Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Professor MÁRIO GUARNIERI – DIREITO PENAL Página | 1 1. CONFLITO APARENTE DE NORMAS Princípios aplicáveis S ubsidiariedade E specialidade C onsunção A lternatividade Segundo a doutrina majoritária, são três os princípios relacionados ao tema conflito aparente de normas, quais sejam: o da especialidade, o da subsidiariedade e o da consunção. Corrente minoritária aponta um quarto princípio, que seria o da alternatividade. REQUISITOS PARA QUE HAJA CONFLITO APARENTE DE NORMAS: 1. Unidade de fato; 2. Pluralidade de leis penais; 3. Vigência simultânea de todas elas; • SUBSIDIARIEDADE – A lei primária tem preponderância sobre a lei subsidiária. É aquele tipo penal que define como crime um fato incluído por outra norma na previsão de delito mais grave como qualificadora, agravante, causa de aumento de pena. Assim existe subsidiariedade entre duas normas penais quando se trata de estágios ou graus diversos de ofensa a um mesmo bem jurídico. Ex: Crime de Roubo que é lei primária (crime mais grave) em relação ao crime subsidiário do Furto. • ESPECIALIDADE – Lei especial é aquela que contém todos os dados típicos de uma norma e outros denominados especializantes. A lei geral prevê o crime genérico, enquanto a norma especial traz em seu bojo crime específico. Norma especial sobrepõe norma geral; Ex: Art. 123 (infanticídio) é um crime especial em relação ao art. 121 (homicídio) do Código Penal. CONSUNÇÃO - O fato menos grave é absolvido pelo mais grave. O fato mais amplo e grave consome, absorve os demais fatos menos amplos e graves, os quais atuam como meio normal de preparação ou execução daquele, ou ainda seu mero exaurimento. Assim, lex consumens derogat legis consumptae, ou seja, a lei consumativa prefere a lei consumida. Este princípio aplica-se ao crime complexo, modalidade na qual resulta na fusão de dois ou mais crimes, que passam a desempenhar a função de elementares ou circunstâncias daquele (ex: crime de roubo que é a junção dos crimes de furto com ameaça ou lesão corporal), crime progressivo, quando ao gente, almejando desde o início o resultado mais grave, pratica, mediante reiteração de atos, crescentes violações ao bem jurídico, progressão criminosa, quando ao gente pretendi, inicialmente, produzir um resultado e, depois de alcança-lo, opta por prosseguir na prática ilícita e reinicia outra conduta, produzindo evento mais grave (ex: agente que, após praticar vias de fato, opta em produzir lesões corporais na vítima) e fatos impuníveis. • ALTERNATIVIDADE – É a situação na qual duas ou mais normas se repetem diante do mesmo fato. Pelo princípio da alternatividade a Professor MÁRIO GUARNIERI – DIREITO PENAL Página | 2 aplicação de uma norma a um fato exclui a aplicabilidade de outra que também o prevê como delito. Ocorre principalmente no tipo penal com mais de um núcleo verbal. Ex.: art. 33 da Lei de Drogas. Mesmo que o agente pratique vários verbos será apenado por apenas um deles. CRIME PROGRESSIVO: o agente, desde o início, tem a intenção de praticar um crime mais grave, mas, para concretizá-lo, passa pelo menos grave. Ex: O agente quer matar a vítima e, para isso, precisa desferir várias facadas. PROGRESSÃO CRIMINOSA: o agente inicialmente queria o resultado menos grave, mas, no "meio do caminho" muda de ideia e passa a querer o resultado mais grave. Ex: Agente da apenas uma facada, porque quer apenas lesionar a vítima e, depois de concretizar essa única facada, decidi matar a vítima. 2. LEI PENAL NO TEMPO Segundo o PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DAS LEIS depois de cumprir todas as fases do processo legislativo previsto na Constituição Federal, a lei penal ingressa no ordenamento jurídico e, assim como as demais leis em geral, vigora até ser revogada por outra. A REVOGAÇÃO é a retirada da vigência de uma lei. A regra geral é que as leis só são revogadas por outra lei. As exceções são as leis excepcionais e temporárias que são autorrevogáveis. Os costumes, por mais consagrados que sejam não revogam leis. Da mesma forma uma decisão judicial não revoga uma lei, ainda que seja proveniente do STF em controle de constitucionalidade. A revogação da lei só pode ser feita através de outra lei emanada do poder legislativo. A revogação da lei, a depender do seu alcance, pode ser absoluta (ab-rogação) ou pode ser parcial (derrogação). Essa revogação pode ser expressa, quando a lei indica expressamente os dispositivos revogados, tácita, quando a lei nova se mostra incompatível com a lei antiga, apesar de não existir menção expressa quanto a revogação ou ainda global, que ocorre quando a nova lei regula inteiramente a matéria disciplinada pela lei anterior, que passa a ser ultrapassada e desnecessária. A regra geral é a da prevalência da lei que se encontrava em vigar quando da prática do fato (tempus regit actum). Resguarda-se o princípio da reserva legal, bem como a anterioridade da lei penal. As exceções podem ocorrer na hipótese de sucessão de leis penais que disciplinam, total ou parcialmente, a mesma matéria. E se o fato tiver sido praticado durante a vigência da lei anterior, cinco situações podem ocorrer: A) NOVATIO LEGIS INCRIMINADORA – Lei cria figura penal, ou seja, novo crime. Só pode ser aplicada a fatos ocorridos durante sua Professor MÁRIO GUARNIERI – DIREITO PENAL Página | 3 vigência (princípio da irretroatividade da lei penal, salvo para beneficiar o réu). B) LEX GRAVIOR – A lei posterior é mais rígida que a anterior. Também só deve alcançar fatos ocorridos posteriormente a sua vigência. C) ABOLITIO CRIMINIS – A lei posterior extingue o crime. Trata-se de uma nova lei que exclui do âmbito do Direito Penal um fato até então considerado criminoso. Tem natureza jurídica de causa de extinção da punibilidade (art. 107, III, CP). Alcança a execução e os efeitos penais da sentença condenatória, não servindo como pressuposto da reincidência, e não configura maus antecedentes. Contudo, ainda persistem os efeitos extrapenais (civis) como a obrigação de reparar o dano. D) LEX MITIOR – A lei posterior é benigna em relação a sanção penal ou à forma de seu cumprimento. Ocorre nas situações que o fato ocorreu sob a vigência de lei mais grave e, posteriormente, sobrevém lei nova mais branda. Nessa situação, a lei nova mais branda retroagirá para alcançar fatos ocorridos antes da sua vigência, constituindo exceção ao princípio da irretroatividade da lei penal na qual a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu. Em nosso ordenamento jurídico-penal, a aplicação da lei penal rege-se pela teoria da atividade, segundo a qual aplica-se a lei vigente à época da prática do delito (tempus regit actum). A teoria da extra-atividade visa explicar as exceções à regra da teoria da atividade. Nessa perspectiva, por via de exceção, uma lei posterior apenas pode retroagir para beneficiar o réu (novatio legis im mellius) (art. 2º do Código Penal). *ULTRATIVIDADE: Quando o fato ocorre sob a vigência de lei mais benéfica e essa lei é revogada entrando em vigência lei nova desfavorável ao réu (LEX GRAVIOR). Nesse caso deve-se aplicar a lei antiga, mesmo que tenha sido revogada. IMPORTANTE!!! SÚMULA 711 STF: “A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência”. E) VACACIO LEGIS – Período em que a lei é publicada, mas deve aguardar determinado prazo para entrar em vigência. Ex: Pacote anticrime. Durante o período de vacatio legis a lei penal não pode ser aplicada, mesmo que seja mais favorável ao réu. F) Pode acontecer da lei posterior conter preceitos mais rígidos e outrosmais brandos. Segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal – STF, não é possível a combinação de Professor MÁRIO GUARNIERI – DIREITO PENAL Página | 4 leis penais, ou seja, aplicar parte de uma lei e parte da outra. 2.1 LEI TEMPORÁRIA E LEI EXCEPCIONAL A LEI TEMPORÁRIA é aquela que tem a sua vigência predeterminada no tempo, isto é, o seu termo final é explicitamente previsto em data certa do calendário. Ex: Lei Geral da Copa do Mundo de Futebol de 2014, lei n. 12.663/2012. Por sua vez, a LEI EXCEPCIONAL é a que se verifica quando sua duração está relacionada a situações de anormalidade (calamidade, guerra, etc). Sua vigência se dá, apenas, no período de tais condições, ou seja, fora dos períodos “normais”. Essas duas leis são autorrevogáveis, não precisam de outra lei para que sejam revogadas. Basta a superveniência do dia nela previsto (lei temporária) ou o fim da situação de anormalidade (lei excepcional), para que deixem automaticamente de produzir seus efeitos legais. Essas leis são dotadas de A extratividade se subdivide em retroatividade e ultratividade. RETROATIVIDADE: Aplicação da lei nova a fatos anteriores a sua vigência, nesse caso, a regra é o princípio da irretroatividade, ou seja, nenhuma lei poderá retroagir para alcançar fatos anteriores a sua vigência, salvo se for beneficiar o réu. ULTRATIVIDADE. Mesmo após a sua revogação ainda persistem seus efeitos para que aquele que praticou o crime previsto na referida lei excepcional ou temporária seja julgado. 2.2 COMBINAÇÃO DE LEIS A posição atual dos tribunais superiores é no sentido de que não é possível a combinação de leis, em homenagem ao princípio da reserva legal. 2.3 LEI INTERMEDIÁRIA É possível, naqueles casos em que há sucessão de leis penais, a aplicação de uma lei intermediária mais favorável ao réu, ainda que não seja a lei em vigor quando da prática da infração penal ou a lei vigente a época do julgamento. Essa lei é dotada, ao mesmo tempo, de retroatividade e ultratividae. EXERCÍCIOS 01. (CESPE - 2018 - PC-MA - Investigador de Polícia) Para solucionar o conflito aparente de normas, são empregados os princípios da: A) especialidade e da subsidiariedade. B) especialidade e da proporcionalidade. C) proporcionalidade e da subsidiariedade. D) subsidiariedade e da fragmentariedade. E) fragmentariedade e da especialidade. 02. (VUNESP - 2018 - MPE-SP - Analista Jurídico do Ministério Público) Sobre o conflito aparente de normas penais e os princípios dirimentes, é correto afirmar que: Professor MÁRIO GUARNIERI – DIREITO PENAL Página | 5 A) a norma especial prevalece sobre a norma geral e, necessariamente, descreve um tipo penal apenado mais severamente. B) o conflito aparente de normas penais tem por requisito a unidade fática; a pluralidade de normas aplicáveis ao mesmo fato (aparente) e a vigência contemporânea de todas elas. C) a norma subsidiária descreve um grau maior de lesividade ao bem jurídico e, necessariamente, um tipo penal apenado mais severamente. D) a consunção, pela qual uma conduta absorve outra, é possível no crime progressivo, no crime complexo e na progressão criminosa. Em todos, necessariamente, há unidade de desígnios do sujeito ativo, desde o primeiro ato. E) pelo princípio da subsidiariedade, prescinde-se do caso concreto para se saber qual a norma aplicável. A análise é feita de forma abstrata, confrontando-se as normas. 03. (FGV - 2018 - TJ-AL - Técnico Judiciário - Área Judiciária) Arlindo desferiu diversos golpes de faca no peito de Tom, sendo que, desde o início dos atos executórios, tinha a intenção de, com seus golpes, causar a morte do seu desafeto. No início, os primeiros golpes de faca causaram lesões leves em Tom. Na quarta facada, porém, as lesões se tornaram graves, e os últimos golpes de faca foram suficientes para alcançar o resultado morte pretendido. Arlindo, para conseguir o resultado final mais grave, praticou vários atos com crescentes violações ao bem jurídico, mas responderá apenas por um crime de homicídio por força do princípio da: A) subsidiariedade, por se tratar de progressão criminosa; B) alternatividade, por se tratar de crime progressivo; C) consunção, por se tratar de progressão criminosa; D) especialidade, por se tratar de progressão criminosa; E) consunção, por se tratar de crime progressivo. 04. (INSTITUTO AOCP - 2019 - PC-ES - Escrivão de Polícia) A impossibilidade da lei penal nova mais gravosa ser aplicada em caso ocorrido anteriormente à sua vigência é chamada de: A) princípio da ultra-atividade da lei nova. B) princípio da legalidade. C) princípio da irretroatividade. D) princípio da normalidade. E) princípio da adequação. 05. (FUNDATEC - 2018 - PC-RS - Escrivão e de Inspetor de Polícia – Tarde) A regra geral em direito é a aplicação da lei vigente à época dos fatos (tempus regit actum). No campo penal, não ocorre de maneira diferente, pois, ao crime cometido em determinada data, aplicar-se-á a lei penal vigente ao dia do fato. Considerando o conceito e o alcance da lei penal no tempo, assinale a alternativa INCORRETA. A) A exceção à regra geral é a extratividade, ou seja, a possibilidade de aplicação de uma lei a fatos ocorridos fora do âmbito de sua vigência. O fenômeno da extratividade, no campo penal, realiza-se em dois ângulos: retroatividade e ultratividade. B) A ultratividade é a aplicação da norma penal benéfica a fato criminoso acontecido antes do período da sua vigência. C) O Código Penal Brasileiro, no artigo 2º, faz referência somente à retroatividade, pelo fato de estar analisando a aplicação da lei penal sob o ponto de vista da data Professor MÁRIO GUARNIERI – DIREITO PENAL Página | 6 do fato. Desta maneira, ou se aplica o princípio regra (tempus regit actum), se for o mais benéfico, ou se aplica a lei penal posterior, se for a mais benigna (retroatividade). D) Para a definição da lei penal mais favorável, deve-se ter em vista, como marco inicial, a data do cometimento da infração penal, e, como marco final, a extinção da punibilidade pelo cumprimento da pena ou outra causa qualquer. De toda sorte, durante a investigação policial, processo ou execução da pena, toda e qualquer lei penal favorável, desde que possível a sua aplicação, deve ser utilizada em favor do réu. E) A abolição do delito (abolitio criminis) é um fenômeno que ocorre quando uma lei posterior deixa de considerar crime determinado fato. Essa hipótese gera a extinção da punibilidade. 06. (CESPE - 2018 - PC-MA - Escrivão de Polícia Civil) A aplicação do princípio da retroatividade benéfica da lei penal ocorre quando, ao tempo da conduta, o fato é A) típico e lei posterior suprime o tipo penal. B) típico e lei posterior provoca a migração do conteúdo criminoso para outro tipo penal. C) ípico e lei posterior aumenta a pena correspondente ao crime. D) típico e lei posterior acrescenta hipótese de aumento de pena. E) atípico e lei posterior o torna típico. 07. (VUNESP - 2019 - TJ-RO - Juiz de Direito Substituto) Tendo em conta as normas previstas no Código Penal relacionadas à aplicação da lei penal, assinale a alternativa correta. A) As leis intermitentes vigoram por prazo determinado e têm por característica a não ultratividade. B) A lei penal mais gravosa aplica-se ao crime continuado, se sua vigência é anterior à cessação da continuidade. C) A lei penal não retroagirá, exceto se mais benéfica ao réu, desde que não iniciada a execução penal fixada em condenação transitada em julgado. D) O princípio da continuidade normativa permite reconhecer abolitio criminis pela revogação da lei, se a conduta permanece típica emoutro dispositivo legal. E) A lei intermediária – vigente entre a data do fato e do julgamento – se mais favorável, terá dupla extra atividade: irretroatividade quanto à lei vigente na data do fato e ultratividade quanto à vigente na data do julgamento. 08. (MetroCapital Soluções - 2019 - Prefeitura de Conchas - SP - Procurador Jurídico) No que se refere ao tema da aplicação das leis penais, analise os itens a seguir e, ao final, assinale a alternativa correta: I – A lei posterior que, de qualquer modo, favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, mesmo tendo sido decidido por sentença transitada em julgado. II – A lei posterior que, de qualquer modo, favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, inclusive sobre os afetados por leis temporárias ou excepcionais. III – A lei excepcional ou temporária, depois de decorrido o tempo de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, não mais se aplica ao fato praticado durante a sua vigência. Professor MÁRIO GUARNIERI – DIREITO PENAL Página | 7 A) Apenas o item I é verdadeiro. B) Apenas o item II é verdadeiro. C) Apenas o item III é verdadeiro. D) Apenas os itens II e III são verdadeiros. E) Nenhum dos itens é verdadeiro. QUESTÃO GABARITO 01 A 02 B 03 E 04 C 05 B 06 A 07 B 08 A
Compartilhar