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Farmacologia dos diuréticos Diuréticos são fármacos que promovem o aumento do fluxo urinário e redução do volume de líquido extracelular por promoverem o aumento da excreção de sódio no túbulo renal (natriurese) e, consequentemente de água. Isso ocorre principalmente pela inibição do transporte do sódio pelas células dos túbulos renais, diminuindo sua reabsorção. Todavia, essa natriurese será finita e posteriormente compensada pela ativação de mecanismos de freio como o sistema nervoso autônomo simpático e o sistema renina angiotensina aldosterona (SRAA), promovendo um aumento do sódio. Assim, esses efeitos diuréticos perduram até certo tempo, sendo que seu uso a longo prazo é mantido por efeitos vasodilatadores associados. No néfron tem-se ação de diferentes diuréticos em diversas partes, como túbulo proximal, alça de Henle, túbulo distal e ducto coletor atuando em enzimas e transportadores específicos de cada segmento. 1) Inibidores da anidrase carbônica Atuam especificamente no túbulo proximal inibindo a enzima anidrase carbônica (II e IV). Normalmente o bicarbonato filtrado no túbulo proximal encontra o hidrogênio proveniente do transportador NHE3, formando espontaneamente o ácido carbônico, que forma H2O e CO2 por ação da anidrase carbônica no lúmen, esses que entram na célula e sofrem novamente a ação da anidrase, tendo formação do ácido carbônico e dissociação em H+ (participa da troca com o Na+ pelo trocador NHE3) e do HCO3, que é reabsorvido para o interstício. Assim, com a inibição da anidrase carbônica tem-se permanência do bicarbonato no lúmen tubular, tendo efeitos como: Excreção de água por não oferecer substrato para o NHE3 e o sódio permanecer no lúmen. Reversão da alcalose metabólica por ter menos HCO3- reabsorvido. Uso clínico: utilização tópica no tratamento do glaucoma, já que a produção do humor aquoso é dependente da anidrase carbônica, podendo auxiliar na diminuição da pressão intraocular. Também pode ser empregado na alcalinização da urina, podendo servir para eliminação de determinados fármacos. Efeitos colaterais: podem causar acidose metabólica por ter os níveis de bicarbonato reduzidos no sangue, além de predispor a formação de cálculos renais por permitir a precipitação de alguns cálculos ao se alcalinizar a urina. Um dos problemas também é a depleção de potássio por aumentar a concentração de sódio tubular, promovendo a entrada de sódio via ENAC e saída de potássio por canais ROMK pelas células principais nos túbulos coletores. Fármacos: acetazolamida, brinzolamida, entre outros. 2) Diuréticos osmóticos São diuréticos que serão completamente filtrados, não serão reabsorvidos e permanecerão dentro do túbulo, gerando um aumento da força osmótica intratubular que atrai a água e aumenta o volume urinário, diminuindo a reabsorção de água e, consequentemente, a volemia. Efeitos adversos: podem promover um agravamento da insuficiência cardíaca por aumentar temporariamente o volume de líquido extracelular até que ele seja filtrado e excretado. Também pode causar certa hiponatremia por manter o sódio no lúmen pela permanência da água. Uso clínico: em casos de elevação da pressão intracraniana, em casos emergenciais. Fármacos: manitol. 3) Diuréticos de alça Os diuréticos de alça atuam no ramo ascendente espesso da alça de Henle inibindo a reabsorção de cerca de 25% do sódio por bloqueio dos receptores NKCC2, promovendo diurese potente por permanência do sódio, potássio e cloreto no lúmen tubular. Esse bloqueio também atua impedindo a geração da diferença de potencial transepitelial (que seria gerada por saída do cloro para o interstício e do potássio para o túbulo), impedindo a passagem de sódio por via paracelular. Todavia, o cálcio e o magnésio também não passarão por essa via, gerando quadros como hipomagnesemia (hipocalcemia não é tão comum, já que ocorre a reabsorção de cálcio por outras vias). Também terão efeito vasodilatador por aumentar a expressão da COX e, consequentemente, de prostaglandinas. Assim, o uso de AINEs podem reduzir a eficácia desses diuréticos. Podem auxiliar no alívio do edema pulmonar por promoverem Redução da reabsorção de Na+ Túbulo proximal Alça de Henle Túbulo distal Ducto coletor vasodilatação e aumento da capacitância venosa, reduzindo a pressão de enchimento do ventrículo esquerdo. Uso clínico: alívio do edema associado a insuficiência cardíaca, hiperpotassemia, hipercalcemia, entre outras. Efeitos colaterais: hipovolemia, hipopotassemia (saída de potássio nas células principais pelos canais ROMK nos túbulos coletores), hipotensão, hiperuricemia (a longo prazo, por competição pela secreção de ácido úrico no túbulo proximal), ototoxicidade (zumbido, vertigem), entre outros. Também ocorre alcalose metabólica, já que as células intercaladas promovem entrada de K+ na célula e saída de bicarbonato para o sangue pela membrana basolateral. Fármacos: furosemida. 4) Tiazídicos Agem nos transportadores NCC nos túbulos distais, impedindo a reabsorção de cerca de 10% do sódio filtrado. Promove também o aumento da expressão do canal TRPV5 na membrana luminal do túbulo distal, aumentando a reabsorção de cálcio, que passará para o interstício por um trocador com o sódio. Podem causar hipopotassemia por permanecer mais sódio no túbulo, promovendo a saída de potássio por canais ROMK pelas células principais. Efeitos colaterais: estão associados a alcalose metabólica (entrada de bicarbonato no sangue pelas células intercaladas), disfunção erétil (redução do volume sanguíneo), além de promoverem redução da tolerância à glicose (atrapalha sinalização da insulina), aumentando a predisposição a diabetes. Possuem meia vida longa em comparação aos diuréticos de alça, podendo ter efeitos sinérgicos, mas são menos eficazes. Uso clínico: hipertensão e ICC. Fármacos: hidroclorotiazida. 5) Poupadores de potássio Reduzem a reabsorção de sódio no ducto coletor por bloqueio dos canais ENAC ou por antagonismo da aldosterona, essa que promoveria o aumento da síntese e inserção de canais ENAC. Assim, impedem a saída de potássio por canais nas células principais, já que mantêm o aporte de sódio no ducto coletor. Efeitos colaterais: hiperpotassemia, ginecomastia (aldosterona é hormônio esteroide, podendo ter reação cruzada em receptores como da testosterona), acidose metabólica (bicarbonato não é liberado no sangue). Irão promover natriurese leve, tendo efeito pouco expressivo como diurético na redução de volemia, sendo mais para poupar potássio. Fármacos: amilorida (inibem canais diretamente), espironolactona (antagonista da aldosterona). Quando utilizar diuréticos? Estados edematosos: insuficiência cardíaca, insuficiência renal, cirrose hepática, edema idiopático. Estados não edematosos: hipertensão, nefrolitíase, hipercalcemia e diabetes insípido. Na insuficiência cardíaca tem-se redução do débito cardíaco, que gera mecanismos compensatórios para aumento da volemia, como vasoconstrição, estímulo do SRAA, aumento da volemia, entre outros. Esse aumento de líquido a curto prazo auxilia na manutenção do débito e do enchimento cardíaco, mas a longo prazo irá promover a piora progressiva do quadro de insuficiência cardíaca e edema. O diurético será importante para reduzir o volume de líquido intravascular, reduzindo a retenção de água, a pré-carga (melhorando o trabalho cardíaco) e o edema. Todavia, esse paciente pode manter o débito cardíaco as custas dessa alta volemia e pressão de enchimento elevada, de modo que a dose utilizada do diurético deve reduzir o edema sem reduzir bruscamente o débito cardíaco, causando hipoxemia e alcalose metabólica. Observa-se também certa tolerância aos diuréticos por aumento compensatório na reabsorção tubular renal de sódio. Em casos de alcalose metabólica deve-se promover reposiçãode potássio e restauração de volume com soro fisiológico. Em casos de hipocalemia deve-se promover redução da ingestão de sódio, aumento da ingestão de potássio ou diuréticos poupadores de potássio. Na hipertensão os tiazídicos são drogas de escolha, sendo que irão inibir o transporte de sódio e aumentar sua excreção, reduzindo a volemia e o retorno venoso, diminuindo o volume sistólico e o débito cardíaco, tendo efeitos diretos na redução da pressão arterial. Além disso terão efeito na produção de prostaglandinas, causando vasodilatação e reduzindo a resistência vascular periférica. Tais fármacos podem ser utilizados em monoterapia na hipertensão arterial leve (10-15 mmHg).