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TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS Programa de Pós-Graduação EAD UNIASSELVI-PÓS Autoria: Dóris Ghilardi CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Coordenador da Pós-Graduação EAD: Prof. Ivan Tesck Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Carlos Fabiano Fistarol Ilana Gunilda Gerber Cavichioli Cristiane Lisandra Danna Norberto Siegel Camila Roczanski Julia dos Santos Ariana Monique Dalri Bárbara Pricila Franz Marcelo Bucci Revisão de Conteúdo: Priscilla Camargo Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Copyright © UNIASSELVI 2018 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. G424t Ghilardi, Dóris Teoria geral das relações obrigacionais. / Dóris Ghilardi – Indaial: UNIASSELVI, 2018. 160 p.; il. ISBN 978-85-53158-12-6 1. Obrigações (Direito) – Brasil. II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. CDD 347.4 Dóris Ghilardi Doutora em Ciência Jurídica pela Univali com tese aprovada com distinção e louvor (2015); Mestre em Ciência Jurídica pela Univali – Itajaí (2006); Formação e aperfeiçoamento pela Escola da Magistratura – ESMESC – Florianópolis – SC (2002); Graduação em Direito na Univali, Itajaí (2000). Professora adjunta da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC –, na área de Direito Civil; professora convidada permanente da ESA-SC; ex-professora da Escola da Magistratura de Santa Catarina (ESMESC); ex-coordenadora do curso de Pós-Graduação de Direito de Família e Sucessões do Cesusc; Pesquisadora. Membro da Comissão de Direito de Família da OAB-SC. Coordenadora Científica do IBDFAM-SC. Autora do livro Economia do afeto: análise econômica do direito de família; coautora do livro de Prática jurídica processual civil. Coorganizadora da coletânea de livros de Prática Jurídica, publicada pela Lumen Juris, e autora de diversos artigos científicos. Membro do grupo de estudos de Direito Civil Contemporâneo. Sumário APRESENTAÇÃO ..........................................................................07 CAPÍTULO 1 Aspectos Gerais das Obrigações ............................................. 09 CAPÍTULO 2 Modalidades das Obrigações .................................................... 19 CAPÍTULO 3 CAPÍTULO 4 Efeitos das Obrigações: Adimplemento, Extinção e Inadimplemento ......................................................................... 29 Transmissão das Obrigações .................................................... 41 APRESENTAÇÃO O tema a ser abordado no presente livro abrange as relações obrigacionais, ramo considerado como o mais refratário a mudanças dentro do Direito Civil, ou seja, não é tão sensível a alterações quanto outras áreas, caso do Direito de Família, o que não significa dizer que seja imutável. Pelo contrário, novas teorias têm surgido e recentes reformas legislativas – caso do novo Código de Processo Civil e do Estatuto da Pessoa com Deficiência – alteraram a matéria. Atentando às transformações, esta obra é redigida com base no Código Civil e demais legislações que influenciam o Direito Obrigacional, além de trazer teorias doutrinárias e entendimentos dos tribunais. A compreensão do Direito das Obrigações, sua estrutura, formação e efeitos serão detalhadamente estudados, de maneira a contemplar a dinâmica contemporânea das relações negociais. Os dogmas clássicos cederam espaço para uma compreensão mais abrangente e humanística, estabelecendo limites às obrigações. Repaginada a autonomia privada, a antiga relação entre credor e devedor ultrapassa o restrito campo do simples cumprimento ou descumprimento da prestação, exigindo, para tanto, a observância dos deveres laterais ou anexos que requerem das partes um modelo de conduta pautada pela honestidade lealdade e confiança. Com base nisso, este livro está dividido em quatro capítulos. O primeiro, intitulado como Aspectos gerais das obrigações, tratará sobre conceito, elementos, fontes e classificação das obrigações. Observando a releitura da relação obrigacional, será esta tratada como um verdadeiro processo que leva em consideração o comportamento ético e de cooperação, pautado pela boa-fé do início ao fim das tratativas entre as partes. O segundo capítulo abrange as modalidades das obrigações com a finalidade de compreender os diversos tipos de obrigações, suas características, modalidades e consequências, buscando a sua compreensão teórica e prática adequada. Na sequência, o terceiro capítulo aborda os efeitos das obrigações, tratando dos modos de adimplemento, extinção e inadimplemento, atentando para as particularidades a que se sujeitam as relações no que tange às possibilidades de cumprimento e consequências de descumprimento. Por fim, o último capítulo aborda a transmissão das obrigações, esclarecendo e diferenciando a cessão de crédito, de débito e de contrato. CAPÍTULO 1 Aspectos Gerais das Obrigações A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: � Compreender a concepção do Direito Obrigacional contemporâneo. � Conhecer as fontes que constituem o Direito Obrigacional. � Compreender seus elementos e classificação. � Realizar a compreensão e aplicação correta do Direito Obrigacional contemporâneo 10 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS 11 Aspectos Gerais das Obrigações Capítulo 1 Contextualização Este capítulo se destina ao estudo e recapitulação dos aspectos introdutórios do direito das obrigações com o objetivo de compreender o conceito contemporâneo de obrigação e todas as importantes implicações daí decorrentes. Analisar os efeitos práticos da obrigação como processo, as condutas exigidas pelas partes e os deveres anexos são tarefas salutares para um amplo aprendizado do conteúdo. Por fim, importa também observar os elementos constitutivos das obrigações, suas fontes e campo de aplicação dos regramentos civis. Compreendidas as noções gerais e analisados os efeitos inerentes, parte-se para a classificação das obrigações, tema do segundo capítulo. Conceito de Obrigação O Código Civil divide-se em Parte Geral e Especial. Obrigações é o primeiro livro da parte Especial e compreende, além das obrigações propriamente ditas, também os contratos e a responsabilidade civil. Este livro traz apenas as noções das relações obrigacionais. O Direito das Obrigações é um ramo de conteúdo econômico, de natureza pessoal, não o confundindo com os direitos reais que pertencem ao Direito das Coisas. É fundamental perceber que existem dois grupos de direitos subjetivos patrimoniais: os direitos obrigacionais ou de crédito e os direitos reais. Duas teorias buscam explicá-los. A teoria unitária defende a unificação dos dois direitos, já a teoria dualista trabalha os dois grupos separadamente. O Brasil optou por trabalhar conforme a teoria dualista. Assim, embora os direitos subjetivos patrimoniais sejam tema comum aos direitos obrigacionais e reais, a primeira área contempla os direitos pessoais, enquanto o Direito das Coisas trata dos direitos reais. O direito pessoal “consiste num vínculo jurídico pela qual o sujeito ativo pode exigir do sujeito passivo determinada prestação. Constitui uma relação de pessoa a pessoa e tem, como elementos, o sujeito ativo, o sujeito passivo e a prestação” (GONÇALVES, 2016, p. 23). 12 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS Já o direito real pode ser definido como “o poder jurídico direto e imediato, do titular sobre a coisa, com exclusividade e contra todos” (GONÇALVES, 2016, p. 23). Dito de outraforma, é uma relação jurídica entre o titular e a coisa. Portanto, tem como elementos o sujeito ativo, a coisa e a relação ou poder do sujeito sobre a coisa. Destarte, nos direitos obrigacionais, a finalidade da obrigação assumida entre credor e devedor é o cumprimento da prestação, ou seja, o que importa é a atividade do devedor (comportamento do devedor, traduzida na prestação de dar, fazer ou não fazer) e não a coisa em si. Exemplificando: se dois sujeitos celebram um contrato em que um passa a se obrigar a entregar uma bicicleta ao outro, o credor passa a ser o titular de um direito pessoal a ser exercido em face do devedor. Isto é, pode exigir que o devedor cumpra com a sua prestação (de dar, de fazer ou não fazer – no caso, de entregar a bicicleta). Não existe uma pretensão de direito real sobre a coisa em si, apenas a de exigir o cumprimento da prestação. Em síntese, nas palavras de Gagliano e Pamplona Filho (2016, p. 46), “[...] conclui-se que o cumprimento da prestação (atividade do devedor), e não a coisa em si (o dinheiro, o imóvel etc.), constitui o objeto imediato da obrigação e, por conseguinte, do próprio direito de crédito”. Em contrapartida, nos direitos reais se estabelece uma relação não entre sujeitos, mas uma relação de poder do titular sobre o próprio objeto – bem móvel ou imóvel. O direito real surge a partir da constituição da posse ou propriedade, ou seja, tomando como exemplo a mesma situação colocada anteriormente: se o devedor cumprir com a sua prestação, a de entregar a bicicleta, surge, então, uma relação jurídica de direito real entre o sujeito ativo e a coisa que faz com que qualquer outro sujeito deva respeitar o direito ali estabelecido. Caso violado, surgirá a pretensão de direito real. “Em verdade, a pretensão de direito real apenas se manifestará contra aquele que eventualmente viole o dever genérico de não lesar” (FARIAS; ROSENVALD, 2017, p. 102). 13 Aspectos Gerais das Obrigações Capítulo 1 Esquematizando: Relação Jurídica pessoal: Sujeito Ativo – Sujeito Passivo – Prestação Relação Jurídica real: Titular Direito Real – Relação Jurídica – Coisa a) Distinções entre direitos reais e pessoais Tecer considerações sobre as principais distinções entre os direitos reais e pessoais é fundamental para uma compreensão mais dinâmica e abrangente do conteúdo. I – A primeira delas trata da relação instalada já mencionada, razão pela qual não será novamente detalhada. Apenas para deixar claro, a relação de direito pessoal se dá entre as partes, enquanto a relação de direito real se dá entre sujeito ativo e objeto. II – No direito pessoal, a relação passiva está vinculada ao sujeito passivo (devedor), isto é, diante de eventual descumprimento da prestação caberá ao sujeito ativo (credor) exigir do sujeito passivo o cumprimento da prestação. Exemplificando: se o devedor se obrigou a transferir um terreno para X e culminou por vendê-lo a um terceiro, exceto no caso de fraude (que resultaria em anulabilidade), o credor não pode, a princípio, exigir do terceiro o imóvel. O descumprimento da prestação só poderá ser exigido em face do devedor que, neste caso, em razão do bem já estar com terceiro, se resolverá em perdas e danos. Somente um registro do contrato de compra e venda na matrícula do imóvel (contrato com eficácia real, em razão do registro) permitiria a pretensão do credor em face de terceiros. 14 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS Já no direito real, a relação passiva é erga omnes, extensível contra todos. Exemplificando, após estabelecido o domínio sobre a coisa, não pode qualquer pessoa turbar ou esbulhar o poder do titular sobre a coisa. Se alguém violar o dever genérico de abstenção, o titular poderá mover a ação correspondente contra quem estiver indevidamente com a coisa. Por isso, os direitos reais são dotados do direito de sequela, que permite ao titular da coisa buscá-la com quem quer que esteja. Exemplificando: se o devedor transferir regularmente – escritura pública de compra e venda, registrada no cartório de registro de imóveis – o terreno para X e, após isso, vender o terreno por meio de um contrato de gaveta para terceiro e este entrar na posse do imóvel, X poderá mover a ação apropriada – ação reivindicatória – para assegurar a sua propriedade e posse. III – A eficácia é inter partes no direito pessoal e erga omnes no direito real, conforme mencionado. Dito de outra forma, a violação do direito subjetivo obrigacional somente autoriza a pretensão em face do próprio devedor (sujeito passivo). Já no direito real, a violação do direito permite ao sujeito ativo exigir a pretensão contra quem o tenha violado. No caso de o transgressor já ter repassado o bem adiante, o credor pode exigir a coisa de quem esteja com ela, em razão do direito de sequela. Exemplificando, se A vender uma moto para B e, antes de entregá-la a B, vender novamente para C, B poderá exigi-la diretamente de C. IV – Enquanto os direitos reais são taxativos, ou seja, estão todos previstos no artigo 1225 do Código Civil, os direitos pessoais são ilimitados, podendo ser livremente criados pelas partes. Quadro 1 – Distinção entre direitos pessoais e reais DE CRÉDITO / OBRIGACIONAIS REAIS I – Relação jurídica interpessoal (credor – devedor); obrigações em geral (dar, fazer, não fazer); I – Poder/relação entre pessoa e coisa (para o seu exercício prescinde-se de ou- tro sujeito) - propriedade; II – Obrigação passiva vinculada ao deve- dor; II – Obrigação passiva universal; Dever geral de abstenção (todos devem respeitar o direito real do outro); III – Eficácia inter partes (o convencionado só produz efeitos entre as partes: credor e devedor); III - Eficácia erga omnes – são oponíveis a todas as pessoas (todos devem respeit- ar; o sujeito passivo identificado somente surge quando há violação ou ameaça concreta – esbulho ou turbação); 15 Aspectos Gerais das Obrigações Capítulo 1 IV – Ilimitado (típicos e atípicos) / autono- mia da vontade. IV - Taxativos – numerus clausus – não admite ampliação pela vontade das partes (art. 1225 CC). Seguem o princípio da legalidade. Fonte: A autora. a) Obrigação propter rem ou ambulatória São as obrigação sui generis, mistas que possuem características tanto do direito real (vincula sempre o titular da coisa) como do direito obrigacional (recai sobre uma pessoa que tem que satisfazer uma prestação). É, portanto, uma obrigação que recai sobre uma pessoa, por força de um direito real. A pessoa assume uma prestação em razão da aquisição de um direito real, ou dito de outro modo, em razão da coisa está obrigada a fazer ou deixar de fazer algo. Segundo Gonçalves (2016), a obrigação propter rem só existe em razão da situação jurídica do obrigado que é de titular do domínio de determinado direito real. Estão inseridas entre os direitos reais e pessoais, possuindo características de ambos. Cumpre recordar que, em regra, os direitos reais não criam obrigações positivas para terceiros, mas apenas o dever genérico de não lesar o direito alheio, enquanto os direitos obrigacionais geralmente surgem de um negócio jurídico entabulado entre credor e devedor. De modo excepcional, a titularidade de um direito real “importará a assunção de obrigações desvinculadas de qualquer manifestação de vontade do sujeito. A obrigação propter rem está vinculada à titularidade do bem, sendo esta a razão pela qual será satisfeita determidada prestação positiva ou negativa” (FARIAS; ROSENVALD, 2017, p. 110). Portanto, as obrigações mistas surgem e se extinguem com o direito real. Exemplos de obrigações propter rem: os direitos de vizinhança, como os deveres impostos aos proprietários e inquilinos de não prejudicarem o sossego ou a segurança dos vizinhos (art. 1277); a obrigação dos condôminos de concorrerem para o pagamento das despesas da coisa comum (art. 1315); o dever de não alterara fachada do prédio (art. 1.336). b) Obrigação com eficácia real (eficácia perante terceiros) São as obrigações que sem perder seu caráter de direito a uma prestação, transmitem-se e são oponíveis a terceiros que adquirem direito sobre determinado 16 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS bem. Certas obrigações alcançam por força de lei a dimensão de direito real. Tem como objetivo dar uma maior segurança jurídica. Exemplos de obrigações com eficácia real são: a) o contrato de locação devidamente registrado na matrícula do imóvel correspondente (art. 576); b) contrato de promessa de compra e venda de imóvel, devidamente registrado na matrícula do imóvel correspondente. Atenção: Contrato não transfere propriedade. O registro é o modo de transferência de bens imóveis. O registro permite a publicidade dos atos e é por esta razão que os direitos reais possuem direito de sequela, que é o direito de pleitear a coisa com quem ela estiver. Os contratos pertencem ao campo dos direitos pessoais, sendo seu descumprimento apenas oponível em face do devedor (sujeito passivo). Todavia, quando um contrato é devidamente registrado na matrícula do imóvel correspondente, ele permite que terceiros tenham acesso à informação ali contida, obrigando terceiros. Exemplificando: se X vender o imóvel a Y por meio de contrato de promessa de compra e venda devidamente registrado no cartório de imóveis e, posteriormente, X vender novamente o imóvel para Z. Supondo que Z ingresse na posse do imóvel, Y poderá requerer o seu direito real sobre o imóvel (art. 1417), ou seja, se o contrato não fosse registrado, só restaria a Y resolver em perdas e danos, como adquiriu o status de direito obrigacional com eficácia real, pode ser oponível perante terceiro (Z). c) Conceito de obrigações O Código Civil não define obrigações, deixando a tarefa para a doutrina. Segundo Farias e Rosenvald (2017, p. 34), em sentido técnico-jurídico, a obrigação relaciona-se com “o vínculo existente entre pessoas, pelo qual uma assume uma prestação em favor da outra, vinculando o seu patrimônio”. No passado, o conceito era centrado apenas na figura do devedor e do credor e o vínculo que os unia. Era visto como uma relação simples de subordinação do sujeito passivo ao sujeito ativo. Contemporaneamente, a relação obrigacional é vista com outros olhos, de forma mais dinâmica, observando a relação por inteiro e exigindo das partes um comportamento idôneo e ilibado, do início das tratativas até a entrega satisfatória da prestação. Ainda há o vínculo entre credor e devedor, porém, o devedor sujeita- se não mais ao credor, mas ao cumprimento da prestação. 17 Aspectos Gerais das Obrigações Capítulo 1 Além disso, não mais interessa apenas o simples cumprimento, mas a forma adequada e esperada de cumprimento, respeitando os prazos, as convenções e os locais de cumprimento, conforme ajustado. Exemplificando: se uma empresa de colocação de outdoors é contratada para colocar três painéis de propaganda pela cidade, de nada adianta colocá- los em locais de pouca circulação de pessoas ou escondidos atrás de arbustos. Apesar do cumprimento, este se deu de forma imperfeita, podendo ser exigido seu cumprimento de modo satisfatório aos interesses do credor. A obrigação passou a ser vista como um processo, tendo em vista a sua complexidade que exige uma série de atividades e comportamentos de ambas as partes, em atendimento não só à entrega da prestação em si, mas também em observância aos deveres anexos ou laterais de conduta, consistentes em respeitar os deveres de informação, lealdade, respeito, probidade, conduta honesta, garantia, deveres de proteção, cooperação a fim de não frustrar as legítimas expectativas de confiança entre os contratantes. Há, portanto, uma diversidade de deveres contidos no vínculo entre credor e devedor, consubstanciada na exigência de uma atuação calcada na boa-fé objetiva. Segundo Clóvis de Couto e Silva (1976, s.p.), “é a finalidade que determina a obrigação como processo”. Dito de outra maneira, a relação obrigacional é uma estrutura dinâmica de processos, não um vínculo estático. É uma ordem de cooperação entre devedor e credor, cuja finalidade é o adimplemento perfeito, que evita danos e aborrecimentos desnecessários de uma parte à outra ao longo de toda a trajetória. Releva anotar que em uma única relação jurídica encontram-se variadas obrigações, “assumindo ambas as partes, em diferentes momentos, o papel de credor e devedor de diferentes obrigações” (FARIAS; ROSENVALD, 2017, p. 36). 18 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS Ilustrativamente, pode-se falar de um contrato de compra e venda de um veículo, enquanto o comprador possui a obrigação de pagar, ao vendedor cabe a entrega da coisa. Neste processo intersubjetivo, vencendo-se a polaridade credor e devedor, a finalidade continua a ser a satisfação dos interesses do credor. Porém, a ordem de cooperação recíproca exigida requer que o cumprimento deva ser feito da maneira mais satisfatória possível a ambas as partes, sem onerar ou dificultar a satisfação de interesses contidos na relação obrigacional. Neste sentido, confirmam Farias e Rosenvald (2017, s.p.), que “é preciso que o próprio credor adote uma posição de cooperação para o adimplemento, permitindo que o devedor se veja liberto do vínculo”. Com efeito, a relação de cooperação exigida entre as partes, requer que o adimplemento ocorra da forma mais satisfatória ao credor e menos onerosa ao devedor. Para aprofundar seus conhecimentos, leia: SILVA, Clóvis V. do Couto. Obrigação como processo. São Paulo, FGV, 2011. Como visto anteriormente, o direito brasileiro adota a teoria dúplice, tratando de forma diversa e separada os direitos reais e obrigacionais. Porém, esta separação é relativa, já que o negócio real depende do negócio obrigacional. Assim, para que o cumprimento da obrigação ocorra de maneira satisfatória, as duas etapas devem ser respeitadas. Portanto, se A se comprometer na obrigação de entregar alguma coisa, já estará se comprometendo com o resultado final que é a transferência da propriedade. Exemplificando: se A vender por meio de promessa de compra e venda uma casa para B, no momento de efetuar a escritura pública de compra e venda não poderá dificultar ou impedir a sua confecção (documento que permitirá o registro efetivo e aquisição do direito real), já que a obrigação é vista como um processo, estendendo-se da obrigação de conduta honesta e cooperativa até a concretização definitiva do direito real. 19 Aspectos Gerais das Obrigações Capítulo 1 No Brasil, enquanto a relação obrigacional objetiva a entrega da prestação, o direito real só se constitui pela tradição (bens móveis) e pelo registro (bens imóveis). E estas etapas dependem do negócio obrigacional que as antecede. Tanto a tradição quanto o registro não constituem novos negócios, tanto que o artigo 1268 prevê que não será transferida a propriedade caso contenha um negócio jurídico nulo. Diferentemente ocorre no direito alemão em que há uma separação absoluta das duas esferas – negócio obrigacional e real – abstraindo-se a causa ao tempo da transmissão. Isto é, concluída a primeira etapa, restará adimplida a obrigação por inteiro. Tanto que se algum problema se verificar na primeira etapa (negócio obrigacional) e já estiver concluída a segunda etapa (negócio real), a anulação ou nulidade do negócio obrigacional não afetará a eficácia do registro, que é um ato independente, abstrato. Já no direito francês e italiano, só uma etapa se verifica, já que seguem a teoria de unificação, ou seja, o contrato entabulado entre as partes é suficiente para transmitir a propriedade (FARIAS; ROSENVALD, 2017). Elementos das Obrigações Trabalhada a definição de obrigação como processo a exigir cooperação entre sujeito ativo e passivo, importa analisar a sua estruturação,ou seja, conhecer os elementos que compõem a relação jurídica. Segundo lição de César Fiuza (2008, p. 290), “a obrigação estrutura-se pelo vínculo entre dois sujeitos, para que um deles satisfaça em proveito do outro, certa prestação”. Do conceito é possível extrair três elementos que são: sujeitos, objeto (prestação) e vínculo. Ou como preferem alguns autores, como Gonçalves (2016, p. 39): a) o subjetivo, concernente aos sujeitos da relação jurídica (sujeito ativo ou credor e sujeito passivo ou devedor); b) o objetivo ou material, atinente ao seu objeto, que se chama prestação; e c) o vínculo jurídico ou elemento imaterial (abstrato ou espiritual). Serão, portanto, trabalhados em tópicos separados cada um dos elementos. Elementos: as obrigações são compostas de três elementos: o elemento subjetivo: relacionado aos sujeitos; o objetivo: relacionado ao objeto; e o vínculo: que une os dois elementos anteriores, como se verá a seguir. 20 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS a) Sujeitos ou elemento subjetivo Os sujeitos da obrigação são o credor (sujeito ativo) e o devedor (sujeito passivo). O credor é aquele que tem o direito de exigir o cumprimento de determinada prestação, já o devedor é aquele que se obrigou a prestá-la. É preciso lembrar, todavia, que as obrigações são complexas em sua maioria e, portanto, as partes são credoras e devedoras reciprocamente, já que a relação negocial cria direitos e deveres. É possível haver pluralidade de sujeitos em qualquer polo da relação, sem descaracterizar a relação dual de sujeito(s) ativo(s) e passivo(s). Quando houver pluralidade de sujeitos, será preciso distingui-la entre obrigação solidária ou divisível ou indivisível, conforme se verá mais adiante. Os sujeitos podem ser pessoas naturais ou jurídicas (de direito público ou privado). As pessoas naturais podem ser capazes ou incapazes, sendo, neste caso, devidamente assistidas ou representadas, a depender da incapacidade, se relativa ou absoluta. Os sujeitos podem ser ainda determinados ou indeterminados, porém os indeterminados precisam ser determináveis no momento do cumprimento da obrigação. É, portanto, uma indeterminabilidade momentânea. Exemplo é o caso do cheque ao portador, a promessa de recompensa, ou um contrato de doação sem identificação do donatário. ● Objeto ou elemento objetivo O objeto se consubstancia em uma conduta humana positiva (de dar ou de fazer) ou negativa (de não fazer). É a chamada prestação. “É a ação ou omissão a que o devedor fica adstrito e que o credor tem o direito de exigir” (GONÇALVES, 2016, p. 41). O objeto da obrigação é o objeto imediato (próximo). O objeto imediato é a prestação de dar, fazer ou não fazer. Já o objeto da prestação, chamado de mediato (distante) está relacionado com a coisa. Exemplo: em um contrato de compra e venda de uma moto, a entrega (obrigação de dar ou de entregar) é o objeto imediato, já o objeto mediato é a moto (o que será entregue). O objeto imediato ou prestação deve observar algumas características essenciais: precisa ser lícito, possível, determinado ou determinável, que são também os elementos gerais de qualquer negócio jurídico (art. 104, CC). 21 Aspectos Gerais das Obrigações Capítulo 1 A licitude requer uma prestação autorizada pelo ordenamento jurídico. No caso de ser ilícita a prestação, será considerado nulo o negócio entabulado. Exemplos de negócios jurídicos com prestação ilícita são os contratos de venda de órgãos ou de venda de entorpecentes. A possibilidade, por seu turno, precisa ser tanto física como jurídica. Se contrariadas estas características, mais uma vez o negócio será considerado nulo. A impossibilidade física relaciona-se com as leis físicas ou naturais, como um contrato de venda de um terreno em Júpiter ou o engarrafamento de todo o ar do universo. Já a impossibilidade jurídica é a que é proibida pelo ordenamento, como os negócios que tenham por objeto a herança de pessoa viva, art. 426, ou um bem público, art. 100, ambos do CC. Precisa ser também determinado ou determinável. Ser determinado significa que a prestação deve estar especificada, detalhada, identificada, certa. Contudo admite também o ordenamento que esta especificação ocorra só mais adiante, no momento do cumprimento, caso da coisa incerta, que deve ser indicada ao menos pela quantidade e gênero, segundo redação do art. 243, CC. Exemplo: cem sacas de milho, sem especificar o tipo. ● Vínculo jurídico ou elemento abstrato ou imaterial O vínculo jurídico é o feche normativo que dá coercibilidade à relação jurídica obrigacional. É o liame existente entre o credor e o devedor. Compõe-se do débito (ex.: dívida – obrigação de pagar do devedor) e da responsabilidade do crédito (possibilidade do credor de exigir judicialmente o pagamento da sua dívida). Com efeito, percebe-se que é o vínculo jurídico que possibilita a exigibilidade de cumprimento da prestação avençada. Caso o cumprimento espontâneo não ocorra, garante-se o cumprimento da obrigação através da atuação do poder judiciário. Ocorrendo atendimento voluntário da prestação, restará adimplido o pacto ajustado entre as partes, que é, sem dúvidas, a finalidade almejada. Contudo, se isso não ocorrer, a pretensão poderá ser exigida judicialmente, ensejando ao credor requerer as medidas coercitivas adequadas ao cumprimento da prestação. O Código Civil trabalha com a ideia de conversão em perdas e danos, porém, o CPC relega esta alternativa somente para os casos de requerimento expresso do autor neste sentido ou no caso de ser impossível a obtenção da tutela específica ou equivalente (art. 499, CPC). 22 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS Não é demais recordar que a satisfação da prestação, seja por meio de cumprimento espontâneo ou coercitivo, atingirá os bens do devedor, não sendo mais permitida a prisão civil. Fontes das Obrigações Fonte no direito significa a origem de uma obrigação, ou de acordo com Gonçalves (2016, p. 46), “é todo o fato jurídico de onde brota o vínculo obrigacional”. Descobrir, desse modo, a fonte das obrigações consiste em classificar os fatos que lhe dão origem, responsáveis pela criação das relações entre credor e devedor. Contudo, essa não é uma tarefa singela, já que o código silenciou a respeito e a doutrina traz inúmeros posicionamentos que a sistematizam de maneiras diversas. Parte considerável da doutrina defende que a lei é fonte primária das obrigações, caso de Álvaro Villaça de Azevedo e Sílvio Rodrigues. Contudo, divergem outros tantos com o argumento de que a lei é sempre fonte imediata das obrigações, inclusive da prestação alimentar que foge deste âmbito de análise. Dentro deste posicionamento, são trazidas as fontes mediatas das obrigações, também classificadas de formas variadas. Para Carlos Roberto Gonçalves (2016, p. 50): A lei, como se disse, é fonte imediata de todas as obrigações. Algumas vezes a obrigação dela emana diretamente, como no caso da obrigação alimentar [...]. Outras vezes, a obrigação resulta diretamente de uma declaração da vontade, bilateral (contrato) ou unilateral (promessa de recompensa etc) ou de um ato ilícito. Percebe-se, portanto, que para o citado, a “obrigação resulta da vontade do Estado, por intermédio da lei, ou da vontade humana, por meio do contrato, da declaração unilateral da vontade ou do ato ilícito” (GONÇALVES, 2016, p. 50). A classificação, trazida por Gagliano e Pamplona Filho (2016, p. 66), já difere da anterior, veja: a) atos jurídicos negociais (o contrato, o testamento, as declarações unilaterais de vontade); b) os atos jurídicos não negociais (o ato jurídico stricto sensu, os fatos materiais – como a situação fática de vizinhança etc.); c) os atos ilícitos (no que se incluem o abuso de direito e o enriquecimento ilícito). 23 Aspectos Gerais das Obrigações Capítulo 1 Atenção: Nestematerial será sugerido que se adote a classificação proposta por Fernando Noronha (2010) que propõe o abandono do critério das fontes para seguir uma classificação conforme às funções das obrigações, que se moldam em três categorias. a) Classificação pela função Para Fernando Noronha (2010, p. 435), mais importante que tentar classificar as obrigações segundo os fatos geradores, que são múltiplos, “é procurar agrupar as inúmeras obrigações da vida real de acordo com a diversidade de funções que elas desempenham na vida real, porque é tal diversidade que implica especificidades no regime jurídico”. Com base neste critério, três são as categorias fundamentais de obrigações do ponto de vista dos interesses tutelados: as negociais, de responsabilidade civil e de enriquecimento sem causa. ● Obrigações negociais As obrigações negociais representam a maior parte das obrigações encontradas e resultam da prática de um ato de autonomia privada voluntariamente assumida por dois sujeitos para alcançar os efeitos pretendidos, ou seja, é o poder concedido às pessoas de estabelecerem e regulamentarem os seus interesses. As obrigações negociais surgem por meio de contratos (negócios bilaterais) ou negócios unilaterais. Os primeiros requerem manifestações de duas ou mais partes, já os segundos surgem da declaração unilateral de vontade, como a promessa de recompensa (art. 854 e ss, CC) ou o pagamento indevido (art. 876 e ss, CC). Nas obrigações negociais a obrigação fundamental é o adimplemento da prestação ajustada; quando ela não é cumprida espontaneamente surge a pretensão que pode ser exigida judicialmente. 24 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS ● Responsabilidade civil A responsabilidade civil é uma outra categoria de obrigações que resulta no dever de indenizar os danos causados a outrem em decorrência do cometimento de atos ilícitos (art. 186, 187 c/c 927, CC). Exemplificando: se o condutor de um veículo atropelar um pedestre que se encontra na faixa de segurança, terá a obrigação de reparar o prejuízo por este sofrido. É visível a diferença entre as obrigações negociais e a responsabilidade civil. Na primeira, a prestação a ser cumprida é assumida voluntariamente entre as partes e caso não seja cumprida espontaneamente, ensejará o seu cumprimento coercitivo. Já na responsabilidade civil é estabelecido apenas um dever genérico de não lesar, eis que não há um vínculo anterior que una as partes. Somente após o dano é que surge a obrigação de reparação. Apenas para lembrar, importa anotar que o dever de indenizar pode ocorrer mediante à comprovação da culpa, na responsabilidade subjetiva ou independentemente de culpa na responsabilidade objetiva. ● Enriquecimento sem causa Consiste na restituição do acréscimo patrimonial indevido (art. 884, CC). Segundo Fernando Noronha (2010, p. 443), “indevidos porque, segundo a ordenação jurídica de bens, deveriam ter acontecido noutro patrimônio (ao qual estavam juridicamente reservados)”. Farias e Rosenvald (2017) trazem uma consideração importante com base nas lições de Giovanni Ettore Nanni de que a classificação do enriquecimento sem causa, pelo Código Civil, dentre os atos unilaterais, não é o mais correto, já que deveria ser tratado como fonte autônoma. Exemplo trazido por Fernando Noronha (2010, p. 443-444) para o enriquecimento sem causa é a do escultor que transforma em estatueta um bloco de mármore “do qual de boa-fé se julga dono, e que terá que restituir ao proprietário do bloco o valor deste. A estatueta é do artista, mas o valor do bloco terá de ser reintegrado no patrimônio de quem era proprietário deste”. 25 Aspectos Gerais das Obrigações Capítulo 1 Atenção: Explicadas as obrigações pelas funções desempenhadas, é preciso esclarecer que este livro tratará apenas das obrigações negociais, cujas modalidades serão abordadas no capítulo a seguir. b) Relações obrigacionais: o civil, o empresário, o consumidor Cumpre deixar claro que as obrigações negociais, embora tenham um campo abrangente, possuem regramentos distintos a depender do conteúdo que encerram. O tratamento dado pelo Código Civil, objeto deste livro, possui um âmbito de aplicação restrito às relações travadas entre particulares – intercivis e interempresariais – não regulamentando as relações consumeristas. Sempre que tiver uma negociação envolvendo relação de consumo, ela seguirá um regramento próprio, preconizado pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8078/90). Farias e Rosenvald (2017, p. 60) trazem uma consideração relevante sobre isso: Todavia, o status de cada um desses personagens é essencialmente dinâmico. Aquele sujeito de direito que em determinada relação obrigacional desempenha o papel de empresário poderá atuar como civil em outro contrato, nada impedindo que em algum momento se identifique como consumidor. O mesmo tipo contratual ensejará aplicação de normas distintas, conforme a mutação subjetiva e finalística da hipótese de incidência. Quer dizer, a igualdade ou a diferença serão visualizadas na concretude do caso, de acordo com o papel a ser desempenhado pelo agente econômico comparativamente ao outro agente econômico de determinada relação jurídica. Um contrato de compra e venda será civil, empresarial ou de consumo conforme a posição que se encontre naquela obrigação específica. Com efeito, deve-se prestar atenção ao tipo de negociação realizada e os sujeitos envolvidos a fim de saber identificar qual regra incidirá. Por exemplo: se A adquiriu um produto em uma loja e está tendo problemas com a entrega, a solução será fornecida pelo CDC, já que se trata de relação de consumo. Agora, se A adquirir o produto de seu vizinho, por exemplo, que não é fornecedor, mas um mero particular, e encontrar o mesmo problema de entrega, a resolução será encontrada no Código Civil. É preciso ficar atento! 26 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS É assim por conta do tratamento especial dado aos vulneráveis que exigem tratamento diferenciado, como também acontece nas relações trabalhistas, tratadas especificamente pela Consolidação das Leis do Trabalho. Para recordar ou aprofundar os conceitos de consumidor, fornecedor e relação de consumo, ver MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. O capítulo chegou ao fim e é preciso resgatar a ideia central aqui trabalhada que refletirá no conhecimento de todo este livro. Para tanto, proponho uma atividade de estudo que deve ser realizada com afinco. Bons estudos! Atividade de Estudos: 1) Houve uma significativa alteração no conceito de obrigação que mudou a forma de tratá-la e estudá-la, ressignificando não apenas a teoria, mas também a prática. Em que consiste a mudança? Justifique. _______________________________________________ _______________________________________________ _______________________________________________ _______________________________________________ _______________________________________________ _______________________________________________ _______________________________________________ _______________________________________________ 27 Aspectos Gerais das Obrigações Capítulo 1 Algumas Considerações O primeiro capítulo, portanto, introduz as relações obrigacionais e apresenta as suas nuances, além de tratar sobre a visão contemporânea de obrigação como processo em que as partes de uma relação obrigacional devem agir de acordo com os parâmetros da boa-fé durante toda a negociação. Além disso, foi visto o que compõe uma obrigação, seus elementos e suas fontes para agora, no próximo capítulo, tratarmos sobre as modalidades obrigacionais. Referências BRASIL. Código civil e normas correlatas. 7. ed. Brasília: Senado Federal, Coordenação de Edições Técnicas, 2016. COUTO E SILVA, Clóvis V. do. Obrigação como processo. São Paulo: Bushatsky,1976. FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: obrigações. Salvador: Jus Podivm, 2017. Fiuza, César. Direito civil: curso completo. 11ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: obrigações. São Paulo: Saraiva: 2016. GOMES, Orlando; BRITO, Eduardo. Obrigações. 18. ed. rev., atual e aum. Rio de Janeiro: Forense, 2017. GONÇALVES, Carlos Roberto. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral das obrigações. São Paulo: Saraiva, 2016. NORONHA, Fernando. Direito das obrigações. São Paulo: Saraiva, 2010. 28 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS CAPÍTULO 2 Modalidades das Obrigações A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: � Compreender os diversos tipos de obrigações e todas as suas características e elementos centrais. � Aplicar adequadamente o Direito obrigacional em cada modalidade específica. � Distinguir os variados tipos de obrigações. 30 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS 31 Modalidades das Obrigações Capítulo 2 Contextualização Há no Código Civil inúmeras modalidades de obrigações, todas trabalhadas em capítulos específicos para facilitar o regramento dado a cada uma delas. A doutrina costuma agrupá-las em categorias, embora essa classificação seja apresentada em enquadramentos distintos, segundo diversos critérios adotados por cada autor, não havendo unanimidade classificatória. Apesar disso, os diferentes critérios não são um problema já que interagem e se inter-relacionam, ou seja, são complementares e não excludentes (FARIAS; ROSENVALD, 2017, p. 170). Gonçalves (2016, 53-56), de forma bem didática, agrupa-as da seguinte maneira: ● Em função de seu objeto: obrigação de dar, que se subdivide em obrigação de dar coisa certa e de dar coisa incerta; obrigação de fazer e obrigação de não fazer. ● Quanto a seus elementos: obrigações simples e complexas, também chamadas de compostas. As obrigações complexas dividem-se pela multiplicidade de objetos (cumulativa e alternativa) e pela multiplicidade de sujeitos (divisíveis, indivisíveis e solidárias). ● Quanto à sua exigibilidade: civis e naturais. ● Quanto ao fim: de meio, de resultado e de garantia. ● Quanto ao momento de cumprimento: de execução instantânea, diferida e periódica ou de trato sucessivo. ● Quanto aos elementos acidentais: puras, condicionais, a termo e com encargo ou modais. ● Quanto à liquidez do objeto: líquidas e ilíquidas. No presente material será trabalhada cada modalidade de obrigação separadamente, porém, referindo-se à classificação anterior. O objetivo do capítulo destina-se, portanto, à percepção e compreensão de cada um dos tipos de obrigações, habilitando o aluno a identificar e classificar as obrigações de modo a aplicar as corretas resoluções e regramentos. Obrigação de Dar As obrigações em função de seu objeto (dar, fazer e não fazer) são a base para todo tipo de obrigação, porquanto qualquer obrigação que venha a ser constituída abrangerá invariavelmente uma dessas três condutas. As obrigações de dar e de fazer são positivas, pois exigem um comportamento ativo, já as obrigações de não fazer são negativas, pois baseiam-se em atos de abstenção. 32 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS a) Sobre a obrigação de dar Conceito: a obrigação de dar, cujo objeto é a prestação de coisas, consiste na atividade de dar (entregar) ou restituir um objeto. Pode ser uma obrigação de dar ou entregar coisa certa ou incerta com previsão de regramentos distintos para cada modalidade caso não ocorra o cumprimento espontâneo. Figura 1 - Obrigação de dar coisa certa ou incerta Fonte: A autora. Das obrigações de dar Propriamente dita/entrega (arts. 233 a 237 CC) (arts. 243 a 246, CC) Restituição (arts. 238 a 242, CC) Coisa Incerta Coisa certa Alguns autores, como Gagliano e Pamplona Filho (2016, p. 80), tratam de forma distinta a obrigação de dar e de entregar, tratando a obrigação de dar como a transferência de propriedade e a obrigação de entregar como transferência da posse ou detenção. Neste material serão utilizadas as expressões de dar e de entregar como sinônimos tanto de transferência de propriedade quanto de detenção ou posse. Destarte, a obrigação de dar ou entregar implica na transferência de coisas do devedor ao credor (lembrar que na compra e venda o vendedor deve pagar a coisa e o comprador deve entregá-la), enquanto a obrigação de restituir consiste na devolução da coisa recebida pelo devedor ao credor. Exemplos: ● Obrigação de dar ou entregar – compra e venda de uma bicicleta, de um celular, de um terreno etc. ● Obrigação de restituir: comodato (empréstimo de coisa infungível), mútuo (empréstimo de coisa fungível) da coisa pelo devedor ao credor. 33 Modalidades das Obrigações Capítulo 2 Atenção: Na visão de obrigação como processo, a prestação não se resume à obrigação de prestar (dar ou restituir), mas também ao resultado da prestação – guardar a coisa vendida, embalar, transportar, entregar a coisa sem avarias ou danos – porquanto a relação obrigacional é direcionada para uma finalidade específica, consistente no adimplemento que satisfaça aos interesses do credor. Lembre-se, ainda, como já visto no primeiro capítulo, de que no direito brasileiro, embora o direito real e obrigacional sejam tratados em planos distintos, a sua separação não é absoluta, já que o negócio dispositivo (real) depende do obrigacional. Exemplificando: Na transferência de propriedade isso fica bem evidente. Se A vender para B um imóvel já na fase da negociação (direito obrigacional), o desejo de B é poder se tornar proprietário do referido bem. Assim, A deve agir durante toda a relação obrigacional, de modo a permitir que a transferência de propriedade se concretize. Portanto, não basta apenas entregar o imóvel para B e depois dificultar a confecção da escritura pública, documento que permitirá o registro e aquisição do bem. Em relação aos bens móveis, as duas etapas praticamente se confundem já que a entrega finaliza o negócio obrigacional e também inicia o direito real que, neste caso, ocorre pela simples tradição. A tradição pode ser real – entrega efetiva –, simbólica – quando representada por um ato, exemplo, entrega das chaves, na compra de um veículo –, ou ficta – caso do constituto-possessório. ● Obrigação de dar coisa certa propriamente dita ● Objeto mediato da obrigação de dar coisa certa sempre será algo determinado que contenha características que o individualizem. Exemplos: compra e venda de um terreno com especificações e localização; aluguel de um veículo devidamente discriminado. ● Na obrigação de dar coisa certa, o devedor deve entregar exatamente o que se obrigou, não podendo entregar outra ainda que mais valiosa (art. 313, do CC), por sua vez, o credor também não pode exigir coisa diversa do pactuado. 34 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS ● Preconiza o artigo 233 do CC que a obrigação principal (existência própria) também abrange os acessórios (depende do principal), embora não mencionados no acordo, exceto se o contrário resultar do título ou das circunstâncias do caso. Assim, no silêncio do contrato, na venda de vacas prenhas estão incluídos os filhotes; já na venda de uma fazenda não estão incluídos os animais destinados à produção. O conceito de bens acessórios compreende: os frutos (utilidades produzidas periodicamente por uma coisa, ex.: frutas, crias, juros), os produtos (são as utilidades que se extraem de uma coisa, diminuindo a quantidade, ex.: metais e pedras) e as benfeitorias (obras realizadas na estrutura da coisa, ex.: piscina, troca de telhado). Para autores como Gagliano e Pamplona Filho (2016), inclui-se nos acessórios ainda as pertenças (coisas destinadas a conservar ou facilitaro uso das coisas principais, ex.: aparelho de ar-condicionado, máquinas utilizadas em uma fábrica) e as partes integrantes (bens que unidos ao principal formam um todo, como a lâmpada em relação ao lustre). Já para outros, como Farias e Rosenvald (2017a), as pertenças e partes integrantes não são bens acessórios em que pese serem subordinadas ao bem principal. Para além dessa discussão, o importante é destacar que consideradas ou não como bens acessórios, as pertenças possuem um regramento próprio, segundo a regra prevista no art. 94 do CC que a disciplina, os “negócios jurídicos que tratam sobre o bem principal não abrangem as pertenças”. Então é fundamental exclui- las da regra prevista no art. 233, CC. São exemplos de pertenças: as máquinas agrícolas, os tratores e os animais utilizados no preparo, plantio e colheita da produção; os elevadores, as instalações elétricas, os espelhos, os tapetes de uma casa, as máquinas e equipamentos utilizados em uma indústria. Além disso, o autor não considera como pertenças os móveis de uma casa, os instrumentos de trabalho e os livros da biblioteca. Já Farias e Rosenvald (2017b, p. 541-542) consideram como pertenças os animais que auxiliam na produção, o aparelho de som do carro, bem como os móveis de uma fazenda, afirmando que não seguem a sorte do bem principal. Em que pese a divergência, em relação aos móveis, na prática, dificilmente se verá um contrato que não disponha sobre a inclusão ou exclusão deles. 35 Modalidades das Obrigações Capítulo 2 – Por sua vez, o art. 237 do CC prevê que “até a tradição pertence ao devedor a coisa, com seus melhoramentos e acrescidos”. Lembra Gonçalves (2016, p. 65) que “como no direito brasileiro o contrato, por si só, não transfere o domínio, mas apenas gera a obrigação de entregar a coisa alienada, enquanto não ocorrer a tradição, na obrigação de entregar, a coisa continuará pertencendo ao devedor”. Diante da situação descrita, poderá o devedor “exigir aumento no preço; se o credor não anuir, poderá o devedor resolver a obrigação” (art. 237, CC). Exemplo: venda de uma casa que será entregue em quinze dias e, neste meio tempo, a casa é atingida por um vendaval e o vendedor precisa efetuar a troca do telhado (benfeitoria necessária). Neste caso, incide a regra. Atenção: Não confundir o art. 233 do CC com o art. 237, CC. A primeira regra refere-se aos acessórios existentes ao tempo do pacto. Já a regra do art. 237, CC somente é aplicável em relação aos melhoramentos e acréscimos que forem constituídos entre a negociação e seu cumprimento. Além disso, para incidir na situação fática, os melhoramentos e acréscimos devem ter sido constituídos onerosamente (art. 242, CC). Caso tenham ocorrido sem despesas ou trabalho do devedor, não caberá indenização (art. 241, CC). O conceito de melhorias previsto no artigo é bem abrangente, compreendendo as benfeitorias e acessões. Contudo, a regra exige bom senso e razoabilidade no que se concorda com Farias e Rosenvald (2017, p. 186), de que a indenização só é cabível se as benfeitorias e melhoramentos forem necessárias ou úteis e efetuadas de boa-fé. “Realmente, o devedor não poderá ser premiado pelo comportamento de má-fé muitas vezes utilizado para constranger o credor a aumentar o valor do negócio, ou mesmo para inviabilizá-lo” (FARIAS; ROSENVALD, 2017a, p. 187). 36 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS Em relação aos frutos, dispõe o parágrafo único do art. 237, CC de que pertencem os frutos percebidos ao devedor e os pendentes ao credor. Exemplo: no caso de comodato (empréstimo de coisa infungível). Se foi autorizado ao comodatário perceber os frutos da árvore que integram o imóvel, terá direito de colhê-los e consumí-los até o fim do contrato; já os que ainda estiverem pendentes ao tempo da devolução do imóvel, pertencerão ao proprietário (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2016, p. 83). Dica: se você estiver com dificuldades nos conceitos dos bens acessórios, retome-os nos livros na Parte Geral de Direito Civil. ● Consequências da não entrega É obrigação do devedor zelar e cuidar da coisa até a sua entrega. Porém, se apesar disso se verificar que a não entrega ocorreu por perecimento (perda completa do bem) ou deterioração (perda parcial), se foi com culpa ou sem culpa do devedor, diferentes consequências ocorrerão. Lembre-se de que os riscos correm por conta do vendedor até a entrega! * Perecimento: perecimento é perda da coisa pelo seu desaparecimento ou perda das qualidades essenciais ou valor econômico. Sem culpa do devedor: se a coisa se perder sem culpa do devedor (coisa destruída por uma inundação, raio, incêndio, roubo), resolve-se a obrigação para ambos (art. 234, CC), ou seja, se a coisa perecer sem culpa antes da tradição, ou pendente condição suspensiva (art. 125, CC), a obrigação se extingue para ambas as partes que retornam ao status quo ante. Exemplificando: se A e B efetuam contrato de compra e venda e a coisa perecer sem que o preço da coisa tenha sido entregue, fica por isso mesmo, já que se nada foi adiantado não há o que restituir; porém, se o vendedor já recebeu o preço da coisa e ela se perder, deve devolver a quantia recebida, mas não estará obrigado a pagar perdas e danos. Em caso de pendência de condição suspensiva (negócio subordinado a um casamento, formatura, conquista de um prêmio etc.), o direito ainda não foi adquirido, razão pela qual o devedor suportará o risco. 37 Modalidades das Obrigações Capítulo 2 Com culpa do devedor: a culpa acarreta a responsabilidade por perdas e danos. Neste caso, o credor tem o direito de receber o seu equivalente (em dinheiro), além das perdas e danos (dano emergente e lucro cessante), se for o caso (art. 234/402, CC). Exemplo: A vendeu sua bicicleta para B com pagamento à vista, porém, a entrega foi combinada para a semana seguinte. Na tentativa de entregá-la, A resolveu transportá-la na traseira de sua camioneta, sem os devidos cuidados. No caminho, em excesso de velocidade e dirigindo embriagado, sofreu um grave acidente, perecendo o veículo e a bicicleta que foram incendiados. Desse modo, A não só assumirá os riscos da perda, como terá que indenizar eventuais prejuízos decorrentes do não cumprimento da obrigação. Isto é, B terá direito a receber o dinheiro de volta, além de eventuais perdas e danos por ele sofridos e devidamente comprovados. Farias e Rosenvald (2017, p. 183) explicam que “nas perdas e danos estarão compreendidos apenas os lucros cessantes, já que o dano emergente seria o próprio dinheiro pago pelo objeto”. Acreditamos, contudo, que o dano emergente vai além do próprio equivalente. Por exemplo, se no caso exemplificado B adquiriu a bicicleta com intuito de participar de um torneio de ciclismo e já tiver pago a inscrição e, em razão da não entrega por A, B não puder participar da competição, restará comprovado o prejuízo efetivo. * Deterioração: perda parcial. Sem culpa: se a coisa se deteriorar, sem culpa do devedor (vendedor), poderá o credor (comprador) optar entre (art. 235, CC): a) resolver a obrigação, por não lhe interessar o bem danificado; b) ou aceitá-la no estado em que se encontra, com abatimento do preço. Exemplo: A vende para B a sua moto, prometendo entregá-la no dia seguinte. No dia da entrega, um veículo colide com a moto, quebrando o espelho retrovisor, sem qualquer culpa do motoqueiro. Neste caso, B poderá escolher entre as duas alternativas. Lembre-se de que resolver a obrigação significa retornar ao estado anterior, isto é, se já tiver efetuado o desembolso do preço, terá direito a recebê-lo de volta, senão, fica tudo como está. Com culpa: se a coisa se deteriorar com culpa do devedor (art. 236, CC), poderá o credor optar entre: a) resolver a obrigação, exigindo o equivalente (caso adiantado o pagamento), mais perdas e danos (se tiver); b) ou aceitar a coisa com abatimento de preço,porém com direito à indenização por perdas e danos. 38 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS Exemplo: se no caso do exemplo anterior a quebra do espelho retrovisor for provocada pela conduta culposa de A, que colide contra o veículo. Também neste caso, B poderá resolver a obrigação, exigindo a devolução do dinheiro (caso tenha adiantado o preço), além de eventuais perdas e danos, ou poderá aceitar a moto (cumprimento da tutela específica), com redução de preço, mais perdas e danos. Reflexão: Farias e Rosenvald (2017b) defendem que se a deterioração tiver sido de pequena monta, não caberia ao credor a opção de exigir a resolução do contrato, pois ofenderia o princípio da proporcionalidade, além de resultar em abuso do direito, segundo a teoria do adimplemento substancial ou inadimplemento mínimo. Esta é uma visão que pode ser considerada recente e depende do entendimento dos julgadores. Há, ainda, muita controvérsia na aplicação da teoria do adimplemento substancial. Teoria do adimplemento substancial: aplica-se aos casos em que há o cumprimento de grande parte da obrigação contraída. Se isso ocorrer, a aplicação da teoria não permite a outra parte pedir a resolução do contrato, isto é, prega a teoria que nas hipóteses em que o contrato tiver sido quase todo cumprido, não caberá sua extinção, mas apenas outros efeitos jurídicos, visando sempre à manutenção da avença. A teoria consagra os princípios da conservação do negócio jurídico e da boa-fé contratual. b) Obrigação de restituir Conceito: consiste na obrigação de devolver coisa alheia que se encontra em poder do devedor por força de estipulação contratual. Nas palavras de Gonçalves (2016, p. 72): Caracteriza-se pela existência de coisa alheia em poder do devedor, a quem cumpre devolvê-la ao dono. Tal modalidade impõe àquele a necessidade de devolver coisa que, em razão de estipulação contratual, encontra-se legitimamente em seu poder. É o caso do depositário (devedor) que deve restituir ao depositante aquilo que recebeu para conservar. Assim como a obrigação do locatário em devolver o bem, findo o contrato; do comodatário entre outros. 39 Modalidades das Obrigações Capítulo 2 Atenção: a locação apesar de constituir uma obrigação de restituir, possui regramento próprio (Lei de Locação). Relembrando as regras das benfeitorias: Nas benfeitorias úteis e necessárias, o devedor tem direito de ser indenizado, podendo reter a coisa até o pagamento da indenização. Nas benfeitorias voluptuárias, poderá o devedor levantá-las, se não lhe for pago o valor devido. Se estiver de má-fé, só terá direito o devedor a reclamar indenização, sem direito à retenção. Caso o bem não seja restituído voluntariamente no tempo certo e a coisa vier a se perder sem culpa do devedor, o prejudicado será o credor, que é o dono da coisa. ● Consequências do não cumprimento * Perecimento: Sem culpa do devedor: se a coisa se perder antes da tradição (238, CC), o credor (dono) sofrerá a perda, com resolução da obrigação, ressalvados os seus direitos até o dia da perda. Exemplo: se o tênis emprestado for objeto de roubo, o proprietário sofrerá a perda, resolvendo-se a obrigação. A última parte do dispositivo garante ao proprietário os seus direitos até o dia da perda, assim, por exemplo, se A alugou uma prancha que veio a ser destruída por um raio, a negociação se resolve. Supondo que o aluguel tenha sido por cinco dias e que A utilizou-a durante dois dias até o seu perecimento, terá o locador direito a receber os dois dias de aluguel. Já se a coisa a ser restituída teve melhoramentos ou acréscimos, sem trabalho do devedor, lucrará o credor, sem ter que indenizar, segundo o art. 241, CC. Se, por exemplo, A emprestou uma galinha para B e esta colocar ovos, estes deverão ser entregues ao proprietário. Já se o melhoramento provém do trabalho do devedor, aplica-se a regra das benfeitorias (art. 1.219, CC), segundo artigo 242, CC. 40 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS Exemplo: No caso de uma casa emprestada, se o vidro da janela quebra e você efetua a troca, pode exigir o valor despendido, se o proprietário não quiser pagar, terás direito de retenção até o efetivo pagamento. Em relação aos frutos percebidos, prevê o parágrafo único do artigo 242, CC que se aplicam as mesmas regras do possuidor de boa ou má-fé. Para entender, é preciso recordar da regra trazida pelo art. 1.214, parágrafo único, do CC que dispõe ter o possuidor direito aos frutos percebidos se estiver de boa-fé, cabendo ao proprietário os pendentes. Caso já tenham sido colhidos, devem ser restituídos. Com culpa do devedor: se a coisa se perder com culpa (art. 239, CC), obriga-se o devedor a pagar o equivalente, além das perdas e danos. Exemplo: locação de um computador portátil que acaba sendo furtado por negligência do locatário. Caberá ao locatário pagar o valor do computador, acrescido eventualmente de perdas e danos. * Deterioração: Sem culpa do devedor: se a coisa se deteriorar sem culpa do devedor, “recebê-la ao credor tal qual se ache, sem direito à indenização” (art. 240, CC). Exemplo: se A emprestar um livro para B e este retornar com uma página manchada de café causada por um fortuito, A receberá o livro no estado em que se encontra. Com culpa do devedor: “se a coisa a ser restituída se deteriorar com culpa do devedor, obriga-se este a pagar o equivalente, além das perdas e danos” (parte final do art. 240, CC). Exemplo: se A empresta a B um livro e este arrancar várias páginas em um momento de raiva, deverá B ressarcir a A o valor do livro, além de eventuais perdas e danos. 41 Modalidades das Obrigações Capítulo 2 Atenção: o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) emitiu o enunciado nº 15 que preconiza que as disposições do art. 236 do CC também são aplicáveis às hipóteses do art. 240 in fine, CC, isto é, o enunciado permite ao credor receber a coisa no estado em que se encontra, com direito a perdas e danos, no caso de deterioração de coisa, com culpa do devedor. O enunciado faz sentido já que o proprietário tem o direito de escolher o que melhor lhe aprouver. c) Obrigação de dar coisa incerta Conceito: a obrigação de dar coisa incerta será identificada, ao menos, pelo gênero e quantidade (art. 243, CC). A indeterminação é apenas relativa ou parcialmente incerta e não absoluta ou totalmente incerta, já que para que possa ser cumprida deve, obrigatoriamente, indicar a quantidade (ex.: cem quilos, duas sacas, cinquenta alqueires etc.) e o gênero. Se faltar qualquer um dos dois indicativos, a avença não gerará obrigação de cumprimento. Parte da doutrina critica a expressão gênero, entendendo que o legislador deveria ter dito espécie, em razão de gênero ser muito abrangente, dificultando o seu cumprimento. Assim, não seria possível efetuar um contrato de cem sacas de cereais (gênero), mas somente cem sacas de milho (espécie), faltando apenas indicar a qualidade. A obrigação é incerta somente no momento da sua origem, devendo se transformar em obrigação certa no momento de seu cumprimento. Dito de outra forma, a obrigação de dar coisa incerta transforma-se em obrigação de dar coisa certa, no instante do adimplemento. 42 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS O estado de indeterminação é transitório e cessará com a escolha. A escolha, também chamada de ato de concentração, é o momento da cientificação da outra parte, do objeto a ser entregue. Neste momento, a obrigação converte-se em obrigação de dar coisa certa, nos termos do artigo 245 do CC “cientificado da escolha o credor, vigorará o disposto na seção antecedente”. Importante observar que a fase da concentração exige não só a escolha, mas também a cientificação da outra parte do que foi escolhido. E a quem cabe a escolha? O art. 244, CC fornece a resposta, indicando caber ao devedor a escolha, se o contrário não tiversido pactuado. Porém, a escolha não é totalmente livre, disciplinando o artigo à observância de limitações, no sentido de que não poderá o devedor dar a coisa pior, assim como não está obrigado a entregar a melhor. A concentração pauta-se pelo critério da qualidade mediana ou intermediária da coisa. Isso se tiver pelo menos três espécies, pois se somente tiver duas, poderá entregar qualquer delas, sob pena de inexistir escolha. Se for necessário judicializar, o procedimento de escolha encontra-se previsto no art. 811 do CPC, indicando que se a escolha couber ao devedor, este será citado para entregar o bem já especificado; já se couber ao credor, a indicação deverá ser feita na petição inicial. * Perda ou deterioração: Na obrigação de dar coisa incerta, a perda ou deterioração possui dois momentos diferentes de avaliação e consequências, a saber: Antes da escolha: não poderá o devedor alegar perda ou deterioração antes da escolha, ainda que por caso fortuito ou força maior (art. 246, CC). Assim, é em razão da indeterminação da coisa que está apenas identificada pelo gênero e quantidade, pois “o gênero nunca perece” (GONÇALVES, 2016, p. 83). Ex.: obrigação de entregar dez sacas de café. Como pode ser possível alegar perda se não se sabe quais dez sacas seriam entregues? Ainda que a obrigação seja de entregar dez cabeças de gado e faleçam todos os gados do devedor, não restará desobrigado do cumprimento, já que poderá adquirir outros dez bovinos para cumprir a obrigação. 43 Modalidades das Obrigações Capítulo 2 Contudo, se a obrigação tiver sido estipulada com determinação do local da coisa, dívida genérica restrita (como a chamam Farias e Rosenvald (2017b)), a conclusão será outra. Exemplo: se a obrigação for de entregar dez cabeças de gado, localizadas na Fazenda X, e todos se perderem por motivo de força maior, a obrigação restará extinta. Portanto, a solução para as obrigações de dar coisa incerta, que se achem circunscritos a determinado local, devidamente especificado, acarretará na resolução da obrigação, no caso de ser perderem sem culpa do devedor, enquanto as obrigações de dar coisa incerta, indicadas apenas pela quantidade e gênero, antes da escolha, não aceitam alegação de perda ou deterioração. Depois da escolha: depois do momento de concentração (escolha e cientificação), a obrigação se converte em obrigação de dar coisa certa e as regras aplicáveis serão as mesmas da perda ou deterioração da obrigação de dar coisa certa (arts. 238 a 240, CC): - Perecimento sem culpa: se resolve. - Perecimento com culpa: equivalente mais perdas e danos. - Deterioração sem culpa: resolver ou aceitar a coisa com abatimento do preço. - Deterioração com culpa: equivalente ou aceitar a coisa mais perdas e danos. Obrigação de Fazer Conceito: o interesse do credor está centrado na conduta do devedor que implica na prestação de serviço ou alguma outra atividade do devedor. O objeto prestacional pode ser tanto a realização de serviço de natureza física (ex.: contrato de empreitada); intelectual (ex.: composição de uma música, poema, peça de teatro) ou prática de ato jurídico que requer uma emissão de vontade (como a outorga de escritura pública). Atenção: A obrigação de fazer se diferencia da obrigação de dar “em razão da preponderância de atos para a realização da prestação, devendo-se verificar se o dar é ou não consequência do fazer” (MONTEIRO, 2017, p. 89). 44 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS Se a prestação consiste além de o devedor entregar a coisa, o dever de confeccioná-la, será obrigação de fazer. Se a coisa já estiver pronta e a prestação for apenas de entrega, a obrigação será de dar. Exemplos: entregar um quadro que será feito pelo próprio devedor – obrigação de fazer; entregar uma bicicleta, que já pertence ao devedor – obrigação de dar. Há situações em que ambas as obrigações serão simultâneas, caso do contrato de empreitada, em que a prestação de materiais é obrigação de dar e a efetivação do serviço é obrigação de fazer. Em resumo, afirma Gonçalves (2016. p. 86): Nas obrigações de entregar, concentra-se o interesse do credor no objeto da prestação, sendo irrelevantes as características pessoais ou qualidades do devedor. Nas de fazer, ao contrário, principalmente naquelas em que o serviço é medido pelo tempo, gênero ou qualidade, esses predicados são relevantes e decisivos. A distinção entre as obrigações de dar e de fazer é relevante, já que as consequências para ambas são distintas, principalmente as medidas processuais, cabendo a aplicação de multa diária em caso de descumprimento da obrigação, apenas no caso de obrigação de fazer. Algumas obrigações deixam dúvidas na sua classificação e, por vezes, são alvo de disputas judiciais, caso do depósito obrigatório das empresas dos valores de FGTS de seus funcionários. Durante muito tempo houve a discussão se a obrigação é de dar ou de fazer, o enunciado do Conselho Federal de Justiça (CFJ) é no sentido de se tratar de obrigação de dar. a) Espécies de obrigações As obrigações de fazer podem ser personalíssimas ou não personalíssimas, a depender se podem ou não ser cumpridas por terceiro. Personalíssima, infungível ou intuitu personae: o credor está interessado na qualidade específica do prestador do serviço, por essa razão a obrigação só poderá ser desempenhada pelo próprio devedor, que só se exonera de cumprir o avençado. Exemplo: a contratação de um cantor específico para realização de show, a contratação de um determinado cirurgião plástico, a contratação do advogado X. Impessoal ou fungível: o credor está apenas interessado no serviço realizado e não na pessoa que irá realizá-lo. Exemplos: contratação de profissionais para a construção de um muro, da pintura da casa, da troca do encanamento etc. Neste caso, havendo recusa do devedor em prestá-la, poderá o credor mandar executar por terceiro. 45 Modalidades das Obrigações Capítulo 2 b) Inadimplemento As obrigações de fazer podem ser inadimplidas porque a prestação tornou- se impossível, com culpa ou sem culpa do devedor, ou também porque, podendo ser cumprida, o devedor se recusa a prestá-la. ● Não cumprimento mediante recusa (art. 247, CC) Nesse caso o cumprimento ainda é possível, porém o devedor se recusa à prestação só a ele imposta ou só por ele exequível. A previsão do Código Civil é no sentido de que o devedor será obrigado a indenizar as perdas e danos. Exemplo: se é contratado um escultor famoso para confeccionar uma obra de arte e ele se recusa, deverá indenizar o contratante pelos prejuízos sofridos. Atenção: O Código de Processo Civil alerta de que a obrigação somente será convertida em perdas e danos se o autor a requerer ou se impossível a tutela específica ou obtenção da tutela pelo resultado prático equivalente (art. 497, CPC). Para isso, contempla medidas específicas que obrigam o devedor a cumpri-las, a teor do art. 536 do CPC: Art. 536 No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente. § 1º Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial. Poderá a parte insistir no cumprimento específico da obrigação e também neste caso pleitear cumulativamente as perdas e danos que eventualmente tenha sofrido pela demora no cumprimento, a teor do art. 500, CPC. 46 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS Com efeito, a regra quanto ao descumprimento da obrigação de fazeré o da execução específica, sendo a resolução em perdas e danos à exceção, podendo ser pleiteada sozinha ou em conjunto com o cumprimento obrigacional. ● Impossibilidade superveniente da prestação nas obrigações pessoais ou infungíveis Se a obrigação não puder ser cumprida por impossibilidade de sua prestação, diferentes consequências são previstas para o caso de terem ocorrido com ou sem culpa do devedor. Todavia, a impossibilidade do objeto ou prestação não pode existir já no início da negociação, o que conduziria à nulidade do negócio (art. 104 c/c 166, II, CC). A impossibilidade de configurar a situação em destaque deve ocorrer após a negociação, isto é, deve ser superveniente ao negócio. Essa impossibilidade pode ser tanto natural (fato da natureza, inundação, por exemplo); pessoal (doença) ou jurídica (proibição de importar determinado material, que é matéria-prima do objeto a ser realizado). – Sem culpa do devedor: preceitua o artigo 248, CC: “se a prestação se tornar impossível sem culpa do devedor, resolver-se-á a obrigação”. Exemplo: foi contratado um professor de alemão para uma tradução simultânea e ele ficou resfriado, ficando sem voz, resolve-se a obrigação, ou seja, se o valor de seus honorários já tiver sido adiantado, será restituído, caso contrário, tudo ficará como antes. – Com culpa do devedor: (parte final do art. 248, CC), responderá este por perdas e danos. Se, por exemplo, um artista é contratado para fazer parte de uma apresentação e deixa de estar presente, pois arriscou-se em viagem para outro destino e correu o risco de não conseguir chegar em tempo, o que, de fato, aconteceu, deverá indenizar os prejuízos sofridos pelo credor. ● Impossibilidade da prestação nas obrigações impessoais ou fungíveis – Em caso de mora: “se o fato puder ser executado por terceiro, será livre ao credor mandá-lo executar à custa do devedor, havendo recusa ou mora, sem prejuízo de indenização cabível” (art. 249, CC). 47 Modalidades das Obrigações Capítulo 2 Portanto, além de indenização cabível, em caso de culpa, poderá o credor solicitar que terceiro realize o serviço à custa do devedor. Se for urgente o serviço, poderá determinar a sua feitura sem necessidade de autorização judicial, caso contrário, somente mediante autorização. Atividade de Estudos: 1) Estudo de caso: A adquire aparelho celular (especificado) de B, adiantando o pagamento. A entrega do aparelho ficou combinada para dois dias depois da negociação. Neste meio tempo, o aparelho perde algumas de suas funções periféricas em razão de uma queda proposital. Diante do caso hipotético, identifique o tipo de obrigação descrita, bem como as consequências para o caso de inadimplemento. Verifique, ainda, se é possível pleitear a imposição de pena de multa para o caso de cumprimento específico da obrigação. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Obrigação de não Fazer Conceito: Obrigações de não fazer consistem nas restrições ou abstenções combinadas ou negociadas entre as partes. São as obrigações assumidas de não praticar determinado ato, que não é proibido por lei. Exemplos: não vender determinado bem, não revelar determinado segredo industrial, não construir acima de determinada altura. A restrição assumida de não fazer deve ser uma abstenção específica, um não fazer determinado e não genérico que respeite certos limites. Exemplo: não se casar com A, jamais não se casar com quem quer que seja; não levantar um muro específico acima de determinada altura, não proibição de levantar qualquer muro. 48 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS Atenção: As obrigações negativas não podem ser confundidas com as servidões, instituto de direito real, que recai sobre o bem e não sobre a pessoa, caso da obrigação de não fazer. As servidões por recaírem sobre o bem são mantidas em caso de alienação, já as obrigações negativas extinguem-se em caso de alienação do bem. a) Classificação das obrigações de não fazer As obrigações de não fazer podem ser: ● Duradouras: sem prazo definido. Exemplo: não alienar certo bem (gravar bem com cláusula de inalienabilidade); ● Temporárias: com prazo definido. Exemplo: não alienar certo bem durante três meses. ● Instantâneas: se desfazem com um único ato. Exemplo: não revelar um segredo. ● Permanentes: dependem de vários e repetidos atos de abstenção. Exemplo: não passar pelo terreno ao lado. Em caso de inadimplemento da obrigação de não fazer, importa a verificação se o inadimplemento ocorreu com ou sem culpa do devedor. – Sem culpa: (art. 250, CC) são aqueles atos que precisam ser efetuados, pois resultam de um ato alheio à sua vontade. Neste caso, resolve-se a obrigação. É o caso de uma obrigação assumida entre A e B de não dispor de um imóvel, mas ele vem a ser desapropriado pelo município; ou uma obrigação assumida com os vizinhos de não construir calçada na frente da casa e, posteriormente, surge uma resolução municipal, dando prazo para a construção das calçadas. – Com culpa: (art. 251, CC) praticado o ato pelo devedor, “a cuja abstenção se obrigara, o credor pode exigir dele que o desfaça, sob pena de se desfazer à sua custa, ressarcindo o culpado perdas e danos”. Exemplo: não elevar muro acima de determinada altura. Se o devedor aumentar o muro, poderá o credor exigir que se desfaça a obra (art. 823, do CPC). Se não for urgente, precisará de autorização judicial que determine o desfazimento, caso contrário, poderá fazê-lo ou determinar que terceiro o desfaça, além das perdas e danos. Em caso de inadimplemento da obrigação de não fazer, importa a verificação se o inadimplemento ocorreu com ou sem culpa do devedor. 49 Modalidades das Obrigações Capítulo 2 Há casos em que será impossível desfazer o ato, como no caso de revelação de um segredo industrial, a obrigação se converterá em perdas e danos (art. 823, parágrafo único do CPC). Recapitulando: As obrigações de dar (objeto), entregar (restituir) ou de fazer (prestação de serviço ou emissão de declaração de vontade) exigem um agir positivo das partes. Já a obrigação de não fazer consiste numa abstenção, num agir negativo. As obrigações de dar dividem-se em obrigação de dar coisa certa e coisa incerta e obrigação de restituir. Obrigações Alternativas A classificação das obrigações quanto aos seus elementos divide-se em obrigações alternativas e obrigações cumulativas. São tipos de obrigações compostas ou múltiplas, já que dizem respeito a mais de um objeto. a) Sobre as obrigações alternativas Nas prestações alternativas, apesar da multiplicidade de objetos que a caracterizam, o devedor se liberta da prestação, elegendo para o seu cumprimento apenas um dos objetos. Conceito: São compostas, portanto, por duas ou mais prestações, das quais somente uma será escolhida para pagamento ao credor e liberação do devedor. Pode ser estabelecida entre duas coisas (um carro ou uma moto); entre dois fatos (fazer pessoalmente ou chamar terceiro) uma coisa e um fato (entregar um carro ou reparar o veículo sinistrado). ● Na visão de obrigação como processo, a obrigação alternativa confere ao devedor maior possibilidade de cumprimento da obrigação, já que pode eleger qual deles quer entregar. Já ao credor, a vantagem reside na maior garantia quanto ao seu cumprimento. 50 TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS Atenção: Não confundir com a prestação de dar coisa incerta: nesta há apenas um objeto indeterminado, já na obrigação alternativa há vários objetos determinados desde o início, cabendo a escolha na entrega de apenas um entre os indicados previamente. ● A quem cabe a escolha
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