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CON TABILIDADE AVA N ÇA DA Sérgio A. Porciúncula Jr. Código Logístico 59589 Fundação Biblioteca Nacional ISBN 978-85-387-6688-9 9 7 8 8 5 3 8 7 6 6 8 8 9 Contabilidade Avançada Sérgio A. Porciúncula Jr. IESDE BRASIL 2020 © 2020 – IESDE BRASIL S/A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito do autor e do detentor dos direitos autorais. Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: Todos os direitos reservados. IESDE BRASIL S/A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ P871c Porciúncula Jr., Sérgio A. Contabilidade avançada / Sérgio A. Porciúncula Jr. - 1. ed. - Curitiba [PR] : Iesde, 2020. 162 p. : il. Inclui bibliografia ISBN 978-85-387-6688-9 1. Contabilidade. 2. Investimentos. I. 20-65596 CDD: 657 CDU: 657 Sérgio A. Porciúncula Jr. Mestrando em Governança e Sustentabilidade pelo Instituto Superior de Administração (ISAE). Especialista em Controladoria pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Graduado em Ciências Contábeis pela mesma instituição. Formação em Professional & Self Coach (PSC) pelo Instituto Brasileiro de Coaching (IBC). Foi professor das disciplinas de Perícia Contábil em Ciências Contábeis e Auditoria e Gestão de Risco, além de palestrante em treinamentos de contabilidade para escritórios jurídicos e instituições de ensino superior. Tem experiência nas áreas de consultoria, auditoria interna e externa e gestão administrativa e financeira. Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! SUMÁRIO 1 Investimentos em participações societárias 9 1.1 Investimentos: conceitos e classificações 9 1.2 Influência significativa: aquisição e perda 12 1.3 Aplicação do Método da Equivalência Patrimonial 14 2 Redução ao valor recuperável de ativos 37 2.1 Ativos que podem estar desvalorizados 38 2.2 Mensuração do valor recuperável 47 2.3 Desvalorização e sua reversão 55 3 Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes 61 3.1 Principais conceitos e critérios de reconhecimento 62 3.2 Mensuração de provisões, passivos e ativos contingentes 72 3.3 Mudanças nas provisões 76 4 Mensuração do valor justo 82 4.1 Principais conceitos do valor justo 82 4.2 Formas de mensuração para ativos e passivos 85 4.3 Técnicas aplicadas à mensuração do valor justo 91 4.4 Hierarquia do valor justo 94 4.5 Identificando transações que são forçadas 102 4.6 Divulgação 102 5 Receita de contratos com clientes 105 5.1 Principais conceitos dos contratos com clientes 105 5.2 Reconhecimento, mensuração e custo do contrato 110 5.3 Julgamentos significativos a serem observados 129 6 Arrendamentos 134 6.1 Principais conceitos de arrendamento 134 6.2 Identificação de arrendamento 137 6.3 Mensuração do arrendamento: inicial e subsequente 143 Gabarito 157 Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! APRESENTAÇÃOVídeo Esta obra trata de tópicos selecionados com base nas práticas contábeis adotadas no Brasil por meio dos Pronunciamentos Técnicos (também conhecidos como CPC), que são amplamente discutidos pelos profissionais contábeis e, muitas vezes, classificados como de complexidade média ou avançada devido aos desafios em suas interpretações e adoções. Nesse sentido, o objetivo principal dessa obra é detalhar esses conteúdos buscando torná-los mais acessíveis e de maior compreensão para esses profissionais, bem como para o público em geral, que faz uso da contabilidade como instrumento de tomada de decisão. Nesse viés, no primeiro capítulo discorro sobre os investimentos em participações societárias por meio do Pronunciamento Técnico CPC 18(R2) – Investimento em Coligada, em Controlada e em Empreendimento Controlado em Conjunto, passando pelos principais conceitos: influência significativa; controle, alcance, uso e descontinuidade do método de equivalência patrimonial; alocação de ágio nos investimentos em participações; mensuração e reconhecimento. No segundo capítulo, trato do Pronunciamento Técnico CPC 01(R1) – Redução ao Valor Recuperável de Ativos e dos procedimentos a serem seguidos pelos profissionais contábeis quanto à identificação dos ativos que podem estar desvalorizados, técnicas de mensuração, reconhecimento da perda por desvalorização e situações em que pode ocorrer a reversão das eventuais perdas apuradas. O terceiro capítulo abrange o Pronunciamento Técnico CPC 25 – Provisões, Passivos Contingentes e Ativos Contingentes e as diferenças existentes entre Provisões, Passivos e Ativos Contingentes, Contas a Pagar e Provisões Accruals. Reconhecimento contábil, mensuração de riscos e incertezas, e contrato oneroso também são temas relevantes devido ao grau de julgamento profissional aplicado nessas estimativas contábeis elaboradas. Sobre o Pronunciamento Técnico CPC 46 – Mensuração do Valor Justo, trato, no quarto capítulo, das formas de mensuração do valor justo, como as técnicas de avaliação aplicadas na mensuração, as hierarquias e outros temas correlatos que proporcionam o adequado entendimento do uso do valor justo nas demonstrações contábeis das empresas. No quinto capítulo, abordo o Pronunciamento Técnico CPC 47 – Receita de Contrato com Cliente com base no modelo de cinco etapas para reconhecimento da receita e os julgamentos significativos e necessários para determinadas situações e aspectos de divulgação nas demonstrações contábeis. 8 Contabilidade Avançada No último e sexto capítulo, abordo o Pronunciamento Técnico CPC 06(R2) – Arrendamentos, o qual representa um dos melhores exemplos da observância do princípio da essência sobre a forma que o profissional contábil deve conhecer. Além disso, discorro sobre os principais conceitos, como a identificação de um arrendamento, a mensuração e reconhecimento inicial e subsequente dessas transações, os impactos no ativo, no passivo e no resultado do arrendador e arrendatário e suas respectivas divulgações. Por fim, como forma de agradecimento, dedico esta obra a minha esposa, Simone, companheira e apoiadora incondicional em todos os momentos da minha vida, a minha mãe, Nádia, ao meu pai, Sérgio, aos meus sogros, Paulo e Eva, e in memoriam dos meus avós, Maria e José Carlos, e meu irmão, Piérre. Investimentos em participações societárias 9 1 Investimentos em participações societárias A necessidade de se estudar os investimentos em participações socie- tárias nasce das transações de compras e vendas celebradas no nível da administração das empresas e que migram para o campo contábil. Sob a ótica da formalização dessas compras e vendas, podemos citar como exemplos de eventos motivadores: o desenvolver de um plano estratégico de diversificação dos resultados por meio do lucro obtido com investimentos em outras empresas; a compra de uma empresa concorrente no mercado para “controlar” a concorrência e aumentar o market share; um plano de expansão das operações e da marca da entidade com abrangência internacional. Pela relevância do assunto, o objetivo deste capítulo é levar até você, estudante efuturo profissional contábil, os principais tópicos seleciona- dos, tendo como principal referência o Pronunciamento Técnico CPC 18 (R2) – Investimento em Coligada, em Controlada e em Empreendimento Controlado em Conjunto, corroborando o relevante papel da contabilida- de no ambiente corporativo e no apoio à tomada de decisão empresarial. Boa leitura! 1.1 Investimentos: conceitos e classificações Vídeo Podem existir várias razões para que a gestão de uma empresa decida investir em outras empresas. Independentemente das motivações, é fato que, para o corre- to prosseguimento desses investimentos, o profissional contábil deve estar atento e preparado para acompanhar o desenrolar das transações e os procedimentos necessários, com o objetivo de viabilizar, concretizar e proceder os registros contá- beis adequados. O estudo, a avaliação e a divulgação dos investimentos em participações societárias são o objeto da contabilidade desde a Lei n. 6.404/1976. Entretanto, foi com o advento da harmonização das práticas contábeis brasileiras, com a Lei n. 11.638/2007, que os pronunciamentos, as orientações e as interpretações técnicas começaram a ser emiti- 10 Contabilidade Avançada dos pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC). Desde a publicação desses do- cumentos técnicos, também pudemos verificar alterações significativas no tratamento contábil de eventos e transações com a inclusão de conceitos, classificações das par- ticipações e movimentações societárias, que passaram a ser exigidas e observadas. No Quadro 1, a seguir, são apresentados os documentos técnicos foco des- te capítulo e as respectivas normas do Conselho Federal de Contabilidade (Normas Brasileiras de Contabilidade – NBC), as quais endossaram a emissão dos Pronunciamentos, e as correspondentes Normas Internacionais (IFRS). Quadro 1 Relação dos correspondentes CPC, NBC e IFRS Documentos emitidos pelo CPC NBC emitidas pelo CFC Normas Internacionais de Relatórios Financeiros (IFRS) Pronunciamento Técnico CPC 18 (R2) – Investimento em Coligada, em Controlada e em Empreendimento Controlado em Conjunto. NBC TG 18 (R2) – Investimento em Coligada, em Controlada e em Em- preendimento Controlado em Conjunto. IAS 28 – Investments in Associates and Joint Ventures. Interpretação Técnica ICPC 09 (R2) – Demonstrações Contábeis Individuais, Demonstrações Separadas, Demonstrações Consolidadas e Aplicação do Método da Equivalência Patrimonial. ITG 09 (R1) – Demonstrações Contábeis Individuais, Demonstrações Separadas, Demonstrações Consolidadas e Aplicação do Método de Equivalência Patrimonial. Sem correspondente equivalente no IFRS. Fonte: Elaborado com base em CPC, 2012b e 2012c. 1.1.1 Conceitos Antes de avançarmos, destacamos os principais conceitos que lhe auxiliarão no entendimento mais aprofundado dos tópicos à medida que são apresentados. Os termos são indicados no item 3 do CPC 18 (R2) (2012b) e contam com algumas ex- plicações complementares, quando necessário. • Coligada: “entidade sobre a qual a investidora tem influência significativa”, ou seja, detém 20% ou mais do capital votante, sem controlá-la. • Controlada: “entidade que é controlada por outra entidade”, ou investidora. • Controladora (ou investidora): “entidade que controla uma ou mais controladas”. • Influência significativa: poder (ou capacidade) que a investidora tem de to- mar decisões sobre políticas financeiras, operacionais e estratégicas da in- vestida, sem que haja o controle individual ou o conjunto dessas políticas. A influência significativa é presumida quando a investidora detiver 20% ou mais do poder de voto da investida, sem deter o seu controle. • Controle sobre a investida: “quando a investidora controla e tem preponderân- cia em decisões, políticas financeiras e operacionais da investida” (CPC, 2012d). O controle também se relaciona com os direitos da investidora sobre o que cha- mamos de retornos variáveis decorrentes de seu relacionamento com a investi- da e a capacidade da investidora de afetar esses retornos, acessar os benefícios e revertê-los para si. Os retornos variáveis podem ser explicados como sendo A Lei n. 11.638/2007 aprovou os dispositivos para recepcionar os Pronunciamentos Contábeis (CPC), com base nas International Financial Reporting Standard (IFRS), em português, Normas Internacionais de Relatório Financeiro, e concretizou o processo de harmonização das práticas contábeis adotadas no Brasil com as práticas contábeis internacionais. Saiba mais Investimentos em participações societárias 11 as decisões estratégicas tomadas pela investidora que impactam diretamente os resultados operacionais da investida. • Negócios em conjunto 1 : “negócio do qual duas ou mais investidoras têm o controle conjunto sobre a investida”, estando vinculadas por acordo contra- tual que dá controle conjunto. • Controle conjunto sobre a investida 1 : “quando duas ou mais investido- ras compartilham o controle de uma mesma investida”, ou seja, não há uma única parte que tenha o poder de controle individualmente; esse controle é contratual e exige o consentimento unânime das partes que o compartilham. • Método da equivalência patrimonial: “método utilizado para refletir na contabilidade da investidora as mutações do patrimônio líquido ocorridas nas investidas, independentemente se for uma coligada, controlada ou um empreendimento controlado em conjunto”. • Potencial direito de voto: a investidora detém o poder de voto adicional ou a redução do voto de outra parte investidora sobre as políticas financeiras e operacionais da investida, que podem ser concedidos por meio de direitos de subscrição, opções de compras de ações, debêntures, instrumentos de dívida ou semelhantes com potencial de exercício ou conversão. O potencial direito de voto de uma investidora também deve ser considerado no momento de avaliar se a entidade possui ou não influência significativa ou controle. 1.1.2 Classificações O CPC 18 (R2) deve ser aplicado em todas as empresas que tenham investimen- tos em participações societárias, sejam elas investidoras com controle individual, com conjunto de investidas ou com influência significativa sobre as investidas. Você deve estar se perguntando: por que a relação societária entre a investidora e a investida é importante? Qual é o impacto de se classificar ou não um investi- mento de acordo com o CPC 18 (R2)? A melhor maneira de respondermos a esses questionamentos é observarmos na Figura 1 o desdobramento da análise do relacionamento societário entre a in- vestidora e a investida, bem como seus reflexos. Figura 1 Árvore de decisão e classificação de investimentos em participações societárias O investimento é mantido para a venda? 2º CPC 18 (R2) e uso do método da equivalência patrimonial 3ºA investidora possui influência significativa ou acesso aos retornos associados aos interesses de propriedade na investida? 1º CPC 48 – Instrumentos Financeiros (*) CPC 31 – Ativo Não Circulante Mantido para Venda e Operação Descontinuada Sim Não Sim Não (*) Quando o CPC 48 é selecionado, o método da equivalência patrimonial não pode ser aplicado. Fonte: Elaborada pelo autor. Os negócios em conjunto e o controle conjunto devem ser analisados com base no CPC 19 (R2) – Negócios em Conjunto. Porém o reconhecimento inicial e as mensurações subsequentes devem ser feitos de acordo com o CPC 18 (R2). Ou seja, a parti- cipação precisa ser avaliada pela equivalência patrimonial. 1 12 Contabilidade Avançada No primeiro quadro da Figura 1 vemos a análise inicial do relacionamento so- cietário entre a investidora e a investida. A existência de pouca ou nenhuma in- fluência significativa (inferior a 20%) ou o não acesso aos retornos variáveis na investida definirão se deve ser aplicado o CPC 18 (R2) ou o CPC 48 – Instrumentos Financeiros 2 . A interpretação errônea desses conceitos levará ao uso do CPC ina- dequado e ao registro contábilincorreto das participações societárias. Passando ao segundo quadro, verificamos que a análise é relacionada com a inten- ção e a capacidade de a investidora vender o investimento em sua condição presente. É importante que o profissional contábil obtenha esses esclarecimentos junto à admi- nistração da investidora, pois as respostas o orientarão a usar ou não o CPC 31 – Ativo Não Circulante Mantido para Venda e Operação Descontinuada 3 . No terceiro quadro, o profissional contábil poderá, por fim, classificar os inves- timentos em participações societárias, de acordo com o CPC 18 (R2). Empresas de capital de risco, fundos mútuos, trustes e entidades similares não devem utilizar o CPC 18 (R2) para investimentos em coligadas e controladas. Estas organizações mantêm aplicações em participações societárias para fins de negociação no mer- cado financeiro e, por isso, devem classificar seus investimentos pelo CPC 48 – Instrumentos Financeiros, bem como avaliá-los ao valor justo. As análises devem ser feitas para cada um dos investimentos que a investidora possui, e sempre que houver alterações nas participações societárias. Importante 1.2 Influência significativa: aquisição e perda Vídeo A influência significativa é um dos principais conceitos que norteiam a obser- vância e a aplicação do CPC 18 (R2), e tem um certo nível de subjetividade. Por essa razão, entender quando ocorre a aquisição e a perda da influência significati- va é fundamental para a adoção adequada desta norma técnica pelo profissional contábil. 1.2.1 Aquisição da influência significativa Antes da harmonização das práticas contábeis entre os CPC e os IFRS, as legisla- ções societária e contábil indicavam que a classificação de coligadas e controladas deveria ser feita com base no percentual de participação societária que a investi- dora possuía sobre as investidas. Certamente, era um critério mais objetivo. Por outro lado, muitas vezes não refletia o relacionamento negocial entre investidora e investida. Mas o que é um relacionamento negocial entre empresas? Um exemplo prático ocorre quando a investidora se beneficia de sinergias operacionais com as investi- das, geralmente de maneira exclusiva, decorrentes de poderes que lhe são conferi- dos por acordos contratuais e instrumentos de capital celebrados entre as partes, os quais acabam potencializando os lucros e a geração de caixa para a investidora. O CPC 48 não será abordado neste livro, contudo, seu objetivo “é apresentar informações per- tinentes e úteis aos usuários de demonstrações contábeis para a avaliação dos valores, época e in- certeza dos fluxos de caixa futuros da entidade” (CPC, 2016). 2 Não trataremos do CPC 31 neste livro, contudo, seu objetivo é “estabelecer a contabilização de ativos não circulantes mantidos para venda (ou colocados à venda) e a apresentação e a divulgação de operações descontinuadas” (CPC, 2009). 3 Investimentos em participações societárias 13 Antes do CPC 18 (R2), os acordos não eram analisados e/ou divulgados. Esse cenário mudou com a introdução do conceito de influência significativa, alinhada à Lei n. 6.404/1976 (art. 243, §1º, alterações introduzidas pela Lei n. 11.638/2007 e pela Lei n. 11.941/2009). Assim, de acordo com a legislação societária, o CPC 18 (R2) (2012b), no item 5, menciona que “se a investidora mantém, direta ou indiretamente (por meio de controladas, por exemplo) vinte por cento ou mais do poder de voto da investida, presume-se que ela tenha influência significativa [sem controlá-la], a menos que possa ser claramente demonstrado o contrário”. Nessa situação, a investida será classificada como uma coligada. Porém, ainda conforme o item 5 do documento, “se a investidora detém, di- reta ou indiretamente, menos de vinte por cento do poder de voto da investida, presume-se que ela não tenha influência significativa, a menos que essa influência possa ser claramente demonstrada” (CPC, 2012b). Nesse cenário, a classificação do investimento será tratada pelo CPC 48 – Instrumentos Financeiros, conforme mencionado no tópico 1.1.2. A análise completa e adequada da influência significativa prevê que a investido- ra “considere a existência e o efeito dos direitos de voto potencial que forem pron- tamente exercíveis ou conversíveis para fins de determinar se possui influência significativa ou controle” (CPC, 2012b). A existência de influência significativa pela investidora é evidenciada por um ou mais dos itens listados a seguir, conforme item 6 do CPC 18 (R2) (2012b): a) representação no conselho de administração ou na diretoria da investida; b) participação nos processos de elaboração de políticas, inclusive em deci- sões sobre dividendos e outras distribuições; c) operações materiais entre a investidora e a investida; d) intercâmbio de diretores ou gerentes; e) fornecimento de informação técnica essencial [Ex.: direitos industriais e tecnológicos da investidora que a investida depende]. O item (a) do CPC 18 (R2) indica que a investidora pode deter o direito de eleger representantes que ocupam cargos relevantes, os quais decidirão a seu favor no estabelecimento e na execução de suas estratégias. Por exemplo, a investidora pode selecionar representantes na investida em número suficien- te de diretores ou conselheiros que decidam a favor dos seus interesses em reuniões. Para o item (b), é possível apontar situação semelhante ao item (a), com a clara defesa dos interesses da investidora no processo de elaboração de políticas relevantes da investida. Já em relação aos itens (c) e (e), a investido- ra poderá exercer sua influência na celebração de operações relevantes com sua investida, até mesmo em caráter de exclusividade, tendo acesso e com- partilhando direitos industriais e tecnológicos, o que geralmente é tratado de modo sigiloso e confidencial pela maioria da administração de empresas, por ser a “alma” do negócio. 14 Contabilidade Avançada Por último, o item (d) revela que a investidora pode promover o intercâmbio de pessoas-chave no nível decisório e mesmo operacional. Além de influenciar nas decisões, ela pode “aprender” com o intercâmbio e “copiar” esses procedimentos e processos para as suas atividades, sem se preocupar com direitos industriais e autorais, o que, sem dúvida, é um grande diferencial negocial e estratégico. Em suma, a influência significativa é verificada em diversos níveis, naturezas e tipos de eventos, mas todos concedendo um benefício diferenciado à investi- dora, se compararmos com outras partes interessadas (de mercado) fora desse relacionamento. 1.2.2. Perda da influência significativa Da mesma maneira que a investidora pode adquirir influência significativa so- bre a sua investida, ela também pode perder essa influência, o que ocorre quando se deixa de ter o poder de participar das decisões sobre as políticas financeiras, operacionais e estratégicas da investida. Isso ocorre com ou sem mudança no nível de participação acionária absoluta ou relativa. Com a perda, a investidora deve suspender o uso do método da equivalência patrimonial a partir da data que o fato foi constatado. Se mesmo assim a investi- dora ainda mantiver participação societária na investida, o investimento passará a ser contabilizado como um instrumento financeiro, de acordo com o CPC 48 (2016). 1.3 Aplicação do Método da Equivalência Patrimonial Vídeo Chegamos ao tema mais relevante desse capítulo: o Método da Equivalência Patrimonial (MEP), que é um dispositivo de avaliação dos investimentos em par- ticipações societárias. Ao todo, existem três métodos: Equivalência Patrimonial, Custo e Valor Justo. No entanto, o escopo deste capítulo é tratar do MEP. O MEP é o método em que o investimento na participação societária da em- presa adquirida (investida) é inicialmente reconhecido pela investidora pelo seu valor de custo (valor pago na aquisição da participação societária). A partir dessa data, a participação societária passa a ser ajustada periodicamentepara refletir as mudanças no Patrimônio Líquido e os eventos econômicos das investidas (lucros, por exemplo). Esse método deve ser aplicado a partir da data em que a investida se tornar uma coligada, uma controlada ou um negócio em conjunto, conforme a previsão do CPC 18 (R2) (2012b) e da Lei n. 6.404/1976, art. 248. Para fins de comparação, no Método do Custo a investidora registra a compra da participação societária pelo valor de custo (valor pago) e não faz novas altera- ções nele, mesmo que ocorram mutações no Patrimônio Líquido das investidas. Os dividendos a receber da investida são registrados como receita na investidora, quando o direito do recebimento for estabelecido. Apesar das vantagens, o MEP apresenta complexidades e peculiaridades que devem ser observadas com atenção pelos profissionais contábeis. Por essa razão, é importante que você conheça os procedimentos para a aplicação adequada. Investimentos em participações societárias 15 1.3.1 MEP: um guia passo a passo Você pode estar pensando: entendo que o assunto é complexo e que terei dificuldades, mas por onde devo começar? Preparamos um passo a passo com orientações e sugestões a serem utilizadas como referência no uso do MEP. Ressal- tamos que os itens a seguir foram fundamentados na premissa de que a investi- dora já possui participação societária em uma investida 4 e que, nesse momento, ela está efetuando os procedimentos contábeis atualizando os saldos do grupo de investimento para a data de um fechamento contábil com base nas mudanças no Patrimônio Líquido e nos eventos econômicos das investidas. 1º passo – Levantando e analisando os documentos societários. Após confirmar a classificação da participação societária no escopo do CPC 18 (R2), conforme os passos comentados, o profissional contábil analisará os documentos societários e os instrumentos patrimoniais que a investidora celebrou com cada uma das investidas. São alguns exemplos: • contrato, estatuto social, atas com o aumento de capital e a emissão de novas ações e/ou diluição de participação das outras investidoras; • atas com deliberação pela distribuição de dividendos intermediários ou aci- ma dos dividendos obrigatórios; • contratos de venda, ou intenção de venda, de participação societária; • contratos de elaboração de parceria com outras empresas. Com os documentos em mãos, o profissional contábil terá condições de avaliar a existência de influência significativa por meio de: a. participação societária da investidora sobre as investidas; b. efeitos de instrumentos de capital e/ou de dívida; c. potenciais direitos de voto. Dentre esses eventos, (b) e (c) exigem mais atenção do profissional devido à sua complexidade, pois, caso se confirmem, assumimos que a investidora teria condi- ções de converter ou exercer seus direitos potenciais de voto, e eles alterarão o percentual de participação a ser aplicado no cálculo do MEP da investidora sobre a investida. Por haver muitos detalhes a serem observados e atendidos, recomendamos que o profissional contábil elabore uma planilha eletrônica para auxiliá-lo no acom- panhamento de todos os eventos societários realizados pela investidora com as investidas. A análise desse passo é aplicável a todas as investidas localizadas no Brasil e/ou no exterior. Os reflexos dos eventos descritos em (b) e (c) podem modificar a classificação de um investimento inicialmente contabilizado pelo CPC 48 para o CPC 18 (R2), como o uso do MEP e, até mesmo, a necessidade de reapresentação das demonstrações con- tábeis, conforme o CPC 23 – Políticas Contábeis, Mudança de Estimativa e Retificação de Erro, o qual não é escopo deste livro. Importante 2º passo – Limite de defasagem entre as datas de demonstrações contábeis da investidora e das investidas. Na próxima seção, 1.3.2, você verá os procedimentos que a investidora deve seguir quando for apurado que passou a deter o controle sobre a investida, da qual já detinha a participação. 4 16 Contabilidade Avançada Em relação à defasagem de datas, o CPC 18 (R2) (2012b) e o art. 248 da Lei n. 6.404/1976 determinam que a investidora deve utilizar a demonstração contá- bil mais recente da investida para a realização do cálculo do MEP. O item 33 do CPC 18 (R2) (2012b, grifo nosso) também indica que “quando o término do exercício social da investida for diferente daquele da investidora, a investida deve elaborar demonstrações contábeis na mesma data das demons- trações da investidora”. Mas como proceder se a investida não puder atender à obrigatoriedade de preparar as suas demonstrações contábeis na mesma data da investidora? Quan- do isso acontecer, serão aceitas demonstrações com uma defasagem máxima não superior a dois meses (60 dias) entre as datas de encerramento das demons- trações contábeis da investida e da investidora. Fique atento: durante o período de defasagem pode ser necessário fazer ajus- tes contábeis que impactam a base do valor do MEP em decorrência de efeitos de transações e eventos relevantes, como: dividendos pagos, aumento de capital, ocorrência de sinistro na empresa e perdas não esperadas. A análise desse passo é aplicável a todas as investidas localizadas no Brasil e/ou no exterior. 3º passo – Investidas localizadas no exterior: atenção aos eventos específicos. O MEP também deve ser adotado para investimentos realizados no exterior. Todavia eles precisam ser tratados com um maior nível de atenção devido a even- tos específicos e reflexos contábeis decorrentes da moeda estrangeira (por exem- plo: dólar, euro) sobre a moeda brasileira (real), conforme tratado a seguir: a. Taxa de câmbio usada na integralização de capital de investida no exterior. A formalização da integralização de capital de uma investida no exterior segue os mesmos passos de uma integralização realizada no Brasil, observando as leis do país em que a investida está localizada. Assim, esse processo se dá por meio dos respectivos documentos societários assinados e vigentes e pela remessa dos recursos financeiros da investidora para o país onde a investida está sediada. Entretanto, você pode ter a seguinte dúvida: qual taxa de câmbio devo utilizar para registrar a integralização de capital nos livros contábeis da investidora no Brasil? Pare e reflita sobre essa situação e os fatos apresentados. Na sua opinião, qual será a taxa de câmbio que melhor reflete a integralização? No Brasil, o valor da integralização da investidora deve ser registrado em moeda nacional (real) pelo valor efetivamente desembolsado, ou seja, o valor em moeda estrangeira da integralização, convertido pela taxa de câmbio corrente na data da remessa dos recursos ao exterior. Considerando que a operação de envio dos recursos financeiros para o ex- terior é celebrada via banco, a taxa de câmbio será aquela que constar no con- trato de câmbio assinado entre a investidora e a instituição financeira, o mesmo raciocínio funciona para os aumentos de capital subsequentes. A análise desse passo é aplicável somente às investidas localizadas no exterior. Para as nacionais, a contabilização ocorrerá conforme os atos societários referentes à integralização de capital sempre na moeda corrente: o real. É importante que o profissional contábil observe o conceito de moeda funcional para avaliar a moeda na qual os registros contábeis das transações poderão ocorrer. Para se aprofun- dar no assunto, recomen- damos o estudo do CPC 02 – Efeitos das mudanças nas taxas de câmbio e conversão de demonstrações contábeis. Disponível em: http://www.cpc. org.br/CPC/Documentos-Emitidos/ Pronunciamentos/Pronunciamen- to?Id=9. Acesso em: 27 jul. 2020. Leitura http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=9 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=9 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=9 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=9Investimentos em participações societárias 17 Vejamos o Caso Prático 1 da situação indicada: A Companhia ABC Brasil (investidora) efetuou o aumento de capital em sua coligada Construldor, localizada na Itália, no valor (em euro) de 500.000,00. O contrato de câmbio com a remessa das divisas do Brasil para a Itália foi celebrado no dia 02/02/2019 com uma taxa de câmbio de 1 euro: R$ 4,3801. A taxa do câmbio do euro em 28/02/2019 era de 1 euro: R$ 4,4001. a) Qual será o valor do aumento de capital a ser contabilizado pela investidora no saldo contábil do grupo de investimento no fechamento contábil do mês de fevereiro de 2019, em reais? b) Efetue os respectivos lançamentos contábeis na investidora. Caso Prático 1 b. Dividendos recebidos de investidas no exterior e no Brasil. Quando a investidora receber dividendos de investidas no exterior, que são ava- liadas pelo MEP, o montante deve ser registrado como redução na respectiva conta do grupo de investimento, na investidora, em reais, mas observando a conversão da moeda estrangeira pela taxa de câmbio na data do recebimento, ou seja, na data em que o contrato de câmbio foi efetivado pela instituição bancária pela qual os recursos estão sendo recebidos pela investidora. Mas atenção: se o registro do dividendo na investidora ocorrer antes do recebi- mento, isto é, pela declaração de dividendo da investida em favor da investidora, a taxa de câmbio de conversão será, inicialmente, na data do registro da declaração de dividendo pela investidora. As variações cambiais registradas entre a data do registro inicial até a data do recebimento serão reconhecidas pela investidora na conta de dividendos a receber em contrapartida da conta de investimentos, e não serão reconhecidas no resultado ou no Patrimônio Líquido. A análise desse passo é aplicável somente às investidas localizadas no exterior. No caso de dividendos recebidos de investidas nacionais, avaliadas pelo MEP, as distribuições recebidas reduzem o valor contábil do investimento e não influen- ciam as contas de resultado da investidora. Por isso, os dividendos devem ser re- gistrados a crédito da conta de investimentos e a débito da conta de bancos pelo recebimento, ou em dividendos a receber, no caso de o direito ao recebimento ter sido estabelecido, mas não recebido. Para entender melhor as movimentações de dividendos recebidos (tanto de in- vestidas no exterior quanto no Brasil), pense neles como uma “realização parcial do investimento” dos lucros anteriormente reconhecidos pelo MEP. Esse tratamen- to contábil é diferente do que ocorre no caso de um investimento mantido pelo Método de Custo, em que os dividendos são contabilizados pela investidora na conta de Receita de Dividendos (Resultado do Exercício), tendo por contrapartida a conta de Dividendos a Receber ou Bancos, caso o dividendo já tenha sido recebido. Observemos o Caso Prático 2: No dia 18/12/2018, a administração da Construldor (investida localizada na Itália) aprovou a distribuição de dividendos mí- nimos obrigatórios para a sua investidora, a Companhia ABC Brasil, no valor (em euro) de 50.000,00 para o exercício de 2018, com base no pré-fechamento contábil realizado. No dia 18/12/2018, a taxa de câmbio era de 1 euro: R$ 4,4001. O recebimento bancário dos dividendos ocorreu em 27/12/18 pela taxa de câmbio de 1 euro: R$ 4,4502. a) Calcule o valor dos dividendos aprovados em reais, considerando a data de aprovação e a data de recebimento, bem como a variação cambial. b) Efetue a contabilização na investidora na data de recebimento. Considere, também, os lançamentos contábeis do efeito da variação cambial. Caso Prático 2 18 Contabilidade Avançada c. Uniformidade (ou alinhamento) das práticas contábeis. O cálculo do MEP pressupõe que as demonstrações contábeis das investidas seguem as mesmas práticas contábeis da investidora. Caso a investida adote práticas diferentes das usadas pela investidora, será necessário realizar ajustes para uniformizar as demonstrações contábeis das empresas antes de se efetuar o MEP. Esse passo é relevante se pensarmos que práticas contábeis diferentes podem levar a resultados diferentes nas contas patrimoniais e no resultado, o que impactará o patrimônio das investidas e, consequentemente, a apuração do MEP na investidora. Você pode estar se perguntando: mas como fazer essa uniformização? Muitas vezes, o profissional contábil da investidora deve realizar um levanta- mento geral – que podemos chamar de diagnóstico contábil – para conhecer as práticas contábeis das investidas no país onde elas estão sediadas e quais serão os ajustes contábeis necessários para o alinhamento das práticas apli- cadas pela investidora no Brasil. Uma boa recomendação é documentar todos os ajustes efetuados em uma planilha eletrônica com os registros extracontábeis necessários. Essa medida é importante para garantir a uniformização, manter todos os documentos que deram suporte, bem como o histórico desses ajustes contábeis realizados ao longo do tempo em que estiveram vigentes. Vejamos um exemplo: Exemplo A investida CarGoWayUS, localizada nos EUA, tem como prática contábil local efetuar a provisão para estoques de baixo giro considerando um percentual his- tórico de 2% sobre o saldo total dos estoques de produtos acabados. Esse valor foi definido após estudos internos aprovados. A investidora CarGoWay Brasil possui uma prática contábil mais conserva- dora. Sua provisão para estoques de baixo giro é de 3% sobre o saldo total dos estoques de produtos acabados, também definida com base em estudos aprovados. Para fins de aplicação do MEP, a investidora deve fazer o alinhamento da práti- ca contábil local da investida CarGoWayUS com a sua prática brasileira. Para isso, deverá complementar a provisão da investida em 1%, atingindo o total de 3%, con- forme detalhes da Tabela 1 a seguir: Tabela 1 CarGoWayUS (investida) Saldo contábil – estoque de produtos acabados em 31/12/2019 USD 100.000,00 Percentual de provisão p/ estoque de baixo giro 2% Saldo da provisão contabilizada pela CarGoWayUS USD 2.000,00 Fonte: Elaborada pelo autor. Investimentos em participações societárias 19 Tabela 2 CarGoWayBrasil (investidora) Percentual de provisão para estoque de baixo giro 3% Taxa cambial em 31/12/2019 1 USD = R$ 3,80 Complemento de provisão Percentual da provisão p/ estoque de baixo giro – CarGoWayUS 1% Valor da provisão p/ estoque de baixo giro – CarGoWayUS USD 1.000,00 Fonte: Elaborada pelo autor. Tabela 3 Resumo da planilha de ajuste extracontábil em 31/12/2019 Saldo final – CarGoWayUS Ajuste extracontábil realizado pela CarGoWay Brasil Saldo final – CarGoWayUS após ajuste extracontábil realizado – CarGoWay Brasil USD Reais Estoque de produtos acabados USD 100.000,00 0 USD 100.000,00 R$ 380.000,00 ( - ) Provisão para estoque de baixo giro USD 2.000,00 USD 1.000,00 USD 3.000,00 R$ 11.400,00 Percentual de provisão 2% 1% 3% 3% Fonte: Elaborada pelo autor. Na planilha de ajuste extracontábil (Tabela 4), o profissional contábil fará um lançamento de complemento da provisão para estoque de baixo giro da inves- tida CarGoWayUS: Tabela 4 Lançamento do ajuste extracontábil D Despesa com provisões (resultado) R$ 3.800,00 C Provisão para estoque de baixo giro (R$ 3.800,00) Fonte: Elaborada pelo autor. Com o ajuste, o resultado da investida CarGoWayUS será reduzido em R$ 3.800,00 (USD 1.000,00). Isso demonstra o porquê de os ajustes extracontábeis serem feitos antes de a investidora realizar o cálculo do MEP sobre o saldo das investidas. O procedimento será executado todas as vezes que se aplicar o MEP. Exem- plos de alguns ajustes extracontábeis são: critérios de classificação e avaliação de ativos e passivos (estoques, imobilizado, intangível, investimentos, ativos e passivos financeiros etc.); e critérios diferentes de reconhecimento de receitas e despesas. Comumente, a análise desse passo é aplicável somente às investidas localizadasno exterior. Mas caso haja investidas no Brasil, com práticas contá- beis diferentes, esse passo também deve ser efetuado. As planilhas com os ajustes extracontábeis devem ser utilizadas somente para esta finalidade. Caso sejam identificadas mudanças de estimativas e correções de erros contábeis, os ajustes não devem ser incluídos nesses documentos, mas sim acomodados seguindo as orientações do CPC 23 – Políticas Contábeis, Mudança de Estimativa e Retificação de Erro , o qual você encontra no link a seguir. Disponível em: http://www.cpc. org.br/CPC/Documentos-Emitidos/ Pronunciamentos/Pronunciamen- to?Id=54. Acesso em: 27 jul. 2020. Importante http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=54 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=54 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=54 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=54 20 Contabilidade Avançada d. Conversão das demonstrações contábeis da investida: de moeda estrangeira para moeda local (real). Esse é um dos assuntos mais desafiadores relacionados com o MEP, por isso o seu foco deve ser redobrado. Encontramos os preceitos desse assunto no CPC 02 – Efeitos das Mudanças nas Taxas de Câmbio e Conversão de Demonstrações Contábeis, entre os itens 38 a 47. Apesar de o CPC 02 não ser o foco desta obra, precisamos tangenciar alguns dos seus temas e conceitos. Importante ressaltar que esse assunto deve ser objeto do profissional contábil desde que a moeda funcional da investida seja diferente da moeda funcional da investidora. Se as moedas funcionais foram as mesmas (no caso, o real), não há que se tratar de conversão das demonstrações contábeis. Ao apurar as variações cambiais e a conversão de saldos e transações, é impor- tante saber que há dois métodos: um para as contas de Ativo e Passivo, que usa a taxa cambial de final do exercício (taxa de câmbio oficial), e outro para as contas de Resultado, que usa a taxa média mensal oficial e a taxa cambial oficial de final do exercício social. As variações cambiais dos itens monetários (por exemplo, caixa, aplicações fi- nanceiras, contas a receber, estoques, impostos a recuperar, contas a pagar, em- préstimos e financiamentos) e não monetários (por exemplo, imobilizado), exceto as contas do Patrimônio Líquido, serão registradas em conta específica no Patrimô- nio Líquido da investida: conta de Ajustes Acumulados de Conversão. A conta de Ajustes Acumulados de Conversão não possui a natureza de uma conta de reserva, por isso pode apresentar saldo positivo ou negativo. Os valores contabilizados pela investida, como resultado da conversão da moeda estrangeira para reais, serão contabilizados pela investidora no grupo de investimentos, como parte da participação que esta possui na investida, e a sua contrapartida será no Patrimônio Líquido da investidora, também em uma conta de Ajustes Acumulados de Conversão. Os valores registrados nessa conta, no Pa- trimônio Líquido, serão reconhecidos como receita ou despesa somente quando ocorrer a venda ou a baixa da investida. Portanto devem ser segregados e não compor o resultado de equivalência patrimonial (no resultado da investidora). Isso ocorrerá segundo o que chamamos de contabilização reflexa dos eventos da investi- da na investidora (explicado no 6º passo). A análise desse passo é aplicável somen- te às investidas localizadas no exterior. Vejamos um exemplo detalhando as etapas a seguir: Exemplo A investida TrendUS, localizada nos EUA, iniciou as suas atividades durante o exercício de 2018 com um capital social de USD 20.000,00. Sua moeda funcional é o dólar norte-americano e seu primeiro ano de operações foi 2019. Em 31/12/2019, a empresa preparou as suas demonstrações contábeis, conforme indicado a seguir (observação: demonstrações contábeis reduzidas para fins didáticos). Investimentos em participações societárias 21 Balanço Patrimonial (em USD – 31/12/2019) USD USD Ativo Passivo Caixa 1.000,00 Contas a Pagar 27.000,00 Estoque 50.000,00 Fornecedores 22.000,00 Imobilizado 20.000,00 Patrimônio Líquido (capital) 20.000,00 Lucros Acumulados 2.000,00 Total 71.000,00 Total 71.000,00 Taxa cambial: 1 USD = R$ 3,00 (em 31/12/2018) Taxa cambial: 1 USD = R$ 3,50 (em 31/12/2019) Demonstração do resultado do exercício (em USD) USD Taxa cambial média trimestral 1º trimestre 2019 300 1º trimestre 2019 R$ 3,10 2º trimestre 2019 440 2º trimestre 2019 R$ 3,20 3º trimestre 2019 540 3º trimestre 2019 R$ 3,30 4º trimestre 2019 720 4º trimestre 2019 R$ 3,40 2.000 Etapa 1 – Convertendo o balanço patrimonial da investida (de USD para reais). Para essa conversão, utilizamos a taxa de câmbio da data de fechamento das demonstrações contábeis da investida TrendUS, isto é, 31/12/2019 (R$ 3,50). Porém os lucros acumulados referentes aos resultados do exercício serão convertidos para reais utilizando outro método. Por ora, demonstramos o resultado da conversão. Balanço Patrimonial (31/12/2019) USD Reais USD Reais Ativo Passivo Caixa 1.000,00 3.500,00 Contas a Pagar 27.000,00 94.500,00 Estoque 50.000,00 175.000,00 Fornecedores 22.000,00 77.000,00 Imobilizado 20.000,00 70.000,00 Patrimônio Líquido (capital) 20.000,00 60.000,00 Ajustes Acum. de Conversão 10.432,00 Lucros Acumulados 2.000,00 6.568,00 Total 71.000,00 248.500,00 Total 71.000,00 248.500,00 Etapa 2 – Convertendo o capital social da investida TrendUS. A conversão seguirá os preceitos do CPC 02 (2010b), itens 39, 40 e 41. O capital social é um item não monetário e deve ser convertido pela sua taxa his- 22 Contabilidade Avançada tórica, ou seja, a taxa de câmbio da data original em que ocorreu a transação. A variação cambial calculada a partir da data inicial não deve ser registrada em seu resultado, mas, sim, apresentada em conta específica e separada, no Patrimônio Líquido. O mesmo raciocínio ocorrerá para as reservas, a contar das datas das suas respectivas constituições. No exemplo, o capital social da TrendUS em 2018 era de USD 20.000,00 e não sofreu alterações em 2019. Por isso, na linha de Patrimônio Líquido (capital) foi mantido o seu valor de conversão pela taxa de 2018, equivalen- do a R$ 60.000,00, e não R$ 70.000,00, que seria o cálculo de conversão dos USD 20.000,00 × R$ 3,50 – taxa em 31/12/2019. Essa diferença de R$ 10.000,00 se refere à variação cambial segregada e contabilizada em conta específica no Patrimônio Líquido (Ajustes Acumulados de Conversão). Etapa 3 – Convertendo a demonstração do resultado da investida (de USD para reais). O resultado da investida TrendUS deve ser convertido pela taxa média (no exemplo, foi utilizada a taxa cambial média trimestral). Será apurada a diferença da variação cambial da taxa média trimestral e a variação cambial da taxa cambial de fechamento em 31/12/2019. Essa diferença será segregada e contabilizada em conta específica no Patrimônio Líquido (Ajustes Acumulados de Conversão). Demonstração do resultado do exercício USD Taxa cambial média trimestral Reais 1º trimestre 2019 300,00 R$ 3,10 930,00 2º trimestre 2019 440,00 R$ 3,20 1.408,00 3º trimestre 2019 540,00 R$ 3,30 1.782,00 4º trimestre 2019 720,00 R$ 3,40 2.448,00 Método de conversão do resultado pela taxa cambial média trimestral, do exercício de 2019, apurado tri- mestre a trimestre 2.000,00 R$ 3,28 6.568,00 Método de conversão do resultado pela taxa cambial de fechamento, em 31/12/2019 2.000,00 R$ 3,50 7.000,00 Diferença de variação cambial en- tre os métodos 432,00 Etapa 4 – Compondo as variações cambiais do Patrimônio Líquido e dos Lucros Acumulados a serem lançadas na conta de Ajustes Acumulados de Conversão. Você deve ter observado que, na conversão do Balanço Patrimonial, há a conta Ajustes Acumulados de Conversão no valor de R$ 10.432,00, a qual é apresentada so- mente na coluna de saldo, em reais. Esse montante serefere às variações cambiais de natureza do Patrimônio Líquido e do Lucro Líquido do Exercício, conforme é deta- lhado a seguir, com base nas definições do CPC 02 (R2), itens 39, 40 e 41 (CPC, 2010b): Investimentos em participações societárias 23 Variação cambial do Patrimônio Líquido – Capital Social USD Taxa cambial Reais Patrimônio Líquido em 31/12/2018 20.000,00 R$ 3,00 R$ 60.000,00 Patrimônio Líquido em 31/12/2019 20.000,00 R$ 3,50 R$ 70.000,00 Variação cambial apurada e contabilizada em conta específica (ajustes acumulados de conversão) (A) R$ 10.000,00 Variação cambial dos lucros acumulados – Lucro Líquido do Exercício de 2019 USD Taxa cambial Reais Lucro Líquido pela taxa média trimestral 2.000,00 R$ 3,28 R$ 6.568,00 Lucro Líquido pela taxa de fechamento em 31/12/2019 2.000,00 R$ 3,50 R$ 7.000,00 Variação cambial apurada e contabilizada em conta específica (ajustes acumula- dos de conversão) (B) R$ 432,00 Variação cambial total apurada e contabilizada em conta específica (ajus- tes acumulados de conversão) (A) + (B) R$ 10.432,00 4º passo – Eliminação do resultado não realizado entre investidora e investidas. Precisamos observar o item I do art. 248, da Lei n. 6.404/1976, o qual estabe- lece que, no valor do patrimônio das investidas, “não serão computados os resul- tados não realizados decorrentes de negócios com a companhia, ou com outras sociedades coligadas à companhia, ou por ela controladas” (BRASIL, 1976). Para Gelbcke et al. (2018, p. 198), a origem desse racional da: eliminação de lucros não realizados do patrimônio líquido da investida deriva do conceito de que as vendas entre empresas do mesmo grupo não geram lucro economicamente enquanto não forem vendidos a terceiros (conceito de “grupo ou conglomerado econômico”). Portanto, enquanto os ativos transacio- nados estiverem no Balanço de alguma empresa do grupo, o lucro nele contido não está “realizado” . Os ajustes apurados serão realizados com base no valor do Patrimônio Líquido da investida. Assim, teremos o patrimônio da investida ajustado pela eliminação dos re- sultados não realizados, sobre a qual será aplicado o percentual de participação da investidora para o cálculo do MEP. Por fim, é computado o resultado de equivalência patrimonial. A análise desse passo é aplicável tanto às investidas localizadas no Brasil quanto às no exterior. O item 28 do CPC 18 (R2) (2012b) traz a referência das transações ascenden- tes (upstream) e descendentes (downstream) que contemplam qualquer tipo de bens e direitos, como: estoques (situação comumente encontrada), imobilizado, investimentos e outros ativos. As transações ascendentes são aquelas originadas da investida cujo destino é a investidora. Por outro lado, as descendentes são aquelas originadas da investidora cujo destino é a investida. Para que a investida e a investidora apurem os valores de eliminação do resultado não realizado entre as empresas, devem possuir controles suficientes para identificar, classi- ficar e separar as transações feitas entre elas das demais transações com terceiros, fora do grupo econômico. Importante 24 Contabilidade Avançada Vejamos um exemplo: Exemplo A investida Cia. ABC vende parte dos seus produtos acabados para a sua investidora (controladora) Cia. XYZ (operação do tipo upstream). Pelos con- troles internos da Cia. ABC foi possível identificar que ela apurou um lucro de 10% nessas vendas. Em 31/12/2019, o profissional contábil da Cia. XYZ está se preparando para fazer o cálculo do MEP da participação societária de 100% que detém na Cia. ABC, e inicia pelo cálculo de eliminação dos lucros não realizados nos estoques: Tabela 5 Cia. ABC (demonstração somente das vendas entre investida e investidora) Receita de vendas da Cia. ABC para a Cia. XYZ (investidora) R$ 1.000.000,00 ( – ) Custo dos produtos vendidos da Cia. ABC para a Cia. XYZ (R$ 900.000,00) Lucro Líquido (somente para essas vendas) R$ 100.000,00 Para fins didáticos, não serão incluídas outras despesas nas transações de venda entre a investida e a investidora Lucro Líquido (total) apurado pela Cia. ABC para o exercício de 2019 R$ 300.000,00 A Cia. ABC é tributada pelo IR e CS, em uma alíquota total de 34% Fonte: Elaborada pelo autor. Cia. XYZ Com base nos controles internos da Cia. XYZ, o profissional contábil apu- rou que todos os produtos acabados vendidos pela Cia. ABC permaneciam nos estoques da Cia. XYZ, em 31/12/2019, ou seja, não foram vendidos para terceiros. O lucro líquido das transações de venda entre a Cia. ABC e a Cia. XYZ deve ser eliminado. Antes de efetuar o cálculo do MEP, o profissional contábil precisa eliminar o lucro não realizado, pois o ativo (produtos acabados) ainda permanece nos estoques da investidora Cia. XYZ. É ainda importante lembrar que o lucro não realizado deve ser calculado líquido dos tributos, conforme pode ser demos- trado na Tabela 6. Tabela 6 Cálculo da eliminação dos lucros não realizados (nos estoques) Lucro Líquido (somente as vendas da Cia. ABC para a Cia. XYZ) R$ 100.000,00 IR / CS – Alíquota de 34% (tributação da Cia. ABC) (R$ 34.000,00) Lucro não realizado a ser eliminado na Cia. XYZ (líquido dos tributos) R$ 66.000,00 Fonte: Elaborada pelo autor. Investimentos em participações societárias 25 Em seguida, realiza, então, o cálculo do MEP, conforme Tabela 7: Tabela 7 Cálculo do MEP Lucro Líquido da Cia. ABC R$ 300.000,00 ( - ) Eliminação dos lucros não realizados (nos estoques) (66.000,00) Novo lucro líquido ajustado (nova base de cálculo para o MEP) R$ 234.000,00 Percentual de participação societária da Cia. XYZ na Cia. ABC 100% Resultado de equivalência patrimonial apurado para o exercício de 2019 R$ 234.000,00 Lançamentos contábeis do resultado do MEP da Cia. XYZ na Cia. ABC (após a eliminação): D Investimentos na Cia. ABC R$ 234.000,00 C Receita de equivalência patrimonial (R$ 234.000,00) Fonte: Elaborada pelo autor. 5º passo – Outras mutações no patrimônio das investidas e reflexos na investidora. Quando forem verificadas mutações patrimoniais na investida registradas em outros resultados abrangentes e reconhecidas diretamente em seu Patrimônio Líquido, elas também deverão ser reconhecidas no Patrimônio Líquido da inves- tidora, como é explicado no 3º passo (atenção aos eventos específicos), item (d), e no 6º passo. Essas mutações podem ser decorrentes da reavaliação de ativos imobiliza- dos, quando permitida legalmente, e de diferenças de conversão em moeda estrangeira (explicações dessa natureza no 3º passo), quando existirem. A par- ticipação da investidora nessas mutações patrimoniais deverá ser reconhecida em seu Patrimônio Líquido, e não em seu resultado, o que é conhecido como contabilidade reflexa. Essa tratativa é mencionada na Interpretação Técnica ICPC 09 (R2) (CPC, 2014), itens 60 e 61, e no CPC 26 (2011b). 6º passo – Apuração do resultado de equivalência e lançamentos contábeis. Estamos chegando ao final da contabilização do MEP. Após o profissional con- tábil efetuar os passos anteriores, nas situações que forem aplicáveis ao investi- mento que a investidora possui, ele deve apurar o Patrimônio Líquido ajustado da investida, aplicar o percentual de participação societária que a investidora detém sobre a investida e, por fim, encontrar o resultado da equivalência patrimonial, procedendo os respectivos registros contábeis. Como você verificou nos temas apresentados, para alguns dos passos anali- sados há situações específicas em que os lançamentos contábeis necessários vão além do registro do resultado de equivalência patrimonial. Para facilitar esse enten- dimento, dividimos os lançamentos contábeis em dois grupos: • Grupo I – Regra geral: lançamentos contábeis do resultado do MEP apura- dos no resultado da investidora. 26 Contabilidade Avançada A investidora irá calcular o MEP sobre o Patrimônio Líquido da investida e, con- sequentemente, sobre o seu lucro ou prejuízo no período, de acordo com a sua participaçãosocietária. Os lançamentos contábeis realizados serão dispostos do seguinte modo: Quadro 2 Se a investida apurar lucro no exercício D/C Conta Descrição da natureza da conta D – Débito Investimentos em [...] (ou coligada, ou controlada, ou negócio em conjunto) Conta do grupo de investimentos, Ativo não Circulante. Os lançamentos contá- beis devem ser feitos individualmen- te, um para cada investida. C – Crédito Receita de equivalência patrimonial Conta de Resultado. Fonte: Elaborado pelo autor. Quadro 3 Se a investida apurar prejuízo no exercício D/C Conta Descrição da natureza da conta D – Débito Despesa de equivalência patrimonial Conta de Resultado C – Crédito Investimentos em [...] (ou coligada, ou controlada, ou negócio em conjunto) Conta do grupo de investimentos, Ativo não Circulante. Os lançamentos contá- beis devem ser feitos individualmen- te, um para cada investida. Fonte: Elaborada pelo autor • Grupo II – Lançamentos contábeis do 3º passo: investidas localizados no exterior (atenção aos eventos específicos). O lucro ou prejuízo apurado pela investida refletirá no resultado de equivalência patrimonial na investidora, enquanto outras mutações no Patrimônio Líquido da investida refletirão no Patrimônio Líquido da investidora (contabilização re- flexa). Assim, é necessário que o profissional contábil acompanhe a natureza dos fatos econômicos da investida e reflita-os na investidora. Tendo por base as premissas abordadas, retomamos o 3º passo, item (d), em que os valores apurados nas conversões das demonstrações contábeis das investidas serão registrados em uma conta denominada Ajustes Acumulados de Conversão, no Patrimônio Líquido da investida. Essa movimentação será reconhecida de maneira reflexa no Patrimônio Lí- quido da investidora. Por isso, recomendamos que ela utilize uma subconta específica para cada natureza de outros resultados abrangentes das investi- das, por exemplo, Ajustes Acumulados de Conversão na Investida [nome da investida]. Agora, apresentamos a continuação do exemplo do 3º passo, item (d), da investida TrendUS, contemplando a situação da contabilização reflexa: Investimentos em participações societárias 27 Exemplo Nesta parte do exemplo, demonstraremos o cálculo do MEP e a segregação das variações cambiais do Patrimônio Líquido e do Lucro Líquido da investida na inves- tidora (contabilização reflexa). A investidora é a empresa TrendBrasil, localizada no Brasil, que possui 100% da participação societária da TrendUS. Variações cambiais de natureza do Patrimônio Líquido e do lucro líquido apura- das no exercício, seguindo as definições do CPC 02 (R2) (CPC, 2010b), itens 39, 40 e 41: Variação cambial do Patrimônio Líquido – Capital Social USD Taxa cambial Reais Patrimônio Líquido em 31/12/2018 20.000,00 R$ 3,00 R$ 60.000,00 Patrimônio Líquido em 31/12/2019 20.000,00 R$ 3,50 R$ 70.000,00 Variação cambial apurada e contabilizada em conta específica (Ajustes Acumu- lados de Conversão) (A) R$ 10.000,00 Variação cambial dos lucros acumulados – Lucro Líquido no Exercício de 2019 USD Taxa cambial Reais Lucro Líquido pela taxa média trimestral 2.000,00 R$ 3,28 R$ 6.568,00 Lucro Líquido pela taxa de fechamento em 31/12/2019 2.000,00 R$ 3,50 R$ 7.000,00 Variação cambial apurada e contabilizada em conta específica (Ajustes Acumu- lados de Conversão) (B) R$ 432,00 Variação cambial total apurada e contabilizada em conta específica (Ajustes Acumulados de Conversão) (A) + (B) R$ 10.432,00 Tabela 8 TrendBrasil – Cálculo do MEP Patrimônio Líquido TrendUS – Saldo inicial em 31/12/2018 R$ 60.000,00 Variações ocorridas no Patrimônio Líquido da TrendUS Lucro Líquido no exercício R$ 6.568,00 Variação cambial sobre o Lucro Líquido do exercício R$ 432,00 Variação cambial sobre o Patrimônio Líquido R$ 10.000,00 Patrimônio Líquido TrendUS – Saldo inicial em 31/12/2019 R$ 77.000,00 Percentual de participação societária da TrendBrasil na TrendUS 100% Saldo final do grupo de investimento – Investida TrendUS R$ 77.000,00 Fonte: Elaborada pelo autor. Segregação das variações cambiais (Patrimônio Líquido) do resultado de equivalência: 28 Contabilidade Avançada Conforme o CPC 02 (R2) (CPC, 2010b) trata nos itens 39, 40 e 41, a investidora deve segregar a natureza das movimentações ocorridas no Patrimônio Líquido da investida localizada no exterior e os efeitos da variação cambial do resultado de equivalência que se referem à atividade operacional (lucro líquido efetivo), sendo que estes devem ser contabilizados no Patrimônio Líquido da investidora, obser- vando a contabilização reflexa, conforme apresentado nas Tabelas 9 e 10, a seguir. Tabela 9 Lançamentos contábeis: contabilização reflexa na investidora Grupo investimentos – Investida TrendUS D Subconta – Investimentos na TrendUS – Variação cambial – Patrimônio Líquido R$ 10.000,00 D Subconta – Investimentos na TrendUS – Variação cambial – Resultado da Operação R$ 432,00 Grupo Patrimônio Líquido – Outros resultados abrangentes C Subconta – Ajuste Acumulado de Conversão – Investimentos na TrendUS (R$ 10.432,00) Fonte: Elaborada pelo autor. Tabela 10 Lançamentos contábeis: resultado do MEP Grupo investimentos – Investida TrendUS D Subconta – Investimentos na TrendUS – Resultado operacional R$ 6.568,00 C Receita de equivalência patrimonial (resultado) (R$ 6.568,00) Fonte: Elaborada pelo autor. A utilização de subcontas permite um melhor controle e acompanhamento do reconhecimento e da segregação das naturezas das movimentações do Patrimônio Líquido da investida na investidora. Lembrando que quando ocorrer a venda (ou baixa) do investimento da TrendUS os valores que foram contabilizados no Patri- mônio Líquido da investidora, em Outros Resultados Abrangentes, Ajuste Acumula- do de Conversão, serão transferidos para o resultado. 1.3.2 Mudança no relacionamento societário de investida: de influência significativa para controle Todas as aquisições de participações celebradas a partir de 1 de janeiro de 2008 (após a Lei n. 11.638/2007) devem ser analisadas sob a ótica do CPC 15 (CPC, 2011a). 1.3.2.1 Apuração de ágios: mais-valia das investidas e/ou expectativa de rentabilidade futura (goodwill) Gelbcke et al. (2018, p. 190) destacam que: quando o preço de aquisição for maior que o valor patrimonial da parti- cipação da investida, podem surgir: (a) um ágio por “mais-valia de ativos líquidos” pela diferença positiva entre a parte da investidora no valor Investimentos em participações societárias 29 justo dos ativos líquidos e o valor patrimonial da participação adquirida (se a diferença for negativa teremos um deságio de uma menos-valia); e/ou (b) um “ágio por expectativa de rentabilidade futura (goodwill)” pela diferença positiva entre o preço de aquisição pelo investidor e a parte da investidora no valor justo dos ativos líquidos (se a diferença for negativa, teremos um “ganho por compra vantajosa”, que deve ser reconhecido diretamente no resultado). O Quadro 4 demonstra a composição do valor pago pela aquisição de uma par- ticipação societária e a natureza dos desdobramentos contábeis verificados quan- do a compra é concretizada com base no CPC 15 (2011a). Quadro 4 Composição do valor pago na aquisição de uma participação societária Goodwill Va lo r p ag o pe la a qu isi çã o da pa rti cip aç ão n a in ve st id a Mais-valia dos ativos líquidos Valor patrimonial da investida Fonte: Elaborado pelo autor com base em CPC 15, 2011a. Você pode estar se perguntando: por que esse assunto está sendo tratado ago- ra e por que ele é importante? Primeiramente, os ágios são eventos societários apurados no momento da compra, podendo fazer com que o valor justo de uma participação societária em coligada ou controlada em conjunto seja maior que o valor patrimonial da investida. Vale mencionar que, independentemente do tipo de ágio apurado, ele não altera o valor patrimonial e contábil da investida; os valores são válidossomente sob a ótica da investidora que comprou a participação socie- tária sobre a investida junto a um terceiro. A compra de participação societária de terceiros é o fato gerador da mais-valia de ativos líquidos, goodwill ou ganho por compra vantajosa. Gelbcke et al. (2018, p. 189) apontam que “o valor de aquisição muito provavelmente será diferente do valor pa- trimonial dessa participação, dando origem ao ágio por mais-valia de ativos líquidos, ao ágio por rentabilidade futura (goodwill) ou ao ganho por compra vantajosa”. 1.3.2.2 Alocação do ágio por mais-valia das investidas e/ou do ágio por expectativa de rentabilidade futura (goodwill) e seus respectivos ajustes extracontábeis O nível de complexidade e os detalhes desse tema são grandes. Por isso, reco- mendamos, mais uma vez, que o profissional contábil tenha uma planilha eletrôni- ca detalhada, elaborada com base nos documentos societários. Essa tabulação dos dados será um documento contábil muito importante, pois conterá a memória e o histórico dos cálculos de apuração, de alocação e de realização do ágio por mais-valia de ativos líquidos e do registro do goodwill. O CPC 15 define o ágio por expectativa de rentabilidade futura (goodwill) como sendo “um ativo que representa benefícios econômicos futuros resultantes de outros ativos adquiridos em uma combinação de negócios, os quais não são individualmente identificados e separadamente reconhecidos” (CPC, 2011). Saiba mais O ágio por mais-valia de ativos líquidos será baixado nos registros extracontábeis da investidora, com base na fundamentação em que ele foi constituído, seguindo o tempo estimado para a sua realização. Entretanto, não é permitida a amortização do ágio por expectativa de rentabilidade futura (goodwill). Este deverá ser submetido ao teste de recuperabi- lidade, anualmente, e será baixado seguindo os preceitos do CPC 01 - Redução ao Valor Recuperável de Ativos. Saiba mais 30 Contabilidade Avançada A alocação e o reconhecimento da mais-valia dos ativos líquidos e do goodwill são procedimentos que fazem com que sejam reconhecidos, extra- contabilmente na determinação do Patrimônio Líquido ajustado da investida, como parte do processo de aplicação do MEP, ativos e/ou passivos não regis- trados na investida, cujo controle foi obtido pela investidora, de acordo com o item 20 do ICPC 09 (R2) (CPC, 2014). Por exemplo, ativos intangíveis (marcas e patentes) formados pela investida, mas que não podem ser reconhecidos con- tabilmente por ela, pois não atendem às condições previstas no CPC 04 – Ativo Intangível (CPC, 2012a). A diferença apurada entre o valor justo e o valor contábil do acervo líquido da investida cujo controle foi obtido será um ajuste extracontábil no Patrimô- nio Líquido da investida adquirida para fins do cômputo da aplicação do MEP. Novamente é importante destacar que essa prática é adotada sob a ótica da investidora. Consta no CPC 09 (R2), item 23, que a investidora é responsável: pela identificação de todos os itens que resultem em diferenças entre os valores contábeis e os valores justos dos ativos e passivos da investida para fins de controle de sua realização por amortização, depreciação, exaustão, venda, liquidação, alteração no valor contabilizado, baixa, impairment ou qualquer outra mutação nos registros contábeis desses ativos e passivos. (CPC, 2014) Os critérios contábeis expostos também estão alinhados com a legislação tributária por meio da Lei n. 12.973/2014. Com o advento dessa lei, a ava- liação de investimento pelo Patrimônio Líquido da investida, por ocasião da aquisição da participação, passou a requerer o desdobramento do custo de aquisição em: 1. valor de Patrimônio Líquido na época da aquisição; 2. mais ou menos-valia; 3. ágio por rentabilidade futura (goodwill). O art. 37, § 3º, inciso I, da Lei n. 12.973/2014, ainda complementa: Art. 37. No caso de aquisição de controle de outra empresa na qual se detinha participação societária anterior, o contribuinte deve observar as seguintes disposições: [...] § 3º Deverão ser contabilizadas em subcontas distintas: I - a mais ou menos-valia e o ágio por rentabilidade futura (goodwill) re- lativos à participação societária anterior, existente antes da aquisição do controle. (BRASIL, 2014) 1.3.2.3 Lançamentos contábeis Seguindo as determinações legais e do CPC/IFRS – em especial, o ICPC 09 (R2), item 27 –, é necessário contabilizar esses eventos em subcontas especí- ficas. Por isso, recomendamos que cada investimento tenha as suas próprias contas e subcontas, conforme exemplo no Quadro 4. Investimentos em participações societárias 31 Quadro 5 Lançamentos contábeis D/C Conta Descrição da natureza da conta D – Débito Investimentos em [...] (ou Coligada, ou Controlada, ou Negócio em Con- junto) Subconta do grupo de investimentos, Ativo não Cir- culante. Os lançamentos contábeis devem ser feitos individualmente, um para cada investida. D – Débito Mais-valia no Investimento em [...] Subconta do grupo de investimentos, Ativo não Cir- culante. Os lançamentos contábeis devem ser feitos individualmente, um para cada investida. D – Débito Ágio por Rentabilidade Futura na [...] Subconta do grupo de investimentos, Ativo não Circulante. Os lançamentos contábeis devem ser feitos individualmente, um para cada in- vestida. C – Crédito Bancos Ou qualquer outra conta de onde os recursos financeiros foram pagos pela investidora para realizar a transação da compra da participação societária na investida. Fonte: Elaborado pelo autor. Os ajustes apurados pela realização do ágio por mais-valia de ativos líquidos serão realizados com base no MEP, ou seja, sobre o valor do Patrimônio Líquido da investida. Com isso, teremos a base do patrimônio ajustado pela realização do ágio por mais-valia e o resultado da investida sobre a qual será aplicado o percentual de participação para o cálculo do MEP. Por último, será apurado o valor do resultado de equivalência patrimonial. Observemos um exemplo: Exemplo A investidora InvestCo possuía uma participação societária de 25% da investi- da ModelInc, o que classificava esse investimento como uma coligada (influência significativa), cujo saldo do investimento em 31/12/2018 era de R$ 100.000,00. A compra dos 25% da participação societária inicial ocorreu em 2004 e não apu- rou nenhum valor de ágio. No primeiro trimestre de 2019, a InvestCo efetuou a compra da totalidade da participação societária da ModelInc, passando a deter seu controle a partir dessa data. Para fins de registro da compra adicional da participação de 75%, de atualização do MEP e de segregação/alocação dos ágios apurados, de acordo com o CPC 15 (2011a) e o CPC 18 (R2) (2012b), seguem os detalhamentos dos procedimentos efetuados – para fins didáticos, não foi tra- tado do IR/CS incidente sobre os ágios: a. Adoção do CPC 15 – Apuração do ágio na compra. Primeiramente, o profissional contábil da InvestCo obteve a documentação referente à compra da participação societária adicional adquirida (75%), com o objetivo de avaliar a existência de ágio entre o valor do Patrimônio Líquido da investida, o valor justo dos ativos líquidos e o valor pago pela investidora. 32 Contabilidade Avançada Considere os seguintes dados complementares da operação (Tabela 11): Tabela 11 Dados complementares da operação de compra da participação societária adicional Data da efetivação da compra 31/03/2020 Valor pago pela InvestCo para comprar os 75% adicionais R$ 1.000.000,00 Valor justo dos ativos líquidos da ModelInc (conforme laudo de avaliação preparado por profissionais qualificados e independentes na data-base de 28/02/2019) R$ 800.000,00 Valor do Patrimônio Líquido da ModelInc (conforme seus livros contábeis) em 28/02/2019 R$ 750.000,00 Fonte: Elaborada pelo autor. Com base nesse levantamento, o profissional contábil apurou: i. mais-valia, conforme os ativos líquidos da ModelInc: R$ 50.000,00; ii. ágio por expectativade rentabilidade futura (goodwill): R$ 200.000,00. b. Contabilização da nova participação e alocação dos ágios apurados. Cabe ao profissional contábil fazer os lançamentos contábeis para registro da aquisição adicional de participação societária, de modo a refletir nos saldos contá- beis do grupo de investimentos da investidora, e da nova realidade verificada após a compra da participação na investida ModelInc, fazendo a segregação dos ágios, conforme previsto pelo CPC e por legislações específicas (Tabela 12). Tabela 12 Lançamentos contábeis da aquisição adicional da participação societária da ModelInc Grupo investimentos na InvestCo D Subconta – Investimentos na ModelInc – Novo investimento R$ 750.000,00 D Subconta – Investimentos na ModelInc – Mais-valia R$ 50.000,00 D Subconta – Investimentos na ModelInc – Goodwill R$ 200.000,00 C Banco conta Movimento (R$ 1.000.000,00) Fonte: Elaborada pelo autor. Com os lançamentos contábeis, o saldo de investimentos da InvestCo na inves- tida ModelInc será de R$ 1.100.000,00 (R$ 100.000,00 de participação inicial adqui- rida e R$ 1.000.000,00 de participação adicional adquirida em 2019). Observações: 1. O valor contábil do Patrimônio Líquido da investida ModelInc não sofrerá alterações em relação aos valores justos apurados, ou seja, continuará sendo de R$ 750.000,00 (data-base de 28/02/2019). 2. As apurações dos ágios ocorreram no nível da investidora InvestCo. Portanto, seu profissional contábil é responsável por fazer os ajustes extracontábeis necessários para alinhar a nova situação, com base nos CPC 15, CPC 18 (R2) e ICPC 09 (R2). 3. O profissional contábil da investidora InvestCo deve acompanhar o fundamento econômico da mais-valia contabilizada de modo a realizar (baixar) os seus valores pelo decorrer do tempo e os critérios verificados no referido laudo de avaliação. Investimentos em participações societárias 33 4. O goodwill deve ser testado anualmente para fins de recuperabilidade do seu valor, em conjunto com o valor do investimento principal na investida ModelInc, observando o conceito de Unidade Geradora de Caixa (UGC), previsto no CPC 01 (CPC, 2010a). 1.3.3 Reconhecimento de prejuízos nas investidas pelo resultado do MEP: Patrimônio Líquido negativo e perdas por impairment no goodwill Devemos lembrar que o resultado da equivalência patrimonial apurado pela in- vestidora pode ser tanto uma receita quanto uma despesa, a depender dos valores auferidos pelas investidas. Prejuízos recorrentes apurados pela investida trazem reflexos diretos para a investidora, conforme trataremos a seguir. 1.3.3.1 Patrimônio Líquido negativo No mundo real dos negócios, não é incomum investidas apresentarem pre- juízos frequentes, ao ponto de os patrimônios líquidos se tornarem negativos. O profissional contábil deve estar atento a essas situações. De modo geral, o CPC 18 (R2), item 38 (CPC, 2012b), indica que a “investidora deve reconhecer a par- te que lhe cabe das perdas nos resultados e nas demais mutações ocorridas no Patrimônio Líquido da investida (‘contabilização reflexa’)”. Portanto, se a investida tiver prejuízo, o saldo contábil do investimento será reduzido pelo reconhecimento da parte da investidora nesse prejuízo. Importante estar alerta também ao item 39 do CPC 18 (R2), o qual considera que: o saldo contábil do investimento da investidora foi reduzido a zero pelos pre- juízos frequentes da investida, perdas adicionais devem ser consideradas, e uma provisão no passivo da investidora deve ser reconhecida, somente na extensão em que a investidora tiver incorrido em obrigações legais (respon- sabilidade legal), obrigações construtivas (aquelas que mesmo não formaliza- das estão relacionadas aos usos e costumes ou por questões éticas) ou tiver feito pagamentos em nome da investida. Quando a investida reverter os pre- juízos, apurando novamente lucro e compensando estes prejuízos apurados, a investidora retomará o reconhecimento de sua participação nesses lucros. (CPC, 2012b) Caso a situação indicada no parágrafo anterior não seja constatada, isto é, a investidora não tiver incorrido em obrigações legais ou construtivas, ou não tiver efetuado pagamentos em nome da investida, a investidora ainda deve observar aspectos de divulgação tratados no CPC 45 – Divulgação de Participações em Outras Entidades. O item 22 (c) do CPC 18 (R2) exige que mesmo que a investidora suspenda: o reconhecimento da parte que lhe cabe nos prejuízos da investida quando tiver zerado o saldo contábil líquido das contas que integram seu investimen- to total líquido e caso a investida continue a gerar mais prejuízos, a investi- dora deve divulgar em nota explicativa à parte não reconhecida nos prejuízos que excederem ao investimento total líquido. (CPC, 2012b) 34 Contabilidade Avançada 1.3.3.2 Perdas por impairment no goodwill Outra maneira de reconhecer perdas de uma investida é por meio do reconheci- mento de perdas por impairment do ágio (goodwill). Como já mencionado, os valores do ágio (goodwill) não são identificados em separado (eles integram o saldo do in- vestimento). Assim, todo o saldo contábil do investimento é testado em relação ao seu valor recuperável, em conformidade com as exigências do CPC 01 (CPC, 2010a). É importante você saber que esses testes devem ser realizados anualmente e que as perdas são identificadas por uma combinação de eventos, os quais podem causar a redução no valor recuperável. As perdas apuradas pelo teste de recuperabilidade (teste de impairment) para o ágio (goodwill) não poderão ser revertidas. 1.3.4 Descontinuidade do uso do MEP A investidora deve descontinuar o uso do MEP a partir da data em que o inves- timento deixar de ser classificado como coligada, controlada ou empreendimento controlado em conjunto, ou seja, a investidora não tem mais influência significati- va ou perdeu o controle sobre a investida, não importando o modo como o fato ocorreu (CPC, 2012a). O profissional contábil deverá efetuar a reclassificação para o resultado do período de todos os montantes que estavam anteriormente registrados no Patrimônio Líquido, relacionados com o investimento objeto da mudança de mensuração contábil. Se mesmo após a perda de influência significativa ou de controle a investidora permanecer com uma participação societária da investida, e essa participação for classificada como um ativo financeiro, a investidora passará a mensurá-la ao valor justo, em consonância com o CPC 48 (CPC, 2016). CONSIDERAÇÕES FINAIS Como pôde ser observado, o conhecimento sobre investimentos em participações societárias é bastante amplo e complexo, e proporciona uma grande oportunidade de desenvolvimento ao profissional contábil que se envolver com o seu estudo, podendo obter um grande destaque técnico em sua área de atuação. O fato incontestável é que a internacionalização e a harmonização das práticas contábeis serviram para apresentar o profissional contábil em um nível de relevância e destaque nunca antes alcançado. Em contrapartida, ele deve estar preparado e atuali- zado tecnicamente, sob a visão global das oportunidades que essas mesmas práticas contábeis podem proporcionar à empresa onde atua. Portanto, a responsabilidade desse profissional ganha relevância, ao mesmo tem- po em que o seu protagonismo na preparação e divulgação de informações contábeis e financeiras em padrões internacionais também aumenta. Todo esse cenário é uma oportunidade sem precedentes àqueles profissionais que querem promover a dife- rença nas empresas em que trabalham ou para quem presta serviços, contribuindo de modo positivo para o sucesso da empresa e para o seu reconhecimento e crescimento profissional na organização. Investimentos em participações societárias 35 ATIVIDADES 1. Qual é a sua opinião sobre a aplicação do método de equivalência patrimonial? Você acredita que ele é um recurso relevante para os investimentos em participações societárias mantidos por investidoras? Fundamentea sua resposta. 2. Com base no que foi estudado, descreva dois assuntos que você identificou como sendo oportunidades para aplicar em sua rotina contábil. Se ainda não está trabalhando na área, pense nesses dois assuntos como itens para aprofundar o seu conhecimento. 3. Em função do protagonismo que o profissional contábil adquiriu com a internacionalização das práticas contábeis, reflita como você pode se preparar para corresponder às novas exigências e expectativas do mercado. Liste duas ações que você pode adotar como um “programa de desenvolvimento”. REFERÊNCIAS BRASIL. Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 17 dez. 1976. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6404consol.htm. Acesso em: 27 jul. 2020. BRASIL. Lei n. 12.973, de 13 de maio de 2014. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 14 maio 2014. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12973.htm. Acesso em: 27 jul. 2020. CPC. CPC 01 (R1) – Redução ao Valor Recuperável de Ativos. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 7 out. 2010a. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/ Pronunciamento?Id=2. Acesso em: 27 jul. 2020. CPC. CPC 02 (R2) – Efeitos das mudanças nas taxas de câmbio e conversão de demonstrações contábeis. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 7 out. 2010b. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/ Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=9. Acesso em: 27 jul. 2020. CPC. CPC 04 (R1) – Ativo Intangível. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 2 dez. 2012a. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=35. Acesso em: 27 jul. 2020. CPC. CPC 15 (R1) – Combinação de Negócios. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 4 ago. 2011a. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=46. Acesso em: 27 jul. 2020. CPC. CPC 18 (R2) – Investimento em Coligada, em Controlada e em Empreendimento Controlado em Conjunto. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 13 dez. 2012b. Disponível em: http://www.cpc.org.br/ CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=49. Acesso em: 27 jul. 2020. CPC. CPC 19 (R2) Negócios em conjunto. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 23 nov. 2012c. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=50. Acesso em: 27 jul. 2020. CPC. CPC 26 (R1) – Apresentação das Demonstrações Contábeis. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 15 dez. 2011b. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/ Pronunciamento?Id=57. Aceso em: 27 jul. 2020. CPC. CPC 31 – Ativo Não Circulante Mantido para Venda e Operação Descontinuada. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 16 set. 2009. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos- Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=62. Acesso em: 21 jul. 2020. CPC. CPC 36 – Demonstrações consolidadas. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 20 dez. 2012d. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=67. Acesso em: 27 jul. 2020. CPC. CPC 48 – Instrumentos financeiros. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 22 dez. 2016. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=106. Acesso em: 27 jul. 2020. CPC. ICPC 09 (R2) Demonstrações Contábeis Individuais, Demonstrações Separadas, Demonstrações Consolidadas e Aplicação do Método de Equivalência Patrimonial. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 27 nov. 2014. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Interpretacoes/ Interpretacao?Id=18. Acesso em: 27 jul. 2020. GELBCKE, E. R. et al. Manual de contabilidade societária: aplicável a todas as sociedades de acordo com as Normas Internacionais e o CPC. São Paulo: Atlas, 2018. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6404consol.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12973.htm http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=2 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=2 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=9 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=9 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=35 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=46 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=49 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=49 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=50 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=57 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=57 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=62 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=62 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=67 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=106 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Interpretacoes/Interpretacao?Id=18 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Interpretacoes/Interpretacao?Id=18 36 Contabilidade Avançada GABARITO CASOS PRÁTICOS Caso Prático 1: Resposta letra (a): Será utilizada a taxa de câmbio da data de remessa das divisas, ou seja, R$ 4,3801, pois é a taxa histó- rica pela qual ocorreu a remessa dos recursos financeiros do Brasil para a Itália, na integralização do capital. Resposta letra (b): Demonstração do cálculo: Valor do aumento de capital: euro = 500.000,00. Taxa de câmbio na data do contrato de remessa (02/02/2019): R$ 4,3801. Total do aumento de capital em reais: R$ 2.190.050,00. Construldor é uma coligada da investidora Companhia ABC Brasil. Lançamentos contábeis na investidora: D Investimentos em coligada (Subconta – Investida Construldor) R$ 2.190.050,00 C Banco conta movimento (R$ 2.190.050,00) Caso Prático 2: Resposta letra (a): Valor dos dividendos mínimos obrigatórios Construldor: euro = 50.000,00. Valor do dividendo na data da aprovação dos dividendos: Taxa de câmbio na data da aprovação dos dividendos (em 18/12/2018): R$ 4,4001. Total dos dividendos em reais (em 18/12/2018): R$ 220.005,00. Valor do dividendo na data do recebimento dos dividendos: Taxa de câmbio na data do recebimento dos recursos (27/12/2018): R$ 4,4502. Total dos dividendos mínimos obrigatórios em reais: R$ 222.510,00. Variação cambial apurada (ativa): R$ 2.505,00. Respostas letra (b): Lançamentos contábeis na investidora (na data da aprovação dos dividendos): D Dividendos a receber R$ 220.005,00 C Investimentos em coligada (Subconta – Investida Construldor) (R$ 220.005,00) Lançamentos contábeis na investidora (variação cambial apurada entre a data de aprovação dos divi- dendos e o seu efetivo recebimento): D Dividendos a receber R$ 2.505,00 C Investimentos em coligada (Subconta – Investida Construldor) (R$ 2.505,00) Lançamentos contábeis na investidora (recebimento): D Bancos c/movimento R$ 222.510,00 C Dividendos a receber (R$ 222.510,00) Redução ao valor recuperável de ativos 37 2 Redução ao valor recuperável de ativos A redução ao valor recuperável de ativos é um tema particularmente relevante na visão contábil e até mesmo econômica da empresa, pois visa garantir que os ativos não estejam registrados por um valor superior ao que possa ser recuperado ao longo do tempo em condições normais e planejadas. O CPC 01R1 (Revisão 01) está correlacionado à Norma Internacional de Contabilidade, à IAS 36 - Impairment of Assets. Desde então, ele deve ser observado por empre- sas de responsabilidade limitada (de grande porte, segun- do os critérios da Lei n.11.638/2007) e sociedades por ações (de acordo com o § 3º, art. 183 da Lei n. 6.404/1976). Lembrando que as empresas de pequeno e médio portes também possuem um mecanismo similar ao previsto no CPC 01(R1), estabelecido no CPC PME (R1) – Contabilidade para Pequenas e Médias Empresas (Seção 27) 1 . Neste capítulo, portanto, tratamos de tópicos selecio- nados com base principalmente no CPC 01(R1) – Redução ao Valor Recuperável de Ativos e dos procedimentos que devem ser seguidos pelos profissionais contábeis. De modo geral, os assuntos deste capítulo abordam a iden- tificação dos ativos que podem estar desvalorizados, as técnicas de mensuração do valor recuperável dos ativos, como realizar a identificação da unidade geradora de caixa, como reconhecer a perda por desvalorização e, também, os casos em que pode ocorrer a reversão dessa perda. Boa leitura! Para mais detalhes, consultar CPC PME (R1) – Contabilidade para Pequenas e Médias Empresas, dis- ponível em: http://www.cpc.org. br/CPC/Documentos-Emitidos/ Pronunciamentos/Pronunciamen- to?Id=79. Acesso em: 1 set. 2020. 1 38 Contabilidade Avançada 2.1 Ativos que podem estar desvalorizados Vídeo O CPC 01(R1) tem por pressuposto que os ativos são mantidos nos registros contábeis das empresas pelos seus valores de aquisição líquidos de determinados ajustes contábeis e que estão gerando os recursos econômicos para a empresa por meio do seu uso. Com o passar do tempo, a administração deve comparar periodi- camente os valores contábeis desses ativos com os recursos econômicos gerados. O objetivo desse processo é apresentar demonstrações contábeis fidedignas aos investidores, stakeholders e tomadores de decisão por meio das informações con- tábeis das empresas. Para entendermos melhor, é necessário passarmos pelas etapas a seguir. 2.1.1 Alcance Em uma primeira análise, é comum imaginarmos que todos os ativos registra- dos nos livros contábeis da empresa devem ser submetidos aos testes de redução ao valor recuperável do CPC 01(R1). Contudo, a realidade não é essa. O item 2 do CPC 01(R1) (CPC, 2010), denominado Alcance, apresenta os ativos que não seguem os preceitos determinados, pois possuem pronunciamentos técnicos específicos vigentes, e que contêm disposições orientadoras próprias para o reco- nhecimento e a mensuração desses ativos e seus ajustes por natureza de redução. Os ativos fora do escopo do CPC 01(R1) são: estoques, ativos advindos de con- tratos de construção, ativos fiscais diferidos, ativos advindos de planos de benefí- cios a empregados, ativos financeiros (dentro do alcance do CPC 48 – Instrumentos Financeiros); ativos classificados como mantidos para venda, ativos biológicos (con- forme escopo do CPC 29 – Ativo Biológico e Produto Agrícola); custos de aquisição diferidos e ativos intangíveis advindos de direitos contratuais de companhia de se- guros (conforme escopo do CPC 11 – Contratos de Seguro). Após repassarmos essa listagem de ativos não contemplados no CPC 01(R1), concluímos, por eliminação, que os ativos no escopo deste são: ativos imobilizados, ativos intangíveis e participações societárias em coligadas, controladas e em- preendimentos controlados em conjunto, não esquecendo dos respectivos ágios (mais-valia e/ou goodwill), quando existirem. 2.1.2 Conceitos Há vários termos relevantes que nos auxiliarão no entendimento aprofun- dado dos assuntos à medida que serão apresentados. Com base no item 6 do CPC 01(R1) (CPC, 2010), transcrevemos a seguir os conceitos de maior destaque: • Ativo: recurso econômico presente controlado pela empresa como resultado de eventos passados. • Recurso econômico: direito da empresa que tem o potencial de produzir benefícios econômicos. O teste de redução ao valor recuperável também é conhecido como: testes de recuperabilidade, teste de impairment e teste de imparidade. Curiosidade Redução ao valor recuperável de ativos 39 • Valor contábil: valor de registro do ativo no balanço depois de deduzidas to- das as respectivas depreciação, amortização ou exaustão acumulada e ajuste para perdas. • Unidade geradora de caixa (UGC): menor grupo identificável de ativos gera- dor de entradas de caixa, as quais são, em grande parte, independentes das entradas de caixa de outros ativos ou outros grupos de ativos. • Valor justo: preço recebido pela venda de um ativo ou pago pela transfe- rência de um passivo em uma transação não forçada entre participantes do mercado na data de mensuração 2 . • Perda por desvalorização: montante pelo qual o valor contábil de um ativo ou de UGC excede seu valor recuperável. • Valor recuperável de um ativo ou de uma unidade geradora de caixa: maior montante entre o valor justo líquido de despesa de venda e o valor em uso. • Valor em uso: valor presente de fluxos de caixa futuros estimados, decorren- tes do uso contínuo do ativo ou de UGC nas operações da empresa. • Despesas de venda ou de baixa: despesas diretamente atribuíveis à venda ou à baixa de um ativo ou de uma UGC, excluindo as despesas financeiras e de impostos sobre o resultado gerado. 2.1.3 Processo de identificação da existência de ativos desvalorizados Naturalmente, o profissional contábil tem uma participação relevante em todo o processo de adoção do CPC 01(R1). Contudo, deve estar atento a com- partilhar e envolver a administração em muitas discussões relevantes, as quais resultarão nas premissas para uma aplicação adequada da norma contábil. Você deve estar achando que esse assunto é complexo. Por onde devemos co- meçar? Pensando nisso, preparamos um passo a passo com o objetivo de indicar as principais etapas executadas no uso organizado da técnica de identificação de ativos que podem estar desvalorizados. Cabe a ressalva de que esse passo a passo é genérico e que deve ser adaptado pelo profissional contábil à sua realidade. 1º passo – Identificando o(s) ativo(s) ou o conjunto de ativos. A aplicação do CPC 01(R1) se inicia com o entendimento claro e adequa- do do(s) ativo(s) ou dos conjuntos de ativos (chamado de unidade geradora de caixa – UGC) que serão submetidos às avaliações e ao teste de recuperabilidade. Esse entendimento será obtido pelo profissional contábil com o auxílio di- reto dos administradores da empresa e poderá contar com informações como: a maneira pela qual a administração analisa e divulga a receita/faturamento dos produtos vendidos (por exemplo, segregação por segmento operacional); número de linhas produtivas e respectivos produtos acabados produzidos nessas linhas; quantidade de fábricas e se essas ficam no mesmo local ou em locais diferentes; se os produtos produzidos em uma linha de produção são classificados como matérias-primas e insumos para outras linhas produtivas; Para maiores detalhes, consultar CPC 46 – Mensuração do Valor Justo, disponível em: http://www. cpc.org.br/CPC/Documentos- -Emitidos/Pronunciamentos/ Pronunciamento?Id=78. Acesso em: 1 set. 2020. 2 Os ativos em análise estarão des- valorizados quando seus valores contábeis excederem seus valores recuperáveis. O escopo principal do teste de recuperabilidade do CPC 01(R1) são os ativos imobili- zados, intangíveis e investimentos em participações societárias. Importante http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=78 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=78 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=78 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=78 40 Contabilidade Avançada como a alocação dos ativos imobilizados (máquinas, equipamentos e outros recursos) foi efetuada nas referidas linhas produtivas, dentre tantas outras in- formações técnicas e gerenciais relacionadas com o uso dos ativos na geração de recursos econômicos para a empresa. Na figura a seguir apresentamos alguns exemplos de cenários resultantes da análise e identificação dos ativos individuais e/ouUGC: Figura 1 Exemplos de cenários para análise e identificação dos ativos individuais e/ou UGC Cenário 1 Processo produtivo Matéria-prima A Produto acabado Matéria-prima B Mesmo que o processo produtivo empregue as matérias-primas A e B e ainda necessite de um ativo individual ou um conjunto de ativos (UGC), a empresa produz e vende um único produto, o qual é o gerador de entradas de caixa (receitas, recursos econômicos). Assim, o ativo individual (ou UGC) será avaliado e tes- tado de maneira consolidada, sendo requerido reali- zar uma única avaliação dos indicadores e um único teste de recuperabilidade. Cenário 2 Processo produtivo B Processo produtivo AMatéria-prima A Produto acabado Matéria-prima B Mesmo que existam dois processos produtivos distintos (A e B) que empreguem matérias-primas A e B, uma etapa de montagem com ativos individuais ou um conjunto de ativos (UGC) também distintos e alocados em suas respectivas linhas produtivas, somente um produto acabado é produzido e vendido, o qual é o gerador de entradas de caixa para a empresa (receitas, recursos econômicos). Assim, o ativo individual (ou UGC) será avaliado e testado de maneira consolidada, sendo requerido realizar uma única avaliação dos indicadores e um único teste de recuperabilidade. Cenário 3 Processo produtivo B Matéria-prima A Produto acabado A Produto acabado B Matéria-prima B Processo produtivo A Os processos produtivos e as matérias-primas são distintos, com vendas de produtos acabados também individualizados (produtos acabados A e B). Estes são os geradores de entradas de caixa para a empresa (receita, recursos econômicos). Assim, os ativos individuais (ou UGC) serão avaliados e testados de maneira segregada por linha produtiva, sendo requerido realizar duas avaliações dos indicadores e dois testes de recuperabilidade: um para o processo produtivo A e outro para o processo produtivo B. Cenário 4 Matéria-prima Processo produtivo Processo produtivo Produto acabado Semiacabado LOCAL A LOCAL B Mesmo existindo dois locais distintos (A e B), o local A produz um item semiacabado, que é levado para o local B, onde os produtos são finalizados e vendidos ao mercado. Há um único produto acabado que é o gerador de entradas de caixa para a empresa (receita, recursos financeiros). Assim, mesmo que os ativos individuais (ou UGC) estejam em duas localidades diferentes, serão avaliados e testados de maneria consolidada, sendo requerido realizar uma única avaliação dos indicadores e um único teste de recuperabilidade. O resultado dessa avaliação poderia ser diferente se houvesse um mercado ativo para a venda do produto semiacabado. Fonte: Elaborada pelo autor. Redução ao valor recuperável de ativos 41 A Figura 1 elenca uma amostra das possibilidades e dos vários cenários com os quais o profissional contábil pode se deparar nas discussões em sua empresa, bem como o nível de complexidade e detalhamento que ele precisa se aprofundar para efetuar um teste de recuperabilidade nos padrões indicados pelo CPC 01(R1). Gelbcke et al. (2018, p. 255) exemplificam que, “em algumas situações, a UGC poderá ser a fábrica inteira, sem possibilidade de subdivisão, quando ela produz um único produto e não há como fazer seccionamentos, como é o caso de uma usina de álcool”. Com relação à UGC, especificamente, é importante destacar que o seu valor contábil compreende os seguintes elementos: i. valor contábil dos ativos que podem ser alocados em base razoável e con- sistente à unidade geradora de caixa e que gerarão fluxos de caixa futuros utilizados na determinação do valor em uso da referida unidade geradora de caixa; ii. ágio ou deságio decorrente e relativo ao ativo pertencente à unidade gera- dora de caixa proveniente de uma aquisição ou subscrição, cujo fundamento esteja na diferença entre o valor de mercado do referido ativo e o seu valor contábil; e iii. não inclui o valor contábil de qualquer passivo reconhecido, exceto se o valor contábil da unidade geradora de caixa não puder ser determinado sem considerar esse passivo. (GELBCKE et al., 2018, p. 255) Para que o valor contábil dos ativos seja alocado em uma base razoável e consis- tente, conforme o item (i), a empresa precisará dispor de um controle patrimonial que possa fornecer essas informações. O conceito de alocação aqui discutido se- guirá o mesmo nível de análise e discussão demonstrado nos exemplos da Figura 1. O ágio ou deságio citado no item (ii) é classificado no grupo de Investimentos no balanço individual ou no grupo Intangível no balanço consolidado, e deve ser con- siderado custo dos respectivos ativos incorporados à unidade geradora de caixa (GELBCKE et al., 2013). O reconhecimento de passivo em uma UGC, item (iii), não é algo usual, mas deve ser observado pelo profissional contábil, pois a administração pode celebrar contratos junto a terceiros ou assumir responsabilidades de pagamento que se enquadrem nesse caso. Recomendamos que o profissional contábil elabore, em conjunto com a administração da empresa, uma política interna (ex.: política de testes de redução ao valor recuperável) que descreva com mais detalhes os critérios ana- lisados, bem como as conclusões obtidas na identificação dos ativos individuais ou em conjunto (UGC). A docu- mentação dessa política interna auxiliará o profissional contábil e a empresa na elaboração das notas explicativas das demonstrações contábeis e a manterem a consistência dessas premissas, garantindo o uso dos mesmos métodos para os mesmos itens entre os exercícios sociais. É uma boa prática de mercado que essa política interna seja revisada pelo menos anualmente, mesmo que não tenha sofrido modificações, e sempre que ocorrer alguma mudança relevante nos critérios inicialmente formalizados. Essa revisão deve ser formalizada para suportar o ambiente de controles internos da empresa. Dica O profissional contábil precisa compreender esses conceitos para que possa fazer a alocação do ágio (goodwill) à UGC, o que estudaremos na sequência. 42 Contabilidade Avançada • Alocando o ágio (goodwill) a uma UGC A alocação do ágio é prevista no item 81 do CPC 01(R1), e sua relevância é decorrente das suas características e do impacto que pode causar no teste de recu- perabilidade dos ativos, conforme observamos a seguir: O ágio (goodwill), reconhecido em uma combinação de negócios, é um ativo que representa benefícios econômicos futuros advindos de outros ativos adquiridos na combinação de negócios, não são identificados in- dividualmente e não são reconhecidos separadamente. O ágio (goodwill) não gera fluxos de caixa independentemente de outros ativos e UGC. Recomenda-se que este julgamento também seja formalizado em uma Política Interna, podem ser a mesma Política de Testes de Redução ao Valor Recuperável. (CPC, 2010) O ágio por expectativa de rentabilidade futura (goodwill) é apurado em uma combinação de negócios (por meio do uso do CPC 15 – Combinação de Negócios) e deve ser obrigatoriamente alocado a uma UGC antes de efetuar os testes de re- cuperabilidade dos ativos, pois ele não gera fluxo de caixa de modo independente. A alocação deve ocorrer desde a data da conclusão da operação da combinação de negócios. Uma vez realizada essa alocação a uma UGC, esse ágio não deve ser transferido e/ou atrelado a outra UGC. Por isso, é fundamental que o ágio (goodwill) seja alocado a cada uma das UGCs da empresa ou a grupos de UGC, que se beneficiarão das sinergias da operação, independentemente de outros ativos. Cada UGC na qual o ágio (goodwill) é alocado deverá, conforme o item 80: “a) Representar o menor nível dentro da empresa no qual o ágio (goodwill) é monitorado para fins gerenciais internos; e b) Não ser maior do que um segmento operacional, conforme definido pelo item 5 do Pronuncia- mento Técnico CPC 22 – Informações por Segmento, antes da agregação” (CPC, 2010). A preocupação reforçada de que a UGC deve representaro menor nível dentro da empresa tem relação tanto com a alocação do ágio a essas UGCs quanto com o fato de poder mensurar da maneira mais acurada possível os benefícios eco- nômicos que esses ativos geram de recursos para as atividades operacionais da empresa. Quanto à menção ao segmento operacional (CPC 22), esse item tem relação com a visão de como a administração gerencia e toma decisões estratégicas sobre as atividades operacionais. Isso pode ocorrer por meio de relatórios ge- renciais, sistemas ERPs, divisão matricial de responsabilidades, entre outros re- cursos disponíveis. Se a empresa possuir UGCs diferentes, elas podem ser testadas para redução ao valor recuperável em momentos diferentes. Porém, se parte ou o todo do ágio (goodwill) alocado a uma UGC for decorrente de uma combinação de negócios que se realizou durante o exercício corrente, essa UGC deve ser testada para redução ao valor recuperável antes do fim do exercício corrente (CPC, 2010). O item 84 do CPC 01(R1) destaca o que pode ocorrer quando a própria combi- nação de negócios ainda não foi concluída: Redução ao valor recuperável de ativos 43 Quando a alocação inicial do ágio por expectativa de rentabilidade futura (goodwill), adquirido em combinação de negócios, não puder ser completa- da antes do término do período anual em que a combinação de negócios ocorrer, essa alocação inicial deve ser completada antes do término do pri- meiro período anual com início, após a data da aquisição. (CPC, 2010) Isso reforça a necessidade de a administração concluir tão logo seja possível o processo de compra de participações societárias e a apuração de ágios, esta reali- zada por meio do CPC 15 – Combinação de Negócios, norma contábil a ser seguida. O CPC 01(R1) (2010) também traz casos específicos com os quais a empresa pode se deparar em seu dia a dia, como: (a) a apuração do valor do ágio (goodwill) não foi concluída plenamente até a data de elaboração das demonstrações contá- beis; (b) tratamento da baixa da UGC; (c) reorganização da estrutura de reporte que pode alterar a composição de uma ou mais UGCs. 2º passo – Definindo as fontes externas e internas (indicadores observados) para avaliação dos ativos identificados. Após a identificação dos ativos (individuais ou em conjunto), a empresa deve avaliar a existência de indicações (ou fatores) apontando que os ativos contabiliza- dos perderam (ou reduziram) os recursos econômicos que fluem para a empresa. Para auxiliar essa identificação, o item 4 do CPC 01(R1) (CPC, 2010) apresenta alguns exemplos de fontes externas e internas que a administração pode utilizar como indicadores observáveis durante o exercício social ou por ocasião da elabo- ração das demonstrações contábeis a serem divulgadas. Lembrando que esses são exemplos de indicadores. A seguir, apresentamos essas fontes nos Quadros 1 e 2, com alguns comentários sobre a sua relevância para o profissional contábil. Quadro 1 Fontes externas Pronunciamento Contábil CPC 01(R1) Comentários O valor de mercado do ativo em análise diminuiu sensivel- mente, mais do que esperado, como resultado da passa- gem do tempo ou do uso normal. Informação relevante para o profissional contábil, princi- palmente se for necessário calcular o valor recuperável do ativo (valor justo líquido de despesas de venda). Ocorreram, ou ocorrerão em futuro próximo, mudanças significativas na tecnologia, no mercado, nos ambientes econômico e/ou legal, onde a empresa opera ou no mer- cado para o qual o ativo é utilizado. Indica que a empresa pode ter sua competitividade no mercado afetada, o que faria com que seus concorren- tes tivessem vantagens competitivas em níveis suficien- tes para pressionar os preços e, consequentemente, afetar suas receitas. As taxas de juros de mercado ou outras taxas de retor- no aplicadas sobre investimentos aumentaram, e esses acréscimos afetarão a taxa de desconto utilizada no cál- culo do valor de um ativo em uso, bem como diminuirão significativamente o seu valor recuperável (mensuração). O impacto desse indicador está diretamente relaciona- do com as estimativas que as administrações utilizam na gestão dos negócios, principalmente a ferramenta de fluxo de caixa. Taxas de juros maiores impactam as ta- xas de desconto e afetam o resultado do valor presente líquido calculado. O valor contábil do Patrimônio Líquido da empresa (ou da investida) se tornou maior do que o valor de suas ações no mercado. Situação para empresas que possuem suas ações nego- ciadas em bolsa de valores. Indicativo de que a empresa está passando por alguma condição de risco, a qual foi identificada pelos investidores. Fonte: Elaborado pelo autor com base no item 12 do CPC 01(R1), 2010. Você sabia que os ativos corporativos não geram entradas de caixa de modo independente e que seu valor contábil não pode ser totalmente atribuído a uma UGC? Exemplos de ativos corporativos são: prédio da sede ou divisão da empresa; equipamentos de processamento eletrôni- co de dados; centro de pesquisas. Esses ativos não serão tra- tados em nossos estudos, por isso, recomendamos a leitura do CPC 01(R1), em particular o seu item 100. Disponível em: http://www. cpc.org.br/CPC/Documentos- -Emitidos/Pronunciamentos/ Pronunciamento?Id=2. Acesso em: 1 set. 2020. Saiba mais http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=2 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=2 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=2 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=2 44 Contabilidade Avançada Quadro 2 Fontes internas Pronunciamento Contábil CPC 01(R1) Comentários do autor Evidência disponível de obsolescência ou de dano físico do ativo ou conjunto de ativos (UGC) em análise. Por exemplo, relatórios internos, como manutenção, demonstrando a ocorrência de eventos que possam reduzir a capacidade produtiva do ativo imobilizado. Ocorreram, ou ocorrerão em futuro próximo, mudanças significativas com efeito adverso na maneira em que o ativo é ou será utilizado. Essas mudanças, entre outras, incluem: o ativo que se torna inativo, o ativo ou conjunto de ativos (UGC) que a administração planeja descontinuar, reestrutu- rar ou baixar antecipadamente; o ativo que passa a ter vida útil definida ao invés de indefinida. Estudos que a administração possa estar elaborando, indicando que o ativo individual ou UGC sofrerá algum tipo de mudança em seu uso e, consequentemente, na geração de recursos financeiros que reverterão de maneira negativa para a empresa em suas operações. Levantamentos ou relatórios internos que evidenciem, por exemplo, a existência de dispêndios extraordinários de construção, capitalização excessiva de encargos financeiros etc., e que indiquem que o desempenho econômico de um ativo é, ou será, pior do que o esperado. Análises de relatórios gerenciais, como orçamentos, utilizadas pela administração para o monitoramento dos resultados apurados e que apontem desvios não esperados. Fonte: Elaborado com base no item 12 do CPC 01(R1) (CPC, 2010). Cada empresa poderá definir seus indicadores próprios, adequados para suas atividades e os segmentos das operações. Cabe ao profissional contábil avaliar quais são os indicadores mais pertinentes que serão base para essas análises. • Dividendos em participações societárias Para os investimentos em coligadas, controladas ou empreendimentos contro- lados em conjunto, a investidora reconhece dividendos advindos desses e existe evidência disponível de, segundo o item 12, que: i. O valor contábil do investimento nas demonstrações contábeis separadas excede os valores contábeis dos ativos líquidos da investida reconhecidos nas demonstrações consolidadas, incluindo eventual ágio por expectativa de rentabilidade futura (goodwill); ou ii. O dividendo excede o total de lucro abrangente da coligada, controladaou empreendimento controlado em conjunto no período em que o dividendo é declarado. (CPC, 2010) O item (i) pode ser verificado quando a empresa investidora (adquirente da participação societária) apura o goodwill que, nas demonstrações contábeis se- paradas, é divulgado no grupo de investimentos, enquanto que nas demons- trações consolidadas é transferido para o grupo de intangível. Os saldos dos investimentos devem ser eliminados para preparação das demonstrações consolidadas. É necessário que o profissional contábil investigue com mais detalhes a situação do item (ii), que culminou na diferença de um dividendo excedente em relação ao valor declarado. Um exemplo bastante interessante do uso de fontes externas e internas aplica- do a ativos intangíveis é apresentado por Almeida (2018), reforçando a importância de julgamentos desses indicadores e análises com um nível de entendimento e profundidade pelo profissional contábil e pela administração para uma adequada tomada de decisão. Recomendamos que as fontes externas e internas, avaliadas em conjunto pelo profissional contábil e pela administração da empresa, também sejam documentadas em uma política interna (podendo ser a mesma comentada anteriormente). Esses julgamentos serão usados como base para a análise da existência de indicadores que confirmem a necessidade ou não da execução dos testes de recuperabilidade na periodicidade indicada. Importante Redução ao valor recuperável de ativos 45 Vejamos o exemplo do reflexo da avaliação dos indicadores (fontes externas e internas): Exemplo Indicadores de desvalorização para softwares de computadores (intangível) A Entidade Y tem diversos softwares de computadores avaliados ao valor de cus- to deduzido da respectiva amortização acumulada. A administração dessa empresa gostaria de saber quais outros eventos e circunstâncias poderiam indicar perda por desvalorização, além dos descritos no CPC 01(R1). É necessário exercermos julgamento cuidadoso ao identificar sinais de possíveis perdas do valor recuperável para softwares de computadores ao valor de custo de- duzido da respectiva amortização acumulada (softwares em uso). Exemplos desses sinais são os seguintes: a. Não é esperado que o software preste o mesmo potencial de serviços como originalmente planejado. b. Uma mudança significativa ocorreu na maneira como o software é usado, de modo que houve redução dos benefícios futuros esperados. c. Uma alteração significativa foi realizada ou será realizada no software, de tal modo que os benefícios futuros esperados (que seriam gerados) serão reduzidos. d. O custo para desenvolver ou modificar o software excede significativamente o valor originalmente orçado. Especificamente com relação ao software atualmente em desenvolvimento para uso interno da entidade (softwares que não estão em uso), indicações de que esse programa poderia não ser concluído e colocado em serviço incluem o seguinte: a. Sem gastos orçados ou sem previsão de gastos que seriam incorridos no projeto. b. Dificuldades de planejamento do uso do software que não podem ser resolvidas em tempo hábil. c. Significativos custos não previstos originalmente. d. Os custos do programa desenvolvido internamente excederão substancialmente os custos de software da mesma natureza de terceiros, e a administração da entidade pretende comprar o software de terceiros em vez de completar o desenvolvido internamente. e. Novas tecnologias foram introduzidas no mercado, e a administração da entidade pretende agora obter o software de terceiros em vez de completar o desenvolvido internamente. f. O segmento de negócio para o qual o software se relaciona é inútil e será interrompido. Se os eventos e as circunstâncias indicam que os custos do software podem não ser recuperáveis, a entidade deve determinar se uma perda deve ser reconhecida na escrituração mercantil. 46 Contabilidade Avançada 3º passo – Reflexos dos resultados das evidências encontradas nas fontes externas e internas (indicadores observados). Se o resultado da análise dos indicadores externos, internos e dividen- dos em participações societárias definidos apontar evidências de que o ativo sofreu desvalorização, com base em qualquer um dos indicadores das fon- tes consultadas, o profissional contábil deve fazer uma estimativa formal do valor recuperável, ou seja, realizar o teste de recuperabilidade, seguindo os preceitos que serão apresentados na Seção 2.2. Todavia mesmo no caso de o resultado da análise dos indicadores não apon- tar a necessidade de se fazer uma estimativa formal, o profissional contábil deve observar determinadas situações em que o teste de recuperabilidade pre- cisa obrigatoriamente ser realizado. Essa previsão será tratada na Seção 2.1.4. Na figura a seguir apresentamos um resumo esquematizado dos três passos para identificar a existência de ativos desvalorizados: Figura 2 Passos para identificação de ativos desvalorizados 1º passo 2º passo 3º passo, cenário 1 3º passo, cenário 2 NãoA B Sim Identificação ou dos ativos individuais ou do conjunto de ativos Deve ser efetuado o teste de recuperabilidade Não é necessário efetuar o teste de recuperabilidade; o teste é encerrado nesta etapa Avaliação dos indicadores (externos e internos) Tipos de ativos Perda ou redução? A – Representa os ativos intangíveis com vida útil indefinida ou os ativos intangíveis ainda não disponíveis para uso e ágio (goodwill). Devem ser testados anualmente. B – Representa os ativos imobilizados, ativos intangíveis com vida útil definida e investimentos em participações societárias. Devem ser submetidos à avaliação dos indicadores. Fonte: Elaborada pelo autor. Portanto, dependendo do tipo de ativo individual ou do conjunto de ativos avaliados, haverá a necessidade de o profissional contábil proceder com o teste de recuperabilidade ou, pelo menos, efetuar a avaliação dos seus indicadores, sejam externos ou internos. O resultado apurado na avaliação desses indicado- res apontarão a necessidade de o profissional contábil efetuar ou não o teste de recuperabilidade. 2.1.4 Periodicidade dos testes A avaliação da existência de indicadores que podem apontar a perda de be- nefícios econômicos dos ativos ou do conjunto de ativos (UGC) deve ser feita pela empresa pelo menos uma vez por ano, sendo recomendável ser realizada na ocasião da elaboração das demonstrações contábeis anuais. Redução ao valor recuperável de ativos 47 Se for constatada essa desvalorização, a empresa deverá proceder teste de recuperabilidade, o qual trataremos na Seção 2.2. Além do que foi explicado anteriormente, merece destaque o item 10 do CPC 01(R1), o qual menciona que independentemente de existir ou não qual- quer indicação de redução ao valor recuperável, apurada por meio das fontes externas ou internas, a empresa deverá testar: a) No mínimo anualmente, a redução ao valor recuperável dos ativos in- tangíveis com vida útil indefinida ou dos ativos intangíveis ainda não dis- poníveis para uso, devido ao maior grau de incertezas nesta fase; e b) Anualmente, o ágio (goodwill) em combinação de negócios, inclusive e, principalmente, aquele ágio que foi alocado a uma UGC. (CPC, 2010) Além do próprio grau de incerteza dos ativos intangíveis com vida útil in- definida e dos ativos intangíveis ainda não disponíveis para uso, outra razão para que sejam testados anualmente é garantir que estão gerando (ou irão ge- rar) recursos econômicos que reverterão para a empresa. Sem o atendimento a essas premissas, as respectivas provisões de perda por desvalorização serão reconhecidas. Com relação ao ágio (goodwill), a razão principal dos testes anuais é a preo- cupação de que a natureza dos seus fundamentos, apurados quando da compra das participações societárias, ainda continue vigente. Portanto, dependendo do tipo de ativo individual ou do conjunto de ativos avaliados, haverá a necessidade de o profissional contábil procedercom o teste de recuperabilidade ou, pelo menos, efetuar a avaliação dos seus indicadores, sejam externos ou internos. O resultado apurado na avaliação desses indicado- res apontarão a necessidade de o profissional contábil efetuar ou não o teste de recuperabilidade. 2.2 Mensuração do valor recuperável Vídeo O valor recuperável de um ativo ou de uma UGC é o maior valor entre o valor justo líquido de despesa de venda e o valor em uso. Conforme comentado por Gelbcke et al. (2018, p. 254), “é provável que no caso dos itens reconhecidos no ativo imobilizado da empresa seja mais comum a utilização do valor em uso como parâmetro para o valor recuperável”. Essa situação pode ocorrer em decorrência das características exclusivas da atividade da entidade e, consequentemente, do ativo que está associado à sua operação. Com isso, a chance de existir um mercado para o ativo imo- bilizado se reduz. Também se considera que o ativo terá maior potencial de gerar benefícios econômicos por meio do seu uso nas operações da empresa do que pela venda. Usualmente, as entidades executam os testes de redução ao valor recupe- rável em um período próximo da elaboração das demonstrações contábeis anuais. Esses testes, porém, podem ser feitos a qualquer momento no exercício, desde que sejam sempre no mesmo período/época do ano. Se a empresa for uma sociedade por ações, com ações negociadas na Bolsa de Valores, a periodi- 48 Contabilidade Avançada cidade das avaliações dos indicadores (fontes externas e internas) será efetuada trimestralmente, seguindo a divulgação dos relatórios financeiros, Informações Trimestrais (ITR), determinada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). 2.2.1 Valor justo líquido de despesas de venda Segundo Marion e Rios (2020, p. 262), valor justo “nada mais é do que o valor pelo qual um ativo possa ser vendido, em um mercado ativo, já descontadas as despesas para vendê-lo, como comissões, transporte do ativo, impostos etc.”. Já o CPC 46 – Mensuração do Valor Justo (CPC, 2012) menciona, em seu item 77, que a evidência mais confiável a ser utilizada no levantamento do valor justo de um ativo é o seu preço cotado em mercado ativo, sendo que não deve sofrer nenhum tipo de ajuste, isto é, o preço apurado deve ser utilizado pelo profissional contábil diretamente na mensuração e nos testes em realização. Por essas razões, o profissional contábil deve priorizar a obtenção de cotações de preço em um mercado ativo, aumentando a confiabilidade das informações constantes nos testes de recuperabilidade. Vejamos um exemplo de apuração do valor justo: Exemplo A Entidade ABC está realizando o teste de recuperabilidade dos seus ativos, sendo necessário apurar o valor justo do seu acervo de máquinas das suas linhas produtivas. O profissional contábil e o analista da área de compras realizaram pes- quisas de preço e cotações em um mercado ativo, no qual foi possível verificar os valores praticados para esses maquinários em condições similares às da empresa. O montante apurado nessas cotações foi de R$ 550.000,00. Ainda como parte dos procedimentos previstos pelo CPC 01(R1), foram levantados os valores e as natu- rezas das despesas a serem incorridas caso as máquinas fossem vendidas, como comissão de venda de 1% sobre o montante a ser vendido, desmontagem e trans- porte das máquinas a R$ 10.000,00 até a empresa do comprador dos itens. Portan- to, para efeito de aplicação do teste e apuração do valor justo líquido de despesas de venda dessas máquinas teremos: Valor total das cotações apuradas: R$ 550.000,00 Despesas: ( – ) Comissão de vendas (1%): (R$ 5.500,00) ( – ) Desmontagem e transporte: (R$ 10.000,00) Total apurado – Valor justo das máquinas: R$ 534.500,00 Como observamos, o principal suporte ao cálculo do valor justo é a existência de um mercado ativo. Porém, o profissional contábil pode se deparar com situações em que: (a) não há um preço a ser cotado em um mercado ativo para apurar o valor justo de um ativo idêntico; e (b) não há uma base para se calcular uma estimativa As despesas com demissão de empregados e as associadas à redução ou reorganização de um negócio em seguida à baixa de um ativo não são despesas que devam ser somadas à baixa do ativo (CPC, 2010, item 28). Importante Redução ao valor recuperável de ativos 49 confiável do preço pelo qual uma transação para a venda do ativo ocorreria entre participantes do mercado na data de mensuração e sob condições de mercado. Nessas situações, o item 20 do CPC 01(R1) (CPC, 2010) aponta que o valor em uso pode ser utilizado como valor recuperável. Uma dica que pode facilitar os trabalhos do profissional contábil é apresentada no item 19 do CPC 01(R1) (CPC, 2010), o qual explica que nem sempre é necessário determinar o valor justo líquido de despesas de venda de um ativo e seu valor em uso. Se um desses montantes exceder o valor contábil do ativo, significa dizer que o ativo não está desvalorizado, portanto, não é necessário estimar outro valor. Entre- tanto, é fundamental manter as evidências de cálculos e informações, bases para a conclusão dessas análises. 2.2.2 Valor em uso Conforme o item 30 do CPC, os elementos a seguir devem ser refletidos no cál- culo do valor em uso do ativo: a. Estimativa dos fluxos de caixa futuros que a entidade espera obter com o uso contínuo do ativo ou conjunto de ativos (UGC) e da sua baixa do ativo ao término de sua vida útil; b. Expectativas acerca de possíveis variações no montante ou no período de ocorrência desses fluxos de caixa futuros; c. Valor do dinheiro no tempo, representado pela atual taxa de juros livre de risco, ou seja, aplicar a taxa de desconto apropriada a esses fluxos de caixa futuros; d. Preço pela assunção da incerteza inerente ao ativo (prêmio); e e. Outros fatores, tais como falta de liquidez, que participantes do mercado iriam considerar ao precificar os fluxos de caixa futuros esperados da entida- de, advindos do ativo. (CPC, 2010) No item (a) podemos verificar que o principal ponto a ser considerado na elabo- ração do fluxo de caixa é observar o uso contínuo do ativo dentro da sua previsão normal de operação e, quando for aplicável, incluir a entrada no fluxo de caixa da apuração da sua venda. A venda do ativo dependerá do tempo estimado de uso do próprio ativo e da quantidade de exercícios usada na elaboração do fluxo de caixa, que, geralmente, são de no máximo cinco anos. Segundo o item 55, a estimativa de fluxos de caixa líquidos a serem recebidos (ou pagos) pela baixa de um ativo ao término de sua vida útil será determinada de modo semelhante para o valor justo líquido de despesas de venda do ativo (CPC, 2010). A respeito dos itens (b) e (d), vemos que a administração deve considerar um fator de incerteza e imprecisão quando da construção do fluxo de caixa. Por isso é comum verificarmos fluxos de caixa construídos com premissas, cenários e proba- bilidades de ocorrência. O item (c) é um dos mais complexos a ser definido, pois dependerá tanto de fatores internos da empresa quanto de fatores externos (momento econômico do país, por exemplo). Um dos fatores internos está relacionado com a possibilidade 50 Contabilidade Avançada de a administração utilizar uma taxa média ponderada apurada com base nos seus empréstimos e financiamentos, chamada de taxa do custo médio ponderado do ca- pital ou WACC (Weighted Average Capital Cost), também previsto no CPC 01(R1), item 56. Do lado do fator externo está como item principal o risco-país ou risco soberano (rating junto a agências classificadoras de risco). As questões abordadas no item (e), incerteza e falta de liquidez do mercado, por exemplo, devem ser consideradas como premissas e/ou cenários alinhadas com crises ou modificações relevantes que possam impactar o mercado do ativo em análise. Estimando fluxos de caixa futuros A tarefa de estimar fluxos de caixa futuros não é simples. Muitas vezes, de- pendendo da complexidade das característicasda empresa, é recomendável que o profissional contábil envolva outros profissionais e departamentos para lhe darem o adequado suporte nessa atividade. Para essa estimativa, no mínimo os seguintes pontos devem ser considerados pelo profissional contábil quando da elaboração das projeções de fluxos de caixa, tendo por base os preceitos dos itens 33, 34 e 35 do CPC 01(R1): a. Elaboradas com premissas razoáveis e que representem a melhor estimativa das condições econômicas ao longo da vida útil remanescente do ativo. b. Dar prioridade ao uso de premissas com evidências externas. c. Utilizar como referência os orçamentos financeiros mais recentes aprovados pela administração. d. Excluir qualquer estimativa originada de reestruturações futuras ou da melhoria e do aprimoramento do desempenho do ativo. e. Abranger, como regra geral, o período máximo de cinco anos, a menos que haja justificativa para o uso de um período mais longo. f. As projeções para além do período abrangido pelo orçamento devem ser efetuadas pela extrapolação das projeções baseadas no orçamento, usando uma taxa de crescimento estável ou decrescente para anos subsequentes. g. Uma taxa de crescimento eventualmente utilizada não deve exceder a taxa média de crescimento de longo prazo para produtos, setores de indústria ou país ou países nos quais a entidade opera ou para o mercado no qual o ativo é utilizado. h. A administração deve avaliar a razoabilidade das premissas sobre as quais as atuais projeções de fluxos de caixa se baseiam, examinando as causas das diferenças entre as projeções passadas de fluxos de caixa e os fluxos de caixa atuais observados (CPC, 2010). Os itens (a) e (b) devem ser lidos em conjunto e reforçam a necessidade de o profissional contábil elaborar o fluxo de caixa projetado utilizando premissas razoáveis, obtidas dos melhores dados e das informações disponíveis no mo- O WACC e o risco-país não serão aprofundados neste livro. Porém você pode ler mais a respeito do WACC no artigo Custo médio ponderado do capital: como calcular o WACC?, publicado no site Empreender Dinheiro, e sobre o risco-país no artigo O que é Risco-País, publicado no site Xp investimentos. Disponíveil em: https://em- preenderdinheiro.com.br/blog/ custo-medio-ponderado-do-capital/. Disponíveil em: https://conteudos. xpi.com.br/aprenda-a-investir/ relatorios/o-que-e-risco-pais/. Acesso em: 1 set. 2020. Leitura https://empreenderdinheiro.com.br/blog/custo-medio-ponderado-do-capital/ https://empreenderdinheiro.com.br/blog/custo-medio-ponderado-do-capital/ https://empreenderdinheiro.com.br/blog/custo-medio-ponderado-do-capital/ https://conteudos.xpi.com.br/aprenda-a-investir/relatorios/o-que-e-risco-pais/ https://conteudos.xpi.com.br/aprenda-a-investir/relatorios/o-que-e-risco-pais/ https://conteudos.xpi.com.br/aprenda-a-investir/relatorios/o-que-e-risco-pais/ Redução ao valor recuperável de ativos 51 mento da elaboração, dando preferência para informações de fontes externas à empresa, o que minimiza algum viés tendencioso que pode comprometer o cenário de projeção. As considerações do item (d) são feitas para lembrar uma reestruturação que pode mudar consideravelmente as características do ativo escopo do teste. Por isso essa situação não deve ser contemplada. A recomendação do uso de cinco anos para projeção e montagem do fluxo, conforme indicado na letra (e), decorre das incertezas que podem acontecer em um período superior a esse prazo. A depender dos momentos de volatilidade e mesmo da complexidade que vivemos na sociedade atual, cinco anos podem até mesmo ser considerados um prazo longo. A taxa de crescimento, letra (g), é uma das variáveis mais sensíveis e estra- tégicas no fluxo de caixa, devido ao seu efeito no cálculo do valor presente. Por isso, o profissional contábil deve avaliar essa taxa de desconto até mesmo com o auxílio de profissionais da área financeira da empresa, selecionando a taxa que melhor reflete os fatores que impactam no negócio e no seu mercado. No caso o item (h), Marion e Rios (2020, p. 265) comentam que a construção de premissas que serão utilizadas nos fluxos de caixa futuros deve adotar a seguinte estratégia: Para que as estimativas sejam realizadas com sucesso, faz-se necessário avaliar as premissas atuais e compará-las com premissas utilizadas no passado, verificando os resultados obtidos. Esses dados servirão de base para as projeções atuais e até mesmo para a correção de dados utilizados no passado e que não se concretizaram ou que provocaram distorções na projeção dos fluxos de caixa. Composição das estimativas de fluxos de caixa futuros Segundo o item 39, as estimativas de fluxos de caixa futuros devem incluir: a. Projeções de entradas de caixa advindas do uso contínuo do ativo; b. Projeções de saídas de caixa necessariamente incorridas para gerar as en- tradas de caixa advindas do uso contínuo do ativo (incluindo as saídas de caixa para preparar o ativo para uso) e que podem ser diretamente atribuídas ou alocadas, em base consistente e razoável, ao ativo; e c. Se houver, fluxos de caixa líquidos a serem recebidos (ou pagos) quando da baixa do ativo ao término de sua vida útil. (CPC, 2010, grifos nossos) O item (a) reforça a necessidade de o profissional contábil e da administração da empresa elaborarem o fluxo de caixa considerando a característica do ativo no escopo do teste e, principalmente, o uso contínuo do ativo até a sua venda. Lem- bremos que se há previsão de o ativo ser vendido (ou baixado) dentro do prazo do fluxo de caixa elaborado, o valor da sua venda deve ser contemplado como uma entrada no próprio fluxo de caixa. Os itens (b) e (c) trazem questões técnicas a serem observadas quando da ela- boração do fluxo de caixa. 52 Contabilidade Avançada Segundo o item 50, os fluxos de caixa futuros devem ser estimados para o ativo em suas condições de uso e ope- ração atuais e não devem incluir futuras entradas ou saídas de caixa previstas, para as quais se tenha expectativa por reestruturação futura ou com as quais a entidade ainda não está compromissada com a melhoria do desem- penho do ativo. Os fluxos de caixa futuros também não devem incluir entradas ou saídas de caixa provenientes de atividades de financiamento, recebimento ou pagamento de tributos sobre a renda (CPC, 2010). Importante Ainda, é importante que o profissional contábil considere os seguintes aspectos com relação à taxa de desconto: a. A taxa de desconto deve ser antes dos impostos. b. A taxa de desconto deve refletir as avaliações atuais do mercado sobre o valor do dinheiro no tempo. c. A taxa de desconto deve refletir as avaliações atuais do mercado sobre os riscos específicos do ativo para os quais as estimativas de fluxos de caixa fu- turas não tenham sido ajustadas. (ALMEIDA, 2018, p. 7) A seguir, destacamos exemplos trazidos por Almeida (2018) que correspondem a situações específicas de tratamentos do fluxo de caixa futuro, base para o cálculo do valor em uso, bem como seus comentários detalhados a respeito dos desafios com os quais o profissional contábil pode se deparar quando estiver executando as análises do fluxo de caixa: Exemplo Determinação de valor em uso de ativo em construção A Entidade J, fabricante de pisos para imóveis residenciais e comerciais, está construindo uma nova fábrica na Argentina, que representa uma UGC. Com a re- dução da atividade econômica argentina, ocorreram indícios de deterioração desse ativo em construção. A Entidade J deve incluir os custos restantes associados para completar essa fábrica em suas estimativas de saídas de fluxos de caixa futuros ao avaliar essa UGC para desvalorização? Sim. O item 42 do CPC 01(R1) (CPC, 2010) afirma claramente que “quando o valor contábil de um ativo ainda não inclui todas as saídas de caixa a serem incorri- das antes de estar pronto para uso, as projeções de fluxos de caixa futuros devem incluir uma estimativa de qualquer saída de caixa adicional quese espera incorrer antes que o ativo esteja pronto para uso”. Exemplo Fluxos para melhorar o ativo A Entidade L tem uma UGC que representa máquinas para produção de móveis residenciais, equipamentos esses que precisam ser substituídos a cada dez anos. A Entidade L espera ser capaz de reduzir os custos de fabricação comprando novas máquinas para dobrar a produção dentro de alguns anos, mas ainda não está com- prometida com essa reestruturação. Redução ao valor recuperável de ativos 53 A administração da empresa está em fase de preparação dos fluxos de caixa futuros dessa UGC, para fins de determinação do seu valor em uso. Surgiu, então, a seguinte dúvida: as saídas futuras de caixa referentes às compras de novas máqui- nas devem ser consideradas nos fluxos de caixa, bem como as receitas decorrentes do aumento da produção e venda dos móveis residenciais? Não. Segundo o item 44 do CPC 01(R1) (CPC, 2010), nem os gastos para compras de novas máquinas nem as receitas adicionais, como consequência dessa expan- são, devem ser incluídos nos fluxos de caixa futuros para determinar o valor em uso dessa UGC. Exemplo Custos de juros que serão capitalizados A Entidade M está construindo uma nova fábrica, a qual está sendo financiada em parte com recursos de instituições financeiras. De acordo com o CPC 20 – Cus- tos de Empréstimos, essa fábrica se enquadra como um ativo qualificável para fins de capitalização de juros (os juros são debitados no ativo com custo da fábrica em construção). A administração da Entidade M está em fase de preparação dos fluxos de caixa futuros dessa UGC para fins de determinação do seu valor em uso. Surgiu, então, uma dúvida: as saídas futuras de caixa referentes aos juros do financiamen- to, que serão capitalizados, devem ser consideradas nos fluxos de caixa dessa UGC? Não. O item 50 do CPC 01(R1) (CPC, 2010) proíbe a inclusão das saídas de fi- nanciamento em dinheiro ou de entradas no cálculo do valor em uso, e não prevê qualquer exceção a essa regra. Aplicação de fluxo de caixa futuro estimado Os fluxos de caixa a serem elaborados podem ter modelos diversificados. No CPC 01(R1) (CPC, 2010) é citado de maneira direta que o fluxo de caixa deve con- templar projeções de entradas (receitas) e saídas (custos/despesas) desembolsadas para promover as entradas de caixa. Sempre lembrando que essas movimentações são previstas com base no uso contínuo do ativo no escopo dos testes. Apresentamos, a seguir, o formato de um fluxo de caixa futuro estimado usan- do o formato de uma demonstração do resultado do exercício que, se pensarmos de modo objetivo, é uma ferramenta para medir a geração econômica da empresa e os desembolsos necessários para a manutenção e o funcionamento dos ativos. Esse modelo de fluxo de caixa pode ser empregado, principalmente, se o ativo (ou conjunto de ativos) do escopo dos testes de recuperabilidade é utilizado para ge- ração de um produto ou poucos produtos. Caso a realidade da empresa seja mais complexa, recomendamos que o profissional contábil avalie a elaboração de um fluxo de caixa contemplando as entradas e as saídas geradas pelos ativos. Para isso, um trabalho detalhado de investigação e estudo deve ser realizado para um levantamento adequado dessas informações. 54 Contabilidade Avançada Exemplo Informações básicas sobre os ativos imobilizados testados A empresa Industry opera em um mercado estável, sem a perspectiva de entra- das de novos concorrentes, com uma tecnologia estável e sem muitas inovações que possam causar uma mudança significativa do seu parque fabril ao longo dos anos. Suas vendas são exclusivamente para o mercado nacional. Ela produz e ven- de somente um produto acabado, assim, todos os seus ativos imobilizados produ- tivos são empregados única e exclusivamente para produzir esse produto. O valor total dos ativos imobilizados contabilizados é de R$ 100,00 (data-base 202X-1). Premissas utilizadas no fluxo de caixa projetado: 1. Vendas para o mercado nacional: valor de referência de R$ 100,00 em 202X e inflação projetada para os próximos quatro anos de 5,5%, 7,0%, 6,0% e 9,0%, respectivamente. Muitas vezes o profissional contábil pode buscar informações complementares com a área comercial, com o objetivo de entender as projeções de vendas, e junto à área de engenharia, para conhecer a capacidade produtiva que está sendo utilizada e que a administração planeja atingir. Essas informações ajudarão na construção de uma premissa de referência mais adequada à projeção de vendas. 2. Custo dos produtos vendidos: margem percentual estimativa em 30% das vendas realizadas. 3. Despesas com vendas: estimadas em um percentual de 10% do lucro bruto. 4. Despesas gerais e administrativas: estimadas em um percentual de 8% do lucro bruto. 5. Depreciação: estimada em um valor linear de R$ 10,00 por exercício social. 6. Outras receitas/despesas líquidas: estipuladas despesas em R$ 1,00 (histórico). 7. Imposto de renda/contribuição social: estimadas as alíquotas individuais de IR em 25% e CS em 9%, totalizando 34%. 8. Taxa de desconto (calculada e projetada para os cinco anos): 6,0%. Tabela 1 Representação do fluxo de caixa projetado 202X 202X+1 202X+2 202X+3 202X+4 TOTAL Vendas para o mercado nacional (1) $ 100,00 $ 105,50 $ 112,90 $ 119,70 $ 130,40 (–) Custo dos produtos vendidos (2) $ (30,00) $ (31,70) $ (33,90) $ (35,90) $ (39,10) Lucro bruto $ 70,00 $ 73,90 $ 79,00 $ 83,80 $ 91,30 Despesas/receitas operacionais (–) Vendas (3) $ (7,00) $ (7,40) $ (7,90) $ (8,40) $ (9,10) (–) Gerais e administrativas (4) $ (5,60) $ (5,90) $ (6,30) $ (6,70) $ (7,30) (–) Depreciação (5) $ (10,00) $ (10,00) $ (10,00) $ (10,00) $ (10,00) (+/–) Outras líquidas (6) $ (1,00) $ (1,00) $ (1,00) $ (1,00) $ (1,00) Lucro antes do IR $ 46,40 $ 49,60 $ 53,80 $ 57,70 $ 63,90 (–) IR/CS (7) $ (15,80) $ (16,80) $ (18,30) $ (19,60) $ (21,70) Lucro líquido $ 30,60 $ 32,70 $ 35,50 $ 38,10 $ 42,20 $ 179,10 Taxa de Desconto (8) 6,0% Lucro líquido (a valor presente) $ 149,50 Fonte: Elaborada pelo autor. Redução ao valor recuperável de ativos 55 Você pode calcular o valor presente por meio de uma planilha eletrônica (ex.: MS Excel) utilizando a função VPL (fórmula). Para isso, precisará preencher as informações solicitadas na ordem indicada: 1. Campo taxa: taxa de desconto = 6,0%. 2. Campos valor 1, 2, 3, 4 e 5: se referem aos anos do fluxo de caixa – cinco em nosso exemplo – respectiva- mente e na mesma ordem do fluxo de caixa. Esse mesmo procedimento pode ser realizado na calculadora HP12C por meio da seguinte ordem: 1. Teclas <f> e CLx para limpar a memória da calculadora. 2. Inserir os valores do fluxo de caixa, ano a ano, digitando o valor e posteriormente as teclas <g> e CFj. 3. Inserir a taxa de desconto digitando o valor e apertando tecla <i>. 4. Teclas <f> e NPV para calcular. Dica Resumo do teste: Valor dos ativos imobilizados testados: R$ 100,00 (data-base 202X-1) Valor em uso: R$ 149,50 Diferença (“sobra”): R$ 49,50 Conclusão: Com base no fluxo de caixa projetado, apuramos que o valor em uso do ativo foi de R$ 149,50, ou seja, o seu valor recuperável foi calculado como sendo superior ao valor contábil (que era de R$ 100,0 na data-base do teste). Assim, o teste de re- cuperabilidade demonstrou que o ativo não apresenta perda por desvalorização e, consequentemente, nenhuma provisão de perda deverá ser reconhecida nessa data. Cabe ressaltar que o exemplo descrito é uma demonstração da ferramenta que o profissional contábil tem a seu dispor para apuração do valor em uso do ativo ou conjunto de ativos, parte dos testes de recuperabilidade. 2.3 Desvalorização e sua reversão Vídeo A perda por desvalorização de um ativo deve ser reconhecida no resultado do exercício da empresa apenas se o valor contábil do ativo for superior ao seu valor recuperável, apurado como resultado dos testes de recuperabilidade. Quando constatada a perda por desvalorização, a empresa deve efetuar os tes- tesnecessários (passos discutidos anteriormente) para reduzir o valor contábil do ativo a seu valor recuperável. Importante reforçarmos que a análise da perda por desvalorização deve ser rea- lizada para cada um dos ativos ou conjuntos de ativos (UGC), conforme tratamos na Seção 2.1.3, e será reconhecida no resultado tendo por base a diferença apurada entre o valor contábil do ativo e o valor recuperável calculados. Conforme é ressaltado por Marion e Rios (2020), somente em uma situação a perda apontada não será reconhecida no resultado: se o ativo tiver sido reava- liado. Nesse caso, o reconhecimento da perda se dará por redução do saldo da conta de reavaliação, a qual fica localizada no Patrimônio Líquido das empresas que realizaram a reavaliação de ativos em datas passadas. Com o advento da 56 Contabilidade Avançada Lei n. 11.638/2007, a reavaliação dos ativos foi vetada. Os autores também enfati- zam que “a perda reconhecida no resultado do exercício figurará na demonstração de resultado do exercício; já a perda de um ativo que foi reavaliado deverá figurar na demonstração do resultado abrangente” (MARION; RIOS, 2020, p. 268). Na prática, o profissional contábil deverá ter em seu plano de contas uma conta de natureza credora nos grupos de ativo imobilizado e ativo intangível, que pode ser chamada de Provisão para Perdas Estimadas por Redução ao Valor Recuperável, ou outra denominação que indique a natureza da conta relacionada com o teste de recuperabilidade. Nela serão registrados os montantes das perdas, como ocorre com a depreciação acumulada. Segundo Gelbcke et al. (2018, p. 253), a baixa por perda de valor desses ativos não é dedutível fiscalmente. A seguir, elaboramos um esquema para uma melhor visualização do efeito comparativo do valor contábil e seu valor recuperável do ati- vo sob o escopo do teste de recuperabilidade. Al ex P in/ Shu tterstock Caso 1 – Valor contábil é superior ao valor recuperável O profissional contábil está procedendo com os testes de recuperabilidade so- bre o ativo imobilizado da empresa e levantou as seguintes informações: (a) valor contábil: R$ 100.000,00; (b) valor justo líquido de despesas de venda: R$ 60.000,00; e (c) valor em uso: R$ 80.000,00. Lembrando que o valor recuperável de um ativo ou de uma UGC é o maior valor entre o valor justo líquido de despesa de venda e o valor em uso e que no exemplo o valor contábil é superior ao valor recuperável (no caso de R$ 80.000,00), será ne- cessário reconhecer uma provisão para perda por desvalorização a ser lançada na conta de provisão de perda, sendo esta a diferença entre o valor recuperável e o valor contábil, no montante de R$ 20.000,00. As Figuras 3a e 3b apresentam os cenários do antes e depois da realização do teste de recuperabilidade: Figura 3a Valor contábil do ativo antes do teste de recuperabilidade R$ 100.000 Valor justo líquido de despesas de venda Valor em uso R$ 80.000 Valor recuperávelValor contábil R$ 60.000 Figura 3b Valor contábil do ativo após o teste de recuperabilidade R$ 80.000 Valor justo líquido de despesas de venda Valor em uso R$ 80.000 Valor recuperávelNovo valor contábil R$ 60.000 R$ 100.000 Valor da provisão para perda por desvalorização: R$ 20.000 Fonte: Elaborada com base em CPC, 2010. Redução ao valor recuperável de ativos 57 Portanto, conforme verificamos nas figuras, o profissional contábil irá apurar o montante de perda por desvalorização da seguinte forma: Valor contábil: R$ 100.000,00 Valor recuperável (base do valor em uso): R$ 80.000,00 ( = ) Valor da perda por desvalorização: R$ 20.000,00 Os lançamentos contábeis a serem realizados nesse cenário serão: Tabela 2 Lançamento contábil D Perda por desvalorização de ativo Despesa – Resultado R$ 20.000,00 C Provisão para perdas estimadas por redução ao valor recuperável Conta redutora do ativo imobilizado (R$ 20.000,00) Fonte: Elaborada pelo autor. Al ex P in/ Shu tterstock Caso 2 – Valor contábil é inferior ao valor recuperável Neste caso, não estamos tratando de perda por desvalorização, isto é, o ativo em análise demonstrou que seu valor recuperável acabou sendo maior do que o seu valor contábil registrado. O CPC 01(R1) proíbe que seja reconhecido qualquer tipo de ganho que aumente o valor dos ativos, pois será classificado como uma reavaliação, o que, conforme mencionado, é proibido pela Lei n. 11.638/2007. As Figuras 4a e 4b apresentam os cenários do antes e depois de quando essa situação é verificada: Figura 4a Valor contábil do ativo antes do teste de recuperabilidade Valor justo líquido de despesas de venda Valor em uso R$ 80.000 R$ 70.000 Valor recuperávelValor contábil R$ 60.000 Figura 4b Valor contábil do ativo após o teste de recuperabilidade R$ 80.000 A diferença de R$ 10.000 não pode ser contabilizada Valor justo líquido de despesas de venda Valor em uso R$ 70.000 Valor recuperávelValor contábil R$ 60.000 Fonte: Elaborada pelo autor com base em CPC, 2010. No Caso 2 ilustrado na Figura 4 não devemos reconhecer qualquer montante de “ganho” por valorização do ativo analisado. O teste será encerrado nesse mo- mento sem que haja a necessidade de se efetuar qualquer lançamento contábil, ou seja, será mantido o valor contábil do ativo no valor de R$ 70.000,00. Importante mencionar que o profissional contábil deve arquivar todos os papéis de trabalho 58 Contabilidade Avançada (físicos ou digitais) gerados nos testes realizados para documentar e corroborar a conclusão apurada. Esses documentos poderão ser solicitados no caso de uma auditoria interna e/ ou externa, caso a empresa tenha que submeter suas demonstrações contábeis ao crivo de outros profissionais. O CPC 01(R1) (CPC, 2010, item 7) ainda ressalta um ponto de reflexão comple- mentar que o profissional contábil deve ponderar em suas análises e, a depender da situação em particular do momento e do ambiente em que a empresa está in- serida, discutir com a administração da empresa, que é o impacto da perda de desvalorização sobre a vida útil do ativo: Se houver indicação de que um ativo possa ter sofrido desvalorização, isso pode indicar que a vida útil remanescente, o método de depreciação, amor- tização e exaustão ou o valor residual para o ativo necessitem ser revisados e ajustados em consonância com os Pronunciamentos Técnicos aplicáveis ao ativo, mesmo que nenhuma perda por desvalorização seja reconhecida para o ativo. Portanto, além da execução do teste de recuperabilidade e da interpretação dos seus resultados, o profissional contábil deve ficar atento à possível necessidade de fazer a revisão da vida útil remanescente dos ativos ou, se for o caso, documentar a justificativa do porquê essa revisão não seria aplicável quando for identificada uma provisão de perda. Lembrando que a revisão da vida útil deve ser elaborada por meio de um laudo técnico que, usualmente, é emitido por profissionais que possuem conhecimento da área de engenharia e que devem observar as determi- nações do CPC 27 – Ativo Imobilizado. 2.3.1 Reversão da perda por desvalorização Se por um lado o profissional contábil deve ficar atento à identificação e aos tes- tes de ativos que possam estar desvalorizados e dar o devido tratamento previsto pelo CPC 01 (R1), também deve avaliar periodicamente se as perdas por desvalori- zação reconhecidas em exercícios anteriores podem ser revertidas. Para isso, o profissional contábil seguirá os mesmos procedimentos comenta- dos neste capítulo, mas com a diferença principal de que se a comparação dos testes realizados apontar que o valor contábil do ativo recuperou suas condições de geração de benefício econômico anteriores ao reconhecimento da perda lança- da, esse atende aos requisitos necessários para a reversão da provisão de perda. A depender de fontes e indícios que impactaram a perda por desvalorização no passado, essa reversão pode ser total ou parcial. Alguns exemplos são fornecidospor Gelbcke et al. (2018, p. 256), como “o valor de mercado do ativo aumentou significativamente durante o período; existe evi- dência nas análises internas que indica que o desempenho econômico do ativo é ou será melhor do que o esperado”. Conforme os autores, “esses princípios gerais da reversão da perda por desvalorização são aplicáveis tanto ao ativo individual como à unidade geradora de caixa”. Não é possível reverter a perda por desvalorização da parcela do ágio pago por expectativa de rentabi- lidade futura (goodwill). Apurada e reconhecida no resultado da empresa, é considerada uma perda definitiva. Importante Redução ao valor recuperável de ativos 59 A reversão da perda deve ser reconhecida no resultado do exercício em que seus indícios foram identificados pelo profissional contábil, conforme exemplifica- do na tabela a seguir: Tabela 3 Lançamento contábil de reversão D Provisão para perdas estimadas por redução ao valor recuperável Conta redutora do Ativo Imobilizado R$ 20.000,00 C Perda por desvalorização de ativo Despesa – Resultado (R$ 20.000,00) Fonte: Elaborada pelo autor. Segundo Gelbcke et al. (2013, p. 256): em se tratando de um ativo reavaliado, para as empresas que optaram por manter a reserva de reavaliação até sua completa realização, o valor deve ser creditado diretamente no patrimônio líquido na reserva de reavaliação até seu limite. Se parte da perda por desvalorização de um ativo reavaliado foi reconhecida no resultado, a reversão deve também ser reconhecida no resultado do período. A reversão da provisão de perda por desvalorização não deve exceder o valor contábil do ativo registrado no balanço da empresa, o que, caso ocorresse, seria considerado uma reavaliação proibida por lei. CONSIDERAÇÕES FINAIS Após repassarmos todos os conceitos, procedimentos e detalhes, pudemos identificar que o profissional contábil tem um papel relevante na apuração da existência de ativos que podem estar desvalorizados e seus potenciais impactados na qualidade das informa- ções contábeis preparadas e divulgadas nas demonstrações contábeis da empresa. Também verificamos a importância de o profissional contábil possuir a habilidade integradora e de se comunicar de maneira assertiva com outras áreas da empresa, inclusive com a administração, para deliberar sobre assuntos mais críticos, complexos e com impacto nos resultados da empresa. Portanto, a aplicação do CPC 01(R1) traz grandes desafios ao profissional contábil; em contrapartida, também traz uma grande oportunidade para que ele tenha acesso a todos os níveis da empresa, com objetivo principal de fazer um trabalho diferenciado, de qualidade e que agregue valor ao seu local de trabalho por meio do seu conheci- mento técnico. ATIVIDADES 1. Em sua opinião, qual dos assuntos tratados se mostrou mais desafiador e que poderá requerer maior esforço e preparação do profissional contábil? Fundamente sua resposta. 2. Pudemos observar que o profissional contábil assumiu um nível de protagonismo nas empresas, o que proporciona um grau de exposição junto a vários níveis. Enumere no mínimo quatro habilidades não técnicas (soft skills) necessárias para que esse profissional possa corresponder de maneira satisfatória a essa nova exigência e, ao mesmo tempo, ter oportunidades diferenciadas em sua carreira. 3. Em sua opinião, como o profissional contábil pode organizar sua rotina de procedimentos para atender às demandas listadas pelo CPC 01(R1)? 60 Contabilidade Avançada REFERÊNCIAS ALMEIDA, M. C. Contabilidade intermediária em IFRS e CPC. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2018. BRASIL. Lei n. 11.638, de 28 de dezembro de 2007. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 28 dez. 2007. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11638.htm. Acesso em: 1 set. 2020. CPC. CPC 01(R1) – Redução ao Valor Recuperável de Ativos. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 7 out. 2010. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/ Pronunciamento?Id=2. Acesso em: 1 set. 2020. CPC. CPC 46 – Mensuração do Valor Justo. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 20 dez. 2012. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=78. Acesso em: 1 set. 2020. GELBCKE, E. R. et al. Manual de contabilidade societária: aplicável a todas as sociedades, de acordo com as Normas Internacionais e o CPC. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2018. MARION, J. C.; RIOS, R. P. Contabilidade Avançada. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2020. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11638.htm http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=2 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=2 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=78 Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes 61 3 Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes Dentre as várias rotinas dos profissionais contábeis, encontramos as in- certezas decorrentes de eventos originados das atividades operacionais das empresas. Esses eventos tanto podem derivar de decisões internas, tomadas diretamente pelas administrações, quanto por fatores externos, ou seja, fora do controle desses mesmos gestores. Por esse motivo, faz parte da respon- sabilidade do profissional contábil desenvolver estimativas contábeis e julga- mentos que lhe socorrerão nesses momentos de incertezas, capturando tais transações e alinhando-as aos respectivos preceitos contábeis. Encontramos a declaração desse propósito no CPC 25 (2009c): “o uso de estimativas é uma parte essencial da elaboração de demonstrações contábeis e não prejudica a sua confiabilidade”. Além da própria subjetividade qualitativa e quantitativa encontrada nas definições dessas estimativas, deve haver a preocupação com o uso adequa- do dos conceitos: provisões, passivo e ativo contingentes, cada um com suas peculiaridades. Conforme verificaremos, o entendimento desses conceitos se assemelha muitas vezes ao grau de interpretação adotado na ciência jurídica, demostrando a relevância da qualificação técnica do profissional contábil para atender a essas demandas. Assim, neste capítulo trataremos de tópicos sele- cionados sobre tais temas, com base principalmente no CPC 25 – Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes, que está correlacionado à Norma Internacional de Contabilidade, IAS 37 - Provisions, Contingent Liabilities and Contingent Assets. De modo geral, abordaremos neste capítulo as diferenças existentes entre as provisões, os passivos e os ativos contingentes; as diferenças entre as contas a pagar e as provisões accruals; o reconhecimento contábil; mensuração de riscos e incertezas; contrato oneroso e reestruturação. Boa leitura! 62 Contabilidade Avançada 3.1 Principais conceitos e critérios de reconhecimento Vídeo O CPC 25 traz conceitos técnicos e exemplos da aplicação prática dos temas relacionados às provisões, aos passivos e aos ativos contingentes. Em geral, o pro- fissional contábil deve conhecer a técnica contábil desses temas, mas não somente isso. Para empregá-los de maneira adequada ele precisa ir além: entender a em- presa e os controles internos existentes, que dão suporte às estimativas contábeis, para que possa estabelecer julgamentos relevantes, prudentes e baseados nas me- lhores informações disponíveis no momento da preparação das demonstrações contábeis. Ao entender o contexto da sua natureza, as circunstâncias e o momento da empresa, o profissional contábil poderá verificar transações, condições e outros eventos que fundamentem os elementos da constituição dessas estimativas. Va- mos detalhar melhor esses assuntos ao longo deste capítulo. 3.1.1 Alcance Primeiramente, vamos tratar do alcance do CPC 25 (2009c), o qual está descrito nos itens 1 a 9. Destacamos os itens 1, 2 e 9: 1. Este pronunciamento deve ser usado por todas as entidadesna contabiliza- ção de provisões, e de passivos e ativos contingentes, exceto: (a) os que resultem de contratos a executar, a menos que o contrato seja oneroso; e (b) os cobertos por outro pronunciamento. 2. Este pronunciamento não se aplica a instrumentos financeiros (incluindo garantias) que se encontrem dentro do alcance do CPC 48 – Instrumentos Financeiros. 9. Este Pronunciamento Técnico aplica-se a provisões para reestruturações (incluindo unidades operacionais descontinuadas). Quando uma reestrutura- ção atende à definição de unidade operacional descontinuada, o Pronuncia- mento Técnico CPC 31 – Ativo Não Circulante Mantido para Venda e Operação Descontinuada pode exigir divulgação adicional. (CPC, 2009c, itens 1, 2 e 9) No item 1(a) verificamos a orientação específica de que o CPC não deve ser utilizado no caso de a empresa possuir “contratos a executar” (esse conceito será tratado na próxima seção). Os itens 1(b), 2 e 9 excluem do escopo do CPC 25 determinadas transações, as quais suas estimativas já são abarcadas em outros CPC de forma específica – caso dos instrumentos financeiros enquadrados no CPC 48 – Instrumentos Financeiros, e dos reflexos de operações descontinuadas, escopo do CPC 31 – Ativo não Circu- lante Mantido para Venda e Operações Descontinuadas. 3.1.2 Conceitos Os conceitos mais relevantes tratados neste capítulo estão indicados nos itens 10, 16 e 17 do CPC 25 (2009c) e são apresentados a seguir. Você irá verificar que os conceitos estão organizados com base na correlação existente entre eles, a fim de facilitar a construção do conhecimento ao longo do seu estudo. Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes 63 Provisão: passivo de prazo ou de valor incertos. São obrigações presentes e é provável que uma saída de recursos que incorpora benefícios econômicos seja necessária para liquidar essa obrigação. Passivo: obrigação presente da entidade, derivada de eventos já ocorridos, cuja liquidação se espera que resulte em saída de recursos da entidade capazes de ge- rar benefícios econômicos. Obrigação presente: evento passado que dá origem a uma obrigação presente se, levando em consideração toda a evidência disponível, for mais provável que exista uma obrigação presente na data do balanço do que se não exista. Evento passado: evento ocorrido anteriormente que conduz e cria uma obriga- ção presente. Para ser classificado como um evento que cria obrigação, é necessá- rio que a empresa não tenha qualquer alternativa realista, se não, a de liquidar a obrigação criada pelo evento. Esse caso ocorre somente: a. quando a liquidação da obrigação pode ser imposta legalmente; ou b. de obrigação não formalizada, quando o evento (que pode ser uma ação da entidade) cria expectativas válidas, em terceiros, de que a entidade cumprirá a obrigação. Evento que cria obrigação: evento que cria uma obrigação legal ou não forma- lizada que faça com que a entidade não tenha nenhuma alternativa realista, se não, liquidar essa obrigação. Obrigação legal: obrigação que deriva de: a. contrato (por meio de termos explícitos ou implícitos); b. legislação; ou c. outra ação da lei. Obrigação não formalizada: obrigação que decorre das ações da entidade em que: a. por via de padrão estabelecido de práticas passadas (costume, tradição ou práticas recorrentes da empresa), de políticas publicadas ou de declaração atual suficientemente específica, a entidade tenha indicado a outras partes que aceitará certas responsabilidades; e b. em consequência, a entidade cria uma expectativa válida nessas outras partes de que cumprirá com essas responsabilidades. Passivo contingente: trata-se de: a. uma obrigação possível que resulta de eventos passados, cuja existência será confirmada apenas pela ocorrência, ou não, de um ou mais eventos futuros incertos não totalmente sob controle da entidade; ou b. uma obrigação presente que resulta de eventos passados, mas que não é reconhecida porque: I. não é provável que uma saída de recursos que incorporam benefícios econômicos seja exigida para liquidar a obrigação; ou II. o valor da obrigação não pode ser mensurado com suficiente confiabi- lidade. 64 Contabilidade Avançada Ativo contingente: ativo possível que resulta de eventos passados cuja existên- cia será confirmada apenas pela ocorrência, ou não, de um ou mais eventos futuros incertos não totalmente sob o controle da entidade. Contrato oneroso: contrato em que os custos inevitáveis para satisfazer as obrigações do contrato excedem os benefícios econômicos que se esperam que sejam recebidos ao longo do mesmo contrato. Reestruturação: programa planejado e controlado pela administração que al- tera materialmente: a. o âmbito de um negócio empreendido por entidade; ou b. a maneira como o negócio é conduzido. Contratos a executar: contratos pelos quais nenhuma parte cumpriu qualquer das suas obrigações ou ambas as partes tenham parcialmente cumprido as suas obrigações em igual extensão. Provisões derivadas de apropriações por competência: conhecidas também como accruals “são obrigações já existentes, registradas no período de competên- cia, em que não existe grau de incerteza relevante” (GELBCKE et al., 2018, p. 367). 3.1.3 Diferenças entre provisões e outros passivos É importante que façamos uma distinção entre o conceito de provisão (um pas- sivo de prazo ou de valor incertos) em relação a outros passivos, como contas pa- gar e provisões accruals, pois é comum a confusão ao usar esses conceitos, os quais são usados sem distinção tanto pelos profissionais contábeis quanto por outros profissionais quando discutem esse assunto. Gelbcke et al. (2018, p. 367, grifos nossos) chamam nossa atenção sobre o uso inadequado do termo provisão na prática contábil brasileira: vale ressaltar que o termo provisão foi amplamente utilizado pelos contado- res como referência a qualquer obrigação ou redução do valor de um ativo (por exemplo, depreciação acumulada e desvalorização de ativos), no qual sua mensuração decorra de alguma estimativa. Entretanto, o termo provisão, como já estava tratado na Deliberação nº 489/05, e conforme a preferência do IASB, refere-se apenas aos passivos com prazo ou valor incertos. Basicamente, podemos destacar que as diferenças existentes entre provisão, contas a pagar e provisão accrual estão no fato da incerteza sobre o prazo de paga- mento ou o valor do desembolso futuro para a sua liquidação. Portanto, podemos resumi-los da seguinte maneira: • Contas a pagar Passivos a pagar decorrentes de obrigações contraídas pela empresa para aqui- sição de bens/serviços fornecidos ou recebidos e contratados junto a fornecedores (faturados ou já acordados). No momento em que há um documento faturado (ou emitido), entendemos que foram definidos: a data de vencimento para pagamento da obrigação e o valor a ser pago no futuro. Com isso, os dois critérios de um pas- sivo a pagar são atendidos, distinguindo-o de uma provisão. Exemplos: contas de Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes 65 energia elétrica, água, telefone, aluguéis, aquisição de imobilizado junto a fornece- dores, contratação de serviços no geral, entre outros. • Provisões accruals Provisões decorrentes de apropriações por competência (accruals) de passivos a pagar, mas que não tenham sido pagos, faturados ou formalmente acordados com o fornecedor, incluindo valores devidos a empregados. Como o termo provisão accruals ainda pode trazer certa confusão em relação às provisões propriamente ditas, trazemos os comentários de Gelbcke et al. (2018, p. 367-368, grifos nossos) para reforçar as principais características das provisões accruals, com alguns exemplos do dia a dia do profissional contábil, ajudando em uma clara separação e aplicação dos conceitos. Estas são caracterizadas como obrigações já existentes, registradas no perío- do de competência, em que não existe grau de incerteza relevante. Assim, pode-se dizer que já se caracterizamcomo passivos genuínos e não devem ser reconhecidos como “provisões”. São exemplos desses passivos: férias e 13º salários devidos aos funcionários, bem como os respectivos encargos sociais, os dividendos mínimos obrigatórios propostos, as gratificações e participações devidas aos empregados e administradores, as participações de partes benefi- ciárias e outros. Esses devem ser contabilizados como “férias a pagar”, “décimo terceiro a pagar”, “encargos sociais a pagar”, “dividendos a pagar” etc. Sobre o tratamento contábil a ser considerado pelo profissional, é importante aplicar a seguinte segregação e divulgação entre as provisões accruals e contas a pagar destaca-se no item 11: “os passivos derivados de apropriação por compe- tência (accruals) são frequentemente divulgados como parte das contas a pagar, enquanto as provisões são divulgadas separadamente (CPC, 2009c)”. 3.1.4 Diferenças entre provisões e passivos contingentes Como já diferenciamos as provisões de outros passivos, em especial os contas a pagar, vamos abordar as diferenças entre as provisões e os passivos contingentes, que também são termos muito próximos e que constantemente geram confusões em seu emprego e interpretação. Com base nos conceitos estudados, podemos verificar que todas as provisões constituídas pela empresa apresentam uma característica “contingente”, pois são incertas quanto a seu prazo ou valor. Porém é exatamente nesse ponto que o CPC 25, item 25, faz um esclarecimento que deve ser observado atentamente: “o termo ‘contingente’ é usado para passi- vos e ativos que não sejam reconhecidos porque a sua existência somente será confirmada pela ocorrência ou não de um ou mais eventos futuros incertos não totalmente sob o controle da entidade” (CPC, 2009c, grifos nossos). Enquanto as provisões são reconhecidas como passivo, pois podem ser esti- madas de forma confiável – são obrigações presentes e é provável que ocorra a saída de recursos –, os passivos contingentes não são reconhecidos como passivo porque são, segundo o item 13 do CPC 25 (2009c, grifos nossos): Lembre-se que todas as provisões, assim que forem mensuradas, devem ser reconhecidas, ou seja, registradas na contabilidade. Por isso, é fundamental que o profissional contábil possa distinguir as situações em que haverá uma provisão, um contas a pagar, uma provisão accrual ou um passivo contingente, assim como seus reflexos contábeis. Importante Os principais pontos de destaque na análise de um passivo e um ativo contingentes estão na incerteza da ocorrência de um evento futuro e que o evento não está sob o controle da empresa. Importante 66 Contabilidade Avançada (i) obrigações possíveis, visto que ainda há de ser confirmado se a entida- de tem ou não uma obrigação presente que possa conduzir a uma saída de recursos que incorporam benefícios econômicos, ou (ii) obrigações presentes que não satisfazem os critérios de reconhecimento deste Pronunciamento Técnico (porque não é provável que seja necessá- ria uma saída de recursos que incorporem benefícios econômicos para liquidar a obrigação, ou não pode ser feita uma estimativa suficientemente confiável do valor da obrigação). É possível notar nos itens (i) e (ii) o caráter de incerteza que existe na situação, isto é, o profissional contábil não consegue confirmar, de maneira clara e objetiva, nem está sob o controle da empresa, que o evento passado gerou uma obrigação presente e, com isso, pode não ser provável que ocorra a saída de recursos para liquidar a obrigação. Concluindo, o termo passivo contingente é usado para passivos que não satisfa- çam os critérios de reconhecimento e, portanto, a empresa não deve reconhecer na contabilidade um passivo contingente. 3.1.5 Reconhecimento As regras e condicionantes empregados no reconhecimento (ou não) das provi- sões, passivos e ativos contingentes precisam ser analisados de maneira detalhada, conforme cada natureza mencionada no CPC 25. Todos esses conceitos relacionados à obrigação presente, obrigação legal e re- conhecimento podem gerar confusão ao profissional contábil, sobre o registro dos passivos apresentados nas demonstrações contábeis, em função do lapso tempo- ral: passado, presente ou futuro. Por isso, o item 18 do CPC 25 pontua de modo claro o seguinte esclarecimento: as demonstrações contábeis tratam da posição financeira da entidade no fim do seu período de divulgação e não da sua possível posição no futuro. Por isso, nenhuma provisão é reconhecida para despesas que necessitam ser incorridas para operar no futuro. Os únicos passivos reconhecidos no ba- lanço da entidade são os que já existem na data do balanço. (CPC, 2009c, grifos nossos). Assim, com base na explicação do CPC 25, provisões para perdas operacionais futuras não devem ser reconhecidas, pois não satisfazem as definições de passivo e nem os critérios necessários para uma provisão. O CPC 25, item 65, indica que nessa situação a análise operacional deve ser procedida com ênfase em testes de recuperabilidade do ativo, com base no CPC 01 – Redução ao Valor Recuperável de Ativos, utilizando as técnicas com fluxo de caixa. 3.1.5.1 Provisões Uma provisão deve ser reconhecida quando todas as condições listadas no CPC 25, item 14, forem atendidas. Se essas condições não forem satisfeitas, a provisão não deve ser reconhecida. O profissional contábil precisa reacessar e reavaliar as provisões, passivos e ativos contingentes, ao menos, na data-base de prepara- ção das demonstrações contábeis para sua divulgação. Portanto, será nessa data que essas reflexões e análises acabarão sendo tratadas. Importante Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes 67 (a) a entidade tem uma obrigação presente (legal ou não formalizada) como resultado de evento passado; (b) seja provável que será necessária uma saída de recursos que incorpo- ram benefícios econômicos para liquidar a obrigação; e (c) possa ser feita uma estimativa confiável do valor da obrigação. (CPC, 2009c, grifos nossos). O profissional contábil deve confirmar se os três itens foram satisfeitos em con- junto. No item (a), a empresa deve confirmar com evidências documentais dispo- níveis (contratuais ou não) que há uma obrigação presente, podendo incluir, até mesmo, a opinião de peritos ou fazer evidências obtidas por eventos ocorridos após a data do balanço. No item (b) é provável (ou praticamente certo) a necessida- de do pagamento, também obtida por meio dos documentos disponíveis. Por fim, no item (c), a estimativa confiável do valor dessa obrigação também pode incluir a opinião de peritos ou mesmo evidências obtidas por eventos ocorridos após a data do balanço. Todavia essa estimativa considera fatores de riscos e incertezas na sua mensuração. Os riscos estão associados aos inúmeros cenários que podem ocorrer para a finalização da obrigação. Esses aspectos serão detalhados a seguir na Seção 3.2. O Apêndice A do CPC 25 resume os principais requerimentos e reflexos do reco- nhecimento e da divulgação de uma provisão (bem como dos passivos contingen- tes, por eliminação) em formato de um quadro, apresentado aqui como Quadro 1. Quadro 1 Reconhecimento e divulgação de uma provisão ou passivo contingente São caracterizados em situações nas quais, como resultado de eventos passados, pode haver uma saí- da de recursos envolvendo benefícios econômicos futuros na liquidação de: (a) obrigação presente; ou (b) obrigação possível cuja existência será confirmada apenas pela ocorrência ou não de um ou mais eventos futuros incertos não totalmente sob controle da entidade. Obrigação Há obrigação presente que provavelmente requer uma saída de recursos. Há obrigação possível ou obrigação presente que pode requerer, mas pro- vavelmente não irá, uma saída de recursos. Há obrigação possível ou obrigação presente cuja probabilidade de uma saí- da de recursos é remota. Reconhecimento A provisão é reconhecida (CPC 25, item 14). Nenhuma provisãoé reco- nhecida (CPC 25, item 27). Nenhuma provisão é reco- nhecida (CPC 25, item 27). Divulgação (nas demonstrações contábeis) Divulgação em nota explicativa é exigida para a provisão (CPC 25, itens 84 e 85). Divulgação em nota explicativa é exigida para o passivo contingente (CPC 25, item 86). Nenhuma divulgação é exigida (CPC 25, item 86). Tratamento contábil Provisão Passivo contingente (deve ser monitorado). Passivo contingente (deve ser monitorado). Probabilidade de ocorrência Provável Possível Remota Fonte: Adaptado de CPC, 2009c. O profissional contábil deve ficar atento às atividades operacionais da sua empresa que podem não gerar imediatamente uma obrigação e, consequentemente, uma provisão. Esse cenário, porém, pode mudar por fatores internos ou externos em uma data poste- rior. Um exemplo de fator externo ocorre por força de alterações na lei: o que não era considerado um dano ambiental passa a ser assim classificado e é exigido da empresa uma retificação desse dano ou quando a entidade publicamente aceita sua responsabilidade pela retificação de modo a criar uma obrigação não formalizada. Atenção 68 Contabilidade Avançada Seguem algumas análises de provisões, com comentários e fragmentos de prá- ticas contábeis, extraídas de demonstrações contábeis reais, publicadas por em- presas listadas em bolsa de valores, as quais trataremos em detalhes ainda neste capítulo. a. Provisão para garantias de produtos, mercadorias e serviços: essas provisões são encontradas em segmentos como o automobilístico, bens de consumo, prestação de serviços, entre outros. Demonstrações contábeis da WEG S.A., de 31/12/2019, Nota explicativa 2 – Base de Preparação e Principais Políticas Contábeis: 2.13 Provisão para garantias “Provisão para garantias é reconhecida quando os produtos ou serviços a que se referem são vendidos, com base em dados históricos e períodos de garantia” (WEG, 2019, p.20). Análises Normalmente, o profissional contábil irá constituir essa estimativa utilizando, no mínimo, as seguintes premissas para o período em análise: (a) quantidade de itens vendidos; (b) registro histórico de eventos em que a garantia dos produtos foi acionada por clientes e/ou consumidores; (c) definição de um percentual do acionamento da garantia. Além de trabalhar na definição dos va- lores a constituir da provisão, o profissional contábil também deve efetuar o controle da baixa pelo uso efetivo da provisão e ajuste pelo decurso do tempo, isto é, pedidos de garantia formalmente requeridos pelos clientes e/ou consumidores e a prescrição dessa obrigação pelo tempo transcorrido. Esse conjunto de ações irá compor as movimentações da nota explicativa das provisões para garantia, atendendo o que é requerido pelo CPC 25, item 84. Análise de Caso b. Provisão para riscos fiscais, trabalhistas e cíveis: processos judiciais que estão sendo discutidos pela empresa e seus consultores jurídicos, ou pelas empresas em seu segmento de atuação, e que não há consenso judicial; aguarda decisão de tribunais e/ou não há jurisprudência formada a respeito. Demonstrações contábeis da Cogna Educação S.A. e Controladas (anteriormente Kroton Educacional S.A.), de 31/12/2019, Nota explicativa 2 – Principais Práticas Contábeis: 2.15. Provisão para perdas tributárias, trabalhistas e cíveis: “As provisões para perdas relacionadas a processos judiciais e administrativos trabalhistas, tributários e cíveis são reconhecidas quando: (i) o Grupo tem uma obrigação presente, legal ou não formalizada, como resultado de eventos passados; (ii) é provável que uma saída de recursos seja necessária para liquidar a obrigação; e (iii) uma estimativa confiável do valor possa ser feita. As provisões são mensuradas pelo valor presente dos gastos que devem ser necessários para liquidar a obrigação, usando uma taxa antes do imposto, a qual reflete as avaliações atuais do mercado do valor temporal do dinheiro e dos riscos específicos da obrigação. O aumento da obrigação em decorrência da passagem do tempo é reconhecido como despesa financeira.” (COGNA EDUCAÇÃO, 2019, p. 28). Análises É possível verificar a preocupação na divulgação dos preceitos obrigatórios que o CPC 25 requer para que uma provisão seja reconhecida. Apesar de não ser mencionada em nota explicativa, as provisões que envolvem assuntos processuais contam com o apoio de especialistas jurídicos contratados pela empresa para defesa dos seus interesses. Por isso, nessas situações, o profissional contábil trabalhará em conjunto com os advogados, que lhe fornecerão informações jurídicas que serão “convertidas” em infor- mações contábeis para divulgação. Mas atenção: o profissional contábil deve trabalhar em conjunto e não simplesmente “dele- gar” essa responsabilidade aos advogados. Isso significa que o profissional contábil receberá os relatórios de acompanhamento dos processos judiciais, analisará as movimentações de valores, novos processos e classificações de perda (provável, possível ou remota). Sempre que estiver em dúvida, o profissional contábil deve contatar o advogado e esclarecê-la. Lembre-se que no final de todo o processo de reunião de informações contábeis, a responsabilidade pela elaboração das demonstrações contábeis é do profissional contábil e ele deve se certificar que essas informações refletem a melhor estimativa no período em análise. Análise de Caso c. Provisão para reestruturação (podendo contemplar à descontinuidade de operações): será reconhecida quando atender aos critérios definidos para uma Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes 69 provisão e quando for planejada e controlada pela administração, incluindo seu anúncio público. Demonstrações contábeis da AMBEV S.A., de 31/12/2019, Nota explicativa 3 – Sumário das Principais Políticas Contábeis: “(o) Provisões [...] Reestruturação Uma provisão para reestruturação é reconhecida quando a Companhia possui um plano detalhado e aprovado de reestruturação e quando a reestruturação já foi iniciada ou anunciada. Gastos relacionados às atividades normais e à conduta futura da Compa- nhia não são provisionados, mas reconhecidos quando incorrida uma despesa. A provisão inclui os compromissos relacionados aos benefícios que serão pagos pela Companhia aos funcionários desligados na reestruturação” (AMBEV, 2019, p. 51). Análises Novamente é possível verificar a preocupação na divulgação dos preceitos obrigatórios que o CPC 25 requer quando uma provisão de reestruturação deve ser reconhecida, principalmente quanto ao (a) plano formal detalhado e (b) a expectativa gerada por meio do anúncio do plano de reestruturação. Esses dois fatores obrigatórios para o surgimento de uma provisão para reestrutu- ração, segundo o item 72, são divulgados de forma clara pela administração e, por isso, foram registrados na contabilidade da Companhia na data-base das suas demonstrações contábeis. Análise de Caso d. Provisão para danos ambientais causados pela entidade: situação em que a operação da empresa pode gerar danos que precisarão ser reparados no futuro. Demonstrações contábeis da Vale S.A., de 31/12/2019, Nota explicativa 3. Rompimento da barragem de Brumadinho: “a) Descaracterização das barragens (a.i) Barragens da Companhia [...] Os planos atualizados indicam que para algumas dessas barragens “a montante”, a Companhia terá primeiramente que reforçar à jusante os maciços dessas estruturas, para então concluir a descaracterização, de acordo com as condições geotécnicas e geográficas de cada uma delas. Também foi considerada a necessidade de construção de contenções adicionais para algumas estruturas, de acordo com seu nível de segurança. Como consequência dessa decisão e seguindo os novos padrões estabelecidos pela ANM, a Companhia avaliou suas estruturas de barragem e registrou uma provisão referente à descaracterização das estruturas a montante, certas estruturas denominadas “centro de linha” e diques de contenção, que foramidentificadas até o momento. A Vale elaborou projetos de engenharia para estas estruturas e os custos totais esperados para realizar todos os projetos de descaracterização resultaram em uma provisão de R$10.274, reconhecida na demonstração do resultado. [...] A mensuração dos custos e o reconhecimento da referida provisão levam em consideração diversas premissas e estimativas que dependem de fatores, alguns dos quais não estão sob o controle da Companhia. As principais estimativas e premissas críticas aplicadas consideram, dentre outros: (i) o volume de rejeitos a ser removido que foi baseado nas informações históricas dispo- níveis e na interpretação das leis e regulamentos em vigor; (ii) a disponibilidade de locais para o depósito dos rejeitos; (iii) a aprovação dos métodos e soluções de engenharia apresentados para as autoridades competentes; e (iv) atualização na taxa de desconto. Portanto, mudanças nas premissas e estimativas relevantes poderão resultar em alteração significativa no montante provisionado em 31 de dezembro de 2019” (VALE, 2019, p. 21-22). Análises Os trágicos eventos ocorridos nas cidades de Mariana/MG e Brumadinho/MG levaram a alterações nos critérios técnicos estabe- lecidos pela Agência Nacional de Mineração (ANM) para segurança de barragens, provocando a necessidade da Vale descarac- terizar e descontinuar as estruturas construídas pelos métodos de alteamento a montante (fatores externos, que não estão sob o controle da empresa). A administração da Companhia efetuou estudos técnicos, com uso de especialistas, e apurou um valor aproximado de R$ 10 bilhões reconhecido em suas provisões e demonstrações contábeis para descontinuar as barragens com essas estruturas, danos ambientais causados ao meio ambiente e outros esforços de remanejamento de rejeitos, para atendimen- to da nova legislação. Com isso, é possível verificar os níveis de complexidade e magnitude que determinadas provisões podem atingir e impactar as demonstrações contábeis das empresas. Barragem a montante: É construída com o uso de rejeito por meio de alteamentos sucessivos sobre o próprio rejeito depositado. Os alteamentos são realizados no sentido contrário ao fluxo de água (montante) - de fora para dentro da barragem. Barragem a Jusante (convencional): É construída em solo compactado, independentemente do tipo de rejeito nela depositado. Os altea- mentos são realizados no sentido do fluxo de água (jusante) - de dentro para fora da barragem. Glossário Análise de Caso 70 Contabilidade Avançada e. Provisão para compensações ou penalidades por quebra de contratos (contratos onerosos): um contrato oneroso é um contrato em que os custos inevitáveis para satisfazer as obrigações do contrato excedem os benefícios econômicos que se espera que sejam recebidos ao longo do mesmo contrato, são os custos inevitáveis para satisfazer as obrigações do contrato quando excedem os benefícios econômicos que se espera que sejam recebidos ao longo do mesmo contrato Demonstrações contábeis da Vale S.A., de 31/12/2019, Nota explicativa 20. Redução ao valor recuperável de ativos (Impair- ment) e contratos onerosos: “b) Contratos onerosos Em 2019, a Companhia revisou sua expectativa do volume de produção e vendas de minério de ferro do sistema Centro-Oeste. Como consequência do plano revisado para os próximos anos, a Companhia reconheceu uma provisão adicional de R$987 (2018: R$1.527) em relação aos custos de alguns contratos de longo prazo para transporte fluvial e serviço portuário, que possuem volume mínimo garantido” (VALE, 2019, p. 54). Análises A companhia reavaliou seus contratos onerosos e apontou a necessidade de complementar sua provisão em R$ 987 milhões para atedimento de custos específicos de contratos de transporte. Portanto, esse fato, com impacto significativo nas demons- trações contábeis da Companhia, reforça a necessidade de o profissional contábil estar atento na reavaliação periódica das provisões e dos eventos que as fundamentam. Análise de Caso O lançamento contábil para registro de uma provisão será: • D – Despesa com provisão [nome da provisão constituída] (Resultado); • C – Provisão [nome da provisão constituída] (Passivo, circulante e/ou não circulante). 3.1.5.2 Passivos contingentes Conforme explicado e diferenciado anteriormente, a empresa não deve reco- nhecer um passivo contingente, pois se caracteriza por uma saída possível, mas não provável de recursos financeiros. Porém engana-se quem pensa que mesmo possuindo somente passivos con- tingentes a empresa (e principalmente o profissional contábil) não tem trabalho a ser executado. Conforme mencionado anteriormente, é fundamental o monitoramento periódico desses eventos, ou seja, os passivos contingentes precisam ser ava- liados periodicamente pelo profissional contábil para determinar se uma saída de recursos que incorporam benefícios econômicos, que antes era possível, se tornou provável. Caso modificações sejam observadas, uma provisão deve ser reconhecida nas demonstrações contábeis considerando o período no qual essa modificação foi identificada, devido à mudança na probabilidade de ocorrência da estimativa. O Quadro 1 explica em detalhes os aspectos de reconhecimento, divulgação e classificação que devem ser observados, com distinções claras entre provisões e passivos contingentes quando as reavaliações apontarem a necessi- dade de adequação desses eventos. O que é um ativo? “É um recurso econômico presente controlado pela entidade como resultado de eventos passados” (CPC, 2019). O que significa um recurso econômico? “É um direito que tem o potencial de produzir benefícios econômicos” (CPC, 2019). Lembre-se Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes 71 3.1.5.3 Ativos contingentes Quando você ouvir falar de ativo contingente, tenha certa cautela, pois a sua denominação como ativo pode lhe induzir ao erro. É exatamente no “controle da entidade dos recursos econômicos” que o ativo contingente difere de um ativo “comum”. A empresa não deve reconhecer um ativo contingente! Conforme Gelbcke et al. (2018, p. 368) destacam “os ativos contingentes surgem da possibilidade de en- trada de benefícios econômicos para entidade de eventos não esperados ou não planejados”. Esses ativos não são reconhecidos nas demonstrações contábeis até que a rea- lização desse ganho seja praticamente certa, o que deixa de caracterizá-lo como contingente. Esse cuidado existe, pois pode tratar-se de um resultado que nunca venha a ser realizado. Por isso, a falta de controle pela empresa e a incerteza pela possibilidade de entrada de recursos financeiros, características do ativo contin- gente, o desqualificam como um ativo que deve ser registrado e apresentado nas demonstrações contábeis da empresa. Assim como foi mencionado para os passivos contingentes, os ativos contingen- tes precisam ser avaliados periodicamente, pois também podem apresentar mo- vimentações em seus eventos ao longo do tempo. Caso haja uma modificação ao ponto de o profissional contábil identificar que é praticamente certo que ocorrerá a entrada de benefícios econômicos, esse ativo contingente passará a ser um ativo e, por isso, deverá ser registrado nos livros contábeis da empresa e divulgado em suas demonstrações contábeis, observando o período em que ocorrer a mudança dessa estimativa. O Quadro 2 apresenta um resumo em relação ao reconhecimento, tratamento e divulgação do ativo contingente, com base do Apêndice A do CPC 25 (2009c). Quadro 2 Reconhecimento e divulgação de um ativo contingente São caracterizados em situações nas quais, como resultado de eventos passados, há um ativo possível cuja existência será confirmada apenas pela ocorrência ou não de um ou mais eventos futuros incertos não totalmente sob controle da entidade. Obrigação A entrada de benefícios econômicos é praticamen- te certa. A entrada de benefícios eco- nômicos é provável, mas não praticamente certa. Aentrada não é provável. Reconhecimento O ativo não é contingente (CPC 25, item 33). Nenhum ativo é reconhecido (CPC 25, item 31). Nenhum ativo é reconheci- do (CPC 25, item 31). Divulgação (nas de- monstrações contábeis) Será registrado e divul- gado nas demonstrações contábeis como um ativo “comum”, conforme CPC 00, item 4.3. Divulgação é exigida (CPC 25, item 89). Nenhuma divulgação é exigida (CPC 25, item 89). Tratamento Contábil Ativo “comum”, CPC 00, item 4.3. Ativo contingente (deve ser monitorado) Ativo contingente (deve ser monitorado) Probabilidade de Ocorrência Praticamente certa Provável Possível ou remota Fonte: Adaptado de CPC, 2009c. 72 Contabilidade Avançada Para concluirmos o assunto de reconhecimento das provisões, passivos e ativos contingentes, reproduzimos a Árvore de Decisão, apresentada no CPC 25, Apêndi- ce B, ilustração relevante que auxiliará o profissional contábil na aplicação prática dos conceitos e situações descritas até o momento, com a finalidade de preparar demonstrações contábeis completas, com qualidade e que sejam fidedignas a po- sição das estimativas na respectiva data-base de apresentação. Figura 1 Árvore de Decisão Início Saída possível? Remota? Obrigação Possível? Estimativa confiável? RECONHECER DIVULGAR O PASSIVO CONTINGENTE NADA A FAZER Obrigação presente como resultado de evento que gera obrigação? Conceito da Probabili- dade Possível Conceito da Probabili- dade Remota Conceito da Probabili- dade Provável NÃO SIM SIM SIM SIM SIM NÃO NÃO NÃO NÃO Fonte: CPC, 2009c. O uso dessa Árvore de Decisão permitirá ao profissional contábil concluir de maneira adequada os reflexos que as provisões terão nas demonstrações contá- beis elaboradas. 3.2 Mensuração de provisões, passivos e ativos contingentes Vídeo O CPC 25 menciona a técnica de mensuração que o profissional contábil deve seguir para a apuração adequada dos valores para reconhecimento de provisões, passivos e ativos contingentes. Vamos dar um maior destaque a três variáveis que impactam de forma relevante a mensuração desses eventos: melhor estimativa; riscos e incertezas; e valor presente. 3.2.1 Melhor estimativa O item 36, do CPC 25, traz como principal referencial de mensuração de valores a serem reconhecidos a “melhor estimativa” disponível, ou seja, “o valor reconheci- Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes 73 do como provisão deve ser a melhor estimativa do desembolso exigido para liqui- dar a obrigação presente na data do balanço”. Isto é, o “valor requerido na hipótese de a entidade pagar para liquidar a obrigação ou transferi-la para terceiros nesse momento” (GELBCKE et al., 2018, p. 368). Isso lhe faz refletir sobre o que é melhor estimativa? O CPC 25, item 37, apresen- ta a seguinte resposta a este pensamento: é o valor que a entidade racionalmente pagaria para liquidar a obrigação na data do balanço ou para transferi-la para terceiros nesse momento. É muitas vezes impossível ou proibitivamente dispendioso liquidar ou transferir a obri- gação na data do balanço. Porém, a estimativa do valor que a entidade ra- cionalmente pagaria para liquidar ou transferir a obrigação produz a melhor estimativa do desembolso exigido para liquidar a obrigação presente na data do balanço. (CPC, 2009c, grifos nossos) O aspecto racional mencionado acima se refere ao julgamento e exercício de cautela que a administração da empresa precisa realizar, juntamente com o pro- fissional contábil. Ele nos remete ao exercício da prudência nas transações que, basicamente, “significa que ativos e receitas não estão superavaliados e passivos e despesas não estão subavaliados” (CPC, 2019) 1 . As estimativas da liquidação da obrigação também dependerão do julgamento da administração e serão complementadas pela experiência de transações seme- lhantes, podendo fazer uso de relatórios de peritos contratados e evidências adi- cionais fornecidas por eventos subsequentes à data do balanço. Os profissionais contábeis devem gerar informações e documentos suficientes de todo o processo, mensuração de estimativas e julgamentos usados para o re- gistro das provisões, as quais devem ser bem fundamentadas, principalmente se a empresa for auditada. 3.2.2 Riscos e incertezas Os riscos e incertezas circundam o valor a ser reconhecido das provisões e podem ser tratados por vários meios, de acordo com as circunstâncias. Em particular, o risco descreve a variabilidade de cenários que a situação pode ter de desfechos possíveis. Para a análise de riscos e incertezas, o profissional contábil poderá utilizar estu- dos de cenários, probabilidades e médias ponderadas para sua efetivação. O nome desses recursos estatísticos de estimativa é valor esperado. Risco e incerteza, portanto, devem ser cobertos adequadamente pelo pro- fissional contábil, conforme é destacado por Gelbcke et al. (2018, p. 368, grifos nossos): as condições de incerteza não devem servir de argumento para a escolha arbitrária do desfecho mais adverso, com criação excessiva de provisões e com uma postura conservadora que chegue a reduzir a relevância do valor divulgado. E nem pode também ser considerado o cenário mais otimista escolhido por mera deliberação. Uma postura conservadora que resulte em criação excessiva de provisões, assim como a escolha por mera delibe- ração do cenário mais favorável, contrariam a neutralidade preconizada pelo Pronunciamento Conceitual Básico (R1) do CPC, impedindo a representação Para saber mais, consulte o CPC 00 (R2), disponível em: http:// www.cpc.org.br/CPC/Documen- tos-Emitidos/Pronunciamentos/ Pronunciamento?Id=80. Acesso em: 2 set. 2020. 1 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=80 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=80 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=80 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=80 74 Contabilidade Avançada fidedigna da realidade. O desfecho a ser considerado deve ser o mais pro- vável, com a devida divulgação das incertezas sobre o valor, cronograma de desembolsos e premissas utilizadas. Novamente, o que vemos descrito no parágrafo anterior é um destaque à obser- vância ao Princípio da Prudência, com o exercício de cautela ao fazer julgamentos sob condições de incerteza, o que é apresentado no CPC 00 – Estrutura Conceitual para Relatórios Financeiros, item 2.16. O método do valor esperado pode ser empregado pelo profissional contábil para reduzir os efeitos arbitrários que podem impactar as provisões, mencionados por Gelbcke et al. (2018). Exemplo O profissional contábil está participando de um grupo de trabalho com o Depar- tamento Jurídico que discute o principal processo tributário que a empresa enfren- ta contra o governo estadual. Na visão dos advogados é provável que a empresa perderá o processo e precisará pagar o valor da ação, mas não há consenso em relação ao valor a ser desembolsado. Para estimar o valor desse desembolso fi- nanceiro, frente às melhores informações disponíveis na data de preparação das demonstrações contábeis, foi proposto o uso do método do valor esperado como melhor estimativa para mensuração do valor da provisão a ser constituída. Assim, o grupo de trabalho descreveu os seguintes cenários possíveis a partir dos desdobramentos do processo, jurisprudências disponíveis, experiências pas- sadas de processos similares e opiniões dos advogados envolvidos no processo, como demonstrado a seguir. Tabela 1 Cenários e probabilidades de ocorrência Cenários Desembolsos (em R$) Probabilidade de ocorrência Cenário Conservador R$ 75.000.000,00 35% Cenário Moderado R$ 50.000.000,00 45% Cenário Otimista R$ 25.000.000,00 20% Desse modo, aplicando o método do valor esperado, há duas possibilidades a serem avaliadas pelo profissional contábil em conjunto com a administração da empresapara o uso e contabilização da melhor estimativa disponível: 1ª opção – utilização do cenário de maior probabilidade de ocorrência; no caso, o Cenário Moderado, com 45% de probabilidade de ocorrência. Nessa opção, o valor a ser registrado de provisão seria de R$ 50.000.000,00. 2ª opção – efetuar a média ponderada entre as probabilidades de ocorrência e os valores possíveis de desembolso. O valor final de mensuração dessa obrigação a ser registrada como provisão seria de R$ 53.750.000,00. Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes 75 Como estamos falando de melhores estimativas e valores esperados de reali- zação, as duas opções poderiam ser consideradas nos registros contábeis da em- presa. Porém é importante destacar a necessidade de que os respectivos estudos e justificativas realizadas sejam devidamente organizados, documentados e man- tidos nos arquivos da contabilidade, principalmente com a referência da decisão tomada pela administração, com base do registro contábil da opção escolhida. 3.2.3 Valor Presente Além dos itens anteriormente abordados, o profissional contábil deve observar se o efeito do valor do dinheiro no tempo exigido para liquidar a obrigação pre- sente é material, principalmente em situações que o desembolso é estimado para ocorrer no longo prazo. Se for relevante, o valor da provisão deve ser calculado considerando o valor presente dos desembolsos que se espera que sejam exigidos para liquidar a obrigação, devendo ser descontadas, ou seja, trazida a valor presen- te para divulgação nas demonstrações contábeis na data. Detalhes de como efetuam-se esses cálculos são apresentados no Pronuncia- mento Técnico CPC 12, que trata do Ajuste a Valor Presente (AVP), o qual não é es- copo desta obra. A taxa de desconto a ser utilizada para o cálculo do valor presente deve refletir as atuais avaliações de mercado quanto ao valor do dinheiro no tempo e os riscos específicos para o passivo (CPC, 2009c). 3.2.4 Alienação esperada de ativo Em determinadas provisões registradas, a administração da empresa pode con- siderar a venda do ativo ao final da sua vida útil ou exaustão dos recursos, aos quais o ativo é empregado (por exemplo, conjunto de ativos adquiridos para explo- rar os recursos naturais de uma mina de mineração). O CPC 25, item 52, menciona que os ganhos esperados na venda desses ativos não devem ser levados em consideração ao mensurar a provisão, “mesmo se a alie- nação esperada estiver intimamente ligada ao evento que dá origem à provisão” (CPC, 2009c). A empresa deve reconhecer os ganhos da venda desses ativos, seguin- do a sua natureza e definições dos respectivos Pronunciamentos Técnicos (CPC). 3.2.5 Reembolsos Podem ocorrer situações em que a empresa apresenta algum tipo de instru- mento que lhe faz esperar que parte dos desembolsos financeiros necessários para liquidar a provisão, ou todos, seja reembolsada, ou até mesmo pagos diretamente por outra parte (por exemplo, contratos de seguros, cláusulas de indenização ou garantias de fornecedores). Esse assunto é tratado no CPC 25, item 55. 76 Contabilidade Avançada O reembolso terá os seguintes tratamentos contábeis dispostos no item 53: somente poderá ser reconhecido pela empresa quando, e somente quando, for praticamente certo que o reembolso será recebido se a empresa liquidar a obrigação. O reembolso deve ser tratado como ativo separado. O valor re- conhecido para o reembolso não deve ultrapassar o valor da provisão. (CPC, 2009c) Portanto, caso o reembolso não seja praticamente certo ele será classificado como um ativo contingente e, assim, não será reconhecido na contabilidade até que sua situação mude e ele possa atender os requisitos previstos para que um ativo seja registrado. 3.3 Mudanças nas provisões Vídeo Dentre as atividades necessárias para o fechamento contábil e a preparação das demonstrações contábeis, o profissional contábil deve se programar e efetuar a reavaliação das provisões, conforme o item 59, em “cada data de balanço e ajus- tadas para refletir a melhor estimativa corrente” (CPC, 2009). A conclusão dessa reavaliação deve ser documentada e arquivada juntamente com os demais papéis de trabalho. Como resultado dessa reavaliação podem ocorrer situações de mudanças nas provisões, inclusive com a sua reversão. Quando o profissional contábil verificar mudanças nas provisões ele deve en- tender a natureza dessas mudanças ocorridas e consultar os preceitos do CPC 23 – Políticas Contábeis, Mudança de Estimativa e Retificação de Erro (2009a), que traz os efeitos e tratamentos diferenciados dessas mudanças nas demonstrações contábeis. 3.3.1 Revisão da estimativa Conforme o item 34, a estimativa base das provisões reconhecidas pode neces- sitar de revisão se “ocorrer alterações nas circunstâncias em que a estimativa se baseou ou em consequência de novas informações ou de maior experiência” (CPC, 2009a, item 34). Nessa situação, a revisão da estimativa não se relaciona com pe- ríodos anteriores nem representa correção de erro. O efeito de mudança na estimativa contábil deve ser reconhecido prospectiva- mente, incluindo-o nos resultados do: a. período da mudança, se a mudança afetar apenas esse período; ou b. período da mudança e futuros períodos, se a mudança afetar todos eles. Importante esclarecer ao profissional contábil, segundo o item 38, que o “reco- nhecimento prospectivo do efeito de mudança na estimativa contábil significa que a mudança é aplicada as transações, a outros eventos e a condições a partir da data da mudança na estimativa” (CPC, 2009a). As mudanças apontadas na reavaliação das provisões são con- sequência das incertezas inerentes às atividades empresariais, em que muitos itens das demons- trações contábeis não podem ser mensurados com precisão, sendo estimados. A estimativa envolve julgamentos baseados na última informação disponível e confiável, as quais também podem mudar de uma data de balanço para outra. Conforme os itens 32 e 33, “o uso de estimativas razoáveis é parte essencial da elaboração de demonstrações contábeis e não reduz sua confiabilidade” (CPC 2009a). Lembre-se Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes 77 3.3.2 Mudança na Política Contábil Quando a reavaliação da provisão realizada pelo profissional contábil iden- tificar uma mudança na base de avaliação, isso é classificado, de acordo com o item 35, como “uma mudança na política contábil e não uma mudança na estimativa contábil” (CPC, 2009a). Porém o próprio CPC 23, nesse mesmo item, indica que “quando for difícil distinguir uma mudança na política contábil de uma mudança na estimativa contábil, a mudança é tratada como mudança na estimativa contábil, devido aos impactos que a definição de uma mudança na política contábil causa das demonstrações contábeis” (CPC, 2009a). Se realmente for verificada a mudança na política contábil, o profissional deverá elaborar análises mais detalhadas dos reflexos dessa mudança nas de- monstrações contábeis, podendo ter impactos significativos na apresentação das demonstrações, devido à necessidade de divulgar os fatos ocorridos que causaram a mudança na política contábil, base da provisão, aos usuários das demonstrações contábeis. Por isso, recomendamos a análise com profundida- de dos preceitos do CPC 23 (do item 14 ao item 31) para que sejam devida- mente formalizados e endereçados nas demonstrações contábeis na data da preparação. 3.3.3 Uso de provisão Sobre o uso dos valores provisionados, o CPC 25, itens 61 e 62, dá as seguintes orientações aos profissionais contábeis e à administração das empresas, de modo a não ocorrer erros de interpretação: 61. Uma provisão deve ser usada somente para os desembolsos para os quais a provisão foi originalmente reconhecida. 62. Somente os desembolsos que se relacionem com a provisão original são compensados com a mesma provisão. Reconhecer os desembolsos contra uma provisão que foi originalmente reconhecida para outrafinalidade escon- deria o impacto de dois eventos diferentes. (CPC, 2009c) Observar esses itens são importantes por causa do requisito de divulgação, es- perado que as empresas apresentem, para cada classe de provisão, como disposto no item 84: (a) o valor contábil no início e no fim do período; (b) provisões adicionais feitas no período, incluindo aumentos nas provisões existentes; (c) valores utilizados (ou seja, incorridos e baixados contra a provisão) duran- te o período; (d) valores não utilizados revertidos durante o período; e (e) o aumento durante o período no valor descontado a valor presente pro- veniente da passagem do tempo e o efeito de qualquer mudança na taxa de desconto. (CPC, 2009c) 78 Contabilidade Avançada Por esses motivos, reforçamos a necessidade de o profissional contábil ter to- dos os papéis de trabalho elaborados e que fundamente as provisões de maneira organizada e atualizada, os quais servirão para que as movimentações nas provi- sões possam ser efetuadas de modo efetivo e seguindo as naturezas para as quais foram criadas, permitindo, assim, a adequada divulgação das movimentações rea- lizadas por meio de tabelas constantes em notas explicativas. 3.3.4 Contratos onerosos O profissional contábil deve estar atento aos contratos que se classificam como contratos onerosos e que podem ser celebrados a qualquer momento pelas ativida- des operacionais realizadas pelos departamentos e/ou áreas de negócio da empresa. Há casos em que os contratos (ou mesmo ordens de compra) podem ser cance- lados a qualquer momento, sem que haja a necessidade de compensações financei- ras à outra parte e, assim não estamos falando de uma obrigação. Segundo o item 67, “outros contratos estabelecem direitos e obrigações para cada uma das partes do contrato” (CPC, 2009c); nessas situações o contrato pode ser classificado como oneroso. A análise do contrato oneroso é criteriosa e envolve também a avaliação de possíveis perdas com desvalorização em ativos atrelados a esse contrato, o que deve ser feito observando o CPC 01 – Redução ao Valor Recuperável de Ativos, se for aplicável. Se os critérios de reconhecimento de um contrato oneroso foram atingidos, a empresa terá um contrato oneroso e, consequentemente, a obrigação presente que deverá ser reconhecida e mensurada como provisão, sendo tratada pelo CPC 25. Se esse contrato não for oneroso, ele não estará no escopo do CPC 25. Por isso, antes da necessidade de reavaliação da provisão, conforme mencionado an- teriormente, é necessária a própria identificação e confirmação que o contrato se classifica como oneroso. De acordo com o item 68, uma provisão será reconhecida quando “os custos inevitáveis de satisfazer as obrigações do contrato excedem os benefícios econô- micos que se espera sejam recebidos ao longo do mesmo contrato” (CPC, 2009c). Esses custos inevitáveis serão calculados considerando o menor custo líquido de sair do contrato tendo como base: “a) no custo de cumprir o contrato ou b) no custo de qualquer compensação ou de penalidades provenientes do não cumprimento do contrato, dos dois o menor” (CPC, 2009c). 3.3.5 Plano de reestruturação Um plano de reestruturação é realizado tendo objetivos estratégicos, dentre eles, o de melhorar o desempenho da empresa. O item 70 (CPC, 2009c) nos apre- senta alguns exemplos de eventos que podem ser enquadrados na definição de reestruturação sob a ótica contábil: (a) venda ou extinção de linha de negócios; (b) fechamento de locais de negócios de um país ou região ou a realocação das atividades de negócios de um país ou região para outro; Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes 79 (c) mudanças na estrutura da administração, por exemplo, eliminação de um nível de gerência; e (d) reorganizações fundamentais que tenham efeito material na natureza e no foco das operações da entidade. Se o profissional contábil tomar ciência de que a sua empresa iniciará (ou está passando por) um processo de reestruturação contemplando alguma das situa- ções anteriormente indicadas, ele terá que observar o atendimento dos requisitos para registro de uma provisão para custos de reestruturação. Esses requisitos são listados nos itens 72 a 83 e demonstram como os critérios gerais de reconhecimen- to dessa provisão se aplicam às reestruturações. Listamos a seguir os requisitos do item 72 que indicam que uma obrigação não formalizada para reestruturação surge somente quando a empresa: (a) Tiver um plano formal detalhado para a reestruturação, identificando pelo menos: (i) o negócio ou parte do negócio em questão, (ii) os principais locais afetados, (iii) o local, as funções e o número aproximado de empregados que serão incentivados financeiramente a se demitir, (iv) os desembolsos que serão efetuados; e (v) quando o plano será implantado; e (b) Tiver criado expectativa válida naqueles que serão afetados pela reestrutu- ração, seja ao começar a implantação desse plano ou ao anunciar as suas prin- cipais características para aqueles afetados pela reestruturação. (CPC, 2009c) Geralmente, a administração da empresa que planeja executar um plano de reestruturação com reduções em suas operações e demissões de seus funcioná- rios, costuma reunir-se com as principais partes interessadas para efetuar um ali- nhamento prévio das expectativas e desdobramentos dessa decisão e evitar que notícias importantes sejam informadas sem o controle adequado da própria enti- dade, o que pode comprometer a imagem e a reputação da empresa. Exemplos de partes interessadas envolvidas pela administração nesse processo: governos, nas esferas federal, estadual e/ou municipal; sindicatos e associações de classe dos funcionários; fornecedores estratégicos; clientes estratégicos; comunidade em geral, principalmente quando projetos filantrópicos são conduzidos e serão encer- rados, entre outros. O profissional contábil deverá acompanhar a forma de comunicação e o nível de detalhamento do plano de reestruturação, ou seja, as principais características do plano. Esses fatores são suficientes para que o plano seja considerado uma obriga- ção não formalizada, concretizando as expectativas válidas das partes interessadas de que a empresa realizará a reestruturação e, com isso, será processado o registro da provisão para custos de reestruturação. Considere agora o seguinte questionamento: quando a administração decide realizar o comunicado do plano de reestruturação? Essa pergunta é relevante e sua resposta pode impactar as demonstrações contábeis da empresa e a aplicação do CPC 24 – Evento Subsequente, na data do balanço, conforme tratado a seguir. 80 Contabilidade Avançada 3.3.5.1 Avaliação das decisões tomadas pela administração na data do balanço. O profissional contábil deverá avaliar se a decisão de reestruturação foi tomada antes da data do balanço e se dá ou não origem a uma obrigação não formalizada na data do balanço. Como regra geral, essas obrigações não seriam formalizadas nas demonstrações contábeis, a menos que a empresa tenha efetuado as seguintes ações antes da data do balanço, conforme o item 75: “(a) começado a implemen- tação do plano de reestruturação; ou (b) anunciado as principais características do plano de reestruturação àqueles afetados por ele, de forma suficientemente es- pecífica, criando neles expectativa válida de que a entidade fará a reestruturação” (CPC, 2009c). 3.3.5.2 Decisões tomadas pela administração após a data do balanço. A administração também pode decidir por começar a implementar seu plano de reestruturação, ou anunciar as suas principais características àqueles afetados pelo plano, somente depois da data do balanço. Nesse caso, o profissional contá- bil deverá aplicar o CPC 24 se a reestruturação for material e se a não divulgação puder influenciar as decisões econômicas dos usuários tomadas com base nas de- monstrações contábeis. Segundo o item 80, a provisão para custos com reestruturação deve incluir so- mente os desembolsosdiretos decorrentes da reestruturação, que simultanea- mente sejam: “(a) necessariamente ocasionados pela reestruturação; e (b) não associados às atividades em andamento da entidade” (CPC, 2009c). Por outro lado, segundo o item 81, a provisão para reestruturação não deve incluir custos relacionados com a conduta futura da empresa e não são passivos de reestruturação na data do balanço, como: “(a) novo treinamento ou remanejamen- to da equipe permanente; (b) marketing; ou (c) investimento em novos sistemas e redes de distribuição” (CPC, 2009c). CONSIDERAÇÕES FINAIS A cada conteúdo estudado, acreditamos ficar cada vez mais clara a responsabi- lidade do profissional contábil em promover as ações contábeis adequadas para os registros contábeis da empresa, bem como os esforços necessários para preparação de demonstrações contábeis fidedignas. Evidentemente, para atingir esse objetivo, o profissional tem papel fundamental na elaboração de informações contábeis prepara- das de acordo com os requisitos definidos no CPC 25 e demais CPC relacionados ao assunto em foco, os quais devem ser analisados de forma conjunta e complementar. Com certeza, o profissional contábil tem mais uma oportunidade para demonstrar suas habilidades técnicas de modo a contribuir com a empresa mantendo provisões em níveis adequados aos requisitos previstos, sem contabilizar provisão em excesso (cenário pessimista) ou em falta (cenário otimista), o que pode acarretar impactos significativos nos resultados da empresa. Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes 81 ATIVIDADES 1. Você acredita que o profissional contábil tem condições de trabalhar de maneira isolada e plena na apuração das informações contábeis necessárias para elaborar as estimativas e julgamentos para registro das provisões? Fundamente sua resposta. 2. Qual a postura que o profissional contábil deve ter em relação às transações realizadas e decisões tomadas pela administração da empresa, bem como seus reflexos nas provisões? 3. Em sua opinião, frente à complexidade das informações requeridas para que as provisões sejam devidamente mensuradas e registradas, como o profissional contábil deve proceder para organizar sua rotina de procedimentos para atender as demandas do CPC 25? REFERÊNCIAS ALMEIDA, M. C. Contabilidade intermediária em IFRS e CPC. São Paulo: Atlas, 2018. AMBEV. Divulgação de resultados. 2019. Disponível em: http://ri.ambev.com.br/relatorios-publicacoes/ divulgacao-de-resultados/. Acesso em: 2 set. 2020. COGNA EDUCAÇÃO. Arquivos. 2019. Disponível em: https://api.mziq.com/mzfilemanager/v2/d/e1110a12- 6e58-4cb0-be24-ed1d5f18049a/18ed7e6a-c911-04f0-8b9c-f04955d92e2a?origin=2. Acesso em: 2 set. 2020. CPC. CPC 00 (R2) – Estrutura conceitual para relatório financeiro. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 10 dez. 2019. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/ Pronunciamento?Id=80. Acesso em: 2 set. 2020. CPC. CPC 23 – Políticas contábeis, mudança de estimativa e retificação de erro. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 16 set. 2009a. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/ Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=54. Acesso em: 2 set. 2020. CPC. CPC 24 – Evento subsequente. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 16 set. 2009b. Disponível em: http://www.cpc. org.br/ CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=55. Acesso em: 2 set. 2020. CPC. CPC 25 – Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 16 set. 2009c. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/ Pronunciamento?Id=56. Acesso em: 2 set. 2020. GELBCKE, E. R. et al. Manual de contabilidade societária: aplicável a todas as sociedades, de acordo com as Normas Internacionais e o CPC. São Paulo: Atlas, 2018. MARION, C. J. Contabilidade Avançada. São Paulo: Atlas, 2020. VALE. Demonstrações Financeiras. 2019. Disponível em: http://www.vale.com/PT/investors/information- market/financial-statements/FinancialStatementsDocs/BRGAAP%204T19_Final.pdf. Acesso em: 2 set. 2020. WEG. Relatórios anuais. 2019. Disponível em: https://mz-filemanager.s3.amazonaws.com/50c1bd3e-8ac6- 42d9-884f-b9d69f690602/central-de-resultadoscentral-de-downloads/9154ba6859e6a545be2675163d 7579eda5176df10c8810b83b5584ce87f112ea/demonstracoes_financeiras_anuais_completas_de_2019. pdf. 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Os acionistas, quotistas, investidores e as partes interessadas buscam in- formações transparentes e fidedignas sobre como esse valor justo é men- surado, assim como seu impacto nas demonstrações preparadas para a data de balanço e seu potencial para impactar exercícios futuros. É importante ressaltar que o valor justo é uma mensuração com base na visão de mercado, não uma mensuração específica da empresa. Por isso, os profissionais contábeis precisam entender esses conceitos e o modo como as técnicas de avaliação e as hierarquias são aplicadas sobre os ativos e os passivos mensurados. Para abarcar essas questões, este ca- pítulo tratará de tópicos selecionados, com base, principalmente, no CPC 46 – Mensuração do Valor Justo. O Pronunciamento Técnico CPC 46 foi promulgado pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) em 7 de dezembro de 2012 e está cor- relacionado com a Norma Internacional de Contabilidade (IFRS 13) - Fair Value Measurement De modo geral, abordaremos aqui as formas de mensuração do va- lor justo, as técnicas de avaliação aplicadas à mensuração, as hierarquias existentes para apuração do valor justo de ativos e passivos (inclusive os instrumentos patrimoniais próprios da empresa) e outrostemas correla- tos, que proporcionam o adequado entendimento do uso do valor justo nas demonstrações contábeis das empresas. Boa leitura! 4.1 Principais conceitos do valor justo Vídeo Nos últimos anos, o uso do valor justo como base de mensuração presente de vários ativos e passivos registrados nas demonstrações contábeis se ampliou. Con- sequentemente, seu grau de relevância também aumentou sensivelmente. Frente a essa preocupação, o CPC 46 nos apresenta uma estrutura com base em princípios a serem aplicados para a adequada mensuração do valor justo. Esses princípios introduzidos visam aumentar a consistência e a comparabilida- de das estimativas do valor justo presentes em várias situações nas demonstrações contábeis divulgadas pelas empresas de modo geral. Mensuração do valor justo 83 O profissional contábil deve estar preparado para aplicar esses princípios na de- terminação do valor justo e entender as interações com outras informações estra- tégicas da empresa, bem como seus controles internos existentes. Isso, conforme veremos, irá requerer uma variedade de premissas e julgamentos significativos, além de um conhecimento técnico mais avançado do profissional. 4.1.1 Objetivo e alcance No item 1 do CPC 46 (2012), encontramos seus objetivos principais. Resumida- mente, eles cobrem: a definição do que é valor justo; o alinhamento em um único Pronunciamento da mensuração do valor justo; e as divulgações previstas nas de- monstrações contábeis sobre mensurações do valor justo. Na sequência, no item 2 do CPC 46, o objetivo de se efetuar a mensuração do valor justo é indicado: Estimar o preço pelo qual uma transação não forçada, para vender o ativo ou para transferir o passivo, ocorreria entre participantes do mercado na data de mensuração sob condições correntes de mercado (ou seja, um preço de saída na data de mensuração do ponto de vista de participante do merca- do que detenha o ativo ou o passivo). (CPC, 2012, grifos nossos) Os itens grifados serão tratados nas próximas seções, pois o entendimento des- ses conceitos e de seus usos é a base para a formação do conhecimento da mensu- ração do valor justo como um todo. Quanto ao seu alcance, o CPC 46 é aplicável quando outro Pronunciamento re- querer ou permitir mensurações do valor justo ou divulgações sobre mensurações do valor justo dos ativos e/ou passivos que estão sendo avaliados, como: • CPC 1 – Redução ao Valor Recuperável de Ativos. • CPC 4 – Ativo intangível. • CPC 15 – Combinação de negócios. • CPC 18 – Investimento em Coligada, em Controlada e em Empreendimento Controlado em Conjunto. • CPC 27 – Ativo imobilizado. • CPC 28 – Propriedade para investimento. • CPC 29 – Ativo biológico e produto agrícola. • CPC 31 – Ativo Não Circulante mantido para venda e operação descontinuada. • CPC 33 – Benefícios a empregados. • CPC 36 – Demonstrações consolidadas. • CPC 47 – Receita de contrato com cliente. • CPC 48 – Instrumentos financeiros. Além de saber quando o CPC 46 pode ser utilizado, também é relevante enten- der quando esse CPC não é aplicado, conforme menciona-se nos itens 6 e 7: 6. Os requisitos de mensuração e divulgação deste Pronunciamento não se aplicam a: (a) transações de pagamento baseadas em ações dentro do alcance do CPC 10 – Pagamento Baseado em Ações; (b) transações de arrendamento dentro do alcance do CPC 06 – Arrendamentos; e 84 Contabilidade Avançada (c) mensurações que tenham algumas similaridades com o valor justo, mas que não representem o valor justo, como, por exemplo, o valor realizável lí- quido a que se refere o Pronunciamento CPC 16 – Estoques ou o valor em uso a que se refere o Pronunciamento CPC 01 – Redução ao Valor Recuperável de Ativos. 7. As divulgações requeridas por este Pronunciamento não são exigidas para: (a) ativos de planos mensurados ao valor justo de acordo com o CPC 33 – Be- nefícios a Empregados; (b) (eliminada); e (c) ativos cujo valor recuperável seja o valor justo menos as despesas de alie- nação, de acordo com o CPC 01. (CPC, 2012) Agora, vamos avançar em nossos estudos abordando os principais conceitos tratados no CPC 46. 4.1.2 Conceitos Os conceitos-chave deste capítulo foram obtidos, principalmente, no Apêndice A do CPC 46 (2012) e incluem os seguintes itens: • Valor justo: preço que seria recebido pela venda de um ativo ou pago pela transferência de um passivo em uma transação não forçada, entre partici- pantes do mercado, no mercado principal (ou mais vantajoso), na data de mensuração e nas condições atuais de mercado (ou seja, em um preço de saída), independentemente de esse preço ser diretamente observável ou es- timado utilizando-se outra técnica de avaliação. • Unidade de contabilização (objeto): nível ao qual um ativo ou passivo é agregado ou desagregado (individual) e que será objeto da mensuração para fins de reconhecimento. • Mercado principal: mercado com o maior volume e nível de atividade para o ativo ou o passivo. Deve estar disponível e ser acessível pela empresa e é aquele em que a empresa entraria em uma transação para vender o ativo ou transferir o passivo, a menos que haja evidências que apontem o contrário. • Mercado ativo: mercado no qual transações para o ativo ou passivo ocorrem com frequência e volume suficientes para fornecer informações de precifica- ção de forma contínua. • Mercado mais vantajoso: mercado que maximiza o valor que seria re- cebido para vender o ativo ou que minimiza o valor que seria pago para transferir o passivo, após levar em consideração os custos de transação e os custos de transporte. • Melhor uso – ou melhor uso possível (highest and best use): uso de um ativo não financeiro, por participantes do mercado, que maximizaria o valor do ativo ou o grupo de ativos e passivos dentro do qual o ativo é usado. • Participantes do mercado: compradores e vendedores do mercado prin- cipal (ou mais vantajoso) para o ativo ou passivo que agem em seu melhor interesse econômico, os quais têm todas as características. De acordo com o apêndice A: a) São independentes entre si, ou seja, não são partes relacionadas, conforme definido no CPC 05 (R1) - Divulgação sobre Partes Relacionadas; Mensuração do valor justo 85 b) São conhecedores, tendo entendimento razoável do ativo ou passivo e da transação com a utilização de todas as informações disponíveis, incluindo in- formações que possam ser obtidas por meio de esforços usuais e habituais com a devida diligência; c) São capazes de realizar transação com o ativo ou passivo; d) Estão interessados em realizar transação com o ativo ou passivo, ou seja, estão motivados, mas não forçados ou, de outro modo, obrigados a fazê-lo. (CPC, 2012) • Preço da transação: preço pago para adquirir o ativo ou recebido para assumir o passivo (um preço de entrada). Em muitos casos, o preço da transação é igual ao valor justo, mas há situações em que o preço da transação pode não representar o valor justo do ativo ou do passivo no reconhecimento inicial. • Preço de entrada: preço pago para adquirir um ativo ou recebido para assumir um passivo em uma transação de troca. • Preço de saída: preço que seria recebido para vender um ativo ou pago para transferir um passivo. • Técnicas de avaliação: técnicas (ou abordagens) utilizadas para mensurar o valor justo que devem maximizar o uso de dados observáveis relevantes e minimizar o uso de dados não observáveis. O profissional contábil deve selecionar infor- mações que sejam consistentes com as características do ativo ou do passivo, as quais seriam levadas em conta por participantes do mercado em transação com o ativo ou passivo. • Abordagem de mercado: técnica de avaliação que utiliza preços e outras infor- mações relevantes geradas por transações de mercado envolvendo ativos, passi- vos ou grupo de ativos e passivos idênticos ou comparáveis (ou seja, similares). • Abordagem de receita: técnicas de avaliação que convertem valores futuros (por exemplo, fluxos de caixa)em um valor único atual (ou seja, descontado). A mensu- ração do valor justo é determinada com base no valor indicado pelas expectativas de mercado atuais em relação a esses valores futuros. • Abordagem de custo: técnica de avaliação que reflete o valor que seria exigido atualmente para substituir a capacidade de serviço de um ativo (normalmente referido como custo de substituição ou reposição). • Informações (inputs): premissas que seriam utilizadas por participantes do mercado ao precificar o ativo ou o passivo, incluindo premissas sobre risco; por exemplo, conforme o apêndice A: “(a) risco inerente a uma técnica de avaliação específica utilizada para mensurar o valor justo (por exemplo, um modelo de pre- cificação); (b) risco inerente às informações da técnica de avaliação. Informações podem ser observáveis ou não observáveis” (CPC, 2012). 4.2 Formas de mensuração para ativos e passivos Vídeo Em seu Apêndice B, o CPC 46 descreve as etapas que o profissional contábil deve seguir para efetuar a adequada mensuração do valor justo. Na Figura 1 é possível observarmos o desdobramento do Apêndice B em um formato organizado de cinco etapas de testes a serem realizados pelo profissional contábil. Há também o detalhamento dos principais elementos existentes a serem cumpridos e documentados. 86 Contabilidade Avançada A estrutura da Figura 1 pode ser aplicada tanto à mensuração inicial quanto à mensuração subsequente do valor justo dos ativos ou passivos. Figura 1 Estrutura para mensuração do valor justo (passo a passo) Determinar a unidade de contabilização Ativos e passivos financeiros Técnicas de Avaliação Se necessário, alocar o valor justo a cada unidade de contabilização Etapa 1 Etapa 2 Etapa 4 Etapa 5 Etapa 3 Sim Sim Não Não Ativos e passivos não financeiros Premissa de avaliação: individual Considerar o valor em uma base combinada Abordagem de Mercado Abordagem de Receita Abordagem de Custo Determinar o melhor uso possível (premissa de avaliação): individual ou combinado com outros ativos / passivos Mercado Há um mercado principal? Valor justo Unidades de contabilização Entradas participantes do mercado Qual é o mercado mais vantajoso (valoriza todos os mercados observáveis)? Desenvolver um mercado hipotético (provavelmente) Acesso a quaisquer mercados observáveis Incorporar a perspectiva dos participantes do mercado Fonte: PwC, 2019, tradução nossa. Etapa 1: Definindo a unidade de contabilização Recomendamos que o profissional contábil inicie o estudo da mensuração do valor justo pela análise, definição adequada e consistente da unidade de con- Mensuração do valor justo 87 tabilização do ativo e/ou do passivo a ser utilizado. A unidade de contabilização pode ser agregada, como uma unidade geradora de caixa (UGC), ou desagrega- da (individual), como um contrato de instrumento financeiro, uma propriedade para investimento. A unidade de contabilização também deve ser determinada de acordo com um Pronunciamento Técnico, que pode exigir e/ou permitir a mensuração do valor jus- to, indo além do próprio CPC 46. Ainda para a definição da unidade de contabilização, o profissional contábil de- verá observar os preceitos estabelecidos no item 48, considerando o ponto de vis- ta de mercado para precificar a exposição ao risco na data de mensuração e não somente a forma como a administração entende ser a “unidade de contabilização” dos seus ativos e passivos. A seguir, disponibilizamos um exemplo sobre a mensuração do valor justo com base em componentes da unidade de contabilização. Exemplo O Fundo de Investimento A detém um investimento na Empresa B; esse inves- timento é contabilizado pelo valor justo. A Empresa B é uma holding privada com duas subsidiárias, cada uma operando em uma linha de negócios diferente. Ambas emitiram dívida pública e publicam suas demonstrações financeiras. O Fundo de Investimento A avalia seu investimento na Empresa B, avaliando as duas subsidiárias separadamente, e inclui quaisquer efeitos potenciais no valor da holding. Como as subsidiárias têm características diferentes, ou seja, perspectivas de crescimento, perfis de risco e requisitos de investimento, essa abordagem per- mite a consideração separada dos fatos e das circunstâncias das subsidiárias, além de ser consistente com a abordagem que um participante do mercado considera- ria, na avaliação, para realizar um investimento na Empresa B. Fonte: KMPG, 2017, p. 19. Etapa 2: Determinando as premissas de avaliação Nessa etapa, o profissional contábil deve determinar a premissa de avaliação, o que será feito com base na natureza do ativo ou passivo que será mensurado. O profissional contábil deve maximizar o uso de dados observáveis relevantes e deve minimizar o uso de dados não observáveis, para atingir o objetivo da men- suração do valor justo (destaque do item 36, CPC 46). Ativos não financeiros: O valor justo de um ativo não financeiro terá como base o conceito do melhor uso possível (highest and best use) pela empresa ou pela venda do ativo a outro participante do mercado que também utilizaria esse ativo em seu melhor uso, o que será determinado com base na perspectiva desse participante do mercado, ainda que a entidade pretenda um uso diferente (item 29, CPC 46). Holding: empresa cuja atividade é deter participação acionária em uma ou mais empresas, assim, passando a controlar a administra- ção e políticas das empresas das quais obteve a participação Glossário 88 Contabilidade Avançada Mesmo que a empresa tenha adquirido um ativo para proteger a sua posição com- petitiva ou não pretenda utilizá-lo de acordo com o melhor uso possível, o profissional contábil deve realizar tal avaliação aplicando o conceito do melhor uso possível. Conforme o item 28, o melhor uso possível de um ativo não financeiro deve levar em consideração: (a) seu uso que seja fisicamente possível quanto às características físicas do ativo que os participantes do mercado levariam em conta ao precificar o ativo (por exemplo, a localização ou o tamanho de um imóvel). (b) seu uso é legalmente permitido com base em quaisquer restrições legais sobre o uso do ativo que os participantes do mercado levariam em conta ao precificá-lo (por exemplo, as regras de zoneamento aplicáveis a um imóvel). (c) um uso é financeiramente viável, ou seja, gera receita ou fluxos de caixa adequados (levando em conta os custos para converter o ativo para esse uso) para produzir o retorno do investimento que os participantes do mercado exigiriam do investimento nesse ativo colocado para esse uso. (CPC, 2012) Vejamos, a seguir, um exemplo de restrição legal no uso do ativo pela empresa, o que impactará negativamente o melhor uso possível (highest and best use) de um ativo não financeiro. Exemplo Restrição legal no uso do ativo Títulos dados como garantia Em alguns acordos de empréstimo, os títulos detidos por um investidor são da- dos em garantia como garantia de dívida, ou outros compromissos, do investidor. Nessas situações, o investidor fica impedido de vender os valores mobiliários da- dos em garantia durante o período em que a dívida ou outro compromisso estiver em aberto. As restrições aos valores mobiliários resultantes dos valores mobiliários dados em garantia representam restrições específicas da entidade que não devem ser consideradas na mensuração do justo valor dos valores mobiliários. Fonte: KPMG, 2017, p. 23. Ativos financeiros: O conceito de melhor uso possível não se aplica aos ativos financeiros. Isso ocorre porque os ativos financeiros não têm usos alternativos, como ocorre com os ativos não financeiros, isto é, seus valores justos não dependem do seu uso dentro de um grupo de outros ativos ou passivos. Além disso, a unidade de contabilização de um instrumento financeiro é normalmente o próprio instrumento financeiro, individualmente. Passivos: Os passivos financeiros ou não financeiros, ou o instrumentopatrimonial pró- prio da empresa são avaliados com base na transferência do passivo para um par- ticipante do mercado na data da mensuração. No entanto, as empresas também devem considerar as premissas dos participantes do mercado relativas à transfe- rência do passivo, assim como foi verificado na análise dos ativos. Mensuração do valor justo 89 Há vários recursos que o profissional contábil pode utilizar para mensurar o valor justo do passivo ou do instrumento patrimonial. No caso de não existir mer- cado para preços cotados para o passivo, ele pode utilizar a comparação de um item idêntico mantido por outra empresa com o mesmo ativo, do ponto de vista de um participante do mercado que detenha o item idêntico como ativo na data de mensuração (o que é previsto no item 37 do CPC 46). Além dessa técnica, é possível utilizar outros recursos, no caso de não existir um ativo idêntico mantido por outra parte, conforme descritos nas etapas 3 e 4, a seguir. Em suas análises, o profissional contábil deve considerar o risco de descum- primento (non-performance) no valor de um passivo, conforme apontado no item 42 do CPC 46. O risco de descumprimento inclui, entre outros, o risco de crédito próprio da entidade (conforme definido no Pronunciamento CPC 40 – Instrumentos Financeiros: Evidenciação). Etapa 3: Determinando o mercado para base de avaliação A determinação do mercado é um dos princípios-chave da mensuração do valor justo, existindo para isso uma hierarquia que o profissional contábil deve seguir. Primeiramente, a determinação do mercado deve ter como base o mercado prin- cipal e, na sua ausência, seguir para o mercado mais vantajoso, conforme mencio- nado no item 16 do CPC 46. Havendo um mercado principal, portanto, o valor justo deve ser determinado usando os preços naquele mercado. Se não houver mercado principal ou a empre- sa não tiver acesso ao mercado principal, o valor justo deve ter como base o preço no mercado mais vantajoso. Acompanhe a seguir um exemplo de análise de mercado principal: Exemplo Em um território existem dois mercados disponíveis para grãos de soja. São eles: • Mercado exportador: nesse mercado, os preços praticados são mais altos e estão disponíveis para o produtor. No entanto, existem limitações nos vo- lumes que podem ser vendidos, porque o governo estabeleceu um limite de volume para exportações; cada produtor precisa obter uma autorização para exportar sua produção e é raro o governo autorizar a exportação de mais de 25% da produção dos produtores. • Mercado doméstico: nesse mercado, os preços são mais baixos em relação ao mercado exportador, mas não há restrições em termos de volume. Os produtores de soja pretendem escoar toda a produção que puderem no mercado de exportação e, quando atingirem o limite da autorização de ex- portação concedida pelo governo, escoar o restante da produção no merca- do interno. A pergunta, então, é: qual é o principal mercado? Embora o mercado de exportação seja o mais vantajoso, pois dá maiores bene- fícios econômicos aos produtores, o mercado interno é o principal, porque pode absorver todo o volume que os produtores têm para venda. Se houver um mercado principal, a mensuração do valor justo deve ter como base o preço daquele mercado, mesmo que o preço em outro seja potencialmente mais vantajoso que o próprio mercado principal. Importante 90 Contabilidade Avançada A determinação do mercado mais vantajoso pode exigir que o profissional con- tábil considere vários mercados potenciais e as premissas de avaliação apropriadas para cada um desses mercados (o que é diferente para ativos financeiros e ativos não financeiros). Uma vez identificados os mercados potenciais, a empresa deve avaliar o ativo em cada mercado para determinar qual é o mais vantajoso. Por último, se mesmo após as análises aplicadas sobre o mercado principal e o mercado mais vantajoso mercados acessíveis não forem identificados, o profis- sional contábil deverá avaliar o ativo em um mercado hipotético, com base em premissas de possíveis participantes do mercado. Nesse caso, o profissional deve maximizar o uso de dados observáveis relevantes e minimizar o uso de dados não observáveis, o que é uma premissa mencionada no item 3 do CPC 46. O mercado principal (ou mais vantajoso) pode ser diferente entre empresas e até mesmo en- tre unidades operacionais dentro da mesma empresa. No caso das unidades operacionais, isso pode ocorrer por elas terem acesso a diferentes mercados e, por isso, cada unidade deve consi- derar, individualmente, o mercado principal ou o mercado mais vantajoso. A determinação do mercado, portanto, deve ser considerada do ponto de vista da empresa que está procedendo a análise. O profissional contábil não pode incorrer no risco de utilizar análises e premissas de mercado de uma empresa em outras empresas. Isso pode gerar distorções rele- vantes nos resultados da mensuração do valor justo dos ativos ou passivos analisados. Além disso, o profissional contábil deve estar atento ao apurar diferentes mensurações de valor justo para ativos ou passivos idênticos ou semelhantes, dependendo das unidades operacionais que detêm os ativos ou passivos e as diferenças nos mercados aos quais têm acesso, bem como as diferenças nas premissas dos participantes do mercado nesses mercados. Atenção O item 20 do CPC 46 (2012) indica que, embora a empresa deva ser capaz de acessar o mercado, ela não precisa ser capaz de vender o ativo específico ou trans- ferir o passivo específico na data de mensuração para que possa mensurar o valor justo com base no preço desse mercado. Etapa 4: Aplicar as abordagens / técnicas de avaliação apropriadas No item 62 do CPC 46 (2012) encontramos as três possíveis abordagens de ava- liação para mensuração do valor justo. O objetivo de usar abordagens de avaliação é estimar o preço pelo qual uma transação não forçada para a venda do ativo ou para a transferência do passivo ocorreria entre participantes do mercado, na data de mensuração nas condições atuais de mercado. Essas três abordagens mencionadas são: (i) abordagem de mercado; (ii) abor- dagem de custo; e (iii) abordagem de renda. Trataremos dessas abordagens de maneira mais detalhada na Seção 4.3. O profissional contábil deve utilizar uma técnica de avaliação que seja apropria- da às circunstâncias e para as quais obtenha dados suficientes, disponíveis para mensurar o valor justo, maximizando o uso de dados observáveis relevantes e mi- nimizando o uso de dados não observáveis, para os quais os dados de preços dos participantes do mercado possam ser obtidos sem custo e esforço indevidos. Mensuração do valor justo 91 Nos casos de ser necessário o uso de múltiplas técnicas de avaliação para men- surar o valor justo apurado, considera-se a razoabilidade da faixa de valores com base no conjunto dessas técnicas. Uma mudança na técnica de avaliação ou em sua aplicação utilizada pelo profis- sional contábil (por exemplo, mudança em sua ponderação quando múltiplas téc- nicas de avaliação forem utilizadas ou mudança no ajuste aplicado a uma técnica de avaliação) pode ocorrer, segundo o item 65, quando qualquer um dos eventos a seguir ocorrerem: (a) novos mercados surgirem; (b) novas informações se tornarem disponíveis; (c) informações utilizadas anteriormente não mais estiverem disponíveis; (d) houver uma melhora nas técnicas de avaliação; ou (e) houver mudanças nas condições de mercado. (CPC, 2012) Quando for necessário efetuar tais revisões decorrentes de mudança na técnica de avaliação ou em sua aplicação, essas situações são tratadas como mudança na estimativa contábil e deverão ser tratadas seguindo as orientações do CPC 23 – Políticas Contábeis, Mudança de Estimativa e Retificação de Erro. É importante observar que as divulgações do CPC 23 para mudança na estimativa contábil não são exigidas para revisões decorrentes de mudança na técnica de avaliação ou na sua aplicação, o que é tratado no item 66do CPC 46. Etapa 5: Determinar o valor justo O resultado da determinação do mercado e da aplicação de abordagens/téc- nicas de avaliação será a mensuração do valor justo. Se um ativo não financeiro é avaliado em combinação com outros ativos, o valor justo é calculado com base no pressuposto de que o participante do mercado já possui os outros ativos. Em certas circunstâncias, o valor total calculado deve ser alocado para cada unidade de conta no agrupamento de ativos. O profissional contábil deve utilizar uma ou mais dessas técnicas de avaliação mencionadas para mensurar o valor justo e, após sua escolha, deverá utilizá-las de modo consistente. Importante 4.3 Técnicas aplicadas à mensuração do valor justo Vídeo Vamos analisar mais detalhadamente as três abordagens previstas no CPC 46, para a mensuração do valor justo de ativos e de passivos. 4.3.1 Abordagem de mercado A abordagem de mercado é frequentemente usada como a abordagem de avaliação primária para ativos e passivos financeiros, quando dados observáveis de instrumen- tos idênticos ou comparáveis estão disponíveis. Utiliza preços e outras informações relevantes geradas por transações de mercado envolvendo ativos, passivos ou grupo de ativos e passivos. Quando o preço de cotação para ativos idênticos ou similares não estiver disponível, algumas técnicas de avaliação são consistentes com essa aborda- gem, como o uso de técnicas de múltiplos ou da matriz de preços. Gelbcke et al. (2018, p. 148) nos apresentam mais informações a respeito das técnicas alternativas que podem ser aplicadas: 92 Contabilidade Avançada (i) Múltiplos de mercado, tais como índices calculados pelas relações preço/lucro, são obtidos a partir de um conjunto de elementos comparáveis e devem estar em faixas, com um múltiplo diferente para cada elemento de comparação. A escolha do múltiplo apropriado dentro da faixa exige julgamento, consideran- do-se fatores qualitativos e quantitativos específicos da mensuração. Tipos de múltiplos podem ser calculados, sendo bastante comum o múltiplo de lucro, como o Preço/lucro, calculado dividindo-se o Preço por ação (P) pelo Lucro por ação (L). Porém, existem outros tipos que consideram o EBITDA (Earnings Before Interests, Taxes, Depreciation, and Amortization), entre outros. Há tam- bém outros tipos de múltiplos, como os múltiplos de valor patrimonial (preço ou valor de mercado dividido pelo valor do patrimônio líquido da empresa) e múltiplos de faturamento (preço ou valor de mercado dividido pelo fatura- mento bruto). (ii) Precificação por matriz, mais utilizada para avaliar determinados instrumen- tos financeiros, é também uma técnica de avaliação consistente com a abor- dagem de mercado e consiste em uma técnica matemática sem se basear exclusivamente em preços cotados para os títulos específicos, mas, sim, ba- seando-se na relação dos títulos a serem precificados com outros, os títulos cotados de referência. Essas técnicas citadas, dentre outras existentes, são amplamente utilizadas pelos analistas do mercado financeiro como ferramentas de apoio na análise de parâmetros ou comparações de ativos (ações) de empresas e também podem ser empregadas pelo profissional contábil, na contabilidade. 4.3.2 Abordagem de receita Essa abordagem é aplicada usando a técnica de avaliação e de análise de fluxo de caixa descontado e que requer: (i) estimar fluxos de caixa futuros para um de- terminado período de projeção; (ii) estimar o valor presente no final do período de projeção de todos os fluxos de caixa subsequentes para o final da vida do ativo ou para a perpetuidade se o ativo tiver uma vida indefinida, se apropriado; e (iii) des- contando esses montantes a valor presente a uma taxa de retorno que considera o risco relativo dos fluxos de caixa e o valor do dinheiro no tempo. Essas técnicas de avaliação incluem, segundo o item B11: a) Técnicas de valor presente; b) Modelos de precificação de opções, como a fórmula de Black-Scholes-Merton ou modelo binomial (ou seja, modelo de árvore), que incorporem técnicas de valor presente e reflitam tanto o valor temporal quanto o valor intrínseco da opção; e c) Método de ganhos excedentes em múltiplos períodos, que é utilizado para mensurar o valor justo de alguns ativos intangíveis. (CPC, 2012) Portanto, é possível verificar que técnicas amplamente utilizadas pelo mercado para precificação de produtos financeiros complexos (como opções, no caso de Black-Scholes-Merton) também podem ser utilizadas pelo profissional contábil de- monstrando a importância de se ter esse conhecimento financeiro também para sua adequada aplicação na contabilidade. Mensuração do valor justo 93 4.3.3 Abordagem de custo A abordagem de custo assume que o valor justo não excede o que custaria a um participante do mercado (normalmente referido como custo de substituição/repo- sição atual) para adquirir ou construir um ativo substituto de utilidade comparável, ajustado pela obsolescência. Esta também inclui a deterioração física, a obsolescên- cia tecnológica e a econômica do ativo. A abordagem de custo é normalmente usada para avaliar ativos que podem ser facilmente substituídos, como os imobilizados. Gelbcke et al. (2018) comentam a mensuração de valor justo pela abordagem do custo, normalmente utilizada para mensurar ativos tangíveis que são usados em conjunto com outros ativos. Justifica-se porque “um comprador participante do mercado não pagaria mais por um ativo do que o valor pelo qual poderia substituir a capacidade de serviço desse ativo” (GELBCKE et al., 2018, p. 149). No Quadro 1 apresentamos um resumo das abordagens descritas anteriormen- te, bem como alguns exemplos de técnicas de avaliação que o profissional contábil pode aplicar nos testes. Quadro 1 Resumo das abordagens e técnicas de avaliação Abordagem Mercado Receita Custo Técnica Marcação ao Mercado Marcação ao Modelo de Fluxo de Caixa Marcação ao Custo Preços de mercado com base em transações recentes Técnica de valor presente (fluxo de caixa descontado) Método de custo de reposição Múltiplos Modelos de precificações de opções Método de reprodução de custo Métodos de ganhos excedentes Modelo Black-Scholes-Merton ou modelo de rede Fonte: Adaptado de PwC, 2019 (traduzido pelo autor). Exemplo Alfa tem uma participação de 10% em Beta. As ações do capital social de Beta não são negociadas em bolsas de valores; no entanto, Beta é considerada compará- vel com outras empresas cujas ações são negociadas em um mercado ativo. PERGUNTA: qual(is) técnica(s) de avaliação Alfa deverá utilizar na estimativa do valor justo da sua participação acionária em Beta? A abordagem de custo, geralmente, não é apropriada para estimar o valor justo dos investimentos em ações. Abordagens de mercado e de receita são técnicas de avaliação comuns em estimar o valor justo dos investimentos em ações que não são negociadas publicamente. Alfa não é obrigada a utilizar tanto a abordagem de mercado quanto a abordagem de receita, depende dos fatos específicos e das circunstâncias. Por exemplo: quando não são necessários ajustes significativos em 94 Contabilidade Avançada relação à abordagem de mercado (ou seja, nível 2 de entradas de dados), seria aceitável usar apenas a abordagem de mercado na estimativa do valor justo dos investimentos em ações (ALMEIDA, 2018, p. 26). Fonte: Almeida, 2018, p. 26 4.3.4 Valor justo no reconhecimento inicial Alguns Pronunciamentos Contábeis exigem ou permitem que um ativo ou passi- vo seja inicialmente reconhecido pelo seu valor justo. Na maioria dos casos, o preço da transação é igual ao valor justo. Ao determinar se um preço de transação, pago para adquirir o ativo ou recebido para assumir o passivo (preço de entrada), representa o valor justo no reconheci- mento inicial, o profissional contábil deverá considerar fatores específicos para a transação e para o ativo ou passivo. Conforme trata o item B4, o preço de transação pode não representar o valorjusto no reconhecimento inicial, como: • Uma transação com parte relacionada; • Uma transação sob coação ou uma transação forçada; • A unidade de contabilização do preço da transação não representa a unidade de contabilização do ativo ou passivo que está sendo mensurado; ou • O mercado no qual ocorre a transação é diferente do mercado principal para o ativo ou passivo que está sendo mensurado. (CPC, 2012) O ganho ou a perda do Dia 1 apurado em um instrumento financeiro (ou seja, no reconhecimento inicial do instrumento) é reconhecido no resultado da empresa apenas quando o valor justo desse instrumento é evidenciado por um preço cotado em um mercado ativo (isto é, uma entrada de Nível 1) ou com base em uma técnica de avaliação que usa apenas dados de mercados observáveis. 4.3.5 Mensuração subsequente do valor justo O item 64 do CPC 46 orienta o profissional contábil que, se uma técnica de ava- liação com dados não observáveis for utilizada para reconhecimento inicial do valor justo, essa mesma técnica deverá ser ajustada para os períodos subsequentes, de modo que, no reconhecimento inicial, o resultado da técnica de avaliação seja igual ao preço da transação. Esse ajuste da técnica assegura que a avaliação reflita as condições de mercado no momento da avaliação e ajude o profissional contábil a determinar se é neces- sária alguma alteração na técnica de avaliação. 4.4 Hierarquia do valor justo Vídeo Para aumentar a consistência e a comparabilidade das mensurações do valor justo, o CPC 46 estabelece uma hierarquia de valor justo dividido em três níveis, com base nas informações (inputs) aplicadas às técnicas de avaliação utilizadas para mensuração do valor justo. Mensuração do valor justo 95 Vamos analisar os três níveis da hierarquia do valor justo introduzidos pelo CPC 46: • Informações de Nível 1 (item 76) São preços cotados (não ajustados) em mercados ativos para ativos ou passivos idênticos a que a empresa possa ter acesso na data de mensuração. Esses preços cotados oferecem a evidência mais confiável do valor justo e de- vem ser utilizados sem ajustes para mensurar o valor justo, por serem disponibili- zados publicamente por terceiros sobre transações reais. Alguns exemplos de instrumentos que geralmente se qualificam como mensu- rações de valor justo de Nível 1: • Ações de empresas listadas e negociadas em mercados ativos, com disponi- bilidade e liquidez, mercado bursátil, externo à empresa (exemplo: Bolsas de Valores de São Paulo, NYSE e NASDAQ); • Preços dos contratos futuros de metais, cotados na London Metal Exchange (LME); • Contratos de futuros e opções negociados em bolsa. Exemplo Alfa possui participação acionária de 17% em Beta (170 milhões de ações). Su- ponha que Beta é uma empresa listada em bolsa de valores e suas ações são nego- ciadas em um mercado ativo. Alfa contabiliza a participação acionária de 17% em Beta, de acordo com o CPC 48 – Instrumentos Financeiros. a. Como deve Alfa determinar o valor justo de sua participação acionária de 17% em Beta? b. Alfa deve determinar o valor justo de sua participação de 17% com base no preço cotado por ação multiplicado pelo número de ações? c. Ou deveria Alfa considerar o bloco de ações na determinação do valor justo da participação de 17%? (1) O CPC 48 requer que a participação acionária de 17% seja mensurada pelo valor justo. (2) Qual é a unidade contábil, de acordo com o CPC 48? A participação indi- vidual (onde as ações são negociadas em um mercado ativo). No CPC 48, a unidade contábil é geralmente um instrumento individual. (3) Alfa mede o valor de mercado da participação acionária de 17% da seguin- te forma: preço cotado por ação × 170 milhões de ações (ALMEIDA, 2018, p. 19-20). Fonte: Almeida, 2018 • Informações de Nível 2 (item 81): São informações observáveis para o ativo ou passivo, seja direta ou indireta- mente, exceto preços cotados incluídos no Nível 1. O profissional contábil deve ter em mente que a hierarquia de valor justo prioriza as informações (inputs) obtidas das técnicas de avaliação, não as técnicas de avaliação propriamente ditas, utilizadas para mensurar o valor justo. Importante 96 Contabilidade Avançada A categorização de um ativo ou passivo como Nível 1 requer que ele seja nego- ciado em um mercado ativo. Se um instrumento não é negociado em um mercado ativo, ele é classificado no Nível 2. Entradas de Nível 2 são entradas observáveis, direta ou indiretamente, mas não se qualificam como Nível 1. As entradas de Nível 2 podem incluir os seguintes itens: • Uma cotação de negociante para um título não líquido, desde que o nego- ciante esteja pronto e capaz de negociar. • O fornecedor ou corretor forneceu preços indicativos, se a devida diligência pela entidade relatora indicar que os preços foram desenvolvidos usando da- dos de mercado observáveis. • Informações que não sejam preços cotados, mas que são observáveis para o ativo (ou passivo), como taxas de juros e curvas de rendimento observáveis em intervalos comumente cotados, volatilidades implícitas e spreads de crédito. Exemplo Alfa possui uma propriedade para investimento que é contabilizada usando o modelo do valor justo, de acordo com o CPC 28. Segundo o laudo de avaliação, o valor justo da propriedade para investimento é determinado com base no valor justo de propriedades comparáveis no local semelhante. PERGUNTA: como Alfa deve categorizar a mensuração do valor justo (ou seja, Nível 1, 2 ou 3)? Nível 2, porque o justo valor é determinado com base em dados de mercado observáveis significativos para a mensuração do valor justo (ou seja, os preços de mercado das propriedades comparáveis em local semelhante). Não houve entra- das não observáveis ou ajustes feitos que teriam um impacto significativo (CPC, 2018, p. 27). Fonte: Almeida, 2018 • Informações de Nível 3 (item 86): São dados não observáveis para o ativo ou passivo. O item 87 do CPC 46 (2012) indica que dados não observáveis devem ser utili- zados para mensurar o valor justo, uma vez que dados observáveis relevantes não estejam disponíveis, admitindo, assim, situações em que há pouca ou nenhuma atividade de mercado para o ativo ou passivo na data de mensuração. Mesmo quando as entradas de Nível 3 são usadas, o objetivo de mensuração do valor justo permanece o mesmo, isto é, refletem um preço de saída na data de mensuração da perspectiva de um participante do mercado que detém o ativo ou deve o passivo. Portanto, as entradas não observáveis devem refletir as premissas de que os participantes do mercado usariam ao precificar o ativo ou o passivo (in- cluindo suposições sobre risco). As entradas de Nível 3 podem incluir informações derivadas por extrapolação ou interpolação que não podem ser diretamente corroborados por dados de mer- cado observáveis. Mensuração do valor justo 97 As entradas que normalmente não são observáveis e são consideradas como Nível 3 incluem: • Entradas obtidas de cotações de corretores que são indicativas (ou seja, não firmes e capazes de serem negociadas após) ou não corroboradas por tran- sações de mercado. • Premissas de gestão que não podem ser corroboradas por dados de merca- do observáveis. • Preços fornecidos pelo fornecedor, não corroborados por transações de mercado. Exemplos de instrumentos que, normalmente, são medições de nível 3: • Instrumentos complexos, como taxas de juros de longo prazo e swaps de moeda e estruturados derivados. • Títulos garantidos por ativos de renda fixa, dependendo do ativo específico possuído (ou seja, o específico tranche), a natureza do modelo de avaliação usado e se os dados são observáveis. No Quadro 2, apresentamos, por meio de informações da PwC (2019), uma sín- tese das características de cada nível, para melhor compreensão. Quadro 2 Resumo das características de cada nível da hierarquia de valor justo Nível Características 1 • Observável • Preços cotados para ativos ou passivos idênticosem mercados ativos (que não devem ser ajustados) 2 • Preços cotados para itens semelhantes em mercados ativos • Preços cotados para itens idênticos / semelhantes, sem mercado ativo • Passivos negociados como ativos em mercados inativos 3 • Entradas não observáveis (exemplo: dados da própria empresa que divulga suas de- monstrações contábeis) • A perspectiva do participante do mercado (não específica da entidade) ainda é necessária Fonte: PwC, 2019, tradução nossa. Veja a Figura 2, que mostra as mensurações do valor justo sendo categorizadas em sua totalidade com base nas entradas de informações (inputs) em seus respec- tivos níveis, sendo o Nível 3 o mais significativo para toda a medição. Figura 2 Estrutura de hierarquia de valor justo (para os Níveis 2 e 3) Existe preço cotado para um item idêntico em um mercado ativo? Alguma das informações (inputs) é não observável? O preço é ajustado? NÍVEL 1 NÍVEL 2 NÍVEL 3 Sim Sim Sim Não Não Fonte: Adaptado de KPMG, 2017 (traduzido pelo autor). Não 98 Contabilidade Avançada • Estrutura de apoio para aplicação dos Níveis 2 e 3: Considerando o maior grau de subjetividade e complexidade na distinção da aplicação dos conceitos presentes nos Níveis 2 e 3, a Figura 3 apresenta uma es- trutura que ajudará o profissional contábil na análise e no enquadramento desses respectivos Níveis. Figura 3 Estrutura de hierarquia de valor justo (para os Níveis 2 e 3) Determinar as informações de entrada (inputs) Informações de entrada (inputs) significativas Informações de entrada (inputs) não significativas Determinar o nível das informações de entrada (inputs): Nível 2 ou Nível 3? Avaliar os requisitos de divulgação Reavaliar as conclusões em cada período de preparação do balanço e demonstrações contábeis Observáveis Não observáveis Etapa 1 Etapa 2 Etapa 4 Etapa 5 Etapa 6 Etapa 3 Fonte: Adaptado de PwC, 2019, tradução nossa. Mensuração do valor justo 99 A seguir, passamos a analisar, com maiores detalhes, cada uma das etapas apresentadas na Figura 3, para um melhor entendimento do enquadramento dos ativos e/ou passivos a serem realizados nos Níveis 2 ou 3. Etapa 1: Determinar as informações de entrada (inputs) As entradas podem incluir informações de preços, crescimento da receita, mu- danças em rentabilidade, fatores de volatilidade, dados de crédito específicos e amplos, estatísticas de liquidez e todos os outros fatores que tenham efeito na mensuração do valor justo. O profissional contábil deve priorizar o uso de informa- ções observáveis, sempre que estiverem disponíveis. Etapa 2: Determinar quais entradas são significativas Em alguns casos, uma técnica de avaliação usada para mensurar o valor justo pode incluir entradas de vários níveis da hierarquia do valor justo. O item 73 do CPC 46 (2012) indica que o ativo ou o passivo deve ser categorizado no nível mais baixo de uma entrada significativa. Exemplo: um dado significativo não observável tem como resultado que todo o ativo ou o passivo deva ser classificado no Nível 3. O profissional contábil, portanto, precisa identificar todas as entradas signifi- cativas, ao determinar a classificação apropriada dentro do nível de hierarquia e avaliar a importância de determinada entrada para a mensuração do valor justo. Isso requer julgamento e deve considerar fatores específicos para o ativo ou pas- sivo. Por isso, fica a cargo do profissional contábil desenvolver e aplicar, de modo consistente, uma política da relevância. Por fim, o profissional contábil deve realizar a avaliação de relevância em um nível de entrada individual e um nível de entrada agregado, considerando a agre- gação de entradas, quando mais de um item de dados não observáveis (ou mais de um parâmetro) é usado para medir o valor justo de um ativo ou passivo. Etapa 3: Determinar se entradas significativas são observáveis As entradas observáveis incluem: • preços ou cotações de bolsas ou mercados listados (exemplos: Bolsa de Va- lores de São Paulo, Bolsa de Valores de Londres, London Metal Exchange) em que haja atividade suficiente; • dados de mercado observáveis que, comprovadamente, estão altamente cor- relacionados e têm uma lógica econômica em relação ao instrumento a ser avaliado (exemplo: preços de eletricidade em dois locais diferentes que são altamente correlacionadas); • outros dados de mercado diretos e indiretos que são observáveis no mercado. Determinar o que constitui entradas observáveis exige um julgamento signifi- cativo. Por isso, a lista de características a seguir fornece algumas evidências de que uma entrada é derivada de dados de mercado observáveis. No entanto, as entradas não precisam ter todas as características para se qualificar como dados de mercado observáveis. • Transações de mercado: evidência de que: (1) as fontes de dados extraem suas informações do mercado real, transações entre outros participantes do mercado; (2) a informação é usada pelo mercado participante para precificar as transações reais. 100 Contabilidade Avançada • Não exclusivo: os dados devem estar disponíveis e serem usados regular- mente pelos participantes no mercado, como base para as transações de pre- ços ou para verificar esses preços. • Prontamente disponível: os participantes do mercado devem ser capazes de obter acesso aos dados, embora o fornecedor das informações possa im- por uma taxa razoável de acesso. • Distribuído regularmente: dados são disponibilizados de maneira oportu- na, suficiente para permitir que os dados sejam significativos nas decisões de preços. • Transparente: pessoas/fontes que fornecem e/ou distribuem os dados. Sua função em determinado produto/mercado deve ser transparente e confiável. • Verificável: evidências de que os usuários regularmente verificam os dados, comparando-os com dados obtidos de outras fontes confiáveis. • Confiável: as empresas devem testar e revisar a confiabilidade dos dados de uma fonte, em uma base contínua, antes de realmente usar essa fonte para determinar ou divulgar o valor justo de mensuração. • Base consensual: dados ou entradas que são fornecidos por fontes múltiplas devem ser comparáveis dentro de um intervalo razoável, antes que uma empre- sa possa considerar as informações como um consenso de mercado. • Fontes ativas e envolvidas no mercado relevante: os dados devem se ori- ginar de um participante ativo no que diz respeito ao produto e no mercado relevante. Além disso, a empresa que está usando os dados deve demons- trar, periodicamente, que a fonte dos dados fornece informações confiáveis sobre uma base. Gelbcke et al. (2018, p. 140) também destacam como o profissional contábil deve proceder quando é necessário definir dados não observáveis: Dados não observáveis podem ser desenvolvidos pela entidade, conside- rando as melhores informações disponíveis, as quais podem incluir dados próprios da entidade, desde que os ajustes necessários sejam feitos quan- do existirem evidências de que outros participantes do mercado utilizariam dados diferentes ou se houver algo específico para a entidade que não estiver disponível para outros participantes do mercado (por exemplo, uma siner- gia específica da entidade). Apesar disso, o normativo orienta que a entidade não precisa empreender esforços exaustivos para obter informações sobre as premissas dos participantes do mercado, devendo levar em conta as infor- mações que estiverem razoavelmente disponíveis. Etapa 4: Determinar o nível das informações de entrada (inputs) A avaliação dos dados significativos determina a classificação do ativo ou do passivo na hierarquia de valor justo. Segundo Gelbcke et al. (2018, p. 155), o uso de informações como as men- cionadas (informações de Nível 2) certamente implica em fazer ajustes, depen- dendo de fatores específicos do ativo ou passivo, como em função do seguinte: • A condição ou localização do ativo. • Em que medida as informações estão relacionadas a itensque são compará- veis ao ativo (ou passivo). Mensuração do valor justo 101 • O volume ou nível de atividade nos mercados em que as informações são observadas. Deve ser dada atenção especial aos ajustes efetuados nas informações de Nível 2, pois sempre que a informação for relevante para a mensuração como um todo e esse ajuste utilizar dados não observáveis significativos, então a mensuração do valor justo deverá ser classificada no Nível 3 da hierarquia de valor justo. Exemplo Contratos futuros de petróleo – classificação Nível 2 ou Nível 3 A empresa G detém contratos futuros de petróleo na Bolsa Mercantil de Nova York (NYMEX). Na data do relatório, a Empresa G obtém o preço de fechamento dos futuros do petróleo da NYMEX. Na data do relatório, mas após a hora de fechamen- to da NYMEX, há um anúncio público que afeta os preços do petróleo e os instru- mentos financeiros relacionados. Isto é evidenciado pelos preços dos contratos a prazo de petróleo transacionados no mercado de balcão na data de relato. A empresa G precisa avaliar os preços de futuros com contratos futuros para le- var em consideração o quão correlacionados os mercados futuros e futuros estão. Se essa análise suportar uma correlação, e o coeficiente de correlação for diferente de 1, esse fator pode ser aplicado aos preços a termo do mercado de reposição, para determinar os ajustes apropriados para o preço cotado no NYMEX. Por causa do ajuste ao preço obtido no mercado principal, a mensuração do valor justo resultante geralmente seria considerada de Nível 2, a menos que os dados não observáveis sejam significativos, caso em que uma designação de Nível 3 seria apropriada. Fonte: KPMG, 2017, p. 58 Etapa 5: Avaliar os requisitos de divulgação Os requisitos de divulgação do CPC 46 podem ser divididos em duas áreas, aquelas que explicam (1) o valor justo de todo o ativo ou passivo e (2) a(s) entrada(s) significativa(s) para a mensuração do valor justo. Etapa 6: Reavaliar as conclusões em cada período de preparação do balanço e das demonstrações contábeis A categorização de um determinado instrumento na hierarquia de valor jus- to pode mudar com o tempo. Por esse motivo, conforme os mercados evoluem, alguns ativos ou passivos podem se tornar mais ou menos líquidos, os dados podem se tornar mais ou menos observáveis e, portanto, o nível na hierarquia do valor justo pode mudar. Sendo assim, é importante avaliar a adequação con- tinuada dos níveis em que as mensurações de valor justo são categorizadas em cada data de relatório. 102 Contabilidade Avançada 4.5 Identificando transações que são forçadas Vídeo No item B43 do CPC 46, encontramos os principais pontos de atenção que o profissional contábil deve ter a fim de identificar se uma transação pode ser iden- tificada como uma operação forçada. As circunstâncias que podem indicar que uma transação é forçada incluem: a) Não houve exposição adequada ao mercado por um período antes da data de mensuração para permitir atividades de marketing que são usuais e habituais para transações envolvendo esses ativos ou passivos sob condições de mer- cado atuais; b) Houve um período de marketing usual e habitual, mas o vendedor comercia- lizou o ativo ou o passivo a um único participante do mercado; c) O vendedor está em (ou próximo de) falência ou recuperação judicial (ou seja, o vendedor está em uma situação adversa); d) O vendedor foi obrigado a vender para satisfazer exigências regulatórias ou legais (ou seja, o vendedor foi forçado); e) O preço da transação é um valor atípico quando comparado a outras tran- sações recentes para o mesmo ativo ou passivo ou para um ativo ou passivo similar. (CPC, 2012) O profissional contábil avaliará as circunstâncias para determinar se, com base nas evidências disponíveis, a transação é ou não forçada e quais são seus efeitos sobre a mensuração do valor justo dos ativos ou dos passivos, sendo analisado no balanço e na preparação das demonstrações contábeis. Se as evidências apontam que a transação pode ser classificada como forçada, o profissional contábil deve atribuir pouco ou nenhum peso (em comparação com outras indicações do valor justo) a esse preço da transação. 4.6 Divulgação Vídeo Um fato relevante e fundamental a ser observado pelo profissional contábil é que, conforme a objetividade das informações de entradas (inputs) diminui, a sua divulgação em notas explicativas aumenta. Certas divulgações exigidas são apli- cáveis apenas aos ativos e passivos de valor justo caracterizados como Nível 3, os quais utilizam dados não observáveis. Gelbcke et al. (2018, p. 158) reforçam essa preocupação na divulgação dando ênfase especial aos Níveis 2 e 3, compreendendo todas as premissas utilizadas na obtenção dos valores. Com isso, os usuários poderão compreender os efeitos da mensuração do valor justo nos resultados e na situação patrimonial das empresas. É fundamental, então, a divulgação completa e transparente dessa base de mensu- ração nas notas explicativas das demonstrações contábeis. O CPC 46, no item 91, aponta que a empresa deve se preocupar em divulgar informações que auxiliem os leitores de suas demonstrações contábeis a avaliar as técnicas de avaliação e informações de mensuração de valor justo, após o re- conhecimento inicial, bem como o efeito das mensurações recorrentes de valor justo classificadas no Nível 3 sobre o resultado do período ou outros resultados abrangentes do período. Mensuração do valor justo 103 As exigências (mínimas) de divulgações determinam as classes de ativos e pas- sivos, considerando dois aspectos: (i) natureza, características e riscos do ativo ou passivo; e (ii) nível da hierarquia de valor justo no qual a mensuração do valor justo está classificada. A determinação dessas classes requer o julgamento por parte do profissional contábil. Sempre que outro Pronunciamento especificar a classe de um ativo ou passivo para atender às exigências de divulgação, a entidade pode utilizar essa classe, des- de que ela atenda às especificações do CPC 46 para o cumprimento do objetivo de divulgação estabelecido. Novamente, Gelbcke et al. (2018, p. 158) chamam nossa atenção para as mensu- rações que podem ser recorrentes ou não. As mensurações recorrentes são aquelas exigidas ou permitidas por um Pro- nunciamento e que devem ser feitas ao final de cada período contábil (para o qual a entidade reporta suas demonstrações contábeis). As mensurações não recorrentes são aquelas exigidas ou permitidas por um Pronunciamento e que são feitas em circunstâncias específicas, como é o caso da mensuração a valor justo da participação remanescente em investida na data em que a entidade perdeu o controle (exigência do CPC 36 – Demonstra- ções Consolidadas) ou o caso da mensuração de um ativo mantido para venda ao valor justo menos os custos para vender (exigência do CPC 31 – Ativo Não Circulante Mantido para Venda e Operação Descontinuada) sempre que o valor justo menos os custos para vender do ativo for menor que o seu valor contábil. Dependendo das circunstâncias, uma mensuração pode ser reclassificada de um nível para outro na hierarquia de valor justo. Desse modo, como destaca o item 95, “a empresa deve divulgar e seguir de forma consistente sua política contábil para determinar quando se considera que ocorreu uma transferência entre níveis da hierarquia de valor justo” (CPC, 2012). São exemplos de políticas para a determi- nação da época das transferências, a critério da empresa, a data do evento ou da mudança nas circunstâncias que causou a transferência, ou o início do período das demonstrações contábeis, ou o final do período das demonstrações contábeis, o que é coberto no item 95 do CPC 46. CONSIDERAÇÕES FINAIS Neste estudo, tratamos das formas de mensuração do valor justo, das técnicas de avaliação aplicadas à mensuração, das hierarquias existentes para apuração do valor justo de ativos e passivos e dos aspectos principais de divulgação em notasexplicati- vas da mensuração do valor justo nas demonstrações contábeis das empresas. Foi possível constatar que os assuntos aqui mencionados foram abordados de uma for- ma assertiva e clara. Ainda assim, é fato que o valor justo e a sua mensuração são assuntos complexos e subjetivos, dentro do arcabouço contábil dos Pronunciamentos Técnicos. Reforçamos com isso a necessidade de o profissional contábil concentrar seus es- forços no desenvolvimento e na atualização de suas habilidades técnicas, de modo a desempenhar o papel protagonista na empresa em que atua. O mesmo se aplica para quem presta serviços nesses cenários complexos e variados, em que a contabilidade se apresenta como uma ciência relevante no ambiente estratégico e como ferramenta de apoio fundamental aos gestores da administração. 104 Contabilidade Avançada ATIVIDADES 1. Com base nas informações apresentadas neste capítulo, você acredita que é possível aplicar o CPC 46 sem conhecer os demais Pronunciamentos Técnicos, quanto aos aspectos específicos da mensuração do valor justo de ativos e/ou passivos? 2. Quais são as ferramentas mínimas necessárias ao profissional contábil para poder empregar o CPC 46 de maneira adequada em suas rotinas contábeis? 3. Em sua opinião, a mensuração do valor justo apresenta características objetivas ou subjetivas? Justifique. REFERÊNCIAS ALMEIDA, M. C. Contabilidade intermediária em IFRS e CPC. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2018. CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis. Pronunciamento contábil CPC 23 – Políticas Contábeis, Mudança de Estimativa e Retificação de Erro. 16 set. 2009. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/ Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=54. Acesso em: 2 set. 2020. CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis. Pronunciamento contábil CPC 40 (R1) - Instrumentos Financeiros: Evidenciação. 30 ago. 2012. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos- Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=71 Acesso em: 2 set. 2020. CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis. CPC 46 – Mensuração do Valor Justo. 7 dez. 2012. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=78. Acesso em: 2 set. 2020. CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis. Pronunciamento contábil CPC 48 – Instrumentos Financeiros. 22 dez. 2016. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/ Pronunciamento?Id=106. Acesso em: 2 set. 2020. GELBCKE, E. R. et al. Manual de contabilidade societária: aplicável a todas as sociedades, de acordo com as Normas Internacionais e o CPC. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2018. KPGM. Fair value measurement – IFRS Standards and US GAAP. Dez. 2017. Disponível em: https://home. kpmg/xx/en/home/services/audit/international-financial-reporting-standards/ifrs-toolkit/ifrs-us-gaap- fair-value-measurement.html. Acesso em: 2 set. 2020. PWC ACCOUNTING GUIDE. Fair Value Measurements. Set. 2019. Disponível em: https://www.pwc.com/us/ en/cfodirect/publications/accounting-guides/fair-value-measurements-asc-820.html. Acesso em: 11 nov. 2020. http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=54 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=54 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=71 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=71 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=78 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=106 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=106 Receita de contratos com clientes 105 5 Receita de contratos com clientes As práticas contábeis para reconhecimento de receita de bens ou serviços, originadas de operações de venda entre a empresa e seus clientes, estavam distribuídas entre diferentes pronunciamentos técni- cos, interpretações e orientações que tratavam a respeito do tema. Essa separação das práticas em diferentes documentos técnicos provocava a ocorrência de inconsistências, falhas e interpretações divergentes na contabilização de transações semelhantes entre as empresas, o que era muitas vezes observado até naquelas empresas que atuavam em um mesmo segmento operacional. Assim, o Pronunciamento Técnico CPC 47 – Receita de Contrato com Cliente foi promulgado pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) em 4 de novembro de 2016 com o objetivo principal de estabelecer um único modelo para o reconhecimento e a mensuração das obrigações de performance, proporcionando fundamentação para que, sendo aten- didos os requisitos técnicos previstos, a receita seja reconhecida. O CPC 47 está relacionado com a Norma Internacional de Contabilidade (IFRS 15 - Revenue from Contracts). Neste capítulo, portanto, estudaremos os principais conceitos do CPC 47, seus impactos na contabilidade das empresas, a aplicação do modelo de cinco etapas para reconhecimento da receita, os julgamen- tos significativos que precisam ser seguidos para o reconhecimento da natureza em determinadas situações e alguns aspectos de divulgações nas demonstrações contábeis das empresas. Boa leitura! 5.1 Principais conceitos dos contratos com clientes Vídeo Os princípios fundamentais das práticas contábeis anteriores ao CPC 47 eram baseados em risco e benefício. Para o CPC 47, o princípio fundamental consiste na empresa reconhecer suas receitas no momento da transferência do controle de bens ou serviços prometidos para o cliente, no valor que reflita a contraprestação acordada entre as partes. 106 Contabilidade Avançada A adoção do CPC 47 ocorreu a partir de 1 de janeiro de 2018 e aponta questões para as quais o profissional contábil deve estar atento devido ao seu maior grau de complexidade e relevância, como: (i) o foco no controle e quando ocorre a transfe- rência do bem ou serviço prometido ao cliente; (ii) o momento do reconhecimento da receita; e (iii) o exercício de julgamentos e uso de estimativas para a apuração do valor da contraprestação a ser paga pelo cliente. Os esforços sobre essas questões dependerão também da natureza das operações celebradas e do próprio segmen- to de atuação da empresa. Quando falamos sobre a transferência de controle dos bens precisamos saber da existência dos Incoterms (International Commercial Ter- ms), em português: Termos Internacionais de Comércio. Eles foram desenvolvidos pela Câmara de Comércio Internacional (International Chamber for Commerce - ICC) em 1936 e são normas padronizadas que regulam diversos aspectos do comércio internacional e entendimentos das responsabilidades entre as empresas e seus clientes em relação à alocação de riscos, custos e obrigações, presentes nos contratos de compra e venda. Atualmente, há uma lista extensa de Incoterms e seu tipo selecionado é negociado entre a empresa e o cliente, podendo impactar o momento da transferência do controle do bem. Esse ponto precisa ser considerado pelo profissional contábil quando for efetuar a análise do momento do reconhecimento da receita. Exemplo de Incoterms é o Free On Board (FOB) desti- no, significa que a titularidade do bem não passa para o cliente até a sua entrega e a empresa vendedora é responsável por quaisquer perdas que ocorrerem durante o trânsito do bem. Disponível em: https://www.fazcomex.com.br/blog/incoterms/; e em: http://www.aprendendoaexportar.gov.br/index.php/negociando-com-importador/incoterms. Acesso em: 2 set. 2020. Saiba mais Almeida (2018, p. 60) relaciona alguns dos principais segmentos que tiveram impacto nas suas práticas contábeis a partir das mudanças trazidas pelo CPC 47 (2016): – Entidades que vendem produtos e serviços em um pacote só. – Indústria automobilística - venda de carros juntamente com manutenção, sem segregar os dois elementos para reconhecimento de receita. – Indústria de telecomunicação - venda de celular com serviços de rede, sem segregar os dois elementospara reconhecimento de receita. – Indústria de software - venda do software com serviços de upgrade, sem se- gregar os dois elementos para reconhecimento de receita. – Licenças de propriedade intelectual - diversidade significativa na contabili- zação de licenças. – Indústria de venda de imóveis - receita que deve ser reconhecida ao longo do tempo de construção do ativo (antiga prática adotada no Brasil) ou num momento específico do tempo (quando o imóvel está pronto). Mesmo sabendo que esses segmentos em particular apresentam maior com- plexidade na aplicação desse CPC, é importante que o profissional contábil faça essa reflexão em sua empresa, mesmo ela não pertencendo a esses segmentos. Ele poderá se deparar com transações comerciais não usuais que precisarão ser avaliadas pelo modelo das cinco etapas, que será comentado detalhadamente nas próximas seções, para que o reconhecimento da receita seja feito de maneira ade- quada e alinhada à prática contábil vigente. 5.1.1 Alcance e aplicação do CPC 47 O item 5 do CPC 47 (2016) descreve que a empresa deve aplicar esse pronun- ciamento a todos os contratos com clientes, exceto para as seguintes situações que estarão no escopo de outros pronunciamentos técnicos também emitidos e vigentes: https://www.fazcomex.com.br/blog/incoterms/ Receita de contratos com clientes 107 a. Contratos de arrendamento dentro do alcance do CPC 06 – Arrendamentos; b. Contratos de seguro dentro do alcance do CPC 11 – Contratos de Seguro; c. Instrumentos financeiros e outros direitos ou obrigações contratuais dentro do alcance do CPC 48 – Instrumentos Financeiros, do CPC 36 – Demonstrações Consolidadas, do CPC 19 – Negócios em Conjunto, do CPC 35 – Demonstra- ções Separadas e do CPC 18 – Investimento em Coligada, em Controlada e em Empreendimento Controlado em Conjunto; e d. Permutas não monetárias entre entidades na mesma linha de negócios para facilitar vendas a clientes ou clientes potenciais. Por exemplo, este pronun- ciamento não se aplica a contrato entre duas empresas do setor de óleo e gás que pactuem a permuta de petróleo para satisfazer à demanda de seus clientes em diferentes locais especificados, de forma tempestiva. Observação: a permuta não monetária não é contemplada no CPC 47, pois ela não tem o que é chamado de substância comercial, não cumprindo com as exigências da Etapa 1, do modelo de cinco etapas de reconhecimento de receita que serão estudados nas próximas seções. Além das exceções indicadas no item 5, o profissional contábil deve estar atento para aplicar o CPC 47 para os contratos somente quando a contraparte for um cliente. Também é importante conhecer e identificar se o contrato celebrado com o cliente pode estar parcialmente dentro do alcance do CPC 47 e parcialmente dentro do alcance de outros pronunciamentos, como os listados no item 5. Exemplo: um contrato de arrendamento de um ativo e a manutenção dos equi- pamentos arrendados. Essas situações estão indicadas no item 7 do CPC 47 e podem ser melhor explo- radas na Figura 1 a seguir: Figura 1 Segregação do contrato entre o CPC 47 e outros Pronunciamentos Não Não Sim Não Sim SimO contrato está totalmente no alcance de outros CPC? Aplicar esses outros CPC e não o CPC 47 Este CPC possui orientação específica aplicável? O contrato está parcialmente no alcance de outros CPC? Aplicar o CPC 47 sobre o contrato e reconhecer a receita Primeiro, aplicar as orientações do outro CPC e, por fim, o que sobrar... Fonte: Adaptada de KPMG, 2016, p. 7. 108 Contabilidade Avançada Ao ter o primeiro contato com os conceitos do CPC 47, ficará evidente que o profissional contábil deve observar vários aspectos relevantes do pronunciamento, além de exercer seu julgamento e conhecer outros pronunciamentos técnicos para seu atendimento adequado e pleno, promovendo o reconhecimento da receita dos contratos celebrados. 5.1.2 Conceitos Os conceitos empregados neste capítulo foram obtidos, principalmente, do Apêndice A do CPC 47 (2016), dentre outras fontes, e incluem itens como: Cliente: parte que contratou a obtenção de bens ou serviços com a empresa, que constitui um produto das atividades normais da empresa, em troca de contra- prestação (valores monetários ou não monetários). Contrato: acordo entre duas ou mais partes que criam direitos e obrigações executáveis. Os contratos podem ser escritos ou verbais, por práticas comerciais usuais da empresa (popularmente conhecidas como “costume”). Também devem ser observadas questões relacionadas às jurisdições legais, aos setores e às pró- prias empresas envolvidas na negociação para definir se o acordo contratual cria direitos e obrigações exigíveis. Obrigação de performance: promessa em contrato com cliente para a trans- ferência ao cliente de: “Bem ou serviço (ou grupo de bens ou serviços) que seja distinto; ou Série de bens ou serviços distintos que sejam praticamente os mesmos e que tenham o mesmo padrão de transferência para o cliente” (CPC, 2016). Preço da transação (para contrato com cliente): valor da contraprestação à qual a empresa espera ter direito em troca da transferência de bens ou serviços prometidos ao cliente, excluindo valores cobrados em nome de terceiros. Preço de venda individual (bem ou serviço): preço pelo qual a empresa ven- deria um bem ou serviço prometido separadamente ao cliente. Controle do ativo: refere-se à “capacidade de determinar o uso do ativo e de obter substancialmente a totalidade dos benefícios provenientes do ativo. Inclui também a capacidade de evitar que outras empresas direcionem o uso do ativo e obtenham benefícios dele” (CPC, 2016). Benefícios do ativo: são os fluxos de caixa potenciais (entradas ou economias em saídas) que podem ser obtidos direta ou indiretamente de muitas formas, como os estabelecidos no item 33: (a) pelo uso do ativo para produzir bens ou prestar serviços (incluindo servi- ços públicos); (b) pelo uso do ativo para aumentar o valor de outros ativos; (c) pelo uso do ativo para liquidar passivos ou reduzir despesas; (d) pela venda ou troca do ativo; (e) pela caução do ativo em garantia de empréstimo; e (f) pela retenção do ativo (CPC, 2016). Receita: aumento nos benefícios econômicos durante o período contábil, originado no curso das atividades usuais da empresa, na forma de fluxos de Receita de contratos com clientes 109 entrada, ou aumentos nos ativos, ou redução nos passivos, que resultam em crescimento no patrimônio líquido e que não sejam provenientes de aportes dos participantes do patrimônio. Substância comercial: “espera-se que o risco, os prazos ou os montantes dos fluxos de caixa futuros da empresa sofram mudanças como resultado da execução do contrato” (GELBCKE et al., 2018, p. 540). 5.1.3 Refletindo sobre os principais impactos do CPC 47 Atualmente, é possível observarmos que o mercado empresarial está mais familiarizado e incorporou em suas atividades e transações comerciais as novas práticas trazidas pelo CPC 47. Contudo é pertinente falarmos sobre os principais impactos introduzidos por esse novo pronunciamento técnico e que podem servir como referência para o profissional contábil verificar se tais assuntos foram ma- peados, avaliados e devidamente implantados pela administração da sua empresa e em suas rotinas contábeis. São eles: a) Novas estimativas, julgamentos e mudanças em estimativas É possível identificar que novos julgamentos e estimativas foram introdu- zidos com o CPC 47, o que pode afetar tanto o valor quanto o momento de reconhecimento da receita de bens ou serviços. Provavelmente, em determi- nadas situações também ocorreram mudanças nas estimativas estabelecidas pela administração da empresa. Neste último caso, o profissional contábil deve analisar o enquadramento de mudanças de estimativas contábeis sob a ótica do CPC 23 – Políticas Contábeis, Mudança de Estimativa e Retificação de Erro, se necessário. b) Mudança no momento do reconhecimento da receita O reconhecimentoda receita pode ocorrer em um momento específico no tempo ou ao longo do tempo. A administração deve avaliar a natureza das obri- gações de performance do contrato celebrado com o cliente por meio da revisão dos termos contratuais, considerando o que é legalmente executável na sua juris- dição. Cabe ao profissional contábil acompanhar as discussões e deliberações para que adote o modo de reconhecimento de receita mais adequado à realidade da empresa. c) Possível aceleração ou diferimento do reconhecimento de receita Como reflexo do item anterior, o reconhecimento da receita pode ser acelerado ou diferido para transações com múltiplos elementos, valores de contraprestação variável ou licenças, afetando o resultado apurado, as métricas e os índices finan- ceiros das empresas. d) Revisões tributária e dos planos de incentivo de vendas Ajustes decorrentes da definição do momento do reconhecimento e do valor de receitas, despesas e custos podem servir de base e oportunidade para uma revisão e/ou um planejamento tributário. Também pode ser necessário reavaliar os bônus e programas de incentivo para funcionários, principalmente àqueles alocados nas 110 Contabilidade Avançada áreas comercial e de vendas, visando garantir alinhamento entre as metas corpo- rativas, indicadores e mesmo acordos coletivos celebrados. e) Reconsideração dos processos de vendas Para algumas empresas, a reavaliação dos termos contratuais e das práticas co- merciais atuais, por exemplo, canais de distribuição, pode ter atingindo determina- do perfil de receita, o que também pode impactar o resultado apurado, as métricas e os índices financeiros da empresa. f) Necessidade de atualização, melhorias ou novos sistemas de TI A necessidade de captura de dados adicionais, por exemplo, dados detalhados utilizados para fazer estimativas de transações de receita e corroborar as divul- gações, pode suscitar a necessidade de atualização, melhorias ou mesmo novos sistemas e processos de TI. g) Revisão dos processos contábeis e dos controles internos Há a necessidade de capturar e armazenar informações na origem das áreas e processos, por exemplo, nas áreas comercial, vendas, marketing e desenvol- vimento de negócios, e de documentar essas informações de forma adequada, especialmente para gerar as estimativas e julgamentos contábeis com informa- ções suficientes para base do reconhecimento e definição do valor da receita. Essa demanda impacta, também, a revisão e a adequação dos controles internos necessários para assegurar a integridade das transações realizadas e a precisão dessas informações. h) Divulgações mais detalhadas nas demonstrações contábeis Preparação das divulgações exigidas pelo CPC 47 com base nas informações capturadas que serão incluídas e apresentadas nas demonstrações contábeis, exi- gindo esforços adicionais do profissional contábil, como um relacionamento mais próximo das áreas que geram estas informações detalhadas, além de mudanças e/ou melhorias nos sistemas de TI. 5.2 Reconhecimento, mensuração e custo do contrato Vídeo Conforme mencionado, a receita deve retratar a transferência do controle de bens ou serviços prometidos aos clientes. Almeida (2018, p. 61) destaca que “a re- ceita deve ser mensurada em um montante que reflita a remuneração que a em- presa espera ter direito em troca desses bens ou serviços”. Com o advento do CPC 47, a empresa deve reconhecer a receita de venda de seus bens ou serviços usando o modelo de cinco etapas descritas no referido pro- nunciamento técnico, que são as seguintes: (a) identificar o contrato; (b) identificar as obrigações de performance; (c) determinar o preço da transação; (d) alocar o preço da transação; e, por último, (e) reconhecer a receita (CPC, 2016). Receita de contratos com clientes 111 5.2.1 Aplicando o modelo de cinco etapas no reconhecimento da receita O princípio fundamental, e resultado final, do modelo de cinco etapas do CPC 47 é que a empresa deve ser capaz de reconhecer a receita quando ocorrer a trans- ferência do controle de bens ou serviços prometidos aos clientes, e o montante da receita a ser reconhecida deve refletir a contraprestação a receber em troca desses bens ou serviços. Para isso, o profissional contábil deve estar atento para a aplicação completa e adequada dos preceitos constantes no modelo das cinco etapas, o qual foi esque- matizado na Figura 2 a seguir. Figura 2 Modelo de cinco etapas no reconhecimento da receita Etapa 1: identificar o contrato com o cliente. Etapa 2: identificar as obrigações de performance no contrato. Etapa 3: determinar o preço da transação. Etapa 4: alocar o preço da transação às obrigações de performance no contrato. Etapa 5: reconhecer a receita no momento que (ou à medida que) a empresa satisfaz uma obrigação de performance. Bem ou serviço distinto - obrigação de performance 1. Bem ou serviço distinto - obrigação de performance 2. Alocar o preço da transação à obrigação de performance #1. Reconhecer a receita. Reconhecer a receita. Preço da transação para o contrato. Contrato (ou contratos combinados). Alocar o preço da transação à obrigação de performance #2. Fonte: Adaptada pelo autor de KPMG, 2016, p. 9. Observação: na figura, o resultado da análise da etapa 1 identificou que o contrato com o cliente possuía duas obrigações de performance que foram separadas na etapa 2. Essa análise deve se repetir para cada contrato (individualmente ou contratos combinados), e a quantidade de obrigações de performance identificadas e segregadas será estabelecida de acordo com o contrato. Agora, vamos explorar com maiores detalhes cada uma das cinco etapas do modelo de reconhecimento de receita. Etapa 1 – Identificar o contrato com o cliente: O profissional contábil deve orientar a administração que um contrato (ou con- trato combinado) celebrado com um cliente deverá ser contabilizado no caso de 112 Contabilidade Avançada estar dentro do alcance do CPC 47 e desde que todos os critérios a seguir apresen- tados na Figura 3 sejam atendidos. O que é um contrato combinado? O CPC 47 permite que a administração avalie e aplique seus preceitos em uma carteira de contratos. Isso é possível desde que os contratos dessa carteira tenham características similares e que não di- firam, significativamente, caso a aplicação do CPC ocorra nos contratos individuais da carteira. Para efetivar a contabilização, o profissional contábil e a administração deverão utilizar estimativas e pre- missas que reflitam o tamanho e a composição da carteira de contratos nesse escopo, assunto que é contemplado no item 4, CPC 47. Figura 3 Critérios requeridos para existência de um contrato com um cliente ... o recebimento da contraprestação é provável (CPC 47, 2016, item 9, letra “e”) ... tem essência (substância) comercial (CPC 47, 2016, item 9, letra “d”) ... direitos aos produtos e/ou serviços e condições de pagamento podem ser identificados (CPC 47, 2016, item 9, letras “b” e “c”) ... está aprovado e as partes estão comprometidas com suas obrigações (CPC 47, 2016, item 9, letra “a”) Um contrato existe se... Fonte: Adaptada de KPMG, 2016, p. 10. Analisando cada um dos critérios, podemos entender de forma mais aprofunda- da a essência desses conceitos trazidos pelo CPC 47: a) Recebimento da contraprestação é provável A avaliação do recebimento da contraprestação provável (item 9, letra ”e”) se re- fere à expectativa de recebimento de valores monetários pela empresa que vendeu e transferiu o controle do bem ou serviço ao seu cliente. Nessa avaliação, o profis- sional contábil considera a capacidade e a intenção do cliente em pagar esse valor quando for devido. O critério estabelecido pelo CPC 47 busca evitar que a admi- nistração aplique o modelo de receita para contratos problemáticos e, ao mesmo tempo, reconheça a receita e uma grande perda por redução do valor recuperável, devido a uma falta de expectativa de recebimento oumesmo liquidez do cliente. b) A essência comercial A essência (substância) comercial do contrato (item 9, letra “d”) está atrelada à expectativa de que o risco, os prazos ou os montantes dos fluxos de caixa futuros da empresa se modifiquem ao longo da execução do contrato. O CPC 47 indica que um contrato não existirá se cada uma das partes detiver o direito incondicional de rescindir inteiramente o contrato não cumprido, sem com- pensar a outra parte (ou partes). Um contrato será inteiramente não cumprido se ambos os critérios a seguir, disposto no item 12, forem atendidos (CPC, 2016): “A entidade ainda não transferiu Receita de contratos com clientes 113 nenhum bem ou serviço prometido ao cliente; e A entidade ainda não recebeu e ainda não tem o direito de receber qualquer contraprestação em troca dos bens ou serviços”. c) Direitos aos bens ou serviços e condições de pagamento Os direitos aos bens ou serviços e condições de pagamento (item 9, letras “b” e “c”) podem ser identificados e estão alinhados com os aspectos legais da jurisdição na qual o contrato foi celebrado. Lembrando que os contratos podem ser escritos ou verbais, dependendo das práticas comerciais usuais de uma empresa. d) Contrato aprovado pelas partes O contrato, mesmo não sendo escrito, precisa ser aprovado entre as partes en- volvidas na negociação e na transação comercial (item 9, letra “a”), estando compro- metidas com suas obrigações e execução. Impacto da avaliação dos critérios do item 9, CPC 47: segundo o item 13, se os critérios descritos anteriormente forem atendidos no início da vigência do contrato celebrado com o cliente, o profissional contábil não deve reavaliar esses critérios, a menos que haja alguma alteração significativa (ou indicação de alteração significa- tiva) nos fatos e circunstâncias que serviram de base para a celebração do contrato entre as partes (CPC, 2016). Já segundo o item 14, se o contrato com o cliente não atender aos critérios do item 9 no início do documento, o profissional contábil deve continuar avaliando-o para determinar se, no futuro, esses critérios serão atendidos (CPC, 2016). Etapa 2 – Identificar as obrigações de performance No início do contrato, a administração deve avaliar os bens ou serviços que re- presentam uma promessa em contrato (ou conjunto de contratos) com um cliente. A promessa constitui uma obrigação de performance caso o bem ou serviço pro- metido seja distinto, devendo ser contabilizado em separado. Um bem ou serviço prometido é distinto se preencher os dois critérios a seguir: Critério 1 O cliente pode se beneficiar do bem ou serviço por conta própria juntamente com outros recursos que estão prontamente disponíveis para ele (item 27, letra “a”, CPC 47). Critério 2 A promessa da entidade de transferir o bem ou serviço para o cliente é separadamente identificável de outras promessas no contrato (item 27, letra “b”, CPC 47). Resultados Se os critérios 1 e 2 forem atendidos simultaneamente, a obrigação de performance é distinta. Se um dos critérios mencionados não for atendido, não é uma obrigação de performance distinta, e os bens ou serviços devem ser combinados com outros bens ou serviços prometidos. Podem ocorrer casos em que a empresa deverá contabilizar todos os bens ou serviços prometidos no contrato como uma única obrigação de performance. 114 Contabilidade Avançada O Critério 1 já vinha sendo utilizado amplamente pelas empresas, de modo geral, antes da adoção do CPC 47. O Critério 2 é um conceito novo que exige da administração e do profissional contábil atenção e julgamento para sua aplicação. O objetivo ao avaliar se um bem ou serviço prometido é separadamente iden- tificável é determinar se a natureza da promessa da empresa, de acordo com o contrato, transferirá individualmente bens ou serviços para o cliente, ou transferirá em conjunto um bem combinado em que os bens ou serviços sejam insumos. Os indicadores de que a promessa para entregar bens ou serviços não é sepa- radamente identificável incluem, de acordo com o item 29: • A empresa fornece um serviço significativo de integração do bem ou serviço com outros bens ou serviços prometidos no contrato. • Um, ou mais, bem ou serviço modifica ou personaliza significativamente, ou é modificado ou personalizado significativamente por um, ou mais, outro bem ou serviço prometido no contrato. • Os bens ou serviços são altamente interdependentes ou altamente inter-relacionados com outros bens ou serviços prometidos no contrato. (CPC, 2016) Um dos exemplos mais elucidativos sobre a aplicação do Critério 2 e sobre a identificação da obrigação de performance distinta de bens ou serviços separados ou em conjunto é fornecido por Gelbcke et al. (2018, p. 541), reproduzido a seguir: Exemplo Tome-se como exemplo os contratos de fornecimentos de bens e serviços em conexão com a telefonia celular. São frequentes as situações em que um cliente firma com a operadora de telefonia móvel um contrato pelo qual terá não só a prestação do serviço de telefonia (a linha de telefone habilitada para fazer e receber chamadas, enviar mensagens de texto etc.), mas também inclui a compra de um aparelho portátil (o telefone), pelo qual o cliente “aparente- mente” não paga nada. Pela ótica do cliente adquirente dos bens/serviços, essa transação ocorreu por meio de um único “pacote” negociado cuja implicação para ele é o compro- misso de realização de pagamento mensal de um determinado valor. Pela ótica da entidade vendedora dos bens/serviços, há claramente diferentes obrigações. Pela contraprestação que o cliente pagará, a empresa de telefonia se compro- meteu e já entregou um aparelho de telefone celular. Também se comprometeu a prestar serviços de telefonia, cujo desempenho se exerce ao longo do tempo e provavelmente se iniciou no instante em que o contrato foi firmado. Nesse caso, apesar de ser um único contrato, há obrigações de diferentes naturezas e padrões de cumprimento, o que evidentemente tem impactos so- bre o reconhecimento e a mensuração de receitas da entidade vendedora. Receita de contratos com clientes 115 Portanto, é fundamental identificar os bens ou serviços distintos que fazem parte de um mesmo contrato. Como vimos, serão distintos os bens/serviços dos quais o cliente poderá se beneficiar isoladamente (ou em conjunto com recur- sos prontamente disponíveis) e que representem uma promessa identificável separadamente das outras promessas do contrato. Etapa 3 – Determinar o preço da transação Primeiramente, é necessário entender que o preço da transação se refere ao valor da contraprestação que a empresa tem direito a receber quando é realizada a transferência de bens ou serviços para um cliente (ou seja, o pre- ço praticado entre as partes na transação celebrada), excluindo as quantias cobradas em nome de terceiros, como os tributos. Além disso, a contrapres- tação prometida em contrato com o cliente pode incluir valores fixos, valores variáveis ou ambos. Também há, conforme o item 49, uma premissa básica a ser considerada na de- terminação do preço da transação pelo profissional contábil e pela administração: de que bens ou serviços serão transferidos ao cliente de acordo com o contrato, o qual não será cancelado, renovado ou modificado ao longo do seu período de vigência (CPC, 2016). Ao determinar o preço da transação, o profissional contábil e a administração devem considerar os efeitos de todos os critérios a seguir, representados na Figura 4: Figura 4 Critérios para determinação do preço da transação (item 48, CPC 47) Valor da contraprestação variável (e a restrição do uso de estimativas) Consideração do risco de reversão da receita ao determinar quanto do valor de contraprestação variável incluir no preço da transação. Contraprestação não monetária A contraprestação não monetária é mensurada ao valor justo se razoavelmente estimável. Caso contrário, uma empresa utiliza o preço de venda independente dobem ou serviço que foi prometido em troca da contraprestação não monetária. Contraprestação a pagar a um cliente Determinação se a contraprestação devida a um cliente representa uma redução do preço da transação, um pagamento de um bem ou serviço distinto, ou uma combinação de ambos. Componente de financiamento significativo Para contratos com um componente de financiamento significativo, a empresa ajusta o valor prometido da contraprestação para refletir o valor do dinheiro no tempo. Preço da transação Fonte: Adaptada de KPMG, 2016, p. 14. É possível verificar o nível de complexidade na aplicação dos critérios que de- vem ser atendidos a partir da adoção do CPC 47 para a apuração do preço de transação. O grau dessa complexidade está diretamente associado ao desenho negocial das transações celebradas pela empresa. Portanto, é fundamental que o profissional contábil entenda a essência das transações comerciais celebradas pela administração e esteja próximo para que possa ter acesso integral às informações críticas que serão amplamente utilizadas por ele em suas rotinas contábeis. 116 Contabilidade Avançada A seguir, vamos analisar os critérios indicados em detalhes. a) Contraprestação variável (e a restrição do uso de estimativas) Segundo o item 51, o valor de uma contraprestação variável prometida no contrato será influenciado por descontos, créditos, concessões de preços, devo- luções ou bônus/penalidades de desempenho, ou seja, reduzido. A ocorrência ou não ocorrência de eventos futuros também influenciará o cálculo da con- traprestação variável. Como exemplos, podemos citar: produto vendido com direito de retorno; se o valor fixo for prometido como bônus de desempenho em caso de ser atingido um marco especificado (CPC, 2016). Portanto, dependendo dos fatos e das circunstâncias negociados e conhecidos, o profissional contábil estimará o valor de contraprestação variável usando um dos dois métodos de apuração indicados: (i) o valor esperado; ou (ii) o valor mais prová- vel. Assim, haverá a necessidade de se estabelecer um julgamento contábil. O que pode parecer algo abstrato para o profissional contábil é mais bem deta- lhado no item 52 do CPC 47, por meio das letras (a) e (b): a. O cliente possui uma expectativa válida decorrente das práticas usuais de negócios da entidade, das políticas publicadas ou de declarações específicas de que a entidade deva aceitar um valor de contraprestação que seja inferior ao preço declarado no contrato. Isto é, espera-se que a entidade ofereça uma concessão de preço. Dependendo da jurisdição, do setor ou do cliente, essa oferta pode ser referida como desconto, abatimento, restituição ou crédito; b. Outros fatos e circunstâncias indicam que a intenção da entidade, ao cele- brar o contrato com o cliente, é oferecer uma concessão de preço ao cliente. (CPC, 2016) A definição do melhor método de apuração do valor de contraprestação depen- derá de qual método o profissional contábil, conjuntamente com a administração, espera melhor prever o valor da contraprestação à qual tem direito. Encontramos os conceitos do valor esperado e do valor mais provável no item 53 do CPC 47: a. Valor esperado: é a soma de valores ponderados em função da probabilidade do conjunto de possíveis cenários e valores de contraprestação possíveis de serem recebidos. O valor esperado pode ser recomendado se a empresa tiver um grande número de contratos com características similares. No Exemplo a seguir esclarecemos o conceito de valor esperado: Exemplo A empresa Brazil Inc. vende uma placa de vídeo, modelo básico, pelo valor de R$ 300,00. Seus clientes geralmente solicitam descontos que são concedidos, conforme histórico a seguir. Vide os valores da contraprestação praticados (pre- ços) após os descontos concedidos: 75% – compram sem solicitar desconto, valor da contraprestação: R$ 300,00. 15% – compram com desconto, valor da contraprestação: R$ 280,00. 10% – compram com desconto, valor da contraprestação: R$ 250,00. Pelo método do valor esperado, temos o seguinte resultado: Uma fonte rica de informações que o profissional contábil pode (e deve) utilizar na análise do melhor método de apuração do valor da contraprestação é a que a própria administração usou para preparar a proposta comercial para o clien- te, em que foram estabelecidos preços, o detalhamento de outras condições comerciais para os bens ou serviços prometidos e que, por último, foram convertidos no contrato celebrado entre as partes. Dica Receita de contratos com clientes 117 Histórico da compra dos clientes com descontos concedidos (%) Valor da contraprestação Receita a ser reconhecida 75% R$ 300,00 R$ 225,00 15% R$ 280,00 R$ 42,00 10% R$ 250,00 R$ 25,00 Total R$ 292,00 Assim, a receita a ser reconhecida nessa situação será de R$ 292,00 por placa vendida. b. Valor mais provável: o valor mais provável é o valor único mais provável de uma gama de possíveis valores de contraprestação (ou seja, o resultado único mais provável do contrato). O valor mais provável pode ser uma esti- mativa apropriada do valor da contraprestação variável se o contrato tiver apenas dois possíveis resultados (por exemplo, a entidade atingir um bônus de desempenho ou não) (CPC, 2016). Aprofundaremos o conceito de valor mais provável no exemplo a seguir: Exemplo A empresa Service celebrou contrato de prestação de serviços pelo valor de R$ 300.000,00. No contrato encontra-se uma cláusula de desempenho indican- do que, se o serviço atender às condições previamente estabelecidas (dentro do prazo, indicadores de qualidade, entre outros itens), haverá um prêmio de 5% no pagamento. Portanto, com base no histórico de trabalhos similares realizados pela Service cujos resultados foram satisfatórios e atingiram condições prévias estabelecidas em outros contratos que possuíam essa cláusula de desempenho e o prêmio foi obtido, a estimativa de contrapartida que a empresa espera contabilizar será de R$ 315.000,00, ou seja, atendendo à cláusula de desempenho e ganhando o prêmio de 5%. Independentemente do método de apuração escolhido, o profissional contábil e a administração deverão utilizar esse método, e as estimativas decorrentes dessa apu- ração sobre os efeitos de incerteza, de modo consistente ao longo de toda vigência do contrato. Por isso, é importante que o profissional contábil tenha acesso a todas as informações relevantes e conheça a fundo a essência das transações celebradas. Mas atenção! Ao mesmo tempo em que o CPC 47 indica a necessidade de o pro- fissional contábil elaborar um estudo de estimativa contábil para apuração do valor da contraprestação variável de um contrato, ele também aponta algumas situações em que ocorrerá a restrição do uso de tais estimativas. Um dos principais fatores é quanto à existência de incertezas que apontem uma alta probabilidade de reversão significativa no valor das receitas apuradas, ou seja, um ajuste significativo redu- zindo o valor da receita acumulada reconhecida, o que poderá ocorrer a qualquer momento, posteriormente ou durante a execução do contrato. 118 Contabilidade Avançada Para essa avaliação, o profissional contábil e a administração devem discutir e considerar a existência de fatores que possam aumentar a probabilidade quanto à magnitude da reversão da receita, como as previstas no item 57, CPC 47: a. O valor da contraprestação é altamente suscetível a fatores fora da influência da entidade. Esses fatores podem incluir volatilidade no mercado, julgamento ou ações de terceiros, condições climáticas e alto risco de obsolescência do bem ou serviço prometido. b. Não se espera que a incerteza sobre o valor da contraprestação seja resolvi- da por longo período de tempo. c. A experiência da entidade (ou outras evidências) com tipos similares de contratos é limitada ou essa experiência (ou outras evidências) possui valor preditivo limitado. d. A entidade tem a prática de oferecer ampla gama deconcessões de preço ou de alterar os termos e condições de pagamento de contratos similares em circunstâncias similares. e. O contrato tem grande número e ampla gama de possíveis valores de con- traprestação. (CPC, 2016) De modo geral, ao final de cada período de preparação das demonstrações con- tábeis, o preço estimado da transação precisa ser reavaliado e, se necessário, atua- lizado para representar fielmente as circunstâncias presentes no final do período de preparação das demonstrações contábeis e as alterações nas circunstâncias du- rante esse período do relatório. Existindo alterações subsequentes na receita estimada do contrato, essa altera- ção deve ser contabilizada como receita, ou como redução da receita, no período em que o preço da transação mudar. No caso de uma alteração no preço da transação ocorrer devido à modificação do contrato, o profissional contábil deverá ter ainda mais atenção em proceder com a contabilização na data do evento de modificação do contrato, seja em função dos valores praticados ou talvez da modificação das obrigações de performance, sendo necessário avaliar se houve alteração da alocação destes (analisar em deta- lhes as prerrogativas indicadas no item 90). b) Existência de componente de financiamento significativo no contrato O profissional contábil deve observar se o contrato contém um componen- te de financiamento significativo (seja expressa ou implicitamente) que pode ser entendido como sendo o ato da administração decidir por fornecer ao cliente o benefício significativo de financiá-lo. Se sim, será necessário estimar o preço da transação do contrato, ajustando o valor prometido da contraprestação para refletir os efeitos do valor do dinheiro no tempo (ajuste a valor presente). Os con- ceitos do ajuste a valor presente são tratados no CPC 12 – Ajuste a Valor Presente, o qual não é o escopo deste livro. Segundo o item 61, o objetivo da aplicação desse critério é reconhecer a receita por um valor que reflita qual teria sido o preço de venda do bem ou serviço prome- tido se o cliente tivesse feito o pagamento quando da obtenção do controle desse bem ou serviço, ou seja, o preço à vista (CPC, 2016). Receita de contratos com clientes 119 Conforme o item 64, a taxa de desconto utilizada é aquela que seria usada em uma transação de financiamento separada entre a empresa e o cliente (CPC, 2016). A orientação aplica-se a pagamentos recebidos tanto antecipadamente quanto a prazo. Para a avaliação do componente de financiamento significativo no contrato, o CPC 47 adota uma abordagem de indicadores, incluindo ambos no seu item 61: a. a diferença, se houver, entre o valor da contraprestação prometida e o preço de venda à vista dos bens ou serviços prometidos; e b. o efeito combinado do disposto nos dois incisos seguintes: i. a duração de tempo esperada entre o momento em que a entidade transfere os bens ou serviços prometidos ao cliente e o momento em que o cliente paga por esses bens ou serviços; e ii. as taxas de juros vigentes no mercado pertinente. (CPC, 2016) Por outro lado, segundo o item 62, o contrato com o cliente não terá compo- nente de financiamento significativo se qualquer um dos seguintes fatores for verificado: a. O cliente pagou pelos bens ou serviços antecipadamente, e a época da trans- ferência desses bens ou serviços será determinada a critério do cliente. b. Um valor substancial da contraprestação prometida pelo cliente é variável, e o valor ou a época dessa contraprestação varia com base na ocorrência ou não ocorrência desse evento futuro que não esteja substancialmente dentro do controle do cliente ou da entidade (por exemplo, se a contraprestação consis- tir em royalties baseados em vendas). (CPC, 2016) No geral, a empresa não precisará ajustar o preço da transação em um con- trato para os efeitos de um componente de financiamento significativo se espera receber o pagamento em até 12 meses, antes ou após a transferência dos bens ou serviços prometidos. Exemplo Uma empresa realiza uma venda a prazo pelo valor de R$ 1.000,00. Porém, caso essa mesma transação fosse realizada à vista, seu valor de venda seria de R$ 850,00. É possível verificarmos que há um componente de financiamento embuti- do quando a modalidade de compra migra de “à vista para a prazo”. No momento da venda a prazo, a contabilização desse exemplo será: D – Clientes a receber R$ 1.000,00 C – Ajuste a valor presente (R$ 150,00) C – Receita de vendas (R$ 850,00) Na liquidação das contas a receber pelo pagamento do cliente, a contabiliza- ção desse exemplo será: D – Caixa/bancos R$ 1.000,00 D – Clientes a receber (R$ 1.000,00) D – Ajuste a valor presente R$ 150,00 C – Receita financeira (R$ 150,00) 120 Contabilidade Avançada c) Contraprestação a pagar ao cliente Essa situação prevista no CPC 47 (item 70) menciona que os valores à vista que a empresa precisa pagar (ou espera pagar) ao cliente, incluindo créditos ou itens como voucher ou cupons, podem ser compensados contra os valores que o cliente deve à empresa. Nesse caso, a empresa deve contabilizar o valor dessa contraprestação a pagar ao cliente como redução do preço da transação e, portanto, das suas receitas. Se essa contraprestação a pagar ao cliente incluir um valor variável, a empresa deverá estimar o preço da transação, conforme mencionado no item “Contrapres- tação variável (e a restrição do uso de estimativas)”, anteriormente. Porém, se a contraprestação a pagar ao cliente for pago com bem ou serviço dis- tinto do cliente, a compra do bem ou serviço será contabilizada da mesma maneira que as compras de outros fornecedores, ou seja, em separado. d) Contraprestação não monetária No caso de a empresa ter uma contraprestação a receber de clientes através de itens não monetários (ou promessa de contraprestação), a mensuração deverá ser realizada por meio do valor justo, seguindo as orientações do item 66 do CPC 47. Se não for possível estimar esse valor justo, o profissional contábil deverá men- surá-lo indiretamente através do preço de venda individual dos bens ou serviços, de acordo com os critérios do item 67. Se o cliente entregar bens ou serviços (por exemplo, materiais, equipamentos ou mão de obra) para honrar com o desempenho do contrato, o profissional contá- bil deverá avaliar se sua empresa passou a deter o controle desses bens ou serviços recebidos. Se sim, a empresa deve contabilizar os bens ou serviços recebidos como contraprestação não monetária recebida do cliente. Etapa 4 – Alocar o preço da transação: Em geral, a alocação do preço de transação é feita para cada obrigação de performance na proporção do seu preço de venda individual. A melhor evidência do preço de venda individual é um preço observável das vendas individuais desse bem ou serviço para clientes em circunstâncias similares. No entanto, se o preço de venda individual não for diretamente observável, deve ser usada uma das seguintes abordagens: (i) avaliação de mercado ajustada; (ii) custo esperado mais margem; ou (iii) residual. Mais uma vez é possível verificar o fundamental papel do profissional contábil que deverá aplicar todo o seu conhecimento técnico na estimava mais adequada para a alocação dos preços da transação. A seguir, vemos a análise detalhada das abordagens indicadas: i. Abordagem de avaliação de mercado ajustada: avaliar o mercado no qual vendem bens ou serviços e estimar o preço que os clientes estariam dispostos a pagar. Em determinadas situações, pode ser necessário consultar os preços dos concorrentes da empresa para bens ou serviços similares e ajustar esses preços, conforme necessário, para refletir os custos e margens da empresa; Receita de contratos com clientes 121 ii. Abordagem do custo esperado mais margem: prever seus custos esperados para satisfazer a obrigação de performance, acrescidos de uma margem adequada; ou iii. Abordagem residual: em circunstâncias limitadas, subtrair a soma dos preçosde venda individuais observáveis de outros bens ou serviços no contrato ao valor total da transação. A determinação do preço de venda individual pode ser resumida conforme ilus- trado na Figura 5 a seguir. Figura 5 Alocação do preço de venda e abordagens permitidas (item 79) Alocar com base nos preços de venda independentes relativos Abordagem residual Determinar os preços de venda individuais Obrigação de performance #1 Obrigação de performance #2 Obrigação de performance #3 Usar preço observável O preço observável está disponível? Estimar o preço Abordagem de avaliação de mercado ajustada Abordagem de custo esperado mais uma margem SIM NÃO Fonte: KPMG, 2016, p. 19. Estimar o preço de venda individual pode ser um desafio! Não devemos falar em alocação se o contrato possuir uma única obrigação de performance. Esta seria a situação mais simples, sem maiores esforços. Mas, muitas vezes, essa não é a realidade do profissional contábil. Ele pode ter que identificar obrigações de performance para as quais os preços de ven- da individuais não foram determinados previamente. Na ausência de um preço observável, se informações confiáveis não estiverem disponíveis para estimar o preço de venda individual (por exemplo, para determinados fornecedores de software, cujos preços podem variar muito para licenças), a abordagem resi- dual pode fornecer a melhor estimativa do preço de venda individual. Ou seja, a empresa determina o preço de venda individual por referência ao preço de transação total menos a soma dos preços de venda individuais observáveis de outros bens ou serviços. O profissional contábil também pode se encontrar em uma situação na qual precise usar uma combinação das três abordagens mencionadas para estimar o preço de venda individual dos bens ou serviços prometidos no contrato. Nesse caso, ele deve avaliar se a alocação do preço da transação por esses preços de 122 Contabilidade Avançada venda individuais estimados é consistente com o objetivo de alocação e com as exigências para a estimativa de preços de venda individuais. Etapa 5 – Reconhecer a receita quando (ou à medida em que) a empresa satis- fazer uma obrigação de performance: O reconhecimento da receita só deverá ocorrer quando forem satisfeitas as obrigações de performance estipuladas em contrato, momento em que ocorre a transferência do bem ou serviço prometido ao cliente. Será considerado transferi- do quando, ou à medida que, o cliente passa a ter o controle desse ativo. Se o contrato tiver várias obrigações de performance estipuladas, deverá haver uma análise do momento de cumprimento da obrigação para cada uma delas. As práticas contábeis adotadas na Etapa 5 fizeram com que as empresas reava- liassem o momento do reconhecimento da receita e trouxeram impactos relevan- tes para determinados segmentos. Por isso, vamos tratar essa etapa de maneira detalhada e individual discutindo alguns desses principais assuntos decorrentes da satisfação de obrigação de performance. Também é importante mencionar que na data em que o CPC 47 passou a vigo- rar, 1 de janeiro de 2018, a administração precisava escolher o regime de transição previsto no Apêndice C. Para fins dessa obra, a análise do regime de transição não será tratada considerando que, nesta data, as empresas já fizeram as devidas ade- quações necessárias para adoção dos novos preceitos trazidos pelo CPC 47 em suas práticas contábeis. Vejamos no exemplo a seguir a aplicação de todas as 5 etapas: Exemplo A empresa Cia. XYZ vende uma máquina de gerar vapor puro que é utilizada no processo industrial do segmento farmacêutico. Ela celebrou contrato com um cliente para o fornecimento dessa máquina pelo valor de R$ 10.000,000,00, sendo entregue na fábrica. Como esse equipamento é um ativo muito específi- co, personalizado para o cliente e com muitos detalhes técnicos, é fundamental que, após a entrega, os técnicos da Cia. XYZ também efetuem a instalação. Há uma previsão contratual que diz que, caso a instalação não seja feita, ou seja feita e não aprovada pela inspeção da equipe técnica da fábrica, a máquina po- derá ser devolvida. Assim, vamos percorrer esse contrato em cada uma das cinco etapas do mo- delo de reconhecimento de receita efetuando as suas análises: Etapa 1 – Identificando o contrato O contrato se refere ao fornecimento de uma máquina que gera vapor puro, com instalação pelo valor de R$ 10.000,000,00, entregue na fábrica. Passo 2 – Identificando as obrigações de performance Numa primeira análise parecem existir duas obrigações de performance: (i) a entrega da máquina pronta e (ii) a instalação da máquina pelos técnicos da Cia. Receita de contratos com clientes 123 XYZ. Essa possibilidade poderia ser admitida se fosse possível separarmos as duas coisas e atribuir valor a cada uma delas. Porém lembre-se de que há uma cláusula expressa e específica no contrato dizendo que, se a instalação não for concluída, ou se for feita e não for aprovada pela inspeção da equipe técnica da fábrica, a máquina poderá ser devolvida. Portanto, nessa condição contratual existente, concluímos que a entrega da máquina e a sua instalação compõem juntas uma única obrigação de performance e assim serão tratadas. Etapa 3 – Determinando o preço da transação: O preço total da transação é de R$ 10.000,000,00. Etapa 4 – Alocando o preço da transação: A alocação será feita para uma única obrigação de performance que se- rão a entrega e instalação da máquina, com aprovação da inspeção pela equi- pe técnica da fábrica. Assim, o valor será alocado para uma só obrigação de performance. Etapa 5 – Reconhecendo a Receita: Como a Cia. XYZ tem estimativas seguras de que conseguirá entregar a má- quina, instalá-la e obter as aprovações de inspeção da equipe técnica da fábrica, quando todas essas etapas forem satisfeitas, a Cia. XYZ deverá reconhecer a receita, sendo seus lançamentos contábeis: D – Clientes a Receber ou Bancos R$ 10.000,000,00 C – Receita com vendas (R$ 10.000,000,00) Mesmo a adoção do CPC 47 tendo ocorrido a partir de 1º de janeiro de 2018, o tema de reconhecimento de receita é relevante, com impactos significativos para as empresas. O modelo de 5 Etapas é uma ferramenta importante no auxílio ao profissional contábil na análise detalhada do que precisa ser cumprido e observado para adotar adequadamente o pronunciamento técnico. 5.2.2 Momento do reconhecimento da Receita: satisfação de obrigação de performance A empresa reconhece a receita quando (ou à medida que) atende a uma obri- gação de performance ao transferir o controle de um bem ou serviço para um cliente. Com o advento do CPC 47, a satisfação da obrigação de performance pode ocor- rer de duas maneiras: (i) ao longo do tempo; ou (ii) em um momento específico no tempo. O emprego de uma dessas duas formas apresentadas deverá ser de- terminado pela administração (com o acompanhamento do profissional contábil) no início do contrato. A seguir, trataremos das duas modalidades previstas para o reconhecimento de receita. 124 Contabilidade Avançada a) Obrigação de performance satisfeita ao longo do tempo Ocorrerá quando a obrigação de performance, ou seja, a transferência do con- trole do ativo, é feita em etapas, isto é, ao longo do tempo. Essa forma de reco- nhecimento de receita é similar à prática contábil antiga, que era amplamente utilizada pelas empresas do segmento de construção civil e atividade imobiliária, ou outro segmento similar, conhecida como Percentual de Obra Concluída ou POC (Percentage of Completion). Mesmo que o profissional contábil e a administração entendam que há certa semelhança entre o POC e o método e reconhecimento da receita ao longo do tem- po do CPC 47 em sua atividade, é imprescindível que os contratos atualmente fir- mados sejam avaliados sob a ótica dos potenciais impactos que os novos critérios estabelecidos pelo CPC 47 podem trazer sobre a transferência do controle do ativo e, consequentemente, reconhecimentoda receita. É importante que essas análises também sejam documentadas e mantidas arquivadas. Conforme o item 35, para o emprego desse momento de reconhecimento de re- ceita, é necessário que um ou mais dos seguintes critérios sejam atendidos: a. o cliente recebe e consome simultaneamente os benefícios gerados pelo de- sempenho por parte da entidade à medida que a entidade efetiva o desem- penho (ver itens B3 e B4); b. o desempenho por parte da entidade cria ou melhora o ativo (por exemplo, produtos em elaboração) que o cliente controla à medida que o ativo é criado ou melhorado (ver item B5); ou c. o desempenho por parte da entidade não cria um ativo com uso alternativo para a entidade (ver itens B6 a B8), e a entidade possui um direito executável a pagamento pelo desempenho concluído até a data presente (ver itens B9 a B13). (CPC, 2016) Um exemplo para elucidar o item “a” são os serviços de limpeza prestados, nos quais o recebimento e o consumo ocorrem de forma simultânea aos benefícios da satisfação da obrigação de performance e podem ser prontamente identificados em função do seu resultado. No caso do item “b”, o ativo que está sendo criado ou melhorado pode ser tan- gível ou intangível. A avaliação do uso alternativo do ativo, mencionado na letra “c”, deve ser feita no iní- cio do contrato e não deve ser atualizada, a menos que as partes do contrato aprovem a modificação do contrato que altere, substancialmente, a obrigação de performance. 5.2.2.1 Métodos para mensuração do progresso para satisfação da obrigação de performance Marion (2020, p. 175-176) nos indica que “a empresa deverá, para cada obri- gação de performance ao longo do tempo, mensurar seu progresso em relação ao seu total cumprido”. Para tanto, a empresa deverá escolher e aplicar um único método de mensuração para cada tipo de obrigação, de forma consistente, tendo por base a natureza do bem ou do serviço prometido a ser transferido ao cliente. Receita de contratos com clientes 125 Escolhido e adotado o método, a receita deve ser reconhecida à medida que as obrigações forem sendo satisfeitas. Com isso, o objetivo é mostrar o desempenho da empresa durante a transferência do controle de bens ou serviços para o cliente. Ao final de cada período contábil a que se referem as demonstrações contábeis, a empresa deve remensurar seu progresso em relação à satisfação completa da obrigação de performance ao longo do tempo. Os métodos de apuração do progresso são: (i) método de produto e (ii) método de insumo. Esses métodos serão utilizados para reconhecimento da receita somen- te se a empresa puder mensurar seu progresso em relação à satisfação completa da obrigação de performance. Isso pode não ser possível se a empresa não dispu- ser de informações confiáveis exigidas para aplicação do método apropriado de mensuração do progresso. Nesse caso, a empresa deverá satisfazer à obrigação de performance pelo método do momento específico no tempo. Vejamos a seguir a explicação de cada método: • (i) método de produto: conforme indicado pelo item B15 do CPC 47 (2016), esse método “reconhece a receita com base na mensuração direta do valor ao cliente dos bens ou serviços transferidos até a data em questão”. Dentre as técnicas existentes para essa mensuração, podem ser empregadas: estu- dos de desempenho, avaliação de resultados atingidos, volume de trabalho em andamento, unidades entregues ou unidades produzidas. O item B17, CPC 47 (2016) indica como desvantagem desse método que: “os produtos utilizados para mensurar podem não ser diretamente observáveis e as informações requeridas para aplicá-los podem não estar disponíveis à empresa sem demasiado custo”. Portanto, ao vivenciar essa situação, o próprio CPC indica a aplicação do método de insumo. • (ii) método de insumo: neste método, o CPC 47 (2016), no item B18, indica que a receita será reconhecida “com base nos esforços ou insumos da em- presa para a satisfação da obrigação de performance referentes aos insumos esperados totais para a satisfação dessa obrigação de performance”. São exemplos: recursos consumidos, horas de trabalho despendidas, custos in- corridos, tempo transcorrido ou horas de máquinas utilizadas. Se a empresa identificar que os esforços ou insumos são empregados ao longo de todo o período de desempenho mantendo a mesma proporcionalidade, é permitido que a empresa reconheça a receita usando um método linear. Assim como o método de produto, o método de insumo apresenta desvanta- gens e limitações, como as tratadas no item B19: Uma falha de métodos de insumo é que pode não existir uma relação direta entre os insumos da entidade e a transferência de controle de bens e serviços ao cliente. Portanto, a entidade deve excluir do método de insumo os efeitos de quaisquer insumos que [...] não descrevem o desempenho da entidade ao transferir o controle de bens ou serviços ao cliente. [...] ao utilizar o método de insumo baseado em custos, pode ser requerido ajuste à mensuração de progresso nas seguintes circunstâncias: 126 Contabilidade Avançada a. quando o custo incorrido não contribui para o progresso da entidade de sa- tisfazer a obrigação de performance [...]; b. quando o custo incorrido não é proporcional ao progresso da entidade de satisfazer a obrigação de performance. (CPC, 2016, grifos nossos) É importante mencionar que o profissional contábil deve acompanhar as circuns- tâncias dos contratos nessas situações e, percebendo modificações ao longo do tempo, o item 43 do CPC 47 (2016) indica que “deve atualizar a sua mensuração do progresso para refletir quaisquer alterações no resultado da obrigação de performance”. Confirmada a ocorrência de alterações na mensuração do progresso, ela deve ser contabilizada como mudança na estimativa contábil de acordo com o CPC 23 – Políticas Contábeis, Mudança de Estimativa e Retificação de Erro. b) Obrigação de performance satisfeita em um momento específico do tempo Se a obrigação de performance não for satisfeita ao longo do tempo, a empresa deverá satisfazer a obrigação de performance em momento específico no tempo. Essa forma também será utilizada quando a satisfação da obrigação de performan- ce for cumprida uma só vez, transferindo ao cliente todo o controle sobre o ativo. Exemplo Venda de um veículo por uma concessionária para um cliente. O prazo de entrega do veículo é de 30 dias; após esse prazo, o ativo é entregue. Nesse momento, a obrigação foi cumprida e é o momento de reconhecer a receita. O exemplo é simples, mas os contratos podem conter obrigações de performance muito mais so- fisticadas, como a entrega do bem com a instalação de um determinado acessório que permite a devolução do bem se não for feita a sua instalação. Se isso ocorrer, apenas após a entrega do bem e a devida instalação será considerada cumprida a obrigação. Apenas a primeira condição (entrega) não basta para o reconhecimento da receita nes- ses termos apresentados. Para determinar o momento específico em que ocorre a transferência do con- trole do ativo prometido, a empresa deverá considerar os seguintes indicadores de transferência de controle, resumidos a partir do item 38 (CPC, 2016), entre outros que a empresa poderá definir: a. A empresa possui um direito presente se o cliente estiver obrigado a pagar pelo ativo, isso pode indicar que o cliente obteve a capacidade de direcionar o uso do ativo. b. O cliente possui a titularidade legal do ativo, a totalidade dos benefícios do ativo ou de restringir o acesso de outras entidades a esses benefícios. c. A empresa transferiu a posse física do ativo para o cliente, o que pode indicar que o cliente tem a capacidade de direcionar o uso do ativo e de obter substancialmente a totalidade dos benefícios restantes desse ativo ou de restringir o acesso de outras entidades a esses benefícios. Receita de contratos com clientes 127 d. O cliente possui os riscos e os benefícios significativos da propriedade do ativo– a transferência dos riscos e benefícios significativos da propriedade do ativo para o cliente pode indicar que o cliente obteve a capacidade de direcionar o uso do ativo e de obter substancialmente a totalidade dos benefícios restantes desse ativo. e. O cliente aceitou o ativo, o que pode indicar que ele obteve a capacidade de direcionar o uso do ativo e de obter substancialmente a totalidade dos benefícios restantes desse ativo. Resumindo esta seção sobre o momento do reconhecimento da receita, veja a Figura 6 que demonstra as opções que o profissional contábil e a administração precisam avaliar para a tomada de decisão mais adequada: Figura 6 Momento de reconhecimento da receita e métodos de satisfação Método de Produto Método de InsumoMomento do reconhecimento da receita Obrigação de performance satisfeita em um momento específico Obrigação de performance satisfeita ao longo do tempo Fonte: Elaborada pelo autor. É recomendável que o profissional contábil dedique-se de modo mais apro- fundada ao tema desenvolvido nesta seção, principalmente se a empresa em que ele trabalha emprega o POC como método de reconhecimento de receita, pois pode ser necessária a revisão dos critérios estabelecidos pelo CPC 47 e a definição de qual método empregar (método de produto ou insumo). Uma definição equivocada pode impactar significativamente o resultado da empre- sa e provocar desdobramentos negativos em seus resultados, indicadores e controles estratégicos e gerenciais. 5.2.3 Custos do contrato O CPC 47 fornece orientações sobre a contabilização de custos incrementais de obtenção e para cumprimento de um contrato. • Custos para obtenção de um contrato O item 91 do CPC 47 (2016) indica que a empresa “deve reconhecer como ativo os custos incrementais para obtenção de contrato com cliente se a en- tidade espera recuperar esses custos” (por exemplo, comissões de vendas). No entanto, um expediente prático indicado no item 94 do CPC 47 permite que a empresa reconheça esses custos como despesas conforme incorridos se o período de amortização do ativo que a empresa teria reconhecido for igual ou inferior a um ano. 128 Contabilidade Avançada • Custos para cumprir um contrato O item 95 do CPC 47 menciona que: Se os custos incorridos no cumprimento de um contrato não estiverem den- tro do alcance de outro pronunciamento (por exemplo, o CPC 16 – Estoques, o CPC 27 – Ativo Imobilizado ou o CPC 04 – Ativo Intangível), a entidade deve reconhecer o ativo a partir dos custos incorridos para cumprir o contrato somente se esses custos atenderem a todos os critérios a seguir: (a) os custos referem-se diretamente ao contrato ou ao contrato previsto que a entidade pode especificamente identificar (por exem- plo, custos relativos a serviços a serem prestados de acordo com a renovação de contrato existente ou custos para projetar o ativo a ser transferido, de acordo com contrato específico que ainda não foi aprovado); (b) os custos geram ou aumentam recursos da entidade que serão usa- dos para satisfazer (ou para continuar a satisfazer) a obrigações de per- formance no futuro; e (c) espera-se que os custos sejam recuperados. Apresentamos a seguir exemplos de custos que podem e de custos que não podem ser capitalizados quando esses critérios forem cumpridos. Quadro 1 Exemplos de custos elegíveis para capitalização ou não Custos diretos que são elegíveis para capitalização se outros critérios forem atendidos Custos a serem lançados como despesas quando incorridos • Mão de obra direta – ex. salários. • Materiais diretos – ex. suprimentos. • Alocação de custos que se refere diretamente ao contrato – por exemplo, despesas de amor- tização. • Custos que são expressamente cobráveis do cliente de acordo com o contrato. • Outros custos que sejam incorridos somente porque a entidade celebrou o contrato – por exemplo, os custos com subcontratantes. • Custos gerais e administrativos – a menos que explicitamente cobráveis nos termos do con- trato. • Custos que se referem a obrigações de desem- penho satisfeitas. • Custos de desperdício de materiais, mão de obra, ou outros. • Custos que não estão diretamente relaciona- dos às obrigações de desempenho remanes- centes, ainda não satisfeitas. Fonte: KPMG, 2016, p. 26. • Amortização dos custos capitalizados de contratos Quanto à amortização desses custos capitalizados, o item 99 do CPC 47 (2016) orienta que “deve ser amortizado em base sistemática que seja consis- tente com a transferência ao cliente dos bens ou serviços aos quais o ativo se refere”. Eles estão sujeitos a testes de redução ao valor recuperável (CPC 01). O período de amortização inclui os períodos esperados para renovação de contratos. Receita de contratos com clientes 129 5.3 Julgamentos significativos a serem observados Vídeo Além de todos os julgamentos e estimativas citados até o momento neste capítulo, relacionamos a seguir mais alguns julgamentos, estimativas e interpre- tações que o profissional contábil deve se atentar e avaliar na aplicação do CPC 47 em sua empresa. Lembrando que se deve buscar o respaldo da administra- ção da empresa na definição dessas práticas a serem adotadas, a fim de evitar surpresas e desgastes desnecessários entre o profissional contábil e a própria administração. a) Abordagem de contratos combinados A abordagem de contratos combinados é um expediente prático destinado a permitir que o CPC 47 seja aplicado a um nível de uma carteira de contratos (ou obrigações de performance) com características semelhantes, em vez de em um contrato individual. No entanto, o uso desse expediente está condicionado a indi- cação das estimativas efetuadas de que os efeitos financeiros da aplicação desse recurso não serão materialmente diferentes caso o CPC fosse aos contratos indivi- duais dentro dessa carteira. Portanto é necessário o emprego de julgamentos: • para avaliar quais “características semelhantes” constituem um portfólio (por exemplo, diferentes ofertas, localizações geográficas); • na decisão do quão grande deve ser a população da carteira de contratos a ser avaliada; • na avaliação de quando esta abordagem pode ser utilizada de forma apro- priada; e • na decisão de qual(is) etapa(s) do reconhecimento da receita esta análise será aplicada. O CPC 47 não menciona como avaliar caso o resultado de usar a abordagem de contratos combinados aponte um resultado próximo ou igual aos contratos avalia- dos individualmente, nem a extensão necessária para essa avaliação. b) Aplicando a disposição de “série de bens ou serviços” Ao identificar as obrigações de performance, o CPC 47 exige que uma série de bens ou serviços, que sejam substancialmente os mesmos e tenham o mesmo pa- drão de transferência para o cliente, seja tratada como uma única obrigação de performance, mesmo que os bens ou serviços sejam distintos. O objetivo é simplificar a aplicação do modelo (por exemplo, evitar a necessi- dade de alocar o preço da transação para cada incremento de bens ou serviços entregues quando eles são idênticos) e promover consistência na identificação de obrigações de performance. 130 Contabilidade Avançada c) Avaliando a duração de um contrato O CPC 47 estabelece que um contrato só poderá existir na medida em que as partes possuam direitos e obrigações exequíveis. Os direitos de rescisão podem afetar a duração de um contrato. Ao considerar se tais direitos são um fator deter- minante, a empresa precisará julgar se esses direitos de rescisão são “substantivos” e qual o tempo de vigência. d) Considerações sobre a atuação como “principal” ou “agente” Alguns contratos resultam no cliente recebendo bens ou serviços de outra em- presa que não é uma parte diretamente envolvida no contrato com o cliente. Quan- do outras partes são envolvidas no fornecimento de bens ou serviços a um cliente, devemos avaliar a natureza das promessas mantidas por cada parte ao cliente. Nesse caso, o CPC 47esclarece que uma empresa deve avaliar se sua obrigação de performance é fornecer os bens ou serviços específicos prometidos (ou seja, agindo como principal) ou se organizar para que esses bens ou serviços sejam for- necidos por outra parte (ou seja, agindo como agente) que os entregue ao cliente. A premissa a ser considerada na determinação de principal e agente é a exis- tência do controle sobre o bem ou serviço especificado antes de o bem ou servi- ço ser transferido para o cliente. A empresa deve determinar se ela é o principal ou um agente para cada bem ou serviço específico prometido ao cliente. Uma empresa pode, em um mesmo contrato, ser principal para alguns bens e servi- ços e agente para outros. Além da premissa do controle, o CPC 47 estabelece indicadores de quando a empresa está agindo como principal, em vez de agente, e as explicações para indi- car como eles refletem o princípio de controle. No item B37 do CPC 47 (2016), encontramos alguns dos principais indicadores disponibilizados para essa análise de papéis entre principal e agente: a. A entidade é a responsável primária para o cumprimento do compromisso de fornecer o bem ou serviço especificado. Isso normalmente inclui a responsa- bilidade para a aceitabilidade do bem ou serviço especificado (por exemplo, a responsabilidade primária pelo bem ou serviço, atendendo às especificações do cliente). Se a entidade é a responsável primária para o cumprimento do compromisso de fornecer o bem ou serviço especificado, isso pode indicar que a outra parte, envolvida no fornecimento do bem ou serviço especificado, está agindo em nome da entidade. b. A entidade tem risco de estoque antes que o bem ou o serviço especificado tenha sido transferido ao cliente; ou após a transferência do controle ao cliente (por exemplo, se o cliente tem o direito de retorno). Por exemplo, se a entidade obtém ou compromete-se a obter o bem ou o serviço especificado antes de obter o contrato com o cliente, pode indicar que a entidade tem a capacidade de dirigir a utilização do (e obter substancialmente todos os benefícios rema- nescentes) bem ou serviço antes de ele ser transferido ao cliente. c. A entidade tem critério para determinação do preço para o bem ou serviço es- pecificado. Estabelecer o preço que o cliente paga pelo bem ou serviço espe- cificado pode indicar que a entidade tem a capacidade de dirigir o uso desse bem ou serviço e obter substancialmente todos os benefícios restantes. No entanto, o agente pode ter liberdade para estabelecer os preços em alguns Receita de contratos com clientes 131 casos. Por exemplo, o agente pode ter alguma flexibilidade na fixação dos preços, a fim de gerar receitas adicionais de seu serviço de organizar bens ou serviços a serem fornecidos por outras partes para os clientes. Esses indicadores podem ajudar na avaliação do controle, mas o profissional contábil deve estar atento à existência de outros indicadores que podem servir de referência para determinação de principal e agente. O desdobramento da definição do papel de principal ou agente indicará como a empresa deverá reconhecer a receita dessa operação, podendo ser pelo seu mon- tante bruto – correspondente à contrapartida que a empresa espera ter direito, pelo papel de principal (item B35B) ou pelo valor líquido, correspondente a qual- quer taxa ou comissão que a empresa espera ter direito, pelo papel de agente (B36), respectivamente. Tal processo é exemplificado na Figura 7, a seguir: Figura 7 Resumo do desdobramento da análise de principal e agente A empresa controla o bem ou serviço antes da transferência para o cliente? Atua como principal, receita bruta (item B35B, CPC 47). Atua como agente, receita líquida (item B36, CPC 47). Sim Não Identifique os bens ou serviços a serem transferidos aos clientes. Fonte: KPMG, 2017, p. 31. Portanto o profissional contábil deve estar atento também ao papel da empre- sa em relação a essa definição de principal e agente, pois será determinante no impacto da natureza e dos montantes a serem auferidos a partir das transações realizadas pela administração com seus clientes. e) Licenças Orientações específicas são fornecidas pelo CPC 47 para se avaliar quando a receita de uma licença de propriedade intelectual é reconhecida: em um momento específico no tempo ou ao longo do tempo. Essas licenças podem ser itens como software e tecnologia, filmes, músicas, franquias, patentes, marcas entre outros. Para isso, a empresa deve considerar se todos os seguintes critérios foram atendidos para ter direito de acesso à propriedade intelectual, conforme o item B58 do CPC 47 (2016): a. o contrato exige, ou o cliente razoavelmente espera, que a entidade realizará atividades que afetam significativamente a propriedade intelectual sobre a qual o cliente tem direitos (ver itens B59 e B59A); b. os direitos concedidos pela licença expõem diretamente o cliente a quaisquer efeitos positivos ou negativos das atividades da entidade, identificadas no item B58(a); e c. essas atividades não resultam na transferência de bem ou de serviço ao clien- te, quando elas ocorrem (ver item 25). 132 Contabilidade Avançada Quando todos os critérios anteriores são atendidos, a receita de uma licença distinta é reconhecida ao longo do tempo. A área de dificuldade para uma empresa nessa avaliação é determinante se suas atividades afetam significativamente a pro- priedade intelectual que o cliente tem direito. Em relação à letra “a”, o CPC 47 esclarece que as atividades de uma empresa afetam significativamente a propriedade intelectual quando: • mudam sua forma ou funcionalidade; ou • a capacidade de o cliente se beneficiar da propriedade intelectual é substan- cialmente derivada, ou dependente, de atividades da empresa. O CPC 47 também esclarece que os royalties só se aplicam quando se referem a uma licença de propriedade intelectual. 5.3.1 Divulgação As divulgações exigidas pelo CPC 47 são bastante densas e detalhadas, dan- do grande relevância para a divulgação dos saldos de contratos, constando, por exemplo, quando as obrigações de performance foram satisfeitas, como os pre- ços das transações foram calculados e alocados, e, principalmente, como os julgamentos significativos e as mudanças nos julgamentos que afetam a deter- minação do valor e época das receitas provenientes de contratos com clientes foram apurados. Com base nessas informações, é possível verificar a relevância do papel do pro- fissional contábil na divulgação das demonstrações contábeis compreendendo a desagregação das receitas reconhecidas e descrevendo a natureza, o valor, a época e a incerteza de receitas e fluxos de caixa provenientes de contratos com clientes. A administração e o profissional contábil devem considerar o nível de detalhe ne- cessário para atingir o objetivo de divulgação e quanta ênfase deve ser dada a cada um dos vários requisitos. Os aspectos de divulgação das informações contábeis requeridas pelo CPC 47 não serão tratados nesta obra, mas devem ser consultados pelo profissional dire- tamente no CPC 47 pelo profissional contábil para que ele possa executar o fecha- mento e a preparação das demonstrações contábeis adequados. CONSIDERAÇÕES FINAIS Como foi possível verificar ao longo deste capítulo, o CPC 47 é abrangente e bastan- te complexo. O profissional contábil e a administração podem descobrir que sua apli- cação detalhada pode vir a conflitar com certos julgamentos, interpretações e práticas contábeis da empresa. Além disso, enquanto o pronunciamento técnico busca reduzir e/ou eliminar inconsistências nos tratamentos contábeis da receita e, principalmen- te, melhorar a comparabilidade das informações, permanece um espaço considerável para julgamento e uso de estimativas contábeis. O cumprimento e a observância de todos os requerimentos do CPC 47 exigem grande empenho do profissional contábil por meio do estudo aprofundado dos con- ceitos, técnicas e discussões com aadministração e outras áreas afins dentro da em- Receita de contratos com clientes 133 presa como forma de levantar as informações relevantes necessárias para que as decisões sejam tomadas de modo a atender aos interesses da empresa e ao mesmo tempo estejam alinhadas com as práticas contábeis vigentes. Também é importante lembrar que, com a evolução da realidade e das transa- ções empresariais, esse documento técnico passará por novas atualizações. Por isso, o papel do profissional contábil é fundamental nas empresas por ser o responsável pela adoção das práticas contábeis, além de gerar informações gerenciais e contá- beis fidedignas para tomada de decisão da administração e, ainda, contribuir com sua experiência empírica nas eventuais consultas públicas que promoverão os aprimora- mentos dos pronunciamentos técnicos, o que é periodicamente divulgado pelo CPC ou mesmo o IFRS. ATIVIDADES 1. O CPC 47 começou a ser adotado no Brasil a partir de 1º de janeiro de 2018. Com base no estudo deste capítulo, você acredita que as atividades empresariais desenvolvidas pelas empresas foram impactadas de modo relevante? Justifique. 2. Foi possível verificar que os contratos celebrados entre a empresa e seus clientes são os principais documentos que servem de base para a aplicação adequada do CPC 47. Como você, profissional contábil, prevê ter acesso a esses contratos e quais são os procedimentos que deverão ser realizados quando você tiver esses documentos em mãos? 3. Com a análise do CPC 47, você entende que os julgamentos e estimativas contábeis farão parte constante das rotinas do profissional contábil? Qual é o desdobramento dessa situação para suas rotinas contábeis? REFERÊNCIAS ALMEIDA, M. C. Contabilidade intermediária em IFRS e CPC. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2018. CPC. Comitê de Pronunciamentos Contábeis. CPC 23 – Políticas Contábeis, Mudança de Estimativa Retificação de Erro. Brasília, DF, 16 set. 2009. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/ Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=54. Acesso em: 16 out. 2020. CPC. Comitê de Pronunciamentos Contábeis. CPC 47 - Receita de Contrato com Cliente. Brasília, DF, 22 dez. 2016. Disponível em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/ Pronunciamento?Id=105. Acesso em: 5 out. 2020. GELBCKE, E.; SANTOS, E. R.; IUDÍCIBUS, A. M. S. Manual de Contabilidade Societária: aplicável a todas as sociedades, de acordo com as Normas Internacionais e o CPC. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2018. MARION, C. J. Contabilidade Avançada. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2020. http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=54 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=54 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=10 http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=10 134 Contabilidade Avançada 6 Arrendamentos Neste capítulo, estudaremos o CPC 06 (R2) – Arrendamentos, base para o reconhecimento das operações de arrendamento, aluguéis e ou- tros direitos de uso. Esse pronunciamento técnico, em particular, é um dos melhores exemplos de mudanças na contabilidade e na mentalida- de da observância do princípio da essência sobre a forma que o pro- fissional contábil deve conhecer. Esse pronunciamento passou a exigir a análise e identificação dos arrendamentos celebrados tendo como base o benefício e o risco, independentemente da formalização contratual exis- tente, conforme será verificado em seção específica em que trataremos da “Identificação de Arrendamento”. O Pronunciamento Técnico CPC 06 (R2) – Arrendamentos foi promul- gado pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) em 6 de outubro de 2017, com vigência a partir de 1º janeiro de 2019, e objetivou estabele- cer os princípios para o reconhecimento, mensuração, apresentação e di- vulgação de arrendamentos, além de permitir a avaliação do efeito dessas operações na posição financeira, no desempenho financeiro e nos fluxos de caixa das empresas. O CPC 06 (R2) está relacionado com a Norma In- ternacional de Contabilidade – IFRS 16 - Lease. Também será escopo deste estudo os principais conceitos do CPC 06 (R2), como proceder com a identificação de um arrendamento por meio de um modelo estruturado, os papéis do arrendador e do arrenda- tário, a mensuração e reconhecimento inicial e subsequente dessas tran- sações, seus impactos no ativo, no passivo e no resultado do arrendador e arrendatário e, por fim, alguns aspectos relevantes de divulgações nas demonstrações contábeis das empresas. Boa leitura! 6.1 Principais conceitos de arrendamento Vídeo Com a adoção do CPC 06 (R2), a partir de 1 de janeiro de 2019, todos os ativos caracterizados como arrendamento passaram a ser contabilizados como direito de uso pelas empresas arrendatárias, não havendo mais diferenças entre ar- rendamentos operacionais e financeiros, ou seja, essas operações passaram a ser denominadas unicamente como arrendamentos. Arrendamentos 135 A principal razão da mudança introduzida pelo novo Pronunciamento Contábil foi de tentar reduzir a assimetria da informação contábil decorrente do fato de que o arrendamento de ativos é importante para muitas empresas, pertencentes aos segmentos mais variados. Esses arrendamentos podem fornecer às empresas arrendatárias acesso aos ativos sem a necessidade de efetuar desembolsos financeiros significativos (com- pra dos ativos), sendo que em muitos casos o uso desses ativos é estratégico para a administração atingir seus objetivos. Sem que as empresas reconheçam os di- reitos de usos desses ativos arrendados e seu Passivo de Arrendamento em suas demonstrações contábeis, os usuários gerais das demonstrações contábeis não ti- nham acesso e conhecimento de todos os ativos dos quais a empresa estava se be- neficiando e nem mesmo a possibilidade de comparar a posição financeira dessas empresas com outras que, dentro da sua estratégia, decidiram efetuar a compra de ativos e não os arrendar. Como será possível verificar, a aplicação do princípio da “essência sobre a for- ma” ganha relevância nesse CPC, pois, mesmo não havendo um contrato formali- zado como arrendamento, o direito de uso de um ativo se sobrepõe à formalidade do contrato. Essa identificação de arrendamento é um dos primeiros desafios que o profissional contábil deve superar. Mas antes de tratarmos das etapas para a identificação de um contrato de ar- rendamento, vamos analisar qual é o alcance do CPC 06 (R2) e seus principais con- ceitos que norteiam a sua aplicação. Esses passos são necessários e fundamentais para que possamos conhecer o vocabulário próprio e amplamente utilizado nesse Pronunciamento Contábil. 6.1.1 Alcance e aplicação do CPC 06 (R2) O item 3 determina que a empresa deve aplicar esse pronunciamento a todos os arrendamentos, incluindo arrendamentos de ativos de direito de uso em subar- rendamento, exceto para: a) arrendamentos para explorar ou usar minerais, petróleo, gás natural e recur- sos não renováveis similares; b) arrendamentos de ativos biológicos dentro do alcance do CPC 29 – Ativo Bio- lógico e Produto Agrícola mantidos por arrendatário; c) acordos de concessão de serviço dentro do alcance da ICPC 01 – Contratos de Concessão; d) licenças de propriedade intelectual concedidas por arrendador dentro do al- cance do CPC 47 – Receita de Contrato com Cliente; e e) direitos detidos por arrendatário previstos em contratos de licenciamento dentro do alcance do CPC 04 – Ativo Intangível para itens como: filmes, grava- ções de vídeo, reproduções, manuscritos, patentes e direitos autorais. (CPC, 2017) Como pode ser observado, o pronunciamento técnico tem a preocupação em definir o que não está ao seu alcance, fazendo referência a pronunciamentos téc- nicos específicos que devem ser seguidos pelos profissionais contábeis. 136 Contabilidade Avançada Ainda, o item 4 (CPC, 2017) informa que o arrendatário pode aplicar,mas não é obrigado, esse pronunciamento em arrendamentos de ativos intangíveis que não sejam aqueles descritos no item 3 (e) (CPC, 2017). Chama à atenção também a isenção de reconhecimento que o arrendatário tem previsto no item 5 (CPC, 2017) para arrendamentos de curto prazo (igual ou inferior a 12 meses) e arrendamentos para os quais o Ativo Subjacente é de baixo valor (a análise de valores do arrendamento não é afetada pelo porte, natureza ou circunstâncias do arrendatário). Essas opções de isenção devem ser avaliadas em profundidade pelo profissional contábil, bem como os res- pectivos tratamentos contábeis a serem seguidos, caso essas isenções sejam adotadas pela empresa. Caso decida optar pela isenção, o arrendatário deve reconhecer os paga- mentos de arrendamento como despesa em base linear ao longo do prazo do arrendamento ou em outra base sistemática, se esta representar o melhor padrão do benefício do arrendatário, conforme o item 6 (CPC, 2017). 6.1.2 Conceitos Os conceitos empregados nesta seção foram obtidos do CPC 06 (R2) (2017), principalmente a partir do Apêndice A e outros anexos, e incluem itens como: • Arrendamento: contrato, ou parte do contrato, que transfere o di- reito de usar um ativo (Ativo Subjacente) por um período em troca de contraprestação. • Ativo de direito de uso: ativo que representa o direito do arrendatário de usar o ativo subjacente durante o prazo do arrendamento. • Ativo subjacente: ativo que é o objeto de arrendamento. O direito de usar esse ativo foi fornecido pelo arrendador ao arrendatário. • Arrendamento financeiro: arrendamento que transfere substancial- mente todos os riscos e benefícios inerentes à propriedade do Ativo Subjacente. • Arrendamento operacional: arrendamento que não transfere substan- cialmente todos os riscos e benefícios inerentes à propriedade do Ativo Subjacente. • Arrendamento de curto prazo: arrendamento que, na data de início, possui o prazo de arrendamento de 12 meses ou menos. O arrendamen- to que contenha uma opção de compra não é arrendamento de curto prazo. • Arrendador: empresa que fornece o direito de usar o ativo subjacente por um período em troca de contraprestação. • Arrendatário: empresa que obtém o direito de usar o ativo subjacente por um período em troca de contraprestação. • Benefícios econômicos do uso do ativo (item B21): incluem a produ- ção (output) principal e subprodutos (incluindo potenciais fluxos de caixa Arrendamentos 137 resultantes desses itens) e outros benefícios econômicos decorrentes do uso do ativo, que poderiam ser realizados a partir de transação comer- cial com terceiro. • Prazo do arrendamento: duração do prazo não cancelável do arrenda- mento, que deve ser determinado durante o período que o contrato for executável. O prazo do arrendamento começa na data de início e inclui quaisquer períodos de arrendamento gratuito concedidos ao arrendatá- rio pelo arrendador (item B36). • Contrato: acordo entre duas ou mais partes que cria direitos e obri- gações executáveis. Um contrato não é mais executável quando o ar- rendatário e o arrendador individualmente têm o direito de rescindir o arrendamento sem permissão da outra parte mediante uma multa quase insignificante. • Taxa de juros implícita no arrendamento: taxa de juros que faz com que o valor presente (a) dos pagamentos do arrendamento e (b) do valor residual não garantido seja igual à soma (i) do valor justo do ativo subja- cente e (ii) de quaisquer custos diretos iniciais do arrendador. • Taxa incremental sobre empréstimo do arrendatário: taxa de juros que o arrendatário teria que pagar ao pedir emprestado, por prazo se- melhante e com garantia semelhante, os recursos necessários para obter o Ativo com valor similar ao Ativo de Direito de Uso em ambiente econô- mico similar. • Valor residual não garantido: parcela do valor residual do Ativo Subja- cente cuja realização, pelo arrendador, não está garantida, ou está ga- rantida exclusivamente, pela parte relacionada ao arrendador. 6.2 Identificação de arrendamento Vídeo Conforme mencionado na seção anterior, um arrendamento pode ser um con- trato, ou parte do contrato, que transfere o direito de usar um ativo por um período em troca de contraprestação. Devido à relevância e à complexidade dessa identificação, o primeiro passo do profissional contábil deve ser avaliar os contratos celebrados pela empresa para identificar se esse contrato se enquadra nos preceitos do CPC 06 (R2), isto é, se os contratos são (ou contêm) um arrendamento, ou se o tratamento contábil deverá seguir o de contratos de prestação de serviços “normais”, cujo reconhecimento se dá no resultado do exercício, ao longo do tempo. Uma vez efetuada essa avaliação da identificação de arrendamento, o profissional contábil deverá reavaliar esses contratos somente caso seus termos e/ou condições sejam alterados. Para isso, os itens B9 a B31 do Pronunciamento Contábil estabelecem os crité- rios de verificação e análise, em particular o item B31, que traz um fluxograma que é transcrito a seguir e analisado logo na sequência. 138 Contabilidade Avançada Figura 1 Fluxograma para avaliar se um contrato contém ou não arrendamento Existe ativo identificado? Considere os itens B13 a B20. O cliente tem o direito de obter substancialmente todos os benefícios econômicos do uso do ativo durante todo o período de uso? Considere os itens B21 a B23. O cliente e o fornecedor, ou nenhuma das partes, têm o direito de direcionar como e para qual finalidade o ativo é usado durante todo o período de uso? Considere os itens B25 a B30. O cliente tem o direito de operar o ativo durante todo o período de uso, sem o fornecedor ter o direito de alterar essas instruções operacionais? Considere o item B24(b)(i). O cliente projetou o ativo de modo que predetermina como e para qual finalidade o ativo será usado durante todo o período de uso? Considere o item B24(b)(ii) CONTRATO CONTÉM ARRENDAMENTO, segue o CPC 06(R2). CONTRATO NÃO CONTÉM ARRENDAMENTO, não segue o CPC 06(R2). Etapa 1 Sim Sim Sim Sim Arrendatário (Cliente) Arrendador (Fornecedor) Ninguém; a forma como e para qual finalidade o ativo será usado é predeterminada. Não Não Não Não Etapa 2 Etapa 3 Fonte: Adaptada de CPC, 2017. A amplitude e relevância desse fluxograma na análise de contratos de arren- damento são confirmadas quando é mencionado que a aplicação dos preceitos do CPC 06 (R2) não se limita apenas à avaliação de contratos identificados como arrendamento ou contratos de aluguel, mas passa também pela análise de fatos e circunstâncias junto com a definição do conceito de arrendamento (novamente reforçamos a máxima da “essência sobre a forma”). Exemplo de uma situação que o profissional contábil pode se deparar e testar o seu conhecimento sobre o tema é encontrado no caso de um contrato de servidão que, a depender da análise, seus termos e circunstâncias podem ser classificados no escopo do CPC 06 (R2) e serem tratados como um arrendamento. Passaremos a analisar as etapas do fluxograma, do item B31 (CPC, 2017) com mais detalhes. Servidão é o direito de atravessar ou usar a terra de um terceiro para um propósito específico, incluindo direitos de uso de uma área de subsolo. Exemplos: faixas de terras que ficam debaixo de linhas de transmissão de alta tensão de energia elétrica; faixas de terras em que são escavadas e enterradas tubulações de gás, oleodutos; instalação de geradores eólicos em terras de fazendas, entre outros (KPMG, 2019). Saiba mais Arrendamentos 139 Etapa 1 – Ativo Identificado O item B13 (CPC 06(R2), 2017) orienta que “o ativo normalmente é identificado ao ser expressamente especificado no contrato. Contudo, o ativo também pode ser identificado ao ser implicitamente especificado na ocasião em que for disponibili- zado para uso pelo cliente”. Exemplos: contrato de aluguel e contrato de comodato de máquinas e equipamentos. Essa análiseé importante porque, em um mesmo contrato, podem existir di- ferentes componentes (ou direitos de uso de ativos): aqueles que atendem ao conceito de arrendamento e aqueles que não atendem. Consequentemente, o pro- fissional contábil deverá separar esses componentes e tratá-los contabilmente de forma específica, conforme será explicado nas próximas seções. Devido à importância da separação dos diferentes componentes que podem ser localizados nos contatos, os itens 12 e 16 trazem as seguintes orientações: 12. Para o contrato que é, ou contém, um arrendamento, a entidade deve contabilizar cada componente do arrendamento dentro do contrato como arrendamento separadamente de componentes de não arrendamento do contrato, salvo se a entidade aplicar o expediente prático do item 15. [...] 16. Salvo se o expediente prático descrito no item 15 for aplicado, o arrenda- tário deve contabilizar componentes de não arrendamento utilizando outros pronunciamentos aplicáveis. (CPC, 2017) O expediente prático referenciado no item 15 (CPC, 2017) não deve ser aplicado a derivativos embutidos que atendem aos critérios no item 4.3.3 do CPC 48 – Instru- mentos Financeiros (esse Pronunciamento Técnico não é objeto desta obra). Etapa 2 – Direito de obter benefícios econômicos do uso do ativo Para atender ao critério descrito nesta etapa, o item B21 (CPC, 2017) comenta que o cliente (ou arrendatário) “precisa possuir o direito de obter, substancialmen- te, todos os benefícios econômicos do uso do ativo durante todo o período de uso” (isto é, ter o uso exclusivo do ativo durante todo período estabelecido no contrato). Esses benefícios econômicos do uso do ativo podem ser obtidos de forma direta ou indireta, ou de diversas outras maneiras, como pelo uso, posse ou subarren- damento do ativo. Esses benefícios econômicos se referem aos fluxos de recursos financeiros obtidos pela empresa arrendatária. Etapa 3 – Direito de direcionar a finalidade (o uso) do ativo O cliente (ou arrendatário) tem o direito de direcionar o uso do ativo quando a empresa pode tomar decisões relevantes sobre como e para qual finalidade esse ativo (ou direito de uso do ativo) será utilizado durante todo o período do contrato, em prol do alcance dos seus objetivos estratégicos e negociais. Portanto, conforme o item B25, os direitos de tomada de decisão são critérios relevantes a serem analisados quando eles afetam os benefícios econômicos a serem obtidos pelo uso do direito do ativo (CPC, 2017). Segundo o item B24, o cliente tem o direito de direcionar o uso do ativo durante todo o período de uso somente se: 140 Contabilidade Avançada a) O cliente tiver o direito de direcionar como e para que finalidade o ativo deve ser utilizado durante todo o período de uso (itens B25 a B30); ou b) As decisões relevantes sobre como e para que finalidade o ativo é usado são predeterminadas e: i. O cliente tem o direito de operar o ativo (ou de orientar outros para ope- rar o ativo da forma como determina) durante todo o período de uso, sem o fornecedor ter o direito de alterar essas instruções operacionais; ou ii. O cliente projetou o ativo (ou aspectos específicos do ativo) de modo que predetermina como e para qual finalidade o ativo deve ser usado durante todo o período de uso. (CPC, 2017) É recomendado que as análises das etapas citadas anteriormente sejam realizadas para cada contrato de forma individual. O item B1, contudo, traz um expediente prático que pode auxiliar o profissional contábil quando existir uma carteira significativa de con- tratos, desde que sejam efetuadas algumas análises e verificações, como: a entidade pode aplicar este pronunciamento à carteira de arrendamentos com características similares, se essa entidade razoavelmente esperar que os efeitos sobre as demonstrações contábeis da aplicação deste pronunciamen- to à carteira não difeririam significativamente da aplicação deste pronuncia- mento aos arrendamentos individuais dentro dessa carteira. Caso contabilize a carteira, a entidade deve utilizar estimativas e premissas que reflitam o ta- manho e a composição da carteira. (CPC, 2017) Ainda quanto à identificação de arrendamentos, alguns pontos de atenção com- plementares, comentados por Marion (2020, p. 235, grifos nossos), são de grande relevância para o profissional contábil: Gerenciamento do uso do ativo subjacente: o arrendatário não controla o uso do ativo se o arrendador tiver o direito substantivo de substituir o ativo por um alternativo durante o arrendamento. Se isso ocorrer, não há geren- ciamento do uso pelo arrendatário e, portanto, não se trata de um contrato de arrendamento mercantil. Direito substantivo de substituição: o arrendador tem o direito, por con- trato, de tomar decisões em relação ao uso do ativo. Exemplo: uma trans- portadora cuja frota de caminhões pode ser substituída de acordo com as necessidades do arrendador. Outro exemplo: um contrato que determine que o arrendatário deve manter o ativo sob algumas condições que restrin- jam o seu uso pleno, direitos de proteção que o arrendador tenha etc. Após analisar e repassar integralmente todas as etapas apresentadas, o profis- sional contábil terá condições de identificar a existência de um arrendamento nos contratos que a empresa possuir e proceder com o tratamento contábil adequado a depender do resultado apurado: o contrato contém um arrendamento ou o con- trato não contém um arrendamento. 6.2.1 Mudanças na contabilização do CPC 06 (R2) Um dos principais efeitos verificados na adoção do CPC 06 (R2) foram as mudan- ças ocorridas na contabilização dos arrendamentos para o arrendatário. Antes do CPC 06(R2) ser promulgado, as empresas arrendatárias separavam suas operações de arrendamento, e consequentemente, a contabilização desses contratos de arrenda- mento mercantil em financeiro, com características de financiamento; e operacional, contabilizados diretamente no resultado do exercício como despesas de aluguel. Arrendamentos 141 A partir de 1º de janeiro de 2019 há um modelo único de contabilização no ar- rendatário, ou seja, se o contrato for considerado um contrato de arrendamento, ele deverá ser reconhecido no balanço, não importando se é classificado como ar- rendamento financeiro ou arrendamento operacional. Outra mudança é que a con- tabilização desses contratos passa a reconhecer no balanço um ativo; porém, esse ativo é um direito de uso. Essas mudanças estão resumidas no Quadro 1: Quadro 1 Resumo das mudanças na contabilização do CPC 06 (R2), para o arrendatário Tipo de Arrendamento Ativo Passivo Resultado Antes do CPC 06 (R2) (até 31/12/2018) Arrendamento Operacional - - Despesa Operacional (Despesa de aluguel) Arrendamento Financeiro Imobilizado Arrendamento Despesa financeira e depreciação mensal Após vigência do CPC 06 (R2) (a partir de 1 de janeiro de 2019) Arrendamento Direito de Uso Arrendamento Despesa financeira e depreciação mensal Fonte: Adaptado de IBEF, 2018. O profissional contábil precisa entender essas mudanças na contabilização, pois elas trouxeram impactos relevantes no ativo, no passivo e no resultado das empre- sas. Além disso, os impactos também ocorreram em indicadores financeiros pe- los quais as empresas são avaliadas internamente e pelo mercado de modo geral, como: o EBITDA, o ROCE, o ROE, entre outros indicadores. • EBITDA (abreviação do termo em inglês Earning Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization, em português, Lucros Antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amorti- zação – LAJIDA) amplamente utilizado pelos analistas de mercado para avaliar a saúde financeira de uma empresa, considerando somente as receitas geradas, sem efeitos financeiros ou abatimento de impostos de qualquer natureza. No Brasil, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) editou a Instrução CVM n. 527/2012 (CMV, 2012), que dispõe como as Sociedades por Ações devem calcular e divulgar o LAJIDA (EBITDA), melhorando a uniformização e comparação dessa informaçãoentre as empresas. • ROCE (abreviação do termo em inglês Return on Capital Employed, em português, Re- torno Sobre Capital Empregado) é um indicador que representa a eficiência da empresa em utilizar o capital que foi nela investido (SUNO, 2017). • ROE (abreviação do termo em inglês Return on Equity, em português, Retorno Sobre o Patrimônio) é o indicador que mensura a rentabilidade (lucro) da empresa em relação aos seus recursos próprios, ou seja, patrimônio líquido (TORORADAR, 2020). É possível perceber uma alteração significativa na geografia dos lançamentos contábeis com a adoção do CPC 06 (R2). Enquanto no ativo e passivo foram estabe- lecidas linhas separadas para contabilização dos “Direitos de Uso” e do “Passivo de Arrendamento”, respectivamente, no resultado, os maiores efeitos foram verifica- dos nas despesas anteriormente tratadas como operacionais e que passaram a ser contabilizadas como “despesas financeiras”, calculadas no momento da apuração da taxa de desconto sobre os passivos de arrendamento, e as despesas com “de- preciação e/ou amortização” relacionadas ao direito de uso, do ativo. 142 Contabilidade Avançada Exemplo Reflexos do CPC 06(R2) no Balanço Patrimonial nas Demonstrações Contábeis (ponto de vista do arrendatário) Utilizando como exemplo a Demonstração Contábil da WEG S.A. de 31/12/2019, sociedade com ações negociadas na Bolsa de Valores B3, é possível observarmos a aplicação do CPC 06 (R2) no ativo e no passivo, saldos consolidados, da referida companhia, com os montantes segregados em linhas espe- cíficas (recorte do grupo de Ativos não Circulantes e do grupo de Passivos Circulantes e não Circulantes): Quadro 2 Balanço Patrimonial WEG S.A. WEG S.A. DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS 2019 Balanço Patrimonial em 31 de dezembro de 2019 (em milhares de reais) CONTROLADORA CONSOLIDADO Notas 2019 2018 2019 2018 Ativo Não Circulante Aplicações financeiras 5 - - - 562.782 Instrumentos financeiros derivativos 29 - - 167.069 166.922 Depósitos judiciais 17.d 4.657 4.657 68.506 58.368 Partes relacionadas 9 3 15 - - Tributos diferidos 10 4.863 3.322 182.042 142.669 Tributos a recuperar 8 - - 78.708 167.689 Outros ativos não circulantes - - 101.472 80.496 Investimentos 11 7.833.527 6.537.391 28.012 20.362 Imobilizado 12 4.219 4.305 3.776.561 3.541.954 Direito de uso em arrendamento 13 - - 204.623 - Intangível 14 - - 1.319.746 1.220.027 7.847.269 6.549.690 5.926.739 5.961.269 CONTROLADORA CONSOLIDADO Notas 2019 2018 2019 2018 Passivo Circulante Fornecedores 15 - - 839.879 842.957 Empréstimos e financiamentos 16 - - 936.370 2.049.093 Instrumentos financeiros derivativos 29 - - 13.879 12.070 Obrigações sociais e tributárias 7.651 10.069 390.119 303.561 Imposto de Renda e contribuição social 34 78 31.578 24.968 Dividendos e juros sobre capital próprio a pagar 144.611 165.016 145.376 165.441 Adiantamento de clientes - - 814.964 655.242 Participação nos lucros - - 212.608 167.941 Arrendamento mercantil - - 49.168 - Faturamento para entrega futura - - 414.337 155.137 Provisão para garantia de produtos - - 168.338 155.532 Contas a pagar – controladas no exterior - - 210.113 161.572 Outros Passivos Circulantes 2.021 2.567 264.292 340.490 154.317 177.730 4.491.021 5.034.004 (Continua) Arrendamentos 143 WEG S.A. DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS 2019 Balanço Patrimonial em 31 de dezembro de 2019 (em milhares de reais) CONTROLADORA CONSOLIDADO Passivo Não Circulante Empréstimos e financiamentos 16 - - 1.348.599 1.723.021 Instrumentos financeiros derivativos 29 - - 6.679 8.124 Arrendamento mercantil - - 153.667 - Provisão para contingências 17.a 4.730 4.730 551.578 547.637 Tributos diferidos 10 - - 75.143 86.537 Outros Passivos não Circulantes - - 130.964 147.270 4.730 4.730 2.266.630 2.512.589 Fonte: WEG, 2019. Portanto, como comentamos anteriormente, os maiores impactos do CPC 06 (R2) podem ser percebidos sob a ótica do arrendatário. Para melhor entendimento desses impactos em sua contabilidade, a próxima seção tratará da mensuração na data inicial e subsequente das operações de arrendamento considerando a ótica do arrendatário e também do arrendador. 6.3 Mensuração do arrendamento: inicial e subsequente Vídeo A mensuração dos arrendamentos tem tratamentos contábeis diferenciados na data inicial e em sua data subsequente. Essas diferenciações ocorrem tanto nes- ses marcos temporais quanto na figura do arrendatário e do arrendador. Por esse motivo, é necessário dividir e analisar separadamente cada um destes aspectos diferenciados para uma adequada mensuração e reconhecimento nos registros contábeis da empresa pelo profissional contábil. 6.3.1 Arrendatário • Mensuração inicial A mensuração e o reconhecimento inicial se darão na data de início do Direito de Uso do Ativo estabelecido no contrato de arrendamento em contrapartida do reconhecimento do Passivo de Arrendamento (passivo). A mensuração inicial pelo arrendatário será procedida de acordo com o item 24 que descreve quais são os elementos que devem compor o custo do Ativo de Direito de Uso. São eles: (a) o valor da mensuração inicial do Passivo de Arrendamento, conforme des- crito no item 26; (b) quaisquer pagamentos de arrendamento efetuados até a data de início, menos quaisquer incentivos de arrendamento recebidos; (c) quaisquer custos diretos iniciais incorridos pelo arrendatário; e (d) a estimativa de custos a serem incorridos pelo arrendatário na 144 Contabilidade Avançada desmontagem e remoção do ativo subjacente, restaurando o local em que está localizado ou restaurando o ativo subjacente à condição requerida pelos termos e condições do arrendamento, salvo se esses custos forem incorridos para produzir estoques. O arrendatário incorre na obrigação por esses custos seja na data de início ou como consequência de ter usado o ativo subjacente durante um período específico. (CPC, 2017) Podemos resumir o item 24 demonstrando os componentes da mensuração do ativo por meio do quadro a seguir: Quadro 3 Demonstrativo dos componentes da mensuração inicial do ativo Mensuração do Ativo de Direito de Uso ( + ) Custos diretos iniciais ( + ) Pagamentos adiantados ( + ) Custos de desmontagem e remoção do ativo subjacente ( – ) Incentivos de arredamento recebidos ( = ) Total da mensuração do ativo igual ao total do Passivo de Arrendamento Fonte: Elaborado pelo autor com base em CPC, 2017. A letra (a) e o item 26 (CPC, 2017) determinam que o arrendatário deverá men- surar o Passivo de Arrendamento na data de início do contrato de arrendamento ao valor presente dos pagamentos que não são efetuados nessa data. Esse des- conto do valor presente será feito utilizando-se a taxa de juros implícita no arre- damento, caso ela possa ser determinada. Se essa taxa de juros não puder ser determinada, o arrendatário deverá utilizar a taxa incremental sobre empréstimo do arrendatário. Na letra (c), os custos diretos iniciais são os custos incorridos para se conseguir o contrato de arrendamento que, de outra forma, não teriam sido incorridos (por exemplo: comissões e custos de obter uma garantia). Já encontramos na letra (d) a referência aos custos de desmontagem e remoção do ativo subjacente que remetem à visão do Pronunciamento Técnico CPC 25 – Pro- visões, passivos contingentes e ativos contingentes, em que existindo tal situação, o profissional contábil também deverá avaliar a necessidade de constituição de provisão específica para este fim. Ao tratarmos da mensuração e do reconhecimento subsequentes, é necessário segregar o tratamento do Ativo de Direito de Uso e o Passivo de Arrendamento. Mensuração e reconhecimento subsequentes para o Ativo de Direito de Uso A mensuração e o reconhecimento subsequentes para o Ativo de Direito de Uso deverão ser realizados de acordo com o método de custo, exceto no caso de uso de propriedades para investimento, em que deverá ser observado o CPC 28 – Pro- priedades para Investimento, permitindo a mensuraçãodo ativo pelo valor justo. O CPC 28 não é o escopo desta obra. No momento da mensuração inicial, o total do direito de uso dos ativos terá o mesmo valor do passivo de arrendamento. Isso ocorreu somente na data de transição e adoção inicial do CPC 06 (R2) pelas empresas, ou seja, em 1 de janeiro de 2019. Atualmente, os montantes do ativo e do passivo deverão ser diferentes em função do decurso do tempo e pela ocorrência dos eventos relacionados às obrigações existentes, como o pagamento das parcelas do arrendamento. Importante Arrendamentos 145 A aplicação do método de custo, citado no item 30 prevê que o arrendatário deve mensurar o Ativo de Direito de Uso ao custo: “(a) menos qualquer depreciação acumulada e quaisquer perdas acumuladas por redução ao valor recuperável; e (b) corrigido por qualquer remensuração do Passivo de Arrendamento especificada no item 36(c)” (CPC, 2017). O CPC 06 (R2) reforça ainda que o profissional contábil deverá observar e aplicar o Pronunciamento Técnico CPC 27 – Ativo Imobilizado em relação à depreciação do Ativo de Direito de Uso da data de início até o fim da vida útil do Ativo Subjacente ao arrendatário ao final do prazo de arrendamento (no caso do arrendatário vir a exercício a opção de compra do ativo) ou ao fim do prazo do contrato de arrenda- mento ou do direito de uso do ativo. Também deverá aplicar o Pronunciamento Técnico CPC 01 – Redução ao Valor Recuperável de Ativos para apurar se o direito de uso apresenta problemas de redução ao valor recuperável, bem como contabilizar qualquer tipo de perda apu- rada nos testes a serem realizados. Mensuração e reconhecimento subsequentes para o passivo de arren damento O Passivo de Arrendamento será mensurado subsequentemente observando os critérios destacados no item 36: (a) aumentando o valor contábil para refletir os juros sobre o Passivo de Arrendamento; (b) reduzindo o valor contábil para refletir os pagamentos do arrendamento efetuados; e (c) remensurando o valor contábil para refletir qualquer reavaliação ou mo- dificações do arrendamento, especificadas nos itens 39 a 46, ou para refletir pagamentos fixos na essência revisados (ver item B42). (CPC, 2017) A seguir, é apresentado um exemplo da mensuração e reconhecimento subse- quentes para o Passivo de Arrendamento. Exemplo • Mensurações e reconhecimentos iniciais e subsequentes no direito de uso do Ativo e no Passivo de Arrendamento Mensuração inicial (Ano 0) Uma empresa aluga um terreno com um galpão industrial para instalação de sua fábrica de embalagens de papelão. O contrato de aluguel foi celebrado por quatro anos, com prestações anuais de R$ 12.000,00 e com uma taxa de juros im- plícita de 12% ao ano. Com base nas informações iniciais, o primeiro passo é efetuar o cálculo do valor presente dos pagamentos que não são efetuados nessa data, ou seja, o valor total do contrato. Recomenda-se o uso de uma planilha eletrônica para essa apuração de for- ma que também possa ser elaborado um fluxo de caixa anual para facilitar o controle e checagem dos cálculos e apuração dos lançamentos contábeis que serão registrados. 146 Contabilidade Avançada Utilizando uma planilha eletrônica (fórmula VP = Valor Presente) e os dados iniciais fornecidos, apurou-se o montante de valor presente de R$ 36.448,19. Consequentemen- te, as despesas com juros nesse contrato são de R$ 11.551,81 (diferença entre o valor integral do contrato, de R$ 48.000,00, para o valor presente apurado, de R$ 36.448,19). Assim, o valor presente de R$ 36.448,19 representará o valor da mensuração e do reconhecimento do direito de uso do ativo no momento inicial (linha do Balanço Patrimonial chamado de Direito de Uso em Arrendamento). Para o Passivo de Arrendamento, o profissional contábil deverá contabilizar a mensuração e o reconhecimento na data inicial pelo montante integral do valor total do contrato, isto é, R$ 48.000,00, reduzindo-o do valor dos juros implícitos de R$ 11.551,81, o que resultará no valor líquido de R$ 36.448,19, igual ao Direito de Uso em Arrendamento, no Ativo não Circulante, Imobilizado. Vide a seguir os lançamentos contábeis para o reconhecimento contábil do ativo e passivo na data inicial, lembrando que o profissional contábil deve também efe- tuar a segregação das parcelas de curto prazo e de longo prazo: Tabela 1 Lançamentos contábeis na mensuração inicial D Ativo não Circulante – Imobilizado: Direito de Uso em Arrendamento R$ 36.448,19 C Passivo Circulante: Arrendamento (R$ 12.000,00) D Passivo Circulante: ( – ) Juros a apropriar – Arrendamento R$ 1.285,71 C Passivo não Circulante: Arrendamento (R$ 36.000,00) D Passivo não Circulante: ( – ) Juros a apropriar – Arrendamento R$ 10.266,10 Fonte: Elaborada pelo autor. • Mensuração subsequente (Ano 1) Começando pelo valor do direito de uso do ativo: o valor do ativo registrado na data inicial do seu reconhecimento não sofrerá modificação. O profissional contá- bil, porém, deverá calcular e reconhecer o valor da depreciação acumulada desse ativo. Esse valor será calculado através do valor do direito de uso do ativo registra- do, valor de R$ 36.448,19, dividido pelo tempo do contrato (4 anos), apurando-se assim o valor anual de depreciação de R$ 9.112,05. Para atualizar o cálculo do Passivo de Arrendamento, o profissional contábil deverá fazer uso do cálculo de um fluxo de caixa descontado pelo prazo de 4 anos do contrato. Demonstra-se a seguir o resultado do fluxo de caixa calculado (o qual se reco- menda que seja apurado por meio de uma planilha eletrônica) para fins de melhor entendimento dos cálculos e valores contabilizados: Arrendamentos 147 Tabela 2 Fluxo de caixa do passivo de arrendamento, conforme contrato de aluguel Ano Valor das presta-ções de aluguel Despesa financeira com juros embutido na prestação de aluguel Amortização da parcela de aluguel Saldo da dívida do contrato de arrenda- mento 0 R$ 36.448,19 1 R$ 12.000,00 R$ 4.373,78 R$ 7.626,22 R$ 28.821,98 2 R$ 12.000,00 R$ 3.458,64 R$ 8.541,36 R$ 20.280,61 3 R$ 12.000,00 R$ 2.433,67 R$ 9.566,33 R$ 10.714,29 4 R$ 12.000,00 R$ 1.285,71 R$ 10.714,29 R$ 0,00 TOTAIS R$ 48.000,00 R$ 11.551,81 R$ 36.448,19 R$ 0,00 Fonte: Elaborada pelo autor. Como pode ser observado, o fluxo de caixa permite que o profissional con- tábil segregue o valor principal da amortização das parcelas das despesas fi- nanceiras com juros (taxa implícita de 12% ao ano), informação relevante para que os lançamentos contábeis sejam realizados de forma adequada, conforme demonstrado a seguir: Tabela 3 Lançamentos contábeis na mensuração dos anos subsequentes Lançamentos referentes ao grupo de Ativo Não Circulante – Imobilizado Ano 1 Ano 2 Ano 3 Ano 4 Ativo Não Circulante – Imobilizado: Direito de Uso em Arrendamento (somente para fins ilustrativos – valor não se altera) R$ 36.448,19 R$ 36.448,19 R$ 36.448,19 R$ 36.448,19 D Resultado do respectivo exercício: Despesa com Depreciação (referente ao Arrendamento) R$ 9.112,05 R$ 9.112,05 R$ 9.112,05 R$ 9.112,05 C Ativo Não Circulante – Imobilizado: ( – ) Depreciação Acumulada (R$ 9.112,05) (R$ 9.112,05) (R$ 9.112,05) (R$ 9.112,05) Ao final dos 4 anos, o direito de uso do ativo estará totalmente depreciado. Lançamentos referentes ao grupo de Passivos Circulantes e Não Circulantes. Pagamento da parcela: Ano 1 Ano 2 Ano 3 Ano 4 D Passivo Circulante: Arrendamento R$ 12.000,00 R$ 12.000,00 R$ 12.000,00 R$ 12.000,00 C Banco conta corrente (R$ 12.000,00) (R$ 12.000,00) (R$ 12.000,00) (R$ 12.000,00) Transferência das parcelas de longo para curto prazo – Passivo de Arrendamento e juros a apropriar: 148 Contabilidade Avançada Ano 1 Ano 2 Ano 3 Ano 4 D Passivo Não Circulante: Arrendamento R$ 12.000,00 R$ 12.000,00 R$ 12.000,00 - C Passivo Circulante: Arrendamento (R$ 12.000,00) (R$ 12.000,00) (R$ 12.000,00) - D Passivo Não Circulante: ( - ) Juros a apropriar – Arrendamento R$ 1.285,71 R$ 1.285,71 R$ 1.285,71 - C Passivo Circulante: