Buscar

Resumo - HOBSBAWM, A Queda do Liberalismo

Prévia do material em texto

Universidade Federal de Uberlândia
Instituto de Economia e Relações Internacionais
Graduação em Relações Internacionais
História das Relações Internacionais II
CARVALHO, Beatriz (11711RIT006)
Bibliografia: A Queda Do Liberalismo, Hobsbawm
I
Apesar da universalidade do liberalismo constitucional entre os países independentes da época (a considerar majoritariamente América e Europa, devido ao colonialismo ainda vigente), as décadas do período entre guerras viram uma “retirada acelerada” das instituições políticas liberais, juntamente com os valores de democracia e liberdade civil. Foram poucos os Estados cujas atividades das estruturas democráticas e parlamentares foram ininterruptas. Tanto para a esquerda quanto para a direita, na “Era da Catástrofe”, houve uma alteração na tendência mundial, com movimentos contrários ao liberalismo, os quais aceleraram após a ascensão de Hitler na Alemanha.
A ameaça ao liberalismo - não limitada à esfera política, estendendo-se aos ideais de uma civilização libera - vinha precisamente da direita, já que a ampliação do comunismo não era do interesse da Rússia soviética stalinista. Aliás, os regimes de direita foram rotulados “fascistas”, embora tal determinação não incluísse todos os movimentos antiliberais da época. Entretanto, todos eram autoritários, contrários à revolução social e tendenciosos ao nacionalismo. O primeiro aspecto favorecia a ação militar e de coerção física, enquanto o último inspirava legitimidade e popularidade, todos meios de controlar a subversão.
Governos autoritários (ou conservadores anacrônicos), como da Finlândia, da Polônia, da Sérvia e da Espanha, não possuíam um programa ideológico particular e aliavam-se à Alemanha hitlerista devido à tendência natural de alinhamento pelo regime político no período entreguerras. Por outro lado, havia a Grã-Bretanha, ainda que governada por um conservador e simpatizante das ideias na Itália de Mussolini (Winston Churchill), posicionou-se contrariamente ao fascismo, enxergando uma ameaça nos alemães.
Havia um segundo tipo de direita política, denominada “estatismo orgânico”, o qual resistia ao individualismo liberal e aos movimentos trabalhista e social, por meio de reformulações de seus princípios. Nesses Estados (Portugal de Salazar como um exemplo deles), remetia-se à ideologia medieval pelo reconhecimento de uma hierarquia social, e o governo era composto em grande parte por burocratas e tecnocratas em nome dos interesses econômicos de um grupo.
Em uma primeira instância, a Igreja Católica opunha-se às pretensões totalitárias e, portanto, ao fascismo. Mas a elaboração da doutrina corporativista em países de tradição católica representava uma aproximação de ambos. Católicos e fascistas eram, comumente, avessos ao Iluminismo e às inclinações liberalistas, e muito mais ao “comunismo ateu”. Por fim, embora houvessem esforços de alguns católicos sociais para organização de formas de defesa dos trabalhadores, eles eram minorias políticas marginais.
II
	Embora possa-se dizer que Mussolini, na Itália, tenha inaugurado os movimentos propriamente “fascistas”, foi graças ao nazismo alemão que se generalizaram e se tornaram universalmente conhecidos, atraindo teóricos reacionários em locais de ativo conservadorismo intelectual. Contudo, os diversos tipos de fascismo não compartilhavam uma mesma linha teórica e nem se identificavam por uma forma de organização estatal.
	Da mesma forma, nem todos os movimentos de direita política podiam ser denominados “fascistas”, tendo estes como diferencial a mobilização de massas de baixo para cima. O fascismo utilizava desse artifício em nome de uma única e indivisa Comunidade Popular (“Volksgemeinschaft”); era revolucionário em sua retórica, em sua aspiração a uma transformação da sociedade e na adaptação de símbolos e nomes. Retórica esta especializada em um retorno às tradições passadas, as quais eram complementadas por um princípio de liderança não tradicional centralizado numa figura com apoio das massas e de ideologias fabricadas. Por exemplo, a crença hitlerista na criação de uma super-raça humana capaz de dominar o mundo. 
	Observa-se “a combinação de valores conservadores, técnicas de democracia em massa e a inovadora ideologia de barbarismo irracionalista, centrada em essência no nacionalismo” por parte dos radicais de direita, contrários ao liberalismo, aos movimentos trabalhistas e, até mesmo, às migrações em massa. Tudo isso por um ressentimento em relação à posição e ao status sociais que alguns homens julgavam lhes ser de direito. Nesse sentido, surgiu o anti-semitismo ou ódio aos judeus, símbolo do nazismo, devido à prosperidade capitalista/financeira que lhes concediam privilégios materiais e sociais. 
	As camadas da classe média da sociedade foram o alicerce dos movimentos radicais de direita e do fortalecimento do fascismo, haja vista as dificuldades de aproximação da sociedade rural e da aversão à organização trabalhista. Em grande parte, o apelo fascista à classe média se direcionava aos jovens, sobretudo, universitários. 
	Em suma, os distintos movimentos de direita no período entre guerras, desde conservadores tradicionais, a revolucionários, a extremistas, alinhavam-se no período entre guerras, muito em função da popularidade e do dinamismo fascistas.
III
	Com o fim da Primeira Guerra, houve a ascensão da direita radical em resposta à revolução social e à organização do proletariado. Entretanto, a reação direitista não ocorreu unicamente devido ao movimento revolucionário esquerdista; é preciso atentar-se ao impacto do conflito mundial nos jovens soldados nacionalistas, como Hitler, amargurados com seu desfecho; bem como a quaisquer movimentos contrários à ordem social existente, não somente o bolchevismo. E, muito embora, mesmo antes de 1914, essas tendências radicais da direita já existissem, foi o colapso dos velhos regimes, suas classes dominantes e seu poder, influência e hegemonia que abriram espaço ao fascismo.
	Nos Estados onde a direita conservadora tradicional se manteve no controle, como França e Grã-Bretanha, não houve progresso efetivo do fascismo. Nem havia a sua necessidade, nos países recém-independentes, sob controle de grupos nacionalistas, como a Polônia. Dessa forma, o cenário ideal à consolidação do fascismo e sua instituição governamental autocrática constituía-se da desintegração do Estado velho, do descontentamento popular, da ameaça socialista e do ressentimento nacional frente às determinações dos tratados de paz. E, por isso, tanto na Itália quanto na Alemanha, a conquista do poder pelos fascistas se deu de forma consensual e constitucional. Entretanto, uma vez no controle, não haviam limites internos à ditadura de um líder supremo populista (Duce ou Fuhrer).
	É necessário desfazer-se das premissas que apontam uma “revolução fascista” ou o fascismo como expressão do “capitalismo monopolista”. Isto é, apesar de apresentarem elementos revolucionários que buscavam transformações sociais, o nazismo, por sua vez, eliminou rapidamente o componente “socialista” do Partido Nacional Socialista Alemão. Não se pretendia um retorno à sociedade feudal, mas houve, fundamentalmente, empenhos modernizadores e técnico-inovadores. Nesse sentido, o programa social nazista atentou-se às massas, através do lazer, dos esportes, do “carro do povo” (o fusca). Contudo, a maior realização do regime foi o fim da Grande Depressão, haja vista a descrença no comprometedor livre mercado.
	Enquanto na Alemanha, o fascismo se colocou como uma reação à depressão e incapacidade de lidar com ela por parte da república de Weimar, as conquistas do regime italiano foram menos marcantes, sendo caracterizada como uma retórica baseada nos interesses das velhas classes dominantes contrária aos movimentos revolucionários do pós-guerra. Além de dar continuidade e consolidação ao processo de unificação da Itália, o governo de Mussolini teve seu significado histórico enquanto pioneiro global da versão triunfante contra revolucionária, servindo de inspiração a Hitler.Eficiente na dinamização e modernização industriais, o fascismo não teve ligação direta ao capitalismo monopolista, haja vista a relação deste com diversos outros regimes, por exemplo, o norte-americano. Contudo, foi o próprio regime que favoreceu o grande capital, por meio da erradicação da revolução esquerdista, do movimento trabalhista e suas limitações aos direitos dos empresários, favorecendo também a situação alemã frente à Depressão.
		
IV
	O refluxo da onda revolucionária esquerdista e a recuperação econômica levaram ao fracasso muitos outros movimentos europeus contrários de direita radical que não o fascismo. A Grande Depressão teve papel fundamental, sobretudo na ascensão de Hitler como fenômeno da periferia política e, enfim, do país, após quase uma década atrás em eleitorado. E, foi, necessariamente o regime alemão que, por desempenhar importante papel político na Europa, atribuiu força e influência ao fascismo. Logo, fez-se como corrente dominante na política global (sob a figura da Itália, da Alemanha e, reforçada pelo Japão), a qual outros Estados e grupos (majoritariamente europeus) eram atraídos e, muitas vezes, apoiados.
	Embora houvessem países fora do continente europeu que simpáticos às ideias fascistas e de Hitler, como por exemplo os árabes resistentes à dominação judaica na Palestina e a convicção japonesa de sua superioridade racial, foram poucas as condições para o estabelecimento de movimentos fascistas em comparação à Europa. O Japão, especificamente, apesar de aliado à Itália e Alemanha na Segunda Guerra Mundial e com ideias semelhantes ao nacional-socialismo alemão, não pode ser considerado adepto ao fascismo. 
	No continente americano, a influência fascista foi demasiada distinta. A começar pela América do Norte, onde a corrente teve entrada por meio de imigrantes, mas ainda assim, não teve muita força. Dentre os movimentos excludentes e racistas, o mais conhecido foi, sem dúvida, a Ku Klux Klan; e o anti-semitismo podia ser notado apenas como uma inspiração católica. Já na América Latina, o principal efeito fascista aconteceu internamente em países como Colômbia e Brasil com, por exemplo, treinamentos militares no sistema alemão ou até mesmo em quadros nazistas. Porém, o destaque da influência do fascismo na política latino-americana foi a divinização de líderes populistas, os quais mobilizavam massas que não tinham nada a perder contra a elite dominante local.
	
V
	A identificação de fascismo com nacionalismo é errônea, pois este não se apresentava puramente em países conquistados pela Alemanha ou pela Itália, apesar de representarem a parcela racial majoritária. Além disso, houveram expressões nacionalistas de cunho esquerdista, ou seja, de mobilização contra o fascismo.
	A partir dessa distinção, pode-se seguir na explicação da queda do liberalismo no período entre guerras. Haja vista a problemática econômica e a ascensão da classe operária revolucionária, a corrente fascista servia à burguesia em busca de força e coerção. O declínio democrático, então, é entendido por seu mal funcionamento em conciliar a maioria dos cidadãos sobre a legitimidade do Estado e do sistema social. Por exemplo, a falha da República de Weimar está expressa impossibilidade de manutenção do acordo entre Estado, patrões e trabalhadores organizados durante os anos da Depressão. Entretanto, no pós Segunda Guerra Mundial, especialmente na nova República Federal da Alemanha, os milagres econômicos foram alicerçados ao regime democrático.
	No entanto, não se limita ao fascismo a reação à Grande Depressão. Em muitos países, como na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos, reformas no governo foram suficientes. Apenas em alguns lugares na América Latina, onde dependiam fortemente de exportações de produtos primários, que a crise econômica acarretou diretamente na derrubada de governos existentes, por meio de golpes militares. 
	Em suma, a vulnerabilidade do liberalismo se deve à forma de governo em democracia representativa, a qual necessitava de condições raramente presentes na Era da Catástrofe, ou no período entre as guerras mundiais. Essas condições eram: o consentimento e a legitimidade gerais, dificilmente encontradas em tempos de crise ou em Estados recém-criados; certo grau de compatibilidade entre os vários componentes do povo para determinação de um governo comum, inviabilizada pelas divisões étnico-nacionais ou religiosas decorrentes de revoluções e tensões sociais; pouca atividade governamental por parte dos governos democráticos, completamente contrários às aspirações de tipo de Estado do século XX; e riqueza e prosperidade, pouco notáveis em ambientes de tensão, conflitos nacionais e ou crises econômicas.
	A verdade é que dificilmente acreditava-se no renascimento da democracia e do liberalismo nos anos seguintes à Segunda Guerra Mundial, pois anteriormente apenas formalizara divisões sociais. Porém, no contexto político da obra em questão, era possível vislumbrar tendências globais similares ao período entre guerras, de contestação às vantagens do sistema vigente.

Continue navegando