Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
RELAÇÕES OBRIGACIONAIS CONTRATUAIS E EXTRACONTRATUAIS Programa de Pós-Graduação EAD UNIASSELVI-PÓS Autoria: Amanda Muniz Oliveira CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Ilana Gunilda Gerber Cavichioli Cristiane Lisandra Danna Norberto Siegel Camila Roczanski Julia dos Santos Ariana Monique Dalri Bárbara Pricila Franz Marcelo Bucci Revisão de Conteúdo: Priscilla Camargo Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Copyright © UNIASSELVI 2018 Ficha catalográfi ca elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. OL48r Oliveira, Amanda Muniz Relações obrigacionais contratuais e extracontratuais. / Amanda Muniz Oliveira – Indaial: UNIASSELVI, 2018. 146 p.; il. ISBN 978-85-53158-20-1 1.Obrigações – Brasil. II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. CDD 342.81085 Amanda Muniz Oliveira Doutoranda em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC e Mestra em Direito pela mesma Universidade. Natural de Montes Claros – MG, obteve o bacharelado em Direito no ano de 2013, pelas Faculdades Santo Agostinho (FADISA) - MG. É pesquisadora do “Núcleo de Estudos Conhecer Direito – NECODI” (UFSC) e do Grupo de Pesquisa “Modelagem e Compreensão de Sistemas Sociais: Direito, Estado, Sociedade e Política” (UFSC), no qual participa do Projeto de Pesquisa “Lilith: Direito das Mulheres”. Dedica- se a pesquisas interdisciplinares na área de Direito e Arte, com ênfase em Rock, Literatura e Cultura Pop. Também se dedica aos estudos de epistemologia jurídica, sociologia do conhecimento, métodos e teorias das ciências humanas, direitos das mulheres e direito e gênero. Possui experiência nas áreas de Direito Civil, Hermenêutica Jurídica, Ética Profi ssional e Metodologia da Pesquisa. Sumário APRESENTAÇÃO ....................................................................07 CAPÍTULO 1 Teoria das Obrigações Contratuais ..................................09 CAPÍTULO 2 Modalidades Contratuais ....................................................43 CAPÍTULO 3 Teoria das Obrigações Extracontratuais: Obrigações por Declaração Unilateral de Vontade ........................................................115 APRESENTAÇÃO A presente obra dedica-se a um dos mais importantes temas do direito civil: as relações obrigacionais contratuais e extracontratuais no mundo contemporâneo. Tradicionalmente concebidas em contextos individualistas, nos quais o sujeito de direito é um indivíduo metafísico e a igualdade meramente formal impera, tais relações adquiriram novas nuances e, portanto, precisam ser analisadas a partir de um outro viés. Neste sentido, o civilista em geral e o contratualista, em especial, se veem diante de um desafio integrador e interdisciplinar: perceber as normas deste ramo do direito como parte de um ordenamento constitucional, sem dúvidas, mas mais que isso, como importante componente das próprias relações sociais hoje existentes. Diariamente celebramos contratos, ainda que de forma inconsciente. Os pães comprados na padaria para o café da manhã são objetos de contrato compra e venda, o combo de internet, celular e TV à cabo são fornecidos mediante contrato de prestação de serviços e mesmo a carona a algum amigo ou colega de trabalho pode configurar contrato de transporte. Neste sentido, é crucial tomar ciência das implicações jurídicas destes atos cotidianos, seja para exigir direitos, seja para cumprir corretamente as obrigações. Iniciamos o tema a partir da teoria geral das obrigações contratuais, adotando como objetos de estudo o conceito e finalidade do direito contratual, identificando suas funções e características. Neste primeiro capítulo, estudamos ainda os requisitos de validade do contrato, os princípios específicos do direito contratual, a formação de contratos e seus efeitos e formas de extinção. O segundo capítulo tem como tema central as diversas espécies de contrato elencadas no Código Civil e em outras legislações esparsas. Aqui, estudamos as características e particularidades concernentes a cada tipo contratual, a aplicação da lei e dos princípios contratuais às espécies de pacto, e procuramos, ainda, fornecer subsídios para que o leitor possa, por si só, analisar os ônus e bônus de cada contrato, visando o melhor interesse das partes. O terceiro e último capítulo aborda outros tipos de obrigação, originadas não pela vontade individual (como no caso dos contratos), mas por força de dispositivos legais. São as declarações unilaterais de vontade, taxativamente expressas em lei, gerando consequências jurídicas que escapam ao poder decisório do sujeito. Apresentamos, neste capítulo, as principais espécies de obrigações extracontratuais unilaterais, procurando evidenciar suas diferenças e particularidades em relação aos contratos já estudados. Esta obra pretende, assim, facilitar o estudo das obrigações contratuais e extracontratuais, temas de grande relevância no direito civil e no mundo contemporâneo, a partir de um viés simples, objetivo e direto. O leitor encontrará atividades de estudo, dicas de leituras complementares e algumas notícias atuais relacionadas aos assuntos estudados, tudo isso visando uma interação didática e acessível. Amanda Muniz Oliveira. CAPÍTULO 1 Teoria das Obrigações Contratuais A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: Compreender a concepção do direito contratual e sua fi nalidade, identifi cando suas funções e características. Os requisitos de validade do contrato, seus princípios fundamentais e sua formação. Os efeitos oriundos da relação contratual e as formas de extinção de um contrato. Contratos válidos e seguros às partes interessadas. 10 Relações Obrigacionais Contratuais e Extracontratuais 11 TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS Capítulo 1 ContextualiZação Neste capítulo, passaremos ao estudo de um elemento central do Direito Civil: o contrato. Compreendido como um acordo de vontades que irá criar normas vinculantes entre seus celebrantes, a fi gura do contrato é tão antiga que suas origens históricas são imprecisas. É possível encontrar sua presença em textos cuneiformes mesopotâmicos e em documentos históricos do Egito antigo; no medievo (século XV) circulou-se a lenda do Dr. Johann Georg Faust, que teria celebrado um contrato com o próprio diabo, incutindo no imaginário social a ideia de que os contratos são armadilhas sem escapatória. No mundo contemporâneo, grande parte das relações jurídicas é estabelecida por meio de contratos. Da simples compra para o café da tarde na padaria mais próxima, à venda de um imóvel registrada em cartório, estamos em constante interação com essa fi gura jurídica, ainda que não nos demos conta disso. Desta forma, é de suma importância que o jurista compreenda a fundo a teoria das obrigações contratuais, no intuito de aprimorar sua prática jurídica e de prestar um melhor auxílio a seus eventuais clientes contratantes. Ter ciência de seus requisitos de validade, seus princípios norteadores, suas hipóteses de celebração e extinção, bem como seus efeitos, pode ser a diferença entre a fi rmação de um negócio lucrativo e um que nada ofereça além de desastrosos prejuízos. Este, portanto, será nosso foco de estudo no presente capítulo. Conceitos e ReQuisitos de Validade do Contrato Juristas de diversas épocas têm se dedicado a conceituar o termo contrato. Conforme Farias e Rosenvald (2012), é possível encontrar múltiplos signifi cados do vocábulo nahistória de Roma; o que mais se aproxima da ideia moderna de contrato refere-se a um acordo de vontades a respeito de um assunto. Todavia, para gerar obrigações, esse contrato deveria possuir existência física, material, ou seja, um mero acordo verbal mostrava-se insufi ciente. Talvez por isso ainda hoje diversas pessoas ignorem a existência do contrato verbal, não se dando conta de que a simples compra de uma fruta na quitanda mais próxima constitui um contrato de compra e venda. 12 Relações Obrigacionais Contratuais e Extracontratuais No século XIX, Farias e Rosenvald (2012) apontam os paradigmas do liberalismo e individualismo como as bases das relações contratuais, o que na prática signifi cava uma liberdade absoluta de contratar. Na segunda metade do século XIX e início do século XX, os abusos oriundos deste tipo de concepção serão denunciados e, portando, uma nova forma de se conceber os contratos irá emergir. Limites legais serão impostos, visando resguardar uma certa igualdade entre as partes, protegendo o indivíduo hipossufi ciente. Neste sentido, atualmente podemos adotar o conceito cunhado por Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2014, s.p.): “o contrato é um negócio jurídico por meio do qual as partes declarantes, limitadas pelos princípios da função social e da boa-fé objetiva, autodisciplinam os efeitos patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia das suas próprias vontades”. Compreendido o conceito jurídico de contrato, vejamos agora seus requisitos de validade. A natureza jurídica do contrato é de negócio jurídico, ou seja, um negócio constituído a partir da manifestação da vontade das partes visando alcançar efeitos específi cos. Por essa razão, os contratos devem obedecer aos requisitos gerais de validade do negócio jurídico. Apesar de ser um tema exaustivamente trabalhado na Parte Geral do Direito Civil, entendemos que é preciso relembrar, ainda que de forma genérica e abrangente, os requisitos de validade do gênero negócios jurídicos, cujo contrato é espécie. Para ser válido e, portanto, gerar os efeitos pretendidos, o negócio jurídico precisa ser analisado a partir de três planos principais: O contrato é um negócio jurídico por meio do qual as partes declarantes, limitadas pelos princípios da função social e da boa- fé objetiva, autodisciplinam os efeitos patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia das suas próprias vontades. O contrato é um negócio jurídico por meio do qual as partes declarantes, limitadas pelos princípios da função social e da boa-fé objetiva, autodisciplinam os efeitos patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia das suas próprias vontades 13 TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS Capítulo 1 • Plano da Existência. • Plano da Validade. • Plano da Efi cácia. Vejamos cada um deles. a) O plano da existência O plano da existência refere-se aos elementos imprescindíveis para a própria existência do contrato; ausente qualquer um deles, o contrato sequer existe juridicamente. Tais elementos são: sujeitos, as partes que celebrarão o contrato; vontade, ou seja, o desejo destes sujeitos contratantes; forma, o meio pelo qual o contrato será materializado (de forma verbal, escrita, eletrônica, etc.); e objeto, o bem ou a obrigação abordada no contrato. b) O plano da validade O plano da validade irá impor alguns limites ao plano da existência: não é qualquer sujeito que pode contratar, assim como não é qualquer vontade manifesta que dará validade ao contrato. Veja: caso algum dos elementos do plano da validade esteja ausente, o contrato até poderá existir juridicamente, mas não produzirá efeitos, porque possui algum tipo de invalidade. Os elementos de validade são: sujeito dotado de capacidade jurídica; vontade livre e sem qualquer vício de consentimento; forma livre ou não proibida por lei; objeto lícito, possível, determinado ou ao menos determinável. Em outras palavras, segundo os requisitos do plano da validade, o indivíduo deve ser capaz (ver artigos 3º, 4º e 5º do Código Civil) e sua vontade não pode, de forma alguma, ser dissimulada (ver artigos 138 ao 165 do Código Civil). A exteriorização do contrato deve obedecer aos limites legais. Em regra, nosso ordenamento adota a forma livre, permitindo que os indivíduos adotem as formas que melhor lhe convirem (ver artigo 107 do Código Civil); em algumas situações, entretanto, a lei estabelece a forma obrigatória a ser seguida, de maneira que se um contrato for celebrado de forma diferente da estipulada, será inválido. Por fi m, o objeto deve ser lícito e possível e, se não determinado ao tempo do contrato, deve ser determinável, pelo menos, até a data escolhida para o cumprimento do acordo. É o caso de contratos de colheita; pode-se acordar que no mês de julho serão vendidas 15 sacas de café, mas a espécie de café só será determinada nesse mês, pois depende da safra. O plano da existência refere- se aos elementos imprescindíveis para a própria existência do contrato; ausente qualquer um deles, o contrato sequer existe juridicamente. Caso algum dos elementos do plano da validade esteja ausente, o contrato até poderá existir juridicamente, mas não produzirá efeitos, porque possui algum tipo de invalidade. 14 Relações Obrigacionais Contratuais e Extracontratuais c) O plano da efi cácia O último plano refere-se à efi cácia, ou seja, ao momento a partir do qual o contrato estipulado produzirá seus efeitos. Em geral, os contratos produzem efeitos imediatos, podendo as partes, entretanto, optarem pela produção de efeitos futuros a partir do termo, condição ou encargo. O termo é um evento futuro e certo, por exemplo, uma data do ano; a condição é um evento futuro e incerto, como um casamento; o encargo é um ônus a ser cumprido para que os efeitos sejam produzidos; como exemplo, doarei uma casa à minha irmã se ela se comprometer a cuidar dos gatos que nela habitam. Tendo em vista os planos abordados, podemos construir o seguinte quadro geral: Em geral, os contratos produzem efeitos imediatos, podendo as partes, entretanto, optarem pela produção de efeitos futuros a partir do termo, condição ou encargo. Elementos de existência do negócio jurídico: um sujeito, que manifesta vontade, de alguma forma, sobre um objeto. Este sujeito deve ser capaz; a vontade deve ser livre e sem defeitos, a forma livre ou não proibida por lei e o objeto precisa ser lícito, possível, determinado ou determinável. OBS: O plano da validade depende do plano da existência; se um dos elementos de existência não está presente no contrato, ele não existe juridicamente, motivo pelo qual não há que se falar em invalidade, mas em inexistência. Pontes de Miranda (1900) coloca os três planos distintos numa escada, como se fossem três degraus, quando se sobe um deles, signifi ca que o degrau debaixo foi cumprido, ou seja, as regras foram cumpridas. Assim, quando os elementos do plano de existência não são observados, o contrato será inexistente; quando os pressupostos do plano de validade não forem observados, o contrato será inválido; e, fi nalmente, quando os fatores de efi cácia não forem observados, o contrato será inefi caz. Para facilitar o estudo dos requisitos gerais de validade, sugerimos ao aluno lembrar-se dos elementos de existência do negócio jurídico: um sujeito, que manifesta vontade, de alguma forma, sobre um objeto. Quadro 1 - Planos do Negócio Jurídico Plano de Existência Plano de Validade Plano da Efi cácia Sujeito Capaz Efi cácia imediata Vontade Livre, sem vícios de consentimento Termo Forma Livre, não proibida por lei Condição Objeto Lícito, possível, determinável ou determi- nado Encargo Fonte: A autora. 15 TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS Capítulo 1 Este sujeito deve ser capaz; a vontade deve ser livre e sem defeitos, a formalivre ou não proibida por lei e o objeto precisa ser lícito, possível, determinado ou determinável. Atividades de Estudos: 1) Levando em consideração que os contratos estão diretamente relacionados à autonomia da vontade, como podemos conceituá-los? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 2) Quais são os requisitos de validade do contrato? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ PrincÍpios Fundamentais do Direito Contratual Conforme o jusfi lósofo Guerra Filho (2002, p. 92), os princípios [...] encontram-se em um nível superior de abstração, sendo igual e hierarquicamente superiores, dentro da compreensão do ordenamento jurídico como uma ‘pirâmide normativa’ (Stufenbau), e se eles não permitem uma subsunção direta de fatos, isso se dá indiretamente, colocando regras sob o seu ‘raio de abrangência’. Desta forma, é correto afi rmar que cada ramo do direito deve ser aplicado e interpretado de acordo com parâmetros basilares, os princípios, que lhes darão certo direcionamento para a prática jurídica. 16 Relações Obrigacionais Contratuais e Extracontratuais O direito contratual também possui seus princípios específi cos, que deverão reger todo o negócio, de sua celebração (e até antes dela) à sua extinção. São eles: 1) Autonomia da vontade; 2) Supremacia da ordem pública; 3) Consensualismo; 4) Relatividade dos efeitos; 5) Obrigatoriedade; 6) Revisão ou onerosidade excessiva; 7) Boa-fé; 8) Função social dos contratos. Como bem destacam Gagliano e Pamplona Filho (2014), não se pode esquecer, porém, que o direito dos contratos deve sempre ser observado sob a luz do princípio basilar de nosso atual paradigma constitucional, ou seja, o princípio da dignidade da pessoa humana. Desta forma, caso o contrato não seja cumprido, “o credor não pode pretender lançar mão de mecanismos atentatórios à dignidade da pessoa humana, senão quando a própria Constituição expressamente admitir o sacrifício de um valor individual tendo em vista fi ns superiores” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2014, s.p.). Feita essa ressalva, passemos ao estudo dos princípios do direito contratual. a) Princípio da autonomia da vontade De acordo com este princípio, os indivíduos são livres para contratarem se quiserem, com quem quiserem e sobre o que quiserem. Assim, o princípio da autonomia da vontade é o poder dos indivíduos constituírem regras próprias, válidas entre si, em observância aos limites estabelecidos pelo ordenamento jurídico. A liberdade contratual encontra amparo nos artigos 421 e 425 do Código Civil, que concedem essa prerrogativa máxima aos particulares. Entretanto, como é de se supor, a liberdade contratual não é ilimitada; ela deverá ser exercida dentro dos parâmetros legais e de forma a não ofender os demais princípios elencados. Além disso, em nossa sociedade atual, a autonomia da vontade encontra, cada vez mais, limitações, como bem recorda Carlos Roberto Gonçalves (2014, p. 34): [...] a faculdade de contratar e de não contratar (de contratar se quiser) mostra-se, atualmente, relativa, pois a vida em sociedade obriga as pessoas a realizar, frequentemente, contratos de toda espécie, como o de transporte, de compra de alimentos, de aquisição de jornais, de fornecimento de bens e serviços públicos (energia elétrica, água, telefone etc.). [...] Também a liberdade de escolha do outro contraente (de contratar com quem quiser) sofre, hoje, restrições, como nos casos de O direito contratual também possui seus princípios específi cos, que deverão reger todo o negócio, de sua celebração (e até antes dela) à sua extinção. São eles: 1) Autonomia da vontade; 2) Supremacia da ordem pública; 3) Consensualismo; 4) Relatividade dos efeitos; 5) Obrigatoriedade; 6) Revisão ou onerosidade excessiva; 7) Boa- fé; 8) Função social dos contratos. O princípio da autonomia da vontade é o poder dos indivíduos constituírem regras próprias, válidas entre si, em observância aos limites estabelecidos pelo ordenamento jurídico. 17 TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS Capítulo 1 serviços públicos concedidos sob regime de monopólio e nos contratos submetidos ao Código do Consumidor. E, em terceiro lugar, o poder de estabelecer o conteúdo do contrato (de contratar sobre o que quiser) sofre também, hodiernamente, limitações determinadas pelas cláusulas gerais, especialmente as que tratam da função social do contrato e da boa-fé objetiva, do Código de Defesa do Consumidor e, principalmente, pelas exigências e supremacia da ordem pública. Esta última limitação mencionada pelo autor, a supremacia da ordem pública, é justamente o segundo princípio a ser analisado. b) Princípio da supremacia da ordem pública O conceito de ordem pública é abstrato e difícil de ser delineado. Levando em consideração que uma ampla e irrestrita liberdade de contratar poderia gerar cenários injustos e esdrúxulos, tal princípio assegura a não exploração de uma das partes contratantes. Para Gagliano e Pamplona Filho (2014), a ordem pública nada mais é que um conjunto de princípios jurídicos, políticos e econômicos a serem observados pelo direito contratual. Neste sentido, segundo Sílvio Rodrigues (2002, p. 16), a “ideia de ordem pública é constituída por aquele conjunto de interesses jurídicos e morais que incumbe à sociedade preservar. Por conseguinte, os princípios de ordem pública não podem ser alterados por convenção entre os particulares”. Em síntese, a ordem pública constitui um limite principiológico aos possíveis abusos que possam ser originados a partir da constituição de um contrato. c) Princípio do Consensualismo O consensualismo refere-se ao necessário acordo de vontades para efetuação de um contrato. Neste sentido, pode-se entender que o negócio se efetua a partir do consenso entre os contratantes e não da entrega do bem em si. Imagine, por exemplo, que você se dirige a uma banca de jornal em busca de uma revista. Desde que você esteja de acordo com o preço ofertado pelo jornaleiro e este esteja de acordo em lhe vender a revista escolhida, o contrato de compra e venda já se estabeleceu, em observância ao princípio do consensualismo, pois existe um acordo de vontades. A ordem pública constitui um limite principiológico aos possíveis abusos que possam ser originados a partir da constituição de um contrato. O consensualismo refere-se ao necessário acordo de vontades para efetuação de um contrato. Neste sentido, pode- se entender que o negócio se efetua a partir do consenso entre os contratantes e não da entrega do bem em si. 18 Relações Obrigacionais Contratuais e Extracontratuais Caso você saia da banca com a revista sem efetuar o pagamento, ou caso o jornaleiro se recuse a entregar o objeto comprado, estaremos diante da fase de execução contratual, uma vez que o negócio já foi fechado, mas não devidamente cumprido. d) Princípio da relatividade dos efeitos do contrato Suponha que você realize uma compra grandiosa na Polishop mais próxima, mas se torne inadimplente. A loja, cansada de lhe procurar para cobrar o que é devido, decide procurar o seu melhor amigo para que ele pague todos os cinco conjuntos de panelas antiaderentes que você adquiriu. Essa situação é juridicamente possível? Por certo que não. E a resposta negativa decorre, especialmente, do princípio da relatividade dos efeitosdo contrato, segundo o qual os negócios fi rmados só terão validade entre as partes contratantes. Não é possível que a relação alcance terceiro e seu patrimônio, que nada tem a ver com o convencionado. Certamente, este princípio possui algumas exceções, como o da estipulação em favor de terceiro e o contrato com pessoa a declarar, brevemente explanados por Gagliano e Pamplona Filho (2014, s.p.): Por meio da primeira previsão, [estipulação em favor de terceiro] uma parte convenciona com o devedor que este deverá realizar determinada prestação em benefício de outrem, alheio à relação jurídica obrigacional original. Na mesma linha, o contrato com pessoa a declarar é uma fi gura contratual consagrada expressamente pelo novo Código Civil, consistindo, em verdade, em uma promessa de prestação de fato de terceiro, que também titularizará os direitos e obrigações decorrentes do negócio, caso aceite a indicação realizada. Este princípio também é limitado nos casos em que há violação da ordem pública; caso uma empresa ofereça contrato com cláusula abusiva ao consumidor, a cláusula será considerada nula para toda a coletividade e não apenas para o consumidor efetivo de determinado produto. e) Princípio da obrigatoriedade dos contratos Pode parecer simplista à primeira leitura, mas, segundo tal princípio, os contratos existem para serem cumpridos. Em outras palavras, caso não haja nenhum tipo de invalidade, nenhuma afronta a algum dos princípios gerais do direito ou aos princípios próprios do direito contratual, o pacto deverá ser cumprido exatamente nos termos em que foi convencionado. Princípio da relatividade dos efeitos do contrato, segundo o qual os negócios fi rmados só terão validade entre as partes contratantes. Não é possível que a relação alcance terceiro e seu patrimônio, que nada tem a ver com o convencionado. Caso não haja nenhum tipo de invalidade, nenhuma afronta a algum dos princípios gerais do direito ou aos princípios próprios do direito contratual, o pacto deverá ser cumprido exatamente nos termos em que foi convencionado. 19 TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS Capítulo 1 Este princípio origina-se da necessidade de segurança jurídica nas relações contratuais e da ideia de que o contrato faz lei entre as partes (que irá originar o brocado pacta sunt servanda), não podendo ser alterado nem mesmo pelo poder público, caso válido e não abusivo. Algumas exceções a este princípio são: um novo acordo entre as partes, no qual todos decidem alterar ou mesmo abolir contrato já pactuado, caso fortuito ou força maior. f) Princípio da revisão dos contratos ou da onerosidade excessiva Ancorado na teoria da imprevisão, também conhecida como rebus sic stantibus, este princípio visa a proteger as partes caso ocorra alguma situação inusitada, imprevisível, que torne o contrato demasiadamente oneroso. Conforme Gonçalves (2014, p. 98): “É por essa razão que os tribunais não aceitam a infl ação e alterações na economia como causa para a revisão dos contratos. Tais fenômenos são considerados previsíveis entre nós”. Os artigos 478, 479 e 480 do Código Civil positivaram o referido princípio, estabelecendo que, caso um acontecimento extraordinário e imprevisível torne as prestações onerosas, as partes podem recorrer ao Judiciário ou para fi ndar o contrato ou para modifi cá-lo, afastando o excesso da forma que for possível. g) Princípio da boa-fé O artigo 422 do Código Civil assim preceitua: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”. Neste sentido, compreende-se como princípio da boa-fé a norma segundo a qual as partes devem se comportar de maneira ética e leal durante todo o processo de formação do contrato. Pode ser dividida em duas espécies: • Boa-fé subjetiva: referente às regras de comportamento e eticidade nas relações sociais, abrange das negociações iniciais ao fi m do contrato. • Boa-fé objetiva: desempenha uma função interpretativa, criadora de deveres jurídicos anexos ou de proteção que irão limitar, por exemplo, a existência de cláusulas abusivas. Uma colocação exemplar diz respeito a uma cláusula contratual cujo conteúdo impedisse a aplicação da teoria da imprevisão, tem- se, neste sentido, um dispositivo contratual que atenta contra a boa-fé objetiva, já que viola princípio juridicamente positivado. Este princípio visa a proteger as partes caso ocorra alguma situação inusitada, imprevisível, que torne o contrato demasiadamente oneroso. Compreende-se como princípio da boa-fé a norma segundo a qual as partes devem se comportar de maneira ética e leal durante todo o processo de formação do contrato. 20 Relações Obrigacionais Contratuais e Extracontratuais h) Princípio da função social dos contratos O artigo 421 do Código Civil assim dispõe: “A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.”. Porém, conforme Gagliano e Pamplona Filho (2014), o princípio da função social dos contratos abrange um conceito aberto e indeterminado, de forma que é preciso explorar suas nuances para então compreendê-lo. Conforme Paulo Nalin (2002), o aludido princípio precisa ser analisado a partir de duas perspectivas: • Intrínseca: ou seja, entre as partes contratantes. Nesta perspectiva, os indivíduos devem atuar conforme o princípio da boa-fé, respeitando os limites éticos e a lealdade negocial. • Extrínseca: ou seja, entre a relação contratual fi rmada e a coletividade. O contrato deve ser observado também a partir do impacto que causará na sociedade onde for fi rmado. Desta forma, depreende-se que a função social do contrato diz respeito à relação existente entre o contrato e a coletividade, como um todo, apesar de gerar efeitos diretos apenas para as partes contratantes, em algumas situações o contrato poderá causar impactos no social, positivos ou negativos. Conforme Gagliano e Pamplona Filho (2014, s.p.): [...] o contrato é considerado não só como um instrumento de circulação de riquezas, mas, também, de desenvolvimento social. Isso mesmo: desenvolvimento social. Sem o contrato, a economia e a sociedade se estagnariam por completo, fazendo com que retornássemos a estágios menos evoluídos da civilização humana. Ocorre que todo desenvolvimento deve ser sustentado, racionalizado e equilibrado. Por isso, ao concebermos a fi gura do contrato – quer seja o fi rmado entre particulares, quer seja o pactuado com a própria Administração Pública – não poderíamos deslocá-lo da conjuntura social que lhe dá ambiência. Consoante inferimos linhas acima, como chancelar como válido, por exemplo, um negócio que, posto atenda aos seus pressupostos formais de validade, desrespeite leis ambientais ou pretenda fraudar leis trabalhistas? Na mesma linha, não se pode admitir contratos que violem a livre concorrência, as leis de mercado ou os postulados de defesa do consumidor, sob o pretexto de se estar incentivando a livre-iniciativa. Desta forma, segundo o princípio da função social dos contratos, os negócios fi rmados entre as partes não podem ser celebrados no intuito de gerar impactos socialmente negativos, como o desrespeito às leis ambientais e/ou trabalhistas. Segundo o princípio da função social dos contratos, os negócios fi rmados entre as partes não podem ser celebrados no intuito de gerar impactos socialmente negativos, como o desrespeito às leis ambientais e/ou trabalhistas. 21 TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS Capítulo 1 Passamos, agora, ao estudo da formação dos contratos. Formação dos Contratos Visto que a autonomia da vontade é um elemento crucial para celebração de contratos, passaremos agora ao estudo da formação dos contratos. Isto porque não basta que um indivíduo exteriorize sua vontade de contratar, é necessário que a outra parteesteja de acordo com a proposta oferecida. Neste sentido, é possível falar em três etapas gerais para formação contratual: 1) Negociações preliminares; 2) Proposta; e 3) Aceitação. Vejamos cada uma delas. a) Negociações preliminares Também conhecida como fase de puntuação, esta refere-se ao período inicial de acordo, discussões e minutas a respeito do contrato. É neste momento que refl exões, pesquisas de preço, cálculos e exposição de interesses antagônicos devem ser realizados, pois ainda estamos falando de um contrato a ser efetuado futuramente. É exatamente por isso que não há que se falar em obrigações fi rmadas nesta etapa – as partes ainda estão discutindo os termos do contrato. Imaginemos que irei efetuar a compra de um carro. Em um primeiro momento, é necessário verifi car o estado de conservação do automóvel, checar sua regularização junto ao Detran, negociar com o vendedor as condições de pagamento e possível desconto etc. Se a qualquer momento eu me desinteressar pelo veículo, não há qualquer consequência jurídica, pois ainda estávamos na fase de negociações preliminares. Entretanto, é preciso lembrar que neste momento o princípio da boa-fé deve ser observado, sob pena de gerar indenização por perdas e danos àquele que agir de má-fé nesta etapa. Conforme Gonçalves (2014, p. 56): Embora as negociações preliminares não gerem, por si mesmas, obrigações para qualquer dos participantes, elas fazem surgir, entretanto, deveres jurídicos para os contraentes, decorrentes da incidência do princípio da boa-fé, sendo os principais os deveres de lealdade e correção, de informação, de proteção e cuidado e de sigilo. A violação desses deveres durante o transcurso das negociações é que gera a responsabilidade do contraente, tenha sido ou não celebrado o contrato. Essa responsabilidade ocorre, pois, não no campo da culpa contratual, mas da aquiliana, somente no caso de um deles induzir no outro a crença de que o contrato será celebrado, levando-o a despesas ou a não contratar com terceiro etc. e depois recuar, causando-lhe dano. É possível falar em três etapas gerais para formação contratual: 1) Negociações preliminares; 2) Proposta; e 3) Aceitação. 22 Relações Obrigacionais Contratuais e Extracontratuais Observe, neste sentido, a seguinte ementa sobre o dever de indenizar em caso de negociações preliminares: Passadas as negociações preliminares, teremos, em seguida, a proposta. b) Proposta de contratar Positivada nos artigos 427 e nos seguintes do Código Civil, a proposta consiste em uma oferta de contratar que uma parte faz a outra, de forma séria, concreta e com real intenção de fi rmar contrato. Poderá ser feita de maneira escrita ou verbal, desde que transmita a real intenção do proponente. Nesta etapa, já se tem o início de um vínculo obrigacional, pois aquele que faz a proposta não pode voltar atrás em sua palavra. Esta vinculação comporta, porém, algumas exceções legais, a saber: • Se a não obrigatoriedade é prevista na proposta, ou seja, quando o proponente expressamente declarar que reserva seu direito de arrependimento. EMENTA 04: REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. RESPONSABILIDADE PRÉ-CONTRATUAL. PRINCÍPIO DA BOA- FÉ OBJETIVA DOS CONTRATOS Negociações preliminares a induzir os autores a deslocarem-se até o Rio de Janeiro para a aquisição de veículo “seminovo” da ré, na companhia de seu fi lho ainda bebê, gerando despesas. Deslealdade nas informações prestadas, pois oferecido como “uma joia de carro”, “impecável”, gerando falsas expectativas, pois na verdade o veículo apresentava pintura mal feita, a revelar envolvimento em acidente de trânsito. Omissão no fornecimento do histórico do veículo que poderia confi rmar as suspeitas de tratar-se de veículo batido. Danos materiais, relativos às passagens aéreas e estadia e danos morais decorrentes do sentimento de desamparo, frustração e revolta diante da proposta enganosa formulada. Sentença confi rmada por seus próprios fundamentos. (Recurso Cível Nº 71000531376, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Ricardo Torres Hermann, Julgado em 08/09/2004). 23 TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS Capítulo 1 • Se a não obrigatoriedade resultar da própria natureza do negócio. Tem-se, como exemplo, as queimas de estoque realizadas por lojas, a oferta é válida enquanto durar o estoque, visto que fi ndo o produto, é extinta também a possibilidade de vendê-lo. • Se a não obrigatoriedade resultar das circunstâncias do caso. Desta forma, o juiz possui liberdade para auferir no caso concreto situações nas quais a proposta não poderia ser considerada obrigatória. Há que se falar, ainda, no prazo de validade das propostas. Seriam elas ilimitadas temporalmente? A resposta é não. O artigo 429 do Código Civil estabelece os prazos de validade aplicáveis à proposta, diferenciando, porém, pessoas presentes de pessoas ausentes. Assim, para melhor compreender o assunto, é preciso diferenciar essas duas categorias. Pessoas presentes são aquelas que mantêm um contato direto e ininterrupto, tanto ao vivo quanto virtualmente (chats, messenger, whatsapp, desde que haja resposta imediata etc.). O importante nessa situação é que o indivíduo tome conhecimento da proposta assim que ela for realizada. No caso das pessoas ausentes, isso não ocorre porque o meio de comunicação utilizado não é imediato. Tem-se, por exemplo, propostas fi rmadas por e-mail e as propostas de renegociação de dívidas enviadas por correio para a casa do devedor. Assim, dispõe o Código Civil que a proposta perde seu prazo de validade quando: Art. 428. [...] I - se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita. Considera-se também presente a pessoa que contrata por telefone ou por meio de comunicação semelhante; II - se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo sufi ciente para chegar a resposta ao conhecimento do proponente; III - se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta dentro do prazo dado; IV - se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte a retratação do proponente. É importante destacar que no caso de pessoas ausentes, o contrato será considerado formado a partir do momento em que a aceitação for enviada, conforme artigo 434 do Código Civil. Todavia, a lei estabelece três exceções a essa regra, a saber: 1) Se antes ou junto da aceitação chegar a desistência do 24 Relações Obrigacionais Contratuais e Extracontratuais aceitante; 2) Se quem fez a proposta se comprometer a aguardar a chegada da aceitação (forma-se o contrato, então, com a chegada e não com a expedição do ato); 3) Se a aceitação não chegar no prazo combinado entre as partes. Vejamos, agora, a fase de aceitação. c) Aceitação A aceitação é a manifestação da vontade do indivíduo no sentido de concordar com a proposta realizada. Conforme o artigo 431 do Código Civil, se essa aceitação não for integral, teremos uma contraproposta, neste caso, a outra parte deverá informar se aceita as mudanças sugeridas para que só então o contrato se fi rme. Caso a proposta seja feita entre ausentes, caso haja algum imprevisto que faça com que a aceitação chegue tarde ao conhecimento do proponente, este deve comunicar ao aceitante imediatamente sob pena de responder por perdas e danos. Gagliano e Pamplona Filho (2014, s.p.) apontam o seguinte exemplo: EMENTA: BEM MÓVEL. COMPRA E VENDA. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. IMPROCEDÊNCIA. DESCUMPRIMENTO DO PRAZO CERTO DE ENTREGA DA MERCADORIA ADQUIRIDA. RECUSA DA MERCADORIA. CONTRATO ENTRE AUSENTES. ART. 434 DO CC. CORREIO ELETRÔNICO. PREVALECE A TEORIA DA EXPEDIÇÃO. EXISTÊNCIA DE PRAZO LIMITE DECLARADO NA ACEITAÇÃO EXPEDIDA. ENTREGA POSTERIOR. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL QUE PERMITIA A RECUSA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. No caso de contrato entre ausentes aplica-se a regra do art. 434 do CC. Paraa aceitação feita mediante correio eletrônico prevalece a data da expedição, com o envio da mensagem. De qualquer modo, na mensagem virtual expedida pelo aceitante constou o prazo fi nal estabelecido para a entrega, sem contrariedade do proponente. Daí porque, descumprido o termo, a recusa está justifi cada e não há direito à reparação de danos. (Tribunal de Justiça de São Paulo TJ-SP - Apelação: APL 10372187820148260576 SP 1037218-78.2014.8.26.0576) 25 TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS Capítulo 1 Imagine-se, por exemplo, que Souza houvesse enviado a Frim uma proposta para a venda de uma tonelada de bananas- da-terra. Frim, então, dentro do prazo assinado, responde, aquiescendo com a oferta. Ocorre que, por circunstância imprevista, a carta é extraviada e somente chega às mãos do proponente/vendedor (Souza) sete dias após o fi nal do prazo de resposta, já tendo o mesmo, inclusive, se comprometido a vender as bananas a um terceiro, Geraldo. Deverá, pois, neste caso, comunicar imediatamente a Frim o recebimento tardio da sua resposta, sob pena de ser civilmente responsabilizado pelos danos daí resultantes. Além disso, a aceitação pode se dar de forma expressa ou tácita, conforme artigo 432 do Código Civil: “Se o negócio for daqueles em que não seja costume a aceitação expressa, ou o proponente a tiver dispensado, reputar-se-á concluído o contrato, não chegando a tempo a recusa”. Assim, temos duas hipóteses. Imagine um comerciante que sempre recebe em sua loja tecidos de algodão fi ados por moradores locais, sem dizer expressamente que aceita a mercadoria, realizando pagamento após cinco dias, os tecidos sempre são deixados na loja e cinco dias depois o comerciante procura os tecelões para fazer o pagamento. Há, aqui, uma aceitação tácita por costume, já que nenhuma das partes exige a aceitação expressa, mas ainda assim fi rmam contrato. Um outro exemplo decorre de quando o próprio ofertante dispensa a aceitação expressa. Imaginemos uma reserva de hotel não negada pelo estabelecimento. Não há aceitação expressa do cliente que reservou o quarto, mas ainda assim o contrato está celebrado. Por fi m, cumpre lembrar que o local de celebração do contrato é aquele no qual foi realizada a proposta, conforme artigo 435 do Código Civil. Caso a proposta tenha sido feita em local indeterminado, como em um voo ou em águas internacionais, será considerado o lugar de domicílio do proponente. ClassiFicação Geral dos Contratos A classifi cação geral dos contratos nada mais é que um recurso pedagógico utilizado para facilitar a compreensão das particularidades de cada contrato. Diferentes autores utilizarão diferentes classifi cações, o que não prejudica o aprendizado da matéria justamente porque não se trata de uma verdade universal, mas de um recurso utilizado para viabilizar o entendimento das características de cada contrato. A classifi cação geral dos contratos nada mais é que um recurso pedagógico utilizado para facilitar a compreensão das particularidades de cada contrato. 26 Relações Obrigacionais Contratuais e Extracontratuais É importante mencionar que neste momento iremos apresentar uma classifi cação genérica, sem nos ater a fundo a cada tipo contratual. Os contratos em espécie serão estudados no capítulo 2. Tomaremos por base, aqui, a classifi cação adotada por Gagliano e Pamplona Filho (2014), que assim classifi cam os contratos: • Classifi cação dos Contratos quanto à Natureza da Obrigação - Contratos Unilaterais, Bilaterais ou Plurilaterais. - Contratos Onerosos ou Gratuitos. - Contratos Comutativos ou Aleatórios. - Contratos Paritários ou por Adesão. - Contratos Evolutivos. • Classifi cação dos Contratos quanto à Forma - Solenes ou Não Solenes. - Consensuais ou Reais. • Classifi cação dos Contratos quanto à Designação • Classifi cação dos Contratos quanto à Pessoa do Contratante - Pessoais ou Impessoais. - Individuais ou Coletivos. - Autocontrato • Classifi cação dos Contratos quanto ao Tempo Comecemos, pois, a partir dos contratos classifi cados quanto à natureza da obrigação. a) Contratos classifi cados quanto à natureza da obrigação Nesta classifi cação, é importante observar o tipo de obrigação a ser acordada entre as partes: se apenas uma das partes receberá algum benefício, se há prestação pecuniária para todas as partes etc. No capítulo 2, você encontra um estudo aprofundado sobre as espécies de contrato. 27 TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS Capítulo 1 Inicialmente, há que se falar em contratos unilaterais e bilaterais (plurilaterais). O contrato unilateral é aquele no qual apenas uma das partes realiza prestação pecuniária, como exemplo, na doação pura: caso um pai queira doar um carro ao fi lho, apenas o pai irá arcar com algum tipo de prestação. Ao fi lho caberá apenas aceitar ou recusar o presente, não é necessário que efetue pagamento algum ao pai. Entretanto, se o pai estivesse vendendo o carro ao fi lho, estaríamos diante de um contrato bilateral, pois a ambos caberia prestação pecuniária. Se a venda fosse do pai ao fi lho e sua nora, teríamos um contrato plurilateral: produção simultânea de prestações pecuniárias para os três envolvidos. Logo, bilateral quando há apenas duas partes arcando com prestações pecuniárias, e plurilateral quando existem mais de três indivíduos na mesma situação. O contrato também poderá ser oneroso ou gratuito. No contrato oneroso, todas as partes experimentam benefícios e deveres, como é o caso da compra e venda. Já no contrato gratuito, apenas uma das partes receberá benefícios, enquanto a outra arcará com o ônus, como é o caso da doação pura. Entende-se contrato comutativo aquele no qual as obrigações se equivalem e são conhecidas de início. Você entra em uma loja para comprar uma bela roupa exposta na vitrine, desde já você conhece o produto, o valor a ser pago por ele e, em regra, imediatamente o leva para casa. Porém, existem os contratos aleatórios, nos quais a prestação só pode ser exigida por uma das partes em razão de evento futuro. É o caso do contrato de seguro, a cobertura só pode ser exigida da agência caso haja algum tipo de acidente. Por fi m, há que se falar ainda em contratos paritários e contratos de adesão. Nos primeiros, há uma igualdade de condições de negociação entre as partes: em ambos pode-se discutir valores, prazos, formas de pagamento etc. O mesmo não ocorre nos contratos de adesão, uma das partes impõe cláusulas a serem cumpridas e cabe a outra aceitar ou não, nem possibilidade de discussões. Tem-se como exemplo os contratos de planos de telefone, internet e TV à cabo. b) Contratos classifi cados quanto à forma Em regra, nosso ordenamento jurídico não exige uma forma específi ca a ser adotada (art. 107 do CC-02), motivo pelo qual o contrato verbal é perfeitamente válido e efi caz, desde que celebrado mediante os requisitos já estudados. Tais contratos são classifi cados como não solenes, já que dispensam formalidades legais. Porém, em alguns casos, a lei estipula determinadas formalidades a serem seguidas. Estes são os contratos solenes, como exemplo, os contratos constitutivos translativos de direitos reais sobre imóveis acima do valor consignado em lei, uma vez que o código exige a forma pública para a validade do ato. 28 Relações Obrigacionais Contratuais e Extracontratuais O contrato poderá, ainda, ser consensual ou real, quanto à forma. O contrato consensual é aquele que se concretiza com a mera declaração de vontade, e, dado o aceite, fi rmado o acordo. Já os contratos reais exigem a entrega da coisa para sua concretização, neste sentido, temos como exemplo os contratos de mútuo, depósito e penhor. c) Contratos classifi cados quanto à designação Algumas espécies contratuais são designadas por lei, outras não, o que não infl uencia na sua validade e efi cácia. Desta forma, tem-se por nominados os contratosespecifi camente tratados no Código Civil, como a compra e venda, e inominados aqueles que não o são. d) Contratos classifi cados quanto à pessoa do contratante Segundo esta classifi cação, os contratos podem ser pessoais, impessoais, individuais ou coletivos. O contrato pessoal é aquele personalíssimo – celebrado unicamente em função de uma pessoa. Considere, por exemplo, que você é um grande fã de Pabllo Vittar e a tenha contratado para cantar em sua festa de aniversário. Veja: não é possível que Anitta, Valesca ou Alcione cantem no lugar da artista, pois o contrato é pessoal – você a contratou pelo seu talento específi co. Já o contrato impessoal visa apenas a realização do trabalho, independentemente de quem o faça. Temos, como exemplo, o contrato de prestação de serviços de limpeza para com uma empresa: não importa se Pablo, Anitta, Valesca ou Alcione façam a limpeza, desde que o serviço em si seja efetuado. O contrato individual é o celebrado por pessoas determinadas, individualmente consideradas: Anitta faz um contrato de compra e venda com Alcione, estabelecendo o acordo entre elas. Já o contrato coletivo é aquele celebrado por grupos não individualizados, reunidos por uma relação jurídica, como no caso das convenções coletivas no direito trabalhista. O sindicato realiza o acordo com a empresa, não Pablo ou Valesca. Por fi m, é importante mencionar a fi gura do autocontrato, que, apesar do nome, não se trata de um contrato consigo mesmo. Suponhamos que você more em Curitiba-PR e esteja vendendo um imóvel à sua amiga Yasmim, que mora em Belém-PA. Como o preço das passagens é alto, Yasmim o nomeia como seu representante legal, por meio de procuração, para que você resolva todos os trâmites do negócio em nome dela. Veja: você é a parte contratual que está 29 TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS Capítulo 1 vendendo o imóvel e está atuando como representante legal da Yasmim, que está comprando este mesmo imóvel – seu nome aparecerá duas vezes no contrato, nos dois polos, mas com uma grande diferença: em um deles você age em nome próprio, no outro, em nome alheio. A este fenômeno, chamamos autocontrato. e) Contratos classifi cados quanto ao tempo de execução De acordo com esta classifi cação, pode-se falar em contratos instantâneos, como exemplo, a compra e venda à vista, ou de duração, como é o caso da compra e venda a prazo. EFeitos do Contrato Em geral, é possível elencar quatro efeitos gerais oriundos dos contratos. O primeiro deles é a obrigatoriedade; uma vez fi rmado o pacto, ele se torna lei absoluta entre as partes, devendo ser cumprido conforme o combinado, se nele não há qualquer invalidade. O segundo refere-se à irretratabilidade; isto signifi ca que o contrato previamente estabelecido só poderá ser desfeito por outro contrato, chamado de distrato (art. 472 CC). O terceiro efeito é o da intangibilidade; o contrato não poderá ser alterado por vontade única de uma das partes, dependendo de um consenso mútuo para que haja a efetivação de qualquer mudança. Por fi m, não custa lembrar que o contrato possui um efeito pessoal, pois vincula apenas as partes contratantes, não podendo, em regra, atingir terceiro desinteressado. Existem, porém, dois elementos oriundos dos efeitos contratuais que merecem ser estudados com maior atenção. Tratam-se do vício redibitório e da evicção. Vejamos cada um deles. a) Vícios redibitórios Conforme o artigo 441 do Código Civil, os vícios redibitórios são defeitos ocultos que diminuem o valor ou prejudicam a utilização da coisa recebida. Segundo Farias e Rosenvald (2012, p. 469): [...] o vício redibitório consiste no vício oculto que acomete a coisa transferida em contratos comutativos, tornando-a imprópria ao uso a que se destina ou lhe reduzindo o valor. Sendo inerente à essência do produto, o vício é capaz de torná-lo imprestável ao seu fi m natural ou reduzir a capacidade do bem por ocasião de sua utilização. Em geral, é possível elencar quatro efeitos gerais oriundos dos contratos. O primeiro deles é a obrigatoriedade; O segundo refere-se à irretratabilidade; O terceiro efeito é o da intangibilidade; Por fi m, não custa lembrar que o contrato possui um efeito pessoal, pois vincula apenas as partes contratantes. 30 Relações Obrigacionais Contratuais e Extracontratuais É importante mencionar que em qualquer tipo de contrato no qual haja transmissão de propriedade, a teoria do vício redibitório poderá ser aplicada. Para que se caracterize o vício redibitório, alguns requisitos são necessários. O primeiro deles é o de que o contrato seja comutativo, ou seja, tenha obrigações equivalentes para ambas as partes, exigíveis de imediato. Nos contratos de doação, o doador não é obrigado a suportar as consequências dos vícios redibitórios, embora possa fazê-lo se assim quiser (art. 552 CC). Além disso, é necessário que o defeito seja oculto e exista antes da tradição, ou seja, da entrega do bem e que acarrete em diminuição de valor econômico ou prejuízo à adequada utilização da coisa. O referido instituto encontra fundamentação jurídica na garantia contratual, segundo a qual, quem adquire um bem por meio de contraprestação, tem total direito de usufruí-lo segundo sua utilidade natural. Imagine um indivíduo que adquire um Iphone 7, de última geração, mas em razão de um vício oculto, precisa utilizá-lo como um simples peso de papel. Não faria o menor sentido. Por essa razão, é preciso que o adquirente tenha algum tipo de garantia contra o vendedor, caso o bem venha eivado por algum tipo de defeito. Assim, a garantia contratual está diretamente relacionada ao princípio da boa-fé, uma vez que cabe ao vendedor informar ao comprador todos os detalhes relativos ao negócio a ser fi rmado. É importante destacar que, mesmo que o vendedor desconheça o vício no bem a ser vendido, ainda será responsável por reparar o dano ao comprador. E quais são as consequências jurídicas do vício redibitório? Segundo Farias e Rosenvald (2012, p. 469): o vício redibitório consiste no vício oculto que acomete a coisa transferida em contratos comutativos, tornando-a imprópria ao uso a que se destina ou lhe reduzindo o valor. Sendo inerente à essência do produto, o vício é capaz de torná-lo imprestável ao seu fi m natural ou reduzir a capacidade do bem por ocasião de sua utilização. Para que se caracterize o vício redibitório, alguns requisitos são necessários. O primeiro deles é o de que o contrato seja comutativo. Além disso, é necessário que o defeito seja oculto e exista antes da tradição, ou seja, da entrega do bem e que acarrete em diminuição de valor econômico ou prejuízo à adequada utilização da coisa. 31 TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS Capítulo 1 Vejamos o que diz o Código Civil, em seu artigo 442: “Em vez de rejeitar a coisa, redibindo o contrato (art. 441), pode o adquirente reclamar abatimento no preço”. Assim, é possível inferir que, caso o dilema não seja resolvido de forma amigável, por meio de rescisão ou abatimento no preço, o adquirente terá duas opções na esfera judicial: redibir o negócio ou obter judicialmente o abatimento no preço por meio de ação estimatória. São o que chamamos de ações edilícias. Assim, nas ações estimatórias, o adquirente visa ao abatimento na prestação já paga. Já nas ações redibitórias, o objetivo é devolver a coisa com a restituição da quantia ou prestação paga ao comprador adquirente. Veja o esquema a seguir. Assim, temos: No entanto, o adquirente deve estar atento aos prazos para propositura das ações edilícias. Se estivermos falando de bens móveis, o prazo será de 30 dias, para bens imóveis, o prazo será de um ano, sempre contados a partir da efetiva entrega do bem. É importante, sobretudo, compreender o que diz a segunda parte do art. 445 do Código Civil: “O adquirente decai do direito de obter a redibiçãoou abatimento no preço no prazo de trinta dias se a coisa for móvel, e de um ano se for imóvel, contado da entrega efetiva; se já estava na posse, o prazo conta-se da alienação, reduzido à metade.” De acordo com o dispositivo mencionado, se o indivíduo já estava na posse do bem no momento da efetivação do contrato, seus prazos irão cair para metade. Claro, se a pessoa já usufruía da coisa, seria de se esperar que ela mesma notasse os vícios presentes no bem. Imaginemos duas situações. Na primeira delas, Ana Paula mora de aluguel na casa de Fabiana há dois anos, quando fi nalmente decidiu comprar o imóvel. Realizada a compra, Ana Paula descobriu que em razão de desmoronamentos na região, o piso do imóvel tende a inclinar dois centímetros por ano, sendo que com o passar do tempo sua moradia ali seria inviável. Fabiana não quer conversa, obrigando Ana Paula a tomar as medidas legais cabíveis. Ações Edilícias Ação Estimatória: reclamar abatimento na prestação Ação Redibitória: rejeitar a coisa, redibindo o contrato 32 Relações Obrigacionais Contratuais e Extracontratuais Qual o prazo para Ana Paula ajuizar ação edilícia? O prazo será de seis meses e não de um ano, pois Ana Paula já residia no imóvel quando fez a compra, ou seja, já estava na posse do bem objeto do contrato. Em situação semelhante, imaginemos que Nathália possui um belo carro Ford KA em sua garagem, presente de seus pais, mas não saiba dirigir. Ela e sua prima Andressa, que já possui carteira de motorista, combinam que apesar do carro ser de Nathália, é Andressa quem irá dirigi-lo, tanto para levar e buscar Nathália em qualquer lugar que ela deseje, quanto para seu uso próprio, para sair com seus amigos e realizar atividades cotidianas. Andressa gosta tanto de dirigir o carro que, após seis meses do acordo, fez uma oferta irrecusável a Nathália, que o vendeu. Todavia, na primeira tempestade que desaba na cidade, o carro, guardado em garagem aberta, sofre inundação em razão de um pequeno furo embaixo do volante. Qual o prazo para Andressa ajuizar a ação edilícia de sua preferência? Como se trata de bem móvel que já estava na posse da adquirente, o prazo será de quinze dias (metade do que seria se ela não estivesse na posse do bem). EMENTA: COBRANÇA. COMPRA E VENDA DE VEÍCULO. VÍCIOS REDIBITÓRIOS. O objeto da compra e venda, à época do negócio, contava com cerca de sete anos. Assim, e tendo a venda se realizado entre particulares, cumpria ao adquirente verifi car o estado do bem, a fi m de evitar a despesa reclamada. Isso porque, considerando o rol de peças dos orçamentos acostados, observa-se se tratar muito mais de desgaste por decurso do tempo e de uso do que por defeito no motor. Dessa forma, não responde o vendedor pelos problemas manifestados no funcionamento do carro. Esse, inclusive, é o entendimento predominante nestas Turmas Recursais. SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO IMPROVIDO. (Recurso Cível Nº 71004278974, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Carlos Eduardo Richinitti, Julgado em 27/06/2013) 33 TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS Capítulo 1 b) Eviccção Conforme já mencionado, nas relações contratuais não basta que as partes cumpram a obrigação acordada. É necessário, ainda, que ajam de acordo com o princípio da boa-fé, atuando conforme os deveres anexos de proteção, cooperação e informação. Neste sentido, trataremos de mais uma fi gura que se origina a partir dos efeitos do contrato: a evicção. Conforme Farias e Rosenvald (2012, p. 493), a evicção é “a perda da coisa em virtude de decisão judicial ou administrativa que conceda o direito – total ou parcial – sobre ela a um terceiro estranho à relação contratual em que se deu a aquisição”. Imaginemos que Silvana compre o computador usado de Joel, por meio de contrato válido de compra e venda. O computador funciona normalmente, não há nenhum vício redibitório e atende perfeitamente às necessidades de Silvana. Acontece que, meses depois, ela é surpreendida por Nívea, que comprova em juízo que o computador, na verdade, era seu – e não de Joel, motivo pelo qual ele não poderia tê-lo vendido. Silvana, assim, torna-se evicta (excluída) e deve procurar Joel para obter a devida indenização. Eis a evicção: perda da posse ou propriedade de um bem em razão do reconhecimento de que este bem, na verdade, pertencia a terceiro antes da celebração do contrato em questão. Eis a evicção: perda da posse ou propriedade de um bem em razão do reconhecimento de que este bem, na verdade, pertencia a terceiro antes da celebração do contrato em questão. Conforme Farias e Rosenvald (2012, p. 493), a evicção é “a perda da coisa em virtude de decisão judicial ou administrativa que conceda o direito – total ou parcial – sobre ela a um terceiro estranho à relação contratual em que se deu a aquisição”. Assim como no caso dos vícios redibitórios, a evicção só atinge os contratos onerosos comutativos, ou seja, no qual ambas as partes têm encargos e vantagens. No caso da doação, Farias e Rosenvald (2012, p. 494-495) afi rmam: 34 Relações Obrigacionais Contratuais e Extracontratuais Não se olvide ainda da possibilidade de o doador suportar a evicção quando dolosamente transfere a propriedade do bem, sabendo ser ela portadora de vício jurídico. Cuida- se do “presente de grego”. A especifi cidade da hipótese reside no fundamento diferenciado da demanda: não será o alienante responsabilizado pela evicção por ser ela estranha aos contratos gratuitos, mas por eventuais perdas e danos decorrentes do ato ilícito. Desta forma, ainda que a evicção em si não possua incidência obrigatória sobre os contratos de doação, alienar bem que não lhe pertence confi gura ato ilícito e, como tal, gera indenização. Outros elementos constituintes da evicção são: privação do direito do adquirente, que apesar de já ter fi rmado o negócio não poderá usufruir do bem que adquiriu; preexistência do direito de terceiro, em razão da ilegitimidade do alienante vendedor para dispor sobre a coisa, já que esta, na verdade, pertencia a terceiro; e privação judicial ou extrajudicial, ou seja, a evicção poderá ocorrer tanto por força de uma sentença quanto por reconhecimento espontâneo do adquirente, ou mesmo mediante apreensão por autoridade administrativa. Basta lembrar de casos de apreensão de veículos furtados, a simples atuação da polícia já é sufi ciente para ocorrência da evicção. Assim como os vícios redibitórios, a evicção tem por fundamentação a garantia contratual. Conforme Farias e Rosenvald (2012, p. 496): A função prático-social da garantia da evicção nos contratos onerosos é a de recompor o equilíbrio contratual, abalado pelo rompimento da correspectividade das prestações. Com a provação do bem, experimenta o evicto uma mitigação patrimonial que rompe o sinalagma genético, pois o seu sacrifício fi nanceiro já não mais será compensado por qualquer vantagem econômica. Assim, a evicção é uma forma de restabelecer o equilíbrio na relação contratual fi rmada, já que nos contratos onerosos comutativos há deveres e obrigações para ambos. Quanto aos direitos do evicto, além da restituição integral da prestação paga, ele terá direito a indenização por perdas e danos decorrentes do ato, ainda que o bem esteja de alguma forma deteriorado. A responsabilidade será do alienante, exceto quando o adquirente estiver de má-fé (saber que o bem pertencia a terceiro, por exemplo). Ainda há que se falar em duas espécies de evicção, a total e a parcial. A primeira ocorre quando há perda completa da posse ou propriedade do bem, como mencionado no exemplo do computador. A evicção parcial ocorre quando apenas parte da posse ou propriedade da coisa é perdida. Como exemplo, imaginemos 35 TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS Capítulo 1 que Beatriz compre a biblioteca completa de seu primoIgor, pelo seu amor à leitura e à erudição. Satisfeita com a compra, Beatriz é surpreendida por Douglas que afi rma que, dos 890 livros constantes no acervo, 300 são seus, e não de Igor. Neste caso, conforme artigo 455 do Código Civil, Beatriz poderá optar entre a extinção do contrato com Igor ou a restituição do preço pelo prejuízo sofrido. Por fi m, é preciso ressaltar que o Código Civil em seu artigo 448 permite expressamente que as partes diminuam, aumentem ou excluam completamente a hipótese de evicção. Essas convenções, entretanto, devem estar expressas no contrato, não podendo nunca serem implícitas. Desta forma, segundo Gagliano e Pamplona Filho (2014, s.p.): Se as partes resolverem aumentar (extensão da garantia) o direito do adquirente – estabelecendo uma multa caso se consume a perda, por exemplo -, abater a garantia de indenização pelos eventuais frutos restituídos (diminuição da garantia), ou, bem assim, excluírem totalmente a responsabilidade pela evicção, somente poderão fazê-lo por cláusula expressa constante do contrato fi rmado. Vistos os efeitos decorrentes das relações contratuais, passaremos agora ao estudo das hipóteses de extinção do contrato. c) Extinção contratual Neste tópico, abordaremos as hipóteses de extinção contratual. Também trataremos de algumas questões relacionadas à extinção dos contratos, como a exceção de contrato não cumprido e a resolução por onerosidade excessiva. Tomando por base a classifi cação proposta por Gagliano e Pamplona Filho (2014), estudaremos as formas de extinção do contrato conforme o seguinte resumo esquemático: Natural Extinção Posterior Cumprimento do pacto Verifi cação de fator efi cacial Causa anterior ao contrato: invalidade, cláusula resolutória, direito de arrependimento, redibição. Causa posterior ao contrato: resilição, resolução, rescisão, morte, caso fortuito ou força maior 36 Relações Obrigacionais Contratuais e Extracontratuais Vejamos primeiro as causas naturais de extinção do contrato. • Extinção natural do contrato Os contratos existem para serem cumpridos, certo? Neste sentido, nada mais lógico que a primeira hipótese de extinção natural seja o cumprimento integral do contrato. As partes cumpriram as obrigações acordadas, usufruíram dos bônus ofertados e o contrato chegou ao fi m de seu ciclo sem maiores problemas. A segunda causa de extinção natural refere-se ao plano da efi cácia, já estudado neste capítulo. Como faláramos, em regra, os contratos são celebrados de forma que o acordado seja efetivado imediatamente. A critério das partes, porém, é possível suspender a efi cácia do acordo para um momento futuro. Assim, é possível que as partes tenham estabelecido um termo, um evento futuro e certo para só então o contrato se efetivar. Por exemplo, Fabíola encomenda um belo vestido no ateliê de Núbia, que só fi cará pronto em 30 dias. Desta forma, ambas se comprometem a realizar as devidas prestações 30 dias após a encomenda, ou seja, no dia 09 de abril. Até lá, o contrato existe e é válido, mas é inefi caz em razão do termo estabelecido, apenas no dia 09 de abril o vestido será entregue, o valor será recebido e, assim, o contrato terá fi m. Outra possibilidade é que as partes tenham estabelecido uma condição, um termo futuro e incerto para a efetivação do contrato. Assim, Conceição se compromete, mediante contrato, a doar um imóvel a seu neto Mateus no dia de seu casamento. Podem se passar 10, 15, 20 anos, caso o casamento não aconteça, o contrato jamais terá efi cácia, pois está vinculado a esta condição. Vistas as hipóteses naturais de extinção, passamos às outras hipóteses de extinção. • Causas anteriores ou contemporâneas à formação do contrato Caso as obrigações pactuadas não tenham sido cumpridas, estaremos diante de causas não naturais de extinção contratual, que podem ocorrer antes, durante e após a celebração do pacto. Trataremos das hipóteses ocorridas antes ou durante a fi rmação do contrato. Primeira hipótese de extinção natural seja o cumprimento integral do contrato. As partes cumpriram as obrigações acordadas, usufruíram dos bônus ofertados e o contrato chegou ao fi m de seu ciclo sem maiores problemas. Caso as obrigações pactuadas não tenham sido cumpridas, estaremos diante de causas não naturais de extinção contratual, que podem ocorrer antes, durante e após a celebração do pacto. É possível que as partes tenham estabelecido um termo, um evento futuro e certo para só então o contrato se efetivar. 37 TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS Capítulo 1 A primeira delas diz respeito ao plano da validade, conforme já estudado neste capítulo. Lembre-se de que para um contrato ser válido, ele deve ter sujeito capaz, vontade livre e sem defeitos, forma livre ou não proibida por lei, objeto lícito, possível, determinado ou determinável. Assim, imagine o seguinte caso: José Herrera, uruguaio, fi rma um contrato de compra e venda de cannabis sativa com João Pedro, brasileiro, no Brasil, sem saber da ilicitude deste objeto em solo brasileiro. José Herrera, esperto, recebe o bem, mas se recusa a pagar sua prestação. O que resta a João Pedro? Sentar e chorar, já que o contrato é inválido em função da ilicitude do objeto e, portanto, será considerado extinto. A segunda hipótese refere-se à cláusula resolutória constante no artigo 474 do Código Civil, sendo uma cláusula que contém um evento futuro e incerto e que, ocorrendo, acarretará a extinção do contrato. A terceira hipótese refere-se aos vícios redibitórios, aqueles defeitos ocultos no bem pactuado. Nathália vende a Andressa um carro Ford KA que, ao enfrentar sua primeira tempestade em local aberto, inunda. Andressa pode tanto extinguir o contrato, obtendo seu dinheiro de volta, ou optar por manter o contrato e solicitar abatimento no preço. A quarta e última hipótese de extinção contratual em razão de causas anteriores ou contemporâneas à formação do contrato é o direito de arrependimento. As partes podem pactuar expressamente no contrato que, dentro de um determinado período de tempo, reservam-se ao direito de se arrepender do negócio fi rmado. Caso este arrependimento realmente ocorra, fi ndo está o contrato, sem que sua fi nalidade original tenha sido cumprida. • Causas supervenientes à formação do contrato A partir de agora, estudaremos as causas de extinção contratual que são posteriores à formação do pacto entre as partes. A primeira delas é a resilição, oriunda de uma vontade que poderá ser bilateral (querida por todas as partes) ou unilateral (desejada por apenas uma das partes). A primeira, também conhecida como distrato, é um novo contrato cujo objeto é a extinção de contrato anteriormente fi rmado. A segunda tem sua incidência reduzida, podendo incidir em apenas alguns tipos contratuais, em razão do princípio da obrigatoriedade dos contratos. A respeito do distrato, o artigo 472 do Código Civil assim preceitua: “O distrato faz-se pela mesma forma exigida para o contrato”, ou seja, se a lei exige alguma forma específi ca para o contrato original, o distrato também deverá obedecê-la. Conforme Gonçalves (2014, p. 143-144): 38 Relações Obrigacionais Contratuais e Extracontratuais A exigência de observância da mesma forma exigida para o contrato, feita no citado art. 472, não deve ser interpretada, contudo, de forma literal, mas com temperamento: o distrato deve obedecer à mesma forma do contrato a ser desfeito quando este tiver forma especial, mas não quando esta for livre. Desse modo, a compra e venda de imóvel de valor superior à taxa legal, que exige escritura pública, só pode ser desfeita, de comum acordo, por outra escritura pública. Mas o contrato de locação, que tem forma livre, pode ser objeto de distrato verbal, mesmo tendo sido constituído mediante contrato escrito, por exemplo. É importante mencionar que o distrato pode findar qualquer tipo de contrato ainda não cumprido, bastando, para tanto, a vontade das duas partes em realizá- lo e seus efeitos não são retroativos, valendo apenas para o futuro. A respeito da resilição unilateral, ela poderá ocorrer apenas nos contratos que tenham por objeto obrigações duradouras, impedindo sua renovação ou continuação, independentemente do inadimplemento de uma das partes. Um bom exemplo é o contrato de renovação de aluguel; em regra, ele irá se renovando automaticamente até que uma das partes opte por fi ndá-lo, sem que haja inadimplemento de qualquer dos lados. Trata-se do meio adequado para extinguir contratos que não tenham prazo determinado, pois, se não houvesse tal possibilidade, o contrato seria eterno. Ademais, como preceitua Gonçalves (2014, p. 144): A resilição unilateral independe de pronunciamento judicial e produz efeitos ex nunc, não retroagindo. Para valer, deve ser notifi cada a outra parte, produzindo efeitos a partir do momento em que chega a seu conhecimento. É, destarte, declaração receptícia da vontade. Em princípio, não precisa ser justifi cada, mas em certos contratos exige-se que obedeça à justa causa. Nestas hipóteses a inexistência de justa causa não impede a resilição do contrato, mas a parte que o resiliu injustamente fi ca obrigada a pagar, à outra, perdas e danos. A segunda causa é a resolução, segundo a qual o contrato se extingue em virtude do descumprimento do que fora pactuado. A resolução pode ocorrer de duas formas: por inexecução voluntária ou por exceção de contrato não cumprido. Na inexecução voluntária, um dos contratantes deixa de cumprir a obrigação pactuada, gerando um desequilíbrio na relação contratual que acarretará em danos para a outra parte. Resolvido o contrato por esta razão, as partes devem realizar restituições recíprocas, estando o indivíduo inadimplente sujeito à indenização por perdas e danos. Caso a obrigação pactuada seja passível de realização imediata, os efeitos dessa extinção serão retroativos, caso seja de trato sucessivo, como a compra e venda a prazo, as prestações já pagas permanecem inalteradas, gerando efeito não retroativo. 39 TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS Capítulo 1 Na exceção de contrato não cumprido, enfrentamos situação um pouco diferenciada: o contrato será extinto porque nenhuma das partes cumpriu aquilo que fora pactuado. Geralmente é utilizada como instrumento de defesa na inexecução voluntária, já que a parte inadimplente pode argumentar que não cumpriu com sua obrigação porque o outro indivíduo também não cumpriu com a sua. Disciplinada no artigo 476 do Código Civil, a exceção de contrato não cumprido tem como um de seus requisitos a existência de um contrato bilateral; a demanda de uma das partes pelo cumprimento daquilo que fora pactuado e um prévio descumprimento da prestação pela parte demandante. Desta forma, imagine que Sofi a realiza a compra de uma geladeira usada com Raíssa. Fica pactuado que a geladeira deverá ser entregue no dia 02 de março, ao passo que Raíssa deverá depositar o dinheiro no dia 03 de março. No dia 04, Sofi a reclama em juízo que não recebeu a prestação combinada, exigindo, portanto, a resolução do contrato. Em sua defesa, porém, Raíssa afi rma que não realizou o pagamento porque não recebeu a geladeira, utilizando, assim, a exceção de contrato não cumprido como forma de defesa processual. Apesar de ser utilizado de forma indiscriminada, o termo rescisão, em seu signifi cado técnico, refere-se à invalidade dos contratos em razão de dois vícios do consentimento: lesão ou estado de perigo. A lesão, prevista no artigo 157 do Código Civil, caracteriza-se quando um indivíduo se aproveita da necessidade ou inexperiência de outrem para celebrar com ele um negócio extremamente desvantajoso. Já o estado de perigo, elencado no artigo 156 do mesmo diploma legal, confi gura-se quando um indivíduo celebra contrato desvantajoso para salvar a si próprio ou alguém de sua família em razão de perigo conhecido pela outra parte. Nas duas hipóteses o contrato é inválido, em razão de vício na vontade emanada e, portanto, poderá ser judicialmente rescindido (extinto). No caso da morte de um dos contratantes, o contrato só será extinto caso a obrigação pactuada seja personalíssima, de forma que apenas o falecido poderia cumpri-la. Caso contrário, ela será transmitida aos herdeiros que deverão fazê-la se cumprir. Uma outra hipótese refere-se à extinção contratual em virtude de caso fortuito ou força maior, cumprimento do contrato torna-se impossível em razão de acontecimentos alheios à vontade dos contratantes. No entanto, este ocorrido deve ser objetivo, ou seja, não ser criado ou infl uenciado pelo devedor; impossibilitar totalmente o cumprimento do pacto, pois o credor pode ainda ter interesse na prestação mesmo que parcial; e defi nitiva, pois, se temporária, gerará apenas a suspensão momentânea do contrato. Neste caso, o inadimplente não é responsável por perdas e danos, a não ser que no contrato haja previsão expressa de que ele arcará com os danos em situação 40 Relações Obrigacionais Contratuais e Extracontratuais de caso fortuito ou força maior ou, ainda, se estiver em mora para com o adquirente (arts. 393 e 399, CC). A extinção do contrato será imediata, com efeito retroativo, ou seja, a parte inadimplente deve devolver eventual prestação que já tenha recebido sem, entretanto, estar obrigado a pagar indenização por perdas e danos. Por fi m, é importante tecer algumas considerações a respeito da teoria da imprevisão e a extinção contratual por onerosidade excessiva. Como já mencionado anteriormente neste capítulo, embora a regra seja a não alteração arbitrária dos contratos, em razão de sua obrigatoriedade, algumas circunstâncias supervenientes podem tornar a prestação excessivamente onerosa. Por tal motivo, temos o princípio da revisão dos contratos ou da onerosidade excessiva, também conhecido como rebus sic stantibus. De acordo com tal princípio, entende-se que nos contratos comutativos existe uma cláusula implícita segundo a qual o contrato só será completamente obrigatório se as situações fáticas que o circundam na origem permanecerem inalteradas, sem modifi cações extraordinárias que tornem o contrato excessivo, por exemplo, na ocorrência de uma guerra. No ordenamento jurídico brasileiro, para que o devedor se livre da obrigação tornada demasiadamente excessiva em razão de fato extraordinário, este acontecimento deve ser, também, imprevisível. Alterações econômicas como a infl ação, por exemplo, não podem ser evocadas como desculpas para o inadimplemento contratual. Uma de suas características é a de que a onerosidade excessiva pode ser alegada tanto pelo devedor quanto pelo credor. Qualquer uma das partes atingida por uma mudança imprevisível e fora do comum terá o direito de recorrer a essa cláusula implícita. Além disso, caso ainda haja algum interesse no cumprimento da obrigação acordada, é possível realizar alterações no contrato para que, ao invés de extinto, ele adeque-se às circunstâncias. A matéria é tratada no Código Civil de 2002, nos artigos 478, 479 e 480. Conforme o referido diploma legal, a extinção contratual com base na onerosidade excessiva só pode se efetivar na ocorrência dos seguintes elementos: acontecimento extraordinário, imprevisível e excessivamente oneroso para uma das partes que acarretará em extrema vantagem para a outra. Atividades de Estudo: 1) A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso. Deixa, entretanto, de ser obrigatória a proposta. 41 TEORIA DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS Capítulo 1 Algumas Considerações Neste capítulo procuramos tecer algumas considerações gerais a respeito do direito contratual, como: o conceito técnico de contrato, seus requisitos
Compartilhar