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P ág in a1 DIREITO PROCESSUAL CIVIL P ág in a2 AVISO DE DIREITOS AUTORAIS Prezado aluno, antes de iniciarmos nossos estudos de hoje, precisamos ter uma conversa séria. Trata-se do respeito aos nossos esforços na produção deste curso, a que temos dedicado todas as nossas energias nos últimos meses. Saiba que nosso objetivo é sempre oferecer o melhor produto possível e que realmente faça a diferença na sua caminhada rumo à aprovação. Mas, para que nós consigamos atingir essa meta, sua ajuda é imprescindível. Então, sempre que algum amigo ou conhecido falar “será que você passa para mim aquele material do RevisãoPGE que você tem?”, lembre desta nossa conversa. Mais: lembre-se que os nossos cursos são tutelados pela legislação civil (como a Lei 9.610/98 e o Código Civil) e pela legislação penal (especialmente pelo art. 184 do Código Penal). Para que não reste dúvida: este curso se destina ao uso exclusivo do aluno que o adquirir em nosso site, e sua aquisição não autoriza sua reprodução. Ok? Sabemos que falar isso parece pouco amigável, mas só estamos tendo este “papo reto” porque queremos de você justamente um ato de amizade: não participar, de forma alguma, da pirataria deste curso. Se isso acontecer, o fornecimento das aulas a você será interrompido e nenhum valor pago será restituído, sem prejuízo, evidentemente, de toda a responsabilização cabível nos âmbitos civil e penal. Bem, o recado era esse. Agora podemos voltar às boas e meter a cara nos livros! Ops... nos PDFs! Bons estudos! P ág in a3 Aula revista e atualizada em 04/06/2022 DIREITO PROCESSUAL CIVIL – AULA 03 AÇÃO DIREITO PROCESSUAL CIVIL – AULA 03 ................................................................................................. 5 AÇÃO .................................................................................................................................................... 5 TEORIA DA AÇÃO: AÇÃO E DIREITO DE AÇÃO ........................................................................................ 5 Direito de ação (situação jurídica) ..................................................................................................... 5 Ação como ato jurídico/Demanda ..................................................................................................... 6 TEORIAS DA AÇÃO ................................................................................................................................ 7 Teoria civilista ................................................................................................................................... 8 Teoria concreta ou concretista.......................................................................................................... 8 Teoria abstrata ................................................................................................................................. 9 Teoria eclética ................................................................................................................................ 10 Teoria da asserção .......................................................................................................................... 10 ELEMENTOS DA AÇÃO ........................................................................................................................ 11 PARTES ............................................................................................................................................... 12 CAUSA DE PEDIR ................................................................................................................................. 14 PEDIDO ............................................................................................................................................... 17 CLASSIFICAÇÃO DAS AÇÕES ................................................................................................................ 19 QUANTO À NATUREZA DA RELAÇÃO JURÍDICA DISCUTIDA .................................................................. 19 QUANTO AO OBJETO DO PEDIDO MEDIATO ....................................................................................... 20 QUANTO AO TIPO DE TUTELA ............................................................................................................. 20 Ações declaratórias ou meramente declaratórias ........................................................................... 20 Ações constitutivas ......................................................................................................................... 22 Ações condenatórias ....................................................................................................................... 23 Ações mandamentais e ações executiva lato sensu ......................................................................... 24 CUMULAÇÃO DE AÇÕES ...................................................................................................................... 25 CONCURSO DE AÇÕES......................................................................................................................... 25 CONDIÇÕES DA AÇÃO ......................................................................................................................... 26 LEGITIMIDADE .................................................................................................................................... 28 Conceito e noções gerais ................................................................................................................ 28 Legitimidade ordinária e extraordinária .......................................................................................... 28 Sucessão processual ....................................................................................................................... 30 Representação processual .............................................................................................................. 30 P ág in a4 Outras classificações ....................................................................................................................... 31 Legitimidade e personalidade judiciária .......................................................................................... 34 INTERESSE DE AGIR OU INTERESSE PROCESSUAL ................................................................................ 35 POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO ................................................................................................. 37 P ág in a5 LEGENDA TEORIA DA AÇÃO: AÇÃO E DIREITO DE AÇÃO Em princípio, convém mencionar que “ação” é um termo que possui mais de uma acepção na linguagem processual. Nesse contexto, é importante que se diferencie o “direito de ação” e a “ação ato jurídico”. O direito de ação é um direito fundamental composto por um conjunto de situações jurídicas que fundamentam a possibilidade de acesso aos tribunais e a exigência de uma tutela jurisdicional adequada. A ação ato jurídico, por sua vez, significa o exercício do direito de ação, podendo ser chamada de ação exercida, ou demanda. É o fato gerador do processo, tendo em vista a sua função de definir o objeto litigioso e fixar os limites da atividade jurisdicional. Direito de ação (situação jurídica) Como já dito, o direito de ação é composto por várias situações jurídicas. Nesse complexo de situações jurídicas, existem duas categorias: (I) as situações pré-processuais (aquelas que são titularizadas e exercidas antes mesmo de o autor propor a demanda). É o caso do direito de provocar a atividade jurisdicional (decorrente do Princípio da Quando seu texto estiver preenchido com esta cor, estaremos falando da jurisprudência do STJ Quando seu textoestiver preenchido com esta cor, estaremos falando da jurisprudência do STF Quando seu texto estiver preenchido com esta cor, estaremos falando de QUESTÕES DE CONCURSO P ág in a6 Inafastabilidade da Jurisdição, CF/88, art. 5º, XXXV e Princípio da inércia) e do direito de escolher o procedimento (entre o rito do mandado de segurança ou o rito ordinário, por exemplo); (II) as situações jurídicas processuais (ocorrem após o exercício do direito de ação). São exemplos o direito de receber uma tutela jurisdicional adequada, o direito de prova, o direito de recorrer, entre outras. Cabe ressaltar que o direito de ação, ora analisado, não pode ser confundido com o direito que se pretende defender em juízo ou o direito afirmado. Este compõe a res in iudicium deducta e pode ser definido como o direito material deduzido em juízo, em uma tradução livre. Em outras palavras, o direito de ação e o direito material que se pretende discutir no processo são direitos autônomos e independentes, como se verá ao estudar as teorias da ação (vide teoria abstrata), de modo que independentemente de haver ou não o direito afirmado, o direito de ação poderá ser exercido. Ação como ato jurídico/Demanda Como visto, a ação como ato jurídico é conhecida como demanda. Nesse contexto, convém mencionar que o vocábulo “demanda” pode ser entendido em duas acepções: a) ato de ir a juízo provocar a atividade jurisdicional; b) o conteúdo da própria postulação (pretensão processual referente à relação jurídica substancial). A demanda, entendida como conteúdo da postulação, é o nome processual que recebe a pretensão processual posta à apreciação do Poder Judiciário. Sendo assim, inexistindo ao menos a afirmação de uma relação jurídica de direito material, o ato demanda não terá conteúdo. Desse modo, os elementos da relação jurídica discutida em juízo (sujeitos, objeto e fato jurídico) guardam correspondência com os elementos da demanda (as partes, a causa de pedir e o pedido). P ág in a7 A relação entre os dois institutos, portanto, é: a afirmação da relação jurídica substancial é o conteúdo da demanda. Para uma melhor visualização dessa relação, confiram o seguinte esquema: ELEMENTOS DA RELAÇÃO JURÍDICA LIVROS DA PARTE GERAL DO CÓDIGO CIVIL ELEMENTOS DA AÇÃO CRITÉRIOS OBJETIVOS DE DISTRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIA Sujeito Das pessoas (livro I) Partes Em razão da pessoa Objeto Dos bens (livro II) Pedido Em razão do valor da causa Fato Dos fatos jurídicos (livro III) Causa de Pedir Em razão da matéria TEORIAS DA AÇÃO Ao longo do tempo, foram criadas diversas teorias sobre a ação. Cabe frisar que, para o objetivo aqui proposto, o importante é compreender o entendimento atual e ter uma breve noção das teorias já superadas. As referidas teorias são: (I) civilista ou imanentista; (II) concreta; (III) abstrata; (IV) eclética; (V) da asserção. As duas primeiras foram completamente superadas e as três últimas merecem mais atenção. P ág in a8 Teoria civilista A teoria civilista ou imanentista considera que a ação é o próprio direto material. Dessa maneira, para a teoria em questão, só existirá ação se houver o respectivo direito material, de modo que a ação não tem autonomia nem independência. Era consagrada pelo Código Civil de 1916, que previa que “a todo o direito corresponde uma ação, que o assegura” (art. 75, CC/16). A partir dos ensinamentos propugnados por esta teoria, o direito de ação remeteria ao “direito a um julgamento favorável”, logo, a improcedência do pedido implicaria na inexistência do direito de ação. Teoria concreta ou concretista A teoria concreta ou concretista, diferentemente da civilista, entende que a ação e o direito material são coisas distintas e que, portanto, a ação é autônoma em relação ao direito material. Apesar do avanço no que se refere à teoria anterior, a teoria concretista afirma que o direito de ação existe somente se o direito material existir. Desse modo, reconhece-se a autonomia do direito de ação, mas não a sua independência. Como vertente da teoria concreta, surgiu o entendimento de que o direito de ação é um direito potestativo (e não subjetivo), tendo em vista ser autônomo em relação ao direito material, mas dependente de uma sentença de mérito favorável. A teoria concreta encontra-se superada, nunca tendo conseguido responder a dois questionamentos importantes: (I) por que, no caso de resolução do mérito desfavorável ao autor, não há exercício do direito de ação? P ág in a9 (II) na hipótese de sentença procedente de ação declaratória negativa, quando o acolhimento do pedido do autor declara a inexistência do direito material, não teria havido direito de ação? Teoria abstrata A teoria abstrata do direito de ação incorpora a noção criada pela teoria concreta de que direito de ação e direito material não se confundem. Nesse sentido, mantém a autonomia entre esses dois direitos e, mais além, defende que o direito de ação é independente do direito material, podendo existir sem ele. Nessa concepção, a ação é o direito abstrato de se receber um pronunciamento jurisdicional, não existindo nenhum requisito que precise ser preenchido para a sua existência. Tal característica de ser o direito de ação incondicionado leva os abstrativistas puros a rejeitar a existência das condições da ação. Logo, de acordo com essa teoria, uma sentença de “carência de ação” (isto é, em que falte uma das condições da ação – interesse e legitimidade), seria uma sentença de mérito, produzindo coisa julgada material. O problema dessa afirmação é que o CPC/15 é expresso ao afirmar que a ausência de interesse e de legitimidade acarreta sentença sem resolução do mérito, vejamos: CPC/15 Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: (...) VI - verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual; Ao analisar o “direito de ação” à luz desta teoria não se fala em condições da ação, os quais seriam encarados enquanto “problemas de mérito” ou “pressupostos processuais”. P ág in a1 0 Embora não seja a corrente majoritária, parte da doutrina entende que essa teoria é a mais condizente com o princípio da economia processual, pois evita a repropositura de demandas nas quais a pretensão do autor já tenha sido rejeitada. Teoria eclética A teoria eclética pode ser entendida como a teoria abstrata com certos temperamentos. Isso porque, para a teoria em comento, o direito de ação não se confunde com o direito material, existindo de maneira autônoma e independente, mas condicionado a alguns requisitos, que são as condições da ação. Para a teoria eclética, as condições da ação não se confundem com o mérito, devendo ser analisadas preliminarmente, gerando, quando ausentes, uma sentença terminativa de carência da ação. Desse modo, essas condições deveriam ser analisadas após a admissibilidade e antes do mérito, constituindo uma fase intermediária. Esta teoria foi idealizada por Enrico Túlio Liebman, que defendia que o direito de ação seria um direito do autor a um julgamento de mérito, independentemente de ser favorável ou desfavorável, sendo que, antes dessa análise seriam verificadas as condições da ação. Posto isso, infere-se que para esta teoria, o direito de ação é autônomo e abstrato, contudo só passaria a existir concretamente caso fosse preenchidas as condições estabelecidas pela legislação, que a luz do CPC/15 seriam apenas a legitimidade ad causam e o interesse de agir (art. 17 do CPC/15). Teoria da asserção Modernamente, surgiu a teoria da asserção, também chamada de teoria in statu assertionis e teoria dela prospettazione, que pode ser pode ser considerada uma teoria intermediária entre a teoria abstrata e a teoria eclética. Para os defensores dessacorrente, presumem-se verdadeiras as alegações do autor para fins de preenchimento das condições da ação. Ultrapassada essa fase, a análise da veracidade ou não dessas alegações se resolve no mérito. P ág in a1 1 Desse modo, o magistrado analisa as alegações do autor e verifica se, em relação à legitimidade e ao interesse de agir, aparentam ser verdadeiras. Em sentido positivo, as condições da ação restam demonstradas. Contudo, se, após esse momento, descobrir-se que as alegações são falsas, resolver-se-á o processo com julgamento de mérito, rejeitando o pedido do autor. Essa teoria é amplamente aceita pelo STJ. De acordo com a Corte Superior, as condições da ação devem ser aferidas com base na teoria da asserção, ou seja, à luz das afirmações deduzidas na petição inicial, dispensando-se qualquer atividade instrutória. (STJ. REsp 1.731.125-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Julgamento em 21/11/2018) Em síntese, o que interessa para fins da existência das condições da ação, no âmbito da teoria da asserção, é a mera alegação do autor, presumindo-se provisoriamente que ele está dizendo a verdade. Cabe ressaltar que a definição sobre o momento de análise sobre as condições da ação é importante devido ao seguinte: (a) caso seja reconhecida a falta de uma das condições da ação no início do processo → haverá coisa julgada formal e a demanda poderá ser proposta novamente; (b) caso o reconhecimento de ausência de uma das condições da ação seja feito posteriormente → haverá coisa julgada material, e a parte não poderá propor a demanda novamente, sob pena de violação à coisa julgada (art. 485, V, CPC/15). ELEMENTOS DA AÇÃO Os elementos da ação são os componentes que se prestam a identificar a ação, sendo de extrema importância quando se pretende comparar uma ação com outra. Isso é importante porque permite afirmar quais ações são iguais, parecidas ou absolutamente diferentes, o que interfere em fenômenos como a coisa julgada, litispendência, perempção, conexão, continência, entre outros. P ág in a1 2 Em regra, a doutrina entende que existem três elementos da ação: partes, causa de pedir e pedido. Cabe ressaltar que alguns autores, a exemplo de DIDIER, examinam somente a causa de pedir e o pedido. COMO O ASSUNTO JÁ FOI COBRADO EM CONCURSOS? Na prova de Advogado da Saneago-GO realizada em 2018 pela banca CS-UFG foi considerada correta a seguinte assertiva: São elementos da “ação” no Direito Processual Civil: partes, causa de pedir (remota e próxima) e pedido. COMENTÁRIOS: conforme explicado no tópico acima, tem-se que as questões de concurso em geral abordam a posição majoritária da doutrina em relação aos elementos da ação. Optamos por apresentar as noções gerais de cada elemento neste momento e aprofundar os temas quando analisarmos pressupostos processuais e petição inicial. PARTES Em princípio, para entender o conceito de parte, é fundamental que se estabeleça a distinção entre parte processual, parte material e parte legítima. A parte processual é a que integra a relação jurídica processual, atuando com parcialidade e podendo ser atingida pelos efeitos da decisão. De acordo com DIDIER, esse é o conceito que deve ser utilizado. A parte processual pode ser parte principal da demanda (demandante ou demandado) ou parte auxiliar, que, embora não formule perdido ou não tenha contra si pedido formulado, é sujeito parcial do contraditório e, portanto, parte. É o caso do assistente simples e do Ministério Público como fiscal da lei. Ressalta-se que determinados sujeitos podem não ser parte da demanda no início do processo e vir a se tornar no decorrer dele, a exemplo do denunciado à lide. P ág in a1 3 Além disso, a demanda pode ser principal ou incidental (como o incidente de suspeição do juiz, por exemplo). Serão partes da demanda principal, autor e réu; na demanda incidental, o juiz será parte, embora não o seja na demanda principal. Por sua vez, a parte material ou do litígio é o sujeito da relação jurídica discutida em juízo. Ela pode ou não ser parte processual, tendo em vista que o Direito pode conferir a alguém, em certas situações, a legitimação para defender, em nome próprio, interesse alheio (legitimação extraordinária). Por fim, parte legítima é a que tem autorização para estar em juízo discutindo determinada situação jurídica. Não havendo essa autorização, a parte será ilegítima. Ressalta-se que parte ilegítima também é parte, caso em que deverá alegar sua ilegitimidade, nos termos do art. 339 do CPC/15: CPC/15 Art. 339. Quando alegar sua ilegitimidade, incumbe ao réu indicar o sujeito passivo da relação jurídica discutida sempre que tiver conhecimento, sob pena de arcar com as despesas processuais e de indenizar o autor pelos prejuízos decorrentes da falta de indicação. Segundo DANIEL AMORIM, citando CÂNDIDO DINAMARCO, existem 4 (quatro)maneiras de se adquirir a qualidade de parte: (a) pelo ingresso da demanda (autor/opoente); (b) pela citação (réu, denunciado à lide e chamado ao processo); (c) de maneira voluntária (assistente e recurso de terceiro prejudicado); (d) sucessão processual (alteração subjetiva da demanda, como na extromissão de parte). Ademais, o mesmo autor aponta que há também a intervenção do Ministério Público, que pode ingressar no processo como fiscal da lei (ou fiscal da ordem jurídica, P ág in a1 4 segundo a doutrina moderna), intervindo de forma voluntária e vinculada, ou seja, a palavra final a respeito da intervenção no processo é sempre do Ministério Público, mas não será sua vontade, e sim a vontade da lei, que demandará sua participação. CAUSA DE PEDIR De acordo com a doutrina, existem duas teorias que explicam do que é composta a causa de pedir. A teoria da individuação, advinda do direito alemão e atualmente com mero interesse histórico, defende que a causa de pedir é composta apenas pela relação jurídica afirmada pelo autor. A teoria da substanciação, por outro lado, também criada pelo direito alemão, determina que a causa de pedir, independentemente da natureza da ação, é formada pelos fatos e pelos fundamentos jurídicos narrados pelo autor. De acordo com o STJ, acerca da causa de pedir, o nosso ordenamento jurídico processual adotou a teoria da substanciação ao exigir que o autor, na petição inicial, indique os fatos (causa de pedir remota) e os fundamentos jurídicos (causa de pedir próxima) do seu pedido. (STJ. REsp 1.634.069-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Julgamento em 20/08/2019) Como pode ser percebido pelo que foi dito acima, a causa de pedir se divide em (I) Próxima e (II) Remota. A causa de pedir próxima consiste nos fundamentos jurídicos constitutivos do direito do autor e a causa de pedir remota nos fatos. Esse é o entendimento da doutrina majoritária e, como visto, do STJ. Existem doutrinadores, porém, que sustentam o contrário. Isto é, causa de pedir remota seria os fundamentos jurídicos e a causa de pedir próxima seria os fatos constitutivos do direito do autor. Para provas, basta que você conheça a divergência e indique a posição do STJ. P ág in a1 5 Cabe ressaltar, contudo, que os fundamentos jurídicos, embora compreendam a causa de pedir, não vinculam o julgador. Nesse sentido, o STJ afirma que, como no direito brasileiro se aplica a teoria da substanciação, segundo a qual apenas os fatos vinculam, é possível que o julgador lhes atribua a qualificação jurídica que entender adequada ao acolhimento ou rejeição do pedido, como fruto dos brocardos iura novit cúria (o juiz conhece o direito) e da mihi factum dabo tibi ius (dê-me o fato e te darei o direito). (STJ. REsp 1.682.986-RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, Julgamento em 19/09/2017) Além disso, é importante que se entenda que fundamento jurídico não é o mesmo que fundamento legal.Com efeito, fundamento legal é o artigo da lei no qual se embasa a pretensão do autor, que é facultativo, e, se não for indicado, não trará qualquer vício. O fundamento jurídico, por sua vez, é o elo entre os fatos e o pedido, conforme preconiza José Roberto Cruz e Tucci. Para uma melhor compreensão, imaginem que o fundamento legal de um pedido de indenização pode ser o art. 186 do Código Civil, abaixo transcrito. Já o fundamento jurídico desse pedido é o relato de que ação ou omissão do réu, praticada mediante negligência ou imprudência, resultou em um prejuízo material ao autor. CC/02 Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Nesse contexto, a omissão do dispositivo legal (art. 186 do CC/02) não teria nenhuma consequência para o processo. A falta da explicação de como surgiu o dever de o réu indenizar o autor, por outro lado, implicaria inépcia da petição inicial. Nos processos objetivos, a exemplo da ação direta de inconstitucionalidade, a causa de pedir é aberta, de modo que pode ser declarada a inconstitucionalidade material de uma lei, apesar de a parte haver pedido a inconstitucionalidade formal, por P ág in a1 6 exemplo. É por isso que o Supremo Tribunal Federal não está condicionado, no desempenho de sua atividade jurisdicional, pelas razões de ordem jurídica invocadas como suporte da pretensão de inconstitucionalidade deduzida pelo autor da ação direta. Em outras palavras, o julgador não está limitado aos fundamentos jurídicos indicados pelas partes. (STF. ADI 514. Rel. Min. Celso de Mello, Julgamento 26/03/2008) Parte da doutrina ainda diferencia a causa de pedir ativa e a causa de pedir passiva, sendo que a primeira é composta dos fatos constitutivos do direito do autor, enquanto a segunda é composta dos fatos contrários alegados pelo réu. Também é possível classificar a causa de pedir em simples, composta e complexa: (I) simples: uma causa de pedir dá origem a um pedido. Exemplo: não pagamento de aluguel enseja um pedido de despejo; (II) composta: duas ou mais causas de pedir dão origem a um pedido. Exemplo: falta de pagamento do aluguel e infração contratual ensejam um pedido de despejo; (III) complexa: duas ou mais causas de pedir dão origem a dois ou mais pedidos. Exemplo: falta de pagamento e destruição do imóvel ensejam um pedido de despejo e um pedido de indenização por danos materiais. É oportuno destacar, ainda, que nem todo fato integra a causa de pedir, mesmo que mencionado na inicial, sendo necessário diferenciar os fatos jurídicos e os fatos simples. Os fatos jurídicos ou jurígenos são os que produzem consequências jurídicas, enquanto que os fatos simples são irrelevantes para o direito. A esse respeito, José Rogério Cruz e Tucci, ao tratar da causa de pedir, assinalam que: (...) Aduz-se que o fato ou os fatos que são essenciais para configurar o objeto do processo e que constituem a causa de P ág in a1 7 pedir são exclusivamente aqueles que têm o condão de delimitar a pretensão. Recorrendo ao conhecido discrime entre fato jurígeno e fato simples, anota Milton Paulo de Carvalho que o fato reputado como causa eficiente de uma pretensão processual é apenas aquele (fato principal) que emerge 'carregado de efeito pelo ordenamento jurídico' e não à evidência o fato simples ou secundário. Daí por que, para que o órgão do Poder Judiciário possa proferir a sentença, é necessário que o ato inaugural do processo esteja particularizado por determinados acontecimentos produzidos pela dinâmica social e dos quais possa ser extraída uma consequência jurídica. DANIEL AMORIM elucida bem a questão exemplificando que aumentar o volume da música enquanto dirige é, a priori, um fato simples. A partir do momento em que essa conduta produz um acidente automobilístico, passa a ser um fato jurídico. Insta consignar, que conforme explicado anteriormente, o juiz não está vinculado a hipótese normativa suscitada pela parte, nesse mesmo sentido foi editado o Enunciado 281 do Fórum Permanente de Processualistas Civis - FPPC. Enunciado 281, FPPC (art. 319, III do CPC/15): A indicação do dispositivo legal não é requisito da petição inicial e, uma vez existente, não vincula o órgão julgador. PEDIDO De início, é importante afirmar que o pedido pode ser imediato (ou direto) e mediato (ou indireto). O primeiro é dirigido ao Poder Judiciário e visa uma prestação jurisdicional, sendo tido como o aspecto processual do pedido. O segundo, por outro lado, é dirigido à outra parte e visa um bem da vida, tratando-se do aspecto material (obrigação de fazer, de dar, entre outras). Desse modo, é possível afirmar que o pedido imediato se pede ao Judiciário para P ág in a1 8 indiretamente (ou mediatamente) se obter o pedido mediato (bem da vida). Nesse sentido, confiram o seguinte esquema: Outros aspectos desse tema (certeza e determinação (art. 322 do CPC/15), cumulação de pedidos (art. 337 do CPC/15), espécies de pedidos, entre outros) serão analisados, de forma detalhada, posteriormente. COMO O ASSUNTO JÁ FOI COBRADO EM CONCURSOS? Na prova de Procurador do Estado de Roraima realizada em 2022 pela Banca CESPE foi apresentada a seguinte questão (adaptada): Joana protocolou ação requerendo a condenação da sociedade empresária Beta ao pagamento de indenização por danos morais, materiais e a retirada do nome da demandante do cadastro de inadimplentes. Tal ação tramita no procedimento comum. Ademais, a autora requereu, por intermédio de tutela provisória antecipada em caráter incidental, a imediata retirada de seu nome do cadastro ora mencionado. Nessa situação hipotética, A banca considerou como correta a seguinte afirmação: “Se a ação proposta por Joana apresentasse pedidos alternativos, o valor da causa deveria ser o de maior valor.” COMENTÁRIOS: CPC/15: “Art. 292. O valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será: (...) P ág in a1 9 VII - na ação em que os pedidos são alternativos, o de maior valor;” CLASSIFICAÇÃO DAS AÇÕES A classificação das ações já foi mencionada no estudo da jurisdição (aula 02), de modo que, na presente aula, apenas serão feitas complementações sobre o tema. Segundo DIDIER, as ações podem ser classificadas seguindo vários critérios: quanto à natureza da relação jurídica discutida, quanto ao objeto do pedido mediato, e quanto ao tipo de tutela. Vejamos cada uma delas: QUANTO À NATUREZA DA RELAÇÃO JURÍDICA DISCUTIDA De acordo com a natureza da relação jurídica discutida, a ação ou demanda pode ser real ou pessoal. A ação real é aquela que se relaciona com o direito material real (art. 1.225 do CC/02), enquanto que a ação pessoal se relaciona com o direito pessoal. A importância dessa classificação verifica-se no estudo das competências, como será aprofundado em momento oportuno. Nesse contexto, é importante destacar as ações possessórias, que não são reais nem pessoais, possuindo um regramento jurídico próprio, bastante semelhante, mas não idêntico, ao das ações reais. Sobre o tema, DIDIER exemplifica da seguinte forma: Ação reipersecutória é a ação real ou pessoal pela qual se busca a entrega / restituição de coisa certa que está em poder de terceiro. A ação de recuperação de bem dado em comodato é exemplo de ação reipersecutória pessoal. A ação reivindicatória é exemplo de ação reipersecutória real. P ág in a2 0 QUANTO AO OBJETO DO PEDIDO MEDIATO Essa classificação considera o objeto do pedido, ou seja, o bem da vida que se pretende obter, podendo ser mobiliária ou imobiliária, conforme o objeto seja móvel ou imóvel. É importante observar que nem toda ação imobiliária é real e nem toda ação mobiliáriaé pessoal. Como exemplo, cita-se a ação de despejo, que é imobiliária e pessoal (na medida em que tem por base o contrato de locação) e a ação reivindicatória de um carro, que é mobiliária e real. QUANTO AO TIPO DE TUTELA Segundo esse critério, a ação ou demanda pode ser: de conhecimento, de execução ou cautelar. Por sua vez, as ações de conhecimento podem ser: declaratórias, constitutivas e condenatórias. Ações declaratórias ou meramente declaratórias As ações declaratórias ou meramente declaratórias objetivam certificar a existência, inexistência ou modo de ser de uma situação jurídica, bem como a declaração de falsidade ou autenticidade do documento. Nesse sentido, confiram os dispositivos do CPC/15 que fundamentam esse tipo de ação: CPC/15 Art. 19. O interesse do autor pode limitar-se à declaração: I - da existência, da inexistência ou do modo de ser de uma relação jurídica; II - da autenticidade ou da falsidade de documento. Art. 20. É admissível a ação meramente declaratória, ainda que tenha ocorrido a violação do direito. Alguns exemplos clássicos de ações que declaram a existência ou a inexistência de relações jurídicas são: P ág in a2 1 a) ação de usucapião; b) ação de inexistência de relação jurídica tributária; c) ação de inexistência de união estável. Sobre o tema, convém exibir o entendimento consolidado do STJ de que a ação declaratória serve para a obtenção de certeza sobre a correta interpretação de cláusula contratual, conforme a súmula nº 181, in verbis: Súmula 181-STJ: É admissível ação declaratória, visando a obter certeza quanto à exata interpretação de cláusula contratual. Cabe ressaltar que toda ação é declaratória, mas nem toda ação é meramente declaratória. Em outras palavras, é possível afirmar que as ações constitutivas e condenatórias também são ações de declaração, porém, além disso, possuem outros objetivos. A ação declaratória ou meramente declaratória, por sua vez, só tem um objetivo: a simples certificação de algo. Observa-se que a ação meramente declaratória pode ser positiva (quando se pretende a declaração da existência de determinada situação jurídica) ou negativa (quando se pretende a declaração de inexistência de uma situação jurídica). A causa de pedir da ação positiva possui dois elementos: (i) a relação jurídica que pretende ver declarada; e (ii) o direito a essa declaração (direito ao reconhecimento). Da mesma forma, na ação declaratória negativa, afirma-se a inexistência de uma situação jurídica e o direito ao reconhecimento desta inexistência. Frisa-se que não se admite a ação meramente declaratória de fato, ressalvada a ação sobre a autenticidade do documento. Efetivamente, permite-se o requerimento ao Poder Judiciário para que ele certifique a situação jurídica que tenha ou não tenha emergido de um fato, não se admitindo o pleito de simples declaração da ocorrência ou não de um evento. É importante mencionar, ainda, que cabe ação declaratória, mesmo se já for possível o ajuizamento de uma ação de prestação. É o que está disposto no já P ág in a2 2 mencionado art. 20 do CPC/15, in verbis: CPC/15 Art. 20. É admissível a ação meramente declaratória, ainda que tenha ocorrido a violação do direito. COMO O ASSUNTO JÁ FOI COBRADO EM CONCURSOS? Na prova para Promotor de Justiça do MP-PR realizada em 2019 por banca da própria instituição foi considerada incorreta a seguinte assertiva: Se houver afirmação de violação de um direito, não se admite a ação meramente declaratória. COMENTÁRIOS: o erro da assertiva está em contrariar a previsão expressa do art. 20 do CPC/15. Com efeito, existe uma tendência de conferir executividade à sentença meramente declaratória quando há o reconhecimento de uma obrigação exigível. Sendo assim, quando a sentença for resultado de uma ação declaratória proposta em momento no qual já se poderia ajuizar uma ação de prestação, é muito difícil distingui- la de uma sentença de prestação. Entretanto, existem algumas diferenças importantes que merecem sua atenção. Como se sabe, a ação meramente declaratória não sofre prescrição, diferentemente da ação condenatória (de prestação). Nesses termos: (a) ação declaratória ajuizada antes da violação ao direito – não se deve falar em prescrição, considerando o fato de não ter ainda havido a lesão; (b) ação declaratória ajuizada após à violação ao direito - há prescrição, tendo em vista a existência de lesão. Contudo, o despacho que ordena a citação não a interrompe, já que não há pretensão à efetivação da prestação devida; (c) ação condenatória - há prescrição e o despacho que ordena a citação a interrompe, considerando a existência de violação a direito e a pretensão de obter a prestação devida. P ág in a2 3 Ações constitutivas As ações constitutivas caracterizam-se como as demandas que têm o intuito de obter a certificação e efetivação de um direito potestativo. Nesse contexto, é importante mencionar que direito potestativo é o poder jurídico conferido a alguém de submeter outrem à alteração, criação ou extinção de situações jurídicas. Com efeito, não é necessário que o vencido realize alguma conduta para que o direito potestativo seja efetivado, pois este se materializa no mundo jurídico das normas. Exemplificativamente, cita-se o direito de anular um negócio jurídico, tendo em vista que tal anulação dar-se-á com a simples decisão transitada em julgado, sendo desnecessário qualquer ato material das partes para tanto. Desse modo, é possível afirmar que, para satisfazer um direito potestativo, não é necessária a efetivação de uma medida executiva. Em regra, as decisões constitutivas produzem efeito ex nunc (não retroagem ou não possuem eficácia retroativa). Entretanto, não se desconhecem decisões constitutivas-negativas que possuem eficácia retroativa (ex tunc), a exemplo da que anula negócio jurídico, nos termos do art. 182 do CC/02 disposto a seguir: CC/02 Art. 182. Anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente. Por fim, ressalta-se que as ações constitutivas se sujeitam à decadência. Ações condenatórias Considerando a divisão clássica de direitos entre potestativos e de prestação, surge a separação entre as ações constitutivas e condenatórias. Os direitos potestativos P ág in a2 4 relacionam-se com as ações constitutivas e os direitos de prestação, com as ações condenatórias. Efetivamente, o direito de prestação consiste no poder jurídico, conferido a determinado sujeito, de exigir de outrem o cumprimento de uma conduta, que pode ser de fazer, não fazer ou dar coisa (no qual inclui-se o dinheiro). Desse modo, para que uma prestação seja efetivamente satisfeita, é necessária a realização de medidas executivas (cumprimento de sentença). Como exemplo, é possível citar decisão que condena o réu a pagar uma quantia em dinheiro, tendo em vista que dependerá, em regra, do cumprimento de sentença para que seja efetivada (exceto se houver cumprimento espontâneo). As ações condenatórias se sujeitam à prescrição nos termos do art. 189 do CC/02 disposto a seguir: CC/02 Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206. Ações mandamentais e ações executivas lato sensu Existem doutrinadores que optam por acrescentar ao rol de ações de conhecimento mais duas espécies: ações mandamentais e ações executivas lato sensu. Nesse contexto, as referidas ações seriam de prestação, tendo como intuito buscar a certificação e a efetivação de um direito. DIDIER explica que a diferença entre as ações mandamentais e as ações executivas é: Ação Executiva Ação MandamentalP ág in a2 5 - A execução é direta ou por sub-rogação. - A execução se dá de forma indireta. A execução direta é utilizada nos casos em que o Estado pode substituir a conduta do devedor, ao passo que a execução indireta é guardada para as situações em que se necessita da colaboração dele. São hipóteses de execução direta a busca e apreensão, a alienação em hasta pública, o usufruto forçado, entre outras. Por outro lado, a execução indireta realiza-se mediante a prisão civil e a multa coercitiva, por exemplo. Embora a maioria dos doutrinadores adotem a classificação tradicional (declaratória, constitutiva e condenatória), é importante que se conheça a classificação quinaria (declaratória, constitutiva, condenatória, mandamental e executiva lato sensu), pois é uma teoria bastante difundida e cobrada em provas. CUMULAÇÃO DE AÇÕES O tema cumulação de ações se divide em: (I) cumulação subjetiva (litisconsórcio); (II) cumulação objetiva (cumulação de pedidos). Ressalta-se que esses temas serão aprofundados em aulas seguintes deste Curso, sendo que a sua breve menção, neste momento, tem o intuito de introduzir tais conceitos, que são de grande importância para o estudo do processo civil. CONCURSO DE AÇÕES A expressão “concurso de ações” deve ser compreendida como concurso de direitos ou concurso de pretensões e deve ser analisada sob dois aspectos: (i) objetivo; e (ii) subjetivo. P ág in a2 6 Sob o aspecto objetivo, o concurso pode adquirir duas formas: a) concurso impróprio – mais de uma pretensão surge de uma causa de pedir; b) concurso próprio – uma pretensão surge de mais de uma causa de pedir. Nesse contexto, confiram o seguinte quadro extraído da obra de DIDIER: CONCURSO OBJETIVO IMPRÓPRIO CONCURSO OBJETIVO PRÓPRIO Pedido 1 Causa de pedir Pedido 2 Causa de pedir 1 Pedido Causa de pedir 2 O concurso subjetivo, por sua vez, é sinônimo de colegitimação ativa (um mesmo pedido, baseado em uma mesma causa de pedir, pode ser formulado por pessoas diferentes). Ao estudarmos pedidos, voltaremos ao assunto. CONDIÇÕES DA AÇÃO A retirada da expressão “condições da ação” do Código de Processo Civil de 2015 suscitou a questão do afastamento desse instituto processual do ordenamento jurídico brasileiro, de modo que o interesse de agir e a legitimidade passassem a ser tratados como pressupostos processuais ou como mérito, a depender do caso concreto. Com efeito, a parcela da doutrina que defende esse afastamento afirma que o CPC/15 teria adotado o binômio “pressupostos processuais” e “mérito”, sendo que o “conceito de condições da ação” teria sido eliminado, embora o que por meio dele se buscava identificar continuasse a existir. Em outras palavras, o órgão jurisdicional ainda teria de examinar a legitimidade, o interesse e a possibilidade jurídica do pedido, mas não mais como condições da ação e sim como pressupostos processuais ou mérito. P ág in a2 7 Para entender melhor a controvérsia, é necessário conhecer o conceito tradicional de “condições da ação”. De acordo com DIDIER, a condição da ação seria uma questão relacionada a um dos elementos da ação (partes, pedido e causa de pedir), que estaria em uma zona intermediária entre as questões de mérito e as de admissibilidade. Sendo assim: As condições da ação, portanto, eram tidas como critérios relacionados às partes, causa de pedir e pedido (legitimidade, interesse e possibilidade jurídica do pedido, respectivamente) que deveriam ser preenchidos após a verificação dos requisitos de admissibilidade do processo (pressupostos de admissibilidade). Destaca-se que, mesmo antes da entrada em vigor do CPC/15, muitos doutrinadores já defendiam a desconsideração da possibilidade jurídica do pedido, remanescendo apenas a legitimidade e o interesse. Nesse contexto, a problemática surgiu devido ao fato de que há somente dois juízos que podem ser feitos pelo órgão jurisdicional (de admissibilidade e de mérito), sendo difícil explicar a criação de uma terceira categoria. Por isso, a fim de solucionar tal situação, alguns doutrinadores passaram a entender a legitimidade e o interesse como parte dos pressupostos processuais. Essa é a corrente defendida por DIDIER. CONDIÇÕES DA AÇÃO PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE MÉRITO P ág in a2 8 A possibilidade jurídica do pedido, por sua vez, passou a ser examinada como hipótese de improcedência liminar do pedido (art. 332 do CPC/15), ou seja, do mérito. Embora não haja um entendimento consolidado sobre o tema, é possível afirmar que as condições da ação não desapareceram. A mudança foi apenas em relação à expressão, considerando que o termo “condição da ação” não foi contemplado pelo CPC/15. Nesse contexto, vejamos a disposição do art. 17 do CPC/15: CPC/15 Art. 17. Para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade. Por fim, é importante ressaltar que as “condições da ação” podem ser discutidas em qualquer fase do processo, não sofrendo preclusão. LEGITIMIDADE Conceito e noções gerais A legitimidade consiste na pertinência subjetiva da ação, isto é, a relação entre os sujeitos da demanda e a situação jurídica afirmada. Em outras palavras, é possível afirmar que a legitimidade é a situação prevista em lei que permite a um determinado sujeito propor a demanda judicial e a um outro sujeito figurar no polo passivo dessa demanda. É chamada de legitimidade para agir (ad causam petendi ou ad agendum). Legitimidade ordinária e extraordinária A legitimidade ordinária e a extraordinária já foram mencionadas nessa aula, mas, neste momento, serão melhor analisadas. De início, vejamos como o CPC/15 dispõe sobre o tema: P ág in a2 9 CPC/15 Art. 18. Ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico. Parágrafo único. Havendo substituição processual, o substituído poderá intervir como assistente litisconsorcial. A legitimidade ordinária é tida como a situação prevista em lei que permite a alguém ser autor ou réu em um processo. Há uma coincidência entre as partes da demanda e as partes do litígio. A legitimidade extraordinária, por outro lado, surge como a autorização do ordenamento jurídico para que alguém, em nome próprio, defenda um interesse alheio. Não há coincidência entre as partes da demanda e as partes do litígio. Sendo assim: LEGITIMAÇÃO ORDINÁRIA LEGITIMAÇÃO EXTRAORDINÁRIA Defende em nome próprio interesse próprio Defende em nome próprio interesse alheio É parte processual e parte material É parte processual, mas não é parte material Cabe ressaltar que se admite a possibilidade de que alguém atue como legitimado ordinário e extraordinário simultaneamente, a exemplo da ação reivindicatória ajuizada pelos condôminos, prevista no art. 1.314 do CC/02, in verbis: CC/02 Art. 1.314. Cada condômino pode usar da coisa conforme sua destinação, sobre ela exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão, reivindicá-la de terceiro, defender a sua posse e alhear a respectiva parte ideal, ou gravá-la. P ág in a3 0 Além disso, é importante saber que, na legitimidade extraordinária, a autorização para a atuação do substituto processual pode ser expressa ou decorrer do sistema. Como exemplo, cita-se a autorização dada pela Constituição para que os sindicatos defendam os interesses de seus filiados (autorização expressa), nos termos do art. 8º, inciso III da CF/88 disposto abaixo: CF/88 Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: (...) III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas; Um exemplo de autorização tácita é a hipótese de recurso interposto pela partepostulando a majoração dos honorários advocatícios devidos, que são direito do advogado. Nessa situação, apesar de não haver dispositivo expresso permitindo tal prática, é pacífico o entendimento de que a inclusão da discussão sobre o valor dos honorários no recurso interposto pelo cliente é válida. A legitimidade extraordinária deve ser entendida como sinônimo de substituição processual ou legitimação anômala, pois a doutrina, majoritariamente, assim a considera, ainda que haja controvérsia sobre essa identidade de nomenclatura. As características da legitimidade extraordinária são: a) direito de o substituído intervir no processo (art. 18, parágrafo único, do CPC/15); b) legitimado extraordinário é parte; c) pode ser ativa (polo ativo) ou passiva (polo passivo); d) a coisa julgada atinge o substituído, relativizando o art. 506 do CPC/15, salvo exceções (art. 274, CC/02; art. 103, CDC). Sucessão processual P ág in a3 1 A legitimidade extraordinária (substituição processual) não deve ser confundida com a sucessão processual, que consiste na troca de uma pessoa por outra em um dos polos do processo. Como exemplo, menciona-se a situação em que o autor morre e o seu descendente assume o polo ativo da demanda ou a hipótese de venda do objeto de disputa do processo, situação na qual o comprador pode ingressar no feito e assumir a posição do réu, acaso o autor assim autorize, nos termos do art. 109 do CPC/15: CPC/15 Art. 109. A alienação da coisa ou do direito litigioso por ato entre vivos, a título particular, não altera a legitimidade das partes. §1º O adquirente ou cessionário não poderá ingressar em juízo, sucedendo o alienante ou cedente, sem que o consinta a parte contrária. Representação processual A legitimidade extraordinária ou substituição processual também não deve ser confundida com a representação processual. Com efeito, na representação processual, alguém atua em nome alheio, defendendo interesse alheio, a exemplo da mãe que representa o filho em uma ação de alimentos. Nesse sentido: SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL Defende em nome próprio interesse alheio Defende em nome alheio interesse alheio É a legitimação extraordinária Não é legitimação extraordinária P ág in a3 2 Outras classificações Legitimação autônoma é da parte. Legitimação subordinada é do assistente. Legitimação exclusiva - apenas um sujeito é considerado legitimado para compor um dos polos do processo. Legitimação concorrente ou colegitimação - existe mais de um sujeito legitimado a compor um dos polos do processo. A legitimação isolada ou disjuntiva (simples) - permite que o legitimado esteja sozinho no processo. Exemplos: a) legitimidade entre os órgãos do MP (estadual e federal); b) legitimidade entre o agente público e a Administração Pública; c) mãe e viúva na ação de compensação por dano moral decorrente da morte de filho / marido; d) legitimidade passiva dos entes públicos (U, E, DF, M) nas ações de saúde. Legitimação conjunta (complexa) - exige a formação de litisconsórcio entre todos ou alguns dos legitimados (litisconsórcio necessário). Exemplos: a) oposição; b) ação de improbidade contra particular e o agente público; c) ação para exigir prestação de contas contra o condomínio. Legitimação total – se refere a todo o processo. Legitimação parcial – se refere somente a determinados atos (nos incidentes processuais). P ág in a3 3 Legitimação original - surge com a demanda inicial. Legitimação derivada – surge com a sucessão processual. Vejamos alguns julgados relacionados aos exemplos indicados acima: • Pode ser admitido litisconsórcio ativo facultativo entre o Ministério Público Federal, o Ministério Público Estadual e o Ministério Público do Trabalho em ação civil pública que vise tutelar pluralidade de direitos que legitimem a referida atuação conjunta em juízo. Essa atuação conjunta deve-se ao cunho social do Parquet e à posição que lhe foi erigida pelo constituinte (de instituição essencial à função jurisdicional do Estado), incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. (STJ. REsp 1.444.484-RN, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Julgamento em 18/9/2014) • Os ascendentes têm legitimidade para a demanda indenizatória por morte da sua prole ainda quando esta já tenha constituído o seu grupo familiar imediato, o que deve ser balizado apenas pelo valor global da indenização devida, ou seja, pela limitação quantitativa da indenização. Sendo assim, percebe-se uma situação de colegitimidade (a genitora tem legitimidade para ajuizar ação objetivando o recebimento de indenização pelo dano moral decorrente da morte de filho casado e que tenha deixado descendentes, ainda que a viúva e os filhos do falecido já tenham recebido, extrajudicialmente, determinado valor a título de compensação por dano moral oriundo do mesmo fato). (STJ. REsp 1.095.762-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Julgamento em 21/02/2013) • É inviável o manejo da ação civil de improbidade exclusivamente e apenas contra o particular, sem a concomitante presença de agente público no polo passivo da demanda. Trata-se de hipótese de legitimação conjunta, tendo em vista a exigência do litisconsórcio P ág in a3 4 necessário para que seja proposta a demanda em face do particular. (STJ. REsp 1.171.017-PA, Rel. Min. Sérgio Kukina, Julgamento em 25/02/2014) • O condômino, isoladamente, não possui legitimidade para propor ação de prestação de contas, pois a obrigação do síndico é de prestar contas à assembleia, nos termos do art. 22, §1º, "f", da Lei nº 4.591/1964. Trata-se de uma situação de legitimação conjunta, tendo em vista a inviabilidade de ação de prestação de contas ajuizada por um único condômino, sendo necessária a presença de toda a assembleia para tanto. (STJ. REsp 1.046.652-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Julgamento em 16/09/2014) Legitimidade e personalidade judiciária Outro ponto importante a ser destacado é a personalidade judiciária. De acordo com a doutrina e jurisprudência, alguns órgãos, embora não possuam personalidade jurídica (Câmara de Vereadores, Assembleias Legislativas, Tribunais de Contas, entre outros) podem defender, em juízo, interesses institucionais, possuindo personalidade judiciária. O STJ, inclusive, fixou o entendimento de que a Câmara Municipal não possui personalidade jurídica, mas apenas personalidade judiciária, a qual lhe autoriza apenas atuar em juízo para defender os seus interesses estritamente institucionais, ou seja, aqueles relacionados ao funcionamento, autonomia e independência do órgão, não se enquadrando, nesse rol, o interesse patrimonial do ente municipal. (STJ. REsp 1.429.322-AL, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Julgamento em 20/02/2014) Esse entendimento encontra-se consolidado, de modo que foi editada a súmula 525 do STJ, nos seguintes termos: Súmula 525-STJ: A Câmara de Vereadores não possui personalidade jurídica, apenas personalidade judiciária, somente podendo demandar em juízo para defender os seus direitos institucionais. P ág in a3 5 INTERESSE DE AGIR OU INTERESSE PROCESSUAL Em princípio, convém distinguir interesse processual e interesse substancial. Interesse processual é secundário e instrumental, visando a obtenção de um provimento para satisfazer o interesse substancial, que é principal, primário e está relacionado ao direito material. Sobre o interesse processual, existem ao menos três entendimentos acerca dos seus elementos, quais sejam: (I) necessidade e adequação; (II) necessidade e utilidade; (III) necessidade, utilidade e adequação. Essa divergência ocorre até mesmo no âmbito jurisprudencial. No informativonº 579 (REsp nº 1.304.736-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Julgamento em 24/2/2016), o STJ asseverou que o interesse de agir se encontra vinculado à necessidade e à adequação da prestação jurisdicional. Por sua vez, no REsp 1.304.736-RS (Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Julgamento em 24/2/2016), o STJ afirmou que o interesse de agir é condição da ação que possui três aspectos: (i) utilidade; (ii) adequação; e (iii) necessidade. Por fim, no REsp 1.732.026-RJ (Rel. Min. Herman Benjamin, Julgamento em 17/05/2018), o STJ afirmou que o interesse recursal repousa no binômio necessidade e utilidade. A necessidade ocorre sempre que o autor demonstrar que não pode obter o bem da vida sem a intervenção jurisdicional. Com efeito, é necessária a demonstração de que o autor não conseguiu obter o bem da vida pretendido por si só, seja porque o réu resistiu a essa pretensão ou porque o ordenamento jurídico exige a participação do Poder Judiciário. P ág in a3 6 A necessidade, portanto, pressupõe que haja resistência da parte adversa. Nos casos de jurisdição voluntária, em que não há resistência, mas é necessária a participação do órgão jurisdicional, o interesse de agir é presumido. Cumpre registrar que a possibilidade de obtenção de solução fora do Poder Judiciário, por um dos equivalentes jurisdicionais, não afasta o acesso à jurisdição. A adequação, por sua vez, caracteriza-se pela possibilidade de o exercício jurisdicional ser apto a resolver o conflito de interesse, gerando um benefício ou utilidade à parte autora. Destaca-se que a inadequação não se refere ao procedimento escolhido. Não importa que o rito escolhido pela parte não seja correto, adequado, pois isso pode ser sanado. O que não se admite é que a pretensão veiculada pela parte não permita a solução do problema. Um exemplo de inadequação é o ajuizamento de ação reivindicatória com o intuito de recuperar a posse de terra invadida por terceiros. Isso porque, ainda que o pedido seja acolhido e seja reconhecido que o autor da demanda é o dono da propriedade, o réu continuaria na sua posse. O correto seria o ajuizamento de uma ação possessória (e não reivindicatória). Finalmente, haverá utilidade se a demanda trouxer algum proveito ou benefício ao demandante. Como exemplo, cita-se a situação em que se inicia um processo para a cobrança de valor ínfimo ou irrisório. Isso porque, devido às custas processuais, o proveito econômico da ação será inexistente para o demandante. Nesse sentido, vejamos um caso expresso de inutilidade trazido pelo CPC/15: CPC/15 Art. 836. Não se levará a efeito a penhora quando ficar evidente que o produto da execução dos bens encontrados será totalmente absorvido pelo pagamento das custas da P ág in a3 7 execução. Contudo, convém mencionar que é entendimento do STJ que o valor irrisório do crédito cobrado por meio de execução fiscal não autoriza que a autoridade judicial decrete, de imediato, a extinção do feito por ausência de interesse de agir, sendo viável o arquivamento, sem baixa na distribuição. (STJ. AgRg no RMS 31.308-SP, Rel. Min. Humberto Martins, Julgamento em 20/04/2010) POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO Como visto, há um certo consenso no que se refere ao fato de que a possibilidade jurídica do pedido não é mais considerada uma condição da ação desde antes do CPC/15. Apesar disso, é um tema que merece bastante atenção e deve ser estudado. DANIEL AMORIM aponta que, em uma análise abstrata do pedido do autor à luz do ordenamento jurídico, são possíveis três resultados: (a) o pedido está expressamente previsto como apto a receber a proteção jurisdicional; (b) não há nenhuma previsão legal a respeito do pedido; (c) existe uma expressa vedação na lei ao pedido formulado. Considerando os três resultados possíveis acima dispostos, somente na última hipótese haverá a impossibilidade jurídica do pedido. Existe uma divergência doutrinária sobre o que significa pretensão vedada pelo ordenamento jurídico. Parcela da doutrina entende que se trata somente do pedido mediato (bem da vida), defendendo que o pedido de tutela jurisdicional é sempre possível. Por outro lado, há quem defenda que se trata apenas do pedido imediato (processual ou tutela jurisdicional), ou ambos os pedidos (imediato e mediato). P ág in a3 8 Por fim, ressalta-se que a impossibilidade pode ser do pedido ou da causa de pedir: (i) será do pedido se a pretensão for vedada pelo ordenamento jurídico (Estado-membro requerer a secessão, por exemplo); (ii) será da causa de pedir se o ordenamento jurídico negar a geração dos direitos pretendidos (cobrança de dívida de jogo, por exemplo).
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