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Acidente vascular cerebral isquêmico

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ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL ISQUÊMICO
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Alteração do sistema nervoso central por falência localizada do suprimento sanguíneo. 
O AVCI corresponde a uma queda de fluxo sanguíneo localizada em uma área restrita do encéfalo, causada por obstrução parcial ou total de uma artéria ou por hipofluxo de origem hemodinâmica. 
Se a queda de fluxo é leve e transitória, pode haver recuperação completa do déficit neurológico, o que caracteriza o ataque isquêmico transitório (AIT). Se houver lesões mais graves, o tecido cerebral entra em necrose (infarto), com sequelas irreversíveis.
A distinção importante entre um ataque isquêmico transitório (AIT) e um AVE é se a isquemia causou infarto cerebral, diferença que pode ser impossível fazer nas primeiras horas após o início dos sintomas, mas que em geral se torna aparente retrospectivamente. Com um acidente vascular encefálico, os sintomas geralmente persistem por mais de 24 horas, porém os déficits clínicos que persistem por mais de 1 a 2 horas normalmente se associam a dano cerebral permanente.
EPIDEMIOLOGIA
- Atualmente, é 2ª causa mais comum de óbito no mundo.
- A hipertensão é o fator de risco mais importante no acidente vascular encefálico isquêmico.
- Aproximadamente 7% a 10% dos homens e 5% a 7% das mulheres maiores de 65 anos.
- O risco relativo para o acidente vascular encefálico é 2 a 6 vezes maior nos pacientes com diabetes insulinodependente.
- Tipo de AVC mais comum (85%).
- No brasil a etiologia embólica tem maior incidência devido doenças como cardiopatia chagásica crônica.
ETIOLOGIA
Há duas classificações principais para os AVEs isquêmicos: 
· Trombose:
Formado na própria artéria envolvida no AVE.
O AVE trombótico mais comum é o AVE lacunar (20% dos AVE isquêmicos), definido por infarto de tamanho inferior a 2 cm, causado pela oclusão de pequenas artérias perfurantes cerebrais, que nutrem o tálamo, a cápsula interna e os gânglios da base, ou dos ramos arteriais que irrigam o tronco cerebral. 
· Embolia:
Trombo proveniente de local distante que caminha pela circulação arterial até impactar na artéria.
Existem dois tipos de AVE isquêmico embólico:
· Cardioembólico: a fonte emboligênica é o coração, na maioria das vezes com fibrilação atrial (trombo no AE), seguida pelo IAM de parede anterior (trombo no VE) e pelas cardiomiopatias dilatadas (trombo em VE e/ou AE).
· Arterioembólico: é o AVE isquêmico típico dos pacientes hipertensos. A fonte emboligênica geralmente é uma placa aterosclerótica instável (com trombo) na carótida comum ou bifurcação carotídea ou na artéria vertebral.
FATORES DE RISCO
· Hipertensão arterial (especialmente a hipertensão sistólica).
· História familiar de doença cerebrovascular
· Cardiopatias emboligênicas (estenose mitral, miocardiopatias, infarto do miocárdio). 
· Dislipidemias - Relacionadas à aterosclerose. 
· Diabetes - Relacionado a dois tipos de espécies arteriais: aterosclerose e microangiopatia.
· Tabagismo
· Estados de hipercoagulabilidade, policitemia, anemia (especialmente anemia falciforme), leucemia, síndrome dos anticorpos antifosfolipídios
· Aumento da homocisteína por deficiência enzimática está associado a trombose e aterosclerose.
· Alcoolismo
· Sedentarismo 
· Contraceptivos - Em mulheres acima de 30 anos. 
· Reposição hormonal na pós-menopausa demonstrou aumento do risco.
FISIOPATOLOGIA
O AVE isquêmico é causado por uma obstrução súbita do fluxo arterial encefálico, devido, na maioria das vezes, a uma causa embólica (trombo proveniente de circulação distante) ou, mais raramente, trombótica (o trombo é formado na própria artéria envolvida no AVE). 
Quando não é possível determinar a causa do AVE, o denominamos AVE criptogênico. É responsável por grandes partes dos AVEs. 
Embora não tenha fisiopatologia esclarecida, estudos sugerem que seja decorrente de embolia paradoxal através de um forame oval patente no coração, ou que seja causado por êmbolos provenientes de placas ateromatosas instáveis da aorta ascendente.
Nas primeiras 24 horas após o AVE, métodos como o PET scan podem delimitar as áreas infartadas e as zonas de penumbra. A interrupção do fluxo sanguíneo subsequente gera isquemia, privando neurônios e células gliais de oxigênio e glicose, e causando disfunção neuronal (quando o fluxo cerebral de oxigênio cai abaixo de 20ml/100mg/ min). Caso essa não haja reversão dessa situação, acontece o infarto do núcleo isquêmico, a morte do tecido e uma lesão irreversível. Ao redor da região infartada, existe a zona de penumbra, onde um mecanismo de extração aumentada de oxigênio apesar do baixo fluxo permite que a lesão causada seja potencialmente reversível, contanto que o fluxo sanguíneo seja restaurado (por recanalização do vaso ocluído ou circulação colateral, altamente dependente da pressão arterial – por isso, é preciso ter cuidado no controle da PA na fase aguda do AVE isquêmico!).
Nas primeiras 48h, há migração de neutrófilos para o local, seguida pela migração de monócitos e células gliais fagocitárias. Após dez dias, com o edema resolvido, a transição entre a zona infartada e o tecido normal torna-se nítida. Entre dez dias e três semanas, a fagocitose provoca uma necrose de liquefação, transformando o infarto numa área amolecida e depois cística e retraída.
· Aterosclerose:
É consenso que as placas ateroscleróticas causem AVEs de três modos: 
1. Forma-se trombose mural no local de uma lesão aterosclerótica, e o coágulo obstrui a artéria naquele local.
2. Ulceração ou ruptura de uma placa leva à formação de um coágulo e embolização distal; 
3. Hemorragia em uma placa obstrui a artéria. 
As manifestações clínicas de um AVE dependem da velocidade de oclusão. Se ocorrer lentamente, pode haver tempo para o desenvolvimento de circulação colateral, se evitando o AVE. Se a oclusão for abrupta, segue-se um AVE, e o grau de dano dependerá da extensão de irrigação colateral disponível para o território cerebral irrigado pelo vaso ocluído.
As localizações mais comuns para a formação de um trombo intravascular são a:
· Base da aorta.
· Bifurcação da artéria carótida comum.
· Ponto onde as artérias vertebrais se originam das subclávias.
· Embólico:
 O êmbolo é proveniente de uma artéria em geral, uma placa aterosclerótica instável principalmente em artérias carótidas ou vertebrais (logo, como vimos, a HAS é fator de risco para AVE isquêmico arterioembólico por causar aterosclerose nessas artérias).
Os êmbolos originados no coração podem alojar-se em qualquer parte do corpo. No entanto, já que cerca de 20% do débito cardíaco normal vão para o cérebro, este é um lugar comum de embolia cardíaca. A formação de um trombo e a liberação de êmbolos do coração são promovidos por arritmias e por anormalidades estruturais das valvas e câmaras. 
· Ataque isquêmico transitório (AIT) 
É um evento também isquêmico, mas não pode ser considerado AVE visto que se trata de um déficit neurológico focal reversível, transitório, e de duração inferior a 24 horas. Em geral, é proveniente de causas arterioembólicas, e um pequeno número de casos advém de trombose em evolução.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Devemos ter em mente que o AVE é uma doença tempo-dependente, ou seja, reconhecer precocemente seus sinais clínicos é de extrema importância para se agir rápido no tratamento e aumentar as chances de recuperação completa. 
Os sinais e sintomas dependem da área acometida do encéfalo. O encéfalo é irrigado por dois sistemas arteriais: 
· Anterior (sistema carotídeo) 
· Posterior (sistema vertebrobasilar)
A depender da região infartada no AVE isquêmico, diferentes manifestações clínicas podem ser observadas:
· Sistema carotídeo 
Artéria oftálmica: alterações visuais monoculares. 
Artéria cerebral anterior: sinais de frontalização, déficit motor e sensitivo na região proximal do membro superior contralateral.
Artéria cerebral média: déficit motor; perda sensorial em face ou membro superior; afasia de Wernick (área da compreensão da fala) e broca (área motora da fala) no hemisfério dominante; Neglingência no hemisférionão dominante; hemiplegia fascio-braquio-crural (por atingir cápsula interna); síndrome piramidal contralateral (por interrupção da via corticoespinhal). A artéria mais afetada pelo AVE isquêmico é a cerebral média.
O chamado “AVC isquêmico maligno” ou “infarto maligno cerebral” é definido como o infarto de mais de 50% do território de irrigação da artéria cerebral média, representando grande parte do hemisfério cerebral, e têm mortalidade de 80% apesar do tratamento conservador adotado, sendo uma importante causa de morte encefálica.
Síndrome do 1º neurônio motor: ocorre quando atinge a artéria perfurantes do sistema lentículo-estriado, que irriga a cápsula interna (local mais atingido no AVE lacunar!). O paciente apresenta sincinesias, sinal de Babinski, hiperreflexia, espasticidade e sinreflexias.
· Sistema vertebrobasilar 
Artéria cerebral posterior: cefaléia ipsilateral, alterações de memória, hemibalismo, alterações do campo visual, rebaixamento do nível de consciência, déficit sensitivo, alterações de funções nervosas superiores. Geralmente AVE embólico ou lacunar
Artéria vertebral ou cerebelar póstero-inferior: síndrome bulbar (vertigem central, disfagia, náuseas, vômitos, nistagmo e ataxia ipsilateral) e síndrome de Horner ipsilateral (ptose palpebral, anisocoria, perda da sensibilidade térmica e dolorosa em face ipsilateral, disartria e nistagmo para o lado infartado).
Regras gerais de localização do AVE isquêmico:
Sugere território carotídeo (cerebral média, anterior): afasia, síndromes cerebrais clássicas (Gerstmann, amusia, agnosias, síndrome do lobo frontal).
Sugere território vertebrobasilar (cerebral posterior, tronco): hemianopsia, agnosia visual, síndrome de Balint, síndrome de Anton. Diplopia sugere AVE de tronco. Vertigem e nistagmo sugerem AVE pontino ou cerebelar. Ataxia cerebelar sugere AVE de cerebelo, mesencéfalo (núcleo rubro) ou tálamo.
Síndromes típicas de infartos lacunares: (1) hemiplegia fasciobraquiocrural (cápsula interna); (2) afasia de Broca ± hemiparesia; (3) hemianestesia (tálamo ventrolateral); (4) disartria com apraxia da mão e braço; (5) hemiparesia atáxica.
DIAGNÓSTICO
· Escala FAST: 
É usada na triagem para reconhecimento rápido de sinais clínicos de AVE, baseada na escala de suspeita pré-hospitalar que se baseia em: 
Face (paralisia facial)
Arms (fraqueza nos MMSS)
Speech (alterações de fala)
Time (tempo dos sintomas)
Déficit neurológico focal súbito > 15 minutos = internação e exame de imagem! Saber o tempo do início de sintomas é essencial, já que a janela terapêutica para se fazer uma trombólise intravenosa no caso de AVE isquêmico é de apenas 4,5 horas.
· Escala NIH: 
A escala frequentemente utilizada para quantificar o déficit neurológico é a National Institute of Health (NIH), podendo ser executada de forma rápida por uma ampla gama de profissionais da saúde. Ela avalia o déficit do AVE através da pontuação de 15 parâmetros, variando de 0 (sem déficit) a 42 (maior déficit). Os parâmetros são: 
- Nível de consciência observado
- Orientação no tempo (em relação a mês e idade)
- Resposta a comandos
- Olhar
-Campo visual
- Movimento facial
- Função motora de membros superiores e inferiores 
- Ataxia de membros
- Sensibilidade
- Linguagem
- Articulação da fala
- Extinção ou desatenção durante o exame
· Tomografia Computadorizada sem contraste: 
É o exame de imagem de escolha, por ser mais acessível e ter boa sensibilidade. Recomenda-se realizá-la em duas etapas: 
1. A primeira TC na chegada do paciente (importante na exclusão do AVE hemorrágico e também diagnóstico de possíveis tumores, sangramentos meníngeos e intraparenquimatosos).
2. A segunda TC após 72 horas do início dos sintomas (TC de controle e definidora da anticoagulação do paciente no caso de AVE isquêmico).
SE LIGA: TC de crânio deve ser realizada em dois momentos: Uma TC sem contraste assim que o paciente chegar com suspeita de AVE, que deve estar laudada em no máximo 45 minutos e uma TC de controle após 72 horas de início dos sintomas.
· Ressonância Magnética: 
Mais sensível que a TC, diagnóstica área isquêmica muito precocemente, tendo mais acurácia que a TC no AVEi; porém, é um exame que demora e não tão acessível. Muito útil nos casos de dúvida se há AVE na TC, ou então nos pacientes com janela terapêutica desconhecida ou fora da janela, para se avaliar melhor a zona de penumbra.
· Coagulograma: 
Devemos esperar seu resultado antes de realizar a trombólise (no caso de AVE isquêmico) caso haja história de uso de anticoagulantes ou suspeita de alterações.
· Outros exames laboratoriais: 
Uréia, Creatinina, Eletrólitos, hemograma completo, gasometria, marcadores de necrose miocárdica e ECG também devem ser realizados nesses pacientes. Não atrasam a trombólise!
Para o diagnóstico etiológico, podemos utilizar de outros exames, como: 
Angiotomografia helicoidal: faz rápida análise dos grandes vasos intra e extracranianos e permite reconhecer obstruções e estenoses nos grandes vasos; quando comparada à angiografia cerebral, apresenta grande acurácia na identificação de obstrução de grandes vasos.
Doppler transcraniano: determina a artéria intracraniana obstruída no AVE isquêmico.
Ecocardiograma: podemos verificar causas de AVE isquêmico, como aneurisma vorticular de ventrículo esquerdo, doença de chagas.
Doppler de carótidas: permite verificar aterosclerose.
COMPROVAÇÃO DIAGNÓSTICA: dados clínicos + TC/RM
TRATAMENTO
· Medidas de suporte:
· Suporte respiratório: 
Não necessitam de suplementação de oxigênio, exceto em casos em que a oximetria de pulso indicar uma saturação menor que 92%. 
· Temperatura: 
A temperatura corporal deve ser monitorada e mantida dentro da faixa normal, próxima aos 36,5 °C, isso leva a uma redução na morbimortalidade dos pacientes com AVCI. 
Já a hipertermia aumenta a liberação de radicais livres no tecido isquêmico, eleva a atividade metabólica neuronal, além de alterar a atividade de alguns neurotransmissores.
· Monitorização cardíaca: 
É obrigatória nas primeiras 24 horas, pois as arritmias cardíacas geralmente estão presentes no período pós-AVCI, e algumas delas são causadoras de eventos isquêmicos. 
· Pressão arterial: 
Se hipertensão arterial: não baixar no primeiro dia. 
Exceto quando PA > 220 x 120 mmHg; Droga de escolha: Nitroprussiato de Sódio (0,5 mcg/ kg/min) 24 horas após Trombolítico se PA > 185 x 110 mmHg. 
Nos pacientes não submetidos à trombólise, somente administrar anti-hipertensivos se PA > 220x120mmHg. 
· Glicemia: 
Deve ser monitorada de 6/6 horas; deve-se descartar a hipoglicemia, que isoladamente já causa lesão cerebral. Se hiperglicemia, iniciar insulina. Manter abaixo 160mg/dL.
· Medidas específicas: 
· Antiagregante plaquetário: 
O ácido acetilsalicílico (AAS) é a droga de escolha no AVE, e como forma de prevenção de recidiva, na posologia 100 a 325mg/dia VO.
Clopidogrel 75mg/dia. 
· Heparina: 
Deve ser usada na dose profilática para tromboembolismo venoso, e não a heparinização plena. Usa-se HNF 5000 UI 8-12h ou HBPM (enoxaparina 40mg SC/ dia). O anticoagulante oral de escolha é a warfarina sódica. 
· Trombolítico: 
Devemos considerar a possibilidade de terapia trombolítica endovenosa (TEV) com ativador de plasminogênio tecidual recombinante (rtPA) se os pacientes preencherem os critérios de inclusão e não tiverem contra-indicações absolutas. O mais utilizado é o Alteplase, na posologia 0,9mg/ kg EV, 10% em bolo e o restante em 1 hora.
Critérios para terapia trombolítica endovenosa:
PROGNÓSTICO
Após um AVE, o resultado do quadro é influenciado por vários fatores, mas dentre eles existem dois principais: 
· A natureza
· E gravidade do déficit neurológico resultante. 
Idade do paciente, etiologia do AVE e comorbidades também são fatores importantes.

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