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Crimildo Carlos Chiconela Regência verbal no Citshwa e Português de Moçambique: caso das preposições simples “com” e “em” em falantes dos níveis médio e superior da Cidade de Maxixe Licenciatura em ensino de Português Universidade Save- Maxixe 2022 1 Crimildo Carlos Chiconela Regência verbal no Citshwa e Português de Moçambique: caso das preposições simples “com” e “em” em falantes dos níveis médio e superior da Cidade de Maxixe Júri - Presidente: Dra. Lina Honorata; - Arguente: Dr. João Samuel; - Supervisor: Ma. Tomás Gomes. Universidade Save- Maxixe 2022 Monografia Científica apresentada ao Departamento de Letras e ciências sociais como requisito para obtenção do grau de Licenciatura em Ensino de Português, com habilitações em Línguas Bantu (Citshwa). i 2 Declaração de Honra Declaro que esta Monografia Científica intitulada Regência verbal no Citshwa e Português de Moçambique: caso das preposições simples “com” e “em” em falantes dos níveis médio e superior da Cidade de Maxixe, é fruto da minha investigação pessoal e das orientações do meu supervisor. O seu conteúdo é original e todas as fontes consultadas estão devidamente mencionadas no texto, nas notas de rodapé e nas referências bibliográficas. Declaro ainda que este não foi apresentado em nenhuma outra instituição para obtenção de qualquer grau académico. Maxixe, 24 de Maio de 2022 Crimildo Carlos Chiconela ii 3 Índice Introdução ................................................................................................................................. 11 Delimitação do estudo ............................................................................................................... 12 Justificativa ............................................................................................................................... 12 Objectivos da pesquisa .............................................................................................................. 13 Formulação do Problema .......................................................................................................... 14 CAPÍTULO I ............................................................................................................................ 17 1. Fundamentação teórica ............................................................................................... 17 1.1. Quadro teórico ............................................................................................................ 17 1.2. Funcionalismo linguístico ........................................................................................... 17 1.3. Concepções de regência .............................................................................................. 18 1.3.1. Regência verbal .......................................................................................................... 18 1.3.2. Concepções do Verbo ................................................................................................. 19 1.3.3. Transitividade verbal .................................................................................................. 20 1.3.4. Verbos intransitivos .................................................................................................... 20 1.3.5. Verbos transitivos ....................................................................................................... 21 1.3.5.1. Verbos transitivos directos .......................................................................................... 21 1.3.5.2. Verbos transitivos indirectos ....................................................................................... 22 1.4. Concepções de Preposição .......................................................................................... 22 1.4.1. Preposições simples .................................................................................................... 23 1.4.2. Preposição simples “com” .......................................................................................... 23 iii 4 1.4.3. Preposição simples “em” ............................................................................................. 24 1.4.4. As preposições nas línguas bantu ................................................................................ 25 1.4.5. Preposições/ Morfemas nas línguas bantu com enfoque na língua Citshwa .................. 27 1.5. Regência verbal dos verbos afectados pelas preposições {com e em}. ......................... 30 CAPITULO II ........................................................................................................................... 31 1.6. Metodologia da pesquisa ................................................................................................. 31 1.6.1. Quanto a abordagem ........................................................................................................ 31 1.6.2. Quanto aos objectivos...................................................................................................... 31 1.6.3. Quanto à natureza ............................................................................................................ 32 1.6.4. Quanto aos procedimentos ............................................................................................... 32 1.6.5. Métodos e técnicas de recolha de dados ........................................................................... 32 1.6.6. Entrevista ........................................................................................................................ 32 1.6.7. Inquérito por questionário................................................................................................ 33 1.6.8. Instrumentos e técnicas de análise de dados ..................................................................... 33 1.6.9. Análise descritiva ............................................................................................................ 33 1.7.1. População ........................................................................................................................ 33 1.7.2. Amostra .......................................................................................................................... 34 CAPÍTULO III ......................................................................................................................... 35 2. Regência verbal do Português de Moçambique, caso das preposições simples “com” e simples “em” pelos estudantes do nível médio e superior da Cidade de Maxixe. ....................... 35 2.1. Factores determinantes da regência verbal desviante no PM: caso das preposições simples “com” e “em”............................................................................................................................ 38 5 2.2. Interferência das línguas Bantu ........................................................................................... 38 2.3. Descrição dos dados obtidos através da entrevista aos estudantes do 2º ano curso de Português em relação à regência verbal no Citshwa e PM, caso das preposições simples associativa “com” e locativa “em”............................................................................................. 40 2.4. Constatações extraídas da entrevista aos estudantes do 2º ano curso de Português em relação à regência verbal no Citshwa e PM, caso das preposições simples associativa “com” e locativa “em”….. ...................................................................................................................... 46 2.5. Descrição dos dados referentes ao Inquérito para alunos da 12ª Classe da E.S. 29 deSetembro da Cidade de Maxixe. ................................................................................................ 47 2.6. Preposição simples “com” nos verbos {Cuidar, comprar, namorar.} ................................... 48 2.7. Preposição simples “em” nos verbos {Ir, cair e Chegar.} .................................................... 49 2.8. Conclusões sobre fatores determinantes da regência verbal no PM: caso das preposições “com” e “em” nos verbos de regência contrária e/ou intransitivos. ............................................ 52 3. Conclusões finais .................................................................................................................. 53 4. Bibliografia ........................................................................................................................... 54 Apêndices…………………………………………………………………………………….…..57 6 Lista de Abreviaturas PM- Português de Moçambique; PE- Português Europeu; ES- Escola Secundária. v 7 Lista de tabelas e figuras Tabela 1- Informantes do nível Superior.................................................................................42 Tabela 2- Informantes do nível médio.....................................................................................48 Figura-1: Ocorrência da preposição simples com nos verbos regentes...................................49 Figura 2- Ocorrências da preposição simples “em” nos verbos regentes................................50 vi 8 Dedicatória À minha mãe! vii 9 Agradecimentos A Deus, pelo dom da vida e pelas forças, quem sabe donde, que me tem dado para enfrentar todos e cada um dos obstáculos desta caminhada estudantil. Ao meu supervisor, Ma. Tomás Gomes, pela paciência, dedicação e compreensão na realização desta pesquisa, pela exigência frequente e apoio moral ao longo da pesquisa. À minha mãe, Isabel Alfredo Sipendo, e meu irmão, Dionísio Carlos Chiconela, pelo amor e apoio incondicional. Palavras não são suficientes para expressar o meu profundo agradecimento e honra que sinto por vos ter como responsáveis de mim. Aos meus docentes, Ma. Alberto Mathe, Ma. Isaías Mate, Ma. Lucério Gundane e tantos outros que não caberiam pela caminhada e ensinamentos de ordem não só pedagógica como também cívica e moral. Aos meus amigos, Raúl Cossa, Estêvão Manjate, Bento Mutoba, Alex Lichate, Bilson Chihungo, Nércia Cau, Ivormerla Amélia, pelo apoio incondicional e suporte dado nestes quatro anos de muito Aprendizado. A todos que seja de forma directa ou indirecta contribuíram para o meu bem-estar, muito Khanimambo! viii 10 Resumo A presente monografia científica tem como titulo: Regência verbal no Citshwa e Português de Moçambique, caso das preposições simples “com” e “em” nos falantes dos ensinos médio e superior da Cidade de Maxixe e pretende debruçar sobre ocorrência das preposições “com” e “em” nos verbos que não estabelecem regência com as preposições em causa ou seja, possui uma grelha de regência diferente daquela que é exibida pelo Português Europeu que, neste caso, funciona como padrão em Moçambique. Em relação à metodologia de pesquisa, esta pesquisa é explicativa e quanto aos procedimentos técnicos é de campo, que se sustenta pela pesquisa bibliográfica. Relativamente à recolha de dados, optamos pela observação directa intensiva, através da técnica de observação e pela observação sistemática, através de instrumento de recolha inquérito por questionário e técnica de entrevista semiestruturada. Os resultados do estudo demonstram que grande parte dos verbos de movimento direccionais seleccionam a preposição em, em contextos em que deveria reger a preposição simples direcional a e verbos que selecionam a preposição com em regência verbal onde não seleciona preposição ou exige preposição a. Palavras-Chave: Regência verbal, verbos transitivos indirectos, preposições “com” e “em”. ix 11 Introdução Os linguistas, especialistas no estudo da língua, há alguns anos não se preocupavam com a questão da correcção linguística, justificando-se pelo fato de que o único objectivo de estudo e actuação da linguística é a “língua espontânea e usual, por ser a natural e livre manifestação do falar” (Bechara, 1999). Consubstanciando, o português é uma língua que é mobilizada em diferentes países, como é o caso específico de Moçambique. No caso do país em causa, sendo que é um país multilinguístico, é certo que a língua portuguesa apresenta diversas interferências em diferentes níveis da gramática. Entretanto, é relevante ter-se em conta de que a língua possui uma função social que é o da comunicação onde só se pode compreender e interpretar dentro do contexto sociocultural ou seja, importante compreender que a língua não é um sistema uno, invariado, estático, porém, abriga um conjunto de variantes, variedades, e dialectos. Todas as línguas são moldadas pelos contextos socioculturais e a sua variação e mudança dependem da forma como os usuários replicam o seu uso. Em Moçambique, não é excepção. Todas as línguas faladas tendem a mudar com o tempo desviando-se constantemente em relação à norma. Sendo assim, a norma não é apenas ou simplesmente um conjunto de formas linguísticas pré-estabelecidas, mas, também, é um agregado de valores socioculturais usados por uma comunidade linguística. Diante dessa realidade sociolinguística, surge a presente pesquisa com o titulo: Regência verbal no Citshwa e Português de Moçambique, caso das preposições “com” e “em” nos falantes dos ensinos médio e superior da Cidade de Maxixe objectivando analisar a ocorrência das preposições “com” e “em” no âmbito discurso escrito/ oral como preposições que se aliam aos verbos transitivos indiretos em regência verbal nos âmbitos verbal ou escrita no seio do Português de Moçambique, particularmente em Maxixe nos alvos citados. Em relação à pertinência, pesquisar sobre Regência verbal do Português de Moçambique no caso das preposições “com” e “em”, particularmente Cidade de Maxixe nos alunos da 12ª Classe da Escola Secundária 29 de Setembro e estudantes do 2º ano- Curso de Licenciatura em Português da Unisave - Maxixe traz consigo a intenção de reflectir de forma conjunta, assim como autónoma para os falantes e para linguistas em prol da mobilização e impulsionamento das normas que compõem a língua, outrossim, a pesquisa abre discussão no que concerne a situação do PM tendo em conta as variáveis sociais, assim como as características léxico-semânticas e sintácticas. Também poderá despertar a necessidade de 12 afirmação própria no que tange a variação linguística, isto é, variedade moçambicana, bem como da redução do preconceito linguístico que aflige o sistema educativo do país. Relativamente a estrutura, o presente trabalho está organizado em três capítulos, a saber: No primeiro capítulo apresenta-se a revisão da literatura em que estabelecemos a discussão de conceitos refentes a regência, regência verbal, verbo, preposição, transitividade verbal e de forma particularizada foi-se mobilizando aprofundadamente os dados que constituem a base da pesquisa. No segundo capítulo constam o tipo e modelo de pesquisa, métodos e técnicas de recolha de dados, a amostra e metodologia de análise de dados. O último capítulo (terceiro) é reservado a análise de dados onde abordamos sobre o tema central da pesquisa, seguindo-se a conclusão e as referências bibliográficas. Delimitação do estudo Aliando-se a Lopes, Sitoe e Nhamuende (2013, p.17 cit. em Timbane (2017), “em Moçambique vem-se desenvolvendo uma variedade de portuguêsque é moçambicana, no sentido em que há traços, características e realizações formais e contextuais de moçambicanidade na fala e na escrita...”. Assim como qualquer língua que contempla variações, é notável a ocorrência de construções que resultam da linguagem usual que se distancia das normas gramaticais. Quanto a actuação, o estudo tem como foco analisar mobilização das preposições “com” e “em” em regência verbal, especificamente na província de Inhambane, na Cidade de Maxixe nos alunos da 12ª Classe da E.S. 29 de Setembro e estudantes do 2º Ano Curso de licenciatura em Português da Unisave Maxixe. Em suma, pretende-se com a presente pesquisa, evidenciar a reais causas de regência desviante que se estabelece entre diversos verbos regentes das preposições em causa. Deste modo, a pesquisa decorreu no período de tempo dos anos 2021 à 2022. Justificativa O Português de Moçambique (PM) é uma variedade que resulta de contextos sociolinguísticos e da diversidade cultural. A escola moçambicana baseia-se no português de Portugal (norma- padrão europeia) para ensinar e avaliar seus alunos, o que faz com que os alunos não progridam academicamente. Portanto, na postura de um país que possui certa variação do português mas que têm o português europeu como referencia devido as variáveis sociais em Moçambique vêm se desenvolvendo uma variedade que é só moçambicana. A partir desta 13 realidade, no que tange a mobilização da gramática normativa1 da língua padrão, mereceu destaque para o caso da ocorrência das preposições “com” e “em” nos diferentes verbos. Nesta senda, no caso de estudantes da Cidade de Maxixe, julgamos que possuem factores que determinam a confusão na regência verbal no PM, permitindo estabelecer coerência e coesão nos discursos produzidos, pois em cada frase/ período produzido há que vigorar relações gramaticais entre as palavras. Sendo assim, a presente pesquisa surge no âmbito da confusão na regência verbal do Português de Moçambique nos alunos da 12ª Classe da E.S. 29 de Setembro e estudantes do 2º Ano Curso de licenciatura em Português da Unisave - Maxixe, em relação a ocorrência das preposições “com” e “em” no que diz respeito a regência verbal nos verbos transitivos indirectos ou ditransitivos, estabelecendo uma pesquisa para a regência verbal. Em relação as normas que a língua possui, sendo linguistas, emanamos a discussão a respeito das prescrições normativas da língua em uso, mas não simplesmente para confirmar o que se prega tradicionalmente. Outrossim, para examinar a língua em uso e avaliar os casos em que há distanciamento da norma, sempre tendo em mente seu conhecimento do funcionamento linguístico. A nível académico, esperamos que a pesquisa promova leituras em relação a gramática tradicional, reiterando o que as gramaticas normativas prescrevem relativamente as normas de construções sintáticas, promovendo assim construções sintáticas aceitáveis gramaticalmente. A pesquisa poderá conscientizar os falantes no sentido de levarem em consideração as normas regentes da língua portuguesa em todos âmbitos discursivos. Objectivos da pesquisa Objectivo geral Analisar a regência verbal no Português de Moçambique: caso das preposições simples locativa em e simples associativa com nos alunos da 12ª Classe da E.S. 29 de Setembro e estudantes do 2º Ano Curso de licenciatura em Português da Unisave - Maxixe; 1 A gramática normativa recomenda como se deve falar e escrever segundo o uso e a autoridade dos escritores correctos e dos gramáticos e dicionaristas esclarecidos. (Bechara, 1999: 37) 14 Objectivos específicos Estabelecer conceções sobre o uso das preposições “com” e “em” nos alunos da 12ª Classe da E.S. 29 de Setembro e estudantes do 2º Ano Curso de licenciatura em Português da Unisave - Maxixe; Interpretar a ocorrência de regência verbal no PM, caso das preposições “com” e “em” nos alunos da 12ª Classe da E.S. 29 de Setembro e estudantes do 2º Ano Curso de licenciatura em Português da Unisave - Maxixe; Identificar fatores que contribuem para confusão da regência verbal, caso das preposições “com” e “em” nos alunos da 12ª Classe da E.S. 29 de Setembro e estudantes do 2º Ano Curso de licenciatura em Português da Unisave - Maxixe; Explicar os fatores que influenciam no uso inadequado das preposições “com” e “em” em regência verbal nos alunos da 12ª Classe da E.S. 29 de Setembro e estudantes do 2º Ano Curso de licenciatura em Português da Unisave - Maxixe; Formulação do Problema Gonçalves (2000), […] A Língua Portuguesa (LP) foi adoptada como língua oficial do país, porque precisava-se estender o acesso à educação para os diversos cantos do país, ou seja, havia necessidade de se fazer com a maior brevidade possível aquilo que o colono não foi capaz de fazer durante muitos anos. Por causa da diversidade linguística do país e pela necessidade de dar educação ao moçambicano, definiu-se que a única língua que reunia condição para que esse objectivo fosse alcançado era o português – aliás, o português gozava desse papel mesmo durante o período da luta pela independência do país. Portanto, sem a padronização do português de Moçambique, têm-se o Português Europeu como língua que contempla as regras da norma culta, ou seja, que o guia. Em relação às diferentes mobilizações da regência verbal das preposições “com” e “em” nos alunos da 12ª Classe da Escola Secundária 29 de Setembro e estudantes do 2º ano- Curso de Licenciatura em Português da Unisave - Maxixe, verificou-se há contextos onde a preposição “com” é estabelecida onde devia posicionar-se a preposição “a” devidas as exigências do verbo ou dos valores semânticos que a preposição possui. Assim como da preposição “em”, é comum os falantes da língua em assunção estabelecer onde se devia posicionar a preposição “a” regido pelos verbos transitivos indirectos. 15 Então, muitos factores poderam influenciar na regência verbal desviante em relação as preposições com e em dos discursos constatados eventualmente. Sendo assim, constatamos a longo prazo a que os falantes desenvolvem uma regência verbal das preposições “com” e “em” desviada da língua norma padrão {PE} nas sentenças: * Cuidado com Carro; * Comprei com meu dinheiro; *[Ex2] namora com [CI3]; *Foi na Escola; *Chegar em casa; *Faltei nas aulas. No que diz respeito às construções atípicas dos estudantes dos níveis médio e superior, foram obtidas através da observação directa intensiva (audição e visão), onde Lakatos e Marconi (2011) define observação directa intensiva como sendo um tipo de actividade que “[…] utiliza os sentidos na obtenção de determinados aspectos da realidade. Não consiste apenas em ver e ouvir, mas também examinar fatos ou fenómenos que deseja estudar”, sendo que frequentemente, no seu processo de construção de frases julgam estabelecer a regência das preposições “com” e “em” em verbos por sinal transitivos indirectos4 porem de forma inadequada. A nível gramatical, as construções sintáticas em causa, admite-se: Cuide-se do Carro; Comprei a meu dinheiro; [Exp5] namora [CI6]; Foi a Escola; Chegar a casa; 2 EXP corresponde ao Experienciador. 3 CI corresponde ao complemento indirecto. 4 Verbos transitivos indirectos necessitam obrigatoriamente de uma preposição para estabelecer regência verbal com o objecto indirecto. 5 Ibid. 6 Ibid. 16 Faltei as aulas. Entretanto, esses erros são comuns no Português de Moçambique, particularmente nos alvos citados, e leva-nos a pensar que o PM neste caso, é uma língua que se desvincula das estruturas sintáticas gramaticais, neste caso, regência de alguns verbos que não selecionam preposições com e em. Com base no fenómeno constatado nos estudantescorrespondentes a frequência escolar pré- universitária e universitária em relação a regência verbal, caso das preposições “com” e “em”, surge a seguinte pergunta: Que fatores contribuem para a confusão na regência verbal no Português Moçambique, caso das preposições “com” e “em” em alunos da 12ª Classe da E.S. 29 de Setembro e estudantes do 2º Ano Curso de licenciatura em Português da Unisave - Maxixe? Hipóteses H¹: Moçambique é um país multilinguístico. Sendo assim, os falantes7 em causa, não só tem o português como língua de uso, ou seja, mobilizam diversas línguas, por isso, denotamos como fator mediador, a transposição de estruturas linguísticas das diversas línguas para a língua Portuguesa; H2: Denota-se como causa do fenómeno a aplicabilidade desviante dos conhecimentos adquiridos sobre regência de alguns verbos; H3: A Língua portuguesa como qualquer outra língua natural, reúne diversificadas normas específicas, que garantem o seu correcto e complexo funcionamento em detrimento dos seus diversos contextos. Contudo, a falta do conhecimento dessas normas linguísticas por parte dos seus utentes, pode se reflectir através do uso inapropriado das mesmas normas que a regem, originando desvios; 7 Alunos da 12a Classe e 2o ano Curso de Licenciatura em Português 17 CAPÍTULO I 1. Fundamentação teórica 1.1.Quadro teórico 1.2.Funcionalismo linguístico O Funcionalismo corresponde a corrente de análise linguística que possui foco principal a linguagem em uso. A teoria analisa os contextos de interacção extralinguística, considerando os aspectos semânticos e discursivos. A teoria funcionalista foi fundada pela escola de Praga, datada 1926 pelos linguistas Roman Jakobson e NikolajTrubetzkoy. Seguindo a perspetiva de Neves (1997), “os componentes funcionais são os componentes fundamentais do significado na língua, sendo cada elemento da língua explicado por referência à sua função na comunicação linguística. Assim, a forma dos enunciados não é independente da sua função, e uma descrição completa considera todo o complexo interacional, ou seja, o que importa não é o que cada elemento significa isoladamente, mas como se codificam no texto a escolha do item, a ordem em que ele se coloca, a sua combinação com outros elementos, etc.” Então, a pesquisa concentra-se nos processos ligados à predicação, correspondente ao processo básico de constituição dos enunciados, discursos, buscando-se determinar, especialmente, a aparente tensão entre o uso e a norma nos casos que a tradição chama de regência verbal nos verbos transitivos indirectos. No que tange a gramática funcional, visa a explicar regularidades nas línguas, e através delas, em termos de aspectos recorrentes das circunstâncias sob as quais as pessoas usam a língua. A gramática funcional ocupa, assim, uma posição intermediária em relação às abordagens que dão conta apenas da sistematicidade da estrutura. Outrossim, a teoria funcionalista contribui para uma percepção mais vasta acerca dos usos linguísticos, ao analisar a língua em contextos reais de comunicação, através de textos produzidos orais ou escritos. Portanto, estudar a regência verbal do Português de Moçambique: caso das preposições “com” e “em”, insere-se no âmbito da teoria Funcionalista, que se objetiva: estudar a língua em uso e se procurar verificar as funções dos meios linguísticos de expressão, isto é, objectiva-se determinar os fins a que as unidades linguísticas servem. 18 1.3.Concepções de regência Faraco e Moura (1999, cit. em, Marques 2006) “Regência é a relação de dependência que se estabelece entre dois termos”. Para completar, diz-se que, quando o termo regente é um verbo, dá-se à regência o nome de regência verbal. Então, linguistas conceituam a regência de diversas maneiras, não obstante, o estudo de regência sempre remete a dependência das várias partes da proposição, cujo sentido é determinado por uma delas, e distingue, na sintaxe de regência, as partes regentes (preposições, adjectivos que pedem complementos, verbos, e, algumas vezes, advérbios e as próprias proposições) e as partes regidas (palavras, orações ou proposições que ficam sob a dependência das regentes). 1.3.1. Regência verbal A regência verbal estuda a relação que se estabelece entre os verbos e os termos que os complementam (objectos directos e objectos indirectos), ou seja, a relação de dependência que determinados verbos contemplam quer seja com objectos directos ou indirectos. Para o caso vejamos os exemplos: Cheguei a Vila molhado. Comprei blusão bonito. Em relação ao primeiro exemplo, o verbo flexionado Cheguei estabelece regência com a preposição direccional a para o objecto Vila, por isso, o verbo flexionado rege indirectamente por meio da preposição para o objecto/ complemento. No caso do segundo exemplo, o verbo flexionado Comprei estabelece regência com o adjectivo Blusão, isto é, o sintagma verbal rege directamente com o complemento. O mesmo elucida Pereira (1909, citado. em Marques 2006) afirmando “… Regência verbal nada mais que a relação estabelecida entre os verbos e seus respectivos complementos, pois, nessa relação, há aqueles que, indispensavelmente, requerem o uso das preposições.” Cunha & Cintra (1985), em geral “…as palavras de uma oração são interdependentes, isto é, relacionam- se entre si para formar um todo significativo. Essa relação necessária que se estabelece entre duas palavras, uma das quais serve de complemento a outra, é o que se chama regência.” 19 Analisando os conceitos de Pereira (1909, cit. em Marques, 2006) e Cunha e Cintra (1985), regência verbal é estabelecida através relação/ ligação por meio de preposição ou de forma directa (verbo para objecto) para que haja sentido. A palavra dependente denomina-se regida, e o termo a que ela se subordina, regente. As relações de regência podem ser indicadas: A. Pela ordem por que se dispõem os termos na oração; B. Pelas preposições, cuja função é justamente a de ligar palavras estabelecendo entre elas um nexo de dependência; C. Pelas conjunções subordinativas, quando se trata de um período composto. Na maioria dos casos de regência, verifica-se se o uso da preposição ou não obrigatório, e se o usuário satisfaz ao que recomenda a normativa quanto a esse uso. 1.3.2. Concepções do Verbo As gramáticas definem o verbo seguindo critério morfossintáctico, dado que, conceituam o verbo no que diz respeito a morfologia, isto é, componente que expressa o tempo, espaço, lugar, modo, etc. em relação ao aspecto sintáctico, o verbo corresponde o núcleo da oração. Neste caso Lima (2011), define verbo “como sendo algo que expressa um fato, um acontecimento: o que se passa com os seres, ou em torno dos seres. É a parte da oração mais rica em variações de forma ou acidentes gramaticais.” Ex: Mário morreu. Em relação ao conceito de Lima, enfatiza o facto de que “verbo” é uma classe gramatical ou seja classe de palavras que expressa uma determinada realidade dos seres, assim como em torno deles, estabelecendo marcas de tempo e modo. Ex: Maria saiu da universidade às 12h. Obs. No exemplo em assunção, temos a forma verbal do verbo “Sair”, que expressa o aspecto tempo temporal. Ao contrário de Bechara (1999), entende-se por verbo: “a unidade de significado categorial que se caracteriza por ser um molde pelo qual organiza o falar seu significado lexical. No verbo português, há categorias que sempre 20 estão ligadas: não se separa a “pessoa” do “número” nem o “tempo” do “modo”; isto ocorre em grande parte, senão totalmente, com o “tempo” e o “aspecto”. Em suma, os conceitos encontrados nas gramáticas sobre Verbos, induzem-nos a mesma concepção, de que verbo é uma unidade de significado ou algo que expressa um facto no tempo e noespaço. 1.3.3. Transitividade verbal Segundo Cunha & Cintra (1985), o predicado verbal tem o núcleo, isto é, o verbo como elemento principal da declaração que se faz do sujeito, um verbo significativo. Verbos significativos são aqueles que trazem uma ideia nova ao sujeito. A ligação do verbo com o seu complemento, isto é, a regência verbal, pode, fazer-se: Directamente, sem uma preposição intermédia, quando o complemento é objecto directo; Indirectamente, mediante o em prego de um a preposição, quando o complemento é objecto indirecto. Destarte, o verbo quanto a predicação, pode ser: transitivo ou intransitivo. 1.3.4. Verbos intransitivos Nestas orações de Da Costa e Silva, Sobe a névoa... A sombra desce... (PC, 281.)8 Verificamos que a acção está integralmente contida nas formas verbais “sobe e desce”. Tais verbos são, pois, intransitivos, ou seja, não transitivos: a acção não vai além do verbo. (Cunha & Cintra, 1985) Em consonância com a conceitualização de Cunha & Cintra, podemos acertar na ideia de que os verbos intransitivos são verbos que não necessitam de complemento para dar sentido a frase, isto é, os verbos por si só dão sentido à frase sem transição. 8 Exemplo de Cunha e Cintra (1985) 21 Assumindo deste modo a não ocorrência de regência verbal em verbos cuja predicação é intransitiva. 1.3.5. Verbos transitivos Nesta oração Ele não me agradece, / nem eu lhe dou tempo. 9 Vemos que as formas verbais “agradece e dou” exigem certos termos para completar-lhes o significado. Como o processo verbal não está integralmente contido nelas, mas se transmite a outros elementos (o pronome me na primeira oração, o pronome lhe e o substantivo tempo na segunda), estes verbos chamam-se Transitivos. (Cunha & Cintra, 1985) Os verbos transitivos podem ser directos, indirectos, ou directos e indirectos ao mesmo tempo. 1.3.5.1.Verbos transitivos directos Nas orações comuns do português de Moçambique Vou ver o professor. Ele rogava a deus. A acção expressa por vou ver e rogava transmite-se a outros elementos (professor e Deus) directamente, ou seja, sem o auxílio de preposição. São, por isso, chamados verbos transitivos directos, e o termo da oração que lhes integra o sentido recebe o nome de objecto directo. Deste modo, há ocorrência de regência verbal entre o núcleo da frase “Verbo” e o complemento directo: “Vou ver” é regente de “O doente”, e “O doente” é regido por “Vou ver”. Bechara, descreve que verbos transitivos directos não possuem sentido completo, logo precisam de um complemento, ou seja, de objecto. E esses complementos (sem preposição), são chamados de objectos directos. O complemento objectivo indirecto ou, mais simplesmente, complemento indirecto ou objecto indirecto, é o que representa uma pessoa ou coisa em cujo proveito ou desproveito se realiza a acção do verbo transitivo ou intransitivo. 9 Exemplo de Cunha & Cintra (1985). 22 1.3.5.2.Verbos transitivos indirectos Temos como referencia os exemplos, a. Os abusados assistiam a luta armada; b. Perdoe a minha Mãe. Na perspectiva de Cunha e Cintra (1985), vê-se que, “a acção expressa pelos verbos transita para outros elementos da oração indirectos. O termo da oração que completa o sentido de um verbo transitivo indirecto denomina-se objecto indirecto.” A acção expressa por assistiam e perdoe transita para outros elementos da oração (a luta e minha Mãe) indirectamente, isto é, por meio da preposição a. Por isso os verbos Assistir e Perdoar assumem-se verbos transitivos indirectos porque necessitam da preposição para complementar-lhe o sentido. Em relação à regência verbal, nos verbos transitivos indirectos ocorrem através de verbo e preposição, isto é, regente e o regido. Sendo assim, para os exemplos usados em Cunha & Cintra podemos entender o seguinte: a) No 1º exemplo, a forma verbal “assistiam” é o termo regente da preposição “a” que complementa indirectamente, e é o termo regido. b) E no 2º exemplo, a forma verbal “Perdoem” é o termo regente da preposição “a” que complementa indirectamente, e é o termo regido. 1.4.Concepções de Preposição Bechara conceitua preposição como “uma unidade linguística desprovida de independência – isto é, não aparece sozinha no discurso, salvo por hipertaxe” e, em geral, átona, que se junta a substantivos, adjectivos, verbos e advérbios para marcar as relações gramaticais que elas desempenham no discurso, quer nos grupos unitários nominais, quer nas orações (Bechara, 1999). Em outras palavras, uma unidade linguística que estabelece relações entre termos de sintagmas ou orações, tornando possível que uma determinada função gramatical seja desempenhada por uma determinada partícula. Contudo, as preposições distinguem-se das conjunções pela sua capacidade de regência e por serem semanticamente a expressão de uma dada relação”. 23 Cunha & Cintra (1985), afirmam que as “preposições são palavras invariáveis que relacionam dois termos de uma oração”, de tal modo que o sentido do primeiro (antecedente) é explicado ou completado pelo segundo (consequente) Assim: Antecedente ---- Preposição---- Consequente Vou a Maputo Chegaram a tempo Estive com Pedro Concordo com você Em suma, preposição é uma palavra invariável que relaciona dois termos de uma oração. Em relação aos sintagmas preposicionais (SP), o núcleo preposicional é sempre complementado pela expressão subordinada/regida. [Os meninos não pagaram as contas [ao [pai] SP] SN]. Cunha & Cintra (1985, p. 375) afirmam que ―a relação que se estabelece entre palavras ligadas por intermédio de preposição pode implicar movimento ou não movimento; melhor dizendo: pode exprimir movimento ou uma situação daí resultante. 1.4.1. Preposições simples Para Cunha e Cintra (1985), preposições simples são: a, com, em, por (per), ante, contra, entre, sem, após, de, para, sob, até, desde, perante, sobre, trás. Emprego das preposições (simples associativa “com” e simples locativa “em”) 1.4.2. Preposição simples “com” Mateus (2003) “A preposição com é a preposição que exprime companhia (comitativo). Com este valor, esta preposição afecta a interpretação do predicado verbal uma vez que as frases podem ser parafraseadas por coordenação e por construções que exprimem a reciprocidade. Portanto é possível notar a ocorrência da preposição com em: 1. - Eu brinquei com João (exprime valor de maneira); 2. - Falamos com muita motivação (Exprime valor de causa ou razão); 24 3. - Com a segurança que temos não nos derrubaram (Exprime valor de instrumento). No caso de Bechara (1999), a preposição “com” aparece nas circunstâncias de companhia, ajuntamento, simultaneidade, modo, maneira, meio, instrumento, causa, concessão (principalmente seguida de infinitivo), oposição: Diferentemente de Borregana (2007), a preposição “com”, assume valor de companhia e modo: Ele vai com os amigos (Companhia); Caminha com rapidez (modo); No caso de Cunha & Cintra (1985), A preposição “com” exprime, fundamentalmente, a ideia de “associação”, “companhia” pág. 580-581. E esta ideia básica, sentimo-la muito mais intensa no primeiro exemplo, = Viajei com Maria, do que no segundo, = Concordo com ela. Posto que o uso da partícula com após o verbo concordar, por ser construção já fixada no idioma, provoca um esvaecimento do conteúdo significativo de “associação”, “companhia”, em favor da função relacional pura. Além disso, a preposição “com” exprime Situação = adição, associação, companhia, comunidade, simultaneidade. Em certos contextos, pode exprimir as noções demodo, meio, causa e concessão. Na noção: a) Vivemos com medo de ser preso por causa da renúncia. b) Sai do quarto com sol já ardente. Em relação aos 2 exemplos do valor noção, é notável que a preposição com é constituinte do sintagma verbal, ou seja, o verbo flexionado [vivemos] é regente da preposição regida com. Assim como no segundo exemplo, em que estamos diante a um argumento interno por sinal sintagma verbal Sai que rege a preposição com. 1.4.3. Preposição simples “em” Raposo et alii (2013, cit. Joaquina 2014), a preposição em dignifica-se preposição simples com valor espacial básico ou preposição locativa, mas particularmente a preposição representa uma localização espacial estática de uma entidade, no lugar que ocupa. Ex: Estamos na sala de espera. 25 Já Borregana (2007), elucida-nos que a “preposição em possui valor de lugar, matéria, tempo e modo: i. Estou em Maputo (Lugar); ii. Relógio em Ouro (matéria); iii. Fez viagem em uma hora (tempo); iv. Ouviu-o em silêncio (modo). Na perspectiva de Bechara (1999), a “preposição em indica lugar onde, situação, em sentido próprio ou figurado”, como é o caso de Vivemos em Nampula, em que a preposição em aparece para indicar o lugar onde o sujeito oculto vive, garantindo o sentido para o caso do sintagma preposicional [em Nampula] regendo-se com verbo estático Viver. Em relação ao valor “causa, motivo (geralmente antes do infinitivo) ”, o autor demonstra que a preposição em rege-se com verbos de modos, como é o caso de {Há pessoas que são felizes em ter milho na Machamba} Outrossim, a preposição em indica “lugar para onde se dirige um movimento, sucessão, em sentido próprio ou figurado”, para a situação: Entrar em Casa, Saltar em Corrida, etc. que por sua vez estabelece regência entre o predicador/ verbo para exprimir valor de estado. 1.4.4. As preposições nas línguas bantu Para falarmos das preposições nas línguas bantu, passamos a fazer uma abordagem sobre as línguas bantu em geral. Bleek (1851, citado em Ngunga 2004), designa as línguas bantu, da África sub-Sahariana de “pronominal prefix languages” (línguas de prefixo pronominal) por ter observado nelas a existência de um sistema comum de concordância por meio de prefixos, usando pela primeira vez o termo bantu para referir a estas línguas. Tendo como ponto a ideia de Bleek retomada por Ngunga, concordamos neste aspecto de as línguas bantu serem de prefixo pronominal, visto que, algumas palavras em bantu apresentam sempre um prefixo no início para exprimir o plural. Vamos observar alguns exemplos da palavra “pessoas” em algumas línguas. 26 Exemplos: Citshwa: va- {Prefixo pronominal} –nhu {tema nominal} Gitonga: va- {prefixo pronominal} –thu {tema nominal} Changana: va- {prefixo pronominal} – nhu {tema nominal} Para melhor compreender o fenómeno das línguas bantu, vamos dispor da classificação das línguas africanas em família, Greenberg (1963, cit. em Ngunga, 2004), afirma que estas línguas se encontram divididas em quatro grandes famílias linguísticas, nomeadamente: 1. Afro- asiática, encontra-se as seguintes subfamílias: Semítica, Egípcia, Cushitica, Berber, Chádica); 2. Nilo- Sahariana (Subfamílias: Songhai, Sahariana, Maban, Fur, Chari-Nilo, Koman); 3. Congo – Kordofaniana (Subfamílias: Níger-Congo e Kordofaniana); 4. Khoi e San (Subfamílias: Khoi, San, Sandawe, Iraqwe, Hatsa ou Hadza). Após a apresentação da classificação das línguas em família, passamos a outro tipo de classificação adoptado por Doke (1945) segundo a qual se classificam Zonas, Grupos, Língua ou conjunto de Dialectos, e Dialectos. Segundo Ngunga (2004), zonas são agregados de línguas que têm uma certa uniformidade ou similaridade de fenómenos linguísticos, mas que não necessitam de ser mutuamente inteligíveis. Esta posição de Ngunga, faz-nos perceber que existem línguas com algumas características comuns, até palavras semelhantes, mas apesar desta semelhança os falantes destas línguas podem não se compreenderem durante a comunicação. Porém, existem algumas línguas que apresentam uma similaridade que possibilita que os falantes se compreendam, mesmo não conhecendo a língua, é o caso de Gitonga e Cicopi, Citshwa e Xangana. Ngunga & Faquir (2012), declaram que o nome Tsonga abrange 3 línguas: Xirhonga, Xichangana e Citshwa, mutuamente inteligíveis, faladas nas províncias de Maputo, Gaza e Inhambane, e na zona meridional das províncias de Manica e Sofala. No entanto, como nos referimos, o interesse da nossa pesquisa centra-se na língua Citshwa. Relativamente a esta língua, os dados do Censo de 2007, citados pelos mesmos autores, apontam que esta língua é falada por 693.386 pessoas de cinco anos e mais de idade (INE, 2010), e esta apresenta as seguintes variantes: a) Xikhambani – falada no Distrito de Panda; 27 b) Xirhonga – falada na zona ocidental do Distrito de Massinga; c) Xidzivi – falada nos Distritos de Morrumbene e Homoíne; d) Xihlengwe – falada nos Distritos de Morrumbene e Massinga, na zona de Funhalouro; e) Ximhandla – falada no Distrito de Vilankulo; f) Xidzhonge (ou Xidonge) – falada na parte meridional do Distrito de Inharrime; Em relação a nossa pesquisa, tomamos como referencia a variante {Xidzivi} por ser a variante que maioria dos falantes da cidade de Maxixe tem mobilizado. 1.4.5. Preposições/ Morfemas nas línguas bantu com enfoque na língua Citshwa Cunha e Cintra (1985), “uma preposição podem exprimir diversos valores semântico dependendo do contexto.” Ou seja, as preposições possuem tendência de exprimir valor semântico para cada contexto, destarte, a medida que uma preposição específica pode expressar mais de um valor semântico, pode-se verificar em Citshwa, onde geralmente usa-se a preposição simples ka para se referir tanto à preposição simples locativa em na frase (a) tanto à preposição simples direccional a na frase (b). Frases em Citshwa Exemplos a. Yana ka Departamento ya maletras. {preposição simples ka} b. Ndzilomo ka Departamento ya maletras. {preposição simples ka} Nas construções acima, trata-se de contextos distintos, isto é, o primeiro estamos perante regência verbal do verbo ir flexionado {yana} que é regente da preposição simples direccional a e o segundo contexto temos regência verbal estabelecida pelo verbo estar flexionado {ndzilomo} regente da preposição simples locativa em. Entretanto, ao analisar estas duas construções, verifica-se que no que concerne ao valor semântico das preposições, especificamente as simples locativa em e simples direccional a, a língua Citshwa contraria o pensamento de Neves (2004 cit. em Marques, 2006), dado que “a preposição “a” indica” movimento em direcção a um lugar”, enquanto a preposição em dá a ideia de “inserção em um lugar”, dizendo-se que essa preposição pode ser usada apenas quando indica o lugar dentro do qual ocorre a acção. Portanto, a distinção semântica das preposições no Português, relaciona- se com o verbo que estabelece regência: 28 Frases traduzidas à luz do padrão europeu a. Vai ao Departamento de Letras. {Preposição simples direccional a} b. Estou no Departamento de Letras. {Preposição simples locativa em} Nestas frases do português, o valor semântico das preposições empregadas determinam a interpretação em relação a sua regência verbal, pois Mateus et ali (2003) defendem que a preposição em, em muitos contextos selecciona os verbos estáticos e a preposição “a” indica” movimento em direcção a um lugar”, enquanto a preposição em dá a ideia de “inserção em um lugar” Neves (Ibid). Deste modo, podemos afirmar que o verbo de movimento flexionado Vai rege a preposição simples direccional a e o verbo estático flexionado estou rege a preposição simples locativa em. Ao contrário do que acontece na língua citshwa em que se usa a preposição simples Ka para reger com verbo demovimento assim como verbo estático, por isso, o que marcará fronteiras entre as frases será os verbos regentes. Em torno destas considerações, observa-se que esta língua da família Bantu, acima referenciada, classificada como a língua usada pela maioria dos seus falantes, distancia-se completamente do Português que é a língua-alvo ou segunda desses falantes, especificamente na regência verbal dos verbos intransitivos caso da preposição simples em, pois se verifica que há uma transposição entre a Língua Citshwa para Língua Portuguesa. Relativamente a preposição simples associativa com, na língua Citshwa, ocorre isoladamente mas assumindo duas grafias {na e ni} como ilustram as frases: Frases em Citshwa a) Maria arandzana na Mário; b) Tiwonele ni Mova. Nas frases plasmadas, estamos perante contextos diferentes onde o verbos flexionado arandzana rege a preposição simples associativa na em {arandzana - na} e no segundo caso o verbo flexionado Tiwonele rege a preposição simples ni {Tiwonele – ni}. Deste modo, ao analisar estas duas construções, verifica-se que no que concerne ao valor semântico das preposições, Mateus (2003) “A preposição com é a preposição que exprime companhia (comitativo). Com este valor, esta preposição afecta a interpretação do predicado verbal uma 29 vez que as frases podem ser parafraseadas por coordenação e por construções que exprimem a reciprocidade. Vemos que na Língua Citshwa o verbo namorar posiciona-se como transitivo directo, indirecto e intransitivo, mas na frase supracitada o verbo pede preposição simples associativa com para estabelecer sentido pois teríamos {Maria arandzana Mário} por isso é necessário a ocorrência da preposição simples associativa. No caso da segunda frase (b), o verbo flexionado pede assim como não a preposição, admitindo que o verbo é transitivo e intransitivo. Sem ocorrência da preposição simples associativa com teríamos Tiwonele Mova sem a mudança e/ ou falta de sentido. Frases traduzidas em português a) Maria namora com Mário; b) Cuidado com Carro. Ainda na análise, verificamos a transposição das estruturas sintácticas da LE para LP, verifica-se que os falantes da língua supracitada (Citshwa) no caso da preposição simples locativa em e simples direccional a assume o mesmo valor, o que vai divergir será o verbo que vai reger as preposições em contextos diferentes {Yana ka/ Ndzilomo ka}. Ao contrário da preposição simples associativa com no verbo kurandzana consubstancia-se preposição exigida pelo verbo e quanto ao verbo Kutiwonela não exige obrigatoriamente a preposição na frase em causa. Assumimos por via disso que a causa principal das dificuldades e dos erros dos aprendentes reside na transferência negativa da língua Citshwa. 30 1.5. Regência verbal dos verbos afectados pelas preposições {com e em}. Cuidar Em consonância com Vitória (1969), a recomendação normativa tradicional para o verbo é que posiciona-se transitivo directo, indirecto e pronominal. Quando é transitivo indirecto rege a preposição com, exceptuando quando flexionado no particípio passado porque actua como adjectivo e não exige preposição. Comprar O verbo comprar pertence ao grupo dos predicados de evento não-causativos de actividade mental (dois lugares), exprimem propriedades ou relações dinâmicas “vividas” por uma entidade “agente” (Mateus, 2003). Relativamente a predicação, o verbo comprar é intransitivo e transitivo directo e indirecto. Quando é transitivo indirecto rege a preposição a. Namorar De acordo com Vitória (1969), “o verbo namorar compreende-se verbo transitivo directo e não admite preposição, pois, trata-se de verbo transitivo directo (construído sem qualquer preposição).” Pág. 120 Ir Na perspetiva de Marques (2006), A recomendação normativa tradicional para este verbo é que, quando usado como verbo de movimento, ele tenha um complemento de direcção regido pela preposição a. Em alguns casos, aceita-se o uso das preposições {para e até}. Chegar O verbo chegar, quando usado como verbo de movimento, possui grelha de transitividade semelhante do verbo ir, em que recomenda-se que seu complemento de destino seja regido pela preposição a.(Marques, 2006), ou seja, é transitivo indirecto e intransitivo. Faltar Luft (1986), “o verbo faltar é um verbo intransitivo ou transitivo indirecto. Quando assume-se transitivo indirecto, selecciona um complemento que é regido pela proposição a.” 31 CAPITULO II 1.6. Metodologia da pesquisa Na produção de trabalho científico é necessário que se apoie a diversos modelos metodológicos. Para tanto, entende-se por “método”, um processo organizado, lógico e sistemático de pesquisa. Ou seja, representa o “caminho” para se chegar a um fim. Lakatos & Marconi (2011), explicam que este método se “inicia pela percepção de uma lacuna nos conhecimentos acerca da qual se formulam hipóteses e, pelo processo de inferência dedutiva, se testa a predição da ocorrência dos fenómenos abrangidos pela hipótese.” 1.6.1. Quanto a abordagem Do ponto de vista da forma de abordagem, a pesquisa segue os parâmetros da pesquisa mista, a qual segundo Gil (1994), “considera que existe uma relação entre o mundo e o sujeito que não pode ser traduzida em números, tornando assim a pesquisa descritiva, na qual o pesquisador tende a analisar seus dados indutivamente”. Pág. 207 É caracterizada como a tentativa de uma compreensão detalhada dos significados e características situacionais apresentadas pelos entrevistados, em lugar de produção de medidas quantitativas de características ou comportamentos (Richardson, 1999). Sendo assim, na base desta modalidade de pesquisa, objectivamos descrever, a partir de análises, de maneira indutiva10, isto é, através de dados colhidos no dia-a-dia com estudantes chegar-se -à a conclusões gerais no que concerne ao emprego inadequado das preposições “com” e “em” em regência verbal nos alunos da 12ª Classe e 2º ano do curso de Licenciatura em Português da Unisave - Maxixe. 1.6.2. Quanto aos objectivos Do ponto de vista dos objectivos, a pesquisa é explicativa, em que pretende-se “identificar os factores que determinam ou que contribuem para a ocorrência dos fenómenos. É o tipo que mais aprofunda o conhecimento da realidade, porque explica a razão, o porquê das coisas.” (Gil, 2004) No entanto, poderemos explicar os fatores que influenciam o emprego inadequado das preposições “com” e “em” em regência verbal nos alunos da 12ª Classe e 2º ano do curso de Licenciatura em Português da Unisave - Maxixe. 10 Gil (2004), “parte de dados particulares observados para chegar a uma proposição geral ou universal não contida nas partes examinadas.” 32 1.6.3. Quanto à natureza A presente pesquisa, quanto à natureza é aplicada. Diz-se que uma pesquisa é aplicada, quando, segundo Gil (1994) se “objectiva gerar conhecimentos para a aplicação prática, dirigidos à soluções de problemas específicos.” De facto, ao descrevermos as causas que fazem com que os falantes usem de forma desviante a preposição locativa “em” e preposição simples associativa “com” em regência verbal, pretendemos, apontar o distanciamento do PM em relação ao PE, o que poderá ser benéfico, tanto os planificadores das políticas linguísticas, como os responsáveis pela educação em Moçambique dado que poderão traçar metodologias adequadas para o português de Moçambique. 1.6.4. Quanto aos procedimentos Relativamente aos procedimentos para a colecta de dados, apelidamos pesquisa de campo, em que Lakatos e Markoni (2011) “pesquisa de campo consiste na observação de factos e fenómenos tal como ocorrem espontaneamente, na colecta de dados a eles referentes e no registro de variáveis que se presume relevantes para analisá-los.” p.69 Então,os campos de pesquisa são a escola Secundária 29 de Setembro da Cidade de Maxixe e Universidade Save- Maxixe, Campus 2. 1.6.5. Instrumentos e técnicas de recolha de dados Os métodos de recolha de dados, são estratégias que possibilitam ao pesquisador obter dados empíricos que lhe possibilitam responder às suas questões investigativas. Para o caso da pesquisa, tem-se como métodos e técnicas de recolha de dados a observação sistemática, que por sua vez, “o observador sabe o que procura e é objectivo nas suas investigações” (Markoni & Lakatos, Ibid11, p. 78) 1.6.6. Entrevista Segundo Gil (2004), a “entrevista é uma técnica “em que o investigador se apresenta frente ao investigado e lhe formula perguntas, com o objectivo de obtenção dos dados que interessam à investigação” p.109. Neste caso, baseando-se na entrevista semiestruturada, foi aplicada aos informantes, que contempla estrutura mista (perguntas abertas e fechadas) para 15 estudantes 11 2011 33 do 2º ano Curso de Licenciatura em Português da Universidade Save-Maxixe, de forma aleatória. 1.6.7. Inquérito por questionário Para Lakatos e Markoni (2011), “questionário é um instrumento e colecta de dados, onde o pesquisador envia perguntas ao grupo pesquisado e recolhe-o depois de preenchido.” Pág. 86 Portanto, aplicamos 1 inquérito para 20 alunos da 12ª Classe da Escola Secundária 29 de Setembro da Cidade de Maxixe, em que a escolha da turma assim como dos alunos foi de forma aleatória. 1.6.8. Métodos e técnicas de análise de dados Análise de dados é o processo de aplicação de técnicas estatísticas e lógicas para avaliar informações obtidas a partir de determinados processos. Nos moldes das tipologias de análise de dados, a pesquisa tem como técnica de análise de dados, a análise descritiva. 1.6.9. Análise descritiva Corresponde a análise de factos baseado em factos, ou seja, na prática este tipo de avaliação de dados é feita a partir de resultados obtidos. Deste modo, usamos análise descritiva dos dados, onde iremos descrever as principais tendenciais nos dados obtidos, mundo real da ocorrência da regência verbal nos alvos citados, interpretar-se-ia os resultados de forma quali- quantitativa para descobrir os factores da ocorrência do fenómeno. 1.7. População e amostra 1.7.1. População Segundo Lakatos e Markoni (2011), a população ou universo da pesquisa é “o conjunto de seres animados ou inanimados que apresentam pelo menos uma característica em comum” p.223. Deste modo, a população constitui o universo do que se pretende estudar, descrever, analisar e/ou averiguar numa pesquisa. A população da nossa pesquisa são os estudantes do 2º ano do curso de Português e 12ª Classe da escola Secundária 29 de Setembro da Cidade de Maxixe. 34 1.7.2. Amostra A amostra é vista de acordo com Gil (2004) “ […] como parte da população que seja representativa da melhor forma, ou seja, é uma porção ou parcela do todo” p. 90. é um subconjunto do universo. Só ocorre quando a pesquisa não é censitária, isto é, não abrange a totalidade dos componentes do universo, surgindo a necessidade de investigar apenas uma parte dessa população. Deste modo, a pesquisa tem como amostra 15 estudantes do 2º ano do Curso de Licenciatura em Português, de Maxixe e 20 alunos da 12ª Classe da Escola Secundária 29 de Setembro da Cidade de Maxixe, somando 35 estudantes de idade compreendida dos 16 a 24 anos de Idade. 1.7.3. Tipo de amostra Amostra aleatória simples Para Lakatos e Markoni (2011), a escolha de um indivíduo, entre uma população, é ao acaso (aleatória), quando cada membro da população tem a mesma probabilidade de ser escolhido. Objetivamos a partir do tipo de amostra, interpretar o fenómeno tendo-se como premissa o estatuto de que cada componente da população estudado possui características similares, gerando igual probabilidade para informantes não seleccionados. Descrição da amostra Níveis Género Médio Superior Masculino 10 Informantes 8 Informantes Feminino 10 Informantes 7 Informantes 35 CAPÍTULO III 2. Regência verbal no Citshwa e Português de Moçambique, caso das preposições simples “com” e simples “em” nos falantes do nível médio e superior da Cidade de Maxixe. No presente capítulo iremos apresentar e analisar os dados do fenómeno obtidos através da técnica de observação directa intensiva, com vista a interpretar construções que contemplam regência verbal, caso das preposições simples locativa “em” e simples associativa “com” nos falantes dos níveis médio e superior da Cidade de Maxixe. Sendo que o fenómeno foi constatado por via auditiva, ou seja, observação directa intensiva, agruparemos as construções em categorias para a análise. Categoria 1- Preposição simples associativa “com” em: Frase 1. *Cuidado com Carro; Frase 2. *Comprei com meu Dinheiro; Frase 3. *[Exp]12 namora com [CI]13; Conforme evidente na categoria 1, temos elucidadas construções frásicas nas quais fez-se regência verbal desviante a luz da norma-padrão14, isto é, usou-se a preposição simples associativa com num contexto em que não ocorre. Em relação a primeira construção, a preposição simples associativa é regida pelo particípio passado do verbo cuidar, embora Cunha e Cintra (1985) reiterem que “o particípio passado ocorre como adjectivo” elucida-nos ainda, o desvio evidente nesta mesma construção é que o interlocutor refere-se a uma realidade em que o sujeito emprega a preposição simples associativa no verbo que se encontra no passado para traduzir uma ideia no presente. Pelo sentido que nos dá a nível da aceitabilidade, a construção transmite valor de presente em que a intenção é de ter zelo consigo próprio ou velar por si quanto ao carro, ao passo que a nível da gramaticalidade nos dá o sentido desviante, dado que posiciona-se pronominal, onde a acção recai ao sujeito, ou seja, reflexivo. Na perspectiva de Cunha e Cintra (1985), “verbos 12 Experienciador 13 Complemento Indirecto 14 Rocha Lima (2011) define “norma-padrão é um constructo sociocultural, portador-perpetuador de uma ideologia linguística, muito mais até do que um guia normativo para se falar e escrever correctamente.” 36 reflexivos são utilizados quando a acção exercida pelo verbo recai também sobre o sujeito, ou seja, nas orações em que o sujeito é o agente e também o paciente”, então quanto a norma o verbo “cuidar” fica cuidar-se, admitindo-se agente e paciente. Portanto, o que as gramáticas normativas do Português Europeu admitem é Cuide-se, flexão verbal da 2ª pessoa do singular na forma pronominal. Assim, ficaria Cuide-se do Carro, regendo-se a preposição simples direccional “de” dado que Cunha e Cintra apontam “indica a razão ou a causa por que uma coisa sucede.” Pág. 567, excluindo-se a necessidade de reger o verbo intransitivo «Cuidado» com a preposição simples associativa «com». Na frase 2, os usuários da língua discursam para se referir da proveniência dos valores que foram usados para pagamento de diversos fins, tendo-se a pergunta: Comprou com o que? E de seguida, manifesta-se a resposta «comprei com meu dinheiro» já o interlocutor vê-se a usar a preposição simples associativa “com” no valor de modo para um verbo que quanto a regência verbal, rege a preposição simples direccional “a”, ficando «comprei a». Deste modo, o verbo comprar pertence ao grupo dos predicados de evento não-causativos de actividade mental (dois lugares), exprimem propriedades ou relações dinâmicas “vividas” por uma entidade “agente” (Mateus, 2003). Na frase 3, a preposição simples associativa «com» é regida pelo verbo flexionado «namora», com intenção de estabelecer uma relação de afectividade entre dois indivíduos que é estabelecida pela preposição associativa. Mas, quanto ao verbo que contemplaregência, Vitória (1969, pág. 169), “o verbo namorar compreende-se verbo transitivo directo e não admite, pois, a preposição com", por outra, quer no sentido de desejar fortemente algo, quer no significado de galantear, trata-se de verbo transitivo directo (construído sem qualquer preposição). Namorar é um verbo que precisa de complemento. Quem namora, namora alguém, certo? Não há necessidade da preposição com. Este é um complemento chamado objecto directo, pois liga-se directamente ao verbo, sem necessidade de preposição. Alertando-se que não necessita de preposição pois rege diretamente o complemento. Frases corrigidas da categoria 1, preposição simples associativa com: Frase1. Cuide-se do carro! Frase2. Comprei a meu dinheiro. 37 Frase3. [Exp]15 namora [CI]16 Categoria 2- Preposição simples locativa {em} nos discursos: Frase 4. *Foi na Escola; Frase 5. *Faltei nas aulas; Frase 6. *Cheguei em casa; Conforme evidente na categoria 2, temos elucidadas construções frásicas nas quais fez-se regência verbal desviante a luz da norma-padrão17, isto é, usou-se a preposição simples locativa “em” num contexto em que não ocorre. Na frase 4, podemos constatar que o interlocutor refere-se a um agente que deslocou-se de um lugar para um determinado lugar, e quanto a preposição simples locativa em sofreu contracção em +a ficando na. Em relação ao valor da preposição simples locativa em o que se nota é que ela é usada preferencialmente para indicar “inserção em algum lugar” (Neves, 2004 cit. Em Marques, 2006), ou seja, rege-se com verbos estáticos. Assim, o verbo ir elege a preposição a em virtude das afinidades que existem entre o sentido do próprio verbo e a ideia de “movimento” inerente a deslocação. E quanto ao verbo ir, na gramática de valências, o verbo ir apresenta valência 2, pois pede dois argumentos, pertencendo ao grupo dos predicados de evento não-causativos de movimento que exprimem o deslocamento de uma entidade origem ou objecto para um dado lugar locativo (Mateus et alii, 2003). Entretanto, o argumento “locativo”, indicando meta, destino, não é tratado de modo uniforme nas gramáticas. Alguns autores consideram-no como complemento verbal e, portanto, obrigatório para completar a predicação do verbo, enquanto outros consideram-no como adjunto, ou seja, termo acessório, não obrigatório. Na frase 5, refere-se a preposição simples locativa em é regida pelo verbo intransitivo Faltar, na medida em que, defende Luft18 “o verbo faltar é um verbo intransitivo (por exemplo, em «faltam casas», «casas» é sujeito) ou transitivo indirecto [«faltou a reunião», em que «a reunião» é o 15 Experienciador 16 Complemento Indirecto 17 Rocha Lima (Ibid) 18 Luft, Celso Pedro. (1986) Dicionário Prático de Regência verbal. 38 complemento indirecto]. Quando assume-se transitivo indirecto, selecciona um complemento que é regido pela proposição a.” Na frase 6, a ocorrência da preposição simples locativa “em” é regida pelo verbo chegar que apresenta valência 2, pedindo dois argumentos e pertencendo ao grupo dos predicados de evento não-causativos de movimento que exprimem o deslocamento de uma entidade origem ou objecto para um dado lugar locativo. As recomendações prescritivas para esse verbo, quando verbo de movimento – exceptuando-se as ocorrências em que o verbo tem o sentido de “ir/vir para perto de”, “encostar”, que são casos especiais e não entram na zona de conflito entre uso e norma –, indicam que seu complemento de destino deve iniciar-se pela preposição a ou até (e não pela preposição em). A preposição “a” indica” movimento em direcção a um lugar”, enquanto a preposição em dá a ideia de “inserção em um lugar” (Neves, 2004 cit. em Marques, 2006), dizendo-se que essa preposição pode ser usada apenas quando indica o lugar dentro do qual ocorre a acção. Frases corrigidas da categoria 2, preposição simples locativa em: Frase 4. Foi a Escola; Frase 5. Faltei as aulas; Frase 6. Cheguei a casa/ Cheguei a Escola. 2.1. Factores determinantes da regência verbal desviante no PM: caso das preposições simples “com” e “em” Interferência das línguas Bantu Conforme elucidamos, o Português de Moçambique (PM) é uma variedade que resulta de contextos sociolinguísticos e da diversidade cultural. A escola moçambicana baseia-se no português de Portugal (norma-padrão europeia) para ensinar e avaliar seus alunos, o que faz com que os alunos não progridam academicamente. Diante desta realidade, emanamo-nos a Chutumiá (2013), que julga Português de Moçambique, os linguistas são unânimes em afirmar que no Português oral em Moçambique ocorrem realizações linguísticas de algum modo “estranhas” à norma do Português europeu, as quais podem resultar da transposição de estruturas linguísticas (fonológicas, morfológicas, sintácticas e até semânticas) próprias das línguas Bantu para a língua portuguesa. 39 Relativamente a preposição simples associativa com, na língua Citshwa, ocorre isoladamente mas assumindo duas grafias {na e ni} como ilustram as frases: Frases em Citshwa a) *[SUJ]19 arandzana na [CI]20; b) Tiwonele ni Mova. Nas frases plasmadas, estamos perante contextos diferentes onde o verbos flexionado warandzana rege a preposição simples associativa com em {arandzana - na} e no segundo caso o verbo flexionado Tiwonele rege a preposição simples com {Tiwonele – ni}. Deste modo, ao analisar estas duas construções, verifica-se que no que concerne ao valor semântico das preposições, Mateus eta lii (2003) “A preposição com é a preposição que exprime companhia (comitativo). Com este valor, esta preposição afecta a interpretação do predicado verbal uma vez que as frases podem ser parafraseadas por coordenação e por construções que exprimem a reciprocidade. Vemos que na Língua Citshwa, o verbo namorar posiciona-se como transitivo directo, indirecto e intransitivo, mas na frase supracitada o verbo pede preposição simples associativa com para estabelecer sentido pois teríamos {[SUJ] arandzana [CI]} por isso é necessário a ocorrência da preposição simples associativa. No caso da segunda frase (b), o verbo flexionado pede assim como não a preposição, admitindo que o verbo é transitivo e intransitivo. Sem ocorrência da preposição simples associativa com teríamos Tiwonele Mova sem a mudança e/ ou falta de sentido. 2.2. Quanto aos verbos por sinal de movimento ou de estado que co-ocorre a preposição simples direccional e locativa [ka] Cunha e Cintra (1985), “uma preposição podem exprimir diversos valores semântico dependendo do contexto.” Ou seja, as preposições possuem tendência de exprimir valor semântico para cada contexto, destarte, a medida que uma preposição específica pode expressar mais de um valor semântico, pode-se verificar em Citshwa, onde geralmente usa-se a preposição simples ka para se referir tanto à preposição simples locativa em na frase (a) tanto à preposição simples direccional a na frase (b). 19 Sujeito 20 Complemento Indirecto 40 Frases em Citshwa Ex: a. Yana ka Departamento ya maletras. {preposição simples ka} b. Ndzilomo ka Departamento ya maletras. {preposição simples ka} Nas construções acima, trata-se de contextos distintos, isto é, o primeiro estamos perante regência verbal do verbo ir flexionado {yana} que é regente da preposição simples direccional a e o segundo contexto temos regência verbal estabelecida pelo verbo estar flexionado {ndzilomo} regente da preposição simples locativa em. No que tange a regência verbal do verbo comprar, julgamos como possível factor a falta de conhecimento das exigências dos verbos a luz da norma-padrão. 2.3. Descrição dos dados obtidos através da entrevista aos estudantes do 2º ano curso de Português em relação à regênciaverbal no Citshwa e PM, caso das preposições simples associativa “com” e locativa “em” Nesta fase, iremos apresentar e descrever os dados obtidos através da observação sistemática aliando-se a técnica de entrevista estruturada, ocorrida na Universidade Save- Campus 2 da Maxixe, correspondentes ao universo de 15 informantes. O objectivo da entrevista foi de analisar através de perguntas abertas e fechadas o conhecimento de regência verbal, os factores que causam a má regência, seus posicionamentos sobre regência de alguns verbos e propomos que criassem frases dos quais os informantes julgam correctas. Em relação aos dados dos informantes, julgamos irrelevante saber, pois a intenção do estudo centra-se na ocorrência das preposições em relação a sua regência verbal. Relativamente, a nossa entrevista questionamos se alguma vez tiveram algum debate científico referente a regência verbal ou ocorrência de preposições simples associativa “com” e simples locativa “em” ao longo do seu perfil académico. 41 Tabela 1- informantes do nível Superior Géneros Quant. Universidades Ano Curso Masculino 8 Unisave-Maxixe, Campus 2 2º Ano Licenciatura em Português Feminino 7 Unisave- Maxixe, Campus 2 2º Ano Licenciatura em Português Total dos informantes: 15 Fonte: Autor A tabela ilustra dados referentes a técnica de entrevista que adoptamos no presente estudo. Separamos os informantes em géneros para que seja facilitada a citação no decurso da descrição. A primeira questão do nosso instrumento de entrevista foi de querer saber dos informantes: Já leu ou aprendeu sobre regência verbal? Para informantes do género feminino, 5 julgaram nunca ter estudado. Os restantes 3 responderam positivamente. Os informantes do género masculino, 3 admitiram ter lido nas classes do nível médio e os restantes 5 responderam que estudaram sobre regência verbal mas não se lembram ao certo. No que tange aos resultados da questão, regência verbal segundo Pereira (1909 cit. em Marques 2006) vai ser “…nada mais que a relação estabelecida entre os verbos e seus respectivos complementos, pois, nessa relação, há aqueles que, indispensavelmente, requerem o uso das preposições.” Assim como Cunha e Cintra (1985), “regência verbal ocorre através da relação/ ligação por meio de preposição ou de forma directa (verbo para objecto) para que haja sentido.”. Diante dessa realidade, surge a questão: o que se espera de quem não tem conhecimento da regência verbal? Obviamente que devido a este factor e mais outros será mais susceptível a cometer desvios. 42 A segunda questão para os informantes foi: Quais são as preposições regidas pelos verbos abaixo: V(a) -Comprar; V (b) - Namorar; V (c) - Ir; V (d) - Faltar; Relativamente aos dados colhidos, no caso de o verbo comprar todos do género feminino propuseram a preposição simples associativa com, assim como 4 informantes do género oposto. Os restantes 4 do género masculino, julgaram não incorporar nenhuma preposição, ou seja, o verbo não exige preposição para estabelecer regência verbal. Para o verbo namorar, num universo de 8 informantes do género masculino, 6 responderam de forma infeliz {rege a preposição simples associativa com} e 7 informantes aliaram-se a mesma resposta de que a preposição exigida é com, os restantes 3 de ambos géneros não seleccionaram nenhuma preposição regida. Em relação ao verbo ir, 4 informantes do género feminino, assim como 5 informantes do género masculino responderam de forma infeliz dizendo que exige a preposição em, os restantes 6 de ambos géneros estabeleceram a preposição simples direccional a. Por fim o verbo faltar, onde os informantes do género masculino julgaram exigir preposição em e informantes do género feminino, 4 aliaram-se a resposta dos informantes do género oposto e 3 informantes estabeleceram a exigência da preposição simples direccional a. Assim, nota-se que o maior índice de desobediência à norma-padrão está na língua falada, que se encontra emanada a norma implícita que Leite (1999b, cit. Ibid21), “[…]norma implícita é a linguagem usada pelo um grupo social (o dos falantes cultos, p. ex.)” Continuando, na terceira questão, objectivamos saber se os informantes22 julgam correcto afirmar: *Cuidado com carro. *Namora com estudante do 3º ano. 21 Marques, Pág. 36 22 Do género masculino 43 *Vai no Departamento de Letras. *Faltei nas aulas de Linguística. Dos 8 informantes do género-M, três julgaram que «cuidado com carro», é o certo e ao justificar o primeiro informante disse:-Sempre se falou assim e acho correcto dizer assim. Dando continuidade as justificativas, outros dois informantes do género-M estabeleceram resposta semelhante ao primeiro informante dizendo: -Cuidado com carro é correcto sim porque as pessoas falam assim. Houve outras respostas dos 5 informantes do mesmo género, dos 4 justificaram dizendo que é certo dizer cuidado com carro porque o interlocutor deve precaver-se de um infortúnio. O último informante julgou inadequado afirmar cuidado com carro, por que afirmar cuidado com carro remete-nos a uma ideia do passado e não do presente. E os informantes do género feminino, julgaram correcto dizer Cuidado com carro porque a frase traduz a ideia de algo que está acontecendo por conta do sujeito pronominal23 oculto que expressa a segunda pessoa do presente do indicativo. Analisando as ideias dos informantes, percebemos que na óptica dos mesmos a ocorrência da preposição simples associativa “com” é bem-vinda, mas Mateus et al . (2003: 397), contradiz dizendo “a preposição com exprime companhia (comitativo); […]”, excluindo-se a ocorrência da preposição simples associativa “com” regida pelo particípio passado do verbo cuidar na ideia de presente do indicativo. Na segunda afirmação «Namora com estudante do 3º ano», dos 8 informantes do género masculino, 7 credibilizaram a frase, pois traduz a ideia de associação por meio de uma relação de intimidade amorosa por isso é correcto dizer «Namoro com estudante do 3º ano», quanto ao último informante, teceu outro posicionamento dizendo «namora-se alguém e não com alguém». Em relação aos informantes do género oposto, afirmaram que é certo dizer namora com Mário, porque surge da interrogativa: Com quem namora? por isso diz-se namora com estudante do 3º ano. Entretanto, aliamo-nos na perspectiva de Vitória (1969, pág. 169), “o verbo namorar compreende-se verbo transitivo directo e não admite, pois, a preposição com", por outra, quer no sentido de desejar fortemente algo, quer no significado de galantear, trata- se de verbo transitivo directo (construído sem qualquer preposição). Assim, houve uso indevido da preposição com, apesar de esta referir-se ao modo e a maneira por que o verbo não exige preposição devido a sua transitividade verbal. 23 Tenha. 44 Para o enunciado «Vai no Departamento de Letras», 5 informantes do género masculino estabeleceram mesmas respostas, alegando estar errado dizer: Vai no BIM levantar dinheiro, por que o verbo ir corresponde aos verbos de movimento, por isso, exigem a preposição a para reger. E os restantes 3 do mesmo género, estabeleceram ideias contraditórias, afirmando que sim é correcto dizer Vai no Departamento de Letras porque trata-se de um lugar estático que é Departamento. Para informantes do género feminino, apenas 4 admitiram que a afirmação é correcta mas sem justificativas, assim as demais24 julgaram estar desviada a regência verbal do Verbo ir porque os verbos de movimentos rege-se a preposição a. Verifica-se que os falantes tendem a dar respostas sem ter total certeza do que a norma padrão25 prescreve em relação a norma implícita. Sendo assim, concordamos com (Mateus et
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