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1 SUMÁRIO 1 FAMÍLIA NATURAL E SUBSTITUTA .......................................................... 3 1.1 Conceito de Família.............................................................................. 3 1.2 Família Natural e Família Substituta .................................................... 5 2 DA PREVENÇÃO, DESCENTRALIZAÇÃO E POLÍTICA DE ATENDIMENTO .......................................................................................................... 6 2.1 Da prevenção ....................................................................................... 6 2.2 Da descentralização ............................................................................. 8 2.3 Política de atendimento ...................................................................... 19 3 PROCEDIMENTOS NA JUSTIÇA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE ..... 26 3.1 Do procedimento de colocação em família substituta – requisitos de petição. Alguns aspectos: ...................................................................................... 28 4 O INFRACIONAL E MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS .............................. 32 4.1 Do Ato Infracional (art. 103 a 105, ECA) ............................................ 32 4.2 Dos Direitos Individuais (arts. 106 a 109, ECA) ................................. 32 4.3 Das Medidas Socioeducativas (arts. 112 a 128, ECA). ...................... 33 4.4 Da Remissão (arts. 126 a 128) ........................................................... 36 4.5 Das Garantias Processuais (art. 110 e 111, do ECA). ....................... 36 4.6 Fase Policial (arts. 171 a 178, do ECA). ............................................. 37 4.7 Do procedimento na fase do Ministério Público (arts. 179 a 182). ..... 38 4.8 Ação Socioeducativa - Do Procedimento na Fase Judicial (arts. 183 a 190, do ECA). ........................................................................................................ 40 4.9 Procedência da Representação. Dos critérios de aplicação de Medidas socioeducativas. .................................................................................................... 41 4.10 Da improcedência da representação .............................................. 41 5 DOS CRIMES CONTRA A CRIANÇA E O ADOLESCENTE .................... 42 5.1 Principais crimes contra a criança e seu enquadramento .................. 42 2 5.2 Tipos de violências praticada contra crianças .................................... 48 BIBLIOGRAFIA ............................................................................................... 54 3 1 FAMÍLIA NATURAL E SUBSTITUTA 1.1 Conceito de Família1 Com as frequentes mudanças na sociedade o conceito de família vem sofrendo adequações. Embora o Código Civil Brasileiro não tenha apresentado conceito de família, a Constituição Federal de 1988 trouxe maior concepção a esse conceito ao aceitar a possibilidade de famílias desenvolvidas fora do casamento, ponderou também a família composta por um dos genitores e seus descendentes, abandonando o que antes era regra. Maria Helena Diniz faz a seguinte orientação: Na significação restrita é a família (CF, art. 226, § § 1º e 2º) o conjunto de pessoas unidas pelos laços do matrimônio e da filiação, ou seja, unicamente os cônjuges e a prole (CC, arts. 1.567 e 1.716), e entidade familiar a comunidade formada pelos pais, que vivem em união estável, ou por qualquer dos pais e descendentes, como prescreve o art. 226, § § 3º e 4º, da Constituição Federal, independentemente de existir o vínculo conjugal, que a originou. (DINIZ, 2011, p.24) Assim sendo, família é a união de pessoas constituída por vínculos consanguíneos ou afetivos. Contudo, não é permitido prender a uma única significação haja vista que, esse assunto está em constante mudança, podendo garantir que por ser algo complexo, atualmente é impossível estabelecer uma definição completa para família. Outro ponto foi a igualdade contraída por filhos concebidos fora do laço matrimonial garantida pela Constituição Federal de 1988 em seu artigo 227, parágrafo 6º que proíbe qualquer forma de discriminação entre os filhos. Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. § 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. 1 Texto extraído do link: openrit.grupotiradentes.com. 4 Hoje em dia é possível se ter vários tipos e atualmente é impossível estabelecer uma definição completa para família. Verifica-se também que a família atual não é apenas constituída por laços de sangue, existe a família por afinidade que dispõe das mesmas garantias e direitos da família natural. Por tal motivo o Direito procura a cada dia se adaptar as frequentes mutações sociais e culturais da família, pois o papel do Direito é atender à sociedade conforme suas ambições e exigências. Fonte: www.castingcallhub.com Desse modo, a família matrimonial deixou de ser a única condição admitida como família, pois a Constituição Federal passou a reconhecer além do casamento a união estável e a família monoparental, e por ser base da sociedade a família tem especial proteção do Estado, conforme o artigo 1º da Lei 9.278/96 que regula o § 3º do artigo 226 da Carta Magna. Art. 1º - É reconhecida como entidade familiar à convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família. Amparada ainda pelo Código Civil Brasileiro, como mostra o artigo 1.723: 5 Art. 1.723 - É reconhecida como entidade familiar à união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. A família monoparental, que pode ser conjecturada como a família constituída por qualquer um dos pais e seus descendentes, conforme está inserido no artigo 226; § 4º da Constituição Federal: Art. 226 - A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 4º - Entende-se, também, como entidade familiar à comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. Formar uma família monoparental não é apenas uma questão de conveniência, cada dia é mais habitual os pais ou mães que decidem assumir a responsabilidade de criar os filhos de forma independente. Diferente do que acontecia antigamente para constituição e reconhecimento de uma família, não é mais indispensável à presença de uma união matrimonial. 1.2 Família Natural e Família Substituta Família substituta é aquela formada por decisão judicial segundo o artigo 19 da Lei 8.069/90 e família natural ou biológica será aquela formada pelos pais ou por apenas um deles e seus descendentes conforme artigo 25 da Lei 8.069/90. A colocação em família substituta é uma das medidas excepcionais, que tem como objetivo assegurar a integridade física, psicológica e emocional da criança ou adolescente. Essa medida será aplicada apenas quando esgotados todos os empenhos para a continuação da criança ou adolescente em sua família biológica. Segundo a Associação de Magistrados Brasileiros na cartilha sobre adoção a família substituta pode ser caracteriza das seguintes maneiras: na primeira, a guarda que os cuidadores contraem de forma permanente ou provisória a posse da criança ou adolescente, quando os pais biológicos não querem ou não podem continuar com a posse da criança ou adolescente;na segunda, a tutela é configurada com o poder estabelecido a um adulto que passará a ser representante legal da criança ou adolescente menor de 18 anos e não emancipado, na falta dos pais; por meio de destituição do poder familiar ou falecimento, para gerir a vida e administrar os bens 6 da criança ou adolescente; e a terceira é com a adoção onde a família substituta contrai definitivamente a guarda da criança ou adolescente. O fato de colocar uma criança ou um adolescente em família substituta deve ser medida extraordinária conforme o artigo 19 da lei 8.069/90, assim, tal medida não poderá ser utilizada como regra. Antes é necessário que o Estado adote todas as medidas admissíveis para que a criança conserve seus vínculos biológicos. Apenas depois de exauridas todas as possibilidades de conservação da criança em sua família biológica é que vai procurar por uma família substituta que possa preservar o melhor interesse da criança ou do adolescente, visto que tal medida está comprometida em atender o interesse da criança e do adolescente e não o interesse de particulares. 2 DA PREVENÇÃO, DESCENTRALIZAÇÃO E POLÍTICA DE ATENDIMENTO 2.1 Da prevenção O título “Normas de Prevenção, que encerra a parte geral do ECA, está dividido em norma de prevenção geral e norma de prevenção especial. Cabe destacar que, para a aplicação de tais normas, não se deve deixar de lado o princípio norteador da proteção integral expresso no Estatuto. Este princípio, uma vez mais, é reafirmado: “Artigo 70. É dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente. ” Conhecido também como Princípio da Prevenção Geral, ou Princípio da Obrigatoriedade e Cooperação, impõe à família, à sociedade e ao Estado inibir e prevenir a ameaça e violação aos direitos da criança e adolescente. Torna obrigatória a intervenção do poder público para coibir qualquer tipo de ameaça e violação. A cooperação para coibir tais violações e ameaças deve se dar entre a sociedade e o Estado, afinal, o dever é de todos. Outro que merece destaque é o Princípio da Abrangência da Tutela, que reafirma a esfera da proteção integral da criança e adolescente e estabelece: “Artigo 71. A criança e adolescente tem o direito à informação, cultura, lazer, esportes, diversões, espetáculos e produtos e serviços que respeitem sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. ” Destaque-se, uma vez mais, que todos devem observar e ter a consciência de que estão envolvidos diretamente na formação e no desenvolvimento da criança e do 7 adolescente. Todo conteúdo inerente à informação, cultura e diversão deve ser criteriosamente selecionado. Por exemplo, o campo de atuação das mídias em geral está em constante e caloroso debate. Parte da discussão serve para tentar estabelecer quando, como, onde e para quem o conteúdo, informação, diversão, produto e serviço serão expostos, é o grande desafio. Igualmente, importa lembrar o Princípio da Responsabilização, segundo o qual tanto as pessoas físicas, jurídicas públicas ou privadas estão sujeitas às penas da lei: “Artigo 73. A inobservância das normas de prevenção importará em responsabilidade da pessoa física ou jurídica nos termos da Lei”. Apenas para fazer um parêntese e perceber a efetiva importância da aplicação deste princípio na sistemática de todo Estatuto, assim como a necessidade da participação de todos na fiscalização e exigência de todos os direitos aqui elencados, dispõe o Artigo 208 que: “Regem-se pelas disposições desta Lei as ações de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao adolescente referente ao não oferecimento ou oferta irregular: I- do ensino obrigatório; II- de atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência; III- de atendimento em creche e pré-escola às crianças de 0 (zero) a 5 (cinco) anos de idade; IV- de ensino noturno regular, adequado às condições do educando; V- de programas suplementares de oferta de material didático escolar, transporte e assistência à saúde do educando do ensino fundamental; VI- de serviço de assistência social visando à proteção à família, à maternidade, à infância e à adolescência, bem como ao amparo às crianças e adolescentes que dele necessitem; VII- de acesso às ações e serviços de saúde; VIII- de escolarização e profissionalização dos adolescentes privados de liberdade; IX- de ações, serviços e programas de orientação, apoio e promoção social de famílias e destinados ao pleno exercício do direito à convivência familiar por crianças e adolescentes”. Portanto, se é dever do Poder Público executar e não omitir, também é dever de todos os cidadãos exigir que assim seja. 8 2.2 Da descentralização2 Desde a promulgação da Constituição Federal (CF), em 1988, conceitos de “descentralização”, “municipalização” e “participação” têm estado em evidência nos discursos e nas propostas dos dirigentes, como alternativa de estratégia para a melhoria na gestão de questões voltadas para a área social, sobretudo para aquelas das políticas públicas no Brasil. A descentralização, no cenário brasileiro, se instituiu como novo paradigma, ao contemplar no artigo 18, da Constituição Federal que diz: “... a organização político- administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos nos termos desta Constituição”. Segundo LUSTOSA (1999), a descentralização como tendência tem-se colocado sob duas formas. Na primeira, constitui-se como uma das estratégias idealizadas pelos governos neoliberais para diminuir a ação do Estado no campo social, com a finalidade de reduzir os gastos públicos nesse setor. A segunda contrapondo ao ideário neoliberal, apresenta propostas que ampliam a esfera pública, envolvendo conjuntamente Estado/Sociedade, possibilitando a efetivação de novas práticas sociais e políticas, assim como a inserção de novos valores na sociedade contemporânea. Na América Latina, em geral, e no Brasil, o debate em torno da descentralização manifesta a preocupação com o crescimento econômico ao mesmo tempo que enfatiza a questão da equidade e da satisfação das necessidades básicas dos cidadãos. Também procura “resgatar aspectos estruturais, institucionais e políticos desprezados pelo neoliberalismo”. Essas questões, estão, principalmente, no plano da relação Estado e Sociedade, onde a descentralização pode favorecer “maior articulação da sociedade civil, por meio de organizações comunitárias e sindicatos, desde que, no nível local, as instituições sejam representativas da comunidade e que a participação seja uma realidade.” (STEIN, 1997b. p. 92). PEREIRA (1996, p. 76 e 78) ao empregar o termo “descentralização” para as políticas sociais, diz que o tema é corretamente compreendido como um “processo de redistribuição de poder em duas principais direções: a) da esfera federal para a estadual e a municipal: 2 Texto extraído do link: www.periodicoseletronicos.ufma.br. 9 b) do Estado para a sociedade”. Para a autora, esse processo também pode ser caracterizado como pluralismo, ou seja: como “formas plurais ou mistas de planejamento e ação (...)”. Esses conceitos apontam para a nova relação entre Estado e Sociedade civil, cuja estratégia centra- se na perspectiva de cidadania, pois apresentam mudanças na estrutura do Estado; contribuem para a formação de novos espaços institucionais de participação e deliberação popular e propõem a gestão conjunta das políticas públicas. STEIN (1997b, p. 79-80) em sua reflexão conceitual sobre o termo descentralização, ressalta que o mesmo se apresenta sob diferentes interpretações quando relacionado com as políticas públicas. Entre as diversas interpretações, a autora diz que o processo de descentralização deveser concebido ‘como status de meio, método ou tática’, mas ela também admite que a definição do termo “descentralização” depende da visão e das preocupações de cada ator social, diante do que pode ser identificado no contexto social como problema a ser resolvido, com o objetivo que se deseja alcançar ou como meio para solucionar outra questão. Sob essas diferentes concepções, a autora conclui que a descentralização deve ser utilizada como um instrumento para atingir determinados fins, já que existe uma inter- relação com as categorias democracia, autonomia e participação. LUSTOSA (1999, p. 242-243) para explicar a distinção do termo descentralização nas políticas sociais brasileiras, sobretudo a descentralização “administrativa, política e fiscal”, toma como referência duas concepções existentes: “Uma mais radical que ele classifica de planejada e a segunda, que não segue alguns procedimentos lógicos básicos, de caótica”. Na planejada, as funções nas esferas federal, estaduais e municipais ‘sofrem mudanças qualitativas’ e os recursos vão sendo substituídos gradativamente de uma esfera para a outra e construindo relações de complementariedade entre elas. Nos países desenvolvidos, segundo os estudos de LUSTOSA (1999, p. 243) a descentralização se apresenta como estratégia que possui um caráter gerencial e administrativo, o que permite responder melhor às demandas, pois propicia um sistema mais ágil de decisão, já que possibilita que outras instâncias decisórias do Governo compartilhem o poder com a sociedade mediante a participação popular. Contudo, para o referido autor, a descentralização, como estratégia, não dá tanta ênfase à questão política, por isso tem destaque apenas o aspecto técnico- 10 administrativo, por meio da gestão compartilhada e participativa. Já nos países em desenvolvimento, a descentralização está diretamente relacionada com a autoridade e o poder que se forma como “um processo político-técnico de reconfiguração do espaço de ação popular e de redefinição da relação Estado-cidadão. ” (LUSTOSA, 1999, p. 245). Diante dessas duas concepções, o autor citado define a descentralização no Brasil como um processo político-técnico de reformulação da estratégia de gestão das políticas sociais, fruto da interação permanente de diversos grupos de interesse dentro e fora do aparelho do Estado”. Essa definição representa o envolvimento do aspecto técnico e administrativo, em termos de gerenciamento, tal qual é desenvolvido nos países avançados. Mas, como estratégia vem sendo implementada sem um compromisso efetivo com os problemas sociais dando um enfoque mais pragmático ao processo, ao mesmo tempo que se constitui um instrumento que permite delegar poderes, atribuições e responsabilidades às demais esferas do Governo, bem como a transferência de recursos para gerir as atribuições repassadas pelo Estado. Todavia, a descentralização é também um processo político, porque está diretamente associada ao processo de redemocratização do País. Na década de 80, quando a sociedade civil mais organizada e capacitada pressionou o Estado a intervir e a influenciar nos rumos das políticas públicas, pela participação via representação, demonstrou, com isso, a ideia de que este é um processo dinâmico, contraditório, variando de acordo com o contexto, a conjuntura social e política em face dos interesses de autoridade e poder dos atores envolvidos. A institucionalização do processo de descentralização político-administrativa desencadeou uma profunda modificação no aparato político-institucional, ao mesmo tempo que constituiu as bases para a construção de um novo formato de cidadania, ao reconhecer o município como locus competente para elaborar e propor políticas sociais como dever do Estado e direito de todos. A mudança de paradigma vai juntar a categoria da descentralização ao conceito de municipalização. JOVCHELOVITCH (1995), ao analisar o processo sobre a municipalização, destaca que ele pode ser compreendido como um meio que permite uma aproximação maior dos serviços à população, mediante a articulação das forças entre a prefeitura e as organizações locais, e não somente como modelo de repasse de serviços e encargos das diversas instâncias para o município. Para 11 JOVCHELOVITCH (1998, p. 49) a municipalização, do ponto de vista político, reforça a ideia de autonomia, pois se encontra diretamente relacionada com o processo decisório, por apresentar as condições reais de participação e de controle social sobre o papel do Estado, tanto na elaboração e deliberação quanto também na efetivação dos planos e políticas no âmbito local. Além disso, a municipalização permite responder de forma mais ágil às demandas postas pelos cidadãos e ao mesmo tempo reduz a responsabilidade do Estado na execução das políticas sociais. Nesse sentido, a municipalização, tal como a descentralização, constitui-se como estratégia de consolidação democrática. Por isso, na ótica de JOVCHELOVITCH (1998, p. 40) essas categorias envolvem a participação, mostrando “que a força da cidadania está no município. É no município que o cidadão nasce, vive e constrói sua história. É aí que o cidadão fiscaliza e exercita o controle social”. O caráter descentralizador e a autonomia dos municípios, que estão contidos nos artigos 29 e 30 da Constituição Federal, garantem-lhes poder para se organizarem e, ao mesmo tempo, atribuem-lhes competências específicas que permitem assegurar e promover programas de melhoria de vida em nível local. Já a política de proteção à infância e juventude brasileira regulamentada no ECA, ao preconizar a efetivação dos direitos fundamentais, também estimula o engajamento da sociedade na promoção de um desenvolvimento saudável, visando prevenir contra a violação desses direitos é, principalmente, por possibilitar as condições sociais para que eles sejam respeitados. O exercício da cidadania está no direito de as crianças e adolescentes não terem seus direitos ameaçados ou violados (SËDA, 1995). As transformações no sistema produtivo e no mundo do trabalho e as políticas de orientação neoliberais vêm acelerando o processo de exclusão social, econômica, política e cultural das famílias brasileiras, cujas crianças e adolescentes são alvo das mais variadas formas de violência, uma vez que não podem ter suas necessidades básicas atendidas e nem mesmo o direito de exercer seu direito de cidadão. Outrossim, os meios legais e institucionais previstos no ECA para garantir e efetivar os direitos e o exercício da cidadania das crianças e adolescentes foram: os Conselhos de Direitos das Crianças e Adolescentes (CDCAs) e os Fundos de Direitos das Crianças e Adolescentes (FDCAs), nas esferas federal, estadual e municipal e os Conselhos Tutelares (CTs), implantados somente no âmbito municipal. 12 Os Conselhos de Direitos (CDs) pressupõem a concretização do processo de descentralização, pois se apresentam como espaços de articulação e “... de mediação entre a sociedade civil e o Poder Executivo Municipal. Funcionam inclusive como estratégia de divisão do poder no âmbito local. ” (JOVCHELOVITCH, 1998, p. 43). Os Conselhos se constituem, na forma da lei, como um dos principais elementos do controle social da sociedade sobre as ações do Estado. A realidade da maioria dos municípios brasileiros continua a apresentar um alto porcentual de crianças e adolescentes privados do direito de manifestar seu direito, de ter um convívio familiar saudável e com dignidade, já que suas famílias sobrevivem com uma renda que não permite suprir as necessidades imediatas de seus filhos. A exclusão social leva uma grande parcela de crianças e jovens entre 5 e 14 anos a deixar as escolas, inserindo-se precocemente no mercado de trabalho, para garantir a própria sobrevivência e ajudar a família. Assim, o trabalho toma-se umaopção natural para aumentar a renda. Na realidade, fere o que estabelece a Constituição Federal e o ECA. Ambos proíbem o trabalho remunerado para menores de 14 anos, podendo haver exceção àqueles que trabalham na condição de aprendiz (Art. 60 do ECA). A violação de direitos de crianças e adolescentes decorre de uma política que exclui um grande percentual de famílias trabalhadoras, ao mesmo tempo que agrava a desigualdade social, em virtude da concentração de renda, das novas relações de trabalho, da ausência de políticas de atendimento integral. O Governo, ao desenvolver políticas que privilegiam o mercado e a redução de gastos, traz embutido um processo de desresponsabilização do Estado como provedor de políticas básicas imbuídas do princípio universalização (FALEIROS. 1996). Associado ao termo descentralização e municipalização, encontra-se o conceito de participação, que é concebido como um elemento qualitativo que engloba os pressupostos básicos de democracia e cidadania. Tais pressupostos partem do princípio de que a soberania popular é um processo de prática de direitos conquistados. Diante dessa necessidade, BORDENAVE (1994. p. 12) afirma que a participação faz parte da natureza humana, pois desde suas origens o homem vive em grupos e a participação “... sempre tem acompanhado — com altos e baixos — as formas históricas que a vida social foi tomando”. 13 Esse processo de participação, na concepção de DEMO (1988, p. 18) só se efetiva como conquista a partir de três razões fundamentais: ... de que participação não pode ser entendida como dádiva, como concessão, como algo já preexistente. Não pode ser entendida como dádiva, porque não seria produto de conquista, nem realizaria o fenômeno fundamental da autopromoção: seria de todos os modos uma participação tutelada e vigente na medida das boas graças do doador, que delimita o espaço permitido. Não pode ser entendida como concessão, porque não é fenômeno residual ou secundário da política social, mas um dos seus eixos fundamentais: seria apenas um expediente para obnubilar o caráter de conquista, ou de conceder, no lado dos dominantes a necessidade de ceder. Não pode ser entendida como algo preexistente, porque o espaço de participação não cai do céu por descuido, nem é o passo primeiro. Estas razões fundamentais propostas pelo autor mostram que a participação é um processo histórico de conquista do ser humano que expressa o exercício ativo do pensamento e da ação coletiva do poder, que se realiza com a ampliação das condições da cidadania, já que na participação está implícita a questão política. Essa concepção permite compreender que uma sociedade é participativa quando os cidadãos produzem e usufruem dos bens de forma equitativa. Para que isso se torne possível, faz-se necessária toda uma estrutura social organizada para esse fim. Conselhos de direitos e conselhos tutelares: espaços públicos de defesa e proteção de crianças e adolescentes A Constituição Brasileira, a Doutrina da Proteção Integral e o ECA introduziram, pelo processo de descentralização político-administrativa, novas relações entre Estado e sociedade civil, bem como instituíram responsabilidades à família e à sociedade, com ênfase na participação das comunidades, e ao Estado, sobretudo nos municípios. Na perspectiva da gestão descentralizada, cabe à União elaborar os princípios e as regras gerais, como também a coordenação nacional da política de atendimento à criança e ao adolescente. Esse trabalho, segundo o Estatuto, deve ser feito por uma instância colegiada ou pelo Conselho Nacional dos Direitos da Criança de Adolescente (CONANDA). Aos Estados federativos cabe aplicar tais princípios e regras à sua realidade, numa relação de articulação com o objetivo de unir os esforços desenvolvidos por ambas as esferas de governo. Tal trabalho deve também ser colocado em prática por 14 uma instância colegiada, o Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (CEDCA). Aos municípios competem a tarefa de suplementar a legislação federal e estadual, além de legislar sobre seus assuntos locais, bem como a execução direta das políticas e programas em parceria com entidades não governamentais e pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA). Fonte:advocaciaoperaria.com.br Sob esse novo paradigma de administração pública, as ações da União ficaram delimitadas em desenhar as políticas no plano nacional: as dos Estados ficaram restritas à intermediação entre a esfera federal e municipal. Entretanto, nesse processo, o papel dos municípios foi ampliado, sendo-lhes dado mais autonomia para atuar e legislar questões de interesse local. Portanto, faz-se necessário um resgate histórico da conformação dos Conselhos como espaço de participação popular, cujo processo antecede à descentralização. Com o advento do ECA, os CDCAs foram sendo instituídos como instâncias públicas, em que as organizações populares vêm consolidando e tornando efetiva sua participação no processo de gestão democrática, principalmente com relação às políticas, em todas as esferas. GOHN (1990, p. 66) mostra que historicamente várias sociedades desenvolveram tais práticas, ora em Conselhos operários ou populares, ora em 15 Conselhos de Cidadãos, mas ressalta que o próprio termo traz embutida uma diferença política fundamental. Para a autora, os Conselhos Operários ou Populares são compostos: “... por trabalhadores, se originam e se articulam diretamente ao sistema de produção (...) são agentes e atores centrais da política econômico-social do país. ” Já os Conselhos de Cidadãos são compostos de “cidadãos e se constituem a partir do processo de consumo e distribuição, de bens, serviços e equipamentos, principalmente públicos (...) são atores de políticas sociais determinadas ou elaboradas por agentes governamentais. ” Nesse sentido, GOHN (1990, p. 87) afirma que os Conselhos, diante de práticas ou formas de intervenção tão dispares, podem ser descritos ou analisados como: “... instrumentos de determinados processos. Estes processos podem ter diferentes objetivos, contribuir para mudanças sociais significativas ou auxiliar a consolidação de estruturas sociais em transição ou sob o impacto de fortes pressões sociais”. Segundo a autora, a qualificação do processo de onde procede a experiência de Conselho é que lhe vai mostrar a natureza. Por isso, os Conselhos poderão constituir-se como instrumentos valiosos para a formação “de um poder popular” quanto poderão tornar-se um instrumento “de acomodação dos conflitos e de integração dos indivíduos” em programas previamente estabelecidos. Em ambas as perspectivas está implícita a noção de cidadania. No primeiro caso, privilegia - lhes a participação nos processos de gestão da vida pública. Nessa ótica, a cidadania toma- se uma finalidade a ser conquistada, pela participação na elaboração e definição de políticas que assegurem os direitos sociais coletivos. No segundo caso, a ênfase recai sobre o indivíduo como cidadão que participa apenas para ter acesso aos bens de consumo, mas sem participar da gestão dos bens públicos ou da política. Por isso a cidadania nessa ótica “é uma elaboração individual, constitucional” e não visa à emancipação e sim à integração do indivíduo. (GOHN. 1990. p. 76). Na realidade brasileira, as experiências históricas sobre os Conselhos, desencadeadas entre as décadas 60 até meados de 80, segundo os estudos de GOHN (1990, p. 77-83) apresentam dois modelos: os Conselhos populares e os Conselhos Comunitários. O primeiro surgiu como resultado de um processo de organização popular e de suas lutas nas relações que se estabelecem com o poder 16 público. O segundo foi criado pelo poder público, para intermediar suas relações com os movimentos populares. A autora apontaas experiências dos Conselhos de Saúde de São Paulo, como aquelas que se aproximam mais dos Conselhos Populares. No entanto, eles não tinham autonomia para gerir seus recursos, como também não tinham poder de deliberar ações, dificultando sua principal função fiscalizadora e controladora. Somente a partir do ECA é que a “participação da comunidade” foi explicitada, bem como se tornou claro o caráter permanente e deliberativo da sociedade na formulação de estratégias. Tem-se, então, com a descentralização, municipalização e participação popular, os instrumentos constitucionais fundamentais para a viabilização dos Conselhos, com grande perspectiva de ocupar “... os espaços políticos descaracterizando o simples controle social’ do Estado pela população e fazendo dessa prática social uma ação interventiva no plano decisório das políticas (...). ” (LIBERATI, CYRINO, 1993, p. 40). LIBERATI &CYRINO (1993, p. 49) conceituam os CDCA por meio das perspectivas: sociológica, jurídico-legal e extrajurídica: Sociologicamente os Conselhos São instrumentos de participação da sociedade civil na gestão política do poder, afetos à questão do atendimento de crianças e adolescentes, onde a representação da sociedade civil deverá buscar a hegemonia de suas posições frente aos representantes do Poder Público. Pode- se também afirmar que, como consequência dessa concepção de Conselho, suas deliberações, em face da composição paritária (sociedade civil/governo), serão manifestações do Estado — por isso, compulsórias. No aspecto jurídico-legal, proposto no artigo 88, inciso II do ECA, os Conselhos são órgãos deliberativos e de controle das ações em todos os níveis de governo, assegurada a participação popular paritária por meio de organizações representativas. Extra juridicamente, os Conselhos “são órgãos criados pelo Poder Público, sem personalidade jurídica, mas com capacidade pública, atuar de maneira descentralizada na formulação e controle das ações e programas” direcionados à infância e juventude. A natureza jurídica dos Conselhos está, no entanto, referenciada no artigo 172 do Decreto-lei n° 200/67 que dispõe sobre a Administração Federal. Esse Decreto-lei também pode ser aplica do junto aos Estados Federados e aos Municípios, e “... oferece embasamento jurídico para posicionar os Conselhos como órgãos autônomos e especiais. ” (LIBERATI, CYRINO, 1993, p. 74). Em face da 17 diversidade conceitual dos Conselhos de Direitos (CDs), constata-se que são órgãos especiais, com particularidades e especificidades e, por isso, podem ser facilmente diferenciados dos demais órgãos públicos. Nas esferas municipais, os CMDCAs, os Fundos e os CTs tomaram-se instituições legais, mediante lei municipal e. por isso, estão vinculados ao Poder Executivo local. Dentro dessa legalidade, os Conselhos constituem-se órgãos públicos, pois fazem parte de uma estrutura e personalidade própria chamada de Município. Essa concepção advém de que “no mundo dos direitos e dos deveres, as pessoas ou são públicas, refletindo a vontade do bem comum, ou privadas, meras emanações da vontade particular de indivíduos e grupos (...). “ (SDA, 1995. p. 157). Nessa perspectiva, os conselhos são organizações públicas, pois na prática estes órgãos devem buscar o “bem comum, que é o mesmo objetivo do município em busca da cidadania.” Já o vínculo dos CTs, na visão do autor, também se dá apenas para efeitos administrativos, em termos de infraestrutura e remuneração dos conselheiros tutelares. A remuneração é a mesma de um servidor com cargo de confiança, já que os conselheiros, como agentes públicos, exercem serviço público relevante. Os conselhos tutelares vêm sendo tema de estudos nos últimos anos, quanto ao seu papel e sua intervenção na defesa dos direitos da criança e do adolescente. Em face dessas questões, qual é o papel do Conselho Tutelar? E como agir? Segundo o art. 131, do ECA: “O Conselho Tutelar é órgão permanente e autônomo, não-jurisdicional encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos das crianças e adolescentes, definidos nesta lei”. SÊDA (1996) concebe o Conselho Tutelar como uma equipe, formada por cidadãos, instituída pelo Município para zelar, caso a caso, pela garantia dos direitos individuais de crianças e adolescentes e a exercer cobrança eficaz dos deveres correspondentes. Autores como LIBERATI & CYRINO (1993) e FALEIROS (1995) concordam com a posição de SÊDA e ampliam esse conceito ao definirem que o conselho tutelar é um espaço democrático de participação e um instrumento jurídico-institucional que a comunidade dispõe para proteger e garantir os direitos e a aplicação da lei, sempre que crianças e adolescentes se sentirem ameaçados ou violados em seus direitos fundamentais. Por ter essa responsabilidade e ser um órgão colegiado, o conselho tutelar tem estabilidade e independência funcional, pois sua função se volta para as 18 questões político-sociais, já que não possui personalidade jurídica. O órgão em tela assume o encaminhamento do atendimento social das crianças e adolescentes anteriormente realizado pela Justiça da Infância e da Juventude, cujas atribuições estão prescritas no art. 136 do ECA. O papel do conselho tutelar, segundo a Lei n° 8.069, é de zelar pelo cumprimento e não atender a direitos. KAMINSKI (2000) ao refletir sobre essa função peculiar, ressalta que o papel fundamental do conselho tutelar “não é atender direitos: é zelar para que os que devem cumprir os direitos das crianças e adolescentes, efetivamente cumpram”. Para o autor, o conselho tutelar não deve agir para obter direitos que devem ser efetivados pela família, pela sociedade ou pelo Estado, e que estão contidos na doutrina da proteção integral, na Constituição Federal, no Estatuto. O papel do Conselho é provocar “mudanças sociais” que contribuam para que o sistema amplie o atendimento e a proteção, apure a responsabilidade daqueles que descumprem seus deveres ou cumprem de forma irregular. Ao Conselho Tutelar cabe o papel de apontar as falhas e as carências de programas de atendimento junto ao CMDCA; buscar a mobilização da comunidade, da sociedade e do Poder Público; participar ativamente de fóruns políticos para mostrar as prioridades e propor alternativas que garantam os direitos às crianças e aos adolescentes. Ainda segundo KAMINSKI (2000) o conselheiro deve ser um líder, representativo, capaz de promover uma mudança cultural no imaginário e na prática com os direitos das crianças e adolescentes; capaz de cultivar o paradigma da cidadania. Essa postura do conselheiro possibilita maior alcance e envolvimento da família, da sociedade e do Estado, para cumprir o que preconiza a lei. O Estatuto prevê que ao conselho tutelar cabe receber denúncias, reclamações e atender a todos aqueles que representem as crianças e adolescentes, quando seus direitos estiverem sendo ameaçados ou violados, mas só deve ser acionado quando os direitos não forem cumpridos pelos atores envolvidos. Portanto, trata-se da discussão sobre o papel político do Conselho Tutelar e da ação de seus conselheiros, no sentido de zelar pela garantia de direitos. No entanto, o que se observa junto a esses órgãos, na prática efetiva de suas ações, é o atendimento precário dos direitos das crianças e adolescentes. Com base nessa realidade, na concepção de KAMINSKI (2000) o conselho tutelar não pode ser considerado como pronto-socorro. Essa posição encontra 19 respaldo, também, em SÊDA (1995, p. 179-180) quando afirma que o conselho tutelar, ao atender a direitos, está desempenhando funções “que são dos programas de atendimento”. Na realidade, isso ocorre para suprir a ausência de programas de atendimento. O conselho tutelar, ao receber as denúncias, as reclamações e os pedidos de socorro, não deve assumir o papel das instituições que deveriamatender, pois segundo Sêda “não cumprem nem a sua função e nem a dos programas que não existem. ” 2.3 Política de atendimento3 A política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente realiza-se por meio do conjunto articulado de ações governamentais e não governamentais nos três níveis de governo, mediante a colaboração recíproca entre os municípios, os Estados, o Distrito Federal e a União. Na proposta do Estatuto da Criança e do Adolescente, a política de atendimento envolve linhas de ação, diretrizes e responsabilidades relativas aos programas e entidades de atendimento. As linhas de ação da política de atendimento envolvem: políticas sociais básicas; políticas e programas de assistência social; serviços especiais de prevenção, atendimento, identificação e localização dos pais ou responsáveis, bem como, proteção jurídica e social prestada por entidades de defesa dos direitos da criança e do adolescente. As políticas sociais básicas estão direcionadas para a efetivação direta e imediata dos direitos fundamentais, previstos na Constituição da República Federativa do Brasil, no artigo 227. As políticas sociais básicas envolvem: “Os benefícios ou serviços de prestação pública dos quais podemos dizer: ‘isto é direito de todos e dever do Estado’, ou seja, as políticas sociais básicas dirigem-se ao universo mais amplo possível dos destinatários, sendo, portanto, de prestação universal. Educação e saúde, por exemplo, são direitos de todas as crianças e dever do Estado. Não pode, portanto, existir criança ou adolescente, independente da sua condição, que esteja legalmente privado do direito à educação e à saúde. Trata-se de um direito de todos, reconhecido e prestado ao conjunto da população infanto-juvenil sem distinção alguma. ” (COSTA, 1994, p. 43) 3 Texto extraído do link: www.ambito-juridico.com.br 20 Fonte: www.webquestfacil.com.br Sob esta perspectiva a política social básica incluiu os programas de atendimento articulado com a prestação de serviços especializados como forma de garantia e efetivação dos direitos fundamentais da criança e do adolescente, mas também, estabelecer uma política subsidiária de Assistência Social para àqueles que dela necessitem, visando promover a emancipação da criança, do adolescente e de sua família. Trata-se, portanto, de uma política do agir estatal. Para LIMA, “[...] uma política do agir estatal é uma micropolítica que impõe ao Estado um Agir, por dever de agir, tendo em vista que o Estado é instrumento à disposição da sociedade para que o processo social centrado na pessoa humana seja permanente e não fique à mercê da caridade, da filantropia, da concessão, nem dependa de eventuais crises sistêmicas que possam abalar a estabilidade social ou política, a governabilidade, ou fenômeno desse gênero. ” (LIMA, 2001, p. 322) Entretanto, o Estatuto da Criança e do Adolescente também se preocupou com a necessidade de atendimento às condições especiais que possam ameaçar ou violar os direitos da criança e do adolescente ao prever a garantia de oferecimento de serviços especiais que façam prevenção e atendimento médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus-tratos, exploração, abuso, crueldade e opressão. Estes serviços especiais destinam-se, inclusive, a proteção da criança e do adolescente, quando vítimas de negligência e maus-tratos e, muitas vezes, com crueldade e opressão. Daí a necessidade do atendimento especializado, que compreenda suas 21 consequências e esteja preparado para perceber os danos ao desenvolvimento físico e psicológico da criança e do adolescente oferecendo alternativas concretas àquela condição. Os serviços especiais devem estar preparados para atender as crianças e adolescentes vítimas, independentemente de qualquer condição, preocupando-se sempre com o restabelecimento dos laços familiares, o amparo e a proteção. Por isso a importância da manutenção de serviços para a identificação dos pais ou responsáveis, possibilitando a efetiva reintegração familiar e, evitando-se desta forma o rompimento dos vínculos afetivos e sociais da criança e do adolescente, desde que estas medidas venham acompanhadas de um suporte assistencial visando atender as necessidades da família, da criança e do adolescente. Os serviços especiais de atendimento à criança e ao adolescente reservam um papel importante, mas que isoladamente apresentam pouco efeito, ou seja, precisam estar acompanhados de um conjunto integrado de políticas públicas básicas de caráter universal e acessível para todos. A crítica produzida pela verificação dos limites das tradicionais políticas sociais brasileiras de caráter centralizador, burocrático e compensatório e, que sem dúvida, além de deixarem poucos resultados contribuíram decisivamente para o aprofundamento do processo de exclusão social, possibilitou uma nova concepção relativa à política de atendimento, hoje já consolidada no Estatuto da Criança e do Adolescente. A política de atendimento aos direitos da criança e do adolescente está amparada por um conjunto de diretrizes que trouxeram um verdadeiro reordenamento institucional, “[...] de forma a re-situar os serviços, regionalizar ações e estabelecer funções compartilhadas pelas diferentes instâncias e setores da sociedade (governamentais e não-governamentais, no sentido de viabilizar a atenção em rede através de ações integradas. ” (OBSERVATÓRIO DOS DIREITOS DO CIDADÃO, 2004, p. 24-25) Isso representa uma profunda ruptura com os modelos anteriores, orientados pelo estigma da menoridade, da situação irregular e do falacioso Bem-Estar do Menor. Nesse sentido, foram estabelecidas a municipalização do atendimento, a criação dos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente, a mobilização e participação da 22 sociedade civil, a descentralização, a criação de fundos vinculados aos conselhos, a integração operacional dos órgãos do sistema de garantias de direitos. As diretrizes dedicam atenção especial aos programas e entidades de atendimento, definindo regimes dos programas, procedimentos para registro e autorização de funcionamento às entidades não-governamentais e programas governamentais, bem como, atribuiu uma sistemática para a fiscalização das entidades, promovendo a participação ativa da sociedade na política de atendimento. A construção de uma política de atendimento requer a integração de uma rede de organizações de atendimento, governamentais e não-governamentais, que colaboram para a produção de diagnósticos, controles, monitoramentos e avaliações, com vistas a uma melhoria qualitativa dos serviços prestados. Além das diretrizes previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente, nos últimos anos foram estabelecidas novas estratégias de ação nas Conferências Municipais, Estaduais e Nacionais dos Direitos da Criança e do Adolescente, ambas amparadas pelos princípios da Doutrina da Proteção Integral. As Conferências dos Direitos da Criança e do Adolescente são realizadas no interstício de dois anos com a finalidade de avaliar as ações realizadas e apontar diretrizes de ação para os próximos dois anos nos três níveis com ampla participação da sociedade civil e os representantes de governo. A comunidade encontra nas Conferências dos Direitos da Criança e do Adolescente um novo espaço de participação e de interferência no sentido dos caminhos desejados para a política de atendimento à criança e ao adolescente representando uma oportunidade de verdadeira relação do Estado com os Movimentos Sociais. Para BARBALET, “[...] os movimentos sociais, ao contrário dos movimentos políticos, não são vocacionados para tomar o poder político, mas parar exprimir as aspirações, interesses, valores e normas – das coletividades sociais. O movimento, social está, portanto, ligado à mudança social através da modificaçãodas expectativas e dos costumes que influenciam as relações sociais. Como meio de mudança cultural, os movimentos sociais reformulam em que pode consistir a participação social. Assim os movimentos sociais podem apressar o desenvolvimento da cidadania, os direitos de cidadania facilitam o aparecimento dos movimentos sociais. ” (BARBALET, 1989, p. 149-150) A construção da Política de Atendimento aos Direitos da Criança e do Adolescente tem como pressuposto a participação da comunidade, daí a necessidade de municipalização do atendimento. A municipalização do atendimento é decorrente 23 do princípio da descentralização político-administrativa com vistas a garantir o atendimento à criança e ao adolescente no lugar em que vivem. A experiência histórica brasileira demonstrou que a concentração de recursos públicos nas esferas mais elevadas sempre apresentou alto custo, baixo nível de eficiência, demora no atendimento e, como se não fosse suficiente, ainda dava margem para o desvio de recursos, o clientelismo e a corrupção. A municipalização visa aproximar os níveis de decisão e execução das políticas de modo que os programas estejam sintonizados com as necessidades das comunidades, permitindo que as mesmas possam fazer o controle das ações e influenciando na consecução de alternativas mais efetivas de atendimento às crianças e aos adolescentes mediante a criação e manutenção dos programas. (LIMA, 2001, p. 271) Os recursos públicos para o atendimento à criança e ao adolescente não seriam suficientes se não houvesse mecanismos específicos de deliberação, controle e monitoramento das políticas de atendimento nos municípios. Isso se fez necessário, diante da desastrosa experiência do sistema da Política Nacional do Bem-Estar do Menor, que não garantia a participação popular, sendo mantido pelo controle centralizado de um pequeno grupo dirigente e, na maioria das vezes, reproduzido nas instâncias locais. Para resolver esta questão foram criados os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente como órgãos, deliberativos e controladores, nos níveis municipal, estadual e nacional promovendo a primeira grande alteração nas relações hierárquicas de gestão da política pública de atendimento, pois até então as esferas nacionais e estaduais detinham poder de intervenção nos níveis inferiores, sedimentando o controle hierarquizado das ações. Atualmente, “[...] a Constituição estabelece bases jurídicas para a construção de um novo formato de cidadania, agora contemplando o ramo social como direito do cidadão e dever do Estado. Mas não apenas isto; agora a cidadania política transcende os limites de delegação de poderes da democracia representativa e expressa-se por meio da democracia participativa, da constituição de conselhos paritários, que se apresentam como novo lócus de exercício político. ” (CAMPOS & MACIEL, 1997, p. 145) Com a criação dos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, essa relação hierárquica sofre uma ruptura, já que os conselhos são autônomos em seus respectivos níveis, estando unicamente submetido às leis, ou seja, as deliberações e 24 resoluções dos conselhos hierarquicamente superiores não vinculam os conselhos locais que devem deliberar e resolver de acordo com a sua própria realidade. Para Vanderlino Nogueira, “Os Conselhos de Direito surgiriam assim como espaços públicos institucionais ‘pontes’, entre a sociedade política e a sociedade civil. O espaço do teste das possibilidades de uma mista democracia representativo- participativa. Aí seriam testados os trabalhos de formação dos gestores públicos comunitários. (Conselheiros não-governamentais). Aí, estariam eles sendo desafiados para o mister de articulação/integração, com os representantes do Estado-governo: para o trabalho de formulação/normatização geral das políticas públicas, o controle das decorrentes ações governamentais e comunitárias e a mobilização social. ” (NOGUEIRA, 1997, p. 29-30). Nos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, a lei assegura a participação da sociedade civil na sua composição. Os membros são escolhidos pelos Fóruns Permanentes de Entidades Não-governamentais em Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Fórum DCA). Os Fóruns DCA são constituídos pelas organizações não-governamentais, mas também por pessoas da comunidade que podem sugerir, decidir, encaminhar e acompanhar suas demandas e necessidades junto aos seus representantes Conselheiros de Direitos, mas também, participar ativamente de todo o processo de consolidação dos direitos da criança e do adolescente, já que “A lei maior consagrou-nos o direito de participação na definição e controle das políticas públicas em todos os níveis. Dessa forma, a cidadania da criança, do adolescente e de qualquer adulto presume participação, materializando a condição de sujeitos de direitos, ou seja, agentes ativos e não objetos de intervenções, como estabelecem as velhas tradições. “(MOTTI, 2005, p. 56). Para viabilizar o complexo conjunto de ações e responsabilidades dos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente foi criado, em todos os níveis, o Fundo da Infância e da Adolescência (FIA), vinculado aos respectivos conselhos. O FIA é um fundo especial, nos termos previstos na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964: “Art. 71 – Constitui fundo especial o produto de receitas especificadas que, por lei, se vinculam à realização de determinados objetivos ou serviços, facultada a adoção de normas peculiares de aplicação. ” A composição do FIA é bastante diversificada incluindo as multas judiciais previstas no art. 213, de Termos de Ajustamento de Conduta propostos pelo Ministério 25 Público, da contribuição decorrentes de dedução do imposto de renda de pessoas físicas e jurídicas, conforme o art. 260, ou recursos provenientes de dotação orçamentária ou repasse da União, estados e municípios. Fonte:www.argosy.com.br Neste contexto, é o Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente que têm a competência para fixar os critérios de utilização dos recursos através de planos de aplicação, com a ressalva que os recursos do FIA não se destinam apenas ao financiamento da política de atendimento, pois o Poder Público deve garantir os recursos para suas políticas públicas mediante previsão orçamentária e as organizações não-governamentais, mediante seus próprios orçamentos e estratégias de mobilização de recursos. Os recursos do Fundo da Infância e da Adolescência destinam-se, prioritariamente, ao diagnóstico, ao planejamento, ao monitoramento e à avaliação das políticas públicas, possibilitando ao Conselho de Direitos a realização efetiva de seu papel institucional. Além disso, cabe ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente identificar nas ações governamentais o conjunto de recursos destinados para a política de atenção à criança e ao adolescente, avaliando o grau de prioridade estabelecido na distribuição dos recursos públicos, monitorar a implementação das 26 diretrizes emanadas pelas Conferências de Direitos da Criança e do Adolescente e contribuir na avaliação dos programas de atendimento. A superação dos obstáculos apontados exige uma efetiva mobilização da opinião pública e a participação da sociedade civil na discussão sobre o necessário papel institucional do Conselho de Direitos e, especialmente, dos conselheiros, pois sua legitimidade deve estar amparada pelo compromisso com a realização dos direitos da criança e do adolescente. Por outro lado, a promoção dos direitos da criança e do adolescente, com a sensibilização das próprias crianças e adolescentes, das famílias e das comunidades pode operar um papel importante na construção de um processo democrático de controle social e, além disso, de todo um significado positivo em torno da infância, superando os valores tradicionais queatribuem à infância uma conotação negativa, que na maioria das vezes, se presta a legitimação de múltiplas condições de exclusão, tais como a violência e a exploração. Construir uma política pública de caráter efetivamente participativo, que considere os próprios desejos e necessidades de crianças e adolescentes, valorizando-os como sujeitos de direitos e cidadãos, implica em ruptura com a tradição autoritária sempre presente no sistema político brasileiro. 3 PROCEDIMENTOS NA JUSTIÇA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE4 É oportuno definir os feitos de competência da infância e da juventude, mesmo que o magistrado julgue matérias diversas, em vara única. É necessário definir essas competências devido às alterações procedimentais que elas trazem, tanto no rito quanto nos prazos. O artigo 148 enumera, não de forma exaustiva, os feitos de competência da Justiça da Infância e da Juventude. São eles, in verbis: Art. 148. A Justiça da Infância e da Juventude é competente para: I - conhecer de representações promovidas pelo Ministério Público, para apuração de ato infracional atribuído a adolescente, aplicando as medidas cabíveis; II - conceder a remissão, como forma de suspensão ou extinção do processo; III - conhecer de pedidos de adoção e seus incidentes; 4 Texto extraído do link: ww4.tjrn.jus.br 27 IV - conhecer de ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente, observado o disposto no art. 209; V - conhecer de ações decorrentes de irregularidades em entidades de atendimento, aplicando as medidas cabíveis; VI - aplicar penalidades administrativas nos casos de infrações contra norma de proteção à criança ou adolescente; VII - conhecer de casos encaminhados pelo Conselho Tutelar, aplicando as medidas cabíveis. Parágrafo único. Quando se tratar de criança ou adolescente nas hipóteses do art. 98, é também competente a Justiça da Infância e da Juventude para o fim de: a) conhecer de pedidos de guarda e tutela; b) conhecer de ações de destituição do poder familiar, perda ou modificação da tutela ou guarda; c) suprir a capacidade ou o consentimento para o casamento; d) conhecer de pedidos baseados em discordância paterna ou materna, em relação ao exercício do poder familiar; e) conceder a emancipação, nos termos da lei civil, quando faltarem os pais; f) designar curador especial em casos de apresentação de queixa ou representação, ou de outros procedimentos judiciais ou extrajudiciais em que haja interesses de criança ou adolescente; g) conhecer de ações de alimentos; h) determinar o cancelamento, a retificação e o suprimento dos registros de nascimento e óbito. As ações previstas no parágrafo único do art. 148 são de competência das varas de família. Entretanto, em alguns casos elas poderão ser julgadas também pelos juízes da infância e da juventude. Para se determinar a competência entre as varas da infância e da juventude e as de família é necessário verificar a situação jurídica da criança ou do adolescente. Se houver a situação prevista no art. 98, do ECA, que a doutrina consagrou como situação de risco pessoal ou social, a competência é da vara da infância e da juventude. Caso não esteja caracterizada essa situação a competência é da vara de família. O art. 98 e incisos, do ECA, prevê que “As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta lei forem ameaçados ou violados: por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável; em razão de sua conduta”. Entenda-se falta dos pais não o fato deles terem ido a óbito, mas a ausência deles no sustento, guarda ou educação dos filhos (art. 22, ECA). Se assim fosse, toda criança ou adolescente órfão de pai e mãe estaria em situação de risco. Basta que um direito fundamental esteja sendo violado ou na iminência de violação a competência é da infância e da juventude. Nos demais casos nas varas de família. 28 A única exceção à regra é a adoção. Independentemente da situação jurídica da criança ou do adolescente a competência é da justiça da infância e da juventude. A adoção de pessoas adultas é de competência das varas de família, nos termos do Código Civil. O ECA ainda prevê outros feitos sem, entretanto, definir procedimentos, como é o caso, por exemplo, da expedição de alvarás de viagem (art. 83), de eventos (art. 149) e, ainda, do acolhimento de criança ou de adolescente em instituições e famílias acolhedoras. Alguns juízes entendem que, no caso dos alvarás, deve ser utilizada a exceção previsto no art. 153, do ECA, e, nos casos de acolhimento, o procedimento ordinário previsto no CPC. 3.1 Do procedimento de colocação em família substituta – requisitos de petição. Alguns aspectos: Existem três modalidades de colocação em família substituta: guarda (arts. 33 a 35), tutela (arts. 36 e 37) e adoção (arts. 39 a 52), independentemente da situação jurídica da criança ou adolescente (art. 28). Guarda – Trata-se de medida de proteção (art. 101, IX) precária, provisória, que se caracteriza quando alguém mantém sob a sua responsabilidade criança ou adolescente, sob o mesmo teto, prestando-lhe assistência material, moral, educacional e espiritual (arts. 3º e 33, §§), ante a ausência dos pais. Características: Não é necessária a destituição do poder familiar dos pais; não gera vínculo de filiação; não gera efeitos sucessórios; é revogável, a qualquer tempo; gera efeitos de direito previdenciário (§ 3º, art. 33 – é entendimento pacífico do STJ); extingue-se quando o guardado completa 18 anos de idade; o guardião pode se opor aos pais ou terceiros (art. 33). A guarda pode ser deferida, liminarmente ou incidentalmente (guarda provisória), nos pedidos de tutela e adoção, exceto no de adoção por estrangeiros (§ 1º, art. 33). Inexiste na legislação a “guarda previdenciária”. Esta era requerida com o único objetivo de deixar pensão previdenciária para algum parente, ou pessoa próxima, tornando-a “ad aeternum”. 29 Tutela – É a segunda modalidade de colocação de criança ou adolescente em família substituta. Dispõe o art. 36, do ECA, que esta será deferida, nos termos da lei civil, a pessoa de até 18 anos de idade incompletos. É a responsabilidade atribuída, por lei, a terceiro, para representar ou assistir a criança ou o adolescente, cujos pais faleceram, foram declarados ausentes ou tiveram o poder familiar suspenso ou destituído, devendo ainda administrar os seus bens. Características: Implica, necessariamente, na destituição ou suspensão do poder familiar e no dever de guarda; é revogável; não tem efeitos sucessórios; tem efeitos previdenciários e extingue-se quando o tutelado completa dezoito anos de idade. Adoção - É a terceira modalidade de inserção em família substituta. É a mais completa. É ato jurídico bilateral que constitui vínculos de filiação e paternidade entre pessoas, independentemente de fato natural. I. Requisitos legais e específicos: Para o adotante: Os maiores de 18 anos de idade, independentemente do estado civil (art.42, do ECA, c/c o art. 1.618, do CC). Significa dizer que solteiros, casados, divorciados, viúvos ou pessoas que vivam em união estável podem adotar. Diferença de dezesseis anos entre o adotante e o adotando (art. 42, §3); Consentimento. A vontade é fundamental, como uma faculdade jurídica; Não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando (§ 1º, art. 42, ECA); Possibilidade de um dos cônjuges ou concubinos adotar o filho do outro (§ 1º, art. 41, ECA); Possibilidade de os divorciados e os judicialmente separados de adotarem conjuntamente, desde que acordem sobre a guarda e o regime de visitas, e ainda quando o estágio de convivência tenha se iniciado naconstância da sociedade conjugal (§ 4º, art. 42, ECA); O tutor ou o curador só pode adotar o pupilo ou o curatelado depois que prestar conta de sua administração e saldar o seu alcance (art. 44, ECA). Para o adotando: 30 Deve contar com, no máximo, dezoito anos de idade à data do pedido, salvo se já estiver sob a guarda ou tutela do adotante (art. 40, ECA); Consentimento dos pais ou do representante legal (art. 45, ECA), salvo se estes forem desconhecidos ou tiverem sido destituídos do poder familiar (§ 1º); Quando contar com mais de doze anos de idade, também deve consentir (§ 2º, art. 45, ECA). Requisito formal: É vedada a adoção por escritura pública ou por procuração (§ 2º, art. 39, ECA). O vínculo da adoção constitui-se por sentença judicial (art. 47, ECA). II. Efeitos jurídicos da adoção: Para o adotando: Pessoais: Atribui a condição de filho, para todos os fins de direito (art. 41, ECA); Rompe o vínculo de filiação com os pais biológicos e os parentes destes (art. 41, ECA), exceto quando um dos cônjuges adota o filho do outro (§ 1º, art. 41, ECA); Alteração do nome, incluindo-se o do adotante, e da possibilidade de mudança do prenome (art. 47, §5º); Patrimoniais: Todos os direitos e deveres de filho, previstos em lei, inclusive previdenciários e sucessórios (art. 41, ECA); Para o adotante: Pessoais: Atribui a condição de pai, para todos os fins de direito, devendo exercer o poder familiar em sua plenitude, o que implica no dever de assistência material, moral, educacional e espiritual; Nos casos previstos em lei, pode perder o poder familiar; Patrimonial: dever de assistência material, moral, educacional e espiritual (arts. 3º e 22, ECA), inclusive sucessório e alimentício (sucessão recíproca- § 2º, art. 41, ECA). Para a família natural do adotado: Perda do poder familiar, desligando-a, por completo, do filho, de forma irrevogável. Não tem sequer direito de visita. A única ressalva são os impedimentos matrimoniais (art. 41, ECA); 31 A morte ou a perda do poder familiar do pais adotivos, não restabelece o poder familiar dos pais naturais (art. 49, ECA). Não há dever nem direito entre o filho adotado e a família natural. A autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro regional, um registro de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e outro de pessoas interessadas na adoção (art. 50, do ECA). O art. 165, do ECA, prevê os requisitos para a concessão de pedidos de colocação em família substituta (guarda, tutela e adoção). São eles: I. Qualificação completa do requerente e de seu eventual cônjuge, ou companheiro, com expressa anuência deste; II. Indicação de eventual parentesco do requerente e de seu cônjuge, ou companheiro, com a criança ou adolescente, especificando se tem ou não parente vivo; III. Qualificação completa da criança ou adolescente e de seus pais, se conhecidos; IV. Indicação do cartório onde foi inscrito nascimento, anexando, se possível, uma cópia da respectiva certidão; V. Declaração sobre a existência de bens, direitos ou rendimentos relativos à criança ou ao adolescente. Concedida a guarda ou tutela, o responsável deve prestar o compromisso de que trata o artigo 32 do Estatuto, e, deferida a adoção, expedir-se-á o mandado de inscrição e cancelamento, previsto no artigo 47 da mesma codificação. Por fim, vale ressalvar que, a colocação em família substituta estrangeira constitui medida excepcional, somente sendo admissível na modalidade de adoção (art. 31 do ECA). 32 4 O INFRACIONAL E MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS Fonte: s2.glbimg.com 4.1 Do Ato Infracional (art. 103 a 105, ECA) Ato Infracional é a conduta descrita como crime ou contravenção penal (art. 103). O adolescente é penalmente inimputável (art. 228, CF), porém, responsável e sujeito às medidas previstas no ECA (art. 104 c/c o art. 112). Já a criança infratora é penalmente inimputável (art. 228, CF) e irresponsável diante do ECA, recebendo apenas medidas de proteção (art. 105 c/c o art. 101). Deve ser levada em consideração a idade da criança e do adolescente à data do fato (parágrafo único, art. 104). 4.2 Dos Direitos Individuais (arts. 106 a 109, ECA) Nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente; o adolescente tem direito à identificação dos responsáveis pela sua apreensão, devendo ser informado acerca de seus direitos (art. 106); a apreensão de qualquer adolescente, e o local onde se encontra recolhido, serão incontinenti comunicados à 33 autoridade judiciária competente e à família do apreendido ou à pessoa por ele indicada; examinar-se-á, desde logo e sob pena de responsabilidade, a possibilidade de liberação imediata (art. 107); é possível a internação provisória, no entanto, no máximo, por quarenta e cinco dias, devendo a decisão que a decretar fundamentar- se em indícios suficientes de autoria e materialidade, demonstra a sua necessidade (art. 108). 4.3 Das Medidas Socioeducativas (arts. 112 a 128, ECA). É a responsabilização do adolescente que comete ato infracional. Sua essência é socioeducativa, caráter que deve prevalecer na execução das medidas. São medidas socioeducativas (art. 112): advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação. Em meio aberto (restrições de direitos): prestação de serviços à comunidade – PSC, liberdade assistida – LA. Em meio fechado (privação de liberdade): semiliberdade e internação. Em ambos os regimes, elas podem ser cumuladas com as Medidas de Proteção, previstas nos incisos II a VI, do art. 101 (art. 112, VII), e ainda aplicadas isolada ou cumulativamente, bem como substituídas a qualquer tempo (arts. 113 c/c 99). Advertência (art. 115): Consiste em admoestação verbal, em audiência designada para esse fim, que será reduzida a termo e assinada. O parágrafo único, do art. 114, prevê a possibilidade de se aplicar advertência só com a prova da materialidade e indícios suficientes da autoria. Porém, o entendimento predominante é que deve existir a prova tanto da materialidade quanto da autoria, até por se tratar de sanção. É medida altamente pedagógica. Obrigação de Reparar o Dano (art. 116): Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade judiciária poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuízo da vítima. Havendo manifesta impossibilidade, a medida poderá ser substituída por outra adequada. Prestação de Serviços à Comunidade – PSC (art. 117) – Consiste na realização de tarefas gratuitas de interesse geral, junto a entidades assistenciais, hospitais, 34 escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem como em programas comunitários ou governamentais. Carga horária: Até 08 horas semanais, inclusive aos sábados, domingos e feriados, de modo que se compatibilize com os estudos e à jornada normal de trabalho do socioeducando; Tempo máximo: 06 meses; Internação: as tarefas serão atribuídas de acordo com as aptidões do adolescente, podendo este se recusar a cumpri-las, caso não seja observado esse critério, em face do que dispõe o § 2º, do art. 112, do ECA, que não admite o trabalho forçado. Não se admite a prestação de serviços a empresas privadas. Advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação. – LA (art. 118 e 119) – Consiste no acompanhamento, auxílio e orientação ao adolescente em conflito com a lei, devendo a autoridade judiciária designar pessoa (orientador judiciário) idônea e qualificada para acompanhá-lo. Deveo orientador, dentre outros encargos: promover socialmente o adolescente s sua família, fornecendo-lhes orientação e inserindo-os, se necessário, em programa oficial ou comunitário de auxílio e assistência social; supervisionar a frequência e o aproveitamento escolar do adolescente, promovendo, inclusive, sua matrícula; diligenciar no sentido da profissionalização e de sua inserção no mercado de trabalho e, ainda, apresentar relatório do caso. Duração da medida: O prazo mínimo é de seis meses. A lei não fixou o tempo máximo, sendo este interpretado como sendo até a inserção familiar e social do adolescente ou até que ele complete 21 anos de idade. Durante a execução da medida esta pode ser, a qualquer tempo, prorrogada, revogada ou substituída por outra medida, ouvido o orientador, o Ministério Público e o Defensor. Semiliberdade (art. 120) – É medida de privação de liberdade, em entidade especializada, eis que o adolescente sujeito a ela enfrenta restrição no direito de ir e vir. São obrigatórias à escolarização e a profissionalização. Eles podem trabalhar e estudar durante o dia e recolher-se à noite e nos finais de semana. Não comporta prazo determinado. Aplica-se, no que couberem, as diretrizes para a internação, o que 35 implica na apresentação do relatório de acompanhamento no prazo máximo de seis meses e internação por um período que não exceda a três anos, ou ainda, até o jovem completar 21 anos de idade (§ 5º, art. 121). A medida pode ser aplicada como meio de transição para o meio aberto (progressão) ou como regime inicial. Internação (arts. 121 a 125) – Implica na privação de liberdade, em entidade de atendimento especializada, com proposta pedagógica obrigatória e com possibilidade de atividades externas, salvo ordem judicial em contrário. Condições de aplicabilidade (art. 122 e §§): Só pode ser aplicada quando se tratar de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência contra a pessoa; por reiteração no cometimento de outras infrações graves ou pelo descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta (regressão – 122, III, e § 1º). Princípios – São três os princípios que norteiam a aplicação e execução da internação: brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento (art. 122). O primeiro orienta quanto ao tempo de internação. Deve ser de, no mínimo, seis meses (§ 2º, art. 121), e, no máximo, três anos (§ 3º, art. 121). Não comporta prazo determinado. Quanto ao segundo a previsão legal é que “em nenhuma hipótese será aplicada à internação, havendo outra medida adequada” (§ 2º, art. 121). Por último, a terceira diz respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. Por isso, é que ele deve ficar internado em estabelecimento adequado, exclusivamente para adolescentes, obedecida rigorosa separação por critérios de idade, compleição física e gravidade do ato (art. 123 e 125). Direitos do adolescente privado de liberdade (art. 124) – São eles: entrevistar- se, pessoalmente, com o representante do Ministério Público; peticionar diretamente a qualquer autoridade; avistar-se reservadamente com seu defensor; ser informado de sua situação processual, sempre que solicitado; ser tratado com respeito e dignidade; permanecer internado na localidade ou naquela mais próxima ao domicílio de seus pais ou responsável; receber visitas, ao menos semanalmente; corresponder- se com os seus familiares e amigos; ter acesso aos objetos necessários à higiene e asseio pessoal; habitar alojamento em condições adequadas de higiene e salubridade; receber escolarização e profissionalização; realizar atividades culturais, esportivas e de lazer; ter acesso aos meios de comunicação social; receber 36 assistência religiosa, segundo a sua crença, e desde que assim o deseje; manter a posse de seus objetos pessoais e dispor de local seguro para guardá-los, recebendo comprovante daqueles que porventura depositados em poder da entidade; receber, quando de sua desinternação, os documentos pessoais indispensáveis à vida em sociedade. Em nenhuma hipótese haverá incomunicabilidade, podendo a autoridade judiciária suspender, temporariamente, a visita de parentes e amigos, em decisão fundamentada (§§ 1º e 2º, art. 124). 4.4 Da Remissão (arts. 126 a 128) Trata-se de transação prevista no ECA, tendo como efeito jurídico, em alguns casos, características de perdão judicial. Pode ser promovida pelo órgão do Ministério Público, como forma de exclusão do processo (art. 126), podendo incluir, eventualmente, qualquer das medidas prevista no estatuto, exceto as de privação de liberdade (art. 127). A remissão não implica, necessariamente, o reconhecimento ou comprovação da responsabilidade, nem prevalece para efeito de antecedentes. Iniciado o procedimento a remissão será concedida pela autoridade judiciária (parágrafo único, art. 126 e § 1º, art. 186), como forma de extinção ou suspensão do processo. Pode ser revista, a qualquer tempo, mediante pedido expresso do adolescente ou seu representante legal, ou do Ministério Público (art. 128). 4.5 Das Garantias Processuais (art. 110 e 111, do ECA). São garantias: nenhum adolescente será privado de sua liberdade sem o devido processo legal; pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, mediante citação ou meio equivalente; igualdade na relação processual, podendo confrontar-se com vítimas e testemunhas e produzir todas as provas necessárias a sua defesa; defesa técnica por advogado; assistência judiciária gratuita e integral aos necessitados, na forma da lei; direito de ser ouvido pessoalmente pela autoridade competente e direito de solicitar a presença de seus pais ou responsável em qualquer fase do procedimento. 37 4.6 Fase Policial (arts. 171 a 178, do ECA). Procedimento Investigatório - O adolescente apreendido por força de ordem judicial será, desde logo, encaminhado à autoridade judiciária, enquanto que aquele apreendido em flagrante de ato infracional será, desde logo, encaminhado à autoridade policial competente (art. 171 e 172). Havendo repartição policial especializada para atendimento de adolescente e em se tratando de ato infracional praticado em coautoria com maior, prevalecerá a atribuição da repartição especializada, que, após as providências necessárias e, conforme o caso, encaminhará o adulto à repartição policial própria. Em caso de flagrante de ato infracional cometido mediante violência ou grave ameaça à pessoa, a autoridade policial, deverá: Providências – a) lavrar auto de apreensão, ouvidos as testemunhas e o adolescente; b) apreender o produto e os instrumentos da infração; c) requisitar os exames ou perícias necessárias à comprovação da materialidade e autoria da infração; nas demais hipóteses de flagrante, a lavratura do auto poderá ser substituída por boletim de ocorrência circunstanciada – BOC (art. 173). Liberação e privação de liberdade - Comparecendo qualquer dos pais ou responsável, o adolescente será prontamente liberado pela autoridade policial, sob termo de compromisso e responsabilidade de sua apresentação ao representante do Ministério Público, no mesmo dia ou, sendo impossível, no primeiro dia útil imediato, exceto quando, pela gravidade do ato infracional e sua repercussão social, deva o adolescente permanecer sob internação para garantia de sua segurança pessoal ou manutenção da ordem pública (art. 174). Encaminhamento ao Ministério Público - Em caso de não liberação, a autoridade policial encaminhará, desde logo, o adolescente ao representante do Ministério Público, juntamente com cópia do auto de apreensão ou boletim de ocorrência. Sendo impossível a apresentação imediata, a autoridade policial encaminhará o adolescente à entidade de atendimento, que fará a apresentação ao representante do Ministério Público
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