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Cidadania: Conceito e História

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FACULDADE DOM ALBERTO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ÉTICA, CIDADANIA E SUTENTABILIDADE 
 
 
 
 
 
 
 
SANTA CRUZ DO SUL – RS 
 
 
 
 
1 
 
 
 
1 CIDADANIA 
Cidadania é um termo de difícil definição simples, mas em um conceito amplo, 
cidadania pode ser dita como a qualidade de ser cidadão, e desse modo sujeito de 
direitos e deveres. 
PENA (2015) traz uma boa definição de cidadania: 
“A cidadania é o conjunto de direitos e deveres exercidos por um indivíduo 
que vive em sociedade, no que se refere ao seu poder e grau de interven-
ção no usufruto de seus espaços e na sua posição em poder nele intervir e 
transformá-lo. Essa expressão vem do latim civitas, que quer dizer cidade. 
Antigamente, cidadão era aquele que fazia parte da cidade, tendo direitos e 
deveres por nela habitar. Atualmente, esse conceito extrapola os limites ur-
banos, podendo ser compreendido no espaço rural.” 
Cidadania é um tema que vem sendo discutido com bastante constância 
atualmente, mas, na maioria das vezes não é feita uma profunda reflexão acerca do 
tema, motivo que torna bastante necessário estudos que buscam desnaturalizar este 
conceito tão vazio, pelo seu uso indevido e ao pouco conhecimento a respeito de 
uma questão fundamental no que tange ao exercício democrático e ao engajamento 
necessário à vida em sociedade. 
 
 
Fonte: institutomillenium.org.br 
 
Os Docentes M. Lima, A. Junior e Brzezinski (2016) colocam o termo da 
seguinte forma: 
AULAS 11 A 20 
 
 
 
2 
 
 
 
“A cidadania é notoriamente um termo associado à vida em sociedade. Sua 
origem está ligada ao desenvolvimento das pólis gregas, entre os séculos 
VIII e VII a.C. A partir de então, tornou-se referência para os estudos que 
enfocam a política4 e as próprias condições de seu exercício, tanto nas so-
ciedades antigas quanto nas modernas. Mudanças nas estruturas socioeco-
nômicas incidiram, igualmente, na evolução do conceito e da prática da ci-
dadania, moldando-os de acordo com as necessidades de cada época. O 
conceito contemporâneo de cidadania se estendeu em direção a uma pers-
pectiva na qual cidadão não é apenas aquele que vota, mas aquela pessoa 
que tem meios para exercer o voto de forma consciente e participativa. Por-
tanto, cidadania é a condição de acesso aos direitos sociais (educação, sa-
úde, segurança, previdência) e econômicos (salário justo, emprego) que 
permitem ao cidadão desenvolver todas as suas potencialidades, incluindo a 
de participar de forma ativa, organizada e consciente da vida coletiva no Es-
tado”. 
 
Segundo MORAES (2013), o termo cidadania tem origem no latim civitas, já o 
conceito advém da Antiguidade, aproximando-se nas civilizações gregas das noções 
de igualdade, liberdade e das virtudes tidas como republicanas – que mesmo 
atualmente são relacionadas ao termo. O ponto primordial da história do conceito de 
cidadania nos leva a dois questionamentos fundamentais: o significado de ser 
cidadão e quem pode ser caracterizado como tal. Segundo o ponto de vista de 
Aristóteles, ser cidadão perpassa pela titularidade de uma espécie de poder público 
sem limitações e com poder de decisão coletiva. Já em relação aos critérios 
necessários à cidadania, Aristóteles os pontua de modo bem mais restritivo, 
posicionadoos entre os poucos homens que não dependiam de sua força produtiva 
para viver, excluindo os estrangeiros, as mulheres e os escravos. 
A edificação da categoria cidadania pelo ponto de vista romano possui um 
caráter mais jurídico. A palavra latina civis, ainda com uma acepção ligada ao 
cidadão, teria que garantir os direitos dos nativos em relação aos estrangeiros. 
Dessa forma, os direitos dos civis relacionam-se ao voto – constituição de família, 
direito de paz ou guerra, às eleições nas magistraturas, contração de obrigações, ou 
mesmo quanto à propriedade ou libertação de servos. Os termos patricius, gentilis e 
civis na Roma antiga, eram relacionados à noção de cidadania, denominando uma 
mesma figura social. Dessa forma, pode-se perceber que a história de Roma 
conferia uma noção extensa aos critérios de cidadania, e que subsequentemente, 
esses direitos seriam concedidos ao povo do império sem distinção. 
O historiador Pedro Paulo Funari (2013), permite-nos verificar a estreita 
relação entre a cidadania romana e o conceito moderno do termo: 
 
 
 
3 
 
 
 
“Como podemos avaliar a importância da experiência romana para o concei-
to moderno de democracia? Para muitos estudiosos do século XX, a Repú-
blica romana foi encarada como uma oligarquia corrupta, uma aristocracia 
endinheirada, comparada negativamente com a Atenas democrática do sé-
culo V a.C. Nas últimas décadas, entretanto, estudiosos têm mostrado que a 
vida política romana era menos controlada pela aristocracia do que se ima-
ginava e, de certa maneira, Roma apresentava diversas características em 
comum com as modernas noções de cidadania e participação popular na vi-
da social. Os patriarcas fundadores dos Estados Unidos da América toma-
ram como modelo a constituição romana republicana, com a combinação de 
Senado e Câmara (no lugar das antigas assembleias). A invenção do voto 
secreto, em Roma, tem sido considerada a pedra de toque da liberdade ci-
dadã. [...] Os romanos tinham um conceito de cidadania muito fluido, aberto, 
aproximando-se do conceito moderno de forma decisiva. ” 
1.1 Democracia e os Direitos fundamentais 
O reconhecimento dos direitos fundamentais do homem teve origem em docu-
mentos históricos que acompanharam o avanço da humanidade na conquista de 
novos direitos. 
Tais documentos foram o ponto de origem que deu ensejo à garantia de liber-
dades que culminaram com o posterior reconhecimento e positivação dos direitos 
fundamentais nas constituições. 
Graças ao longo processo de evolução dos Estados chegou-se até ao Estado 
Democrático de Direito e à industrialização, advinda das novas formas tecnológicas 
características da Revolução Industrial e dos avanços científicos, surgindo a neces-
sidade de tutela dos direitos das mulheres e crianças nas jornadas desumanas de 
trabalho de 14 e 16 horas, ensejando no surgimento da Organização Internacional 
do Trabalho. 
A Magna Carta estabelecida em 1215, pontifica alguns direitos dos súditos in-
gleses, mais especificadamente dos nobres, como o habeas corpus, o due process 
of law e o direito de propriedade, confirmando um marco histórico na evolução dos 
direitos fundamentais. 
Outro movimento que propiciou a evolução dos direitos fundamentais foi a Re-
forma Protestante. Ela consagrou o direito à liberdade de culto e opção religiosa no 
contexto europeu, como bem demonstrou o Edito de Nantes de 1598. 
A Petition of Rights de 1628, fruto da Revolução Gloriosa foi recebida como um 
dos mais consistentes precedentes na afirmação desses direitos. Neste documento 
 
 
 
4 
 
 
 
foi estabelecida a proibição das prisões arbitrárias, concedendo-se habeas corpus e 
conferindo o direito de petição, como também o princípio da legalidade penal. 
A Declaração de Direitos do povo da Virgínia, de 1776, consubstancia a ideia 
de que todos os homens são, por natureza, igualmente livres e independentes, e de 
que todo poder emana do povo, assegurava o direito de defesa nos processos crimi-
nais, o julgamento célere e imparcial, a liberdade de imprensa, entre outros direitos 
que assumem uma feição democrática na formação do novo governo. 
A Constituição norte americana, aprovada na Convenção de Filadélfia, ratifica o 
sentimento e a necessidade de estruturação e positivação desses direitos. 
Adiante, temos a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de origem 
francesa, de 1789, com um teor mais metafísico e universal, estabelecendo um novo 
paradigma, não obstante as críticas a sua consistência. 
No pós Segunda Guerra, em 1948, a Assembleia Geral da ONU proclama a 
Declaração Universal dos Direitos do Homem, que assumiu um caráter de proteçãoem âmbito internacional, criando-se a comissão dos Direitos do Homem, revestida 
do sentimento de negação aos horrores e violações a tais direitos, como o extermí-
nio de judeus, as deportações em massa, os trabalhos forçados, os assassinatos 
políticos, típicos da conjuntura da época. 
Na Europa, através do Estatuto de Roma de 1950, foi criada a Convenção Eu-
ropeia dos Direitos Humanos. Neste contexto, foi estabelecida a Corte Europeia de 
Direitos Humanos que reúne protocolos previstos na Carta Social Europeia, com le-
gitimidade apenas para avaliar violações relativas aos direitos inerentes à Conven-
ção Europeia de Direitos Humanos. Os Estados signatários são submetidos à juris-
dição da Corte Europeia de Direitos Humanos. 
Na América, foi criada a Convenção Americana de Direitos Humanos, também 
conhecida como o Pacto San José da Costa Rica, em 1969, com jurisdição exercida 
pela Corte Interamericana de Direitos Humanos desde 1978; no entanto, o Brasil 
tornou-se signatário apenas em 1992. Um dos fatores que impediram ou retardaram 
um desenvolvimento mais plausível na América Latina foi à ditadura e os seus des-
dobramentos políticos. 
No Brasil, a preocupação do legislador originário sempre foi evidente quanto 
aos Direitos do Homem e data da primeira Constituição brasileira, de 1824, na van-
guarda até mesmo em relação à Constituição belga de 1831, que continha em suas 
 
 
 
5 
 
 
 
disposições gerais direitos civis e políticos. Seguem-se as constituições de 1891, 
1934, 1937, já sob a égide ditatorial, ampliando o rol de direitos para a inclusão da 
ordem econômica social. A Constituição de 1946 não consagrou o direito à subsis-
tência, ocorrendo o mesmo com a de 1967 e, posteriormente, com a de 1969, que 
de forma sistematizada, elenca os direitos econômicos e sociais. 
Por fim, a Constituição de 1988 reserva especial atenção aos direitos funda-
mentais, contendo o título “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”, conferindo por 
força do art. 5º, §1º, o caráter de aplicabilidade imediata para as garantias funda-
mentais e, ainda, com o rol abstraído do art.60, § 4º, as cláusulas pétreas, limitado-
ras à atuação do poder constituinte derivado. 
Logo, a Constituição Brasileira de 1988 institucionaliza a instauração de um re-
gime político democrático no Brasil. Introduz também indiscutível avanço na consoli-
dação legislativa das garantias e direitos fundamentais e na proteção de setores vul-
neráveis da sociedade brasileira. 
A partir dela, os direitos fundamentais ganham relevo extraordinário, situando-
se a Carta de 1988 como documento abrangente e pormenorizado sobre dos direitos 
dos homens jamais adotado no Brasil. 
A consolidação das liberdades fundamentais e das instituições democráticas 
no país, por sua vez, mudam substancialmente a política brasileira de Direitos 
Humanos, possibilitando um progresso significativo no reconhecimento de 
obrigações internacionais neste âmbito. 
 
 
 
 
6 
 
 
 
 
Fonte: osconstitucionalistas.com.br 
 
O Juiz de Direito e Professor Ingo Wolfgang Sarlet (2015), nos traz uma 
compreensão acerca dos Direitos Fundamentais: 
Para a compreensão adequada do que são, afinal de contas, direitos fun-
damentais, não basta saber que se cuida de direitos assegurados pela or-
dem constitucional de determinado Estado, pois tal circunstância, embora 
essencial, por si só não é suficiente, ao menos de acordo com a evolução 
que marcou o constitucionalismo do Segundo Pós-Guerra e da qual o mode-
lo adotado pelo nosso próprio constituinte de 1988 é tributário. 
Dito de outro modo, o conceito de direitos fundamentais também entre nós 
não se limita à condição de direitos positivados expressa (ou mesmo implici-
tamente) em determinada constituição: um direito fundamental não é, por-
tanto, apenas um direito de matriz constitucional. 
 
O Direito Internacional dos Direitos Humanos, surgido no período pós-guerra, 
veio como uma tentativa de situar os direitos fundamentais na base da ordem 
internacional contemporânea. Para que esse objetivo fosse alcançado, seria 
necessária uma universalização e internacionalização desses direitos, ou seja, a 
questão dos Direitos Humanos deveria ir além das fronteiras dos Estados Nacionais. 
 
 
 
7 
 
 
 
Esse processo de internacionalização acabou gerando o surgimento de um 
sistema normativo internacional, voltado para a proteção e amparo dos direitos 
fundamentais. O sistema internacional de proteção dos direitos humanos dialoga 
com os sistemas nacionais para a garantia e o respeito aos direitos e às liberdades 
fundamentais dos indivíduos. Todavia, se o Estado se torna negligente frente ao 
compromisso de promoção dos Direitos Humanos, o sistema internacional possui 
legitimidade para cobrar desses Estados. 
 Essa legitimidade tem lugar, sobretudo, quando se estabelece uma efetiva 
relação do Estado Nacional com a ordem internacional, no sentido de garantia dos 
direitos fundamentais. De outra maneira: quando o Estado aceita o aparato 
internacional. Nessa perspectiva, a intervenção internacional é uma medida que 
reflete apenas em um auxílio ou em um complemento à proteção interna desses 
direitos. O processo de internacionalização dos direitos humanos desencadeia a 
democratização do cenário internacional, uma vez que surge a sociedade civil 
internacional, composta por organizações não governamentais e por indivíduos, que 
passam a poder acionar órgãos internacionais em casos de violação dos direitos 
humanos. 
Por essas razões, a dimensão da cidadania no exercício de garantia dos 
direitos humanos, sobretudo no plano internacional, sugere que o favorecimento do 
acesso às Cortes internacionais a indivíduos ou grupos organizados, não só 
contribui para a efetivação dos direitos humanos, como se realiza, propriamente, o 
entendimento de que o sistema internacional de proteção desses direitos envolve um 
sistema legal juridicamente vinculante, podendo ser exigível, portanto, diretamente 
pela cidadania. É preciso, no entanto, refletir sobre como a proteção dos direitos 
humanos costuma se realizar no interior de ordenamentos jurídicos internos dos 
Estados democráticos e, sobretudo para os objetivos deste trabalho, na democracia 
brasileira. 
As declarações francesas de 1789 e americana de 1776, no início da idade 
contemporânea, trazem a ideia de cidadania apoiada em um discurso liberal, em que 
os direitos fundamentais se relacionavam à ideia de liberdade, segurança e 
propriedade. Estabeleciam, desse modo, os direitos civis e políticos. Já no período 
entre guerras, surge a preocupação com o discurso social da cidadania, sendo 
valorizada a ideia de igualdade (na dimensão dos direitos sociais e econômicos), 
 
 
 
8 
 
 
 
como uma tentativa de eliminar a exploração econômica conforme tratava a 
Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado de 1918, da extinta 
República Soviética Russa. 
A separação entre os direitos civis e políticos e os direitos sociais acerca da 
cidadania tem fim com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948. 
Aquele texto reúne todos os tipos direitos fundamentais, que agora não podem mais 
ser pensados isoladamente. Além disso, a Declaração Universal estabelece que os 
Direitos Humanos são universais e inerentes aos seres humanos. Somando esses 
dois aspectos, a Declaração de 1948 traz a concepção contemporânea de cidadania. 
Representando uma nova dimensão sobre o que passa a ser um sujeito de direito: a 
partir de então, se fala em categorias de direitos, segundo suas condições 
particulares. Nessa linha, ganha relevo discussões sobre os direitos das mulheres, 
dos grupos raciais e de quaisquer sujeitos que costumam ser discriminados ou 
constitua alguma espécie de minoria que precise de uma dimensão de afirmação de 
seus direitos. É preciso pensar, nesse cenário, se a Constituição brasileira de 1988 
acolhe essa nova dimensãode cidadania, tal como descrita. A Constituição brasileira 
adota a indivisibilidade dos direitos humanos. Ou seja, ela proclama ser inconcebível 
separar os direitos civis e políticos dos direitos sociais, econômicos e culturais. 
Nesse quesito, ela atende a concepção de cidadania que se delineou. 
No que diz respeito ao alcance universal dos Direitos Humanos, a Carta de 
1988 também está em consonância com a concepção contemporânea de cidadania, 
tendo em vista que seu texto afirma que todos são iguais e que os direitos 
fundamentais são inerentes à pessoa humana. A Constituição brasileira também 
concebe os direitos fundamentais como um tema de interesse internacional. Além 
disso, a ordem constitucional estabelecida em 1988 acolhe aquela nova dimensão 
de sujeito de direito, concreto e categorizado, segundo suas particularidades. Em 
seu texto, fica clara a divisão em capítulos dedicados a categorias como idosos, 
crianças e adolescentes, direitos dos índios, entre outros, dessa maneira propondo 
um tratamento específico para esses grupos. Dessa forma, a Constituição brasileira 
parece dialogar fortemente com essa nova dimensão de sujeito de direito 
internacional, e propriamente com a nova concepção de cidadania, tal como 
apresentada. 
 
 
 
9 
 
 
 
Para além disso, é possível analisar a responsabilidade do Estado na 
consolidação da cidadania brasileira observando três elementos essenciais da ideia 
de cidadania no cenário da discussão sobre Direitos Humanos, refletidos na 
Constituição brasileira: a indivisibilidade e a universalidade da ideia de direitos 
humanos, e a característica de especificidade dos sujeitos de direito. A Constituição 
brasileira assegura todos os tipos de direitos fundamentais e garante a efetividade 
de seus preceitos. Por essa razão, a todos esses direitos são assegurados a mesma 
garantia de proteção na ordem jurídica interna. A Carta de 1988 também estabelece 
o princípio da aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais, dessa forma 
vinculando os Poderes Públicos ao dever de promover esses direitos de forma plena 
e efetiva. Quanto à universalidade dos direitos fundamentais, o Estado brasileiro leva 
isso em consideração em relação a todos os indivíduos. Além disso, o país é 
obrigado a observar plenamente na ordem interna os acordos internacionais 
firmados que tratam dos direitos e garantias fundamentais e que foram ratificados 
pelo Estado brasileiro. 
Uma reflexão sobre Direitos Humanos, sobretudo quando se pensa a 
democracia brasileira e seu passado (recente) de autoritarismo, passa pela 
necessidade de se analisar a responsabilidade do Estado na consolidação da 
cidadania no Brasil. A Constituição Federal de 1988 é considerada, por muitos, um 
marco da transição democrática e da institucionalização dos direitos humanos no 
Brasil, importando, desse modo, em uma redefinição do Estado e dos direitos 
fundamentais no país, após longos vinte e um anos de ditadura militar. 
A importância com o bem-estar social e a preservação da dignidade humana 
é tão expressiva que a Constituição eleva os direitos e garantias fundamentais ao 
patamar de cláusulas pétreas. A Carta de 1988 inova ao extrapolar os limites dos 
direitos individuais e tutelar também os direitos coletivos (direitos que se aplicam a 
classes ou categorias sociais). Além disso, ela estabelece a aplicabilidade imediata 
das normas que dizem respeito aos direitos fundamentais. Aquilo que Flávia 
Piovesan chama de um “constitucionalismo concretizador dos direitos fundamentais”. 
Os direitos sociais também são tratados na Constituição com a mesma dimensão. O 
artigo 6º da Constituição estabelece uma série de direitos, como à educação, à 
saúde e ao trabalho, entre outros. Não obstante, o importante é ressaltar que a 
Constituição estabelece “uma ordem social com um amplo universo de normas que 
 
 
 
10 
 
 
 
enunciam programas, tarefas, diretrizes e fins a serem perseguidos pelo estado e 
pela sociedade”. Por outro lado, além da ordem social, a Constituição de 1988 
também estabeleceu uma ordem econômica, marcada pelo intervencionismo estatal 
em prol do bem-estar social. 
1.2 Histórico de organização das sociedades 
Pode-se dizer que uma estrutura social é o que define determinada 
sociedade. Ela é constituida da relação entre os diversos fatores — econômicos, 
políticos, históricos, sociais, religiosos, culturais — o que torna cada sociedade 
única. 
Uma das características da estrutura de uma sociedade é sua estratifícação, 
ou seja, a forma como os indivíduos e grupos diferentes são classificados em 
estratos (camadas) sociais e o modo como ocorre a mobilidade de um nível para 
outro. 
A questão da estratifícação social foi analisada pelo sociólogo brasileiro 
Octávio Ianni, em diferentes sociedades, com base, fundamentalmente, na forma 
como os indivíduos organizam a produção econômica e o poder político. Para 
estudar a estratifícação em cada sociedade é necessário que se verifique “como se 
organizam as estruturas de apropriação (econômica) e dominação (política)”, afirma 
Ianni na introdução ao livro Teorias da estratifícação social. Entretanto, essas 
estruturas são atravessadas por outros elementos — como a religião, a etnia, o 
sexo, a tradição e a cultura —, que, de uma forma ou de outra, influem no processo 
de divisão social do trabalho e no processo de hierarquização. 
A estratifícação social e as desigualdades decorrentes são produzidas 
historicamente, ou seja, são geradas por situações diversas e se expressam na 
organização das sociedades em sistemas de castas, de estamentos ou de classes. 
Cada caso precisa ser analisado como uma configuração histórica particular. 
As sociedades organizadas em castas 
O sistema de castas é uma configuração social de que se tem registro em 
diferentes tempos e lugares. No mundo antigo, há vários exemplos da organização 
em castas (na Grécia e na China, entre outros lugares). Mas é na índia que está a 
expressão mais acabada desse sistema. 
 
 
 
11 
 
 
 
A sociedade indiana começou a se organizar em castas e subcastas há mais 
de 3 mil anos, adotando uma hierarquização baseada em religião, etnia, cor, 
hereditariedade e ocupação. Esses elementos definem a organização do poder 
político e a distribuição da riqueza gerada pela sociedade. Apesar de na índia haver 
hoje uma estrutura de classes, o sistema de castas permanece mesclado a ela, o 
que representa uma dificuldade a mais para entender a questão. O sistema 
sobrevive por força da tradição, pois legalmente foi abolido em 1950. 
Pode-se afirmar, em termos genéricos, que existem quatro grandes castas na 
índia: a dos brâmanes (casta sacerdotal, superior a todas as outras), a dos xátrias 
(casta intermediária, formada normalmente pelos guerreiros, que se encarregam do 
governo e da administração pública), a dos vaixás (casta dos comerciantes, artesãos 
e camponeses, que se situam abaixo dos xátrias) e a dos sudras (a casta dos 
inferiores, na qual se situam aqueles que fazem trabalhos manuais considerados 
servis). Os párias são os que não pertencem a nenhuma casta, e vivem, portanto, 
fora das regras existentes. Entretanto, há ainda um sistema de castas regionais que 
se subdividem em outras tantas subcastas. 
O sistema de castas caracteriza-se por relações muito estanques, isto é, 
quem nasce numa casta não tem como sair dela e passar para outra. Não há, 
portanto, mobilidade social nesse sistema. Os elementos mais visíveis da 
imobilidade social são a hereditariedade, a endogamia (casamentos só entre 
membros da mesma casta), as regras relacionadas à alimentação (as pessoas só 
podem ter refeições com os membros da própria casta e com alimentos preparados 
por elas mesmas) e a proibição do contato físico entre membros das castas 
inferiores e superiores. Repulsão, hierarquia e especialização hereditária: estas são 
as palavras-chave para definiro sistema de castas, de acordo com o sociólogo 
francês Céléstin Bouglé (1870-1939), discípulo de Durkheim. 
Mas nenhum sistema é totalmente rígido, nem o de castas. Embora seja 
proibido, as castas inferiores adotam costumes, ritos e crenças dos brâmanes, e isso 
cria uma certa homogeneidade de costumes entre castas. A rigidez das regras 
também é relativizada por casamentos entre membros de castas diferentes (menos 
com os brâmanes), o que não é comum, mas acontece. 
A urbanização e a industrialização crescentes e a introdução dos padrões 
comportamentais do Ocidente têm levado elementos de diferentes castas a se 
 
 
 
12 
 
 
 
relacionarem. Isso vai contra a persistência dos padrões mais tradicionais, pois, no 
sistema capitalista, no qual a índia está fortemente inserida, a estruturação societária 
anterior só se mantém se é fundamental para a sobrevivência do próprio sistema. No 
caso específico da índia, o sistema de castas está sendo gradativamente 
desintegrado, o que não significa, entretanto, que as normas e os costumes 
relacionados com a diferenciação em castas tenham desaparecido do cotidiano das 
pessoas. Isso é confirmado pela existência de programas de cotas de inclusão para 
as castas consideradas inferiores nas universidades públicas. 
[...] a palavra casta parece despertar, de início, a ideia de especialização he-
reditária. Ninguém, a não ser o filho, pode continuar a profissão do pai; e o 
filho não pode escolher outra profissão a não ser a do pai. [...] [É] um dever 
de nascimento. [...] A palavra casta não faz pensar apenas nos trabalhos 
hereditariamente divididos, e sim também nos direitos desigualmente repar-
tidos. Quem diz casta não diz apenas monopólio, diz também privilégio. [...] 
O "estatuto" pessoal de uns e de outros é determinado, por toda a vida, pela 
categoria do grupo ao qual pertencem. [...] Quando declaramos que o espíri-
to de casta reina em dada sociedade, queremos dizer que os vários grupos 
dos quais essa sociedade é composta se repelem, em vez de atrair-se, que 
cada um desses grupos se dobra sobre si mesmo, se isola, faz quanto pode 
para impedir seus membros de contrair aliança ou, até, de entrar em relação 
com os membros dos grupos vizinhos. [...] Repulsão, hierarquia, especiali-
zação hereditária, o espírito de casta reúne essas três tendências. Cumpre 
retê-las a todas se se quiser chegar a uma definição completa do regime de 
castas (BOUGLÉ, 1973, p. 90 e 91). 
 
As sociedades organizadas por estamentos 
 O sistema de estamentos ou estados constitui outra forma de estratifícação 
social. A sociedade feudal organizou-se dessa maneira. Na França, por exemplo, no 
final do século XVIII, às vésperas da revolução havia três estados: a nobreza, o clero 
e o chamado terceiro estado, que incluía todos os outros membros da sociedade — 
comerciantes, industriais, trabalhadores urbanos, camponeses, etc. 
 Nas palavras de Octávio Ianni, no livro Teorias da estratifícação social, “a 
sociedade estamental [...] não se revela e explica apenas no nível das estruturas de 
poder e apropriação. Para compreender os estamentos (em si e em suas relações 
recíprocas e hierárquicas), é indispensável compreender o modo pelo qual 
categorias tais como tradição, linhagem, vassalagem, honra e cavalheirismo 
parecem predominar no pensamento e na ação das pessoas”. 
Assim, o que identifica um estamento é o que também o diferencia, ou seja, 
um conjunto de direitos e deveres, privilégios e obrigações que são aceitos como 
 
 
 
13 
 
 
 
naturais e são publicamente reconhecidos, mantidos e sustentados pelas 
autoridades oficiais e também pelos tribunais. 
Numa sociedade que se estrutura por estamentos, a condição dos indivíduos 
e dos grupos em relação ao poder e à participação na riqueza produzida pela 
sociedade não é somente uma questão de fato, mas também de direito. Na 
sociedade feudal, por exemplo, os indivíduos eram diferenciados desde que 
nasciam, ou seja, os nobres tinham privilégios e obrigações que em nada se 
assemelhavam aos direitos e deveres dos camponeses e dos servos, porque a 
desigualdade, além de existir de fato, transformava-se em direito. Existia assim um 
direito desigual para desiguais. 
A possibilidade de mobilidade de um estamento para outro existia, mas era 
muito controlada — alguns chegavam a conseguir títulos de nobreza, o que, no 
entanto, não significava obter o bem maior, que era a terra. A propriedade da terra 
definia o prestígio, a liberdade e o poder dos indivíduos. Os que não a possuíam 
eram dependentes, econômica e politicamente, além de socialmente inferiores. 
O que explica, entretanto, a relação entre os estamentos é a reciprocidade. 
No caso das sociedades do período feudal, existia uma série de obrigações dos 
servos para com os senhores (trabalho) e destes para com aqueles (proteção), ainda 
que camponeses e servos estivessem sempre em situação de inferioridade. 
Entre os proprietários de terras, havia uma relação de outro tipo: um senhor 
feudal (suserano) exigia serviços militares e outros serviços dos senhores a ele 
subordinados (vassalos). Formava-se, então, uma rede de obrigações recíprocas, 
como também de fidelidade, observando-se uma hierarquia em cujo topo estavam os 
que dispunham de mais terras e mais homens armados. Mas o que prevalecia era a 
desigualdade como um fato natural. 
Um exemplo dado pelo sociólogo brasileiro José de Souza Martins ilustra bem 
isso. Ele declara, em seu livro A sociedade vista do abismo: novos estudos sobre 
exclusão, pobreza e classes sociais, que durante uma pesquisa no Mosteiro de São 
Bento, na cidade de São Paulo, encontrou um livro da segunda metade do século 
XVIII, no qual havia dois registros de doações (esmolas): uma feita para um nobre 
pobre (os nobres podiam tornar-se pobres, mas não perdiam a condição de nobres), 
que recebeu 320 réis; outra, para um pobre que não era nobre, que recebeu 20 réis. 
Comenta o sociólogo que “um nobre pobre, na consciência social da época e na 
 
 
 
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realidade das relações sociais, valia dezesseis vezes um pobre que não era nobre 
[...] porque as necessidades de um nobre pobre eram completamente diferentes das 
necessidades sociais de um pobre apenas pobre”. 
Atualmente, se alguém decide dar esmola a uma pessoa que está em 
situação precária, jamais leva em consideração as diferenças sociais de origem do 
pedinte, pois parte do pressuposto de que elas são puramente econômicas. José de 
Souza Martins conclui que basicamente é isso o que distingue estamento de classe 
social. 
Hoje, muitas vezes utilizamos o termo estamento para designar determinada 
categoria ou atividade profissional que tem regras muito precisas para que se 
ingresse nela ou para que o indivíduo se desenvolva nela, com um rígido código de 
honra e de obediência — por exemplo, a categoria dos militares ou a dos médicos. 
Assim, usar as expressões “estamento militar” ou “estamento médico” significa 
afirmar as características que definiam as relações na sociedade estamental.

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