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54 Unidade II Unidade II 5 FISIOLOGIA DA DOR 5.1 Introdução Agora daremos continuidade a outro assunto de extrema importância: o estudo da dor. Na nossa prática clínica, é muito comum atender pacientes com a queixa clássica de dor, e, dessa forma, é necessário entender todos os aspectos da dor, para que ela seja tratada da forma mais efetiva possível. De acordo com a definição adotada pela International Association for the Study of Pain, Associação Internacional para o Estudo da Dor (MERSKEY; BOGDUK, 2017), dor é definida como “uma experiência sensorial e emocional desagradável, associada a dano tecidual potencial ou de fato, ou, ainda, descrita em termos que sugerem tal dano”. No ano de 2020, essa definição sofreu uma atualização, e a descrição da dor ficou da seguinte forma: “uma experiência sensitiva e emocional desagradável associada, ou semelhante àquela associada, a uma lesão tecidual real ou potencial”. Esse conceito de dor valoriza a experiência de dor pelo paciente, mesmo na ausência de uma lesão tecidual evidente, tanto através de sensações percebidas, em uma ou diversas partes do corpo, quanto seu impacto emocional. A ausência de uma lesão precipitando a dor pode estar relacionada a uma manifestação somática de um transtorno psicológico, bem como ser consequência de um processo de sensibilização central pela dor (o corpo inteiro se encontra mais sensível à dor), em que a percepção de sensação dolorosa, inicialmente desencadeada por uma lesão tecidual, passa a prescindir dela. A dor é uma experiência presente na vida da maior parte dos seres humanos, pois constitui um mecanismo fisiológico de proteção que possibilita a detecção de estímulos físicos e químicos nocivos. O fenômeno doloroso é complexo e multifatorial, envolvendo processos sensoriais periféricos e centrais, bem como a interação com elementos afetivos, cognitivo-comportamentais e socioculturais. Com certeza, você, aluno, sabe muito bem o que queremos dizer com esse parágrafo anterior. Vamos entendê-lo melhor. 5.2 Epidemiologia da dor 5.2.1 Dor aguda Estudos epidemiológicos relacionados à dor aguda são de difícil execução, uma vez que esse sintoma está presente em uma grande variedade de situações clínicas. No entanto, algumas etiologias específicas têm sido estudadas com maior frequência, tal como a dor aguda pós-operatória, já que esse tipo de dor continua apresentando valores elevados de incidência em todo o mundo, e seu controle segue como uma meta crucial na melhora da qualidade da assistência nos sistemas de saúde. As cirurgias 55 ELETROTERAPIA ortopédicas, em particular, cursam com uma chance elevada do desenvolvimento de dor no período pós-operatório, correspondendo à metade dos pacientes submetidos a artroplastia total de joelho, que, por exemplo, evoluem com dor de forte intensidade imediatamente após a cirurgia. Nos Estados Unidos, foi descrita uma incidência superior a 80% de dor aguda pós-cirúrgica, sendo que menos de 50% desses pacientes receberam tratamento adequado. A dor pélvica crônica que sucede uma cirurgia abdominal ou do trato genital foi estimada em 20-40% das pacientes do sexo feminino. Há também outras doenças que também apresentam grande potencial para desenvolverem quadros de dor aguda de difícil tratamento, tais como a crise dolorosa de anemia falciforme, politraumatismos e a dor lombar aguda. Dados americanos mostram que nos serviços de emergência a dor é motivo de 78% dos atendimentos. O tratamento inadequado da dor aguda tem como consequência aumento do tempo de internação, maior incidência de complicações respiratórias e cardiovasculares, limitação na reabilitação dos pacientes, desarranjos psíquicos (ansiedade, medo da dor e depressão), bem como o aumento no risco do desenvolvimento de dor crônica. Apesar disso, pacientes com dor aguda permanecem não recebendo avaliação e tratamento abrangente, integrativo e baseado em evidências. No Brasil, não há dados concretos em relação à porcentagem de pessoas que apresentam dor aguda, porém, estima-se que há uma grande porcentagem da população que não recebe tratamento adequado para tratamento da dor. A dor aguda é uma resposta fisiológica ao estímulo nocivo, sendo definida por se apresentar um início recente e de provável curta duração, e geralmente tem uma relação temporal e causal facilmente identificada com uma lesão ou doença. Em relação à caracterização de tempo, é definida por ter duração menor que três meses, e sabe-se que a dor aguda, quando não tratada adequadamente, pode se tornar uma dor crônica. Importante salientar que essa experiência dolorosa aguda é resultado da interação de fatores biológicos, psicológicos, ambientais e sociais. Esse tipo de dor primordialmente nociceptiva (aquela que resulta da ativação de nociceptores – receptores de estímulos nocivos, presentes nas terminações nervosas), mediante dano real ou potencial de um tecido não neural, caracteriza-se por ser autolimitada, facilmente localizada, possuir etiologia definida, e que se traduz como sinal de alerta de um dano iminente ou existente. Em geral, o manuseio da dor aguda é um tema desafiador, pois tem alta prevalência e também por ser um fator que gera impacto no cotidiano de médicos e fisioterapeutas. Nos serviços de pronto atendimento é uma queixa frequente, em mais de 60% dos casos. Além disso, é a principal causa de readmissão hospitalar após procedimentos cirúrgicos. Deve-se destacar a importância da abordagem multidisciplinar integrada para o tratamento da dor, que também considera preferências e experiências prévias vividas pelo paciente. A dor também pode surgir por atividade gerada no sistema nervoso sem a estimulação adequada de suas terminações sensoriais periféricas. Para esse tipo de dor, a Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP) introduziu o termo “dor neuropática”, definida como a dor iniciada ou causada por uma 56 Unidade II lesão primária ou disfunção no sistema nervoso. Esse tipo de dor é decorrente de uma lesão total ou parcial de qualquer parte do sistema nervoso periférico (nervo, plexo ou raiz) ou do sistema nervoso central (medula ou encéfalo). Suas manifestações clínicas podem ser superficiais ou profundas, e são descritas por sintomas de dor contínua (ex.: dor em queimação) ou intermitente (ex.: em pontada, em choque ou em agulhada). O tratamento da dor neuropática é diferente do que ocorre na dor nociceptiva, pois a melhora com analgésicos comuns é deficiente, e os melhores resultados no tratamento correspondem às medicações coadjuvantes, como os antidepressivos e os anticonvulsivantes, sendo um tipo de dor de difícil tratamento. Apesar de apresentar mecanismos universais, a dor é uma experiência única e subjetiva para cada indivíduo, não dependendo apenas da natureza e da intensidade do estímulo sofrido, sendo também influenciada por fatores psicossociais e neurossensitivos. Você já deve ter percebido que as pessoas “sentem” e “demonstram” as dores de formas diferentes. A dor sofre uma modulação (controle) no sistema nervoso central e da interação entre os estímulos nociceptivos e fatores moduladores, o que resulta na experiência de sensação da dor. A qualidade e a quantidade da dor dependem do entendimento da situação geradora da dor, das experiências anteriores pessoais com o ativador álgico, cultura, crenças, ansiedade e capacidade da pessoa em se abstrair das sensações nóxicas e dos sentimentos de controle da dor. Dessa forma, são os componentes emocionais da dor que influenciarão na qualidade do resultado do tratamento. Veja que interessante: Percepção da dor Projeções talamocorticais Modulação Transmissão Transdução Aferentes primários Estímulo nociceptivo Figura 19 – Mecanismo de dor 57 ELETROTERAPIA Lembrete Na prática clínica, ao tratar a dor, sempre devemos fazer a avaliação da dor antes e após o tratamento utilizado. Dessa forma, é possível avaliar o nível de dor do paciente, bem como a resposta terapêuticaapós a intervenção utilizada. 5.2.2 Instrumentos de avaliação da dor Com o objetivo de compreender melhor a sintomatologia dos pacientes, algumas escalas unidimensionais foram desenvolvidas e adotadas na prática clínica devido à sua praticidade e confiabilidade de aplicação. Entre as escalas criadas para avaliar a experiência dolorosa, a escala visual numérica (EVN) e a escala visual analógica (EVA), além da escala de faces Wong-Baker, são as mais utilizadas. A EVN consiste em uma linha reta numerada de zero a dez, em que maiores pontuações indicam uma maior intensidade da dor. A EVA apresenta uma linha reta sem numeração, em que em suas extremidades são marcadas com as expressões “sem dor” e “máxima dor”, e o indivíduo assinala seu grau de dor na linha. Já na escala de faces Wong-Baker, imagens de faces com diferentes expressões são expostas, para que o paciente escolha a que melhor condiz com sua dor, sendo muito utilizada para a avaliação álgica em crianças ou pacientes com alterações de comunicação. 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 0 2 4 6 8 101 Sem dor Sem dor Sem dor Escala visual analógica (EVA) Escala qualitativa Escala de faces Escala numérica Dor ligeira Dor moderada Dor intensa Dor máxima Dor máxima Dor insuportável 3 5 7 9 0 2 41 3 5 Figura 20 – Escalas mais utilizadas para avaliação da dor 58 Unidade II Observação É importante lembrar que a dor é sempre multifatorial e, dessa forma, o terapeuta deve avaliar sempre todos os aspectos que podem estar relacionados à dor para o seu tratamento adequado. 5.2.3 Dor crônica Vamos falar agora sobre a dor crônica, sintoma muito presente nos pacientes. A dor crônica (DC) é um problema grave de saúde pública com grandes implicações socioeconômicas para a sociedade. Estima-se que a prevalência na população geral de dor crônica varie de 12% a 80%. Quadros de dor com características neuropáticas (dor relacionada a lesões neurológicas) estão presentes em 7% a 8% da população geral, o que corresponde a cerca de um terço da população com dores crônicas. Variações na prevalência estimada de dor crônica podem ser atribuídas à falta de homogeneidade na sua definição, tipos de população estudada e forma metodológica da pesquisa. Em um estudo epidemiológico realizado anteriormente, com a participação de 15 países, foram entrevistados um total de 46.394 pessoas em toda Europa (BOUHASSIRA et al., 2008; TORRENCE et al., 2006; JOHANNES et al., 2010; BREIVIK et al., 2006). A prevalência média de dor crônica para toda a Europa foi de 19%, sendo mais alta na Noruega, Polônia e Itália, e menor na Espanha, Irlanda e Reino Unido. Nesse estudo, as mulheres referiram mais dor do que os homens. A dor foi mais prevalente entre 41-60 anos. Somente 12% dos respondentes sofriam de dor crônica a menos de dois anos, quase 60% apresentavam dor entre 2 a 15 anos e muitos reportaram dor com duração maior do que 20 anos (21%). Uma em cada cinco pessoas tinha dor de cabeça e em membros inferiores. A dor foi intensa em 34% das pessoas, sendo que 31% não toleravam mais a dor. Somente 25% foram ao especialista em dor (BOUHASSIRA et al., 2008; TORRENCE et al., 2006; JOHANNES et al., 2010; BREIVIK et al., 2006). Em relação ao tipo de medicamento utilizado para o tratamento da dor, a maioria, 55%, utilizava anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), 43% usavam analgésicos, sendo que 13% eram opioides. Em relação à satisfação com o tratamento, 40% estavam insatisfeitos com o tratamento recebido (BOUHASSIRA et al., 2008; TORRENCE et al., 2006; JOHANNES et al., 2010; BREIVIK et al., 2006). Apesar da importância desse tema, no Brasil, poucos estudos foram realizados sobre a prevalência de dor crônica. A prevalência de dor crônica foi estimada em 42% em um estudo realizado na cidade de São Luís no Maranhão, valor maior que o encontrado em estimativas mundiais descritas anteriormente. Entre esses pacientes, 10% apresentaram dor com características de dor neuropática. O aumento da idade foi um forte fator associado, observando-se que a prevalência de dor crônica aumentou nos indivíduos mais velhos. O tempo de duração da dor nesse estudo variou de 6 meses a 4 anos, sendo descrita predominantemente como diária. A intensidade dolorosa e o tempo de dor foram maiores nas pessoas que tinham dor crônica com característica neuropática, que representaram 10% dos pacientes. Houve predominância da dor em membros inferiores nessa população (51%), e grande parte da população 59 ELETROTERAPIA ainda não sabia a causa (50,89%). Os medicamentos mais utilizados para o tratamento da dor crônica nesse estudo foram analgésicos e AINEs (DELLAROZA; PIMENTA; MATSUO, 2007; SA et al., 2009; SOUZA et al., 2017; SOUZA; PERISSINOTTI, 2018). Um estudo populacional, feito por meio de contato telefônico, que incluiu 723 pessoas oriundas de diversos estados do Brasil, registrou que 39% dos entrevistados referiram quadro de dor com duração superior a seis meses. As mulheres são mais afetadas, correspondendo a 56% dos pacientes com dor crônica. Em um estudo subsequente, que utilizou dados desse mesmo grupo de pacientes, a prevalência de fibromialgia no Brasil foi estimada em 2% da população geral (SOUZA et al., 2017). O reconhecimento da dor crônica como doença foi debatido e negligenciado durante anos, apesar do impacto socioeconômico tanto nos serviços de saúde como na população mundial. Sua importância como doença é demonstrada em estudos epidemiológicos, uma vez que causa prejuízos na qualidade de vida e também representa fator de risco para outras doenças, entre elas, depressão e ansiedade, independente de mortalidade. Trata-se de um sintoma frequente, na maioria das vezes não tratado adequadamente, apesar do tratamento da dor ser direito humano fundamental a todos. Com tudo isso, você já deve imaginar que a dor crônica apresenta grande impacto para indivíduo, familiares, empregador, sistemas de saúde e sociedade de um modo geral, já que representa grande custo pessoal e social, importante causa de absenteísmo no trabalho e impacto socioeconômico. A dor representa a principal causa de procura por atendimento médico, bem como a principal queixa no pronto atendimento e na prática farmacêutica. Apesar da definição da DC ser temporal (geralmente acima de 3-6 meses), para a maioria dos pacientes, o maior problema não é o tempo de duração da dor, mas, sim, as perdas associadas a ela: perda de função, de identidade, da saúde mental (ansiedade, depressão), de relacionamento familiar, de qualidade de sono, da vida profissional e, consequentemente, prejuízo à qualidade de vida. É difícil precisar a incidência da DC, já que os pacientes com frequência não se lembram quando os sintomas iniciaram e procuram atendimento médico quando a dor está presente há algum tempo. Uma pesquisa telefônica realizada em 15 países da Europa e em Israel revelou que 20% das pessoas sofrem de DC com duração igual ou superior a 6 meses, com pelo menos 2 episódios por semana e intensidade maior ou igual a 5 em uma escala de 1 a 10 (BREIVIK et al., 2006). Segundo esse estudo, os locais mais frequentes de dor relatados pelos pacientes são, geralmente: • região lombar: 18%; • cabeça: 15%; • joelhos: 14%; • membros inferiores: 14%; • seguidos pelos ombros: 9%; coluna cervical e quadril: 8%; mão: 6%; e coluna dorsal: 5%. 60 Unidade II As etiologias (causas) mais comuns são: • osteoartrite: 34%; • compressões radiculares: 15%; • traumatismos: 12%; • poliartrite: 8%; • cefaleias e migrâneas (cefaleia primária episódica e crônica): 7%; • fraturas e degeneração da coluna vertebral: 6%; • lesão de nervo ou cartilagem: 4%; • síndrome do chicote: 4%; • cirurgias: 3%. A pesquisa também mostrou a importância da DC na qualidade de vida: 56% das pessoas referiram alteração do sono, sendo que 9% não dormiam mais. Um quarto dos participantes relataram a influência da dor em sua vida profissional, e os que continuavam trabalhando apresentavamabsenteísmo de 7 a 8 dias nos últimos 6 meses. É importante ressaltar que menos de 2% dos portadores de DC haviam consultado um especialista. Em relação ao sexo, a prevalência da DC é maior no sexo feminino. Deve-se salientar que alguns fatores de risco aumentam a chance do desenvolvimento de DC após um episódio de dor aguda: • idade mais avançada, gênero feminino, predisposições genéticas; • baixo nível socioeconômico e tipo de trabalho; • localização geográfica e cultura regional; • antecedentes de estresse psicológico; • lesão tecidual cirúrgica; • depressão, tendência a ansiedade e preocupação exagerada (catastrofização); • estilo de vida: sedentarismo, dieta inapropriada e obesidade; • portadores de outras patologias crônicas; • hiperalgesia (diminuição do limiar de dor) induzida por opioides e endocrinopatias. 61 ELETROTERAPIA Os fatores de risco não podem ser alterados. Porém, uma abordagem ideal no tratamento de um episódio doloroso agudo, principalmente em pacientes pertencentes a esses grupos, parece evitar a cronificação da dor aguda. Observação No Brasil, há poucos estudos sobre prevalência e incidência da dor crônica. No entanto, segundo o PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), a dor lombar crônica apresenta-se como uma das principais queixas da população brasileira (IBGE, s.d.). 5.3 Impactos da dor crônica Para pacientes com dor crônica, com os quais nos deparamos muito na prática clínica, o sintoma da dor é apenas uma das muitas facetas de um quadro mais complexo. As alterações de humor e os distúrbios cognitivos são comuns e resultam em piora na qualidade de vida e em baixa taxa de resposta aos tratamentos empregados. Em 150 pacientes avaliados num centro de dor multidisciplinar dinamarquês com dor crônica não oncológica, a qualidade de vida e o humor foram significativamente afetados em relação à população geral. Além disso, 58% dos pacientes apresentaram escores indicando depressão ou ansiedade, que são transtornos que têm se mostrado comumente associados à presença ou curso clínico da dor crônica. Pesquisas anteriores mostraram que indivíduos com dor crônica na população geral são mais propensos a ter um transtorno psicológico ou psiquiátrico (BECKER et al., 2000; OHAYON, 2004). Estudos de ressonância magnética estrutural (RME) em vários pacientes com diferentes tipos de dores crônicas mostram que os cérebros desses indivíduos diferem daqueles sem dor. A anormalidade mais pronunciada observada em todos os estudos é a redução da substância cinzenta nos pacientes, mais consistentemente no córtex pré-frontal, na ínsula e nos córtices cingulados anterior e médio. Essas são regiões cerebrais implicadas no processamento e na regulação da dor, regulação do humor e cognição. Estudos que examinaram essa relação descobriram que a matéria cinzenta diminui em doentes com dor crônica de acordo com a duração dos sintomas de dor, sugerindo que a dor prolongada pode contribuir para a redução da substância cinzenta. Há também alguma evidência de que a magnitude da disfunção cognitiva em pacientes com dor crônica se correlaciona com a redução da substância cinzenta nos córtices frontal e cingulado, regiões importantes para a memória e atenção (BUSHNELL; CEKO; LOW, 2013; GEHA et al., 2008). A dor crônica é uma das mais incapacitantes e com maior custo da América do Norte, Europa e Austrália. Estudos mostram que os fatores associados com maior prevalência de dor crônica são o sexo feminino, aumento da idade, baixo nível socioeconômico e baixa escolaridade (BLYTH et al., 2001; CURROW et al., 2010; SJOGREN et al., 2009). Uma revisão de quinze estudos epidemiológicos sobre a prevalência da dor crônica na população adulta mostrou que as regiões mais acometidas são cefálica, lombar e membros inferiores (WONG; FIELD, 2011). Nos Estados Unidos, uma média de 5,2 horas/semana de tempo produtivo foi perdida devido à dor musculoesquelética, e indivíduos com dor no trabalho perderam 101,8 milhões de dias úteis devido à dor nas costas. Um outro estudo revelou que o impacto total estimado da dor crônica entre 2.459 62 Unidade II funcionários foi de mais de quatro mil dólares por empregado por ano para cuidados relacionados com dor, incluindo os custos médicos e de farmácia. Verificou-se que 234 indivíduos perderam trabalho ou tarefas domésticas em pelo menos um dia por ano devido à dor, e a duração média de ausência do trabalho pelo mesmo motivo foi de 9,6 dias. Além disso, 55 desses indivíduos estavam ausentes do seu trabalho por mais de uma semana. Quando se avalia a perda de oportunidades de trabalho, são levados também em conta a diminuição da capacidade de trabalho e o ônus de cuidar das famílias. Assim, o aumento dos custos socioeconômicos devido à DC provavelmente será muito maior (PIZZI et al., 2005). Saiba mais Você pode se aprofundar nesse assunto com a seguinte publicação: KOBAYASHI, R.; LUZO, M. V. M.; COHEN, M. (coord.). Tratado de dor musculoesquelética. Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (SBOT). São Paulo: Alef, 2019. 5.3.1 Dor crônica na função física e atividades diárias Como já pôde conceber, a dor interfere em diversas funções orgânicas, levando ao sofrimento pelo aumento gradativo das incapacidades físicas. Diversos estudos relacionam a DC com diminuição da atividade física. Intensidade, duração e localização da dor têm papel decisivo na atividade física, levando a sua diminuição e determinando limitações físicas que afetam a vida diária. Os pacientes portadores de DC frequentemente não têm consciência do seu nível de atividade física, uma vez que os parâmetros objetivos e subjetivos diferem. Se o paciente superestimar seu nível de atividade, ele pode considerá-la suficiente e, portanto, não ter intenção nem motivação de mudar seu comportamento. Como a intenção e a motivação de mudar são os pontos principais para a mudança comportamental de acordo com modelos teóricos, é importante conscientizar os pacientes do seu comportamento para que eles adotem um estilo de vida mais saudável, tornando-se mais ativos e diminuindo as limitações causadas pela dor. E isso pode e deve ser feito pelos fisioterapeutas. 5.3.2 Dor crônica na qualidade de vida A qualidade de vida, tanto mental como física, é outra consequência negativa da dor. Diferentes estudos mostram que portadores de fibromialgia, artrite reumatoide ou dor lombar crônica apresentam importante comprometimento na qualidade de vida, de acordo com o questionário Qualidade de Vida Relacionada à Saúde (HRQoL). O escore total do HRQoL é bem mais baixo em pacientes portadores de DC do que nos de dor aguda ou nos que não apresentam dor; e quanto mais intensa a dor, pior o escore (DUENAS et al., 2016; COLLADO; GOMEZ; COSCOLLA, 2014). 63 ELETROTERAPIA 5.3.3 Dor crônica e sono Alterações do sono são frequentes em portadores de DC. Essas alterações podem aumentar o nível de estresse, além de prejudicar a parte cognitiva, afetando atividades no trabalho e em casa. Os estudos demonstram que uma noite com alterações do sono é seguida de um dia com dor mais intensa, assim como um dia de dor mais intensa é seguido de um sono de pior qualidade. Esses achados mostram a importância do diagnóstico do distúrbio do sono e do tratamento adequado (DUENAS et al., 2016; COLLADO; GOMEZ; COSCOLLA, 2014). 5.3.4 Dor crônica nas atividades laborais Estudos mostram que a dor é responsável por grande aumento do absenteísmo, necessidade da mudança de função e desemprego. Na Espanha, 24,4% dos indivíduos com DC pediram licença médica no ano anterior, e 12% saíram ou foram dispensados de seu emprego. Os trabalhadores que mantiveram a atividade de trabalho apesar da dor apresentaram redução na produtividade de 21,5% nos casos de dor leve, 26% nos casos de dor moderada e 42,9% nos casos de dor severa (e nesse caso as porcentagens foram progressivamente maiores) (COLLADO; GOMEZ; COSCOLLA, 2014). Entre as causas mais comuns de absenteísmo,a dor lombar seguida de dores reumáticas está em primeiro lugar. A dor neuropática e a fibromialgia também afetam consideravelmente a atividade no trabalho e aumentam o absenteísmo. 5.3.5 Dor crônica na vida social e familiar A dor crônica afeta a vida social e as atividades de lazer do indivíduo. Pelo menos metade dos pacientes com dor crônica refere ausência em atividades de lazer, eventos sociais e familiares. Estudos em portadores de fibromialgia e osteoartrite demonstraram que tanto a dor como problemas físicos e emocionais tiveram impacto significante na vida social. As emoções negativas, a irritabilidade e a raiva apresentam um impacto negativo nas relações interpessoais e causam estresse nas relações familiares. A vida profissional, social e diária dos familiares também acaba sendo afetada. Admite-se que algumas regiões cerebrais que fazem parte da matriz dolorosa estejam implicadas nesse processo (amígdala, ínsula e córtex cingulado anterior). 5.4 Fisiopatologia da dor crônica Atualmente, acredita-se que a DC ocorre por um processo patológico de reorganização do sistema nervoso. Diversos fatores estão implicados nessa gênese, entre eles a predisposição genética e os mecanismos de sensibilização central e periférica. Fenômenos de sensibilização periférica e central são a base da fisiopatologia da DC. O conhecimento da fisiopatologia, dos conceitos de sensibilização central e periférica, bem como da modulação da dor, é essencial para a compreensão, a avaliação e o tratamento da DC. Por ser uma doença multifatorial, esses conhecimentos são necessários para uma abordagem terapêutica multidimensional. 64 Unidade II 5.5 Sensibilização periférica Após a lesão tecidual, as células liberam diversas substâncias inflamatórias (prostaglandinas, ATP/ADP, serotonina, bradicinina, fator de crescimento neuronal, entre outras) que constituem a chamada “sopa inflamatória”. Essas substâncias estimulam os nociceptores das fibras C e A-delta, que transformam esse estímulo em potencial elétrico. Essa “sopa” induz a modificação de diferentes nociceptores. O influxo elétrico segue em direção ao sistema nervoso central (SNC), mas também retorna para a periferia (refluxo axônico antidrômico) liberando substância P e o peptídeo ligado ao gene da calcitonina (CGRP), que são responsáveis por induzir alterações gênicas e também no nível do gânglio espinal, que a longo prazo modificam a resposta às fibras aferentes (nociplasticidade). A expressão dos canais de sódio é aumentada e a dos canais de potássio é diminuída. Os canais de sódio próximos à lesão participam da excitabilidade periférica. Já a atividade ectópica nos nervos lesados e nos íntegros adjacentes contribui para a sensibilização central. 5.6 Sensibilização central Com a manutenção do estímulo nociceptivo, os receptores N-Metil D-Aspartato (NMDA), que normalmente estão bloqueados pelo íon magnésio, são ativados e então permitem a entrada de cálcio no neurônio pós-sináptico. Outros neurotransmissores e fatores tróficos são liberados, mantendo uma resposta mais intensa e mais prolongada. Ocorre também aumento do número de receptores. Em seguida, inicia-se a expressão de novos genes que atuam tanto no nível pré como pós-sináptico. As primeiras alterações ocorrem em segundos e duram alguns minutos. As reações que se seguem podem aparecer após alguns dias e persistir por longo período. A irreversibilidade de alguns mecanismos de sensibilização se devem à morte neuronal (apoptose) dos neurônios inibitórios do corno posterior da medula espinal, facilitando a transmissão do sinal nociceptivo. De modo menos definitivo, os interneurônios inibidores gabaérgicos ou glicinérgicos podem ser modulados, exercendo um efeito menos evidente, podendo até desenvolver uma ação excitatória em decorrência dos níveis iônicos a que ficam expostos. O conceito de perda da inibição central constitui um alvo terapêutico interessante e que deve ser abordado nas doenças crônicas. Paralelamente a essas alterações, ocorre também a ativação dos astrócitos da micróglia, que correspondem aos monócitos e macrófagos no SNC. Lesões nervosas, mesmo que periféricas, levam a alterações morfológicas da micróglia e também das suas propriedades e expressão gênica. As células modificadas secretam mediadores inflamatórios (fator neurotrófico derivado do cérebro) que transformam os neurônios gabaérgicos inibitórios em excitatórios. A sensibilização central é responsável pelo aumento da excitabilidade da sinapse, o que se traduz na prática clínica pela alodínea e pela hiperalgesia. Observação Em um estado sensibilizado, seus nervos estão dizendo ao seu cérebro que há mais perigo para os tecidos do que realmente existe. 65 ELETROTERAPIA Intensidade da dor para o estímulo X: resposta de dor normal Resposta de dor normal X Lesão Intensidade do estímulo In te ns id ad e da d or Resposta de dor sensibilzadaIntensidade da dor para o estímulo X: resposta de dor sensibilzada Figura 21 – Mecanismos de alodínea e hiperalgesia Saiba mais Para conhecer um pouco mais sobre a dor lombar, leia este artigo: NIJS, J. et al. Low back pain: guidelines for the clinical classification of predominant neuropathic, nociceptive, or central sensitization pain. Pain Physician, v. 18, n. 3, p. E333-346, maio-jun. 2015. 5.7 Dor aguda versus dor crônica Agora que já falamos separadamente sobre a dor aguda e a dor crônica, vamos pensar um pouco sobre as duas. A dor aguda tem início recente e é mais comumente associada a uma lesão específica. Indica que o dano ou lesão já ocorreu. Consiste em uma resposta fisiológica, normal e previsível aos estímulos lesivos, sendo habitualmente um início súbito, com reversão total do fenômeno após a interrupção do estímulo, e que invoca um comportamento de autopreservação contra uma lesão atual ou potencial. Constitui um sintoma que pode estar associado a trauma, cirurgia ou alguma doença, e é considerado um sinal de alerta para o indivíduo. Já a dor crônica é uma dor constante ou intermitente que persiste por certo período de tempo e não pode ser atribuída a uma causa específica. A dor crônica não representa somente um sintoma, mas caracteriza-se por um estado patológico bem definido, isto é, uma alteração do sistema somatossensitivo que persiste além da solução do processo etiológico dela. Ainda não há um critério definido para o tempo de início da dor crônica. Alguns estudos utilizam como critério para dor crônica uma dor com 66 Unidade II duração acima de três meses e outros definem a partir de seis meses de duração. Do ponto de vista fisiopatológico, a dor crônica pode ser nociceptiva, neuropática ou nociplástica. A dor crônica por nocicepção ocorre pela ativação de terminações nervosas livres de fibras A-delta e C, denominados nociceptores. Esses receptores apresentam limiar de excitação alto e são responsáveis pela transdução do dano tecidual em impulsos nervosos, que são transmitidos para a medula espinal e para os centros supraespinais. É produzida pela atividade neural normal em resposta a estímulos causadores de dano tecidual. A dor neuropática é causada por lesão ou doença que afeta o sistema somatossensitivo, podendo ser periférica ou central. A dor neuropática tem difícil diagnóstico devido às condições clínicas associadas a uma grande variedade de lesões nervosas centrais ou periféricas, e também diferentes formas de manifestação da dor. A sensação dolorosa pode ocorrer após um estímulo não doloroso (alodinia) e resposta inadequada (hiperalgesia). Grande parte se torna crônica e incapacitante, e está entre as mais desafiadoras em relação ao tratamento. Consequentemente, a dor neuropática está associada com uma baixa qualidade de vida, e até mesmo doenças psiquiátricas. Recentemente, foi cunhado o termo “nociplástica” para os casos em que há uma alteração da nocicepção percebida como dor, mesmo na ausência de estimulação dos nociceptores por lesão tecidual atualou potencial, ou de doença que esteja afetando o sistema somatossensitivo. A dor mista é causada por uma combinação de fatores da dor nociceptiva e neuropática, ou nociceptiva e nociplástica. Quadro 1 – Características da dor aguda × dor crônica Propriedades Dor aguda Dor crônica Receptores aferentes Terminações nervosas livres – fibras A-delta (grupo III) Terminações nervosas livres – fibras C (grupo IV) Velocidade de condução do potencial de ação Relativamente lenta: 5-30 m/s Muito lenta: 0,5-2 m/s Sensação subjetiva Latência curta, surgimento rápido Latência longa, surgimento lento Localização Bem localizada, facilmente identificada Má localizada, difusa Duração da sensação Curta duração Longa duração Resposta subjetiva Retirada reflexa, menos envolvimento emocional Difícil suportar, possível resposta emocional e automática 5.8 Educação em neurociência da dor A educação da dor é uma abordagem de tratamento dentro do modelo biopsicossocial fundamentada nas teorias de mudanças conceituais e do modelo instrucional. É biologicamente plausível e consiste em uma série de intervenções educacionais visando ajudar os pacientes a entender a dor como um sinalizador e necessária para proteger os tecidos do corpo. Além disso, mostrar que a dor pode ser modulada (controlada) por crenças é um conceito fundamental para a dor como fenômeno biopsicossocial. A proposta que se segue é a de que a dor pode ser melhorada através da modificação 67 ELETROTERAPIA das crenças errôneas, o que pode diminuir a catastrofização e reduzir a incapacidade relacionada à dor crônica, incluindo a cinesiofobia (medo de movimento). O modelo biopsicossocial da dor inclui tanto a pessoa quanto a doença no processo de raciocínio do profissional de saúde. A origem desse modelo reside na consciência de que um modelo puramente biomédico não atende às necessidades dos cuidados de saúde contemporâneos, especificamente porque a saúde atualmente enfrenta uma transição demográfica e epidemiológica importante. Fatores psicossociais (uma combinação do status cognitivo, emocional e social de um indivíduo) podem influenciar o estado de saúde, e a percepção/expressão da dor incluem: • crenças dos pacientes de que a dor e a atividade são prejudiciais; • atitudes disfuncionais e comportamentos negativos derivados dessas crenças; • tipo de personalidade (tendência a ansiedade, depressão, traços obsessivos, histéricos e hipocondríacos); • estratégias passivas de enfrentamento; • fé e crenças religiosas; • falta de apoio familiar e/ou famílias superprotetoras. Bio Social Psico Fatores biológicos: anatômicos, fisiológicos, anatomopatógicos e biomecânicos Fatores psicológicos: pensamentos, emoções, comportamentos (evitação pelo medo) Fatores sociais: família, trabalho, cultura, religião Figura 22 – Modelo biopisicossocial da dor Saiba mais Para saber um pouco mais sobre esse assunto, acesse: https://www.retrainpain.org 68 Unidade II O enfrentamento da dor visa reduzir o valor de ameaça vindas dos estímulos e das emoções associadas e reduz também o valor de ameaça da suposta alteração biológica. Enfrentar de forma ativa a dor e muitos outros problemas de saúde (e de vida) é melhor do que lidar de forma passiva com essas adversidades. Dessa forma, podemos trabalhar com algumas ferramentas para enfrentamento da dor: • ferramenta 1: educação, para entender a dor; • ferramenta 2: saber que a dor não vai te prejudicar; • ferramenta 3: exposição gradual e pacing (no sentido de “encontrar um ritmo ideal para as atividades”, evitando padrões de declínio gradual ou de excesso/recesso); • ferramenta 4: acessar seu corpo virtual. 5.8.1 Educação e compreensão Pessoas sem qualquer formação na área de saúde podem entender a fisiologia da dor (apesar de alguns profissionais de saúde pensarem que não). Aprender sobre a neurociência da dor reduz o valor ameaça de dor. A redução da ameaça diminui a ativação dos nossos sistemas de proteção: simpático, endócrino e motor, e isso ajuda a restaurar função imune normal. Combinar educação em neurociência da dor com a prática gradual de exercícios pode reduzir a dor, aumentar sua capacidade física e melhorar sua qualidade de vida. • Educação da dor na dor musculoesquelética: — melhora o conhecimento que o paciente tem sobre sua dor; — diminui a dor; — diminui a catastrofização e a percepção da deficiência; — melhora o movimento, o desempenho físico e a função e reduz a deficiência; — atenua os fatores psicossociais; — reduz a utilização da rede de cuidados de saúde. 69 ELETROTERAPIA Saiba mais Leia mais informações sobre a dor em: HELP… WHY do i still hurt? Cor-Kinetic Envolving Movement, [s.d.]. Disponível em: http://cor-kinetic.com/help-why-do-i-still-hurt/. Acesso em: 17 nov. 2020. • Cinco diretrizes para a eficácia da educação da dor: — É necessária a interação com um terapeuta para a obtenção de efeitos clinicamente significativos sobre a dor. — Somente os pacientes insatisfeitos com suas percepções atuais sobre a dor estarão dispostos a reconceituá-la. — A nova explicação deve ser inteligível para o paciente. — A nova explicação deve parecer plausível e benéfica para o paciente. — Os novos conceitos devem ser compartilhados no ambiente direto do paciente (familiares, amigos etc.). Saiba mais Grande parte dos profissionais da área da saúde possuem um baixo conhecimento sobre dor. Leia o livro proposto, aprimore seu conhecimento sobre esse sintoma e melhore sua forma de lidar com essa questão junto aos pacientes: BUTTLER, D. S.; MOSELEY, G. L. Explicando a dor. Austrália: Noigroup Publications, 2009. 6 ESTIMULAÇÃO ELÉTRICA NERVOSA TRANSCUTÂNEA (TENS) Já que discutimos bastante, e esperamos que tenham entendido sobre a dor, vamos pensar em alguns recursos que temos, como profissionais da área, para o alívio dessa dor. 70 Unidade II 6.1 Definição A estimulação elétrica nervosa transcutânea (TENS) é definida pela American Physical Therapy Association como a aplicação de estimulação elétrica através da pele para controle da dor. TENS é não invasiva, barata, segura e fácil de usar. A eletricidade tem sido usada por milhares de anos para o alívio da dor, como descrito no primeiro escrito documentado por Aristóteles. Em meados de 1800 e no início de 1900, vários médicos e dentistas relataram o uso de eletricidade como um analgésico e anestésico. No entanto, a estimulação elétrica para o alívio da dor não foi totalmente aceita pela área médica até a publicação por Wall e Sweet em 1967 em resposta à Teoria das Comportas. Wall e Sweet demonstraram que a estimulação com uma frequência alta (100 Hz) ativava grandes fibras aferentes, reduzindo a dor neuropática nos pacientes. Embora usada clinicamente por mais de 30 anos, os mecanismos pelos quais a TENS produz alívio da dor não eram conhecidos. Atualmente, há diversas teorias que apoiam seu uso, incluindo a Teoria das Comportas da Dor e a liberação de opioides endógenos como as mais aceitas. A estimulação por TENS é amplamente utilizada na atualidade no tratamento de doenças agudas e também nas condições de dores crônicas. A estimulação elétrica transcutânea (TENS), desde sua introdução em 1967, tem sido utilizada amplamente como modalidade terapêutica para o alívio da dor, sendo que o mecanismo exato da neuromodulação (controle da dor) ainda não está totalmente esclarecido. Na década de 1960, com a descrição da Teoria da Comportas da Dor, combinada com geradores eletrostáticos e condensadores, a eletroterapia vem sendo utilizada como método de tratamento. A divulgação da Teoria da Comporta do Controle da Dor, juntamente com o aumento na frequência de dores crônicas na população mundial, transformaram os aparelhos de TENS como um dos recursos mais utilizados na prática da fisioterapia. Embora a maioria dos estimuladores elétricos usados hoje seja essencialmente unidades TENS, esses equipamentos têm características de corrente muitoparecidas com outras formas de estimulação neuromuscular. Eles são constituídos de geradores de correntes pulsáteis, bifásicas simétricas ou assimétricas de forma retangular. A TENS corresponde à aplicação de correntes elétricas pulsadas de forma transcutânea (através da pele) para estimular nervos periféricos intactos, principalmente com o objetivo de alívio da dor. No entanto, é também usada no atendimento paliativo para lidar com a dor causada por doença óssea metastática e neoplasias. Há também algumas evidências demonstrando que essa terapia exerça efeitos antieméticos e favoreça a regeneração dos tecidos, embora tenha pouca utilização com esses objetivos. 6.2 Aplicação clínica da TENS Clinicamente, a TENS é aplicada com várias frequências, intensidades e durações de pulso de estimulação. A frequência de estimulação é amplamente classificada como alta frequência (>50Hz), baixa frequência (<10 Hz) ou TENS burst (rajadas de alta estimulação de frequência aplicada em uma frequência muito mais baixa). A intensidade é determinada pela resposta do paciente, sendo aplicados TENS no nível sensorial ou TENS no nível motor. Além disso, alguns terapeutas utilizam a estimulação 71 ELETROTERAPIA abaixo de uma intensidade sensorial, denominada estimulação elétrica por microcorrente, porém, até o momento, não há dados para apoiá-la por estimulação elétrica no alívio da dor. Para aplicação em nível sensorial, a voltagem (ou seja, amplitude) é aumentada até que o paciente sinta um formigamento confortável (percebido com alta frequência) ou sensação de batidas (percebida com baixa frequência) sem contração motora. Essa amplitude é conhecida como baixa intensidade. Já para o nível do motor com TENS, a intensidade é aumentada para produzir uma contração motora. Normalmente, a intensidade é aumentada para o nível máximo antes de se tornar nocivo (doloroso). Esse método é conhecido como TENS de alta intensidade. No geral, a de alta frequência é aplicada em baixas intensidades e é referida como convencional. Em contraste, TENS de baixa frequência é normalmente aplicada em altas intensidades, portanto gerando uma contração motora. Esse modo de estimulação é referido como TENS acupuntura. Na prática clínica, a TENS é administrada utilizando um dispositivo portátil, alimentado por bateria, que gera correntes elétricas que são introduzidas ao tecido através de eletrodos conectados na superfície intacta da pele. TENS é um recurso barato e que também pode ser autoadministrado por pacientes de forma domiciliar, desde que devidamente orientados pelo fisioterapeuta. Lembrete Vale ressaltar que há indicações para utilização da TENS, sendo as principais, para analgesia e relaxamento muscular. Caso o paciente não apresente as indicações para aplicação dessa terapia, deve-se escolher outra modalidade terapêutica. Pulsos monofásicos Pulsos bifásicos simétricos Pulso bifásico assimétrico Pulso bifásico tipo ponta Tempo Co rr en te Figura 23 – Tipos de pulsos utilizados nos equipamentos de TENS 72 Unidade II 6.3 Teorias sobre analgesia por TENS Diversas teorias são utilizadas para apoiar o uso da TENS. A mais popular sobre o mecanismo de ação dessa terapia é a Teoria das Comportas, proposta por Melzack e Wall, em 1965. De acordo com a essa teoria, a estimulação de fibras aferentes de grande diâmetro por TENS (fibras A-beta) inibem as fibras nociceptivas (fibras A-Delta e tipo C) no corno dorsal da medula. A Teoria das Comportas envolve inibição segmentar através de neurônios localizados na substância gelatinosa do corno dorsal da medula espinal. No entanto, a teoria original sugere que podem existir vias inibitórias descendentes e que esses neurônios espinais estão sob influências descendentes. Neurotransmissores específicos ou seus receptores não foram sugeridos na época porque estávamos apenas começando a entender a farmacologia do sistema nervoso. Assim, a Teoria das Comportas pode ser amplamente interpretada. Agora existem dados muito mais detalhados a respeito dos mecanismos de ações da TENS, que incluem vias anatômicas, neurotransmissores e seus receptores, e os tipos de neurônios envolvidos na inibição da dor. Embora haja pouco consenso em relação aos parâmetros necessários para induzir a hipoalgesia, tanto a alta quanto a baixa frequência podem promover diminuição da dor, pelos diferentes receptores opioides ativados: frequências baixas (abaixo de 10 Hz) ativam receptores μ-opioide; e frequências altas (acima de 50 Hz) ativam receptores δ-opioide. Além da sua ampla utilização para promover analgesia em dores agudas e crônicas de diversas origens, a TENS demonstrou sua eficácia nos casos de dor pós-operatória, associada à troca de curativos em feridas, afecções musculoesqueléticas, nos cuidados paliativos para dores decorrentes de neoplasias, entre outras. Por último, a liberação de opioides endógenos tem sido usada para explicar as ações do TENS, particularmente de baixa frequência de estimulação. Dados recentes apoiam essa teoria para a terapia de baixa frequência, bem como para a de alta frequência. Existem três tipos de receptores opioides, que estão localizados perifericamente, na medula espinal e em áreas envolvidas na inibição descendente da dor, incluindo o núcleo rafe magnus no bulbo rostral ventral (RVM) e a substância cinzenta periaquedutal (PAG). A PAG envia projeção para o RVM, que por sua vez envia projeções para o corno dorsal da medula espinal. A estimulação do PAG ou do RVM produzem inibição de neurônios do corno dorsal, incluindo células do trato espinotalâmico. É comumente aceito que a inibição mediada por opioides produz seus efeitos por meio da ativação da via PAG-RVM. Além disso, as vias RVM usam a serotonina como neurotransmissor. Outra via inibitória comum é a partir dos grupos de células noradrenérgicas pontinas, A6 (locus caeruleus) e A7 (locus subcaeruleus). Esses neurônios pontinhos usam o neurotransmissor noradrenalina e ativam dois receptores espinais para produzir inibição dos neurônios no corno dorsal. Dessa forma, vários opioides e seus receptores podem estar envolvidos no alívio da dor por TENS. A via mais provavelmente envolvida com a analgesia opioide origina-se na substância cinzenta periaquedutal (PAG) e envia projeções à região rostral ventral da medula oblonga (RVM), que se projeta sobre a coluna dorsal da medula espinal. A ativação dessas vias inibitórias descendentes produz analgesia opioide, envolve o neurotransmissor serotonina e é responsável pelas ações da morfina aplicada de forma sistêmica. 73 ELETROTERAPIA A depletação da serotonina, um neurotransmissor da via rafe-espinhal, reduz o efeito antinociceptivo da estimulação de alta frequência em animais intactos, mas não nos animais espinhais. Isso sugere que as vias serotoninérgicas descendentes estão envolvidas com a analgesia por TENS. A antinocicepção induzida por estimulação elétrica fica significativamente aumentada pela administração de L-5-hidroxitriptofano, um precursor da serotonina (5-HT), e é abolida pelo bloqueio espinal dos receptores de serotonina com metisergida. A microinjeção de naloxone na RVM em doses que bloqueiam os receptores opioides abole os efeitos anti-hiperalgésicos da TENS de baixa frequência, enquanto que microinjeções de salina ou de naltrindole não têm esse efeito. A anti-hiperalgesia da HF-TENS é bloqueada por microinjeção de naltrindole na RVM, a qual bloqueia receptores opioides, mas não por naloxone ou salina. Dessa forma, a LF-TENS ativa receptores opioides e a HF-TENS ativa receptores opioides, na medula espinal e na RVM. Assim, tanto a TENS de alta quanto de baixa frequência usam mecanismos opioides para reduzir a dor. Fibras de grande calibre Entrada do estímulo Fibras de pequeno calibre T cellSG Sistema de ação Controle central Figura 24 – Diagrama mostrando a Teoria das Comportas Medulares da Dor originalmente descrita por Melzack e Wall, 1965 A célula T (T cell) é um neurônioascendente que poderia ser do trato espinotalâmico, espinorreticular ou trato espinomesencefálico. A substância gelatinosa (SG) é um neurônio (lâmina II) do corno dorsal da medula espinal. Os canais abertos representam as sinapses excitatórias e os canais fechados representam as sinapses inibitórias. A fibra grande representa a entrada de fibras aferentes primárias de grande diâmetro na periferia do sistema nervoso, e a fibra pequena representa a entrada das fibras aferentes primárias nociceptivas na periferia do sistema nervoso. O conceito geral é que as fibras de pequeno diâmetro excitam as células da medula espinal, que enviam informações para centros superiores para a percepção da dor. As fibras de grande diâmetro (não nociceptivas) reduzem a entrada nociva de nociceptores pela ativação de neurônios na substância gelatinosa da medula espinal. 74 Unidade II Saiba mais Um livro bem interessante em que se pode ler sobre os diversos recursos de eletroterapia e aprofundar o conhecimento é: KITCHEN, S. Eletroterapia prática baseada em evidências. 11. ed. Barueri: Manole, 2003. 6.4 Principais indicações da TENS na prática clínica Veremos a seguir as principais indicações e utilizações da TENS na prática clínica. • Alívio da dor aguda: — dor pós-operatória; — dor obstétrica; — dismenorreia (cólica menstrual); — dor musculoesquelética; — fraturas ósseas; — procedimentos dentários. • Alívio da dor crônica: — dor lombar; — artrite; — coto e dor fantasma; — neuralgia pós-herpética; — neuralgia do trigêmeo; — dor cervical; — lesão de nervos periféricos; 75 ELETROTERAPIA — angina pectoris; — dor facial; — dor óssea metastática. • Efeitos não analgésicos da TENS: — efeitos antieméticos: - náusea pós-operatória associada com medicamentos opioides; - náusea associada com quimioterapia; - enjoo matinal; - enjoo por movimento/viagem. — melhora do fluxo sanguíneo: - redução da isquemia devido à cirurgia reconstrutiva; - redução dos sintomas associados com doença de Raynaud e neuropatia diabética; - melhora da regeneração de feridas e úlceras. 6.5 Princípios físicos A TENS é aplicada em diversas frequências, intensidades e durações de pulso. Existe um bom suporte científico de base para os mecanismos de ação tanto da de alta frequência (> 50 Hz), HF-TENS, quanto da de baixa frequência (<10 Hz), LF-TENS. A intensidade é determinada pela resposta do paciente à estimulação: em nível sensorial (baixa intensidade), LI-TENS, ou em nível motor (alta intensidade), HI-TENS. Geralmente, a TENS de alta frequência é aplicada em baixa intensidade e é referida como TENS convencional. Em contraste, a TENS de baixa frequência é tipicamente aplicada em alta intensidade, de tal forma que uma contração muscular é produzida. Na prática clínica, é difícil prever a natureza e a distribuição exata das correntes quando elas passam através de superfície intacta da pele devido à impedância (resistência do tecido à passagem da corrente) complexa e não homogênea do tecido. Contudo, como a pele oferece uma alta impedância para as frequências usadas na TENS, é provável que as correntes permaneçam superficiais estimulando as fibras nervosas cutâneas em vez das fibras nervosas musculares e viscerais localizadas profundamente. Além do mais, diferentes aparelhos de TENS usam diferentes formas de onda nos pulsos. Geralmente, elas podem ser divididas em formas de onda monofásicas e bifásicas. Dispositivos que usam formas de onda bifásicas, com fluxo de corrente total zero, alternarão o cátodo e o ânodo entre os dois eletrodos. 76 Unidade II O fluxo de corrente total zero pode prevenir o acúmulo de concentrações de íons embaixo dos eletrodos, prevenindo reações adversas da pele devido às concentrações nos polos. A introdução de características novas nos aparelhos, tais como amplitude modulada, frequência modulada e duração modulada, possibilita aos fabricantes ganhar uma margem competitiva no mercado, mas raramente tem o respaldo de melhoras comprovadas na efetividade clínica. Infelizmente, a complexidade cada vez maior dos aparelhos de TENS tem levado a uma confusão quanto ao modo mais apropriado de aplicar a TENS. Portanto, é importante resumir os princípios para os tipos principais de TENS. 6.5.1 TENS convencional (de alta frequência) Durante a TENS convencional, as correntes são geralmente emitidas com uma frequência entre 10 Hz e 200 Hz, com duração de 100 μs ou menos de amplitude de pulso dosada para produzir uma parestesia (formigamento) forte, porém confortável. Como as fibras de diâmetro largo têm períodos refratários curtos, elas podem gerar impulsos nervosos com altas frequências. Isso significa que são mais capazes de gerar descargas de impulsos nervosos de alta frequência quando são emitidas correntes de alta frequência. Assim, uma maior quantidade de disparos aferentes é produzida nas fibras nervosas de diâmetro largo quando são usadas altas frequências (10-200 Hz). O padrão de emissão de pulsos é geralmente contínuo, embora a TENS convencional possa também ser conseguida emitindo os pulsos em “disparos” ou “trens” e isso tem sido descrito por alguns autores como TENS pulsada ou burst. É provável que a TENS contínua e a TENS burst produzam efeitos similares quando aplicadas de modo intenso, porém confortável, sem abalos musculares concorrentes. 6.5.2 TENS acupuntura (de baixa frequência) A maioria dos especialistas acredita que a TENS acupuntura deve ser definida como a indução de contrações musculares fásicas, porém não dolorosas, nos miótomos relacionados com a origem da dor. O objetivo dessa terapia é ativar seletivamente fibras de pequeno diâmetro (Aδ – A-delta – ou do grupo III) que se originam nos músculos (ergorreceptores) através da indução de abalos musculares fásicos. Assim, é emitida sobre os pontos motores para ativar eferentes Aa, de modo a gerar um abalo muscular fásico que resulte na atividade de ergorreceptores. Os pacientes relatam desconforto quando são usados pulsos de baixa frequência em vez de trens de pulsos para gerar abalos musculares. As evidências sugerem que a TENS acupuntura produza analgesia extrassegmentar de uma maneira similar à sugerida para a acupuntura. Contudo, há inconsistência no uso do termo “TENS acupuntura”, já que alguns autores o descrevem como a emissão sobre pontos de acupuntura independentemente de produzir atividade muscular. 6.5.3 TENS breve-intensa A meta dessa terapia é ativar aferentes cutâneos Aδ de pequeno diâmetro, emitindo a TENS sobre os nervos periféricos que se originam no local da dor em uma intensidade que seja apenas tolerável para o paciente. Assim, a TENS é emitida sobre o local da dor ou feixe nervoso principalmente de onde 77 ELETROTERAPIA se origina a dor usando correntes de alta frequência e alta intensidade, que são apenas toleráveis para o paciente. Como a TENS breve-intensa age em parte como um contrairritante, ela pode ser emitida apenas por um curto período de tempo, mas pode ser útil em pequenos procedimentos cirúrgicos, tais como troca de curativos e remoção de suturas. Tem-se mostrado que a atividade nos aferentes cutâneos Aδ induzida pela TENS breve-intensa produz bloqueio periférico da atividade dos aferentes nociceptivos e analgesia segmentar e extrassegmentar. Observação Na atualidade, apesar de ainda existir em alguns aparelhos os modos TENS burst e breve e intensa, ambas não são mais utilizadas com frequência na prática clínica. Dessa forma, é recomendada a utilização dos modos convencional e acupuntura. Quadro 2 – Parâmetros para aplicação da TENS Modos de aplicação da TENS Frequência (F) Duração do pulso (T) Amplitude TENS convencional 10-250 Hz 100 µs ou menos Nível sensorial TENS acupuntura <10 Hz (1 a 4) 150-200 µs Nível motor TENS burst 100 Hz, modulada em 2 Hz 200 µs Nível motor TENS breve e intensa 200 Hz 150-200 µs Nível motor/doloroso Tipo de estimulação Frequência Duração de pulso Tempo Figura 25 – Modelode eletroestimulador TENS com seus respectivos parâmetros 78 Unidade II 6.6 Contradições da TENS Para a aplicação da corrente, é preciso entender e saber as contraindicações dessa modalidade. A seguir, temos as principais contraindicações da aplicação da TENS: • pacientes que também possuem implantes eletrônicos, como marcapassos cardíacos e desfibriladores cardioversores implantáveis; • gravidez; • epilepsia; • trombose venosa profunda; • alergia à corrente; • pacientes com alteração de sensibilidade; • alterações cognitivas; • sobre o seio carotídeo e tireoide; • áreas inchadas, infectadas, ou inflamadas ou sobre erupções da pele, tais como flebite, tromboflebite, varizes etc. Além dessas contraindicações, ainda seguem os seguintes princípios: • A estimulação não deve ser aplicada sobre ou próximo a lesões cancerígenas. • A estimulação não deve ser aplicada quando o paciente está na banheira ou no chuveiro. • A estimulação não deve ser aplicada enquanto o paciente estiver dormindo. • A estimulação não deve ser aplicada enquanto o paciente estiver dirigindo, operando máquinas ou durante qualquer atividade em que a estimulação elétrica possa colocar o paciente em risco de lesão. 79 ELETROTERAPIA Neuralgia do trigêmeo Ombro anterior Angina Metástase em costela Dor pós-operatória – eletrodos grandes se apropriado Dor no membro fantasma – nervo mediano contralateral Dor pós-operatória (veia safena) – eletrodos grandes se apropriado Dor no ombro Dor lombar ou dismenorreia Ciática Doença vascular periférica Tendinite Dor talâmica – onde a dor é mais acentuada Neuralgia pós-herpética – acima do dermátomo afetado – através do dermátomo afetado Dor no membro fantasma – sobre o principal feixe nervoso se originando do membro amputado Dismenorreia (mulheres) Dor no joelho (osteoartrite) – dois canais se apropriado Dor no tornozelo Dor cervical – bilateral – unilateral Neuralgia pós-herpética – acima do dermátomo afetado – através do dermátomo afetado Dor no coto Dor no quadril Coto e membro fantasma A) B) Figura 26 – Posicionamento dos eletrodos com o uso da TENS: A: posição dos eletrodos para condições comuns de dor – vista anterior; B: posição dos eletrodos para condições comuns de dor – vista posterior 80 Unidade II 6.7 TENS na prática clínica Clinicamente, TENS não deve ser o único tratamento que o paciente deve receber, já que a estimulação deve ser um complemento e um tratamento auxiliar para controle da dor. Clinicamente, o paciente provavelmente estará utilizando medicamentos, como anti-inflamatórios não esteroides, opioides (fentanil, cloridrato de oxicodona), alfa-adrenérgicos agonistas (clonidina) ou relaxantes musculares (ciclobenzaprina). As intervenções procedimentais mais comuns na fisioterapia são exercícios terapêuticos e treinamento funcional. Fisioterapeutas que tratam da dor, particularmente dor crônica, usam uma combinação de exercícios e treinamento funcional. Modalidades eletroterapêuticas, ou TENS, são usadas por fisioterapeutas como um complemento para modular e reduzir a dor, e o uso de TENS na ausência de outras intervenções não é considerada uma terapia física (cinesioterapia). No entanto, em algumas condições e pacientes, a dor limita a capacidade de um paciente de realizar uma adaptação aos programas de exercícios. Uma vez que a dor estiver controlada, o paciente pode ser mais capaz de realizar um programa de exercícios ativos, atividades da vida diária ou retorno ao trabalho. Compreender os mecanismos da TENS ajudará melhor o clínico na escolha adequada do tratamento de controle da dor. O uso dessa terapia (em combinação com outras terapias) permitirá que os pacientes aumentem o nível de atividade, o tempo de hospitalização diminua e ocorra melhora da função. É importante o conhecimento prévio a respeito dos medicamentos utilizados pelo paciente para controle da dor, bem como os efeitos desses medicamentos sobre os efeitos da TENS. Dessa forma, compreendendo os mecanismos de ação da TENS, estratégias de tratamento mais adequadas podem ser traçadas pelo terapeuta. Se um paciente está tomando opioides, o uso da modalidade TENS de alta frequência pode ser mais apropriado. Isso se baseia no fato de que TENS de baixa frequência, mas não de alta, é ineficaz se administrado em animais tolerante à morfina. Além disso, é sabido que o tratamento repetido com a mesma frequência produz tolerância analgésica. Saiba mais O seguinte artigo descreve os mecanismos científicos básicos por trás de diferentes frequências de estimulação TENS: SLUKA, K. A.; WALSH, D. Transcutaneous electrical nerve stimulation: basic science mechanisms and clinical effectiveness. J Pain, v. 4, n. 3, p. 109-121, abr. 2003. Disponível em: https://www.jpain.org/article/S1526 -5900(03)00484-X/pdf. Acesso em: 17 nov. 2020. 6.8 TENS e dor crônica Agora, vamos falar dos efeitos da TENS para o alívio da dor crônica. Uma pesquisa sobre o uso de terapias não farmacológicas foi realizada entrevistando especialistas em dor de membros da Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP) e relatou que 77% dos entrevistados 81 ELETROTERAPIA indicaram que usavam TENS ou outro equipamento eletromagnético para analgesia. A relação custo-benefício da terapia como uma técnica de tratamento da dor também foi destacada. Depois de aplicar um modelo de simulação de custos a seus dados, concluiu-se que os custos poderiam ser reduzidos em até 55% para analgésicos, e até 69% para outras terapias. A TENS é vista por muitos terapeutas, principalmente, como uma modalidade para condições de dor crônica, e uma ampla gama de pesquisas fornece evidências para apoiar seu uso. Outra pesquisa sobre TENS e dor crônica avaliou uma ampla gama de condições incluindo artrite reumatoide, dor miofascial, neuropatia diabética e dor lombar crônica. A medida de desfecho mais comum usada nesses estudos foi a escala visual analógica (EVA) de 10 cm, mostrando que são necessários estudos mais robustos e de melhor qualidade para avaliação dos efeitos da TENS. 6.8.1 Dor lombar crônica Dor lombar crônica é definida como dor lombar por mais de 3 meses de duração. Curiosamente, a aplicação da TENS nos estudos variou muito, diversificando de um tratamento por dia durante 2 dias a três tratamentos por dia durante 4 semanas. Essa variação no método de aplicação de TENS é um bom exemplo da falta de padronização, em geral observados nos ensaios clínicos randomizados publicados. As varáveis avaliadas incluíram avaliação da dor, função, bem-estar, deficiência e satisfação com o atendimento. Não há evidências que suportem o uso de TENS para o tratamento da dor lombar crônica, porém há falta de dados sobre o tipo de aplicação, duração do tratamento e frequências e intensidades ideais. Figura 27 – Exemplo de aplicação de TENS em dor lombar com irradiação para membro inferior Figura 28 – Exemplo de aplicação de TENS em dor lombar crônica 82 Unidade II 6.8.2 Dismenorreia primária A dismenorreia primária é a ocorrência de dor por cólicas menstruais que estão associadas à isquemia do útero. No tratamento dessa condição, os eletrodos de TENS são tipicamente colocados sobre o abdome ou coluna torácica em áreas relacionadas às raízes nervosas espinhais que recebem informações nociceptivas do útero. Em alguns casos, pontos de acupuntura podem ser usados, por exemplo, B21, B29, ST36 e SP6, e a aplicação geralmente ocorre por 30 minutos. Figura 29 – Exemplo de aplicação de TENS em dismenorreia primaria 6.8.3 Osteoartrite do joelho Para osteoartrite de joelho, TENS convencional é semelhante à de acupuntura em relação ao efeito analgésico, e ambos são melhores que TENS placebo. A colocação dos eletrodos deve ser idealmente determinada para cada indivíduo de acordo com a avaliação do terapeuta. Um estudo investigou seu efeito ou exercício isométrico na dor osteoartrítica no joelho. TENS foi aplicado por 60 minutos, 5 dias por semanadurante 4 semanas. Os resultados mostraram uma redução cumulativa significativa na dor do grupo TENS e grupo placebo. Os autores também relataram que a diminuição da dor foi mantida nas 4 semanas acompanhado de exercícios e nos grupos somente com TENS. Figura 30 – Exemplo de aplicação de TENS em osteoartrite de joelho 83 ELETROTERAPIA 6.8.4 Dor pós-operatória aguda A dor pós-operatória é um exemplo de uma condição de dor aguda em que TENS é utilizada com sucesso. No pós-operatório, é normalmente usada como um adjuvante à medicação de rotina, e vez de um tratamento isolado. A aplicação envolve o posicionamento de eletrodos estéreis paralelos à incisão com eletrodos adicionais às vezes colocados sobre a coluna torácica correspondente à inervação. As vantagens óbvias de controlar a dor no pós-operatório incluem mobilização antecipada, maior eficácia na respiração profunda/tosse, o que levará a uma alta hospitalar mais precoce. Figura 31 – Exemplo de aplicação de TENS em pós-cirúrgico Saiba mais Os pesquisadores que mais estudam sobre TENS no mundo estão no grupo de pesquisa da professora Kathleen Sluka, da Universidade de Iowa, inclusive sendo composto por pesquisadores brasileiros. Para entender melhor sobre TENS, não deixe de ler os artigos desses autores em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/ Na barra de pesquisa, insira “Sluka and TENS”, e você encontrará diversos estudos importantes sobre o tema. 84 Unidade II 6.9 CORRENTE INTERFERENCIAL 6.9.1 Definição A corrente interferencial foi desenvolvida na década de 1950 pelo Dr. Hans Nemec, em Viena, tornando-se cada vez mais popular no Reino Unido durante a década de 1970. É um método de tratamento não medicamentoso simples e não invasivo, utilizado principalmente para induzir analgesia, produzir contração muscular e reduzir edemas. Atualmente, é uma das correntes elétricas mais utilizadas em serviços de fisioterapia em países como Canadá, Austrália e Inglaterra. Consiste na aplicação transcutânea de correntes alternadas de média frequência, com amplitude modulada em baixa frequência (0-250 Hz), formando “pacotes” ou bursts de corrente. A corrente interferencial é formada mesclando-se duas correntes de média frequência que ficam levemente fora de fase, de modo que sofram interferência nos tecidos ou de forma pré-modulada (modulada dentro do estimulador). Uma corrente é de frequência fixa, por exemplo, 4.000 Hz, e a outra corrente é ajustável, por exemplo, entre 4.001 e 4.250 Hz. As duas correntes se somam ou se cancelam, produzindo a corrente interferencial de amplitude modulada resultante (AMF). A frequência da corrente resultante será igual à média das duas correntes originais e sofrerá variação em amplitude com uma frequência igual à diferença entre essas duas correntes. 10 ms AMF 100 Hz 4050 Hz Vo lta ge o r c ur re nt 4100 Hz + 0 - 4000 Hz Figura 32 – Interferência entre duas correntes de 4.000 Hz e 4.100 Hz; a frequência resultante representa 4.050 Hz; a duração burst é de 10 ms e a frequência de modulação da amplitude (AMF) é de 100 Hz; considera-se a frequência de menor valor como sendo a frequência portadora, nesse caso, a frequência portadora da corrente interferencial é de 4.000 Hz 85 ELETROTERAPIA 6.9.2 Vantagens da corrente interferencial As principais vantagens atribuídas à corrente interferencial são a redução da resistência da pele, produzindo menor desconforto, normalmente observado nas correntes tradicionais de baixa frequência, além da produção de efeitos das correntes de baixa frequência nos tecidos. É sugerido também que a corrente interferencial permita o tratamento de tecidos profundos, porém ainda não há evidências que comprovem esses efeitos. 6.9.3 Parâmetros ajustáveis Frequência portadora Em relação à frequência portadora da corrente, comumente utiliza-se a de 2 kHz para gerar fortalecimento muscular e a de 4 kHz para gerar analgesia. Isso porque quando se utiliza a frequência de 2 kHz, a duração da fase da onda é de 250 microssegundos (µs), e na frequência de 4 kHz, a duração da fase da onda é 125 µs. Dessa forma, considerando-se as curvas força-duração, a duração de fase mais longa da frequência de 2 kHz seria mais adequada para ativação de fibras nervosas motoras, ao passo que a duração de fase menor da de 4 kHz seria mais seletiva para as fibras nervosas sensitivas. No entanto, essa informação é proveniente de livros e manuais de equipamentos. Somente um estudo publicado recentemente realizou a comparação das diferentes frequências portadoras da corrente interferencial em indivíduos saudáveis, apresentando melhor efeito hipoalgésico das de 1 kHz e 2 kHz em comparação às frequências de 8 kHz e 10 kHz. Também foi avaliado o desconforto entre as diferentes frequências analisadas, mostrando menor desconforto nas de 8 kHz e 10 kHz comparada às demais analisadas, de 1 kHz, 2 kHz e 4 kHz. Saiba mais Para saber mais sobre a corrente interferencial, leia o artigo: GOATS, G. C. Interferential current therapy. Br J Sports Med., v. 24, n. 2, p. 87-92, jul. 1990. Disponível em: https://bjsm.bmj.com/content/ bjsports/24/2/87.full.pdf. Acesso em: 18 nov. 2020. Frequência de amplitude modulada (AMF) Na corrente interferencial, considera-se que uma frequência de amplitude modulada é o ingrediente ativo da corrente, simulando correntes de baixa frequência, variando de 1 Hz a 250 Hz como forma de induzir mecanismos fisiológicos nos tecidos. A teoria é de que os componentes da média frequência sejam responsáveis por agir como correntes portadoras, conduzindo a frequência de amplitude modulada (AMF) de baixa frequência para dentro dos tecidos. No entanto, os mecanismos de ocorrência da AMF ainda são desconhecidos. 86 Unidade II Na corrente interferencial, a duração do burst pode ser definida como o tempo necessário para um ciclo de modulação de amplitude (período) ocorrer em estimuladores de CI, e o único meio de alterar a duração burst é modificando a AMF. Embora não existiam evidências sobre a relevância da criação de diferentes valores de AMFs para o controle da dor, tem sido afirmado que uma AMF de 100 Hz é capaz de gerar maior analgesia. Dessa maneira, uma AMF de 100 Hz é frequentemente utilizada em estudos de avaliação dos efeitos hipoalgésicos da CI. Usualmente, são utilizadas AMFs de 120 Hz a 150 Hz para a fase aguda da lesão, 75 Hz a 120 Hz na fase subaguda e 25 Hz a 75 Hz para fase crônica da lesão ou para estimulação muscular. Frequência de varredura A AMF pode ser controlada de duas maneiras básicas, sendo conhecidas como modo contínuo (constante) e modo frequência de varredura (∆F). Essa faixa de frequência é automaticamente e ritmicamente aumentada e diminuída dentro de uma faixa de AMF pré-estabelecida. O ∆F é uma variação da AMF, na qual ocorrem aumentos e diminuições da frequência em padrões estabelecidos no equipamento, que varia de 1 Hz a 100 Hz. Portanto, se utilizada uma AMF de 100 Hz, com ∆F de 50 Hz, a variação da modulação ocorrerá entre 100 Hz e 150 Hz. O ∆F é uma forma de diminuir a ocorrência de habituação sensorial da corrente e pode ser ajustado para aumentar e diminuir lentamente durante um período tempo. É preconizado que o ∆F seja ajustado com valor de 50% a 60% da AMF, com exceção em casos crônicos, em que ele pode ser utilizado com valores iguais ou próximos da AMF escolhida. Padrão de varredura O padrão de varredura é caracterizado pelo aumento da AMF a partir da frequência mais baixa para a mais alta durante certo período de tempo. No padrão de varredura de 6:6 (s), a AMF aumenta da frequência mais baixa para a mais alta em um período de 6 segundos e retorna à AMF base em mais 6 segundos. O padrão de varredura também pode ser de 1:5:1 (s), em que a frequência aumenta em 1 segundo, se mantém por 5 segundos e volta à AMF base em 1 segundo e a 1:1 (s), com a frequência aumentando em 1 segundo e voltando à AMF base em 1 segundo. No entanto, evidências recentes suportam que não há diferençasentre os padrões de padrão de varredura no alívio da dor em indivíduos saudáveis. Para fase aguda da lesão, recomenda-se o uso de padrão de varredura de 6:6 (s), para a fase subaguda, 1:5:1 (s), e para a fase crônica, 1:1 (s). 87 ELETROTERAPIA Figura 33 – Aparelho de estimulação por corrente interferencial Modo TP ou BP Frequência portadora Padrão de varredura Frequência de varredura Frequência de amplitude modulada TempoModo de estimulação Figura 34 – Exemplo de parâmetros de aplicação da corrente interferencial Forma de aplicação A forma de aplicação da corrente interferencial pode ser quadripolar ou tetrapolar (eletrodos cruzados para as correntes produzirem interferência dentro dos tecidos), ou bipolar ou pré-modulada (com dois ou quatro eletrodos que não se cruzam, sendo que nesse caso a interferência das correntes ocorre no interior do equipamento). Considera-se que enquanto a CI quadripolar é criada pela interferência das correntes profundamente dentro dos tecidos, a CI bipolar é distribuída de modo 88 Unidade II similar à estimulação elétrica convencional, com intensidades máximas de corrente abaixo dos eletrodos, diminuindo progressivamente com a distância. Um estudo recente relata que o modo de aplicação bipolar penetrou mais profundamente nos tecidos e produziu maior torque e conforto em indivíduos saudáveis. Modos de aplicação • Campo interferencial estático (tetrapolar normal ou estandar) No tratamento interferencial conhecido como tetrapolar normal ou estandar, são necessários quatro eletrodos (dois por canal). Esses quatro eletrodos são usualmente aplicados no paciente. Dois circuitos são colocados na diagonal da melhor maneira possível. É importante fazer algumas considerações a respeito da aplicação dos eletrodos na terapia interferencial. Um tratamento efetivo somente ocorre quando o paciente percebe uma sensação dominante concentrada na área onde o problema se encontra. Em outras palavras, o paciente irá sentir uma significante sensação de formigamento ao redor e na área onde o problema se encontra. Um ajuste da posição dos eletrodos na pele é importante para se conseguir os melhores resultados. Uma das razões encontradas quando o resultado não é satisfatório na terapia interferencial é a posição inadequada dos eletrodos. O paciente deve experimentar uma sensação de formigamento de preferência agradável (como “delicadas agulhadas”). É possível para o paciente experimentar a sensação debaixo do eletrodo, mas deve também sempre que possível sentir este “formigamento” na área onde ocorre o problema. • Campo interferencial dinâmico (tetrapolar com vetor manual ou automático) O campo interferencial estático descrito representa o modo tetrapolar normal ou estandar de aplicação de correntes interferenciais. Através dos anos, esse processo básico sofreu interessantes desenvolvimentos. O maior deles foi o chamado “vetor manual” e “vetor automático”. Esse modo vetor manual ou automático nada mais é que o fluxo de corrente produzido, acrescentando-se vetorialmente os dois circuitos (canais) juntos. Uma descrição técnica melhor colocada seria o conceito de sistema de vetor “rotacional” ou “dinâmico”. O conceito de sistema de vetor “dinâmico” é basicamente simples, ou seja, implica numa rotação do campo interferencial estático de zero a aproximadamente 45 graus, retornando novamente para o zero. A área de influência do campo no tecido passa a ser mais extensa do que no campo interferencial estático. Esse “movimento” é produzido ritmicamente pelo desequilíbrio das correntes, alterando a posição da área de máxima estimulação. No caso em que o paciente apresente sintomas não bem localizados, o sistema de vetor dinâmico (vetor automático) pode ser um meio útil para esse problema. No entanto, deve-se entender que, como o campo de influência está “varrendo” os tecidos, uma parte do tempo de tratamento pode não ser gasto sobre a lesão. 89 ELETROTERAPIA A) Circuito 1 Circuito 2 Circuito 1 Direção do efeito da interferência Circuito 2 B) Circuito 1 Circuito 2 2 45º45º 100% de efeito de interferência Essas flechas indicam o deslocamento do campo interferencial Figura 35 – A) campo interferencial estático; B) campo interferencial dinâmico 6.9.4 Mecanismo de analgesia O mecanismo de analgesia mais aceito com o uso da CI é a Teoria das Comportas Medulares,, na qual estímulos sensoriais ativam fibras não nociceptivas (fibras Aβ), que, por sua vez, ativam interneurônios que inibem a transmissão do impulso nervoso das fibras nociceptivas no corno posterior de medula espinal (fibras Aδ e C), gerando analgesia localizada. Saiba mais Outro artigo bacana para aprimorarem mais sobre o assunto: CORRÊA, J. B. et al. Effects of the carrier frequency of interferential current on pain modulation and central hypersensitivity in people with chronic nonspecific low back pain: a randomized placebo-controlled trial. Eur J Pain., v. 20, n. 10, p. 1.653-1.666, nov. 2016. 90 Unidade II 6.9.5 Tempo de aplicação A duração de tratamento recomendadas e clinicamente mais usadas tem uma base ainda pouco estudada e pode ser resultado de restrições práticas do uso da corrente interferencial, usualmente recomendada entre 10 a 20 minutos de aplicação. Um estudo de revisão sistemática com uso da corrente interferencial nas desordens musculoesqueléticas apresentou estudos que utilizaram tempos variando de 10 a 20 minutos, além do número variado de média de 2 a 4 semanas com um total de 12 sessões como o protocolo de tratamento mais comum para uso da corrente interferencial. Estudos recentes têm utilizado protocolos para analgesia com aplicação de corrente por 30 minutos. Lembrete A corrente interferencial é muito utilizada em países da Europa, já a TENS, em países da América-Latina e Estados Unidos. Os dois tipos de estimulação apresentam bons resultados para analgesia, porém, a interferencial apresenta pequenas vantagens em relação a outra, de acordo com a literatura. 6.9.6 Contraindicações Para a aplicação da corrente, precisamos entender e saber as contraindicações dessa modalidade. A seguir, temos as principais contraindicações da aplicação da corrente interferencial: • portadores de marcapasso; • pacientes com trombose venosa profunda; • câncer; • útero gravídico; • portadores de doenças cardíacas; • alteração de sensibilidade; • alergia no local de aplicação dos eletrodos. 91 ELETROTERAPIA Figura 36 – Aplicação da corrente interferencial no modo bipolar Figura 37 – Aplicação da corrente interferencial no modo bipolar 92 Unidade II Resumo A dor é uma experiência presente na vida da maior parte dos seres humanos, pois constitui um mecanismo fisiológico de proteção que possibilita a detecção de estímulos físicos e químicos nocivos. O fenômeno doloroso é complexo e multifatorial, envolvendo processos sensoriais periféricos e centrais, bem como a interação com elementos afetivos, cognitivo-comportamentais e socioculturais. A dor pode ser melhorada através da modificação das crenças errôneas, o que pode diminuir a catastrofização e reduzir a incapacidade relacionada à dor crônica, incluindo a cinesiofobia (medo de movimento). O modelo biopsicossocial da dor inclui tanto a pessoa quanto a doença no processo de raciocínio do profissional de saúde. A estimulação elétrica nervosa transcutânea (TENS) é definida pela American Physical Therapy Association como a aplicação de estimulação elétrica através da pele para controle da dor. TENS é não invasiva, barata, segura e fácil de usar. TENS corresponde à aplicação de correntes elétricas pulsadas de forma transcutânea (através da pele) para estimular nervos periféricos intactos, principalmente com o objetivo de alívio da dor. No entanto, TENS é também usada no atendimento paliativo para lidar com a dor causada por doença óssea metastática e neoplasias. Há também algumas evidências demonstrando que a TENS exerça efeitos
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