Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
EPISTAXE INTRODUÇÃO Epistaxe é definida por um sangramento proveniente das fossas nasais secundário a uma alteração na hemostasia da mucosa nasal. Ocorre em 60% das pessoas durante a vida, mas apenas 6% desses sangramentos merecem formalmente tratamento médico. Apresenta distribuição bimodal, sendo mais frequente em menores de 10 anos e em maiores de 45 anos. Nas crianças os episódios de epistaxe tendem a recorrer, mas são habitualmente autolimitados e raramente observados em crianças com menos de 2 anos. É um dos principais sintomas de apresentação dos tumores nasais benignos e malignos. Estudos evidenciam uma variação sazonal na incidência da epistaxe, sendo mais frequente durante o inverno. ANATOMIA DO NARIZ O nariz possui uma mucosa ricamente vascularizada que permite suas funções de aquecimento, umidificação e filtração do ar, mas que também facilita a origem de sangraentos. A vascularização nasal é oriunda de vasos provenientes dos sistemas carotídeos interno e externo. Artéria carótida interna artéria oftálmica artéria etmoidal anterior e posterior Artéria carótida externa artéria maxilar artéria esfenopalatina Na região anterior do septo nasal existe uma rica rede de anastomoses, chamada de plexo de Kiesselbach localizado na área de Little Nessa região ocorre a confluência de quatro principais artérias: ramo nasal lateral da artéria esfenopalatina, ramo septal da artéria etmoidal anterior, artéria labial superior e artéria palatina maior. Na região posterior, localizado posteriormente à concha média existe o plexo de Woodruff anastomose entre ramos da artéria maxilar interna, principalmente a artéria esfenopalatina e ramos da artéria faríngea posterior. CLASSIFICAÇÃO Epistaxe anterior Origina-se na região do plexo de Kiesselbach; É a mais comum ocorrendo em 90 a 95% dos casos; Tende a ser de menor intensidade e mais autolimitada; É o tipo mais comum em crianças. Epistaxe posterior Origina-se da parede posterolateral do nariz, abaixo da concha média, área irrigada pelo plexo de Woodruff; São sangramentos mais raros ocorrendo em 5 a 10% dos casos; Tendem a ser mais volumosos e a necessitar de atendimento especializado para sua resolução; São mais comuns em pacientes acima de 40 anos. Epistaxe superior Localizam-se na região delimitada medialmente pela porção mais superior do septo nasal, lateralmente pela face septal do corneto médio e superiormente pelo teto da cavidade nasal região irrigada pelas artérias etmoidais anteriores e posteriores e ramos da artéria oftálmica. São menos frequentes. A epistaxe proveniente da artéria etmoidal anterior está associada a trauma facial ou a lesão iatrogênica durante a cirurgia endoscópica nasosinusal. ETIOLOGIA As principais causas de epistaxe podem ser divididas em locais ou sistêmicas. Alterações locais Trauma por manipulação digital: é uma das causas mais comuns e o local mais comum das escoriações é na transição mucocutânea. Trauma facial: a gravidade depende dos mecanismos do trauma, porém os sangramentos são anteriores. Lesão iatrogênica: após procedimentos otorrinolaringológicos. Alteração da umidade ambiental: ambientes secos podem causar ressecamento e irritação da mucosa com consequente sangramento. Corpo estranho: presença de corpo estranho nas fossas nasais pode causar epistaxe, geralmente unilateral e acompanhada por rinorreia purulenta. Alterações infecciosas: quadros de rinossinusites alérgicas ou infecciosas podem causar epistaxe. Alterações neoplásicas: os tumores nasossinusais que mais cursam com epistaxe são carcinoma escamocelular, adenoide cístico, melanoma, papiloma invertido e nasoangiofibroma juvenil. Alterações anatômicas: desvio septais podem tornar a mucosa nasal mais susceptível a sangramentos. Uso de medicamentos ou drogas: um dos principais efeitos colaterais do uso crônico de corticosteroides tópicos nasais é a epistaxe. Uso de drogas como a cocaína também deve ser investigado. Aneurisma ou pseudoaneurisma da artéria carótida: epistaxe volumosa ou recorrente pode ser secundaria a aneurisma de carótida. Alterações sistêmicas Distúrbios da coagulação: alterações plaquetárias, hemofilias, doença de von Willebrand, leucemias e hepatopatias podem ser causas de epistaxe volumosa e recidivante. Uso de anticoagulantes/antiagregantes: estudos evidenciam aumento do risco de epistaxe em pacientes que usam o ácido acetilsalicílico (AAS) ou clopidogrel. Uso de fitoterápicos: os que mais comumente pode alterais a agregação plaquetária são a Ginkgo biloba, o óleo de peixe, o extrato de alho, a vitamina E e o ginseng. Hipertensão: a associação entre epistaxe e hipertensão ainda não está bem definida, existe dúvida sobre se a hipertensão seria a causa ou se a pressão estaria elevada por ansiedade do paciente diante do quadro de epistaxe. Telangiectasia hemorrágica hereditária (THH): uma doença autossômica dominante caracterizada por malformações arteriovenosas na pele e em mucosas. A epistaxe recorrente é a manifestação clinica mais característica e pode ser de difícil controle. AVALIAÇÃO E MANEJO GERAL A avaliação inicial do paciente com epistaxe visa manter a via aérea pérvia e controlar o estado hemodinâmico, seguindo o algoritimo do “Advanced Life Support – ABC (Airway, Breathing, Circulation)”. As manobras de intervenção a serem utilizadas dependem da intensidade da perda sanguínea, que pode ser mensurada pela história clínica (tempo e quantidade aproximada) e pelo estado geral e dados vitais (frequência cardíaca, respiratória e pressão arterial). Se possível deve-se colocar o paciente em posição sentada, levemente inclinado para a frente e pedir que ele elimine coágulos que eventualmente estejam na faringe. O ideal é que se consiga um acesso venoso periférico com envio de material para tipagem sanguínea, pois o paciente pode necessitar de reposição volêmica, inicialmente com solução salina, e até transfusão sanguínea, dependendo da intensidade da perda. História clinica Tempo Frequência Lateralidade Estimativa da perda sanguínea Comorbidades Condições predisponentes Exame otorrinolaringológico Exame adequado das cavidades nasais. Principal objetivo é localizar o ponto sangrante para auxiliar na melhor escolha do tratamento. Paramentação e materiais adequados: luvas, capas, óculos, máscara, touca, iluminação adequada, espéculo nasal, pinça baioneta e aspirador. Quando possível, utilizar algodões embebidos com solução de lidocaína a 2% e vasoconstrictor para adequada analgesia e vasoconstrição. A limpeza da cavidade nasal para remoção de coágulos (aspiração ou lavagem com solução salina) deve ser realizada a fim de proporcionar uma melhor inspeção. Na rinoscopia anterior, deve-se avaliar bem a área de Little que é o principal local de sangramento. Avaliação de toda a mucosa nasal deve ser realizada em busca de sangramento ativo, ulcerações, corpo estranho ou lesões tumorais. Sangramentos posteriores tendem a ser mais volumosos, tornando mais difícil a visualização do foco inicial. Endoscopia nasal permite a visualização do foco do sangramento em mais de 80% dos casos, reduzindo tempo de permanência hospitalar e os custos. Avaliação laboratorial Hemograma completo, principalmente em pacientes com epistaxe severa, visando acompanhar o nível de hemoglobina/hematócrito para avaliar a necessidade de hemotransfusão abaixo de 7 a 9 mg/dL de hemoglobina (dependendo de idade, comorbidades e nível basal de hemoglobina), já existem evidencias de que a hemotransfusão melhora o desfecho clinico desses pacientes. A avaliação da coagulação inicialmente, é indicada apenas para pacientes usuários de anticoagulantes, com comorbidades(hepatopatias ou distúrbios da coagulação) ou crianças com sangramentos volumosos. TRATAMENTO Medidas iniciais feitas pelo próprio paciente como o uso de vasoconstritor tópico nasal, compressão direta e uso de compressas gelas, podem ser suficientes para controle de epistaxe leve. Cauterização: é o tratamento de escolha se o ponto de sangramento for identificado. Cauterização química: é habitualmente o tratamento de primeira escolha. Anestesia nasal deve ser realizada. A cauterização é realizada inicialmente em uma pequena área ao redor do ponto sangrante, e só posteriormente na área central, cauteriza-se a menor área possível. Utiliza-se o nitrato de prata ou o ácido tricloroacético, sedo o primeiro mais bem tolerado pelo paciente. Cauterização elétrica: tão eficaz quanto a cauterização química e tem a vantagem de ser mais efetiva quando existe sangramento ativo. Geralmente utilizada caso o sangramento persista ou recorra após a cauterização química. Como desvantagem pode causar desconforto maior ao paciente caso não tenha sido a anestesia eficaz. Tamponamento nasal anterior: utilizado se a cauterização inicial for ineficaz ou se não for possível localizar o ponto de sangramento. Adequada anestesia e vasoconstrição devem ser realizadas. Existem diversas opções de material para tamponamento, como exemplo a gaze de Rayon. Boa iluminação, espéculo nasal e pinça baioneta são fundamentais. Inicialmente, tenta-se o tamponamento unilateral, caso não cesse o sangramento, deve-se fazer o tamponamento anterior bilateral, os pacientes dever ser reavaliados para a remoção do tampão em 24 a 48 horas. Tamponamento anteroposterior: realizado nos pacientes com epistaxe posterior severa e pacientes com sangramento refratário ao tamponamento anterior. Esses pacientes devem ser hospitalizados para manejo adequado. Existem sondas com duplo balão prontas para a realização do tamponamento anteroposterior, porém, é pouco disponível. A sonda de Foley com balonete de Foley, associado ao tamponamento anterior com gaze é mais utilizado. Uma sonda de Foley nº 10 a 16 (dependendo do tamanho da fossa nasal) é introduzida pela fossa nasal até ser visualizada na orofaringe. O cuff deve ser insuflado com 10 a 15 mL de água destilada, e a sonda, posteriormente tracionada até impactar na rinofaringe. Após colocação da sonda de Foley, o tamponamento anterior deve ser confeccionado e a sonda deve ser fixada. O tampão deve ser desinsuflado em 24 a 48 horas e, se não houver sangramento ativo, removido. A permanência do tampão por mais de 72 horas etá associada ao aumento de complicações, como necrose, síndrome do choque tóxico e rinossinusites. Medicamentos: uso de ácido tranexâmico diminui o sangramento no intraoperatório, porém faltam dados sobre sua eficácia na epistaxe primária. Pacientes com doença de von Willebrand cursando com epistaxe volumosa podem ser tratados com desmopressina (DDAVP), reposição de fator VIIa recombinante ou imunoglobulina venosa. Embolização: opção de escolha para pacientes com condições clínicas desfavoráveis ao tamponamento nasal anteroposterior ou ao procedimento cirúrgico, e para casos de epistaxe grave refratária ao tratamento conservador. A localização do sítio de sangramento e a possibilidade de obliteração seletiva de vasos distais com Gelfoam ou microesferas, com sucesso em torno de 90% das vezes, são vantagens do método. Suas limitações são a contraindicação à embolização das artérias etmoidais (sistema da carótida interna) e o alto custo do procedimento. Cirurgia: opção terapêutica em epistaxes graves: sangramentos profusos e difusos ou de difícil localização, em casos de intolerância ou recusa do paciente ao tampão, ou quando existe falha no controle do sangramento com o tampão nasal. A abordagem cirúrgica tem diminuído a necessidade de transfusão sanguínea, o tempo de internação hospitalar e tem dado maior conforto ao paciente. Ligadura da artéria esfenopalatina: faz a ligadura de artérias terminais da irrigação nasal o mais próximo possível do local de sangramento. É fundamental a correta topografia do sangramento. A cirurgia consiste na identificação e cauterização e/ou ligadura com clipe vascular dos ramos intranasais da artéria esfenopalatina. Antes do procedimento, assegura-se a via aérea do paciente e a otimização do seu estado hemodinâmico. É prudente ainda a reserva de concentrado de hemácias e outros hemoderivados, e seu uso quando indicado. O procedimento é realizado sob anestesia geral. Ligadura da artéria etmoidal anterior: é empregada em sangramentos com origem na região superior e lateral do nariz. Estes são menos comuns que os sangramentos posteriores e se apresentam em menor quantidade. Apresenta alto índice de sucesso quando realizada de acordo com um correto topodiagnóstico. ALGORITMO DE TRATAMENTO DA EPISTAXE
Compartilhar