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AULA 1 INTERDISCIPLINARIDADE Profª Margarete Terezinha de Andrade Costa 2 INTRODUÇÃO Pensar sobre interdisciplinaridade exige um olhar amplo, que acople o estar aqui e os limiares de onde se deseja ir. Em outras palavras, não se pode pensar a relação entre os conhecimentos sem ter noção do espaço em que ela pode acontecer. É evidente que esse espaço é desmedido, visto que vivemos em um cenário sem limites; convivemos, por meio das possibilidades tecnológicas, em todo o planeta ao mesmo tempo e com possibilidades intermináveis de conhecer instantaneamente o passado e, com isso, antever o futuro. Poderíamos resumir esse pensamento como se fossemos deuses, uma vez que temos a possibilidade, com ajuda da tecnologia, de sermos onipresentes e oniscientes. Todavia, devemos, como já dito, olhar ao nosso redor e perceber a diferença do que se pode fazer daquilo que se faz. Assim, principalmente como educadores, devemos conhecer as diferentes, ricas e importantes culturas e o processo cada vez mais aberto e possível de globalização. Nesta aula, iremos refletir sobre a multiculturalidade, a educação na globalização, a cognição e a tecnologia, os paradigmas da ciência e a educação do futuro, temáticas que se relacionam e embasam o estudo da interdisciplinaridade. TEMA 1 – MULTICULTURALIDADE Nós, seres humanos, temos características interessantes: ao mesmo tempo que somos todos parecidos, com as mesmas necessidades físicas e psicológicas como fome, sono, medo, ansiedade, valorização, entre tantas outras, também somos diferentes: não há, em todo o universo, duas pessoas exatamente iguais. Aliás, igual é uma concepção humana, não havendo nada exatamente idêntico. E isso nos leva a uma grande reflexão: em um universo de pessoas ímpares, por que a ideia de pensar, gostar ou estudar da mesma forma? Não há dúvidas de que somos heterogêneos, e isso é o nosso grande valor. Dessa forma, todas as diferentes culturas têm o seu valor e precisam ser igualmente apreciadas, daí a importância de se pensar o multiculturalismo. 3 1.1 Conceituando Multiculturalismo é um termo composto pelos seguintes elementos: Em que: • Multi é um prefixo que expressa a ideia de muito, plural; • Cultural significa o conjunto de saberes de um indivíduo ou grupo social; • -ismo é um sufixo que remete a um conjunto de ideias, uma doutrina. Assim temos: O termo é polissêmico, isto é, pode ter vários entendimentos. Alguns dizem que o multiculturalismo é a convivência de diferentes culturas em um mesmo território; outros, que é a relação de várias culturas em distintos ambientes. Ou o estudo das culturas díspares espalhadas nos lugares do mundo. O multiculturalismo é também denominado de pluralismo cultural, o que reforça a ideia da ligação do que diferentes culturas têm em comum ou que podem ser compartilhadas, a interligação de grupos culturais distintos. O interessante é pensar que todas as culturas têm um valor social e histórico, devendo, por isso, ser respeitadas de igual forma e que suas diferenças são as características que as tornam ricas. Alguns lugares possuem uma diversidade cultural mais acentuada devido a diferentes colonizações e imigrações, como é o caso do Brasil; outros ambientes possuem uma cultura mais homogênea, sendo imprescindível ressaltar que não se deve considerar nenhuma cultura superior a outra. O mais importante para nossos estudos é analisar as diferentes culturas e a interdisciplinaridade, que também é um termo composto: Multi- cultural -ismo Multiculturalismo – vários conjuntos de saberes Inter- disciplinar -idade 4 Em que: • Inter exprime a noção de relação recíproca; • Disciplinar é uma área do conhecimento, que tem um objeto de estudo escolar, instrução ou pode ter a conotação de dependência a um conjunto de regras com submissão e obediência à autoridade; • -idade indica uma qualidade ou condição, normalmente para forma um substantivo abstrato, como é o caso. Assim, podemos entender que a interdisciplinaridade é a relação entre os objetos de estudos de diferentes áreas do conhecimento. Não há como questionar a relação explícita entre as visões multiculturais da interdisciplinaridade. 1.2 Multiculturalismo e interdisciplinaridade Olhar o mundo respeitando as diversas culturas e saber fazer uma ponte entre os diferentes saberes são bases estruturantes da educação. Se essa for voltada para a formação de um cidadão ético, crítico e que busca a transformação social, a coexistência das diferenças possibilitará o processo. Cabem aqui algumas questões básicas: qual é a real função da escola? Por que a maioria das crianças vai à escola? O que se quer com a educação? Muitas seriam as respostas e cada uma delas refletiria uma concepção de educação. Afirmamos que a escola deveria ter o papel de possibilitar que os estudantes tenham e possam fazer escolhas. Talvez isso seja um desejo pessoal, mas é desejável que todos os alunos tenham condições de poder escolher conscientemente o que querem ser e fazer durante e depois de sair da escola. Figura 1 – Papel da educação Papel da educação na escola dar o poder de escolha 5 Para isso, sem dúvida alguma, há a necessidade de se conhecer os saberes elaborados historicamente e respeitar as diferentes formas de viver de cada ser humano, respeitando também as diversas manifestações culturais, carregadas de crenças, costumes e valores diferentes dos nossos. Em síntese, é preciso ter uma postura multicultural com o olhar interdisciplinar. Figura 2 – Postura multicultural e olhar interdisciplinar Créditos: Lightspring/Shutterstock. Essa reflexão, à primeira vista, pode parecer simplista. Mas, como já expresso, ao se considerar o contexto em que vivemos, podemos conferir que sua execução exige uma maior complexidade. Vamos analisar o porquê disso. Em um contexto capitalista, em que as relações são marcadas por uma relação de troca em busca de lucro, as lutas pelos direitos civis são uma constante, devido à relação de poder de grupos dominantes contra minorias, representadas expressamente por mulheres, negros, homossexuais, adeptos de religiões afro-brasileiras, pessoas com deficiências, entre tantos outros grupos com menor representatividade. Como justificativa da permanência no poder, há uma noção de superioridade cultural que é refletida na construção curricular escolar. Como isso é replicado por muito tempo, acredita-se que determinados saberes também são superiores a outros e que a forma de se transmitirem esses conhecimentos também deve ser mantida. Uma educação que privilegia determinada visão de mundo e fragmenta o conhecimento disciplinarmente vai contra o desejo de educação igualitária para todos. 6 TEMA 2 – EDUCAÇÃO NA GLOBALIZAÇÃO A globalização não é um fenômeno recente. Pedro Alvares Cabral, por exemplo, ao navegar pelo oceano, estava realizando a interligação econômica, política, social e cultural entre continentes, ou seja, ele estava globalizando. Isso se deu várias vezes na história. É claro que com os recursos tecnológicos este processo teve uma ampliação imensuravelmente maior que as aventuras marítimas do final do século XV. A globalização que vivemos tem como base interesses econômicos voltados para a perpetuação do capitalismo, base das nossas relações sociais. Com isso, os detentores do poder financeiro são os maiores beneficiários que transitam entre os recursos disponíveis, sempre na busca de lucro, sendo este não só financeiro, mas também de poder na tomada de decisões. Isso é muito interessante, visto que, por exemplo, na busca de consumidores, os focos dos investidores mudam constantemente. Os investimentos em empresas transnacionais podem ser substituídos pelo controle de aparatos tecnológicos. A globalização nos mostra um perfil socialindividualista, superficial e massificante. São sugeridos, portanto, com base no pensamento de Gadotti (2000), termos como planetário ou mundialização no lugar de globalização quando se refere aos cuidados com o planeta. 2.1 Período pós-pandemia do Covid-19 Impossível não analisar nosso olhar globalizador depois da pandemia do Covid-19, que teve início em 2020. Todos no planeta sentiram as consequências das relações entre os países e as formas político-econômicas de tratar esse episódio histórico. Houve, com a pandemia de Covid-19, uma emergência de ensino na modalidade não presencial e, para isso foi necessário o uso da tecnologia, modificando a posição dos processos de ensino-aprendizagem para todos. Aqui está um ponto muito importante, visto que, diferentemente das primeiras tecnologias nem que a comunicação se dava de um para todo, passou-se a ter o dispositivo comunicacional que permite a comunicação todos para todos. Talvez esse seja o avanço mais significativo: não somente classes sociais privilegiadas tiveram que utilizar as tecnologias educacionais, mas toda uma população e das mais variadas situações econômicas. 7 Outro ponto relevante que precisamos destacar foi a necessidade também emergente de adaptações por parte dos profissionais da educação com o uso dos meios digitais. Cabe ressaltar que a tecnologia deu voz a todos e, também, os mecanismos de controle para, de um lado, salvaguardar a individualidade e, de outro, controlar uma ferramenta poderosa: a comunicação digital. Essa modificação social mundial marcou um momento na história da educação, pois todos nos deparamos com ferramentas muitas vezes não utilizadas ou mesmo vistas como desnecessárias no processo educativo, e o resultado dessa experiência trouxe à tona a importância do domínio e uso de tecnologia na educação. Mas não foi somente esta a grande mudança. Com a óbvia necessidade de aumentar a inclusão digital e social pós- pandemia de Covid-19, de forma globalizada, permitiu-se a extensão dos espaços educativos além da sala de aula. Houve um imperativo de proporcionar aos alunos distanciados uns dos outros, novas oportunidade de ensinar e aprender por meio das tecnologias digitais móveis e, com isso, a abertura de novas tendências políticas governamentais. Assim, a necessidade de se aprender, na prática, como utilizar melhor estas tecnologias. O desenvolvimento de competências digitais básicas se deu para os alunos, para os professores e para gestores escolares em todos os contextos mundiais. A alfabetização digital, o uso de tecnologias, ferramentas comunicacionais e redes sociais tornaram-se exigências curriculares. Para isso, a gerência, integração, avaliação e uso de informações passou a ter papel imperativo nos processos educativos, além de estar estendida à sociedade que também teve seu processo de informatização e conexão realizável. Percebeu-se a possibilidade real de se trabalhar, aprender e estudar de forma remota com uso de tecnologias móveis a nível global. Todavia, fica claro que, frente ao grande número de possibilidades, o engajamento do aluno em relação aos conteúdos a serem aprendidos também deveria ser adaptado. A aprendizagem precisaria proporcionar desafios, resolução de problemas, jogos, realidade aumentada e, principalmente, uma leitura crítica das informações disponíveis em rede, cabendo ao professor buscar a superação do uso da tecnologia pela tecnologia e reconhecer uma função maior que os simples encantos proporcionados pelos recursos midiáticos. Para isso, faz- se necessário entender os processos cognitivos e sua relação com a tecnologia. 8 TEMA 3 – COGNIÇÃO E A TECNOLOGIA A cognição é a capacidade que nós, seres humanos, temos de processar informações e transformá-las em conhecimentos. É como o cérebro interpreta as sensações obtidas pelos sentidos, transformando-as em entendimento. Esse processo é resultado de uma adaptação biológica nos diferentes estágios de desenvolvimento da inteligência (Piaget, 1976) O conhecimento também é, por sua vez, uma capacidade humana de entender, apreender e compreender informações disponíveis no meio que vivemos e aplicá-las elaborando algo novo. A cognição utiliza habilidades mentais e cerebrais para organizar os conhecimentos, tais como a percepção, atenção, associação, imaginação, juízo, raciocínio, pensamento, linguagem e memória. Esses eventos são desenvolvidos em todas as fases da vida dos seres humanos. 3.1 Tecnologia A tecnologia entrou nos processos educativos, há muito tempo: o uso do giz é uma forma tecnológica de se trabalhar; o livro impresso foi por muito tempo uma forte ferramenta utilizada como suporte educacional; a utilização de recursos como rádio, televisão e vídeos são formas tecnológicas utilizadas paralelamente ao ensino nos diferentes espaços escolares. Já estamos na quarta geração com o computador conectado à internet. Até muito pouco tempo, a tecnologia digital servia apenas como um recurso a mais, sem grandes preocupações metodológicas. A discussão vai além da ideia de integrar tecnologias no sistema educativo, devendo estar voltada para as mudanças sociais e o ensino tradicional como um processo que deve ser repensado. Se a metodologia educacional for tradicional, a tecnologia por si não resolverá os problemas educacionais, principalmente porque a sociedade está em plena transformação e pede uma formação escolar também pronta para o pensamento com bases tecnológicas e digitais. Com o surgimento e, principalmente, a divulgação dos recursos tecnológicos, houve um significativo aumento dos estudos sobre a cognição humana e sua relação com a área computacional. Borges et al. (2004, p. 79) fazem uma analogia entre o cérebro e o computador, como os dispositivos de entrada e saída e as unidades de processamento. 9 Figura 3 – Analogia entre o cérebro e o computador Créditos: Planeto F Vectors/Shutterstock. Mesmo havendo alguns pontos em comum, alguns autores discordam da comparação entre o cérebro e o computador, principalmente pela emoção, que é exclusivamente humana, pelo menos por enquanto. Maturana e Varela (2001) apontam a analogia errônea principalmente em relação ao sistema nervoso central, como uma unidade que interage por meio de entradas e saídas; para os pesquisadores, o cérebro não capta informações, como se pensa; ele reage às perturbações do meio e mudanças que estas desencadeiam no organismo. Para Morin (2003), a comparação até seria possível, todavia, ele ressalta que o cérebro não foi fabricado como o computador; ele é uma máquina biológica, química e elétrica que trabalha com elementos de precisão e imprecisão, certezas e incertezas, cruzando rememoração com a invenção e criação. Esclarece que o computador realiza grandes performances e que há uma inteligência artificial que se limita à computação, enquanto a mente humana associa a computação cerebral na cognição, no pensamento que vai além do que é posto. Além do encanto, existe outro fato que deve ser considerado, a banalização, que ainda persiste, mesmo frente aos avanços teóricos e técnicos do uso da internet na educação. Ao abrirem espaço na rede educacional, os Dispositivo de entrada sistema sensor Dispositivo de saída Sistema efetor Unidades de processamento Conhecer: algoritmo de captar, representar, armazenar, recuperar e processar os atributos, coisas ou regras para transformar em símbolos 10 recursos tecnológicos chamaram a atenção da ideologia publicitária e o aumento do apelo de venda. Isso não seria problema se não houvesse detrimento dos conteúdos e processos comunicacional, já que houve um aumento no lançamento de produtos ditos educacionais, mas que não possuem bases científicas sólidas; somado ao despreparo na área tecnológica de alguns docentes que não possuemainda um olhar crítico sobre alguns produtos e serviços oferecidos no mercado, ou melhor, ainda, não conseguem relacionar os dispositivos dos recursos tecnológicos aos princípios educativos que podem ser aproveitados na formação educacional. Cabe prestar atenção ao termo relacionar, que está diretamente ligado à interdisciplinaridade, que realiza a relação entre conhecimentos, estimula a criatividade e desperta o interesse. A intenção de uma educação plena é fazer com que os alunos adquiram uma visão completa e aplicada dos conteúdos trabalhados; o emprego dos meios telemáticos possibilita o detrimento da visão parcializada e sem conexão com a realidade, oferecendo dispositivos informacionais e comunicacionais mais eficientes e práticos, e isso está se dando em todos os níveis de ensino. O advento da pandemia criou a necessidade do uso de interfaces disponíveis na internet para a interatividade, compartilhamento e participação de todos na elaboração dos saberes. Isso também se deu com o trabalho em equipe que desenvolve as habilidades socioemocionais. Isso porque a interdisciplinaridade pressupõe a integração de saberes e a troca conceituais entre seus participantes pelo compartilhamento de conhecimentos, reflexões, descobertas, discussões, que é oportunizada pelos meios tecnológicos. 3.2 Educação e tecnologia Houve um tempo, não muito distante, no qual os alunos iam para a sala de informática ter aula envolvendo a tecnologia em tempo e espaço predeterminados. Pouco tempo depois, desfechou a discussão sobre a grande problemática do uso de celulares pelos alunos durante as aulas. E aí veio a pandemia do Covid-19, que forçosamente modificou o paradigma das aulas tradicionais. Até o advento da pandemia, o ensino a distância era visto com certa resistência e havia muito preconceito em sua concretização. Depois disso, todos, absolutamente todos tiveram que efetivamente utilizar da tecnologia para manter os processos educativos, de tal modo que o processo de resistência às aulas on- 11 line foi substituído pelo obrigatório mergulho no ciberespaço e utilização das tecnologias na educação em tempo integral, na qual a linguagem digital teve que ser apreendida e utilizada em tempo recorde. Esse processo modificou a visão engessada das aulas presenciais. Um ponto importante desse advento é que, muitas vezes, houve troca dos papéis de ensino-aprendizagem tradicionais, visto que alunos ensinaram professores a utilizar os recursos da internet. Com isso, o universo educacional teve que ser revisto. Esses processos fizeram que nos deparássemos com categorias buscadas há muito tempo, tais como a autonomia, criticidade e interatividade do e com os alunos, o que vem em sentido contrário às tradicionais aulas expositivas e bancárias utilizadas por décadas. Ao mesmo tempo, devemos pensar no papel tão importante do professor e sua formação, a superação dos modelos instrucionistas, reprodutores de saberes de maneira linear e autoritária na qual esses são dominadores dos saberes e donos dos processos educativos, que foi superado e ressignificado frente às práticas educativas. A especificidade educativa e sua centralidade não podem ser suprimidas frente a efeitos especiais e recursos tecnológicos simplesmente. A aprendizagem deve ter um caráter significativo com rigor e profundidade. O infinito número de informações disponíveis digitalmente precisa ter sentido e transformar-se em instrumento de interlocução com conteúdos de aprendizagem e desenvolvimento cognitivo esperado para aqueles que passam pelo processo educacional. Dessa forma, um trabalho educativo voltado para a interação com diferentes saberes, somado ao conhecimento das relações estabelecidas entre eles e o seu uso eficaz, deve proporcionar um crescimento intelectual efetivo. Assim, ao interpretar, criar e se auto-organizar, o estudante e professor estão elaborando uma rede de saberes interdisciplinares práticos e uteis para a formação de sujeitos ativos e inteirados com o universo em que convivem. Paralelamente ao processo exposto, existe outro patamar, que é o autodidatismo: ao desenvolver a autonomia do aluno frente às informações disponíveis, cria-se a possibilidade de o sujeito buscar conhecimentos de interesses individuais. Cabe à educação formal incentivar esse procedimento, todavia acenando para alguns cuidados frente ao atributo e à importância do autoaprendizado. Deve-se desenvolver no aluno a criticidade quando à qualidade do conteúdo, sua significação, seleção das fontes de informação e formas de sua 12 manifestação, sendo também tal habilidade imperiosa na formação de um verdadeiro cidadão. A sala de aula transformou-se em outro cenário, no qual o modelo de transmissão tradicional foi superado. O professor, como mestre que fala e dita, foi substituído por um processo de participação genuína, isto é, o processo mecânico transformou-se em participação sensório-corporal e semântica (Silva, 2010), os fundamentos da interatividade transformaram-se em pilares educacionais e formadores de pessoas para a participação cidadã. A interatividade é um conceito de comunicação, ele acontece entre seres humanos, seres humanos e máquina ou entre usuários e serviços. Para que haja interatividade, ainda segundo Silva (2010), é preciso duas relações básicas, a primeira se dá dialogicamente entre o emissor e receptor como seres antagônicos e complementares na cocriação da comunicação e o segundo é a intervenção tanto do emissor quanto do receptor no conteúdo da mensagem. Esses processos modificam a concepção clássica da comunicação na qual o emissor emite uma mensagem que é captada pelo receptor, por exemplo, na sala de aula tradicional. Silva (2010) apresenta alguns fundamentos para a produção e gestão de práticas pedagógicas interativas: • Participação-intervenção: participar não é apenas responder “sim” ou “não”, significa modificar a mensagem; • Bidirecionalidade-hibridação: a comunicação é a produção conjunta da emissão e da recepção, é cocriação; os dois polos codificam e decodificam; • Permutabilidade-potencialidade: a comunicação supõe múltiplas redes articulatórias de conexões e liberdade de trocas, associações e significações. Para dar conta dos compromissos educacionais nacionais, houve necessidade de investimento, até certo ponto irrisório, a fim de proporcionar maior comunicação e conexão entre as escolas, alunos, famílias e professores. Não podemos ser ingênuos, pensando que todos têm o mesmo tipo de acesso à tecnologia. No entanto, muito se caminhou nesse sentido; a educação a distância teve um disparo em relação ao que acontecia anteriormente. Assim, surgiram usos do ensino a distância para grande parte de nossos estudantes. Vamos começar revendo o que cada forma de ensino significa. 13 • Aprendizagem remota é a transmissão das aulas em tempo real em plataforma de streaming. Nesse modelo, tanto os professores quanto os alunos participam da aula ao mesmo tempo, seguindo um calendário similar à modalidade presencial. Há uso de recursos didáticos tecnológicos como os conteúdos assíncronos; • O ensino híbrido, ou blended learning, é a combinação entre o ensino presencial e on-line. Nesse modelo, as aulas não precisam, necessariamente, ocorrer em tempo real; elas ficam disponíveis para que os alunos as acessem quando tiverem oportunidade. As aulas presenciais acontecem de forma que os alunos e professores estejam no mesmo lugar ao mesmo tempo; as aulas remotas são síncronas, acontecem ao mesmo tempo, mas em lugares diferentes; e as aulas híbridas são ministradas de forma assíncrona, em tempos e lugares diferentes. TEMA 4 – PARADIGMAS DA CIÊNCIA Um dos grandes paradigmas da ciência é, sem dúvida, os problemas educacionais. Isso ocorre devido à significativa lacuna existente entre os avançose retrocesso vistos dos processos educativos e seus reflexos na vida de todos, principalmente ao considerarmos as classes menos privilegiadas e os irrisórios investimentos na educação pública em nosso país. Não há como não reconhecer as melhorias proporcionadas pela tecnologia na qualidade de vida, todavia, esse progresso não atinge a todos, havendo uma massa de pessoas sem acesso aos meios de produção dos recursos desenvolvidos, sendo somente consumidores desprovidos do controle social e econômico de suas próprias vidas. 4.1 Ciência e educação O cerne do processo científico tem seu início na educação básica, a qual tem a especificidade de proporcionar bases culturais aos alunos a fim de prepará- los para agir no mundo. Porém, no decorrer dos tempos, os seres humanos têm tido diferentes concepções de educação e de sua importância. Cabe reforçar a grande diferença de investimentos na educação pública básica, que atinge a maioria dos estudantes do país, refletindo em uma formação fragilidade de alunos e consequentemente dos próprios docentes. 14 Um problema de resiliência é que as camadas populares mais simples veem na escola espaços que não proporcionam mudanças nos processos sociais de forma ampla, contrariando, assim, sua finalidade maior e afastando com isso o envolvimento com a ciência como fundamento do entendimento dos processos e como caminho de formação de um cidadão crítico e autônomo. Dessa forma, distancia-se do pensamento científico na sua formação básica, visto que há um número significativo de pessoas para as quais a educação foi tida de forma fragmentada e não vinculada ao mundo em que vivem. Assim, o processo educativo é visto parceladamente organizado em anos, séries, períodos, disciplinas que não se conectam entre si e nem como a realidade vivida. Cabe aqui expor a educação internalizada, pensada no final do século XX. De acordo com Gadotti (2000), possibilitaram-se planos de educação, com baixo custo e elevados benefícios e que tinham como princípio uma educação igual para todos, todavia com parâmetro curricular comum, mas não com princípio de justiça social. Para que se possa ensinar a pensar criticamente, há necessidade de uma aproximação dos diversos campos de conhecimento e é necessário haver a construção de uma visão que os percorra sob uma mesma ótica. Essa construção não pode ser alienatória, improvisada ou realizada em momentos estanques; ela precisa ser aprendida e ensinada no espaço educativo. A escola precisa proporcionar uma linguagem comum que entenda as diferentes abordagens, axiomas e pressupostos científicos, esclarecendo a separação didática das ciências e ensinando a retomada da visão holística necessária para o entendimento do que está acontecendo ao nosso redor. TEMA 5 – EDUCAÇÃO DO FUTURO Pensar a educação do futuro é um grande desafio, principalmente frente às grandes e principalmente rápidas mudanças vivenciadas na história. Todavia, uma assertiva é a centralidade do conhecimento, em contrapartida às múltiplas possibilidades metodológicas. Outro ponto convergente é a necessidade de se ter uma visão da relação do ser humano com o planeta. Dessa forma, é preciso considerar as aceleradas transformações em todos os sentidos, seja na área tecnológica, nos costumes e crenças, nos conhecimentos e principalmente na educação, e é importante pensar no entendimento não limitado das relações e interligações em que estamos inseridos. 15 5.1 Holismo Holismo é um termo derivado do grego holos, que significa “inteiro, composto, completo, global, o todo”. O sufixo -ismo também é derivado do grego, formando nomes que designam fenômenos, sistemas, doutrinas e conceitos de ordem geral. Dessa forma, holismo é a visão interligada de tudo que nos rodeia, inclusive nós mesmos em relação ao outro e a todas as coisas e fenômenos. Essa visão embasa a interdisciplinaridade, a multiculturalidade e a globalização, elementos necessários para uma educação plena dos cidadãos e que contempla as necessidades de sempre. 5.2 Paradigmas holonômicos Quando percebemos a relação que há entre tudo que nos rodeia, entendemos a integralidade dos fenômenos de forma sistêmica. Isto é, existe uma organização metódica e generalizada de causa e consequência em tudo que existe. Dessa forma, não há como conceber uma educação que seja fragmentada e organizada em disciplinas estanque, sem real ligação entre os saberes, como propõe a visão cartesiana, que vê o todo como a soma das partes. A visão holística é universal e sistêmica, visto que procura a conexão e desconexão entre a parte no todo. Segundo Edgar Morin (1993, p. 1), “recolocá-los em seu meio ambiente para melhor conhecê-los, sabendo que todo ser vivo só pode ser conhecido na sua relação com o meio que o cerca, onde vai buscar energia e organização”. Os paradigmas holonômicos têm alicerce no holismo e na complexidade, ou seja, na heterogeneidade, diversidade e multiplicidade. Com eles, a ideia de certo e errado da visão cartesiana é substituída por escolha, decisão, projeto, ambiguidade e síntese. Dessa forma, a formação educacional dos seres humanos é tida como um processo de totalidade e a transdisciplinaridade. De acordo com Gadotti (2000), a transdisciplinaridade é entendida com uma atitude e um método que vão ao encontro do contexto atual como a hol- -ismo holismo 16 pedagogia da terra, a ecopedagogia e outras vertentes voltadas a uma sociedade sustentável. A interdisciplinaridade busca uma melhor forma de trabalhar o conhecimento, assim como a trans, multi, pluri e tantas outras formas de se trabalhar o processo ensino-aprendizagem. O importante é ter fundamentação suficiente para saber escolher e utilizar sempre a melhor metodologia. Nesta aula, pretendemos mostrar que há uma nítida relação entre os seres humanos entre si e entre eles e o contexto em que vivem. O compartilhamento universal do conhecimento carece de uma visão ampla, densa e suficientemente fundamentada, que respeite os preceitos multiculturais, globalizados e preparados para as inovações tecnológicas que surgiram. 17 REFERÊNCIAS BORGES, M. E. N. et al. A ciência da informação discutida à luz das teorias cognitivas: estudos atuais e perspectivas para a área. Cadernos BAD 2, Lisboa, p.80-91, 2004. GADOTTI, M. Perspectivas atuais da educação Porto Alegre: Artes Médicas, 2000. MATURANA, H. R.; VARELA, F. J. A árvore do conhecimento: as bases biológicas da compreensão humana. Trad. Humberto Mariotti; Lia Diskn. 2. ed. São Paulo: Palas Athena, 2001. MORIN, E. O método 5: a humanidade da humanidade. Trad. Juremir Machado da Silva. 2. ed. Porto Alegre: Sulina, 2003. PIAGET, J. Psicologia e pedagogia. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense; Universitária,1976. SILVA, M. Sala de aula interativa a educação presencial e à distância em sintonia com a era digital e com a cidadania. Revista Digital de Tecnologias Cognitivas, n. 3, jan.-jun. 2010. Disponível em: <https://bit.ly/3H09p3O >. Acesso em: 24 jan. 2022. .
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