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INTRODUÇÃO Os animais peçonhentos e venenosos possuem em comum o fato de produzir veneno. O que os diferencia é a presença de uma estrutura para inocular essa substância. Os animais peçonhentos possuem um aparelho para inocular o veneno. Em relação à identificação das cobras peçonhentas, existem algumas características específicas, sendo as peçonhentas com cabeça geralmente achatada, triangular e com presas, olhos pequenos com pupila em fenda vertical, fosseta loreal, cauda curta e afinada, movimento lento, hábitos noturnos e agressivos. Com exceção das cobras corais- verdadeiras, que não possuem fosseta loreal e possuem pupilas arredondadas. As serpentes peçonhentas no Brasil pertencem às famílias Viperidae e Elapidae. Na família Viperidae, temos as serpentes responsáveis pelos acidentes botrópico, crotálico, e laquético. A família Elapidae são conhecidas pelos acidentes elapídicos. A dentição das serpentes é uma característica importante, porque a inoculação do veneno depende de presas apropriadas para esta função. As serpentes são divididas em quatro grupos, de acordo com a dentição e a capacidade de injetar veneno: áglifa, opistóglifa, proteróglifa e solenóglifa. Áglifa: não apresenta presas capazes de inocular o veneno, esta dentição está presente nas serpentes consideradas não peçonhentas; Opistóglifa: possui duas ou mais presas com sulco externo, pelo qual o veneno é injetado, localizadas na posição posterior do maxilar superior Proteróglifa: dotada de um par de presas fixas com um canal central, localizadas na posição anterior do maxilar superior; Solenóglifa: possui um par de presas inoculadoras, com um canal central, grandes, pontiagudas e retráteis, localizadas na porção anterior do maxilar superior. Os gêneros Bothrops e Crotalus correspondem cerca de 90% dos casos de acidentes. Já os casos de acidente laquetico são considerados incomuns e os de elapidico raros. ACIDENTE ELAPÍDICO O acidente elapídico é causado por serpentes da família Elapidae, gêneros Micrurus e Leptomicrurus. No Brasil, temos 19 espécies de Micrurus e três de Leptomicrurus. As espécies mais importantes são Micrurus frontalis (chamada de cobra-coral ou só coral), Micrurus corallinus (que também leva o nome de cobra-coral, coral-verdadeira ou boicorá) e Micrurus ibiboboca (chamada popularmente de coral-venenosa, coral- verdadeira). O acidente elapídico é raro no Brasil, porque essas serpentes tem um comportamento não agressivo e são de habitat semissubterrâneo, mas isso não quer dizer que devem ser ignorados, porque podem ser bastante graves, então o prognóstico é sempre considerado reservado. Além disso, os locais onde mais aconteceriam esses acidentes são em áreas rurais e com animais de produção, onde muitas vezes a presença de veterinário não é requisitada e muito menos notificação aos órgãos responsáveis. São serpentes de tamanho mediano (de 30 centímetros até 1 metro e 20), que apresentam anéis corporais de colorações pretas, amarelas, brancas e vermelhas. Os olhos são pequenos com pupilas arredondadas. Possuem dentição proteróglifa, e não têm fosseta loreal. Uma característica marcante é o comportamento de levantarem a cauda, de forma semienrolada, quando se sentem ameaçadas. É possível considerar que a Micrurus pode inocular no mínimo 20mg do veneno, sendo que 4 ou 5mg já pode ser considerada uma dose letal. Esse veneno contem 25% de sólidos totais, sendo 70-90% deles proteínas e o restante carboidratos, aminoácidos, peptídeos, aminas e metaloproteinases. Além de duas neurotoxinas, uma pré e outra pós sináptica. É difícil o estudo dos componentes por ser um veneno de pouca quantidade obtida, difícil coleta e difícil manutenção da cobra-coral em cativeiro. O veneno elapídico possui ações neurotóxica, mionecrótica, edematogênica e hemorrágica, sendo as duas primeiras com maior importância clínica. A neurotoxina pré-sináptica vai atuar na junção muscular nos nervos motores, possuem atividade fosfolipásica, interferem no metabolismo do Ca++, impedindo a liberação da acetilcolina na fenda sináptica. Já a neurotoxina pós-sináptica se fixam competitivamente aos receptores colinérgicos na junção neuromuscular, impedindo a combinação com a Ach; assim, a deflagração do potencial de ação é bloqueada. Não há contração muscular, logo não há movimento, fazendo com que a morte ocorra por falência respiratória por paralisia muscula, em decorrência da paralisia da musculatura torácica intercostal e também por acúmulo de secreções, evoluindo para paralisia diafragmática. Como o veneno possui neurotoxinas de baixo peso molecular, os sinais iniciam precocemente. Outra ação do veneno é a mionecrose, provocada por influxo de Ca++, causando hipercontração dos microfilamentos, danos mitocondriais e ativação de fosfolipases dependentes de Ca++. As porções necrosadas das miofibras têm diversas aparências histológicas diferentes. As mudanças mais precoces frequentemente são hipercontrações segmentares, tendo como resultado segmentos de diâmetro ligeiramente maiores com coloração ligeiramente mais escura que são mais bem observados em seções transversais, como esse exemplo aqui. Os sinais clínicos locais são a parestesia e a dor. Os sinais sistêmicos observados são vômitos, face miastênica com ptose palpebral bilateral simétrica ou assimétrica, flacidez dos músculos da face, turvação visual, diplopia, oftalmoplegia, anisocoria, dificuldade para deglutição e mastigação, sialorreia, ptose mandibular, mialgia generalizada e dispneia restritiva e obstrutiva. O tratamento específico é feito com o soro antielapídico, entretanto, esse soro é difícil de ser encontrado para uso veterinário, por isso é usual apenas o tratamento de suporte. A utilização de anticolinesterásicos, como a neostigmina ou a piridostigmina, é indicada para reverter o bloqueio colinérgico na junção neuromuscular promovido pelo veneno, mas deve ser feita após prévia atropinização para evitar estimulação muscarínica. Também é recomendado um teste prévio com a neostigmina antes da sua utilização, para comprovar sua eficácia. Como a morte pode ocorrer por parada respiratória, pode ser feita a ventilação artificial do paciente, além do uso de antibióticos para possíveis infecções secundárias, controle da dor e uso de bandagens no local do ataque a fim de imobilização. Importante lembrar da contraindicação ao uso de opióides, como a morfina, pois estes acentuam a depressão respiratória.