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36 Unidade II Unidade II 3 LICITAÇÃO O Poder Público, como qualquer pessoa jurídica de direito privado ou pessoa física, realiza negócios perante a sociedade. Mas, ao contrário da versatilidade e prontidão típicas de negócios corriqueiros, ao lidarmos com questões de ordem pública, oficialidade e interesse coletivo, faz-se pertinente haver maiores controles e meios de fiscalização. Para tanto, é demandado um processo e rigor acerca da destinação do dinheiro público, seja para construir uma escola, uma rodovia, ou habilitar concessionárias que realizem a fiscalização e a manutenção da rodovia: trata-se do certame conhecido como licitação. Dessa forma, empresas buscam editais e se adéquam às condições dispostas nesse documento para competir sobre o objeto da licitação. No final, a licitante vencedora é qualificada e estabelece o contrato administrativo para, finalmente, dar início à prestação do serviço ou à realização de obra pública. Em situações específicas, a licitação propriamente poderá ser dispensada ou não exigida; são as chamadas contratações diretas. As disposições principais acerca do assunto licitação estão nos arts. 22, XXVII, e 37, XXI, da Carta República de 1988, e na recente Lei n. 14.133/2021, que veio para substituir a Lei Geral de Licitações (Lei n. 8.666/1993). Embora a recente lei tenha vindo para substituir a Lei n. 8.666/1993, a nova Lei de Licitação e Contratos Administrativos estipulou ainda um período para a produção de efeitos para aquela, pois ela será revogada após decorridos 2 (dois) anos a partir da publicação da Lei n. 14.133/2021. Esta medida serve para que a Administração Pública possa se adaptar gradualmente com as mudanças, que serão estudadas nesta unidade. Lembrete Por força do art. 193, II da Lei n. 14.133/2021, a antiga Lei de Licitação (Lei n. 8.666/1993) permanecerá em vigor por 2 (dois) anos. Antes da recente norma, houve outros regimes licitatórios, como a Lei n. 10.520/2002, referente à modalidade pregão, e o regime diferenciado de contratações, conforme a Lei n. 12.462/2011, criado para atender às obras e serviços de grandes eventos, como a Copa do Mundo de 2014. Há ainda disposições sobre a licitação em outras normas, como alguns tópicos acerca do assunto em relação às empresas enquadradas no Simples Nacional, pela Lei Complementar n. 123/2006, e regimes específicos de licitação, como o da Lei n. 12.598/2012, referente ao sistema de defesa nacional. 37 FUNDAMENTOS DE DIREITO ADMINISTRATIVO A Lei n. 13.303/2016 (Estatuto das Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista) também traz disposições para esses entes administrativos no que tange ao certame licitatório, com as peculiaridades típicas, afinal, essas pessoas jurídicas competem com a iniciativa privada em patamar de igualdade, mas, por outro lado, submetem-se a regramentos jurídicos de direito público – licitação para atividades-meio, como contratação de serviço de limpeza. Vale salientar que muitas estatais federais já possuíam um regulamento – norma infralegal, inclusive – próprio para licitar, criando possibilidades de debates doutrinários e consolidação de entendimentos jurisprudenciais acerca da convalidação ou revogação desses regulamentos. A competência legislativa sobre o tema licitação é incumbência da União: Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: XXVII – normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III (BRASIL, 1988). Conforme salientado em epígrafe, os estados, o Distrito Federal e os municípios poderão criar normas próprias acerca da licitação para adequar-se às suas necessidades, desde que estejam em harmonia com a lei federal. Outra norma constitucional que enseja a criação de leis sobre a licitação é o art. 37, inciso XXI in verbis: Art. 37. A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: […] XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações (BRASIL, 1993). Conceitualmente, para uma clara definição de licitação, podemos nos atear às palavras da douta Odete Medauar: 38 Unidade II Licitação, no ordenamento brasileiro, é o processo administrativo em que a sucessão de fases e atos leva à indicação de quem vai celebrar contrato com a Administração. Visa, portanto, a selecionar quem vai contratar com a Administração, por oferecer proposta mais vantajosa ao interesse público. A decisão final do processo licitatório aponta o futuro contratado (MEDAUAR, 2018, p. 175). A licitação é, portanto, o conjunto de atos encadeados, objetivando consolidar a contratação com a Administração Pública. Resumidamente, consiste num certame em que agentes econômicos se inteiram do conteúdo do edital e enviam propostas para a Administração licitante. A partir de critérios estabelecidos na lei e consequentemente no edital, o Poder Público decidirá o licitante apto para finalmente celebrar o contrato e dar início à produção ou prestação do bem ou serviço. Em seu proceder, há prazos para obediência, períodos para oferecer impugnações, tal qual um processo judicial ou administrativo. Porém, devemos prestar atenção no uso de termos como processo ou procedimento. Faz-se necessário distinguir o emprego de tais palavras no processo civil: • Processo: pode-se entender pela acepção genérica de uma demanda entre duas partes opostas levada ao juízo. • Procedimento: é o roteiro ou encadeamento da prática dos atos processuais. No campo administrativo, procedimento pode estar relacionado muitas vezes a atos e práticas de um processo, e ambos os termos podem, até mesmo, ser entendidos como sinônimos. O parágrafo único do art. 4º da lei antiga definia licitação ou procedimento licitatório como ato administrativo formal. A partir da Lei n. 14.133/2021, o intuito dela foi consolidar as disposições do regime diferenciado, do pregão com a própria norma de licitação. Nesse sentido, ela se furta em destacar uma definição sobre o tema. O seu art. 6º elenca uma série de definições empregadas na lei, e vemos que o emprego do termo procedimento é indiscriminado, conforme mencionado anteriormente. Por fim, o art. 11 também destaca que a licitação poderá ser chamada de processo licitatório, que não deve ser confundido com o processo judicial. Em seus primeiros artigos, podemos encontrar a quais bens e serviços ela se destina e quais pessoas jurídicas deverão se submeter à norma. Assim, estarão sujeitos ao regime normativo de licitação as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. O escopo é amplo, abrangendo órgãos dos Poderes Legislativos e Judiciários da União, dos estados e do Distrito Federal, e os órgãos do Poder Legislativo dos municípios, quando exercerem função administrativa, por exemplo, a gestão da própria estrutura, a contratação de profissionais e a compra de materiais de trabalho. A lei salienta também que os fundos especiais e as entidades controladas, de maneira direta ou indireta, pela Administração Pública também deverão observar o regime licitatório da Lei n. 14.133/2021. 39 FUNDAMENTOS DE DIREITO ADMINISTRATIVO Ficam de fora de sua aplicação,portanto, as empresas públicas e sociedades de economia mista, e suas respectivas subsidiárias, que estão regradas pelo Estatuto da Empresa Pública (Lei n. 13.303/2016). Lembrete Algumas entidades estatais federais já possuem um regulamento próprio – infralegal – para licitar. O art. 2º da Lei de Licitação e Contratos menciona para quais formas de serviços será exigido o certame. A licitação aplica-se sobre alienação e concessão de direito real de uso de bens; para compras, até mesmo encomendadas; para locação; para concessão e permissão de uso de bens públicos; para prestação de serviços, inclusive serviços técnico-profissionais especializados; para obras e serviços de arquitetura e engenharia; e para contratação de tecnologia de informação e de comunicação. A Lei de Licitação e Contratos Administrativos é uma norma geral de licitações. Deve-se manter em equilíbrio com as leis distintas acerca do mesmo tema elencadas anteriormente: a Lei n. 14.133/2021 trata de normas gerais, e cada lei em vigor sobre a temática licitatória refere-se a especificidades. Então, a lei específica prevalece e se completa com as disposições da lei geral, naquilo que lhe for necessário, mas deve obediência a preceitos e fundamentos estabelecidos na lei genérica, em razão do tema. Os objetivos da licitação constam no art. 11. São eles: • assegurar a seleção da proposta mais apta a gerar o resultado de contratação mais vantajosa para o Poder Público; • garantir tratamento isonômico e justa competição entre os licitantes; • evitar contratações com sobrepreço ou preços inexequíveis e superfaturamento na etapa contratual; e • incentivar a inovação e o desenvolvimento nacional sustentável. 3.1 Princípios O art. 5º da Lei n. 14.133/2021 estabelece os princípios pertinentes, alguns já elencados em sede constitucional e outros mais específicos: Art. 5º Na aplicação desta Lei, serão observados os princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade, da eficiência, do interesse público, da probidade administrativa, da igualdade, do planejamento, da transparência, da eficácia, da segregação de funções, da motivação, da vinculação ao edital, do julgamento objetivo, da segurança jurídica, da razoabilidade, da competitividade, da proporcionalidade, da celeridade, da economicidade 40 Unidade II e do desenvolvimento nacional sustentável, assim como as disposições do Decreto-Lei n. 4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro) (BRASIL, 2021). Encontramos mudanças em relação à lei anterior de licitação, a qual esculpia alguns princípios que explicitamente desenhavam o caráter solene do procedimento licitatório. O art. 3º da antiga lei discriminava alguns princípios de matriz constitucional e outros típicos da licitação. Daqueles, tínhamos a isonomia (igualdade, em sentido maior), a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável. Agora, a partir da Lei de Licitação e Contratos Administrativos, temos um escopo mais amplo de princípios, alguns deles também sendo aqueles princípios constitucionais explícitos. Nesse sentido, observemos o seguinte quadro demonstrando um comparativo entre os princípios trazidos por ambas as leis: Quadro 1 – Princípios da licitação Lei de Licitação e Contratos Administrativos (Lei n. 14.133/2021) Lei antiga (Lei n. 8.666/1993) Legalidade Legalidade Impessoalidade Impessoalidade Moralidade Moralidade Publicidade Publicidade Eficiência Interesse público Proposta mais vantajosa Probidade administrativa Probidade administrativa Igualdade Igualdade e isonomia Planejamento Transparência Eficácia Segregação de funções Motivação Vinculação ao edital Vinculação ao instrumento convocatório Julgamento objetivo Julgamento objetivo Segurança jurídica Razoabilidade Competitividade Proporcionalidade Celeridade Economicidade Desenvolvimento nacional sustentável Promoção do desenvolvimento nacional sustentável 41 FUNDAMENTOS DE DIREITO ADMINISTRATIVO Conforme já mencionado, os cinco primeiros valores mencionados correspondem àqueles mencionados pelo caput do art. 37 da Constituição Federal, definidos como princípios da Administração Pública. Alguns outros podem ser um desdobramento de princípios maiores e consubstanciam mais de um axioma em seu significado. Assim, eficiência, eficácia, planejamento e transparência acabam por atender à prevalência do interesse público, como também podem significar a busca pela proposta mais vantajosa para a Administração Pública, que deixou de ser um princípio explícito para licitações, mas ainda fazendo parte do certame (art. 61). Os princípios também descrevem finalidades e objetivos e ainda servem de adequação ao regime jurídico de direito público. Nesse sentido, podemos considerar os mais importantes: • Princípio da igualdade: a isonomia significa a igualdade, aplicando-se aos participantes do certame licitatório, não admitindo que haja diferenciação de tratamento ou concessão de vantagens, como regra. A isonomia admite exceção, que consiste em tratar os desiguais na medida de suas desigualdades. Por exemplo, um dos critérios de desempate consiste em dar preferência pela contratação de microempresas e empresas de pequeno porte (art. 60, §2º combinado com art. 45 da Lei Complementar n. 123/2006). • Proposta mais vantajosa para a Administração Pública: não significa necessariamente a que for mais barata, e sim a que se adéqua aos critérios do edital, em especial valorando a relação custo-benefício. Pagar barato por algum produto ou serviço de baixa qualidade significa muitas vezes pagar caro – custos de manutenção, e nesta seara estamos lidando com bens e valores públicos. • Desenvolvimento nacional sustentável: é uma exceção a critérios igualitários per se, em que a lei permite haver priorização de propostas que repercutam no desenvolvimento de tecnologias e produtos nacionais. A título de ilustração, a aplicação simultânea desses princípios pode ser visualizada pelo art. 60 da Lei de Licitações, estabelecendo como critérios para desempates sobre duas ou mais propostas apresentadas: • disputa final, quando os licitantes empatados poderão apresentar uma nova proposta; • avaliação do desempenho contratual prévio dos licitantes; • se o licitante tem ações que buscam a equidade entre homens e mulheres no ambiente de trabalho, nos termos de regulamento próprio; • desenvolvimento de um programa de integridade (compliance). Caso esses critérios não sejam suficientes para o desempate, o ente público poderá dar preferência aos bens e serviços produzidos ou prestados por: 42 Unidade II • empresas estabelecidas no território do estado ou do Distrito Federal do órgão ou entidade licitante; e no caso de o licitante ser municipal, empresas localizadas no respectivo estado; • empresas brasileiras; • empresas que investem na pesquisa e desenvolvimento de tecnologias no país; • empresas que realizem o processo de mitigação, nos termos da Política Nacional sobre Mudanças Climáticas (PNMC). Esses quatro últimos critérios de desempate devem ser considerados na ordem sucessiva, conforme aqui elencado. Também podemos observar outra prioridade dada para bens e serviços com tecnologia desenvolvida no Brasil, desde que tenha seu processo produtivo em harmonia com os planos traçados pela Lei n. 10.176/2001. Nesta situação, trata-se de uma restrição sobre a licitação, de modo a atender programas e políticas de fomento ao desenvolvimento de tecnologias em território nacional. Observação Poder-se-ia questionar se há violação ao princípio da igualdade por causa dos critérios ou prioridades para desempate. Entende-se que é uma exceção estabelecida em lei que prioriza um fim ideológico e estrategicamente proposto, como desenvolver o mercado e o potencial nacionais ou garantir equidade de tratamento entre empresas de portes distintos. Quanto ao princípio da vinculaçãoao edital, dispõe haver uma determinação tanto para a Administração Pública quanto para os licitantes acerca do conteúdo do edital. A validade do processo e do contrato atenderá ao conteúdo transcrito no edital. Por analogia com o Direito Civil pátrio, “contrato faz lei entre as partes” é um axioma que traduz adequadamente o sentido do princípio na esfera do Direito Público, já que o edital formará o contrato administrativo futuramente, e até lá, todas as prescrições, como regras e garantias aos licitantes, estarão dispostas no edital. Observemos, então, o conteúdo do edital, conforme o art. 25 da Lei de Licitações: Art. 25. O edital deverá conter o objeto da licitação e as regras relativas à convocação, ao julgamento, à habilitação, aos recursos e às penalidades da licitação, à fiscalização e à gestão do contrato, à entrega do objeto e às condições de pagamento (BRASIL, 2021). 43 FUNDAMENTOS DE DIREITO ADMINISTRATIVO Evidentemente, a matéria descrita por esse artigo não esgota todo o conteúdo que pode haver no edital. Por exemplo, tratando-se de licitação internacional, o edital dedicará espaço para diretrizes de política monetária e de comércio exterior (art. 52). Ademais, é condição exigida para o contrato administrativo a vinculação ao edital da licitação, bem como à proposta do licitante vencedor (art. 92, II). Todavia, o edital não tem caráter absoluto e, portanto, inquestionável. Há medidas que podem ser ajuizadas para conter irregularidades ou para esclarecer seus termos. O art. 164 destina até 3 (três) dias úteis antes da data da abertura do certame para a protocolização do pedido de impugnação de irregularidades ou para a solicitação de esclarecimentos. É possível observarmos que a impugnação é uma prerrogativa a ser exercida não apenas por licitantes ou participantes, mas por qualquer pessoa (art. 164). Outrora destacado em dispositivo próprio, o princípio do julgamento objetivo, com a nova lei, está espalhado por diversos dispositivos legais e serve de fundamento harmonizado com princípios de sede constitucional, como o da impessoalidade, plasmado no art. 37, caput, da Carta Magna. Ele destaca que o julgamento das propostas ou da habilitação deverá afastar ou evitar contaminações de cunho pessoal. A Lei de Licitações e Contratos Administrativos não possui mais o elenco a ser seguido para alcançar o julgamento objetivo, como constava o art. 45 da antiga lei, mas destaca pormenorizando como será a avaliação de cada um dos critérios ou parâmetros da licitação. Os critérios trazidos pelo art. 33 são: menor preço; maior desconto; melhor técnica ou conteúdo artístico; técnica e preço; maior lance, em relação ao leilão; e maior retorno econômico. São novidades o critério de maior desconto e o de maior retorno econômico. A seguir, a lei destina os arts. 34 ao 39 para cada um desses critérios de julgamentos. De início, o julgamento por menor preço, por maior desconto e, quando couber, preço e técnica considerarão o menor gasto para a Administração, desde que atendidos todos os requisitos mínimos de qualidades que estiverem definidos pelo edital. Esta disposição se destina especialmente para a contratação de projetos e trabalhos de natureza técnica, científica ou artística (art. 35, parágrafo único). Especificadamente, para o julgamento com base no maior desconto, a lei comanda a referência ser o preço global fixado no edital, possibilitando que os descontos sejam estendidos para os termos aditivos. Quanto ao julgamento por técnica e preço, adotará a maior pontuação a partir das notas atribuídas sobre aspectos de técnica e sobre o preço da proposta (art. 36, caput). Primeiramente, são analisadas as propostas técnicas e, posteriormente, as propostas de preço são apresentadas, com proporção máxima de 70% (setenta por cento) da valoração da proposta técnica. Os incisos do §1º do art. 36 mencionam alguns dos serviços que adotarão esse critério, como atividades de natureza predominantemente intelectual e obras e serviços de tecnologia da informação e de comunicação, além das obras e serviços especiais de engenharia. 44 Unidade II Para o julgamento com base no maior retorno econômico, terá como objetivo a celebração de contrato de eficiência, e considerará a maior economia para o Poder Público, sendo que a remuneração será fixada em percentual incidente proporcionalmente sobre a economia efetivamente obtida na execução contratual (art. 39, caput). Dentre as novidades trazidas pela recente Lei de Licitações, há o princípio da segregação de funções, consistindo em medidas que coíbam a corrupção e o superfaturamento das contratações. Trata-se da imposição de que os agentes públicos envolvidos na execução do certame licitatório possuam funções específicas, impedindo a sujeição de um agente determinado a etapas ou decisões que envolvam risco. Objetiva, sobretudo, a diminuir a ocultação de erros ou irregularidades, bem como a ocorrência de fraudes e ilícitos (art. 7º, §1º). Este princípio também se estende para órgãos e agentes de assessoramento jurídico e de controladoria interna da Administração Pública envolvida no certame. É certo que alguma medida nesse nível era crucial para a recuperação de ativos e da reputação de entidades privadas da sociedade civil, principalmente diante dos últimos escândalos de desvio de dinheiro público ou superfaturamento, culminando em operações judiciais de grande repercussão. Pertinentemente, devemos comparar a Lei de Licitação e Contratos Administrativos com a lei revogada – Lei n. 8.666/1993. O art. 3º desta elencava alguns princípios e, ao final, mantinha a expressão “e dos que lhe são correlatos”, permitindo inferir que haveria outros princípios implícitos ao direito administrativo e à licitação que estariam sendo aplicados ou conferidos por meio da prática licitatória. A doutrina nomearia os princípios correlatos como “princípios implícitos”, por não constarem expressamente na lei. Nas disposições também doutrinárias e de Teoria Geral do Direito, encontramos respaldo para classificar o grupo de princípios mencionados como rol exemplificativo (numerus apertus), que estipula uma lista de princípios e abre margem para reconhecimento e aplicação de outros princípios. Do contrário, tratar-se-ia de um rol taxativo (numerus clausus), em que o dispositivo legal reconhece aqueles princípios, somente. A lei atual modificou essa permissão literal aos princípios implícitos, permitindo, no entanto, contemplar a aplicação subsidiária dos valores contidos no Decreto-Lei n. 4.657/1942, a denominada Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Lindb). A Lindb é uma norma peculiar, pois ela é também conhecida como uma “lei sobre leis”, disciplinando regras de Direito, como o período de vigência de uma nova lei introduzida ao ordenamento jurídico e quais instrumentos o juiz deverá aplicar caso tenha que decidir sobre um caso que não possua previsão legal ainda. Nesse sentido, não houve supressão de princípios implícitos, mas a priorização de alguns constantes desta norma. A Lindb prevê a aplicação de princípios gerais de direito para sanar a lacuna da lei (art. 4º). Embora seja um comando destinado ao Poder Judiciário, convém o cumprimento e a adequação aos princípios para evitar demandas judiciais, inclusive porque alguns princípios, como os já mencionados sobre a licitação, servem de instrumentalização da própria licitação ou para cumprimento de suas etapas. 45 FUNDAMENTOS DE DIREITO ADMINISTRATIVO Observação O ordenamento jurídico é uno, sofrendo divisões unicamente em razão do didatismo sobre alguns temas (crimes, relações de direito privado etc.). Nesse aspecto, é esperado que uma lei preveja a complementação da sua interpretação por parte de outras leis. Como princípio implícito relevante, há o denominado adjudicação compulsória, didaticamente transcrito no seguinte dispositivo da antiga Lei de Licitações: Art. 50. A Administração não poderá celebrar o contrato com preteriçãoda ordem de classificação das propostas ou com terceiros estranhos ao procedimento licitatório, sob pena de nulidade (BRASIL, 1993). Todavia, embora não contemplado na atual norma, a partir da interpretação de algum artigo, podemos constatar que sua dinâmica ainda está prevista no decorrer do texto legal. Nesse sentido, a Lei de Licitações e Contratos Administrativos traz o seguinte sistema sobre a adjudicação compulsória, por meio do art. 61: Art. 61. Definido o resultado do julgamento, a Administração poderá negociar condições mais vantajosas com o primeiro colocado. § 1º A negociação poderá ser feita com os demais licitantes, segundo a ordem de classificação inicialmente estabelecida, quando o primeiro colocado, mesmo após a negociação, for desclassificado em razão de sua proposta permanecer acima do preço máximo definido pela Administração [...] (BRASIL, 2021). De antemão, observa-se que a Administração Pública possui o exercício da prerrogativa de sugerir negociações mais vantajosas para o interesse público. O §1º do art. 61 traz a possibilidade de o primeiro classificado estar sujeito à desclassificação em face do oferecimento de proposta acima dos valores precificados pelo poder público. Na seara contratual, o primeiro classificado tem o dever de celebrar o contrato ou retirar instrumento equivalente, de acordo com prazo e nas condições estabelecidas no edital, sob pena de sujeição às sanções trazidas pela norma (art. 90). Em seguida, dentre as sanções elencadas pela Lei n. 14.133/2021, temos a disciplina do inciso VI do art. 155. Esse rol de condutas do art. 155 define as infrações a que se sujeitam o licitante ou o contratado. 46 Unidade II Dentre elas, haverá responsabilização do licitante ou contratado caso não celebre o contrato ou não entregue a documentação exigida para contratação, quando convocado, no prazo de validade de sua proposta. Outras medidas relevantes, e não disposta no rol de princípios explícitos sobre licitação, são o contraditório e a ampla defesa. Embora muitas vezes descritos como se fossem apenas um único princípio, pode ser entendido que são dois mecanismos jurídicos entrelaçados, um necessitando do outro para que haja uma defesa contundente. Sua matriz é constitucional, com fulcro no art. 5º, inciso LV do texto político, cujo comando assegura aos litigantes, no processo judicial ou administrativo, o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. Contraditório significa poder manifestar-se a respeito de qualquer ato ou conjunto de atos constituídos no processo judicial ou administrativo que possa interferir no seu direito ou dever. A ampla defesa significa poder utilizar todos os meios de produção de provas admitidas em direito, isto é, as provas lícitas, inclusive em via recursal. Em relação ao processo licitatório e as garantias do licitante, temos que será assegurado ao licitante ou contratado poder contradizer e defender-se contra as hipóteses de extinção de contratos, que, como regra, são decididas pela Administração licitante, até mesmo de forma unilateral. Nesse sentido, os arts. 164 ao 168 preveem mecanismos de impugnação e recursos, além do pedido de reconsideração. A impugnação refere-se a aferir ou esclarecer irregularidades e termos constantes do edital. O recurso e o pedido de reconsideração afetam diretamente a condição do cidadão, pois são destinados às decisões que aplicam sanções ou acarretam alguma forma de prejuízo. O recurso administrativo é cabível contra atos administrativos que indefiram pedido de pré-qualificação de interessado ou de inscrição em registro cadastral, além de suas alterações ou cancelamento; julgamento das propostas; ato de habilitação ou inabilitação de licitante; anulação ou revogação da licitação; e extinção do contrato, quando determinada unilateralmente pelo poder público. Caso o ato não caiba recurso hierárquico, em que a decisão será prolatada pela autoridade pública superior àquela responsável pelo ato recorrido, além da declaração de idoneidade para licitar ou contratar, caberá o pedido de reconsideração. Como instrumento garantista, o §5º do art. 165 clama que o licitante terá vista dos elementos indispensáveis para o exercício de sua defesa. Além disso, algumas sanções admitem a instauração do processo administrativo de responsabilização, expediente administrativo próprio que teve como marco legal a Lei de Responsabilização Empresarial (Lei n. 12.846/2013), também responsável pela exigência de compliance nas contratações e vínculos mantidos com a Administração Pública. Acerca da aferição de irregularidades, a Lei de Licitações prevê o instituto da desconsideração da personalidade da pessoa jurídica, um instituto jurídico que alcança o patrimônio pessoal dos 47 FUNDAMENTOS DE DIREITO ADMINISTRATIVO administradores ou gestores responsáveis por ilícitos – abuso de direitos para dissimular a prática de atos ilícitos ou na ocorrência de confusão patrimonial – realizados de modo a ludibriar as autoridades com o uso da pessoa jurídica. Diante do incidente acerca da desconsideração deverão também ser assegurados o contraditório e a ampla defesa (art. 160). 3.2 Modalidades de licitação As modalidades de licitação são o conteúdo mais mencionado nos estudos de licitação em direito administrativo. Elas são o enredo do encadeamento de atos do processo licitatório, como elas se desenvolvem ou se formalizam. A Lei de Licitações antiga estabelecia cinco modalidades principais, dispostas em seu art. 22, a saber: concorrência, tomada de preços, convite, leilão e concurso, o qual não deve ser confundido com concursos públicos de provas e títulos para contratação ou reposição de agentes públicos em seus quadros. Com a nova Lei de Licitação, o art. 28 elenca agora cinco modalidades distintas: pregão, concorrência, concurso, leilão e diálogo competitivo. Cada uma deve ser considerada em si, estando proibidas a criação de novas modalidades ou a combinação destas (art. 28, §2º), admitindo-se, porém, os procedimentos auxiliares de licitação e contratação dispostos pelo art. 78. A inovação legislativa suprimiu as modalidades tomada de preço e convite, e trouxe o pregão, que era uma espécie de licitação disciplinada pela Lei n. 10.520/2002, a qual agora está revogada. Além disso, inovou com a criação de um novo modelo, chamado diálogo competitivo. Os incisos do art. 6º destinam-se também a conceituar essas modalidades, conforme seguem: • Pregão: modalidade licitatória obrigatória para aquisição de bens e serviços comuns, cujo critério de julgamento poderá ser o de menor preço ou o de maior desconto. • Concorrência: modalidade de licitação para contratação de bens e serviços especiais e de obra e serviços comuns e especiais de engenharia, tendo como critérios de julgamento os incisos I ao IV e VI do art. 33 (menor preço, maior desconto, melhor técnica ou conteúdo artístico, técnica e preço, e maior retorno econômico). • Concurso: modalidade de licitação para escolha de trabalho técnico, científico ou artístico, cujo critério de julgamento será o de melhor técnica ou conteúdo artístico, e para concessão de prêmio ou remuneração ao vencedor. • Leilão: modalidade de licitação para alienação de bens imóveis inservíveis ou legalmente apreendidos a quem oferecer o maior lance. • Diálogo competitivo: modalidade de licitação para contratação de obras, serviços e compras em que a Administração Pública realiza diálogos com licitantes previamente selecionados 48 Unidade II mediante critérios objetivos, com o intuito de desenvolver uma ou mais alternativas capazes de atender às suas necessidades, devendo os licitantes apresentar proposta final após o encerramento dos diálogos. Embora o §2º do art. 28 vede expressamente a criação de novas modalidades de licitação ou a combinação das referidas no artigo, não há impeditivo para a criação de uma nova modalidade em lei distinta, desde que sejam observadas regras de competência.Por exemplo, a Lei Federal n. 9.472/1997 (Lei Geral de Telecomunicações), que dispõe sobre a criação da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), autarquia em regime especial e agência reguladora, criou uma modalidade específica de licitação, denominada consulta: Art. 54. A contratação de obras e serviços de engenharia civil está sujeita ao procedimento das licitações previsto em lei geral para a Administração Pública. Parágrafo único. Para os casos não previstos no caput, a Agência poderá utilizar procedimentos próprios de contratação, nas modalidades de consulta e pregão (BRASIL, 1997) (grifo nosso). Sem uma definição muito precisa, o art. 58 diz que “a licitação na modalidade de consulta tem por objeto o fornecimento de bens e serviços não compreendidos nos arts. 56 e 57”, os quais referem-se ao pregão. Aprofundando essas disposições e instrumentalizando sua prática, a Anatel publicou a norma Resolução n. 05/1998, definindo o que seria a consulta e o seu proceder: Art. 15. Consulta é a modalidade de licitação em que ao menos cinco pessoas, físicas ou jurídicas, de elevada qualificação, serão chamadas a apresentar propostas para fornecimento de bens ou serviços não comuns. Parágrafo único. Consideram-se bens e serviços não comuns aqueles com diferenças de desempenho e qualidade, insuscetíveis de comparação direta, ou que tenham características individualizadoras relevantes ao objeto da contratação, em casos como o dos trabalhos predominantemente intelectuais, da elaboração de projetos, da consultoria, da auditoria e da elaboração de pareceres técnicos, bem assim da aquisição de equipamentos sob encomenda e de acordo com especificações particulares da Agência ou de outros bens infungíveis. Porém, a própria agência reguladora revogou esta resolução em 2019 (Resolução n. 708/2019), haja vista o advento da modalidade pregão, quando estava disciplinada por lei própria (Lei n. 10.520/2002). No mesmo sentido, a Lei n. 9.986/2000, que dispõe sobre a gestão de recursos humanos das agências reguladoras, reconheceu a consulta como modalidade licitatória típica dessas autarquias: 49 FUNDAMENTOS DE DIREITO ADMINISTRATIVO Art. 37. A aquisição de bens e a contratação de serviços pelas Agências Reguladoras poderá se dar nas modalidades de consulta e pregão, observado o disposto nos arts. 55 a 58 da Lei no 9.472, de 1997, e nos termos de regulamento próprio (BRASIL, 2000b). Com a criação do pregão e, agora, pela nova Lei Geral de Licitação (Lei n. 14.133/2021), a tendência é que a consulta caia em desuso, devido à praticidade das novas modalidades consolidadas na recente lei. Conclui-se, portanto, que, para os fins da Lei n. 14.133/2021 unicamente, não se admite criação ou combinação daquelas cinco modalidades de licitação. A consulta possui uma finalidade importante e distinta, e está disciplinada em outra lei. Observação Em sede jurisprudencial, o ministro Nelson Jobim proferiu didaticamente a afirmação de que ao instituir a Lei de Licitações, especificadamente a Lei n. 8.666/1993, a União estabeleceu normas gerais de licitação, não esgotando todo o conteúdo do tema. As principais normas constantes da Lei n. 14.133/2021 sobre as modalidades de licitação estão no capítulo II – Da Fase Preparatória, Seção II – Das modalidades de Licitação, contemplando os arts. 28 ao 32. Dentre as cinco modalidades, o pregão e a concorrência merecem ter analisadas suas distinções. Na vigência da Lei n. 8.666/1993, as modalidades convite, tomada de preço e concorrência se diferenciavam essencialmente pelo porte da obra e serviço, ou seu preço. Nesse sentido, as obras ou serviços de baixo valor estariam contempladas sob a modalidade convite, enquanto as obras de maior complexidade e valoração econômica demandariam a realização de concorrência. Paralelamente, a modalidade pregão, definida em lei própria, era destinada para aquisição de bens e serviços comuns à Administração Pública. Agora, com a Lei n. 14.133/2021, a distinção de pregão e concorrência se define pela natureza dos serviços ou bens a serem adquiridos: Quadro 2 Modalidade Bens e serviços Pregão Bens e serviços comuns Concorrência Bens e serviços especiais Obras e serviços comuns de engenharia Obras e serviços especiais de engenharia 50 Unidade II Posto isso, em relação à concorrência, não há mais estratificação com base em valores para serviços e obras de engenharia e outros, como constava no art. 23, I e II da antiga Lei de Licitações. Quanto à distinção entre bens e serviços comuns e especiais, os incisos XIII e XIV do art. 6º define como comuns os bens e serviços cujos padrões de desempenho e qualidade podem ser objetivamente definidos no edital, utilizando especificações usuais de mercado. No sentido contrário, os bens e serviços especiais, pela sua heterogeneidade ou complexidade, não podem ser descritos unicamente no edital, determinando a justificativa prévia do contratante. Anteriormente, com a Lei n. 8.666/1993, a alienação de bens imóveis estaria sujeita à modalidade concorrência em algumas situações, como dação em pagamento, permuta e doação exclusiva a outro órgão ou entidade pública. Com a nova lei, essas situações especiais também estarão sujeitas ao leilão, ora elencadas pelo art. 76. O parágrafo único do art. 29 salienta que não poderá ser aplicada a modalidade pregão para contratação de serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual e de obras e serviços de engenharia, com exceção dos serviços comuns de engenharia, definidos pelo art. 6º, XXI, “a”. Seguindo com as modalidades de licitação, o art. 30 define as condições para a realização de concurso, também condicionado a um edital, que indicará a qualificação exigida dos participantes, as diretrizes e formas de apresentação do trabalho e as condições de realização e o prêmio ou remuneração a ser concedida ao vencedor. Lembrete Não se deve confundir a modalidade de licitações “concurso” com concursos públicos de provas e títulos para contratação de servidores públicos. Tratando-se de elaboração de projeto, o vencedor da modalidade concurso deverá ceder os direitos patrimoniais relativos ao projeto e autorizar sua execução de acordo com o juízo de conveniência e oportunidade das autoridades públicas (art. 30, parágrafo único). Observação Concurso público de provas e título é um processo de avaliação para contratar funcionários e preencher cargos públicos. Em razão dos princípios da igualdade e da impessoalidade, não deixa margem para aspectos subjetivos influenciarem diretamente na contratação de alguém. O leilão continua sendo a modalidade de licitação destinada para a venda de bens da Administração Pública ou para bens apreendidos. 51 FUNDAMENTOS DE DIREITO ADMINISTRATIVO Pelas novas regras, o leilão poderá ser realizado por leiloeiro oficial ou servidor designado pela autoridade competente licitante (art. 31, caput). Os procedimentos operacionais pertinentes deverão constar em regulamento próprio. Na hipótese de leiloeiro oficial, este iniciará sua atuação por meio do credenciamento (art. 78, I) ou pregão, e critério de julgamento será o de maior desconto para as comissões a serem cobradas. Para o leilão, não é exigido registro cadastral prévio, nem haverá fase de habilitação (art. 31, §4º). A alienação de bens móveis ou imóveis pertencentes à Administração licitante também será procedida por meio de leilão, dentre outras condições, conforme segue: Art. 76. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas: I - tratando-se de bens imóveis, inclusive os pertencentes às autarquias e às fundações, exigirá autorização legislativa e dependerá de licitação na modalidade leilão, dispensada a realização de licitação nos casos de: a) dação em pagamento; b) doação, permitida exclusivamente para outro órgão ou entidade da AdministraçãoPública, de qualquer esfera de governo, ressalvado o disposto nas alíneas “f”, “g” e “h” deste inciso; c) permuta por outros imóveis que atendam aos requisitos relacionados às finalidades precípuas da Administração, desde que a diferença apurada não ultrapasse a metade do valor do imóvel que será ofertado pela União, segundo avaliação prévia, e ocorra a torna de valores, sempre que for o caso; d) investidura; e) venda a outro órgão ou entidade da Administração Pública de qualquer esfera de governo; f) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de direito real de uso, locação e permissão de uso de bens imóveis residenciais construídos, destinados ou efetivamente usados em programas de habitação ou de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgão ou entidade da Administração Pública; g) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de direito real de uso, locação e permissão de uso de bens imóveis comerciais de âmbito local, com área de até 250 m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) 52 Unidade II e destinados a programas de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgão ou entidade da Administração Pública; h) alienação e concessão de direito real de uso, gratuita ou onerosa, de terras públicas rurais da União e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) onde incidam ocupações até o limite de que trata o § 1º do art. 6º da Lei n. 11.952, de 25 de junho de 2009, para fins de regularização fundiária, atendidos os requisitos legais; i) legitimação de posse de que trata o art. 29 da Lei n. 6.383, de 7 de dezembro de 1976, mediante iniciativa e deliberação dos órgãos da Administração Pública competentes; j) legitimação fundiária e legitimação de posse de que trata a Lei n. 13.465, de 11 de julho de 2017; II - tratando-se de bens móveis, dependerá de licitação na modalidade leilão, dispensada a realização de licitação nos casos de: a) doação, permitida exclusivamente para fins e uso de interesse social, após avaliação de oportunidade e conveniência socioeconômica em relação à escolha de outra forma de alienação; b) permuta, permitida exclusivamente entre órgãos ou entidades da Administração Pública; c) venda de ações, que poderão ser negociadas em bolsa, observada a legislação específica; d) venda de títulos, observada a legislação pertinente; e) venda de bens produzidos ou comercializados por entidades da Administração Pública, em virtude de suas finalidades; f) venda de materiais e equipamentos sem utilização previsível por quem deles dispõe para outros órgãos ou entidades da Administração Pública. Por fim, o diálogo competitivo será utilizado para contratações nos termos do art. 32, dentre elas a contratação de objeto que tenha inovação tecnológica ou técnica; impossibilidade de o órgão ou entidade ter sua necessidade satisfeita sem a adaptação de soluções disponíveis no mercado; e impossibilidade de as especificações técnicas serem definidas com precisão suficiente pela Administração. Além disso, caberá diálogo competitivo para que a Administração possa definir e identificar meios e alternativas para satisfazer suas necessidades, com base na solução técnica mais adequada, nos requisitos técnicos aptos a concretizar a solução já definida ou com base na estrutura jurídica ou financeira do contrato. Trata-se de uma rodada de debates para atendimento das necessidades do órgão ou entidade licitante. 53 FUNDAMENTOS DE DIREITO ADMINISTRATIVO Sua condução será encabeçada por comissão de contratação composta por, no mínimo, 3 (três) servidores efetivos ou empregados públicos permanentes pertencentes ao quadro da Administração licitante, podendo ser contratados profissionais para assessoria técnica (art. 32, §1º, XI). Os diálogos competitivos não inovam apenas em relação à Lei Geral de Licitação. Foi introduzida alteração legislativa também na Lei n. 11.079/2004, que trata das normas gerais de licitação e contratação por meio de parceria público-privada (PPP). A PPP consiste em contrato administrativo de concessão, nas modalidades denominadas como patrocinada ou administrativa. Segundo o art. 2º, a concessão patrocinada é a concessão de serviços públicos ou de obras públicas, disciplinada pela Lei n. 8.987/1995, quando envolver adicionalmente à tarefa cobrada dos usuários contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado. Já a concessão administrativa ocorrerá quando a Administração pública for usuária direta ou indireta do contrato de prestação de serviços, mesmo que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens. Nesse sentido, o art. 10 prevê agora que a contratação por parceria público-privada será precedida de licitação na modalidade concorrência ou diálogo competitivo, além de outros requisitos. Observação Por menção expressa de um dispositivo em lei, uma modalidade de licitação pode ser também aplicada em relação a outro regime de contratação ou parceria, como no caso da parceria público-privada. Saiba mais Contextualizando o entendimento sobre as novas modalidades de licitação, em especial sobre a concorrência, convém a leitura dos art. 22 e 23 da Lei n. 8.666/1993, especialmente sobre as antigas modalidades tomada de preços e convite: BRASIL. Presidência da República. Lei n. 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Brasília, 1993. Disponível em: https://cutt.ly/KIwlfYy. Acesso em: 23 abr. 2021. 54 Unidade II 3.3 Fases do procedimento licitatório Na redação original da Lei n. 8.666/1993, a norma não dispunha de fases dos procedimentos licitatórios expressamente, cabendo a doutrinadores estipular ou esquematizar as etapas de uma licitação. Todavia, a atual lei elenca quais são as fases e sua ordem, tornando mais didática imaginar o trâmite do certame. O art. 17 da Lei n. 14.133/2021 dispõe sobre sete etapas ou fases, podendo ser mais bem compreendidas pelo gráfico a seguir: Quadro 3 Fases do processo de licitação Preparatória Divulgação do edital de licitação Apresentação de propostas e lances, quando for o caso Julgamento Habilitação Recursal Homologação O §2º do art. 17 menciona que será dada preferência à forma digital de realização da licitação, deixando a forma presencial como exceção, necessitando de motivação para a realização. A sequência de fases não é absoluta ou imutável, havendo disposição expressa da lei sobre a possibilidade de a etapa de habilitação anteceder as etapas de apresentação de propostas ou lances e de julgamento. Todavia, far-se-á necessário mencionar expressamente no edital quando da realização desse expediente, além de condicionada a um ato motivado emanado pelo poder público licitante. Originalmente, na vigência da Lei n. 8.666/1993, a etapa de habilitação antecedia dessa forma as etapas das propostas e julgamento, mostrando-se essencialmente mais morosa do que outros procedimentos licitatórios modernos, como o regime de diferenciado de contratações (RDC), sob égide da Lei n. 12.462/2011, criado outrora para atender obras e serviços de grande porte e para grandes eventos. Agora, com a etapa habilitação antecedendo à etapa de julgamento, demandará ato motivado explicitando as vantagens daí decorrentes (art. 17, §1º). A fase preparatória compreende os arts. 18 ao 27, e sua definição, nos termos do caput do art. 18, a caracteriza pelo planejamento da licitação, compatibilizado com o plano de contratações anuais, que objetiva racionalizar as contrações com órgãos e entidades públicos (art. 12, VII), quando elaborado, e com as lei orçamentárias. Deverá atender aos incisos do art. 18, delimitando a instrução do processo licitatório: 55 FUNDAMENTOS DE DIREITO ADMINISTRATIVO Art. 18 I - a descrição da necessidade da contratação fundamentada em estudo técnico preliminar que caracterize o interessepúblico envolvido; II - a definição do objeto para o atendimento da necessidade, por meio de termo de referência, anteprojeto, projeto básico ou projeto executivo, conforme o caso; III - a definição das condições de execução e pagamento, das garantias exigidas e ofertadas e das condições de recebimento; IV - o orçamento estimado, com as composições dos preços utilizados para sua formação; V - a elaboração do edital de licitação; VI - a elaboração de minuta de contrato, quando necessária, que constará obrigatoriamente como anexo do edital de licitação; VII - o regime de fornecimento de bens, de prestação de serviços ou de execução de obras e serviços de engenharia, observados os potenciais de economia de escala; VIII - a modalidade de licitação, o critério de julgamento, o modo de disputa e a adequação e eficiência da forma de combinação desses parâmetros, para os fins de seleção da proposta apta a gerar o resultado de contratação mais vantajoso para a Administração Pública, considerado todo o ciclo de vida do objeto; IX - a motivação circunstanciada das condições do edital, tais como justificativa de exigências de qualificação técnica, mediante indicação das parcelas de maior relevância técnica ou valor significativo do objeto, e de qualificação econômico-financeira, justificativa dos critérios de pontuação e julgamento das propostas técnicas, nas licitações com julgamento por melhor técnica ou técnica e preço, e justificativa das regras pertinentes à participação de empresas em consórcio; X - a análise dos riscos que possam comprometer o sucesso da licitação e a boa execução contratual; XI - a motivação sobre o momento da divulgação do orçamento da licitação, observado o art. 24 desta Lei. 56 Unidade II A Administração licitante poderá convocar audiência pública, presencial ou a distância, na forma eletrônica, acerca da licitação, facultando aos interessados o direito de manifestarem-se sobre o assunto (art. 21, caput). O art. 25 traz a exigência dos conteúdos que devem estar prescritos pelo edital de licitação, como o objeto do certame e as regras acerca da convocação, do julgamento, da habilitação, dos recursos e as penalidades cabíveis, além das disposições sobre a fiscalização e gestão do contrato, entrega do objeto e condições de pagamento. Portanto, as regras sobre as demais etapas da licitação deverão constar do próprio edital. Caso o objeto da licitação permitir, poderão ser adotadas minutas padronizadas de edital e de contrato com cláusulas uniformes (art. 25, §1º). O §3º do art. 25 menciona que o conteúdo do edital também deverá ser divulgado em sitio eletrônico oficial na mesma data de divulgação do edital, sem necessidade de registro ou identificação prévia para acesso. Não se trata de cortesia direcionada à Administração contratante, mas, sim, um dever imposto. Saiba mais No âmbito federal, é mantido o Portal de Compras do Governo Federal: https://cutt.ly/zIwcgVU Ao fim da fase preparatória, conforme salienta o art. 53, o órgão de assessoramento jurídico da entidade licitante realizará o controle prévio de legalidade e a análise jurídica da contratação, mediante parecer. Finalizada a instrução técnica e jurídica, a autoridade determinará a divulgação do edital de licitação, nos termos do art. 54. O artigo trata da publicação e divulgação dos atos de licitação no denominado Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), facultada também a publicação do edital e de anexos em sítio eletrônico oficial do ente federativo ou órgão e entidade responsável pela licitação. Exigido pela lei, o PNCP ainda não foi inaugurado, permanecendo o dispositivo em voga com seus efeitos prejudicados, ou, conforme salientado pelo art. 193, II, ainda não é exigido em razão da vigência final da Lei n. 8.666/1993. Posto isto, não fica anulada a praticidade licitatória, haja vista ainda existirem, e estarem funcionais, os portais respectivos de cada ente federativo acerca de licitações e compras, além do Portal da Transparência. Em seguida, são abertos os prazos para apresentação de propostas, seguindo o roteiro do art. 55, dispondo sobre o prazo mínimo para propostas e lances, contados a partir da data de divulgação do edital. Os prazos são agora definidos com base no critério de julgamento adotado e conforme a natureza do objeto da contratação. 57 FUNDAMENTOS DE DIREITO ADMINISTRATIVO Assim, para aquisição de bens, serão estratificados dois prazos: 8 (oito) dias úteis, tendo como critério de julgamento o menor preço ou o maior desconto (pregão); e 15 (quinze) dias úteis, nos demais critérios de julgamento (concorrência). Em relação aos serviços e obras, haverá mais prazos: 10 (dez) dias, para serviços comuns e de obras e serviços comuns de engenharia que adotem os critérios de menor preço ou o de maior desconto; 25 (vinte e cinco) dias úteis, para serviços especiais e obras e serviços especiais de engenharia, cujos critérios de julgamento forem menor preço e maior desconto; 60 (sessenta) dias para o regime de execução de contratação integrada; e 35 (trinta e cinco) dias, em relação ao regime de execução de contratação semi-integrada, nas situações não abrangidas anteriormente. Os regimes de execução de contratação para obras e serviços de engenharia são a integrada e semi-integrada, as quais têm definição constante nos incisos XXXII e XXXIII do art. 6º: • Contratação integrada: regime de contratação de obras e serviços de engenharia em que o contratado é responsável por elaborar e desenvolver os projetos básico e executivo, executar obras e serviços de engenharia, fornecer bens ou prestar serviços especiais e realizar montagem, teste, pré-operação e as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto. • Contratação semi-integrada: regime de contratação de obras e serviços de engenharia em que o contratado é responsável por elaborar e desenvolver o projeto executivo, executar obras e serviços de engenharia, fornecer bens ou prestar serviços especiais e realizar montagem, teste, pré-operação e as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto. Em relação ao leilão, o prazo para apresentação do maior lance será 15 (quinze) dias úteis. Por fim, para as demais licitações que adotem como critério técnica e preço ou melhor técnica ou conteúdo artístico (concorrência e concurso), 35 (trinta e cinco) dias úteis. Todos os prazos elencados poderão ser reduzidos até a metade em licitações orquestradas pelo Ministério da Saúde, em relação ao Sistema Único de Saúde (SUS) (art. 55, §2º). Na etapa seguinte, a apresentação de propostas (art. 17, III) obedecerá à peculiaridade específica da modalidade de licitação, enquanto no leilão serão dados os lances. O julgamento é realizado em seguida, com obediência das regras dos arts. 59 ao 61. O primeiro filtro compete ao art. 59, quanto às características que irão desclassificar a proposta: • proposta com vícios insanáveis; • desobediência às especificações técnicas pormenorizadas pelo edital; • preços inexequíveis apresentados ou acima do orçamento estimado para contratação; • ausência de demonstração de exequibilidade, quando for requisitada pela Administração; • desconformidades insanáveis perante outras exigências do edital. 58 Unidade II Ocorrendo empate entre duas ou mais propostas, a Administração licitante adotará as seguintes medidas, em ordem: 1) disputa final, hipótese em que os licitantes empatados poderão apresentar nova proposta em ato contínuo à classificação; 2) avaliação do desempenho contratual prévio dos licitantes, para a qual deverão preferencialmente ser utilizados registros cadastrais para efeito de atesto de cumprimento de obrigações previstos nesta Lei; 3) desenvolvimento pelo licitante de ações de equidade entre homens e mulheres no ambiente de trabalho, conforme regulamento; 4) desenvolvimento pelo licitante de programa de integridade, conforme orientações dos órgãos de controle.Posto isto, adquirem vantagem também as entidades que já tenham participado de outras licitações, participando do registro cadastral prévio, além da necessidade do programa de integridade, também conhecido como compliance, que vem sendo uma necessidade de adequação da sociedade civil desde ao advento da Lei n. 12.846/2013, sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a Administração Pública. Caso não ocorra o desempate, haverá as regras de preferência, em que, sucessivamente, serão priorizados bens e serviços produzidos ou prestados por: • empresas estabelecidas no território do Estado ou do Distrito Federal do órgão ou entidade da Administração Pública estadual ou distrital licitante ou, no caso de licitação realizada por órgão ou entidade de município, no território do estado em que este se localize; • empresas brasileiras; • empresas que invistam em pesquisa e no desenvolvimento de tecnologia no país; • empresas que comprovem a prática de mitigação, nos termos da Política Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC (Lei n. 12.187/2009). Não obstante o resultado do julgamento, a entidade ou órgão licitante poderá novamente renegociar condições vantajosas com o primeiro colocado. O primeiro colocado, em seguida, será sujeito ao trâmite da habilitação, que, segundo o art. 62, é a “fase da licitação em que se verifica o conjunto de informações e documentos necessários e suficientes para demonstrar a capacidade de realizar o objeto da licitação”. A habilitação é dividida em habilitação jurídica; técnica; fiscal, social e trabalhista; e econômico-financeira. As condições precisarão estar definidas no edital, permitindo sua realização ser feita por processo eletrônico (art. 65). Nesta etapa pode ser exigida apresentação de documentos 59 FUNDAMENTOS DE DIREITO ADMINISTRATIVO ou declarações de regularidade por parte do licitante, admitida apresentação de novos documentos excepcionalmente para complementação de informações apresentadas previamente ou atualização de outras informações que tenham sua validade expirada. Os requisitos sobre a habilitação técnica constam no art. 67, mencionando ser esta qualificação de natureza técnico-profissional e técnico-operacional restrita à: • apresentação de profissional, devidamente registrado no conselho profissional competente, quando for o caso, detentor de atestado de responsabilidade técnica por execução de obra ou serviço de características semelhantes, para fins de contratação; • certidões ou atestados, regularmente emitidos pelo conselho profissional competente, quando for o caso, que demonstrem capacidade operacional na execução de serviços similares de complexidade tecnológica e operacional equivalente ou superior, bem como documentos comprobatórios emitidos na forma do § 3º do art. 88 desta Lei; • indicação do pessoal técnico, das instalações e do aparelhamento adequados e disponíveis para a realização do objeto da licitação, bem como da qualificação de cada membro da equipe técnica que se responsabilizará pelos trabalhos; • prova do atendimento de requisitos previstos em lei especial, quando for o caso; • registro ou inscrição na entidade profissional competente, quando for o caso; • declaração de que o licitante tomou conhecimento de todas as informações e das condições locais para o cumprimento das obrigações objeto da licitação. Quanto à habilitação jurídica, tem como objetivo atestar a capacidade de o licitante exercer direitos e assumir obrigações, por meio da comprovação da existência jurídica da pessoa e de autorização para o exercício da atividade a ser contratada (art. 66). Já para a qualificação fiscal, social e trabalhista, precisará atender aos requisitos do art. 68: • inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ); • inscrição no cadastro de contribuintes estadual e/ou municipal, se houver, relativo ao domicílio ou sede do licitante, pertinente ao seu ramo de atividade e compatível com o objeto contratual; • regularidade perante a Fazenda federal, estadual e/ou municipal do domicílio ou sede do licitante, ou outra equivalente, na forma da lei; • regularidade relativa à Seguridade Social e ao FGTS, que demonstre cumprimento dos encargos sociais instituídos por lei; 60 Unidade II • regularidade perante a Justiça do Trabalho; • cumprimento do disposto no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal (proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos). Por fim, a capacitação econômico-financeira demonstrará a aptidão econômica do licitante em cumprir as obrigações decorrentes do futuro contrato, comprovada por vias objetivas e por coeficientes e índices econômicos determinados pelo edital, além da apresentação de balanço patrimonial, demonstração do resultado do exercício e demais demonstrações contábeis dos últimos dois exercícios sociais, e certidão negativa de falência expedida pelo distribuidor da sede do licitante. Encerrada a fase de habilitação, considerando ainda, os pedidos de impugnação, esclarecimentos e recursos, corolários do exercício do contraditório e ampla defesa, a autoridade superior da Administração Pública licitante poderá determinar o saneamento de irregularidades; revogar a licitação por motivo de conveniência ou oportunidade; anular a licitação, quando constatada ilegalidade insanável; e adjudicar o objeto da licitação e homologá-la. O papel seguinte e fundamental consiste no exercício da adjudicação do objeto de licitação e homologação do certame, que consiste em atestar a regularidade de todo procedimento e encerramento de todas as etapas. A partir deste momento, dar-se-á início à celebração do contrato administrativo. 3.4 Contratação direta A regra é que a Administração Pública realize a licitação para contratar a produção e a aquisição de bens e serviços. Neste tópico, serão vistas as hipóteses em que não será necessária a ocorrência do certame ou quando não for possível realizá-lo, como ocorre na falta de concorrentes, em que há apenas um único prestador ou fornecedor do serviço ou bem disponível no mercado. Neste contexto, elas são consideradas contratações diretas. Devido à sistemática e circunstância constantes da lei, há duas classificações para haver a contratação direta: • a licitação dispensável é feita em circunstâncias previstas, que tornam conveniente não licitar; • a licitação inexigível é feita quando inexistem competidores no mercado para determinada finalidade ou possuidores de determinada qualificação. A licitação dispensável está disposta em rol exaustivo. Relembrando: apenas se admitem as hipóteses elencadas na lei. Com relação às hipóteses de inexigibilidade da licitação, está descrita em rol exemplificativo (a lei discrimina algumas hipóteses como exemplo, deixando margem para outras circunstâncias similares). 61 FUNDAMENTOS DE DIREITO ADMINISTRATIVO O art. 72 menciona quais documentos irão instruir a contratação direta, sendo eles: • documento de formalização de demanda e, se for o caso, estudo técnico preliminar, análise de riscos, termo de referência, projeto básico ou projeto executivo; • estimativa de despesa, que deverá ser calculada na forma estabelecida no art. 23 desta Lei; • parecer jurídico e pareceres técnicos, se for o caso, que demonstrem o atendimento dos requisitos exigidos; • demonstração da compatibilidade da previsão de recursos orçamentários com o compromisso a ser assumido; • comprovação de que o contratado preenche os requisitos de habilitação e qualificação mínima necessária; • razão da escolha do contratado; • justificativa de preço; • autorização da autoridade competente. O parágrafo único do art. 72 dispõe que o ato autorizativo da contratação direta ou o extrato decorrente do contrato deverá ser divulgado e mantido à disposiçãodo público em sítio eletrônico oficial. Na ordem disposta pela lei, a inexigibilidade de licitação ocorrerá quando houver inviabilidade de competição – falta de participantes licitantes. A norma menciona cinco casos específicos, sem prejuízo de outras situações: • Aquisição de materiais, de equipamentos ou de gêneros ou contratação de serviços que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivos. • Contratação de profissional do setor artístico, diretamente ou por meio de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública. • Contratação dos seguintes serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação: — estudos técnicos, planejamentos, projetos básicos ou projetos executivos; — pareceres, perícias e avaliações em geral; — assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias; 62 Unidade II — fiscalização, supervisão ou gerenciamento de obras ou serviços; — patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas; — treinamento e aperfeiçoamento de pessoal; — restauração de obras de arte e de bens de valor histórico; — controles de qualidade e tecnológico, análises, testes e ensaios de campo e laboratoriais, instrumentação e monitoramento de parâmetros específicos de obras e do meio ambiente e demais serviços de engenharia que se enquadrem no disposto neste inciso. • Objetos que devam ou possam ser contratados por meio de credenciamento. • Aquisição ou locação de imóvel cujas características de instalações e de localização tornem necessária sua escolha. Para o primeiro exemplo, a Administração licitante precisará demonstrar a inviabilidade de competição, mediante o atestado de exclusividade, ou por meio de declaração do fabricante ou documento idôneo capaz de comprovar a exclusividade do objeto fornecido ou prestado. A lei especifica também que não pode haver preferência por marca específica. Em relação à contratação de profissional artístico, conforme o §2º do art. 74, a contratação dar-se-á por intermédio de um empresário exclusivo, conceituado como a pessoa física ou jurídica que possua contrato, declaração, carta ou outro documento que ateste a exclusividade permanente e contínua de representação, no país ou em estado específico, do profissional do setor artístico, afastada a possibilidade de contratação direta por inexigibilidade por meio de empresário com representação restrita a evento ou local específico (BRASIL, 2021). O terceiro item destaca a notória especialização, que é entendida como a essencialidade e plena adequação para o objeto da contratação, atestada por desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica ou outros requisitos relativos à sua atividade. Quanto ao credenciamento, trata-se de uma instrumento auxiliar, facilitador, da realização de licitação e contratação, definido pelo inciso XLIII do art. 6º como um processo administrativo de chamamento público, realizado pela Administração, por meio de uma convocação de interessados em prestar serviços ou fornecer bens, que, ao preencher requisitos, tornam-se credenciados no órgão ou entidade licitante. Para o último item, é necessário preencher os requisitos dos três incisos do §5º do art. 74; assim, para a aquisição ou locação de imóvel cujas características de instalação ou de localização tornem 63 FUNDAMENTOS DE DIREITO ADMINISTRATIVO sua escolha essencial, serão necessárias a avaliação prévia do bem (estado de conservação, custos de adaptação e prazo de amortização dos investimentos), certificação de inexistência de imóveis públicos vagos e disponíveis que atenderiam o objeto da licitação, e justificativa sobre a singularidade daquele imóvel e sobre evidência de vantagem para a Administração licitante. Diferentemente da inexigibilidade, as dispensas de licitação são situações especificadas pela lei, que justificam a não realização do procedimento licitatório. Neste cenário, a lei menciona um rol exaustivo de situações, não havendo que falar em licitação dispensável para situações alheias ao rol do art. 75. Destacam-se contratações de obras e serviços de engenharia ou de outros tipos de serviços desde que em valores inferiores aos constantes dos incisos I e II ou para aquisição de material de uso das Forças Armada. Posto isto, é dispensável a licitação para as seguintes situações: I - para contratação que envolva valores inferiores a R$ 100.000,00 (cem mil reais), no caso de obras e serviços de engenharia ou de serviços de manutenção de veículos automotores; II - para contratação que envolva valores inferiores a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), no caso de outros serviços e compras; III - para contratação que mantenha todas as condições definidas em edital de licitação realizada há menos de 1 (um) ano, quando se verificar que naquela licitação: a) não surgiram licitantes interessados ou não foram apresentadas propostas válidas; b) as propostas apresentadas consignaram preços manifestamente superiores aos praticados no mercado ou incompatíveis com os fixados pelos órgãos oficiais competentes; IV - para contratação que tenha por objeto: a) bens, componentes ou peças de origem nacional ou estrangeira necessários à manutenção de equipamentos, a serem adquiridos do fornecedor original desses equipamentos durante o período de garantia técnica, quando essa condição de exclusividade for indispensável para a vigência da garantia; b) bens, serviços, alienações ou obras, nos termos de acordo internacional específico aprovado pelo Congresso Nacional, quando as condições ofertadas forem manifestamente vantajosas para a Administração; c) produtos para pesquisa e desenvolvimento, limitada a contratação, no caso de obras e serviços de engenharia, ao valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais); 64 Unidade II d) transferência de tecnologia ou licenciamento de direito de uso ou de exploração de criação protegida, nas contratações realizadas por instituição científica, tecnológica e de inovação (ICT) pública ou por agência de fomento, desde que demonstrada vantagem para a Administração; e) hortifrutigranjeiros, pães e outros gêneros perecíveis, no período necessário para a realização dos processos licitatórios correspondentes, hipótese em que a contratação será realizada diretamente com base no preço do dia; f) bens ou serviços produzidos ou prestados no País que envolvam, cumulativamente, alta complexidade tecnológica e defesa nacional; g) materiais de uso das Forças Armadas, com exceção de materiais de uso pessoal e administrativo, quando houver necessidade de manter a padronização requerida pela estrutura de apoio logístico dos meios navais, aéreos e terrestres, mediante autorização por ato do comandante da força militar; h) bens e serviços para atendimento dos contingentes militares das forças singulares brasileiras empregadas em operações de paz no exterior, hipótese em que a contratação deverá ser justificada quanto ao preço e à escolha do fornecedor ou executante e ratificada pelo comandante da força militar; i) abastecimento ou suprimento de efetivos militares em estada eventual de curta duração em portos, aeroportos ou localidades diferentes de suas sedes, por motivo de movimentação operacional ou de adestramento; j) coleta, processamento e comercialização de resíduos sólidos urbanos recicláveis ou reutilizáveis, em áreas com sistema de coleta seletiva de lixo, realizados por associações ou cooperativas formadas exclusivamente de pessoas físicas de baixa renda reconhecidas pelo poder público como catadores de materiais recicláveis, com o uso de equipamentos compatíveis com as normas técnicas, ambientais e de saúde pública; k) aquisição ou restauração de obras de arte e objetos históricos, de autenticidade certificada,desde que inerente às finalidades do órgão ou com elas compatível; l) serviços especializados ou aquisição ou locação de equipamentos destinados ao rastreamento e à obtenção de provas previstas nos incisos II e V do caput do art. 3º da Lei n. 12.850, de 2 de agosto de 2013, quando houver necessidade justificada de manutenção de sigilo sobre a investigação; m) aquisição de medicamentos destinados exclusivamente ao tratamento de doenças raras definidas pelo Ministério da Saúde; 65 FUNDAMENTOS DE DIREITO ADMINISTRATIVO V - para contratação com vistas ao cumprimento do disposto nos arts. 3º, 3º-A, 4º, 5º e 20 da Lei n. 10.973, de 2 de dezembro de 2004, observados os princípios gerais de contratação constantes da referida Lei; VI - para contratação que possa acarretar comprometimento da segurança nacional, nos casos estabelecidos pelo Ministro de Estado da Defesa, mediante demanda dos comandos das Forças Armadas ou dos demais ministérios; VII - nos casos de guerra, estado de defesa, estado de sítio, intervenção federal ou de grave perturbação da ordem; VIII - nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a continuidade dos serviços públicos ou a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para aquisição dos bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 1 (um) ano, contado da data de ocorrência da emergência ou da calamidade, vedadas a prorrogação dos respectivos contratos e a recontratação de empresa já contratada com base no disposto neste inciso; IX - para a aquisição, por pessoa jurídica de direito público interno, de bens produzidos ou serviços prestados por órgão ou entidade que integrem a Administração Pública e que tenham sido criados para esse fim específico, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado; X - quando a União tiver que intervir no domínio econômico para regular preços ou normalizar o abastecimento; XI - para celebração de contrato de programa com ente federativo ou com entidade de sua Administração Pública indireta que envolva prestação de serviços públicos de forma associada nos termos autorizados em contrato de consórcio público ou em convênio de cooperação; XII - para contratação em que houver transferência de tecnologia de produtos estratégicos para o Sistema Único de Saúde (SUS), conforme elencados em ato da direção nacional do SUS, inclusive por ocasião da aquisição desses produtos durante as etapas de absorção tecnológica, e em valores compatíveis com aqueles definidos no instrumento firmado para a transferência de tecnologia; XIII - para contratação de profissionais para compor a comissão de avaliação de critérios de técnica, quando se tratar de profissional técnico de notória especialização; 66 Unidade II XIV - para contratação de associação de pessoas com deficiência, sem fins lucrativos e de comprovada idoneidade, por órgão ou entidade da Administração Pública, para a prestação de serviços, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado e os serviços contratados sejam prestados exclusivamente por pessoas com deficiência; XV - para contratação de instituição brasileira que tenha por finalidade estatutária apoiar, captar e executar atividades de ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico e tecnológico e estímulo à inovação, inclusive para gerir administrativa e financeiramente essas atividades, ou para contratação de instituição dedicada à recuperação social da pessoa presa, desde que o contratado tenha inquestionável reputação ética e profissional e não tenha fins lucrativos; XVI - para aquisição, por pessoa jurídica de direito público interno, de insumos estratégicos para a saúde produzidos por fundação que, regimental ou estatutariamente, tenha por finalidade apoiar órgão da Administração Pública direta, sua autarquia ou fundação em projetos de ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico e tecnológico e de estímulo à inovação, inclusive na gestão administrativa e financeira necessária à execução desses projetos, ou em parcerias que envolvam transferência de tecnologia de produtos estratégicos para o SUS, nos termos do inciso XII do caput deste artigo, e que tenha sido criada para esse fim específico em data anterior à entrada em vigor desta Lei, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado (BRASIL, 2021). Em relação à Lei n. 8.666/1993, o rol da atual lei é mais enxuto. Pela antiga lei, o art. 24 possuía 35 incisos, muitos deles sendo acrescentados posteriormente, por meio de mudanças legislativas. Observação Nota-se que o conteúdo dos incisos expõe circunstâncias que demandam emergência ou danos quanto à demora do processo de licitação, e ainda atos de fomentos a determinados setores da economia. Encontramos hipóteses relacionadas à compra de gêneros alimentícios, que possuem prazo de validade, demandando celeridade na aquisição; compra de materiais para Forças Armadas; reformas para estabelecimentos prisionais; e aquisição de materiais destinados para pesquisas científicas ou para entidades atuantes no SUS (Sistema Único de Saúde). Ainda na vigência desta lei, havia a distinção entre licitação dispensada e dispensável, não existindo mais a primeira modalidade, que servia também para a alienação de bens pertencentes à Administração. Na constância da atual lei, essas alienações são realizadas exclusivamente por leilão. 67 FUNDAMENTOS DE DIREITO ADMINISTRATIVO Observação A dispensa de licitação não é uma exigência direta da lei, competindo ao poder público analisar a conveniência e oportunidade da adoção da contratação direta, quando presentes as circunstâncias do art. 75. 3.5 Instrumentos auxiliares A Lei n. 14.133/2021 criou procedimentos auxiliares para realização de licitação ou contratação, sendo eles elencados pelo art. 78 como: credenciamento, pré-qualificação, procedimento de manifestação de interesse, sistema de registro de preços e registro cadastral. São procedimentos que facilitam a realização de etapas do certame, especialmente no que diz respeito à organização de potenciais participantes. Todas devem atender a critérios claros e objetivos definidos em regulamento (art. 78, §1º). Alguns desses instrumentos estão definidos pelo art. 6º, por meio de seus incisos XLIII, XLIV e XLV: Credenciamento Processo administrativo de chamamento público em que a Administração Pública convoca interessados em prestar serviços ou fornecer bens para que, preenchidos os requisitos necessários, se credenciem no órgão ou na entidade para executar o objeto quando convocados; O credenciamento poderá ser utilizado em três situações de contratação, explicadas pelos incisos I a III do art. 79: paralela e não excludente, sendo estas contratações simultâneas e padronizadas viáveis e vantajosas para a Administração Pública; com seleção a critério de terceiros, a cargo do beneficiário direto da contratação; e em mercado fluidos, situação em que a flutuação constante do valor das prestações e das condições inviabilizem a seleção de participantes por meio de licitação. Este instrumento será disciplinado por regulamento próprio. A Administração manterá o edital de chamamento em sítio eletrônico oficial, para cadastramento de novos interessados permanentemente. Pré-qualificação Procedimento seletivo prévio à licitação, convocado por meio de edital, destinado à análise das condições de habilitação, total ou parcial, dos interessados ou do objeto. A lei prevê também que a pré-qualificação ficará permanentemente aberta para a inscrição de interessados. Já o art. 80 menciona ser um procedimento técnico-administrativo, destinado para licitantes que reúnem condições de habilitação
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