bicarbonato (HCO3) baixos no sangue. Essa combinação de alterações permite concluir que houve desequilíbrio acidobásico e que ele não foi causado pelo sistema respiratório e sim pelos rins. CASO CLÍNICO Dona Maria tem 68 anos, é aposentada e faz uso de insulina e metformina porque sofre de diabetes há 12 anos. Ela também segue dieta adequada com restrição de sal, carboidratos e gordura, mas não realiza atividades físicas. Teve um infarto agudo do miocárdio há 4 anos, quando descobriu que era hipertensa, e passou a tomar atenolol 50 mg/dia. Desde o infarto, a paciente faz acompanhamento médico para monitorar o seu quadro metabólico. No entanto, não se sentiu bem nos últimos dias, quase desmaiou, sentiu fraqueza e cansaço, muita sede e passou a urinar muito. A avaliação clinica e laboratorial indicou os seguintes resultados: • Paciente 68 anos, feminino; medicamentos em uso: Insulina 2 U subcutânea diária, Metformina 850 mg/dia, Atenolol 50 mg/dia. • Pressão arterial levemente baixa (100/60 mmHg). • Índice de Filtração Glomerular (clearance de creatinina): 40 mL min/ 1,73 m 2 (VR 75 a 115 mL/min/1,73 m2). Dosagem no sangue (em que VR valor de referência): • Creatinina 5,2 mg/dL (VR 0,5 a 1,0 mg/ dL). • Acido úrico 8,0 mg/dL (VR 2,5 a 6,0 mg/ dL). • Ureia 70 mg/dL (VR 14 a 40 mg/dL). • Bicarbonato 21 mmol/L (VR 22 a 29 mmol/L). • Sódio 130 mmol/L (VR 135 a 145 mmol/L). • Potássio 6,1 mmol/L (VR 3,5 a 5,3 mmol/L). • Glicose jejum 50 mg/ dL (VR 60 a 99 mg/ dL). Analise esses resultados laboratoriais e aponte o significado deles. Resolução As alterações observadas indicam uma insuficiência renal crônica que ocorreu como complicação do diabetes mellitus associado a hipertensão. Para chegar a essa conclusão utilize os conceitos expostos sobre os exames de avaliação da função renal: 1) eletrólitos, 2) A importância da creatinina no diagnóstico de doenças renais, 3) depuração ou clearance de creatinina para avaliação do Índice de Filtração Glomerular e 4) desequilíbrio acidobásico da insuficiência renal. 1) Observa-se os resultados dos eletrólitos (potássio, bicarbonato) e o clearance de creatinina. Veja que ha elevação do potássio e da creatinina e o Ritmo de Filtração Glomerular está abaixo de 60 mL /1,73 m2. Esse valor de clearance de creatinina já indica a doença renal crônica 2) Ureia e ácido úrico como produtos nitrogenados para excreção: há um acúmulo de ureia e de ácido úrico indicando a piora na função excretora renal aliado a isso, o bicarbonato está tendendo a diminuir. Se essa condição piorar, ocorrera uma acidose. 3) A glicemia esta abaixo do valor de referência. Lembre-se de que a paciente usa insulina e hipoglicemiante metformina devido a existência de diabetes crônica e ao alto risco cardiovascular Porem, sendo idosa, possivelmente as doses precisam ser ajustadas. Beatriz Loureiro Considerando a medicação em uso e a idade da paciente, é necessário avaliar o possível efeito colateral nefrotóxico de doses elevadas dos medicamentos. Ela precisa receber tratamento e acompanhamento da doença renal crônica. Beatriz Loureiro
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