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1 FACULDADE ÚNICA DE IPATINGA 2 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS- METODOLÓGICOS E SERVIÇO SOCIAL I 1ª edição Ipatinga – MG 2021 3 FACULDADE ÚNICA EDITORIAL Diretor Geral: Valdir Henrique Valério Diretor Executivo: William José Ferreira Ger. do Núcleo de Educação a Distância: Cristiane Lelis dos Santos Coord. Pedag. da Equipe Multidisciplinar: Gilvânia Barcelos Dias Teixeira Revisão Gramatical e Ortográfica: Izabel Cristina da Costa Revisão/Diagramação/Estruturação: Bárbara Carla Amorim O. Silva Bruna Luiza Mendes Leite Carla Jordânia G. de Souza Guilherme Prado Salles Rubens Henrique L. de Oliveira Design: Brayan Lazarino Santos Élen Cristina Teixeira Oliveira Maria Luiza Filgueiras Taisser Gustavo de Soares Duarte © 2021, Faculdade Única. Este livro ou parte dele não podem ser reproduzidos por qualquer meio sem Autorização escrita do Editor. Ficha catalográfica elaborada pela bibliotecária Melina Lacerda Vaz CRB – 6/2920. NEaD – Núcleo de Educação a Distância FACULDADE ÚNICA Rua Salermo, 299 Anexo 03 – Bairro Bethânia – CEP: 35164-779 – Ipatinga/MG Tel (31) 2109 -2300 – 0800 724 2300 www.faculdadeunica.com.br http://www.faculdadeunica.com.br/ 4 Menu de Ícones Com o intuito de facilitar o seu estudo e uma melhor compreensão do conteúdo aplicado ao longo do livro didático, você irá encontrar ícones ao lado dos textos. Eles são para chamar a sua atenção para determinado trecho do conteúdo, cada um com uma função específica, mostradas a seguir: São sugestões de links para vídeos, documentos científi- co (artigos, monografias, dissertações e teses), sites ou links das Bibliotecas Virtuais (Minha Biblioteca e Biblioteca Pearson) relacionados com o conteúdo abordado. Trata-se dos conceitos, definições ou afirmações importantes nas quais você deve ter um maior grau de atenção! São exercícios de fixação do conteúdo abordado em cada unidade do livro. São para o esclarecimento do significado de determinados termos/palavras mostradas ao longo do livro. Este espaço é destinado para a reflexão sobre questões citadas em cada unidade, associando-o a suas ações, seja no ambiente profissional ou em seu cotidiano. 5 SUMÁRIO EXPANSÃO DO CAPITALISMO MONOPOLISTA E O SERVIÇO SOCIAL ... 8 1.1 O CAPITALISMO MONOPOLISTA......................................................................... 8 1.2 A EXPANSÃO DOS SERVIÇOS SOCIAIS ............................................................ 12 1.3 A FUNÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO CAPITALISMO MONOPOLISTA ........... 15 FIXANDO O CONTEUDO .................................................................................... 21 A INFLUÊNCIA DO SERVIÇO SOCIAL EUROPEU E NORTEAMERICANO NA CONSTITUIÇÃO DA PROFISSÃO NO BRASIL ........................................... 24 2.1 A INFLUÊNCIA DO SERVIÇO SOCIAL EUROPEU E NORTEAMERICANO NA CONSTITUIÇÃO DA PROFISSÃO NO BRASIL. .................................................... 24 2.2 AS TÉCNICAS NORTE AMERICANAS E EUROPEIAS ADOTADAS NA PRÁTICA PROFISSIONAL NO BRASIL ................................................................................. 27 2.3 O DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADE E O DESENVOLVIMENTISMO ........ 33 FIXANDO O CONTEÚDO .................................................................................... 40 AS FORMAS DE EXPRESSÃO E ENFRENTAMENTO DA QUESTÃO SOCIAL NA AMÉRICA LATINA, PARTICULARMENTE NO BRASIL ......................... 43 3.1 A QUESTÃO SOCIAL NAS DÉCADAS DE 20 E 30 E A ORGANIZAÇÃO DOS TRABALHADORES ............................................................................................... 43 3.2 PARTICULARIDADES DA QUESTÃO SOCIAL NO BRASIL E AS LEIS SOCIAIS .... 46 3.3 RESPOSTAS DO ESTADO E DA IGREJA NO ENFRENTAMENTO DA QUESTÃO SOCIAL NO BRASIL ............................................................................................ 53 FIXANDO O CONTEÚDO .................................................................................... 61 A INSTITUCIONALIZAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO CONTEXTO DO CAPITALISMO TARDIO ATÉ A SEGUNDA GUERRA .................................. 65 4.1 O DESENVOLVIMENTO DAS GRANDES INSTITUIÇÕES SOCIAIS, A INSTITUCIONALIZAÇÃO E A PROFISSIONALIZAÇÃO DA PRÁTICA PROFISSIONAL DOS ASSISTENTES SOCIAIS. ...................................................... 65 4.2 O PACTO FORDISTA E A TESE KEYNESIANA ...................................................... 71 4.3 O ESTADO DE BEM ESTAR SOCIAL NA EUROPA E A CIDADANIA REGULADA PELO TRABALHO NO BRASIL .............................................................................. 74 FIXANDO O CONTEÚDO ................................................................................ 6180 ANÁLISE CRÍTICA DAS INFLUÊNCIAS TEÓRICO-METODOLÓGICAS ...... 83 5.1 O PROCESSO DE RENOVAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO BRASIL E AMÉRICA LATINA ................................................................................................................ 83 5.2 CONTEXTO SOCIOPOLÍTICO E AS DIREÇÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS QUE A RENOVAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL ASSUMIU NO BRASIL: PERSPECTIVA MODERNIZADORA, REATUALIZAÇÃO DO CONSERVADORISMO E INTENÇÃO DE RUPTURA .................................................................................. 87 5.3 AS CONQUISTAS, LIMITES E REPERCUSSÕES DO MOVIMENTO DE RECONCEITUAÇÃO NA ATUALIDADE ............................................................... 92 FIXANDO O CONTEÚDO .................................................................................. 101 UNIDADE 01 UNIDADE 03 UNIDADE 04 UNIDADE 05 UNIDADE 02 6 AS FORMAS DE INTERVENÇÃO CONSTRUÍDAS PELA PROFISSÃO ....... 105 6.1 A NECESSIDADE DA TEORIA NA INSTRUMENTALIZAÇÃO DA PRÁTICA, A PARTIR DA RELAÇÃO DIALÉTICA. .................................................................... 105 6.2 MEDIAÇÕES ENTRE TEORIA E PRÁTICA PROFISSIONAL PARA APREENSÃO CRÍTICA DA REALIDADE ................................................................................... 109 6.3 OS ESPAÇOS SOCIOOCUPACIONAIS DOS ASSISTENTES SOCIAIS ............... 113 FIXANDO O CONTEUDO .................................................................................. 120 RESPOSTAS DO FIXANDO O CONTEÚDO ............................................. 124 REFERÊNCIAS ......................................................................................... 125 UNIDADE 06 7 CONFIRA NO LIVRO Na unidade 01 trataremos de estudar o alargamento das funções do Estado no capitalismo monopolista que facilita a expansão do setor de serviços e buscaremos tratar da função do Serviço Social nesta fase e sua emergência enquanto profissão. Trataremos de analisar nesta unidade, a literatura que traz a trajetória histórica da profissão, considerando a relação do Brasil coma as experiências norte-americanas e europeias de Serviço Social para explicar as técnicas adotadas no Serviço Social brasileiro no inicio da sua profissionalização e institucionalização. Na unidade 03 apresentaremos as manifestações da questão Social na America Latina e no Brasil, refletindo as disparidades econômicas, políticas e culturais, envolvendo a formação de classes sociais, assim como apontaremos a organização dos trabalhadores na luta pela melhoria das condições de vida e trabalho. Trataremos de expor a resposta do Estado e da Igreja para controlar a forca de trabalho e enfrentar as manifestaçõesda Questão Social. Na unidade 04, veremos o processo de institucionalização do Serviço Social no contexto do capitalismo tardio. Fruto deste processo ocorre à criação das primeiras instituições sociais que marcara a profissionalização dos assistentes sociais. Bem como, trataremos de entender o pacto fordista, as condições políticas e culturais na fase do capitalismo maduro que propiciou nas políticas de Bem Estar social na Europa e a criação de leis sociais em demais países. Na unidade 05 trataremos de expor as motivações para o Serviço Social tradicional, as mudanças teóricas metodológicas no interior da categoria profissional, acompanhadas pelo contexto sociohistórico e o amadurecimento profissional com a construção de um referencial teórico próprio. Na unidade 06, apontaremos a direção social assumida pela profissão nos anos 80 e 90, por meio do conhecimento de matrizes e da perspectiva crítica dialética. Entenderemos a necessidade das mediações entre teoria e pratica para apreensão critica da realidade na busca de qualificação profissional, apontando alguns equívocos no que se refere aos referencias profissionais. 8 EXPANSÃO DO CAPITALISMO MONOPOLISTA E O SERVIÇO SOCIAL Trataremos de estudar neste capitulo, o processo de alargamento das funções do Estado na fase do capitalismo monopolista e a expansão dos serviços sociais. Compreenderemos também a inserção da profissão com base nas necessidades do capitalismo monopolista e sua emersão no processo de produção e reprodução das relações sociais. 1.1 O CAPITALISMO MONOPOLISTA Considera-se que, a reprodução é a continuidade do processo social de produção, porém, uma continuidade que não se reduz à mera repetição é uma continuidade no decorrer da qual o processo se renova, se cria e recria de modo peculiar (IAMAMOTO, 2008). Neste sentido, tal autora identifica que é no bojo deste movimento da reprodução das relações sociais que podemos compreender a emergência do Serviço Social, que no Brasil se afirma enquanto profissão, vinculado ao setor público, diante de uma progressiva ampliação do controle e do âmbito da ação do Estado junto à sociedade civil. Pensando a atuação do Assistente Social nos aparelhos estatais, Iamamoto (2008) afirma que pensar a profissão requer analisar a sua relação institucional, ou seja, precisa necessariamente entender a sua vinculação com a organização a qual o assistente social está empregado. Dessa forma, a autora compreende que a atividade profissional não se encerra em si mesma e seus efeitos sociais não derivam, exclusivamente, da atuação do profissional. Portanto, devemos considerar que, sendo integrante dos aparatos de poder, como uma das categorias profissionais envolvidas na implementação de políticas sociais, seu significado social só pode ser compreendido levando em conta essa característica. Lessa (1999) influenciado pelas ideias de Lukács contribui para o debate do trabalho na medida em que afirma que as relações sociais adquirem sentido na ação humana. Dessa forma, o fato de existir homem requer uma relação social, UNIDADE 01 9 seja de gênero, técnica e de geração. Sendo assim, podemos afirmar que os processos de natureza social possuem características da sociabilidade humana. Nesse sentido, pensar o trabalho como atividade social é relacionar com a atividade teleológica do ser social, na produção e reprodução social a partir das objetivações primárias (é o ato do trabalho na relação de produção material) e objetivações secundárias (é o ato da transformação a partir do trabalho humano). Essa dimensão social do trabalho do Assistente Social, compreendendo-o na dinâmica do modo de produção capitalista emerge das necessidades sociais e está organizada a partir das relações sociais estabelecidas entre as pessoas. Nesse sentido, Netto (1992) o Estado no capitalismo monopolista assume a função essencial da política social que se expressa nos mecanismos de controle e preservação da força de trabalho ocupada mediante as legislações trabalhistas, políticas educacionais da massa trabalhadora, recursos humanos e/ou desempregada assistida pelos seguros sociais. Nesta mesma linha, Iamamoto (2008) coloca que o Estado vê-se obrigado, pelo poder de pressão das classes subalternas, a incorporar, alguns de seus interesses, desde que não afetam a classe capitalista como um todo, dentro de um pacto de dominação. https://bit.ly/3cinNHt https://bit.ly/3gplp35 10 Dessa forma, para os autores, o capitalismo monopolista promove uma contradição elementar entre a socialização da produção e a apropriação privada, a internacionalizada produção e grupos de monopólios controlam sem considerar a soberania dos povos e do Estado. Conforme identifica Mandel (1987), temos nesta fase, a expansão do setor terciário que absorveu a demanda por serviços que anteriormente estavam na esfera privada da vida social. Além disso, políticas setoriais com investimento em maior escala como reformas urbanas; habitação, obras viárias, saneamento básico, reduzem, portanto, as dificuldades de valorização advindas da supercapitalização. Segundo Netto (1992), no estágio monopolista, as funções políticas do Estado relacionam-se com as funções econômicas, na forma de gerir a máquina estatal, por isso, a ideia central do Estado é garantir os superlucros. O Estado promove a sua inserção como empresário nos setores básicos não rentáveis (energia e matérias- primas) e assume, portanto, o controle das empresas capitalistas em dificuldades e também a entrega das riquezas construídas com fundos públicos, fornecendo subsídios imediatos aos monopólios e a garantia explícita de lucro pelo Estado. Assume, portanto, uma função estratégia investindo no desenvolvimento das forças produtivas, através de planos e projetos de médio e longo prazos, organizando a economia, operando ainda como administrador das crises. Sendo assim, o Estado atua como comitê da burguesia, propiciando “[...] um conjunto de condições necessárias à acumulação e valorização do capital monopolista[...]”. Como, por exemplo, o controle da força de trabalho. (NETTO, 1992, p. 21). Dessa maneira, a atuação do Serviço Social, segundo Mandel (1982) se vincula a um processo de socialização de procedimentos reconhecidos pelo Estado, através da oferta de serviços, como agentes executores das políticas públicas. Sendo assim, se coloca como demanda dos projetos de intervenção dos profissionais de serviço social, as demandas dos trabalhadores. Para Mandel (1982), ao analisar a produção capitalista, entende que não devemos circunscrever os estágios do capitalismo entre o passado e presente, porque seu sistema mundial é universal e compreende seu desenvolvimento desigual e combinado às demais formas de produção. Portanto, o mesmo concluir que este sistema parte do processo de análise considerar que na sociedade capitalista, pressupõe a manutenção de determinadas organizações produtivas e a coexistência desses modos de maneira a elevar a taxa de exploração da mais 11 valia, propiciando um aumento da acumulação do capital. Mandel (1982) compreende que, com a crescente socialização do trabalho, setores como comércio, transporte e serviços em geral se desenvolvem, isso acarretará uma especialização e racionalização das atividades, principalmente devido à adoção da eletrônica e cibernética no processo produtivo e produção de novos produtos. A expansão do crédito e aquisição de bens duráveis no capitalismo tardio também possibilitou essa alteração nas relações sociais, como por exemplo, podemos perceber esse movimento pela substituição de atividades de profissionais liberais pelo desenvolvimento da indústria têxtil, como os alfaiates,tendo em vista que seu trabalho foi substituído pelas lojas de departamentos de roupas feitas. Para Mandel (1982) este fenômeno da industrialização massiva e crescente se caracteriza por um processo de industrialização generalizada universal, marcada pela mecanização, a padronização, a superespecialização e a fragmentação do trabalho, considerando que essas alterações no processo produtivo, ressignificam o cotidiano da vida social. O processo de supercapitalização induz a penetração do capital nas esferas da circulação, serviços e reprodução da massa de mais valia. O Estado assume funções produtivas do capital, como transporte; promove aceleração do tempo de rotação do capital produtivo circulante (comércio e crédito); reduz os custos da produção via Estado com adoção de infraestrutura e através dos serviços individuais que passam a ser consumidos na esfera do mercado privado, como exemplo tem o alfaiate e a loja de roupas. A utilização de serviços de energia com a eletrificação; construção de trens de passageiros, estradas, usinas hidrelétricas para uso de gás e água encanada aquecem o setor de serviços. (MANDEL, 1982). O Estado se reestrutura e se organiza financeiramente. O Estado, portanto, nessa fase monopolista, assume uma função política, a partir de mecanismos de intervenção extraeconômicos. 12 1.2 A EXPANSÃO DOS SERVIÇOS SOCIAIS Para Braverman (1987) o rápido crescimento da prestação de serviços tanto na esfera privada quando nos setores públicos da economia se deu com a conquista completa das atividades industriais, correspondendo à acumulação de capitais nelas, e a junção dessas reservas de trabalho e capital no terreno de novas industriais; e o inexorável crescimento das necessidades de serviços à medida que a nova forma de sociedade destrói as antigas formas de cooperação mútua social, comunitária e familiar. Com a expansão urbana, a sociedade começou a questionar o feito em casa em detrimento do que fora fabricado e comprado. “Assim, a população [...] [vai] ao mercado não apenas para adquirir alimento, vestuário e habitação, mas 13 também para recreação, divertimento, segurança, assistência aos jovens, velhos, doentes e excepcionais” (BRAVERMAN, 1977, p. 235). O movimento da sociedade capitalista nesse sentido liga-se, no aspecto econômico, ao impulso capitalista de inovar produtos diversos, novos serviços, novas indústrias. O excedente produzido primeiro de tudo nas industriais fabris sob a forma de concentrações da riqueza é igualado no espaço do trabalho pelo relativo declínio da demanda dos trabalhadores naquelas mesmas indústrias à medida que elas são mecanizadas. As novas mercadorias surgem igualando as condições de vida do morador urbano, e são postas em circulação nas formas ditadas pela organização capitalista da sociedade. Como, por exemplo, temos o rádio, televisão e o automóvel (BRAVERMAN, 1987). Para Braverman (1987) com o desenvolvimento do capitalismo monopolista, a socialização do mercado, incentivado pelo processo de conquista dos bens pela população e o consequente crescimento do consumo e expansão dos serviços, incentiva a produção de mercadorias, fazendo com que acelere o ciclo produtivo. Esse processo ocorre, ao passo que o próprio capitalismo inventa novos produtos e serviços para se tornarem acessíveis à população, criando novas necessidades sociais à vida moderna. Os próprios serviços sociais que deveriam facilitar a vida social e a solidariedade social tem o efeito contrário. À medida que os avanços da indústria de utilidades domésticas e de serviços aliviam o trabalho da família, aumentam a futilidade da vida familiar; à medida que removem os fardos das relações pessoais, esvazia-as de sentimentos; á medida que criam uma intricada vida social, assim despindo dos vestígios da comunidade e deixam em seu lugar um vínculo monetário (BRAVERMAN, 1987, p. 240). A apropriação de Iamamoto (2008, p. 92) sobre o debate dos serviços situa os serviços sociais como “[...] uma parcela de valor criado pelos trabalhadores e apropriado pelos capitalistas e pelo Estado, que é devolvido a toda a sociedade (em especial, os trabalhadores, que deles mais fazem uso) [...]”, sob forma de serviços sociais”, contudo cabe ressaltar que tal autora não se aprofunda no debate sobre os serviços. Para Netto (1992), o alargamento das funções do Estado no capitalismo monopolista facilita a expansão do setor de serviços. Assim, o Estado passa por um processo de hierarquização de natureza técnico-burocrático para assegurar as novas funções econômicas e sociais. Essa reorganização se dá principalmente no 14 uso do fundo público para investimentos no mercado. O Estado para gerir o trabalho excedente e necessário a partir de taxações sobre o trabalho, determinando a forma de financiamento das políticas sociais. O Estado, portanto, atua no setor estratégico da economia, operando como um administrador dos ciclos de crise. O Estado, como comitê da burguesia atua no sistema de poder político e nos centros de decisão que ficam autônomas às instâncias representativas formalmente legitimadas. Nesse sentido, próprias ao capital monopolista são as condições necessárias à acumulação e valorização do capital. (NETTO, 1992). Tal autor elenca fenômenos que explicam a consolidação do capitalismo e expansão do setor de serviços, como: a) preço das mercadorias (serviços); b) taxa de lucros nos setores monopolizados; c) taxa de acumulação maior e tendência de taxa média de lucro; d) taxa de lucro determina o investimento nos setores de maior concorrência; e) tendência de organização do trabalho 'vivo', com introdução de novas tecnologias; f) sobrem os custos de venda no sistema de distribuição (NETTO, 1992, p. 32). Para Netto (1992), o alargamento das funções do Estado no capitalismo monopolista facilita a expansão do setor de serviços, sendo assim, o Exército Industrial de Reserva (EIR) será um agente importante na importação do setor de serviços. O Estado passa por um processo de hierarquização de natureza técnico- burocrático para assegurar as novas funções econômicas e sociais. Essa reorganização se dá principalmente no uso do fundo público para investimentos no mercado. O Estado para gerir o trabalho excedente e necessário deve fazer taxações sobre o trabalho, determinando a forma de financiamento das políticas sociais. Do ponto de vista do capital, os serviços sociais são indispensáveis à 15 manutenção da ordem e do controle social da classe dominada. Nesse sentido, os serviços sociais são necessários ao capital na participação da socialização de parte dos custos da reprodução da força de trabalho com toda a população, a qual os assume, indiretamente, via impostos e taxas que lhes são cobradas; na ampliação do campo de investimento capitalista, principalmente no que se refere às ações filantrópicas, desenvolvidas nos anos 1990 até hoje; garantem elevados níveis de produtividade do trabalho já que a força de trabalho empregada quanto à força de trabalho que integra o exército industrial de reserva permanece em constante disputa e possibilitam que a classe trabalhadora participe do processo produtivo através do consumo. Para a classe trabalhadora esse consumo significa a sua sobrevivência, já para o Estado e para os capitalistas, significa a sua reprodução. 1.3 A FUNÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO CAPITALISMO MONOPOLISTA Para pensar a divisão do trabalho em Marx, como totalidade para compreendermos a função do Serviço Social na fase monopolista, devemos destacar que sua função social é definida conforme o alargamento as funções do Estado, conforme afirma Netto (1992). Na fase monopolista, grandes empresas se articulam paradefinir preços de mercado. Nesse sentido, cresce a tendência de economizar o trabalho vivo, que compreende a força de trabalho. O Estado passa por um processo de alargamento das suas funções, como a função econômico-social, definindo fundos públicos, investimentos para a economia e regulação do mercado e incentivo às indústrias. O Estado regula não somente o trabalho excedente, mas também o trabalho necessário, estabelecendo limites na taxa de exploração sobre o trabalho (NETTO, 1992). Netto (1992) reforça que essa é a funcionalidade da política social no 16 capitalismo monopolista, o da preservação e controle da força de trabalho. Através da política social, o Estado burguês no capitalismo monopolista procura administrar as expressões da “questão social”, de forma a atender às demandas de ordem monopolítica conformando, pela adesão que recebe de categorias e setores sujas demandas incorporam, sistemas de consensos variáveis, mas operandes (NETTO, 1992, p. 30). Dessa maneira, não podemos perder de vista que o Estado se estrutura para garantir a produção do capital, a gestão de suas crises e também para garantir a reprodução ampliada da força de trabalho. Nesse sentido, o Estado passa a garantir condições institucionais, sociais e legais para regular o capitalismo monopolista e assegurar o pleno funcionamento do modo de produção capitalista. Para Netto (1992, p. 29) a funcionalidade da política social no âmbito do capitalismo monopolista decorre “[...]da capacidade de mobilização, organização da classe operária e do conjunto dos trabalhadores[...]”, considerando que o Estado, por vezes, atua de maneira estratégica se antecipando às demandas sociais a fim de não esgotar a tensão entre “[...]sociedade demandantes/Estado burguês no capitalismo monopolista[...]”. Com isso, a formulação das políticas sociais depende dos diversos protagonistas, seus interesses e estratégias. As tensões que envolvem o público e o privado se confundem com o redimensionamento do Estado burguês no capitalismo monopolista no que tange ao enfrentamento das manifestações da Questão Social. Para Netto (1992) a incorporação do caráter público da Questão Social vem acompanhada de um esforço da aparência da natureza privada das suas manifestações individuais. Embora haja a implementação de “[...]medidas públicas para enfrentar as refrações da 'questão social', a permanência das suas sequelas são deslocadas para a responsabilidade dos sujeitos individuais que dela as experimentam[...]” (NETTO, 1992, p. 32). Sendo assim, a natureza técnica do Serviço Social se dá na atuação desde a formulação, à execução das políticas sociais tanto no enfrentamento público quanto privado da chamada Questão Social. Dessa maneira, a atuação do Assistente Social nos serviços sociais está ligada às estratégias e mecanismos desenvolvidos pelo Estado de preservação e controle da força de trabalho (NETTO, 1992). 17 Com isso podemos verificar, o trabalho do Assistente Social é permeado de contradições que envolvem o conflito entre o capital e o trabalho. Como afirma Iamamoto (2007, p. 100), sua atuação, “[...] não se limita a reproduzir monoliticamente necessidades exclusivas do capital, também de respostas às necessidades legítimas de sobrevivência da classe trabalhadora[...]”. A autora reforça que é, por meio do enfrentamento coletivo, que a classe trabalhadora busca o acesso aos recursos sociais, via equipamentos coletivos que constituem os direitos sociais do cidadão. Dentre algumas características da prática profissional podemos destacar que o trabalho do assistente social se vincula “[...] aos organismos estatais, paraestatais ou privados, dedica-se ao planejamento, operacionalização e viabilização dos serviços sociais à população[...]”. Quanto à demanda profissional, o Assistente Social é chamado atuar na “linha de frente” nas relações entre instituição e população, entre os serviços prestados e a solicitação desses mesmos serviços pelos interessados. Sendo assim, é no cotidiano das classes populares que o Assistente Social executa a sua práxis, a partir da reprodução das relações sociais. Dessa forma, este trabalho “[...]é expressão de um modo de vida em que não só se reproduzem suas bases, mas em que também são gestadas as bases de uma prática inovadora. [...]” (IAMAMOTO, 2007, p.100-102). Segundo Iamamoto (2007) sua atividade está presente nas diversas esferas da vida: na saúde, na educação, lazer, habitação, família etc. Esse contato direto com a população permite, ao profissional, romper com um caráter pragmático e empirista que marca a atuação profissional, fortalecendo uma visão totalizadora desse cotidiano e da maneira que é vivenciado pelos agentes sociais. Esse contato com as classes subalternas pode consistir numa relativa autonomia do exercício de suas funções institucionais, a partir da relação singular entre o assistente social e o usuário. Embora a profissão seja considerada como um trabalho improdutivo e não desempenhe funções diretamente ligadas à produção de mais-valia, a sua práxis 18 participa da tarefa de “[...] implementação das condições necessárias ao processo de reprodução no seu conjunto [...]” (IAMAMOTO, 2008, p. 86). Iamamoto (2007) trata de analisar que a solicitação do trabalho do Assistente Social nas instituições públicas não é levada pelo caráter técnico-especializado das suas ações, mas para desenvolver funções de cunho educativo, moralizador e disciplinador que, mediante um suporte adminstrativo-burocrático exerce sobre as classes trabalhadoras. Dessa forma, o Assistente Social aparece como “[...] profissional da coerção e do consenso, tendo em vista sua ação eminentemente política [...]” (IAMAMOTO 2007, p. 42). Tal autora confirma que tais características da profissão têm sua base no significado da atividade assistencial derivadas da sua trajetória histórica e sua atualização. Sua demanda pelos canais oficiais do Estado está relacionada, portanto, desde seus primórdios, às tensões e mudanças significativas nas oposições de classes configuradas na Questão Social. Para Netto (1992) a ruptura do Serviço Social com práticas caritativas e voluntárias só pode ser explicada pela sua condição de assalariamento que coloca o significado da profissão vinculado à reprodução das relações sociais. Esse deslocamento de significado, para ele, se deu devido a um espaço determinado na divisão social e técnica do trabalho. Esse espaço só se abriu para a consolidação da profissão, devido a sua vinculação à dinâmica da ordem monopólica. Essa forma de pensar a profissão rompeu com o caráter da 19 profissionalização ligada à que se conhecida como evolução da ajuda, à racionalização da filantropia e à organização da caridade e cria bases de sustentação da profissão, quando o Estado enfrenta a Questão Social por meio das políticas sociais. Iamamoto (2007) define o Serviço Social, considerando como uma especialização do trabalho coletivo, dentro da divisão social e técnica do trabalho. Apesar da crise da categoria trabalho entre os pensadores pós-modernos, a profissão para a autora reivindica a centralidade do trabalho no debate sobre os fundamentos da categoria profissional. Entende-se que “[...]o trabalho produz as condições materiais de sobrevivência, da vida material e reproduz o modo de ser dos indivíduos.[...]” (IAMAMOTO 2007,p. 83-84). A autora salienta que não devemos considerar a prática profissional como uma atividade isolada, é preciso que sejam considerados os condicionantes internos que correspondem ao aprimoramento instrumental e seu desempenho técnico-operativo e os condicionantes externos que inscrevem as circunstâncias sociais e históricasno qual se realiza a prática profissional. (IAMAMOTO, 2007) Para Iamamoto (2007, p. 100), o Serviço Social como profissão, situa-se no “[...] processo de reprodução das relações sociais, fundamentalmente como uma atividade auxiliar e subsidiária no exercício do controle social e na difusão da ideologia da classe dominante entre a classe trabalhadora.” Isto é, na criação de bases para o exercício do poder de classe, intervindo na criação de condições favoráveis para a reprodução da força de trabalho. Como profissional liberal, o assistente social detém de uma relativa autonomia no seu atendimento. No Brasil, o Assistente Social atua por meio da elaboração, gestão, execução, avaliação de políticas públicas, pois o Estado, através dos serviços sociais o contrata executar programas, projetos e políticas sociais, em sua maioria. Essa autonomia vai ser conduzida quanto à dinâmica do seu trabalho, outros fatores que compõe o processo de trabalho que o Assistente 20 Social participa influenciarão sua autonomia como: as relações de poder institucional, os recursos disponíveis para as políticas públicas, as políticas sociais específicas, os objetivos e demandas da instituição empregadora, a realidade social da população usuária dos serviços prestados, entre outros (IAMAMOTO, 2007). Nesse sentido, a autora reconhece que existem variados processos de trabalho no qual se insere o trabalho do Serviço Social, sendo assim ele se encontra dentro de uma organização do processo de trabalho coletivo mais amplo que só tem sentido enquanto compreendido na sua totalidade. As múltiplas manifestações da questão social são consideradas como matéria do trabalho do Assistente Social e por isso conhecer seu objeto de intervenção é fundamental para a ação transformadora do trabalho. Sendo assim, a autora reforça a ação investigativa como central para o entendimento das determinações sociais. 21 FIXANDO O CONTEUDO 1. No livro “Capitalismo Monopolista e Serviço Social (1992)”, o autor elenca fenômenos que explicam a consolidação do capitalismo e expansão do setor de serviços, podemos citar um entre eles: a) Tendência de organização do trabalho vivo, com introdução de novas tecnologias. b) Redução dos lucros. c) Terceirização do trabalho. d) Precarização do trabalho. e) Setor agroexportador. 2. O trabalho do Serviço Social se insere na organização do processo de trabalho coletivo mais amplo que só tem sentido enquanto compreendido na sua: a) Amplitude. b) Dinamicidade. c) Totalidade. d) Particularidade. e) Singularidade. 3. Iamamoto (2007) salienta que não devemos considerar a prática profissional como uma atividade isolada, para isso precisamos considerar: a) Os condicionantes técnicos. b) Os condicionantes internos e externos. c) Os condicionantes científicos. d) A prática profissional. e) A política social. 4. O significado profissional, segundo Netto (1992) se deu devido a um espaço determinado na divisão social e técnica do trabalho. Esse espaço só se abriu 22 para a consolidação da profissão, devido a sua vinculação à dinâmica da ordem monopólica e rompeu: a) Com o Serviço Social crítico. b) Com o capitalismo monopolista. c) Com a filantropia. d) Com as praticas de ajuda. e) As primeiras instituições. 5. Segundo Iamamoto (2007), o Serviço Social como profissão, situa-se no processo de reprodução das relações sociais, isso cria bases para a: a) Produção capitalista. b) Reprodução da forca de trabalho. c) Ampliação do fundo público. d) Alargamento das funções do Estado. e) Marginalidade social. 6. Para Iamamoto (2007), o assistente social pode ser um profissional da coerção e do consenso, tendo em vista sua ação eminentemente política. Isto refere-se a: a) Ao suporte administrativo e burocrático do Estado. b) As ações caritativas da Igreja. c) A ação violenta que esta impregnada no trabalho do assistente social d) Na sua vinculação com as forcas armadas. e) A vinculação institucional. 7. Para Iamamoto (2007), a dimensão investigativa é fundamental à profissão para o entendimento das determinações sociais, pois: a) Vincula-se aos órgãos de pesquisas cientificas. b) Necessita conhecer seu objeto de intervenção para ação profissional. c) Precisa investigar as condições de vida dos trabalhadores. d) Entende a importância do fomento à pesquisa. 23 e) Com a pesquisa, aprimora o instrumental técnico. 8. Os serviços sociais são indispensáveis à manutenção da ordem e do controle social da classe dominada. Nesse sentido, a socialização dos custos da produção, pode se dar de que forma: a) Pela implantação de impostos e taxas somente a classe trabalhadora b) Ações filantrópicas para todos. c) Redução de salário d) Expansão das Políticas Sociais e) Integração da forca de trabalho pelo consumo. 24 A INFLUÊNCIA DO SERVIÇO SOCIAL EUROPEU E NORTEAMERICANO NA CONSTITUIÇÃO DA PROFISSÃO NO BRASIL Trataremos de estudar as principais referências norte-americanas e franco- belgas na constituição da profissão no Brasil que marcou o início do Serviço Social conservador. Apresentaremos traços da profissão no inicio do século XX, o discurso profissional e o tratamento dado às manifestações da Questão Social. Descreveremos as principais técnicas conhecidas desenvolvidas no período para compreendermos o papel da profissão para a sociedade brasileira, entre as décadas de 20 e 50. 2.1 A INFLUÊNCIA DO SERVIÇO SOCIAL EUROPEU E NORTEAMERICANO NA CONSTITUIÇÃO DA PROFISSÃO NO BRASIL. Parafraseando Silva (2002), a influência do modelo franco-belga foi bastante marcante na formação dos assistentes sociais nos anos 1930-40, considerando a priorização dos valores morais e doutrinários no conteúdo curricular obrigatório da categoria profissional. Não é por acaso, que Cardoso (2016) verificou o surgimento de disciplinas relacionadas às questões sociais dos trabalhadores na indústria. No que se refere a essa formação moral-religiosa, Aguiar (1995) coloca, primeiro, que a formação científica foi adotada por meio de disciplinas como Sociologia, Psicologia, Biologia e Moral, buscando conhecer o homem e sua relação com a vida social, mental e moral, econômica e jurídica, social; segundo, a formação técnica: assim o assistente social devia conhecer os desajustamentos dos indivíduos e coletivos para ensinar como fazer diante de tais problemas, compreendendo técnicas morais e auxiliares, como entrevistas, orientação moral, etc.; terceiro, a formação prática é a aprendizagem do “como fazer” a partir das visitas realizadas a obras sociais e às famílias necessitadas e já incorporava as UNIDADE 02 25 iniciativas de estágio e, quarto, a formação pessoal, cabendo à escola orientar integralmente o aluno, a partir de uma formação moral sólida, com orientações pedagógicas individual, doutrinária, com círculos de estudos. O Serviço Social teve por objeto, neste período histórico, remediar as deficiências dos indivíduos e das coletividades, buscando o ajustamento de um determinado quadro, sanando as deficiências acidentais, decorrentes de certas circunstâncias, e não de um defeito estrutural, como retrata nos estudos de Iamamoto e Carvalho (2008). Essa leitura sobre a classe trabalhadora nesta época é bem característica da influência católica e das encíclicas papais que se colocam em oposição ao comunismo, buscando uma harmonia entre as classes sociais. No plano da metodologia e das técnicas, também não se observa por parte dos profissionais, um trabalho de teorização e adaptação à realidade brasileira. A tônica será a do serviço socialde casos individuais; só muito mais tarde se começará a pensar na organização e desenvolvimento de comunidade, e isto também a partir de influência externa. Verifica-se a partir do discurso dos assistentes sociais, a existência de um projeto teórico de intervenção nos diversos aspectos da vida do proletariado, tendo em vista a reordenação do conjunto da vida social. Segundo tal autora, a incorporação da força de trabalho feminina e infantil, as migrações ocasionadas pela transformação da agricultura, as transformações técnicas da produção industrial, tem por consequência a existência de um imenso exército industrial de reserva – vivendo em condições sub-humanas – e permitindo que o preço da força de trabalho possa ser depreciado de seu valor. Neste quadro, a reprodução da força de trabalho ativa – da mesma forma que a daqueles, total ou parcialmente ocupados, componentes do exército industrial de reserva – só pode realizar-se parcialmente sob a forma valor. Torna-se necessária a complementação de sua subsistência. (IAMAMOTO; CARVALHO, 2008). De acordo com os referidos autores, a tarefa principal era recristianizar a sociedade em geral e recuperar valores que reforçam sentimentos de solidariedade e justiça social para justificar as obras católicas e ações sociais com a população, na época. Assim, o perfil exigido do assistente social era caracterizado apenas, pela sua integridade e formação moral. Portanto, a ausência de uma base técnica também marca a atuação profissional dos assistentes socais nas primeiras turmas formadas no Rio e São Paulo, como afirma Iamamoto (2008). Na década de 1940, conforme identifica Aguiar (1995), a presença europeia 26 marcou a constituição do Serviço Social brasileiro, contudo essa realidade mudará neste período com o Serviço Social norte-americano. Esta última presença se dará por meio de adoção de técnicas para o agir profissional, fundamentadas no pressuposto teórico do funcionalismo. Assim, a filosofia neotomista que já tinha raízes na formação do assistente social sofrerá influências por meio do desenvolvimento de técnicas norte-americanas na prática do serviço social brasileiro. Dessa maneira, Aguiar (1995) mostra que neste momento, não haverá a ruptura radical com a Igreja Católica, mas a coexistência das duas posições no cenário brasileiro do Serviço Social. O Serviço Social permanece na base dos princípios católicos e neotomistas, inclusive via Estados Unidos e ao mesmo tempo incorpora técnicas norte-americanas. Essa influência estadunidense marcará a Conferência Nacional de Serviço Social que se realizou em Atlantic City, promovida pela American Association of Schools Work, em 1941, que oferecerá bolsas de estudos aos assistentes sociais sulamericanos para aperfeiçoamento e especialização nas escolas Norte-americanas, tal parceria durará até 1957, como retrata o autor. A relação abaixo indica as primeiras assistentes socais que farão esse intercâmbio, como segue o Quadro 01: Quadro 1: Aproximação Brasil – E.U.A. Assistentes Sociais do Rio de Janeiro e São Paulo Ano de Ingresso na ESS Universidades ou Instituições americanas Período Maria Josefina Rabello Albano (RJ) 1936 New York School of Social Work 1941- 1943 Marília Diniz Carneiro (RJ) 1938 Fordhan University School of Social Service 1942- 1944 Nadir Kfouri 1936 Universidade de Washington National Catholic School of Social Service 1942- 1943 Balbina Ottoni Vieira (RJ) 1941 National Charities Nova York 1943 Maria Helena Correia de Araujo (RJ) 1942 National Catholic School of Social Service Whashington 1944- 1946 Helena Iracy Junqueira (SP) 1936 Universidade de Pittsburg, Pensilvânia 1944- 1945 Fonte: Aguiar (1995) Dessa maneira, essa aproximação EUA-Brasil, se consolidou também a partir da disposição de empréstimos norteamericanos ao governo brasileiro para a Companhia Siderúrgica Nacional, baseada na política de boa vizinhança em 1942 27 com o governo Roosevelt. Assim, como houve os acordos na área financeira, na área cultural também houve, e no que tange ao Serviço Social, Aguiar (1995, p. 60) afirma que esses acordos significaram “[...]a mudança na sua prática com a importação de técnicas de Serviço Social de Casos de início, depois de Serviço Social de Grupo e Comunidade”. Quando os assistentes sociais foram estudar nas universidades americanas, o chamado Serviço Social de casos era o mais desenvolvido. O Serviço Social de Caso recebeu, de início, uma influência da Sociologia, mas é a Psicologia que fundamentará esse método; há preocupação com o indivíduo suas emoções e sua personalidade. Isso se fez possível dado o desenvolvimento econômico dos Estados Unidos, o que não era e não é o caso do Brasil. Mas, como o Serviço Social brasileiro carecia de um aparato instrumental, o Serviço Social norte-americano aparece como solução. E essa influência virá até nós pelas bolsistas, que foram estudar na América do Norte (AGUIAR, 1995, p. 60). Aguiar (1995) ainda reforça a partir dos estudos de Yasbeck que, a influência norte-americana está relacionada neste início, principalmente no que se refere à instrumentação do Serviço Social e mostra que, com a passagem da fase franco- belga para a americana, se apresenta em contrapartida aos conteúdos filosóficos e começa a se impor um conteúdo mais técnico e metodológico, representando um grande esforço para a racionalização do Serviço Social. Dessa maneira, o mesmo coloca que, com a vinda do Serviço Social americano para o Serviço Social brasileiro, a perspectiva funcionalista marca até hoje o Serviço Social no Brasil, “[...]através da presença das Ciências Sociais com Durkheim, Malinovisk, Parsons e Merton.[...]” (AGUIAR, 1995, p. 60). 2.2 AS TÉCNICAS NORTE AMERICANAS E EUROPEIAS ADOTADAS NA PRÁTICA PROFISSIONAL NO BRASIL Aguiar (1995) afirma que, com o aprofundamento das relações Brasil-EUA no que tange ao Serviço Social fica demarcada a importação de técnicas norteamericanas, considerando que o Serviço Social necessitava de aprimoramento técnico-científico. Não obstante, os postulados cristãos e neotomistas, como mostrados anteriormente, não ficarão deslocados da prática profissional, presença cristã ainda será marcante nos processos de Caso, Grupo e Comunidade (técnicas desenvolvidas pelo Serviço Social até a década de 1960). 28 O autor ao analisar o discurso de assistentes sociais na época, confirmou que a partir dos depoimentos coletados por ele, havia traduções de “[...] livros, referentes aos processos de caso, grupo e comunidade, mas nem sempre eram traduções do livro inteiro, mas apenas de capítulos referentes às técnicas [...].” (AGUIAR, 1995, p. 61). Dessa forma, o funcionalismo vai sendo empregado na prática profissional, aos poucos, à medida que as estudantes vão tendo contato com a literatura e desenvolvendo suas práticas profissionais nos campos institucionais. Embora gradativamente, o funcionalismo ganhe corpo, constatamos, ao analisar os programas de filosofia de 48,6% das 37 escolas existentes entre 1936 a 1970, a presença marcante do neotomismo até o início da década de 1960. A presença do neotomismo até esse período se justifica pelo desenvolvimento que ele vai ter, no período de 50, com a influência de Jacques Maritain, pela presença da UCISS e pela elaboração do tomismo nos Estados Unidos e Canadá, articulando seus pressupostos de Caso, Grupo e Comunidade. Para o desenvolvimento do tomismo na America do Norte, foi fundamental a presença de Maritain, que viveu longos anos nos Estados Unidos. Acreditamos que a influencia funcionalista não foi à única herdada dos Estados Unidos – embora possa a ser predominante – recebemos também e concomitantementeuma influencia neotomista fundamentando as técnicas encontradas pelo Serviço Social norte americano (AGUIAR, 1995, p. 61). Para Aguiar (1995), o Serviço Social de Caso foi o primeiro a ser ensinado no Brasil, primeiramente pela corrente sociológica e depois pela psicológica. Sob orientação católica, o mesmo afirmou que, em 1956, no Brasil, o Serviço Social de Caso era ensinado dentro do espírito cristão. Segundo ensinamentos de São Tomás de Aquino, o método do Serviço Social de Casos deve ser concebido dentro de uma parte integrante do trabalho social, com a finalidade de proporcionar a criatura humana bem-estar e que auxilie na organização da comunidade. No que se refere à técnica do Serviço Social de Caso, Gordon (1973) aponta que no processo psicossocial, como um dos processos técnicos, o homem é um organismo biológico e social. O caso, o problema e o tratamento são sempre https://bit.ly/3wXKSXP 29 considerados pelo assistente social como um processo psicossocial. Um caso social não e determinado pela natureza do cliente (família, criança, velho, adolescente) nem pode ser distinguido pela natureza do problema (incapacidade econômica ou problema de comportamento). Um caso social e um fato humano, no qual sempre existem fatores econômicos, físicos, mentais, emocionais e sociais, que atuam em maior ou menor intensidade. Um caso social e composto de fatores internos e externos ou ambientais. Não se lida com pessoas ou com o ambiente, no sentido material do termo, mas trata-se dos indivíduos em relação não somente com suas experiências sociais, mas também com os sentimentos em relação às mesmas. [...] O problema é geralmente interpessoal, além de social (GORDON, 1973, p. 19). O Serviço Social atuava no esclarecimento do problema, fazendo com que o cliente possa agir em relação ao mesmo. Dessa forma, Gordon (1973, p. 19) coloca que a Antropologia e Psiquiatria contribuíram neste método, pois “[...]auxiliarão o assistente social fazer um bom ajustamento do indivíduo, que geralmente estava em situação de angustia, miséria e incapaz nas suas relações pessoais”. Dessa forma, a visão profissional é que o indivíduo precisa ser aceito socialmente e para isso, precisa desenvolver um bom comportamento no seu ambiente que esteja inclinado à desorientação. Portanto, o Serviço Social estimulava e incentivava os indivíduos a tomarem decisões coletivas, favorecendo sua participação ativa na comunidade que o integra. Com essa mudança do Serviço Social, a profissionalização não estava ligada apenas às atividades de caridade, mas estavam nos hospitais, orfanatos, na assistência aos incapacitados, nas organizações para aperfeiçoamento moral, assim, não prestava apenas o auxílio material, como indica Gordon (1973), isso fica bem demarcado pelo lugar que o profissional ocupa neste período. A produção baixa na indústria, as dificuldades de convivência com os companheiros do trabalho, o abandono de crianças, a delinquência são problemas que os assistentes sociais trataram com a ajuda mútua, a reabilitação e a recuperação. Tratamentos estes dados com o Serviço Social de Casos. A ação social também era prática do assistente social, seja por iniciativa individual ou grupo de voluntários, com vistas melhorar as condições de habitação, reformar o sistema penal, melhorar as instituições e métodos de administração da assistência. Sejam em campanhas de previdência social, como no amparo a maternidade e infância, auxílio à velhice, a cegueira, difusão de assistência médica e harmonia das relações entre empregadores e empregados, nos diversos 30 campos, na assistência médica, trabalho, indústria, assistência pública, recreação, educação social, prevenção de delinquência e assimilação das diferentes culturas, como indica Gordon (1973). Dessa forma, os assistentes sociais tratam tais problemas de forma individualizada ou em grupos de modo a possibilitar as pessoas a conviverem socialmente. O Serviço Social de Grupo, como confirma Aguiar (1995) também se baseia nos princípios cristãos na justiça e caridade, incentivando os homens a fazerem caridade em comunidades e serem beneficiados por estas obras caritativas, sendo justificada pela entrada no Reino dos Deus. Destaca-se, também como uma das ações do Serviço Social de Grupo, a formação de comissões, conferências, organização da comunidade para desenvolvimento de programas sociais, na mobilização de um grupo, incentivando lideranças comunitárias, buscando os resultados do trabalho social, educação e aperfeiçoamento popular. Neste período, que o Serviço Social começa a unificar a Pesquisa Social, como processos básicos do Serviço Social, a partir daí surgem o planejamento para a realização do bem-estar social da comunidade. Assim, Gordon (1973) aponta que o Serviço Social de Grupo e um processo psicossocial que desenvolve a capacidade de liderança e cooperação para aproveitamento dos interesses dos grupos em benefício da sociedade. Os indivíduos e grupos, a partir da vivencia democrática e participação comunitária poderão desenvolver responsabilidades, buscando satisfazer suas necessidades, buscando resolução de problemas de forma coletiva, na perspectiva do conhecimento de direitos e deveres sociais, experimentando o compartilhamento da vida social. A partir da interação grupal e a conscientização das finalidades comuns, os grupos podem criar redes de ajuda mutua e formas de ação social. O conhecido Serviço Social de Comunidade não se limita, somente nas obras de caridade e na ação de grupos de voluntários, como define Gordon (1973, p. 32), seu trabalho será baseado em “[...]métodos cooperativistas, em pesquisas e estudos sociais em favelas e bairros populares, com o objetivo de melhoria das condições de vida, adequando-se as necessidades dos moradores aos recursos fornecidos pelo Estado[...]”, promovendo educação social, ou seja, educação popular, por meio de distribuição de informação, formando redes de divulgação. Tanto os programas de assistência econômica e aproveitamento de lazer, 31 como parques, jardins para infância eram administrados pelo governo, quanto os programas de habitação popular, recreação e creches contribuíram para as comunidades. “[...] as técnicas utilizadas são para organizar e atender as comunidades, dentro dos resultados esperados nos programas, buscando sempre a participação da população nas ações sociais.” (GORDON, 1973, p. 32). Por isso, foi necessária a conscientização das ações desenvolvidas pelos assistentes sociais para esclarecimento da população e apoio nos programas de bem-estar. Deve-se destacar que, nesta época de proliferação da tuberculose, a ação dos assistentes sociais estava apoiada numa visão higienista e da medicina sobre o comportamento e os problemas de saúde coletiva, por isso, muitos preconceitos são disseminados, neste período, sobre o modo de vida dos trabalhadores, por meio de ações e tentativas de remoção, justificadas pela falta de higiene e insalubridade habitacional da população pobre. Neste sentido, o papel das visitadoras sociais durante este período era o de ensinar os trabalhadores a morar bem, pois os cortiços e habitações insalubres dos proletários eram foco de “[...] ações higienistas e sanitaristas do Estado para controle de doenças, como tuberculose e outras que pudessem colocar em risco toda a sociedade.” Considerava-se que esta população possuía “[...] costumes depravadados que se agravavam pelos hábitos de uma população meio nômade, avessa a toda e qualquer regra de higiene”, como reforça Vieira (2013, p. 123). Tais segmentos dos trabalhadores viviam em más condições de higiene nas habitações coletivas e eram considerados grupos perigosos pelo poder público. Vieira (2013) problematizaque a proposta de higienização de lugares e pessoas visava combater os desequilíbrios do lar, pois a rotina considerada descomedida, sem regras e com comportamentos nocivos decorria da falta de educação doméstica. Estas ações constituíam um amplo processo de recomposição do espaço urbano fundamentado através desse trabalho social molecular, que afirmava a desqualificação dos trabalhadores e suas famílias por meio da utilização das suas moradias. Neste momento, há um forte vínculo entre higiene e moralização nas ações do Estado, impondo não só modelos de habitação por meio dos parques e vilas proletárias, como também padrões de comportamento. Dessa forma, o binômio: moralização e controle do operariado esteve presente na política do Estado no tratamento da questão da moradia na década de 1940 e 1950, em consonância 32 com os ideais industriais que desejavam que os “[...] trabalhadores pudessem ficar mais próximos do trabalho, diminuindo assim o tempo de locomoção e intervindo no lugar de moradia dos trabalhadores e promovendo habitações bem- construídas, higiênicas e econômicas[...]”, de acordo com os padrões arquitetônicos da época (VIEIRA, 2013, p. 124). Contudo, conforme problematiza Vieira (2013, p. 125), não bastava construir casas consideradas higiênicas, era necessário reeducar os trabalhadores por meio de uma nova lógica de “[...] significados, ordenação e função, a partir de novos hábitos, atitudes e comportamentos [...]”, pois se acreditava que isso era obstáculo ao crescimento econômico. Verdés-Lenoux (1986) realiza um estudo sobre a formação dos assistentes no final do século XIX e retrata a atuação do trabalhador social na França como um dos mecanismos de controle social das classes subalternas, na aceitação de valores dominantes, na individualização das questões sociais como forma de educar a classe operária, a partir de um olhar de disciplinamento, orientação nas suas vestimentas, nos lares, orçamentos domésticos, na maneira de pensar, conformando um trabalho de vigilância domiciliar. Segundo a autora, as visitadoras construíam uma rede de proteção sanitária e social efetiva, até mesmo com vistas a enfrentar a chamada marginalidade social, com o objetivo de trabalhar valores e regras sociais. Neste período, o Serviço Social Francês, influenciado pela psicanálise trabalhava para o desenvolvimento de ações, enquanto conselheira social. A autora também identifica a mudança do discurso de readequação social para educação popular no trato da Questão Social. Esta atuação do Serviço Social francês possui algumas semelhanças com o Serviço Social Brasileiro, no que se refere à sua atuação entre a década de 1940 até meados da década de 1950. Com vistas ao enquadramento dos trabalhadores, aos comportamentos próprios de uma sociedade industrial, moderna e civilizada, as visitadoras sociais realizavam intervenções de modo a produzir diagnósticos sobre o modo de vida das famílias dos proletários. Exercia também o serviço de orientadoras sociais, serviço este que produzia cursos domésticos para atingir as donas de casas, reforçando o lugar da mulher no lar como educadora familiar e principal responsável pela higienização dos costumes, dos hábitos, da implantação de um novo modo de pensar o ambiente doméstico (VIEIRA, 2013). Muitos eram os relatos de desagregação familiar e famílias consideradas mal 33 ajustadas. Os assistentes sociais consideravam entre as motivações de tal desagregação social: a inserção das mulheres no trabalho (nas fábricas), o alcoolismo e a falta de cuidado com os filhos. Acreditava-se na estratégia de familização das camadas populares para elevação do papel social da mulher na estrutura familiar. Com isso, podemos observar uma atuação dos assistentes sociais na perspectiva do enquadramento da força de trabalho e no tratamento moral da questão social e de suas refrações sociais e históricas, a partir de um olhar fiscalizador da vida social, por meio do entendimento da moradia popular como lugar privilegiado para o desempenho das estratégias de ajuste e adequação social (VIEIRA, 2013). 2.3 O DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADE E O DESENVOLVIMENTISMO O início do Governo Vargas, conforme aponta Aguiar (1995) teve a primeira experiência de Desenvolvimento de Comunidade na zona rural, que constituiu uma missão em Itaperuna, no interior do Rio de Janeiro. Tal experiência foi fruto do Seminário Interamericano de Educação de Adultos, em 1949. Os assistentes tinham a visão de que as populações eram: [...] desajustadas, e era preciso integrá-las, adaptá-las a sociedade. Vemos na época, em programas das escolas de Serviço Social, referências a conceitos como normalidade e anormalidade, ajustamento e desajustamento. Essa visão de integração não levava em conta as contradições e desigualdades da sociedade. [...] Os assistentes sociais não puderem perceber as contradições, uma vez que a sua formação nessa época enfatizava que a sociedade é harmônica e que existem apenas alguns desajustes. E era a visão sustentada por Vargas, que sempre buscou o consenso entre as classes. Várias conferências foram realizadas em 1951, em Porto Alegre, por exemplo, teve o Seminário sobre Desenvolvimento de Comunidade promovido pela Organização dos Estados Americanos (OEA), em 1952, em Madras na Índia, que ocorreu a Conferência Internacional sobre Desenvolvimento e em 1953, a ONU promove o Seminário de Bem-Estar Social, na Universidade Rural do Brasil. Neste último seminário, ocorre a discussão do Serviço Social Rural, com presença marcante em 1960. (AGUIAR, 1995, p. 76). Aguiar (1995) indica que tais missões tinham como pressuposto integrar os que eram considerados marginalizados e suprir o atraso cultural do povo rural, com a finalidade de discutir os problemas, reunindo grupos de interesse antagônicos, tais como latifundiários, diaristas e meeiros. Dessa forma, o Ministério da Agricultura, com Vargas foi o espaço que tinha essas experiências de trabalho, sendo que 34 toda a literatura vinha dos Estados Unidos e se apoiava no positivismo de Conte. Já em 1953, o Serviço Social tem seu ensino regulamentado e é autorizada a permissão para emissão de diplomas no final do governo Vargas. No governo de Juscelino Kubitschek, o Estado protagoniza um papel forte no processo de industrialização brasileira. Ianni (1989) aponta a direção de uma política econômica governamental que concentra sua atuação sobre o processo de acumulação de capital, proporcionando condições institucionais para esse processo que envolve as estruturas de dominação, as relações de classe, o imperialismo e suas modalidades recentes de acumulação capitalista. Em síntese, para garantir o desenvolvimento econômico, o Estado atua de maneira decisiva no controle da força de trabalho, do progresso técnico e na acumulação do capital. O dilema do desenvolvimentismo perpassa, segundo seus ideólogos, um nacionalismo mais sadio, ou seja, àquele que possa associar os fluxos do capital ao progresso econômico do país. Esse nacionalismo, se volta para “[...] uma busca racional do poder e bem-estar econômico e da realização cultural de uma comunidade nacional. [...]” (IANNI, 1989, p. 103). Essa concepção harmonizadora das desigualdades e contradições sociais foi a forma que a burguesia nacional assumiu para dar respostas às inquietações das classes assalariadas e ter direção do processo político, diante do risco que a classe trabalhadora pudesse assumir a direção. 35 Para garantir o desenvolvimento econômico do país, tivemos traços deste projeto nacionalista na implantação do Plano de Metas, durante o governo de Juscelino Kubitschek de Oliveira - JK (1956-1961). Este foi um grande exemplo doesforço nacionalista de superação do atraso econômico e social do Brasil. Para Ianni (1989) a burguesia industrial joga com as classes assalariadas para vencer a indústria agrária com o objetivo de elevar as finanças e controlar o circuito do capital. Utilizou-se, portanto, do nacionalismo para atribuir significado e conteúdo ao projeto nacional desenvolvimentista e ganhar adesão dos trabalhadores a esse projeto. Nesse sentido, se observarmos o trabalho dos assistentes sociais em favelas no período da década de 1950, com o desenvolvimento de comunidade, o eixo de mobilização popular estava associado a um projeto de desenvolvimento urbano nacional, cujo objetivo era promover o desenvolvimento econômico aliado ao desenvolvimento social. Contudo, como adverte Ammann (2003), tal dimensão do desenvolvimento social estava assentada na perspectiva de integração social https://bit.ly/3iiVexe 36 através das ações do Estado, como se as mesmas pudessem solucionar problemas de ordem estrutural das classes subalternas. Nos seminários de Desenvolvimento de Comunidade, de 1951 e 1966, a temática sobre Desenvolvimento de Comunidade, geralmente aparece como instrumento de trabalho e era compreendida como uma: [...] técnica que, tendo por base, a discussão de assunto específico, em grupos informais de debate, levam seus integrantes, elementos representativos da comunidade (lideranças, entidade e povo) intencionalmente organizados, a uma tomada de consciência dos problemas e recursos da mesma, tornando-os preparados a realizarem trabalho onde prevaleça o espírito comunitário em uma forma coordenada e harmônica. (AMMANN, 2013, p. 214). Expressava uma construção ideológica tipicamente funcionalista, com foco sobre o controle do processo de intervenção, esmiuçado em procedimentos, etapas, instrumentos, onde os instrumentos mais desenvolvidos eram: o diagnóstico, a programação e a intervenção social. 37 No Desenvolvimento de Comunidade tradicional, relata Ammann (2013, p. 214), o técnico atuará junto às lideranças locais, indicadas estas pelas lideranças formais como, “prefeito, vereadores, dirigentes religiosos. Essas lideranças é que devem nomear pessoas que vêm atuando na comunidade, há tempos, em ações para benefício da comunidade”. Dessa forma, o trabalho desenvolvido tinha um caráter elitista, baseado e reprodutor das estruturas de poder existentes, e era avaliado conforme os interesses da classe dominante. A relação entre o assistente social e a população era baseada entre sujeito e objeto: o técnico era o sujeito da ação e considerava-se como objeto a população usuária, esta em segundo plano. O assistente social preocupa-se em conhecer a cultura da comunidade, principalmente suas normas e valores. Ele terá o cuidado quanto à escolha do projeto, no diagnóstico. Ele deverá procurar conhecer as causas maiores das situações ou dos bloqueios que intervêm no desenvolvimento local. É preciso que o técnico ajude as pessoas a compreenderem os porquês de determinadas 38 situações ou bloqueios, considerando os comunitários (AMMANN, 2013, p. 216). Essa relação com a comunidade era baseada na ideia de conscientizar a população para que eles pudessem olhar seus próprios problemas e resolvê-los coletivamente, como se eles mesmos não pudessem identificar esses problemas. [...] o desenvolvimento de comunidade assume caráter de mecanismo de ação sobre o capital humano, a partir de sua experiência comunitária, e estimula o próprio povo a participar do planejamento e da realização de programas destinados a elevar o padrão de suas vidas por meio de esforços somados entre o povo e o governo. As comunidades deveriam encerrar as razões e as causas de seu desenvolvimento, bem como as condições para que isso acontecesse (GUILHERME, 2012, p. 135). Assim, os problemas da comunidade foram contornados com o tratamento assistencial, na perspectiva ideológica integradora, com a oferta de serviços como: educação popular para as famílias dos moradores de favelas, organização comunitária, educação sanitária, mutirões para a provisão e melhoria de moradias, infraestrutura, etc. Assim, é importante observar que esse contato direto com as populações subalternas, particularmente a partir do seu lugar de moradia, não constitui uma situação ou um lócus da atuação do Serviço Social, na atualidade. Esse diálogo permanente com a classe trabalhadora, mediado pela questão da moradia como expressão social e urbana das relações capitalistas, se faz presente ao longo da nossa trajetória. A associação do trabalho dos Assistentes Sociais com um projeto nacional de desenvolvimento é histórica na nossa profissão enquanto assistentes sociais. Nesse sentido, muitas contradições foram omitidas na perspectiva de inserir as classes subalternas no projeto de dominação do capital, naquela época. Por isso, algumas reivindicações eram atendidas tais como: educação popular para as famílias dos moradores de favelas; organização comunitária; educação sanitária; mutirões para a provisão e melhorias de moradias; infraestrutura como foi problematizado anteriormente. 39 Devemos considerar que o assistente social se manteve, neste período histórico, trabalhando na perspectiva de conciliação entre as classes, embasado na perspectiva funcionalista, a medida que, incorporava algumas pautas da classe trabalhadora ao projeto da burguesia nacional. Na América Latina, é desencadeada, na década de 60, mais forte em 1970, uma clara posição de recusa e crítica ao chamado Serviço Social tradicional, a partir de experiências desenvolvimentistas. É desenvolvida uma posição contrária às ações paternalistas e ações paliativas que se configuram como respostas profissionais aos problemas sociais da época, além da crítica à importação de modelos não compatíveis a realidade brasileira latino-americana. (RAICHELIS, 1988). Outras experiências relacionadas às práticas de educação popular e as experiências desenvolvidas pelo MEB (Movimento de Educação de Base) são mais progressistas. O reconhecimento da dimensão política profissional, na contribuição do processo de conscientização e mobilização social é visto como um confronto de posições que possibilita saltos de qualidade na organização da população, esse processo vai transformando a visão dos profissionais anteriormente ligados aos setores conservadores. A associação com movimentos populares também possibilita aos profissionais essa aliança aos valores da classe trabalhadora, o que reconfigura aos poucos a linha teórica-metodológica da profissão. 40 FIXANDO O CONTEÚDO 1. (Adaptada COPESE-UFT 2012). No serviço social o que pode ser considerado como fundamento da prática social, no processo de reprodução da vida social: a) A prática social em si. b) O homem como ser social. c) A práxis dentro da sociedade. d) O trabalho social. e) Nenhuma das alternativas. 2. (Adaptada CEPERJ-DEGASE 2012). Iamamoto (2008) analisa o Serviço Social como uma profissão inserida na sociedade capitalista. Baseada neste pressuposto, ela verifica que historicamente o assistente social: a) Faz parte livremente da administração do Estado em parcerias privadas. b) Se localiza no processo de reprodução das relações sociais. c) Personifica categorias econômicas e sociais. d) Não é afetado pelo antagonismo entre capital e trabalho. e) Nega os conflitos sociais, preza pela harmonia social. 3. (Adaptada MS CONCURSOS – 2018) Em relação às influências teórico- metodológicos do Serviço Social em diferentes contextos históricos, assinale a afirmativa correta: a) A encíclica “Rerum Novarum” do Papa Pio XI, de 1931,vai iniciar o magistério social da igreja católica no contexto de busca de restauração de seu papel social na sociedade. b) O Serviço Social Brasileiro vai fundamentar a formulação de seus primeiros objetivos políticos/sociais orientando-se por posicionamentos de cunho humanista conservador. c) A influência por meio do desenvolvimento de técnicas norte-americanas na prática do serviço social brasileiro se dará logo no início do surgimento da profissão. 41 d) A natureza técnica do Serviço Social somente no enfrentamento privado da Questão Social por parte do Estado e) Nenhuma das anteriores. 4. Quais eram as características da classe trabalhadora, ou seja, como era vista pelos assistentes sociais na emergência da profissão, sob influência neotomista na profissão: a) Desajustada e Marginalizada. b) Integrada e Consumista. c) Problemática e Esforçada. d) Adaptada e atrasada. e) Civilizada e educada. 5. O Serviço Social de Casos objetivava: a) O Serviço Social buscava entender a conjuntura social para pensar estratégias profissionais. b) O assistente social entrevistava grupos de pessoas para resolver coletivamente os problemas sociais dos sujeitos. c) Tratava de resolver os desajustes para integra-los a comunidade, numa perspectiva de mediar às relações. d) O Serviço Social atuava no esclarecimento do problema, fazendo com que o cliente possa agir em relação ao mesmo para ajustamento do individuo. e) O profissional tratava de tomar o posicionamento de classe para organizar os grupos por categorias geracionais. 6. A técnica do Serviço Social de caso enxergava o homem, como um ser: a) Coletivo e plural. b) Biológico e social. c) Social e humano. d) Abstrato e sentimental. e) Sujeito coletivo e amplo. 42 7. O Serviço Social de grupo atuava na perspectiva de integrar os indivíduos na comunidade, a partir da interação social, incentivando: a) Lideranças comunitárias. b) Lideranças católicas. c) Grupos associativistas. d) Partidos políticos. e) Grupos humanitários. 8. ) O Serviço Social de comunidade atuava na realização de trabalho comunitário para a tomada de consciência dos problemas e recursos da mesma, tornando a população preparada a realizar o trabalho, onde prevaleça o espírito comunitário em uma forma coordenada e harmônica para desenvolvimento de programas sociais em favelas e bairros populares, como retrata Ammann (1980). Tal técnica estava aliada a: a) Um projeto profissional. b) Um projeto societário. c) Ao projeto democrático-popular. d) Ao projeto socialista. e) Ao projeto de desenvolvimento nacional. 43 AS FORMAS DE EXPRESSÃO E ENFRENTAMENTO DA QUESTÃO SOCIAL NA AMÉRICA LATINA, PARTICULARMENTE NO BRASIL Trataremos de analisar neste capítulo, as formas de enfrentamento da Questão Social, as características socio-históricas da formação do capitalismo brasileiro para entendermos o processo de constituição das classes sociais no Brasil e sua polarização de interesses, ao mesmo tempo abordaremos o tratamento dado pelo Estado e pela Igreja para enfrentar os problemas sociais da época. Em contrapartida, analisaremos as condições de vida da classe trabalhadora e suas formas de resistências. 3.1 A QUESTÃO SOCIAL NAS DÉCADAS DE 20 E 30 E A ORGANIZAÇÃO DOS TRABALHADORES A violência gerada por parte do Estado e os protestos no campo e na cidade geram possibilidade de organização da classe trabalhadora. Nas décadas de 20-30 são marcadas pelo populismo e militarismo - a Questão Social é considerada como problema de polícia. Em contraposição, Carvalho (1980) nos explica que a crise de 1929 e o movimento de outubro de 1930 constituem elementos de um processo revolucionário que fará com que o Estado comece a se preocupar com as manifestações da Questão Social, visto as condições vividas pelos trabalhadores brasileiros. A ênfase do autor será tratar da Questão Social neste contexto, a fim de compreender a implantação do Serviço Social no Brasil, com destaque para o significado da pressão exercida pela classe trabalhadora, vejamos: A pressão exercida pelo proletariado – presente mesmo nas conjunturas específicas em que sua luta não se faça imediata e claramente presente enquanto manifestações abertas – permanece constantemente como pano de fundo a partir da qual diferentes atores sociais mobilizam políticas diferenciadas. Essas políticas demarcarão os limites dentro dos quais irá surgir e atuar o Serviço UNIDADE 03 44 Social – a caridade e a repressão – limites em relação aos quais deve se constituir numa alternativa. (CARVALHO, 1980, p. 130). Num quadro social, cultural e econômico em que a classe operária vivia em condições angustiantes: Amontam-se em bairros insalubres junto às aglomerações industriais, em casas infectas, sendo muito frequente a carência – ou mesmo a falta absoluta – de água, esgoto e luz. Grande parte das empresas funciona em prédios adaptados, onde são mínimas as condições de higiene e segurança, e muito frequentes os acidentes. O poder aquisitivo dos salários é de tal forma ínfimo que para uma família média, mesmo com o trabalho extenuante da maioria de seus membros, a renda obtida fica em nível insuficiente para a subsistência. O preço da força de trabalho será constantemente pressionado para baixo daquele nível pela progressiva constituição de um relativamente amplo exército industrial de reserva [...] É comum a observação sobre a existência de crianças operárias de até cinco anos e dos castigos corporais infligidos a aprendizes. Warren Dean calcula, já para 1920, que dá força de trabalho industrial de São Paulo uma terça parte é constituída de mulheres, metade aproximadamente são operários e operárias menores de 18 anos, e 8% menores de 14 anos. A jornada normal de trabalho – apesar de diferir por ramos industriais – é, no início do século, de 14 horas. Em 1911 será em média de 11 horas e, por volta de 1920, no entanto, dependerá na maioria das vezes das necessidades das empresas. Mulheres e crianças estarão sujeitas à mesma jornada e ritmo de trabalho, inclusive noturno, com salários bastante inferiores [...] O operário contará para sobreviver apenas com a venda diária da força de trabalho, sua e de sua mulher e filhos. Não terá direito à férias, descanso semanal remunerado, licença para tratamento de saúde ou qualquer espécie de seguro regulado por lei. Dentro da fábrica estará sujeito à autoridade absoluta – muitas vezes paternalista – de patrões e mestres. Não possuirá também garantia empregatícia ou contrato particular entre patrão e empregado, regido pelo código civil. As frequentes crises do setor industrial, ainda emergente, são marcadas por dispensas maciças e rebaixamentos salariais, que tornam mais sombria a vida do proletariado industrial atirado ao pauperismo. Para suas necessidades de ensino e cultura ficarão, basicamente, na dependência de iniciativas próprias ou da caridade e filantropia. [...] cidadãos de segunda linha (CARVALHO, 1980, p. 131-132). O referido autor destaca que a organização dos trabalhadores foi diversa e constituiu o modo como participavam ativamente da sociedade, que na verdade foi uma das principais maneiras nas quais, os trabalhadores participavam ativamente da sociedade, foi através da utilização da sua força de trabalho e na geração de riquezas. De toda forma, as organizações políticas foram centrais como forças de contraposição às condições de vida insalubres e deletérias à própria reprodução da classe trabalhadora. 45 No plano cultural e social serão desenvolvidas diversas iniciativas baseadas numa forma de ser proletária, constituindo-se
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