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Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 01 Do� Situação problema 1: Passando mal Dona Carmem, com 47 anos, estava desanimada frente à pilha de roupa da família que tinha para passar. Começou seu trabalho e logo em seguida o telefone tocou. Colocou o ferro no suporte e ficou uns 10 minutos conversando com uma amiga, que queria uma receita de bolo de chocolate. Voltando para passar a roupa e achando que tinha desligado o ferro da tomada, apoiou a mão esquerda na chapa, para melhor segurá-lo. Devido à dor intensa que sentiu, sem se dar conta, o jogou no chão e fez um movimento brusco para trás, batendo com o ombro direito na janela aberta. Imediatamente colocou a mão queimada sob a água fria, o que lhe deu algum alívio. Horas mais tarde, sentia, além da dor na mão, uma dor intensa no ombro machucado, tanto que o simples toque no local ou até a lembrança da cena a incomodava. Começou a tomar paracetamol 500 mg (2 comprimidos a cada quatro horas) até o dia seguinte, quando, sentindo-se ainda pior, procurou atendimento na UBS próxima. O médico constatou queimadura de segundo grau na mão esquerda e contusão no ombro direito. A paciente queria saber por que seu ombro estava "inchado" e tão sensível a qualquer contato, mesmo passadas 24 horas do acidente. Após dar-lhe explicações, o médico advertiu-a quanto ao uso indiscriminado de medicações, principalmente quando em doses excessivas. Prescreveu um anti-inflamatório, além de orientações gerais para seu tipo de queimadura. Uma semana depois, Dona Carmem retornou para consulta de seguimento, apresentando movimentação normal, desaparecimento do edema do ombro e melhora do aspecto da área lesada na mão. A dor pode ser de origem somática (pele, articulações, músculos), visceral ou neuropática (lesão dos nervos, vias da medula espinal ou tálamo). Dor somática - Estímulo nociceptivo geralmente evidente - Comumente bem localizada - Semelhante às outras dores somáticas na experiência do paciente - Aliviada por anti-inflamatórios ou analgésicos narcóticos Dor visceral - Mais comumente ativada por inflamação - Dor mal-localizada e em geral referida - Associada ao desconforto difuso (p. ex., náuseas, distensão abdominal) - Aliviada por analgésicos narcóticos Dor neuropática - Nenhum estímulo nociceptivo óbvio - Evidência associada de lesão nervosa (p. ex., comprometimento sensorial, fraqueza). - Incomum, diferente da dor somática, frequentemente lancinante ou como choque elétrico. - Apenas parcialmente aliviada por analgésicos narcóticos, podendo responder a antidepressivos e anticonvulsivantes. Axônios aferentes primários São axônios que transmitem a informação dos receptores somatossensoriais à medula espinhal ou ao tronco encefálico. Eles entram na medula espinhal pelas raízes dorsais; seus corpos celulares estão no gânglio da raiz dorsal. Os axônios aferentes primários apresentam diâmetros variados e seus tamanhos correlacionam-se com o tipo de receptor sensorial do qual recebem a sinalização. Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 02 A transdução dos estímulos dolorosos ocorre nas terminações nervosas livres das fibras não mielinizadas C (dor secundária - lenta e contínua) que captam estímulos mecânicos, térmicos e químicos e nas pobremente mielinizadas Ad (dor primária - rápida e aguda) que captam estímulos mecânicos e térmicos. Nociceptores A sensação somática depende demais de nociceptores, que são as terminações nervosas livres, ramificadas, não mielinizadas que sinalizam lesão ou risco de lesão ao corpo. Dor é a sensação, ou a percepção, de sensações, como irritação, inflamação, fisgada, ardência, latejo, ou seja, sensações insuportáveis que surgem de uma parte do corpo. A nocicepção é o processo sensorial que fornece as sinalizações que disparam a experiência da dor. Os nociceptores são ativados por estímulos que têm o potencial para causar lesão nos tecidos. O simples estiramento ou dobramento da membrana do nociceptor ativa os canais iônicos mecanossensíveis, que levam à despolarização da célula e ao disparo de potenciais de ação. Além disso, as células danificadas no local da lesão podem liberar uma série de substâncias que provocam a abertura de canais iônicos nas membranas dos nociceptores. As proteases podem clivar um peptídeo extra- celular abundante, chamado de cininogênio, para formar o peptídeo bradicinina. A bradicinina liga-se a uma molécula receptora específica, que aumenta a condução iônica de alguns nociceptores. De modo similar, o ATP causa a despolarização dos nociceptores por meio da ligação direta a canais iônicos que dependem de ATP para sua ativação. E, o aumento de [K+] extracelular despolariza diretamente as membranas neuronais. Tipos de nociceptores Nociceptores polimodais: Excitados por mais de um tipo de estímulo. Nociceptores mecânicos: sensíveis a deformações nocivas. Nociceptores térmicos: Excitados por temperaturas acima de 45 graus e no congelamento. Nociceptores químicos: Excitados por substâncias químicas. Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 03 Os nociceptores normalmente respondem apenas quando os estímulos são suficientemente intensos para provocar lesão tecidual. Hiperalgesia: Limiar reduzido à dor, uma intensidade aumentada dos estímulos dolorosos ou dor espontânea. - Hiperalgesia primária: Área do tecido lesado - Hiperalgesia secundária: Tecidos que envolvem a região da lesão. O processo inflamatório pode modular a excitabilidade dos nociceptores, tornando-os mais sensíveis a estímulos térmicos ou mecânicos. Bradicinina: Despolariza diretamente os nociceptores e estimula mudanças intracelulares de longa duração, que tornam mais sensíveis os canais iônicos ativados por calor. Prostaglandinas: Aumentam a sensibilidade dos nociceptores. Substância P: peptídeo sintetizado pelos próprios nociceptores. A ativação de uma ramificação do neurito periférico do nociceptor pode levar à secreção de substância P por outras ramificações do neurito do mesmo nociceptor nas áreas vizinhas da pele. A substância P causa vasodilatação (aumento do diâmetro dos capilares sanguíneos) e a liberação de histamina dos mastócitos. A sensibilização de outros nociceptores pela substância P em torno do local da lesão é uma das causas da hiperalgesia secundária. Uma substância que parece ser mais dolorosa que outras é a bradicinina. Pesquisadores sugeriram que ela pode ser o agente mais responsável por provocar dor após uma lesão tecidual. Ademais, a intensidade da dor correlaciona-se com o aumento local da concentração de potássio ou o aumento das enzimas proteolíticas que atacam diretamente as terminações nervosas e excitam a dor por tornarem as membranas neurais mais permeáveis a íons. Dor por isquemia tecidual: Uma das causas sugeridas de dor durante a isquemia é o acúmulo de grandes quantidades de ácido láctico nos tecidos, formado como consequência do metabolismo anaeróbico (i. e., metabolismo sem oxigênio). Também é provável que outros agentes químicos, como a bradicinina e as enzimas proteolíticas, sejam formadas nos tecidos devido à lesão celular e que esses agentes estimulam terminações nervosas de dor juntamente com o ácido láctico. Os mecanismos do SNC também contribuem com a hiperalgesia secundária. Após a lesão, a ativação dos axônios mecanorreceptores Aβ por um toque leve pode resultar em dor. Portanto, outro mecanismo de hiperalgesia envolve uma interação sináptica (linha cruzada) entre a via do tato e a via da dor na medula espinhal. Limiar à dor: a menor intensidade de estímulo que permite ao indivíduo perceber a dor. Vias da dor: Dor rápida/aguda: fibras tipo A delta com velocidade de 6 a 30m/s. Dor lenta/crônica: fibras do tipo C com velocidade de 0,5 a 2 m/s. Devido a esse sistema duplo de inervação de dor, um estímulo doloroso súbito muitas vezes causa a sensação de dor dupla: uma dor Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 04 rápida/aguda transmitida ao encéfalo pela via das fibras Aδ, seguida mais ou menos 1 segundo após por um tipo de dor lenta transmitida pelavia das fibras C. A dor aguda exerce um importante papel em promover reação imediata para o indivíduo remover-se do estímulo. Já a dor lenta tende a tornar-se pior ao longo do tempo, eventualmente produzindo dor intolerável, que faz a pessoa continuar buscando um alívio para a causa da dor. Assim como as fibras mecanossensoriais Aβ, as fibras de pequeno calibre possuem seus corpos celulares nos gânglios da raiz dorsal segmentar e entram no corno dorsal da medula espinhal. Ao penetrarem na medula, as fibras logo ramificam-se e percorrem uma curta distância nos sentidos rostral e caudal na medula, em uma região chamada de tracto de Lissauer, fazendo, depois, sinapse com neurônios da parte mais periférica do corno dorsal, em uma região conhecida como substância gelatinosa. É interessante observar que os axônios de nociceptores viscerais entram na medula espinhal pelo mesmo trajeto que os de nociceptores cutâneos. Na medula espinhal, ocorre uma mistura substancial de informação dessas duas fontes de aferências. Essa linha cruzada origina o fenômeno da dor referida, pelo qual a ativação do nociceptor visceral é percebida como uma sensação cutânea. Um exemplo clássico de dor referida é a angina, que ocorre quando o coração não recebe oxigênio em quantidade suficiente. Os pacientes localizam frequentemente a dor da angina na parte superior do tórax e no braço esquerdo. Outro exemplo comum é a dor associada à apendicite, que é referida, em seu estágio inicial, na parede abdominal ao redor do umbigo. Ao adentrar a medula espinhal a partir das raízes dorsais, fibras nervosas de dor terminam em neurônios do corno dorsal. Aqui, mais uma vez, há dois sistemas de processamento dos sinais de dor a caminho do encéfalo: Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 05 Os estímulos sensoriais produtores de dor (nociceptivos) na pele e nas vísceras ativam as terminações nervosas periféricas dos neurônios aferentes primários, os quais fazem sinapse com os neurônios de segunda ordem na medula espinal ou na medula. Esses neurônios de segunda ordem formam vias ascendentes cruzadas que alcançam o tálamo e se projetam até o córtex somatossensorial. Neurônios ascendentes paralelos, os quais fazem conexão com o tronco encefálico e núcleos talâmicos, se projetam até o sistema límbico e são responsáveis pelo aspecto emocional da dor. A transmissão da dor é regulada no nível do corno dorsal através das vias bulboespinais descendentes que utilizam serotonina, norepinefrina e vários neuropeptídeos como neurotransmissores. Via da dor espinotalâmica Há duas vias: Via neoespinotalâmica: estimuladas pelas fibras A delta -> mecano e termorreceptores -> entra pela lâmina marginal ou I. Acredita-se o glutamato seja a substância neurotransmissora secretada na medula espinhal pelas terminações de fibras nervosas de dor tipo Aδ. Ele é um dos transmissores excitatórios mais utilizados no sistema nervoso central, geralmente com duração de ação de apenas alguns milissegundos. Via paleoespinotalâmica: estimulada pelas fibras C -> entra pelas lâminas II e III (substância gelatinosa). Terminais de fibras de dor tipo C que adentram a medula espinhal liberam tanto o transmissor glutamato quanto a substância P. O transmissor glutamato atua instantaneamente e dura apenas alguns milissegundos. Já a substância P é liberada de maneira muito mais lenta, ocorrendo acúmulo de sua concentração ao longo de segundos ou mesmo minutos. Com efeito, sugeriu-se que a sensação de dor dupla que se sente após uma perfuração pode resultar em parte do fato de que o glutamato fornece a sensação de dor rápida, ao passo que a substância P transmite uma Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 06 sensação mais retardada. Independentemente de detalhes ainda desconhecidos, parece claro que o glutamato é o neurotransmissor mais relacionado à transmissão de dor rápida para o sistema nervoso central, e a substância P, à dor lenta/crônica. A localização da dor transmitida pela via paleoespinotalâmica é imprecisa. A: Transmissão de mensagens nociceptivas, onde estímulos nocivos atingem os neurônios primários por transdução. A mensagem transmitida vai até a medula espinhal e trato talâmico, onde atinge o SNC. B: Rede de modulação da dor, onde o córtex frontal e Hipotálamo ativam células no mesencéfalo que controlam a transmissão da dor via espinal. Mecanismos de modulação da dor Sistema de analgesia: Neurônios da substância cinzenta periaquedutal e periventricular do mesencéfalo e porção superior da ponte emitem sinais para o núcleo magno da rafe e para o núcleo reticular paragigantocelular. A partir desses núcleos, sinais secundários são enviados para as colunas dorsolaterais da medula para um complexo inibitório da dor localizado nos cornos dorsais da medula espinhal. Nesse ponto, sinais de analgesia podem bloquear a dor antes que ela seja transmitida para o cérebro. A estimulação elétrica da substância cinzenta periaquedutal ou do núcleo magno da rafe pode suprimir muitos sinais fortes de dor que Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 07 adentram a medula pelas raízes dorsais. Além disso, a estimulação de áreas superiores do encéfalo que excitam a substância cinzenta periaquedutal também podem suprimir a dor. Algumas dessas áreas incluem: os núcleos periventriculares do hipotálamo, adjacentes ao terceiro ventrículo; e, em menor grau, o fascículo prosencefálico medial, também no hipotálamo. Acredita-se que a encefalina cause inibição pré-sináptica e pós-sináptica de fibras nociceptivas tipo C e Aδ em suas sinapses nos cornos dorsais. As fibras liberam encefalina e também serotonina que, indiretamente, estimulam a secreção de encefalina pelas fibras. Opióides naturais cerebrais: β-endorfina, Met-encefalina, Leu-encefalina e dinorfina. As duas encefalinas são encontradas no tronco encefálico, na medula espinhal e em porções do sistema de analgesia descritas anteriormente, ao passo que a β-endorfina está presente no hipotálamo e na hipófise. A dinorfina é encontrada principalmente nas mesmas áreas descritas para as encefalinas, porém em quantidades menores. Sendo assim, embora detalhes acerca do sistema opioide do encéfalo não estejam elucidados por completo, a ativação do sistema de analgesia por sinais nervosos que adentram a substância cinzenta periaquedutal e periventricular, ou a inativação de vias da dor por substâncias similares à morfina, pode suprimir quase em sua totalidade muitos sinais nociceptivos que chegam por meio de nervos periféricos. Inibição da transmissão da dor por sinais sensoriais táteis simultâneos Fibras sensoriais do tipo Aβ de receptores táteis periféricos capazes de deprimir a transmissão de sinais de dor advindos da mesma área do corpo. Tal efeito provavelmente resulta de uma inibição lateral local na medula espinhal. Isso explica por que manobras simples – como esfregar a pele próxima à área dolorosa – são, muitas vezes, eficientes em aliviar a dor, além de provavelmente esclarecer também o motivo pelo qual linimentos costumam ser úteis para o alívio da dor. É provável que esse mecanismo e a excitação psicogênica simultânea do sistema de analgesia central também sejam a base do alívio da dor por meio de acupuntura. Tratamento da dor por meio de estimulação elétrica Diversos procedimentos clínicos já foram desenvolvidos para suprimir a dor com o emprego de estimulação elétrica. Eletrodos são posicionados em áreas específicas da pele ou, ocasionalmente, implantados sobre a medula espinhal, a fim de estimular as colunas sensoriais dorsais. Em alguns pacientes, os eletrodos são colocados, por meio de cirurgia estereotáxica, em núcleos intralaminares apropriados do tálamo ou na substância cinzenta periaquedutal ou paraventricular do diencéfalo. O paciente pode controlar, de maneira personalizada, o grau de estimulação. Foi relatado alívio dramático da dor em alguns casos, além de duração de até 24 horas após poucos minutos de estimulação. Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 08 Sensibilizaçãoda dor O processo de sensibilização da dor pode ocorrer fisiologicamentefisiologicamente como por exemploexemplo durante processos inflamatórios ou patologicamente como em casos de dor crônica. Ela pode ocorrer sob duas formas principais: periférica e central. Sensibilização periférica: 1. Redução do limiar de estimulação dos nociceptores periféricos: - Intensificação da reação a estímulos nociceptivos. - Desenvolvimento de atividade espontânea. 2. Ativação de neurônios silenciosos ("Adormecidos") 3. Inflamação neurogênica. Fisiologicamente, as fibras C participam ativamente no local da lesão através da liberação de SP, CGRP, NKA, óxido nítrico, entre outras moléculas que vão dar início à sensibilização periférica. A reação inflamatória através de macrofagos, polimorfonucleares, linfócitos, mastócitos e plaquetas interagem com mediadores moleculares secretados pelas células ou sintetizados de novo. Estes mediadores são, por exemplo, a endotelina, a prostaglandina E2, leucotrienos, bradicinina, citocinas, 5-HT e adrenalina, criando uma "sopa inflamatoria". Isso tudo, ativa a transcrição e fosforilação de múltiplas moléculas que estão relacionadas com a hiperexcitabilidade das fibras A delta e C, intensificando desta forma, a reação a estímulos nociceptivos. Sensibilização central: 1. Estímulos persistentemente dolorosos provocam uma estimulação excessiva dos neurônios espinhais e supra espinhal, particularmente em consequência da ativação dos receptores NMDA. 2. As alterações da plasticidade aumentam a densidade dos receptores. Pode acontecer quando um estímulo nóxico periférico persiste na ativação contínua das fibras C, numa baixa frequência e por um longo período de tempo, aumentando progressivamente a resposta eletrofisiológica. Os receptores NMDA do glutamato são diretamente responsáveis por este processo que ocorre na medula espinhal. Estes receptores são conhecidos a nível central pelo seu papel chave na LTP e são cruciais para o processo de memorização e aprendizagem a nível do tálamo. Pode haver igualmente um tipo de memória importante para a sensibilização da dor que explica em parte alguns aspectos entendidos como psicossociais da dor e que podem ter uma base biológica. Assim, a libertação de glutamato e consequentemente ativação dos seus receptores NMDA podem conduzir a alterações plásticas, isto é, a um aumento da densidade de receptores NMDA e consequentemente uma maior sensibilização para a transmissão de impulsos dolorosos. Na sensibilização central, ocorre hiperalgesia secundária em áreas não afetadas mas adjacentes à lesão. Pensa-se que este fenômeno acontece devido à redução do limiar de disparo de neurônios no corno posterior que são igualmente responsáveis pela transmissão do impulso nervoso de áreas adjacentes. Queimadura Camadas da Pele: A pele é considerada um órgão, fazendo parte do sistema tegumentar, composto ainda pelo tecido subcutâneo e por anexos epidérmicos, Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 09 como pelos, unhas e glândulas. Entre suas principais funções, encontram-se a proteção mecânica e imunológica, a regulação, de temperatura, de excreção de sais e da síntese de vitamina D, e a sensibilidade, devido a presença de receptores de pressão, dor, temperatura e tato. Podemos dividi-la em três camadas: epiderme, derme e hipoderme, ou tecido subcutâneo A epiderme é a camada mais externa, queratinizada e avascular. É de tecido epitelial, composta por queratinócitos em diferentes graus de diferenciação, além de melanócitos, células dendríticas, mecanorreceptores e células lipídicas. Possui importante papel na permeabilidade, formando uma barreira à desidratação. A derme é a camada imediatamente inferior à epiderme, composta de tecido conjuntivo. Apresenta ainda fibras elásticas e reticulares, colágeno, rica vascularização, drenagem linfática e inervação, possibilitando suas funções de suporte nutricional, regulação térmica, elasticidade e resistência. Além disso, tem importante papel nas situações de inflamação, por viabilizar a mobilização de células de defesa. É dividida em derme papilar, que serve como base a epiderme, e derme reticular, mais profunda e predominantemente composta por fibras de colágeno entrelaçadas. A hipoderme é a camada mais profunda da derme, constituída por lóbulos de adipócitos e colágeno, além de vasos sanguíneos, linfáticos e nervos. Tem importante papel na proteção contra traumas e como isolante térmico, além de ser um depósito de calorias. Tipos de Queimaduras: Térmicas: podem ser subdivididas em causadas por escaldo, por flamas e labaredas e por contato direto com uma superfície ou objeto extremamente aquecido. Elétricas: dependem, na maioria dos casos, da passagem de corrente elétrica pelo corpo, lesando todos os tecidos que percorrem entre o ponto de entrada e de saída. O impacto da eletricidade nas estruturas é determinado pela voltagem, e essa varia entre ambientes domésticos e os demais. Químicas: Apesar de menos frequentes em relação às anteriores, são uma possibilidade e ocorrem em acidentes domésticos ou industriais, durante o manejo de agentes corrosivos. Classificação das Queimaduras: Primeiro grau: são superficiais, atingindo a epiderme. A pele apresenta um aspecto seco, hiperemiado e é dolorosa. Não é necessária abordagem terapêutica específica, visto o Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 010 caráter autolimitado e pouco grave. Porém, deve-se considerar a hidratação da pele com substâncias umectantes/hidratantes e, em casos de exposição prolongada, a hidratação oral, especialmente em idosos e crianças. Substâncias analgésicas podem aliviar o ardor desconfortável. Queimadura solar Segundo grau: atingem, em graus variáveis, a derme. acometimento mais profundo, mas não total da derme, alcançando glândulas sudoríparas e folículos pilosos, com uma pele menos úmida e mais dolorosa. Queimadura química Terceiro Grau: Destruição tanto da epiderme quanto da derme e, algumas vezes, do tecido subcutâneo adjacente. A pele tem aspectos como coloração variável, de pálida a avermelhada ou preta, inelástica, ressecada e endurecida ao toque. A depender do dano aos nervos periféricos locais, pode apresentar diminuição ou abolição da sensibilidade. Quarto Grau: A lesão danifica todas as camadas teciduais e atinge fáscia, músculos e até o osso, em determinados casos. Diversas referências consideram a classificação até o terceiro grau Queimadura elétrica Alta voltagem Protocolo de tratamento de queimaduras (MS) 1. Tratamento imediato de emergência • Interrompa o processo de queimadura. •Remova roupas, joias, anéis, piercings e próteses. • Cubra as lesões com tecido limpo. 2. Tratamento na sala de emergência a. Vias aéreas (avaliação): • Avalie a presença de corpos estranhos, verifique e retire qualquer tipo de obstrução. b. Respiração: • Aspire as vias aéreas superiores, se necessário. Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 011 • Administre oxigênio a 100% (máscara umidificada) e, na suspeita de intoxicação por monóxido de carbono, mantenha a oxigenação por três horas. • Suspeita de lesão inalatória: queimadura em ambiente fechado com acometimento da face, presença de rouquidão, estridor, escarro carbonáceo, dispneia, queimadura das vibrissas, insuficiência respiratória. • Mantenha a cabeceira elevada (30°). • Indique intubação orotraqueal quando: a escala de coma Glasgow for menor do que 8; a PaO2 for menor do que 60; a PaCO2 for maior do que 55 na gasometria; a dessaturação for menor do que 90 na oximetria; houver edema importante de face e orofaringe. c. Avalie se há queimaduras circulares no tórax, nos membros superiores e inferiores e verifique a perfusão distal e o aspecto circulatório (oximetria de pulso). d. Avalie traumas associados, doenças prévias ou outras incapacidades e adote providências imediatas. e. Exponha a área queimada. f. Acesso venoso: • Obtenha preferencialmente acesso venoso periférico e calibroso, mesmo em área queimada, e somente na impossibilidadedesta utilize acesso venoso central. g. Instale sonda vesical de demora para o controle da diurese nas queimaduras em área corporal superior a 20% em adultos e 10% em crianças. 3. Profundidade da queimadura: a. Primeiro grau (espessura superficial) – eritema solar: • Afeta somente a epiderme, sem formar bolhas. • Apresenta vermelhidão, dor, edema e descama em 4 a 6 dias. b. Segundo grau (espessura parcial-superficial e profunda): • Afeta a epiderme e parte da derme, forma bolhas ou flictenas. • Superficial: a base da bolha é rósea, úmida e dolorosa. • Profunda: a base da bolha é branca, seca, indolor e menos dolorosa (profunda). • A restauração das lesões ocorre entre 7 e 21 dias. c. Terceiro grau (espessura total): • Afeta a epiderme, a derme e estruturas profundas. • É indolor. • Existe a presença de placa esbranquiçada ou enegrecida. • Possui textura coreácea. • Não reepiteliza e necessita de enxertia de pele (indicada também para o segundo grau profundo) 4. Extensão da queimadura (superfície corpórea queimada – SCQ): • Regra dos nove (urgência) (veja a figura 1). • A superfície palmar do paciente (incluindo os dedos) representa cerca de 1% da SCQ. • Áreas nobres/queimaduras especiais: Olhos, orelhas, face, pescoço, mão, pé, região inguinal, grandes articulações (ombro, axila, cotovelo, punho, articulação coxofemural, joelho e tornozelo) e órgãos genitais, bem como queimaduras profundas que atinjam estruturas Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 012 profundas como ossos, músculos, nervos e/ou vasos desvitalizados. 5. Cálculo da hidratação: Fórmula de Parkland = 2 a 4ml x % SCQ x peso (kg): • 2 a 4ml/kg/% SCQ para crianças e adultos. • Idosos, portadores de insuficiência renal e de insuficiência cardíaca congestiva (ICC) devem ter seu tratamento iniciado com 2 a 3ml/kg/%SCQ e necessitam de observação mais criteriosa quanto ao resultado da diurese. • Use preferencialmente soluções cristaloides (ringer com lactato). • Faça a infusão de 50% do volume calculado nas primeiras 8 horas e 50% nas 16 horas seguintes. • Considere as horas a partir da hora da queimadura. • Mantenha a diurese entre 0,5 a 1ml/kg/h. • No trauma elétrico, mantenha a diurese em torno de 1,5ml/kg/hora ou até o clareamento da urina. • Observe a glicemia nas crianças, nos diabéticos e sempre que necessário. • Na fase de hidratação (nas 24h iniciais), evite o uso de coloide, diurético e drogas vasoativas. 6. Tratamento da dor: Instale acesso intravenoso e administre: • Para adultos: Dipirona = de 500mg a 1 grama em injeção endovenosa (EV); ou Morfina = 1ml (ou 10mg) diluído em 9ml de solução fisiológica (SF) a 0,9%, considerando-se que cada 1ml é igual a 1mg. Administre de 0,5 a 1mg para cada 10kg de peso. • Para crianças: Dipirona = de 15 a 25mg/kg em EV; ou Morfina = 10mg diluída em 9ml de SF a 0,9%, considerando-se que cada 1ml é igual a 1mg. Administre de 0,5 a 1mg para cada 10kg de peso. 7. Gravidade da queimadura: Condições que classificam queimadura grave: • Extensão/profundidade maior do que 20% de SCQ em adultos. • Extensão/profundidade maior do que 10% de SCQ em crianças. • Idade menor do que 3 anos ou maior do que 65 anos. • Presença de lesão inalatória. • Politrauma e doenças prévias associadas. • Queimadura química. • Trauma elétrico. • Áreas nobres/especiais (veja o terceiro tópico do item 4). • Violência, maus-tratos, tentativa de autoextermínio (suicídio), entre outras. 8. Medidas gerais imediatas e tratamento da ferida: • Limpe a ferida com água e clorexidina desgermante a 2%. Na falta desta, use água e sabão neutro. • Posicionamento: mantenha elevada a cabeceira da cama do paciente, pescoço em hiperextensão e membros superiores elevados e abduzidos, se Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 013 houver lesão em pilares axilares. • Administre toxoide tetânico para profilaxia/ reforço antitétano. • Administre bloqueador receptor de H2 para profilaxia da úlcera de estresse. • Administre heparina subcutânea para profilaxia do tromboembolismo. • Administre sulfadiazina de prata a 1% como antimicrobiano tópico. • Curativo exposto na face e no períneo. • Curativo oclusivo em quatro camadas: atadura de morim ou de tecido sintético (rayon) contendo o princípio ativo (sulfadiazina de prata a 1%), gaze absorvente/gaze de queimado, algodão hidrófilo e atadura de crepe. • Restrinja o uso de antibiótico sistêmico profilático apenas às queimaduras potencialmente colonizadas e com sinais de infecção local ou sistêmica. Em outros casos, evite o uso. • Evite o uso indiscriminado de corticosteroides por qualquer via. • As queimaduras circunferenciais em tórax podem necessitar de escarotomia para melhorar a expansão da caixa torácica. • Para escarotomia de tórax, realize incisão em linha axilar anterior unida à linha abaixo dos últimos arcos costais • Para escarotomia de membros superiores e membros inferiores, realize incisões mediais e laterais (veja a figura 2). • Habitualmente, não é necessária anestesia local para tais procedimentos; porém, há necessidade de se proceder à hemostasia. Escala da dor e fármacos envolvidos: A escala da dor OMS, se baseia em quanto de dor o paciente refere na hora do exame físico ou anamnese. Usando como referência uma escala de 0 a 10, bem como as fáscias do paciente, o médico é capaz de quantificar essa dor e disponibilizar o melhor medicamento possível. Segundo a OMS, a escala da dor se dá da seguinte maneira: Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 014 Dor Neoplásica: Estima-se que 35-45% dos doentes oncológicos sentem dor à data do diagnóstico ou numa fase precoce da doença, que cerca de 70 % apresentam dor na fase avançada e que quase todos têm dor na fase terminal da doença. No doente oncológico, a dor está relacionada com a neoplasia em 60-90 % dos casos (invasão ou compressão de estruturas), em 5-20 % dos casos está relacionado com o tratamento (radioterapia, fibrose, neuropatia pós-quimioterapia, pós-operatório) e em 3-10% a dor não tem relação com a doença neoplásica. A dor tem grande impacto no doente oncológico, significando agravamento do prognóstico ou morte próxima, diminuição da autonomia, diminuição do bem-estar e qualidade de vida, ameaça de aumento do sofrimento físico e desafio à dignidade. Abordagem do doente com dor Antes de iniciar o tratamento, deve ser feita uma avaliação global do doente e da dor, incluindo a caracterização rigorosa desta, interferência da mesma nas atividades da vida diária e relações interpessoais e, ainda, da história farmacológica. Relativamente à caracterização da dor, é essencial determinar o seguinte: • localização • intensidade • tipo (somática, visceral, neuropática) • início • duração/variação diurna • factores de alívio e agravamento • sintomatologia acompanhante • interferência nas atividades da vida diária • etiologia (relacionada ou não com a neoplasia) Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 015 A dor irruptiva pode ser definida como uma exacerbação passageira da dor que se sobrepõe a um fundo de dor persistente estável. Os doentes com dor crônica moderada ou intensa podem apresentar dor irruptiva em 52 a 64% dos casos. É habitualmente uma dor de intensidade moderada a grave, de início rápido (< 3 minutos em 43 % dos doentes), com duração relativamente curta (aprox. 30 minutos) e frequência de 1 a 4 episódios por dia. Pode ser de dois tipos: • Incidental: tem um evento precipitante identificável (ex., pôr-se em pé, andar, tossir) • Espontânea: surge sem causa precipitante identificável. Automedicação A automedicação é muito comum entre pessoas de todas as idades, geralmente ocorre por indicações de terceiros, por conhecimento próprio ou fácil acesso em farmácias. Segundo a Organização Mundial de Saúde e o Ministério da Saúde, o mercado brasileiro dispõe de mais de 32 mil medicamentos que não poderiam ser vendidos sem a apresentação da receita, porém esta é dispensada de forma indiscriminada pelas farmácias favorecendo a automedicação. A utilização desses medicamentos pode muitasvezes esconder uma doença, agravar novos problemas de saúde, causar efeitos adversos e interações medicamentosas, prejudicando a saúde do paciente. A população, muitas vezes, não tem acesso a informações completas a respeito da segurança dos fármacos. A maior parte das pessoas sequer conhece o conjunto dos possíveis efeitos nocivos que a automedicação pode trazer, ou não sabe identificar nem prevenir corretamente combinações perigosas entre as substâncias farmacológicas. Por outro lado, alguns pacientes ignoram os perigos da associação de medicamentos, sua segurança fica em risco, com isso a presença do farmacêutico torna-se importante para prestar orientação do uso de qualquer medicamento e garantir um uso racional dos mesmos. Tanto no Brasil como em outros países a automedicação é uma prática amplamente difundida, assim como, a prescrição errônea pode acarretar efeitos indesejáveis, como o mascaramento de sintomas e doenças até o surgimento de enfermidades iatrogênicas, ou seja, doenças desencadeadas pelo uso incorreto do medicamento. A automedicação mostra-se ainda frequente na sociedade devido a uma soma de fatores, como a dificuldade de acesso, a demora e a baixa qualidade do atendimento nos serviços de saúde (tanto no setor público Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 016 quanto no privado), a veiculação de propagandas de medicamentos isentos de prescrição na mídia, a presença da chamada “farmacinha caseira” nos domicílios e a crença da população de que os medicamentos resolvem todas as enfermidades. Uso indiscriminado de analgésicos Os AINEs não seletivos quando usados de maneira irracional podem causar vários efeitos colaterais, sendo os mais comuns os efeitos gastrointestinais (úlceras gástricas e gastrites), isso se deve a inibição das ciclooxigenases e consequentemente das prostaglandinas cuja ação fisiológica é estimular a produção de muco e bicarbonato nas células epiteliais gástricas e redução da produção do ácido clorídrico nas células parietais. Os AINES causam também uma redução das prostaglandinas renais que são vasodilatadoras nas arteríolas aferentes, consequentemente diminuirá a taxa de filtração glomerular com ativação do sistema renina angiotensina aldosterona provocando aumento da pressão arterial e risco de insuficiência renal. Outros efeitos colaterais podem ser representados por aumento do tempo de sangramento (redução da formação do tromboxano), reações de hipersensibilidade, desvio metabólico para a via da lipooxigenase aumentando a formação dos leucotrienos que promovem broncoconstrição. Os medicamentos isentos de prescrição(MIP) por serem de fácil acesso à população e não precisarem de prescrição médica, podem ocasionar danos à saúde como qualquer outro tipo de medicamento quando usados de forma incorreta não respeitando a dose, posologia e o uso terapêutico. Estudo realizado em uma Universidade de Presidente Prudente em 2017 sobre a prática de automedicação de analgésicos: No presente estudo, a dipirona e o ibuprofeno foram os mais utilizados pelo sexo feminino, já o paracetamol e o diclofenaco pelo masculino; apesar da nimesulida não ser isento de prescrição dentre os medicamentos de prevalência é o terceiro mais utilizado em ambos os sexos. A dipirona pode causar algumas reações adversas como induzir a discrasia sanguínea, em especial a agranulocitose, porém estudos demonstram que os riscos da dipirona são similares ou menores do que o de outros analgésicos-antipiréticos sendo a ocorrência de aplasia medular rara no uso intensivo de dipirona. O paracetamol assim como a dipirona pode causar reações adversas se utilizado de maneira irracional, destacando-se seus efeitos hepatotóxicos que são comuns quando o mesmo é utilizado em doses elevadas ou continuadamente. A maioria dos participantes da pesquisa relatou não conhecer os efeitos adversos dos medicamentos. A prevalência das mulheres deve-se ao fato de provavelmente possuírem mais conhecimento dos medicamentos que consomem. Um estudo realizado por Abrahão Et al. apresentou resultados similares ao presente estudo no qual a maioria dos participantes (92%) relataram desconhecer qualquer tipo dessas reações, diferente do resultado encontrado por Rankel et al.1no qual 40% não tinham conhecimento dos efeitos do uso abusivo de medicação. No presente estudo, aproximadamente metade dos participantes afirmaram ler a bula dos medicamentos, sendo o sexo feminino mais prevalente o que pode ser devido ao fato das Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 017 mulheres se cuidarem mais quanto ao uso dos fármacos. Este valor foi muito diferente do encontrado no estudo de Santana na qual apenas 10% afirmaram ler a bula de medicamentos. A bula é um importante instrumento para informar o usuário quanto ao uso do medicamento, efeitos adversos, podendo gerar uma sensação superficial de domínio do saber médico, e mesmo com grande número de informações contidas nas bulas, as pessoas continuam a praticar a automedicação. Dentre as justificativas para a realização da automedicação, as que mais foram relatadas pelos participantes foram: utilização de um fármaco anteriormente já prescrito pelo médico. Valor parecido corrobora com o estudo de Silva e Rodrigues. No qual 53,1% dos participantes afirmaram que já se basearam em receitas médicas anteriores para tratar sintomas e doenças e 38,2% dos participantes afirmaram ter sido feita por indicação familiar. Já no estudo de Silva et al.2, 30% dos participantes afirmaram usar prescrição médica antiga, e 30% indicações de amigos e parentes. Com relação à orientação do farmacêutico a maioria dos participantes afirmaram não receber orientações desse profissional, divergindo do estudo de Silva et al. que encontraram 56,84% dos entrevistados dizendo ser orientados pelo farmacêutico somente quanto à forma de utilização, e o restante, 43,16%, responderam que não são orientados. Uso indiscriminado de analgésicos por discentes de uma instituição de ensino superior: um risco imperceptível. O Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox) registrou 20.562 casos de intoxicação por medicamento (SINITOX, 2016). Ao passo que o Ministério da Saúde apontou que aproximadamente 60 mil casos de internações ocorreram em decorrência do uso irracional de medicamentos no Brasil nos últimos cinco anos. Nesta cultura de automedicação há uma alta incidência do uso, sobretudo, de analgésicos, antitérmicos e anti-inflamatórios, que podem ser adquiridos livremente nas farmácias, e grande parte da população não conhece suas contraindicações de uso (BRASIL, 2014). Conforme demonstra a pesquisa, dor é o principal motivo de uso dos medicamentos analgésicos, sendo ela de diversos tipos. Os maiores tipos e dor relatados foram dor de cabeça, seguido por cólica menstrual, dor nas costas, nas pernas e cólica intestinal. Dentre os entrevistados, houve aqueles que não souberam localizar, de forma específica, a dor e, ainda, alguns que afirmaram não sentir nenhum tipo de dor. A pesquisa realizada proporcionou vários pontos de reflexão sobre o uso de analgésicos, demonstrando que, em alguns casos, de forma indiscriminada e, em outros, por orientação médica ou farmacêutica, sendo que, em muitos deles, com o intuito de aliviar ou combater dor moderada ou intensa são utilizados de forma repetida pela população analisada. A intensidade na utilização de analgésicos é uma constância na população brasileira e isso tem se configurado em automedicação que causa sérios danos à saúde. A dor é o sintoma que estimulou o uso de analgésicos. Nesta pesquisa, mais de 80% fazem uso do medicamento analgésico assim que uma inconveniente dor lhe atormente, destes 9,7% relataram ser dor leve, 28,8% dor moderada, enquanto que, 61,5% uma dor intensa.A cefaléia, que é comum entre os brasileiros desde crianças, adolescentes, adultos e idosos, em diferentes sexos, é considerada uma ocorrência limitante que interfere na qualidade de vida e na Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 018produtividade. Nas palavras de Oliveira e Pelógia (2011), a cefaleia aguda corresponde a 4% das queixas em pronto atendimento sendo que muitos pacientes procuram tratamento sem o devido acompanhamento médico e com a automedicação. Epidemiologia da dor • Estima-se que até 30% da população mundial sofra de dor crônica. • Usando a definição de dor crônica da IASP 35,5%. • Atualmente é um problema de saúde pública. • Pacientes com dor crônica usam os serviços de saúde cinco vezes mais do que o restante da população. Prevalência de dor: • Dor pós-operatória: 30% a 70% • Emergência (PS): 90% • Câncer: 55% a 85% • SIDA (AIDS): 30% a 90% • Lombalgia em trabalhadores adultos: 18% a 90% • Em idosos institucionalizados: até 80% Mulheres (39,6% no mundo) relatam: • Dores mais intensas • Dores mais frequentes • Mais locais de dor • Apresentam limiar de dor mais baixo • Apresentam menor tolerência à dor que homens • Visitam o médico com mais frequência • Fazem mais uso de analgésicos • Maior tendência a desenvolverem dor crônica • No período da pré-adolescência, as incidências são similares. • Prevalência de dor crônica generalizada – 11,8% (10,1-13%) – Homens – 7,2% (3-10,5%) – Mulheres – 14,7% (14,7-14,9%) Prevalência de dor crônica No Brasil, a prevalência de dor crônica nos estudos coletados foi diversa, apresentando desde 23,02% em um estudo realizado no Maranhão, até 76,17% em um estudo online conduzido em âmbito nacional. Entretanto, de uma forma geral e inespecífica, a prevalência nacional de DC foi de 45,59% para todos os estudos incluídos (Tabela 2). Um dos pontos que desperta atenção é que, em adultos moradores da cidade de São Paulo, o percentual da população com DC, em média, foi de 31%, enquanto em adultos residentes da cidade de São Luís foi de 42,3% (Tabela 3). Ao fim dos resultados identificou-se estudos que atendem aos critérios de classificação quanto aos mecanismos de dor predominantes da IASP, sendo agrupados na tabela 4. Nos estudos que declaram ter incluído dores de predomínio possivelmente nociceptivo (Tabela 4), a prevalência inespecífica dos achados foi de Julia Lopes Filagrana e João Pedro P. Bussolo 019 29,5% e uma alta variação de resultados foi observada entre os artigos, especialmente os relacionados à dor lombar crônica (dentre as dores inseridas como nociceptivas), apresentando valor mínimo de 10,7% em estudo com adolescentes do município de Caracol, do estado do Piauí, e chegando a 96,8% de dor lombar crônica em pacientes com diagnóstico de Parkinson do ambulatório de um hospital de Belo Horizonte. Em relação à prevalência de dor neuropática, o resultado foi de 14,5% em pacientes internados em hospitais da área urbana de Santo André/SP. Já sobre características de dor nociplástica, foi apresentada uma prevalência de 5,5% de fibromialgia em relação à população de idosos residentes da região oeste de São Paulo, como também 19,5% de prevalência de síndrome do intestino irritável em mulheres com dor crônica pélvica, com prevalência média entre os estudos de 12,5% (Tabela 4). Referências GUYTON, A.C. e Hall J.E.– Tratado de Fisiologia Médica. 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