Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Brasília-DF. Ultrassonografia VascUlar, articUlar e abdominal de PeqUenos animais Elaboração André Luiz Veiga Conrado Produção Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração Sumário APRESENTAÇÃO ................................................................................................................................. 4 ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA .................................................................... 5 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 7 UNIDADE I ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS ....................................................................... 9 CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO E DEFINIÇÕES .................................................................................................... 9 CAPÍTULO 2 OPERANDO O EQUIPAMENTO DE ULTRASSOM NA MODALIDADE DOPPLER .............................. 21 CAPÍTULO 3 APLICAÇÕES DO ESTUDO DE PEQUENOS VASOS E MICROCIRCULAÇÃO COM ULTRASSONOGRAFIA DOPPLER ............................................................................................... 27 UNIDADE II ULTRASSONOGRAFIA ARTICULAR EM PEQUENOS ANIMAIS..................................................................... 30 CAPÍTULO 1 CONSIDERAÇÕES GERAIS ...................................................................................................... 30 CAPÍTULO 2 AVALIAÇÃO DAS ARTICULAÇÕES ............................................................................................ 33 UNIDADE III ULTRASSONOGRAFIA ABDOMINAL EM PEQUENOS ANIMAIS .................................................................. 44 CAPÍTULO 1 CONCEITOS BÁSICOS DA ULTRASSONOGRAFIA ABDOMINAL ................................................... 44 CAPÍTULO 2 ASPECTOS ULTRASSONOGRÁFICOS DOS ÓRGÃOS ABDOMINAIS NORMAIS E ALTERADOS ........ 49 REFERÊNCIAS ................................................................................................................................ 109 4 Apresentação Caro aluno A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da Educação a Distância – EaD. Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo. Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira. Conselho Editorial 5 Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta para aprofundar seus estudos com leituras e pesquisas complementares. A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos e Pesquisa. Provocação Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor conteudista. Para refletir Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões. Sugestão de estudo complementar Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo, discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso. Atenção Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a síntese/conclusão do assunto abordado. 6 Saiba mais Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões sobre o assunto abordado. Sintetizando Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos. Para (não) finalizar Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado. 7 Introdução O uso da ultrassonografia na Medicina Veterinária é amplamente difundido, pois é um método diagnóstico não invasivo de tecidos moles e, recentemente, também da superfície dos tecidos ósseos. A habilidade em ultrassonografia abdominal requer um alto nível de destreza e coordenação dos olhos, assim como conhecimento de anatomia, fisiologia, fisiopatologia, efeitos das diferenças corporais, capacidade e limitação dos equipamentos (transdutor), e também conhecimento dos artefatos gerados durante um exame. É de grande importância que o iniciante desenvolva um método de exame sistemático para a ultrassonografia abdominal, garantindo maior consistência na identificação de todos os órgãos e estruturas e, assim, melhorando a eficácia da técnica. As informações primordiais da localização e da imagem ultrassonográfica normal dos respectivos órgãos fazem com que o operador utilize esse conhecimento na identificação de doenças a que a espécie animal comumente é acometida. Nesse contexto, é necessário conhecer o que é normal para, depois, saber identificar o anormal (KEALY; McALLISTER, 2005). O conhecimento da anatomia topográfica e ultrassonográfica, incluindo as suas variações dos órgãos abdominais, principalmente de fígado, baço, rins, pâncreas, glândulas adrenais e bexiga de cães e gatos adultos e filhotes, são de fundamental importância para a aprendizagem da ultrassonografia abdominal em pequenos animais. Isso porque, com o conhecimento de topografia anatômica, padrões de ecogenicidade e arquitetura dos órgãos abdominais, bem como conhecimento dos princípios de formação da imagem ultrassonográfica, o operador obterá subsídios para a realização de um exame ultrassonográfico útil. As principais peculiaridades do método ultrassonográfico são: as imagens seccionais podem ser obtidas em qualquer orientação espacial; não apresenta efeitos nocivos significativos; possibilita o estudo não invasivo da hemodinâmica corporal pelo efeito Doppler; a aquisição de imagens é realizada praticamente em tempo real, permitindo o estudo do movimento de estruturas corporais (SANTOS, 2009). 8 Objetivos » Introduzir os conhecimentos sobre a ultrassonografia Doppler para a avaliação de fluxos arteriais e venosos no sistema circulatório de grandes vasos e no interior dos órgãos. » Descrever a técnica ultrassonográfica, a morfologia ultrassonográfica e as alterações dos órgãos abdominais. » Estabelecer as possibilidades do uso da ultrassonografia na avaliação de articulações de pequenos animais. 9 UNIDADE I ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS CAPÍTULO 1 Introdução e definições Introdução A ultrassonografia Doppler no diagnóstico médico começou no ano 1956 com o trabalho de Shigeo Satomura na Universidade de Osaka. Inicialmente, Satomura e colaboradores reportaram a detecção com Doppler do movimento das paredes cardíacas. Desde aquela época têm sido publicadas inúmeras pesquisas sobre a ultrassonografia Doppler, mais intensamente a partir de1980, quando se popularizou a aplicação dessa técnica diagnóstica na detecção de doenças. Um dos primeiros estudos que envolvia circulação menor foi o de Suzuki e Satomura, no ano 1958, sobre a pulsatilidade do globo ocular (CASTELLÓ et al., 2015). Desde então, a ultrassonografia Doppler tem passado por uma constante evolução de equipamentos e técnicas, possibilitando o estudo não invasivo da hemodinâmica corporal. A ultrassonografia Doppler aportou novas possibilidades de estudo do fluxo sanguíneo e da microcirculação nos órgãos. Considera-se microvasculatura os vasos de diâmetro médio inferior a 100 μm e de velocidade de fluxo inferior a 10 mm/s. Esses vasos são as arteríolas, os capilares e as vênulas. Essa técnica está bem estabelecida na Medicina Diagnóstica. Em algumas áreas, como na cirurgia vascular, nefrologia e cardiologia, nas quais o Doppler vem sendo empregado há vários anos, existem muitas orientações e treinamento para a padronização da aquisição de imagens. Porém, não existem muitas diretrizes para o uso da ultrassonografia Doppler no estudo de pequenos fluxos, apesar de ter ganhado muita importância durante os últimos anos, aportando novos conhecimentos em campos como a oncologia, obstetrícia, cirurgia de transplantes e reumatologia. 10 UNIDADE I │ ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS No entanto, esta é uma ferramenta pouco utilizada na medicina veterinária, e ainda é menos usada para o estudo de mapeamento de pequenos fluxos devido, principalmente, ao pouco treinamento do médico veterinário, em consequência da pequena quantidade de dados sobre o assunto na literatura veterinária quando comparado aos dados da medicina (CASTELLÓ et al., 2015). Doppler A ultrassonografia é um método de obtenção de imagens não invasivo e seguro, o qual se baseia na obtenção de imagens empregando técnicas de transmissão de pulsos ultrassonográficos, detecção dos ecos, processamento desses ecos e exibição na tela do aparelho. O princípio físico da ultrassonografia em modo Doppler baseia-se no efeito Doppler, o qual descreve a mudança na frequência de onda do som que se produz quando existe movimento relativo entre a fonte emissora e o receptor. A ultrassonografia Doppler usa a informação adicional nos ecos que retornam para avaliar o movimento de alvos móveis. Quando o som de alta frequência colide com uma interface estacionária, o som refletido tem essencialmente a mesma frequência ou o mesmo comprimento de onda do som transmitido. Contudo, se a interface refletora estiver em movimento com relação ao feixe sonoro emitido pelo transdutor, como no caso das células sanguíneas, haverá uma mudança na frequência do som, que se dispersa pelo objeto em movimento. Quando a interface refletora aproxima-se do transdutor, as ondas são percebidas com maior frequência, e, por outro lado, quando a interfase refletora distancia- se, são percebidas com menor frequência. Na prática, dentro dos vasos existem muitas células sanguíneas refletindo os ultrassons, e essas células movimentam- se com diferentes velocidades e ângulos variados. Assim, os ecos recebidos terão uma ampla gama de frequência e diversas amplitudes a serem analisadas. As frequências dos desvios Doppler são extraídas a partir do sinal complexo detectado e são avaliados pelos analisadores de frequência, que são circuitos eletrônicos capazes de separar as diversas frequências existentes no volume de amostragem e apresentá-las em forma de gráfico (CASTELLÓ et al., 2015). Em contraste com a ultrassonografia bidimensional em escala de cinza, que exibe a informação de interfaces teciduais, os instrumentos de ultrassom Doppler são otimizados para exibir informação sobre fluxo; permitem, assim, a avaliação da hemodinâmica por meio da análise do 11 ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS │ UNIDADE I som emitido, das ondas espectrais de velocidade e do mapeamento colorido (CASTELLÓ et al., 2015). Diferentes técnicas foram desenvolvidas para explorar todas essas informações que a mudança na frequência dos ultrassons proporciona. Assim, atualmente, existem vários modos de exibição dessa informação, sendo eles: Doppler contínuo, Doppler pulsado, Doppler colorido e Doppler de amplitude. No modo Doppler contínuo, são usados dois cristais piezoelétricos, um para emitir os pulsos e outro para receber os ecos desses pulsos. Já nos outros modos é usado um só cristal piezoelétrico, que serve como emissor e receptor. Entre esses modos, os usados para o estudo de pequenos vasos e microcirculação são, principalmente, o Doppler colorido e o Doppler de amplitude. Ocasionalmente, também é usado o Doppler pulsado. No estudo da microcirculação, o Doppler pulsado costuma a ser usado conjuntamente com o Doppler colorido, no nomeado tríplex Doppler (CASTELLÓ et al., 2015). O termo ecografia Doppler ou sonografia “Duplex” ou “Triplex”, usado em alto grau dentro do campo da ultrassonografia, indica o uso adicional do princípio Doppler para medir os parâmetros dos fluxos sanguíneos em determinados órgãos. A ultrassonografia Doppler é usada para identificar o fluxo e a velocidade do sangue, como também para calcular os gradientes de pressão pelas válvulas cardíacas. São conhecidos os seguintes tipos de Doppler: o Doppler de ondas contínuas, o Doppler duplex, o Doppler de ondas pulsadas e o Doppler de fluxo colorido (mais usado). O princípio Doppler baseia-se na mudança de frequência do som conforme ele se aproxima ou se afasta de um objeto. Quando ondas de ultrassom com uma frequência conhecida encontram-se com células sanguíneas que se movem na direção do transdutor, a frequência das ondas sonoras refletidas sofre um aumento e, conforme elas se afastam, a frequência é reduzida. O fluxo de sangue direcionado ao transdutor é visto acima da linha base, e o fluxo que se afasta é visto abaixo da linha base. O fluxo Doppler exibe uma imagem no modo-M com o fluxo sanguíneo. A cor que indica as direções do fluxo em aproximação geralmente é vermelha, e a que indica afastamento, azul (KEALY; McALLISTER, 2005). » Doppler colorido: no Doppler colorido, a apresentação em tempo real de informações de fluxo em cor é sobreposta à imagem em escala de cinza, em modo-B. Os sinais eco do sangue e tecidos são processados pelo sistema eletrônico por duas vias. Por um 12 UNIDADE I │ ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS lado, alvos estacionários ou em movimento lento fornecem a base da imagem em modo B; por outro lado, são captados os ecos das células sanguíneas, como desvios de efeito Doppler, e os desvios médios de frequência são processados, fornecendo informação acerca da presença e direção do movimento, dando, assim, imagens em cores. » Existem diferentes volumes de amostragem dentro de uma região circunscrita, chamada de caixa colorida. Essa caixa colorida é dividida em vários volumes de amostragem, cada um dos quais é submetido a um processamento de análise independente. O desvio de frequência significativo de cada volume é calculado e mostrado como uma cor, em função da direção do fluxo em relação ao transdutor (Figura 1). Assim, para representar o mapeamento do movimento, é apresentada uma imagem colorida sobre a imagem em modo-B. A exibição de fluxo em todo o campo de imagem permite observar a posição e a orientação do vaso de interesse em todos os momentos; o contraste do fluxo na luz do vaso permite visualizar os vasos pequenos, que são invisíveis pelos métodos convencionais de obtenção de imagens (CARVALHO et al., 2008; CASTELLÓ et al., 2015). » Doppler pulsado e tríplex Doppler: no mapeamento Doppler pulsado, ou espectral, os ultrassons são produzidos em pulsos sonoros, permitindo um intervalo entre a transmissão do pulso e o retorno do eco. Com isso, o volume sensível a partir do qual os dados são amostrados pode ser controlado em termos de forma, profundidade e posição (CASTELLÓ et al., 2015). O volume da amostra a ser avaliada é representadopor um cursor retangular móvel, ajustável pelo operador, que capta os ecos originados do sangue em movimento que irão atingir o transdutor. » O Doppler pulsado pode ser usado por conta própria, alterando lentamente a direção do feixe ou a profundidade, por exemplo, em estudos de circulação transcranial. Porém, é mais usado em combinação com ultrassom em modo B, formando o sistema duplex, com a imagem em tempo real e a localização do vaso alvo disposta na tela em modo bidimensional (CARVALHO et al., 2008). No estudo da microcirculação, o Doppler pulsado é exibido junto com o Doppler colorido, sendo denominado tríplex Doppler (Figura 1). Isso permite uma melhor identificação do vaso alvo, disposta na tela em modo Doppler colorido. 13 ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS │ UNIDADE I Figura 1. Avaliação de fluxo artéria carótida. Vel +1 = 113,1 cm/s Vel +2 = 113,1 cm/s AC 60º 150 100 50 cm/s - 50 Neste caso, a caixa colorida é cônica e, em seu interior, está posicionado volume de amostra com o ângulo de intersecção (AC) em 60 graus. O traçado do Doppler pulsado apresenta os picos das velocidades sistólica e diastólica. Fonte: Arquivo pessoal do autor, 2020. Controles do aparelho para uso do Doppler Os equipamentos modernos permitem o uso de vários processos de otimização das imagens, além de demonstrar, simultaneamente, a imagem em modo bidimensional em tempo real, os gráficos de velocidade do Doppler pulsado e o mapeamento do Doppler colorido. Os parâmetros e ajustes de processamento de sinal podem ser modificados, permitindo ao examinador explorar os recursos do equipamento para melhorar a qualidade da imagem (CARVALHO et al., 2008). Os principais parâmetros ajustáveis para o estudo da microcirculação são: a frequência Doppler, o tamanho da caixa colorida, o ganho, a frequência de repetição de pulso e os filtros de parede. Estes serão discutidos a seguir, baseando-se nos trabalhos de Carvalho et al. (2008), Sartor e Mamprim (2009), Carvalho et al. (2012) e Castelló et al. (2015). a. Frequência Doppler: uma frequência Doppler menor permitirá mais penetração, porém oferecerá uma imagem com mais pixels. Assim, a maior frequência Doppler dá uma imagem mais detalhada dos vasos, mas à custa de penetração. Para o exame de vasos profundos, como os abdominais, costuma-se usar uma frequência baixa, na faixa de 5,0 a 7,5 MHz. No entanto, com frequências tão 14 UNIDADE I │ ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS baixas, a ultrassonografia Doppler sofre severas limitações para o exame de pequenos vasos e microcirculação. Essas limitações incluem dificuldade para detectar pequenas frequências produzidas por fluxos muito lentos e dificuldade para detectar o sinal de volumes de sangue muito pequenos. Para poder detectar vasos menores que arteríolas, nesse caso, recomenda-se usar Doppler de amplitude na frequência mais alta possível para essa profundidade. Para avaliação de vasos superficiais, como no caso do estudo de lesões em tendões, costumam-se usar frequências maiores, entre 10 e 18 MHz. Para o estudo de microcirculação, essa frequência pode ser aumentada até 50 MHz, se for necessário e o transdutor permitir. Apesar de existirem essas indicações, a frequência ideal deve ser encontrada na prática, e não em teoria. b. Tamanho da caixa colorida: a região de amostragem deverá ser a menor possível e restrita à área de maior interesse, a fim de melhorar a taxa de quadros e a resolução espacial, além de minimizar erros de processamento provocados pela pulsação transmitida pelas estruturas ao redor do vaso, ou por movimentos do paciente. Quanto menor for a janela de cor, mais rápida será a taxa de quadro, vice-versa. c. Ganho: o ganho Doppler é independente do ganho da escala de cinza, e o seu ajuste determina a sensibilidade do sistema ao fluxo; reduzindo o ganho, serão impedidos ruídos e artefatos de movimento, mas os sinais de fluxo fracos não serão detectados. Portanto, é importante achar o equilíbrio para detectar os fluxos de interesse sem ter um ganho excessivo. O ajuste excessivo de ganho durante o exame Doppler produz sinais em áreas onde não há fluxo sanguíneo, chamados de fluxo artefatual, mostrando uma imagem com pixels coloridos extraluminais. Uma forma de conseguir um bom ajuste do ganho é aumentá-lo até aparecer ruído aleatório e, em seguida, baixá-lo até o ruído desaparecer. Assim, conseguimos o máximo ganho sem presença de fluxo artefatual. d. Ângulo Doppler: o ângulo entre o caminho dos pulsos Doppler e a direção do vaso deve ser corrigido antes de realizar as medidas de velocidade, particularmente quando o ângulo for maior de 60º. Nesse caso, pequenas alterações podem resultar em mudanças significativas 15 ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS │ UNIDADE I na velocidade calculada e, portanto, em medições inexatas. Quando esse ângulo for de 90º, a imagem aparecerá obscura ou com ruído, devido ao mínimo ou ao ausente deslocamento de frequência. Nesse caso, o vaso deverá ser examinado numa posição diferente para conseguir um ângulo mais agudo. Se isso não for possível, devem- se utilizar transdutores lineares com feixes sonoros que emitam ondas em ângulo mais agudo, ao passo que a imagem bidimensional permanece a mesma. e. Frequência de repetição de pulso (PRF): a amostragem possui uma frequência específica de pulsação (pulsos por segundo), denominada frequência de repetição de pulso (PRF), que determina a frequência máxima detectável pelo equipamento. O ajuste desse controle determina a frequência de pulsação do feixe de mapeamento Doppler, definindo os limites de velocidades que podem ser amostrados sem a ocorrência de artefatos. Se a PRF estiver muito baixa, ocorrerá aliasing, e, no caso de PRF muito elevada, lacunas coloridas ilegítimas irão aparecer e imitar uma trombose ou obstrução. O ajuste correto permite uma aparência normal e homogênea do sinal do fluxo. Em geral, alta PRF é aplicada para evitar o aliasing em regiões de elevada velocidade de fluxo sanguíneo. Os fluxos mais lentos, como no caso de pequenos vasos e microcirculação, precisam de baixa PRF para serem detectados, com a qual será mais difícil evitar o aliasing. 6. Filtros: os aparelhos Doppler têm filtros que eliminam os sinais de baixa frequência, provenientes de movimentos dos vasos e das partes moles, causados pela respiração e/ou movimentação do paciente, para que estes não sejam visíveis nem audíveis no espectro Doppler (CARVALHO et al., 2008). O uso impróprio desse controle pode remover sinais de fluxo de baixa velocidade, resultando em erro de interpretação. Os filtros devem ser mantidos na sua posição mais baixa para o uso em microcirculação. Artefatos A detecção e a exibição da informação sobre frequência relacionada com alvos móveis acrescentam um conjunto de considerações técnicas especiais com relação aos artefatos gerados pelo Doppler. É importante conhecer a fonte desses artefatos e entender sua influência sobre a interpretação das medidas de fluxo obtidas. Em seguida, são descritos os artefatos mais comumente visualizados no exame da microcirculação. 16 UNIDADE I │ ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS a. Ruído aleatório: quando o ganho é demasiado elevado, ruído aleatório torna-se detectável em circuitos Doppler. Na imagem, vê-se como focos de cor aparecendo aleatoriamente, e é facilmente identificado como um artefato porque os focos de cor não reaparecem na mesma localização do eixo de fluxo verdadeiro. O ruído aleatório é utilizado para ajustar o ganho do Doppler, e desaparece quando esse é ajustado corretamente. b. Aliasing: este é um dos artefatos mais conhecido tanto no Doppler espectral quanto no Doppler colorido. Surge quando o desvio máximo da frequência produzido pelo movimento alvo é maior do que a metade da PRF, que é o denominado limite de Nyquist. Quando isso acontecer, serão exibidos desvios de frequência mais baixosque os existentes de fato, resultando no erro de informação sobre a velocidade e a direção do fluxo. Quando ocorre efeito aliasing no feixe Doppler espectral, parte do espectro que está acima do limite superior fica cortada e aparece erroneamente no lado oposto da linha de base, como a continuação do espectro propriamente dito. A altura do pico transferido é o dobro do que deveria ser se estivesse no lado correto. Nas imagens em modo Doppler colorido, fluxos que estão acima do limite de Nyquist são exibidos com direções erradas, aparecendo o aliasing como a cor vermelha no lugar de azul, vice-versa, e com a velocidade relativa incorreta; pelo tanto, também aparece alterado o matiz da cor. As soluções para reduzir os efeitos desse artefato seriam aumentar a PRF ou reduzir o ângulo Doppler, diminuindo o desvio de frequência; deslocar a linha de base; ou reduzir a frequência do transdutor. Em alguns exames de microcirculação com Doppler colorido, em que o estudo é centrado na aparição e na distribuição do fluxo, sem interesse na velocidade ou direção, o aliasing não é importante e não deve ser evitado por aumento da PRF, já que isso poderia levar à subdetecção de fluxo. Isso pode acontecer em estudos de neovascularização em tumores ou de inflamação em lesões musculoesqueléticas. c. qualquer superfície lisa altamente refletora pode atuar como um espelho acústico. O modo Doppler é tão propenso a espelhamento como o modo-B. O artefato de espelho é facilmente visto como tal quando a imagem falsa é uma cópia justaposta da imagem verdadeira. A imagem do espelho é ligeiramente mais complicada de detectar quando a imagem falsa não aparece da mesma forma que a verdadeira. 17 ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS │ UNIDADE I Interpretação da imagem a. Em Doppler colorido: Doppler colorido propicia dados sobre a arquitetura vascular do órgão e fornece o mapeamento vascular da região em estudo. Em relação à direção e à velocidade do movimento das células sanguíneas, o sinal recebido é decodificado por cores e intensidades da cor, respectivamente. Assim, é apresentada uma imagem colorida que representa um mapeamento dos componentes móveis em relação à velocidade e ao sentido do movimento. Os sinais da movimentação das células sanguíneas são codificados por cores em função do sentido de seu movimento em direção ao transdutor, ou contrário a ele. A intensidade das cores (nuances) também indica a velocidade relativa das células. Por convenção, o fluxo em direção ao transdutor é vermelho, e o fluxo em direção contrária ao transdutor é azul. Os fluxos de maior velocidade são demonstrados por tonalidades mais claras, como amarelo e laranja (dirigidos ao transdutor) e tons de azul claro ou verde (contrários ao transdutor). Essa direção do fluxo em relação ao transdutor é ilustrada em uma barra vertical colorida na lateral da imagem, onde a parte superior da barra, geralmente de cor vermelha, é usada para indicar um fluxo em direção ao transdutor; e a parte inferior da barra, geralmente em cor azul, indica o fluxo que se distancia. O grau de saturação da cor é usado para indicar a velocidade relativa, sendo que essa barra apresenta também valores numéricos, indicando um intervalo com limiar superior e inferior de velocidade. Uma vantagem da técnica Doppler colorido é fornecer informações sobre o movimento em uma grande parte da imagem. Essa técnica permite avaliar a presença, a direção e a qualidade do fluxo sanguíneo mais rapidamente do que qualquer outra técnica não invasiva, até mesmo em vasos pequenos, que não aparecem no modo bidimensional. Também é possível a diferenciação entre fluxos rápidos e lentos sem a determinação de valores absolutos. As limitações do fluxo Doppler colorido incluem dependência do ângulo, aliasing, incapacidade de exibir todo o espectro Doppler na imagem e artefatos causados pelo ruído. O aliasing, nesse método, produz inversão de cor no centro do vaso, com uma mistura de cores na porção brilhante do espectro colorido. Assim como no Doppler espectral, esse artefato deverá ser compensado pelo ajuste 18 UNIDADE I │ ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS da PRF. Artefatos de ruído promovem turbilhonamento dentro do lúmen de um determinado vaso em estudo, e são observados como a presença de áreas com mosaico de cores e tonalidades variadas. Os mapeamentos coloridos permitem a análise da presença ou ausência do fluxo, direção do fluxo, velocidade média e presença ou não de turbulência dentro do vaso. A ausência de sinal Doppler, ou seja, de cor em um determinado segmento de um vaso ou em parte dele, pode sugerir oclusão, trombose ou estenose, uma vez descartada a possibilidade de artefato de técnica. No estudo de pequenos vasos e microcirculação, o Doppler colorido analisa a presença e ausência do fluxo, o estudo da distribuição, a direção e a velocidade, permitindo estudar vários tipos de lesão e tumor. b. Em Doppler espectral: no Doppler espectral, os dados sobre o desvio Doppler são representados na forma de gráficos, como um espectro temporal do sinal que retorna (Figura 2). O tempo decorrido fica no eixo horizontal ou na linha de base, e a frequência de deslocamento Doppler pode ser vista no eixo vertical. A detecção de desvio da frequência Doppler indica movimento do alvo, que, na maioria dos casos, está relacionado com a presença de fluxo. O sinal de desvio da frequência, positivo ou negativo, indica a direção do fluxo com relação ao transdutor. Por convenção, o traçado espectral é disposto acima do zero da linha de base (desvio positivo) quando a frequência do eco retornado é maior do que a frequência transmitida e, portanto, o fluxo encontra-se na direção do transdutor. Um traçado disposto abaixo da linha de base (desvio negativo) indica que o fluxo está direcionado no sentido contrário ao transdutor, e a frequência retornada é menor do que a frequência transmitida. Durante o exame com Doppler pulsado, a frequência de deslocamento Doppler não é disposta somente graficamente, pois também são audíveis. As artérias têm som parecido com um assovio, enquanto as veias possuem som parecido com o vento soprando continuamente. Graficamente, as artérias apresentam um traçado em que o fluxo sistólico se observa em forma de picos, e o fluxo diastólico, como um declive próximo da linha base. Dependendo da resistividade do fluxo (alta, intermediária ou baixa), o mapeamento espectral apresenta diferentes padrões. O padrão de fluxo venoso geralmente é laminar. As condições de pressão intratorácica e intra-abdominal, durante a inspiração e a expiração, influenciam a velocidade de fluxo sanguíneo nas veias, promovendo alterações de fase. 19 ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS │ UNIDADE I A maioria das veias tem baixo grau de plasticidade e periodicidade. Para se obter uma análise quantitativa do traçado Doppler, os aparelhos têm a capacidade de calcular a média da frequência de deslocamento ou a velocidade, automaticamente. O ponto máximo alcançado no espectro é denominado velocidade de pico sistólico (VPS), e o ponto mínimo na morfologia da onda é o valor da velocidade diastólica final (VDF). O fluxo médio pode ser calculado multiplicando-se a velocidade média pela área do vaso. No entanto, informações sobre a impedância vascular não podem ser obtidas apenas pela velocidade absoluta, por isso foram desenvolvidos os índices Doppler. Esses índices comparam o fluxo durante a sístole e a diástole, sendo razões das velocidades obtidas do espectro Doppler. Por isso, ao contrário da análise isolada da velocidade, os índices têm como vantagem a independência da correção do ângulo, sendo usados para avaliação de vasos muito pequenos e tortuosos em que é difícil a correção do ângulo. Os índices Doppler, tais como a proporção sistólica/diastólica, o índice de resistividade e de pulsatilidade, fornecem informações acerca da resistência arterialao fluxo sanguíneo. Assim, indicam alterações que resultam de uma variedade de enfermidades. No estudo de pequenos vasos e microcirculação, esses índices são usados para avaliar alterações nos fluxos dos órgãos que podem indicar doenças, para definir o prognóstico e para acompanhar o tratamento. Os índices mais utilizados nas mensurações de pequenos vasos são o índice de resistividade (IR) e o índice de pulsatilidade (IP). O IR, descrito por Pourcelot em 1974, relaciona o resultado da subtração entre as velocidades de pico sistólico e diastólico final sobre a velocidade de pico sistólico (IR = VPS – VDF/ VPS). O IP, descrito por Grosling e King em 1975, relaciona o resultado da subtração entre as velocidades de pico sistólico e diastólico final sobre a velocidade média (IP = VPS – VDF/ VM). O aumento na velocidade diastólica leva a um correspondente aumento do fluxo sanguíneo e redução dos índices de resistividade e pulsatilidade. Portanto, baixa resistividade de fluxo sugere alto metabolismo, e altas resistências, baixo metabolismo. Já índices de resistência aumentados reduzem o fluxo diastólico. Dependendo da alteração que está ocasionando o aumento da resistência, pode-se encontrar até ausência de fluxo diastólico, ou a chamada diástole zero. A vantagem do IR é sua alta sensibilidade para diferenciar traçados anormais, porque o denominador nunca se torna zero, permitindo sempre a obtenção de um valor para esse índice. O IP tem como vantagem o fato de levar em conta a velocidade média, que reflete o que ocorre durante todo o ciclo cardíaco, e não em apenas um momento específico como o IR. As alterações dos índices hemodinâmicos auxiliam na 20 UNIDADE I │ ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS identificação da perfusão e de alterações na complacência do leito vascular em estudo, associadas à rejeição de transplantes, disfunções de parênquima ou caracterização de malignidade de doenças. Na estenose, há redução significativa do volume sanguíneo e aumento da velocidade deste, provocando turbulência e aumento do IR e do IP. Estados inflamatórios são caracterizados por aumento do fluxo sanguíneo em resposta à hiperemia, podendo ocorrer redução da resistência arterial nos tecidos ou órgãos envolvidos. Tem sido relatado aumento dos índices de resistividade em animais com hepatopatia crônica apresentando hipertensão portal (SARTOR; MAMPRIM, 2009) e em cães com infiltração gordurosa hepática difusa de forma proporcional à esteatose hepática (CARVALHO et al., 2012 apud CASTELLÓ et al., 2015). Os índices também podem ser utilizados para avaliação dos vasos em tumores, sendo encontrados aumentos significativos do IR e do IP em nódulos malignos da tireoide em relação aos nódulos benignos e aos vasos sanguíneos normais, de acordo com Zhou et al. (2012) apud Castelló et al. (2015). Figura 2. Doppler triplex da artéria carótida. PS = 88,8 cm/s ED = 17,5 cm/s IP = 2,13 IR = 0,80 AC 60º 80 60 40 20 cm/s - 20 - 40 Observe os valores registrados para a velocidade de pico sistólico (PS) e diastólico (ED), além dos cálculos automáticos para os índices de pulsatilidade (IP) e resistividade (IR). Fonte:próprio autor, 2020. 21 CAPÍTULO 2 Operando o equipamento de ultrassom na modalidade Doppler Exame sonográfico dos vasos sanguíneos Durante o exame de um vaso sanguíneo, o primeiro passo é imaginar o vaso usando uma técnica bidimensional em tempo real no plano longitudinal. Idealmente, o eixo do feixe de ultrassom e o eixo do vaso são paralelos entre si, mas seu ângulo de intersecção não deve exceder 60º. Utilizando o modo de cor, é possível determinar a presença ou a ausência de fluxo no vaso. Os parâmetros de cor devem ser definidos para que o lúmen do vaso seja preenchido com apenas uma cor (ou seja, sem aliasing), e informações de cor não devem ser vistas fora do lúmen do vaso (por exemplo, muito ganho de cor), mas todo o lúmen do vaso (periférico às paredes) deve ser preenchido com cor. Finalmente, o volume amostral é colocado em uma parte específica do vaso – de acordo com o método de velocidade máxima ou o método de insonação uniforme –, e, usando a técnica Doppler de onda pulsada, um rastreamento Doppler pode ser registrado a partir dessa parte específica do vaso. Se o rastreamento do Doppler estiver livre de artefatos, a imagem deverá ser congelada, e, após a correção do ângulo, a análise de forma de onda poderá ser realizada (SZATMÁRI; SÓTONYI; VÖRÖS, 2001). O perfil da velocidade de fluxos em artérias e veias e suas formas discutido a seguir baseia-se no trabalho de Szatmári, Sótonyi e Vörös (2001). Perfis de velocidade de fluxo de artérias A distribuição das velocidades de fluxo através do lúmen do vaso é exibida como uma faixa de frequência ou velocidade no espectro Doppler. Os perfis de velocidade de fluxo laminar são descritos como achatado/plug (faixa estreita de frequências/velocidades), semiparabólico (ampla gama de frequências/velocidades) ou parabólico (faixa intermediária). Turbulência também pode ser detectada. O sinal do Doppler audível produzido pelo fluxo laminar tem uma qualidade de “assobiar”. 22 UNIDADE I │ ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS O fluxo sanguíneo, na maioria dos vasos sanguíneos, é laminar, com sangue movendo-se em finas camadas concêntricas ou lâminas. As camadas centrais fluem mais rápido, enquanto as forças de fricção causam perda de energia e lentidão de camadas perto da parede do vaso (SZATMÁRI; SÓTONYI; VÖRÖS, 2001). Os tipos de fluxo laminar são: a. Perfil de velocidade de fluxo achatado (plug): em artérias maiores (por exemplo, a aorta) a velocidade do sangue é quase a mesma no centro do vaso como perto da parede do vaso. A grande maioria das células sanguíneas está se movendo a uma velocidade uniforme, assim a distribuição de velocidade é muito estreita através do lúmen do vaso (Figura 3). Como resultado, o espectro é caracterizado por uma linha fina em sístole que delineia um espaço claro, chamado janela espectral (ou janela sistólica). b. Perfil de velocidade de fluxo semiparabólico (blunted parabolic): em artérias menores (por exemplo, artéria renal), o sangue centralmente móvel tem maior velocidade em comparação ao sangue perto da parede do vaso, de modo que a distribuição de velocidade é ampla através do lúmen do vaso (Figura 3). A janela espectral não pode ser vista durante a sístole no visor do espectro, porque as células sanguíneas com uma gama de velocidades (de zero à velocidade máxima) fluem através do volume de amostra. c. Perfil de velocidade parabólica (parabolic): em artérias de médio porte (por exemplo, tronco celíaco), o fluxo é semelhante ao perfil de velocidade de fluxo achatado no centro do vaso (ou seja, células movendo-se a uma velocidade uniforme). No entanto, o fluxo é mais semelhante ao perfil de fluxo parabólico nas partes periféricas do lúmen do vaso. Células com uma pequena gama de velocidade são representadas no pico de sístole (fluxos com velocidade zero e lenta estão ausentes). A distribuição de velocidade através do lúmen do vaso é mais ampla do que em um vaso com perfil de velocidade de fluxo achatado, mas não tão amplo quanto o de um vaso com perfil de velocidade de fluxo parabólico (Figura 3). Assim, uma janela espectral está presente durante a sístole, mas é menor do que no espectro de uma artéria com perfil de velocidade de fluxo achatado. 23 ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS │ UNIDADE I Figura 3. Perfis de velocidade do sangue dentro de um vaso que se bifurca. A B C A - perfil de velocidade de fluxo achatado; B - perfil de velocidade de fluxo semiparabólico; C - perfil de velocidade de fluxo parabólico. (v = velocidade do fluxo, a = quantidade de células sanguíneas). Fonte: Adaptado de Szatmári, Sótonyi e Vörös, 2001; Carvalho et al., 2008. Fluxo turbulento Em bifurcações, curvas ou ramos, a ampla distribuição da velocidade (ou seja, ampliaçãoespectral) ou mesmo reversão de fluxo podem estar presentes, onde células com uma ampla gama de velocidades de zero a velocidades máximas negativas e positivas são representadas. As classes mencionadas acima (perfis de velocidade de fluxo parabólico achatado, semiparabólico e parabólico) não são rigorosas, pois um perfil de velocidade de fluxo pode ser transitório entre duas categorias. O tamanho e a posição do volume da amostra influenciam fortemente o padrão Doppler. O uso do método de insonação uniforme resulta em um espectro Doppler diferente do espectro obtido usando o método de velocidade máxima. Isso se deve à diferença no tamanho do volume de amostra. Não só o tamanho, mas também o local do volume amostral (gantry) através do lúmen do vaso influencia o espectro Doppler. Se um pequeno volume de amostra for colocado no centro de uma artéria com perfil de velocidade de fluxo parabólico, de acordo com o método de velocidade máxima – o espectro será diferente do obtido se o mesmo volume de tamanho for colocado na periferia da mesma artéria, ou se um maior volume amostral foi utilizado – de acordo com o método de insonação uniforme. 24 UNIDADE I │ ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS Formas de onda Doppler dos vasos sanguíneos O contorno da frequência máxima de deslocamento do Doppler corresponde à variação de tempo da velocidade máxima de fluxo dentro do vaso. A pulsatilidade da forma de onda está relacionada à impedância vascular fluxo abaixo até o ponto de medição. Os requisitos de perfusão de cada órgão determinam o estado de seu leito vascular, o que, por sua vez, afeta as características de fluxo de seus vasos associados. Cada contração cardíaca causa fluxo sanguíneo adiante e resulta em distensão das artérias. O fluxo reverso diastólico é devido ao sangue realmente se recuperando da aorta, uma vez que a onda de velocidade é refletida a partir da alta impedância do leito vascular periférico dos membros posteriores. À medida que os diâmetros dos vasos voltam ao normal, a energia de recuperação fornece energia necessária para promover o fluxo contínuo em diástole. O fluxo sanguíneo que entra nas artérias alimentando órgãos parenquimáticos (por exemplo, rins, fígado, baço), que constantemente requerem perfusão, normalmente tem fluxo contínuo e gradualmente diminui em diástole sem inversão de fluxo diastólico. » Padrão de fluxo de alta resistência: alta pulsatilidade e alta resistência ao fluxo são indicadas por picos sistólicos acentuados e reversão de fluxo no início da diástole (por exemplo, aorta). Observamos com arritmia sinusal marcada se o próximo batimento cardíaco for retardado (ou seja, a diástole é longa). Não há apenas duas ondas diastólicas (ou seja, o pico sistólico é seguido por uma onda de fluxo reverso, que é seguida por uma onda de fluxo à frente), mas contínuas oscilações podem ser vistas: a primeira onda de fluxo diastólico adiante é seguida por outra onda de fluxo reverso; em seguida, uma onda adiante vem, etc., até a próxima sístole. A amplitude das próximas ondas diastólicas é gradualmente menor, ou seja, a primeira onda de fluxo reverso diastólica é a mais alta entre as ondas de fluxo reverso diastólica de um complexo sístole-diástole, e a primeira onda de fluxo de avanço diastólica é a mais alta entre as ondas de fluxo diastólica para a frente. » Padrão de fluxo de baixa resistência: baixa pulsatilidade e baixa resistência ao fluxo são indicadas por picos sistólicos amplos e fluxo contínuo de alta velocidade em diástole, com velocidade gradualmente decrescente. As artérias de baixa resistência (por exemplo, artéria renal) fornecem sangue para órgãos que têm 25 ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS │ UNIDADE I demanda contínua. Essa demanda pode mudar de acordo com o estado funcional do órgão (por exemplo, estado pré e pós-prandial dos intestinos), enquanto isso o padrão de fluxo do Doppler do vaso também muda. » Padrão de fluxo de resistência intermediária: pulsatilidade intermediária e resistência intermediária ao fluxo são indicadas por picos sistólicos afiados (mais largos do que em artérias de alto padrão de fluxo de resistência) e fluxo adiante em diástole sem fluxo reverso (por exemplo, tronco celíaco). A velocidade de pico diastólica é menor do que no padrão de fluxo de baixa resistência em comparação ao pico de velocidade sistólica. » Fluxo venoso: normalmente, o fluxo nas veias é laminar. As condições de pressão intratorácica e intrabdominal durante a inspiração e a velocidade de fluxo sanguíneo de expiração nas veias levam a alterações fásicas. A maioria das veias tem plasticidade e periodicidade de baixo grau. As veias hepáticas e a parte craniana da veia caudal abdominal cava têm padrões Doppler com forte periodicidade devido ao efeito das mudanças de pressão atrial direita durante o ciclo cardíaco. » Pico sistólico precoce (ESP): geralmente, em um traçado de Doppler arterial, um pico sistólico pode ser visto durante cada sístole. Em alguns cães, há picos sistólicos duplos em determinadas artérias. Foi sugerido que o ESP em um rastreamento Doppler representa um pulso transmitido e que o segundo pico sistólico mais amplo que é visto em “artérias de baixa resistência” é um pico de conformidade. Além disso, a ausência de um ESP pode ser um achado normal na artéria renal (em humanos), e provavelmente está relacionado ao grau de conformidade vascular. Encontramos ESPs em artérias renais e esplênicas. Além disso, encontramos picos sistólicos duplos no tronco celíaco, nas artérias mesentéricas craniais e caudais, nas artérias lombares e nas artérias ilíacas circunflexas profundas. A morfologia dos picos sistólicos duplos nas últimas cinco artérias difere das duas primeiras artérias devido a diferenças na resistência vascular. O tronco celíaco e as artérias mesentéricas craniais e caudais são “artérias de resistência 26 UNIDADE I │ ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS intermediária”, e a artéria ilíaca circunflexa profunda e a artéria lombar são “artérias de alta resistência”, enquanto as artérias renais e esplênicas são artérias “de baixa resistência”. » Se um pico sistólico duplo está presente no padrão Doppler do tronco celíaco, nas artérias mesentéricas craniais e caudais ou na artéria ilíaca circunflexa profunda, o pico acentuado torna-se notado, onde o primeiro pico é maior do que o segundo. Isso contrasta com a morfologia do padrão Doppler das artérias de baixa resistência (por exemplo, artérias esplênicas e renais) onde o ESP é menor do que o segundo pico. 27 CAPÍTULO 3 Aplicações do estudo de pequenos vasos e microcirculação com ultrassonografia Doppler Atualmente, a ultrassonografia Doppler está bem estabelecida em muitos campos da Medicina e Medicina Veterinária. O seu uso está em aumento, sendo continuamente publicados estudos com propostas para aumentar sua aplicação. Na continuação, serão analisados a metodologia e os resultados de alguns estudos em diferentes áreas da medicina e da veterinária. » Estudo de tumores: uma das áreas em que a ultrassonografia Doppler, para microcirculação, está sendo mais aplicada é no estudo de tumores. Permite o estudo do fluxo sanguíneo, o qual pode ajudar num futuro a direcionar tratamentos mais específicos. Também é usada para estudar padrões de vascularização e neoangiogênese para identificar e classificar os tumores segundo a malignidade e para estudar fatores preditores de metástases. Exemplos de seu uso podem ser conferidos em Grano et al. (2013) e Navarro et al. (2018). O grande número de pesquisas publicadas que estudam o uso de ultrassonografia Doppler em tumores nos mostra a importância de ter um melhor conhecimento do fluxo nessas enfermidades, tanto para melhorar o diagnóstico e classificação quanto para introduzir novas terapias mais direcionadas e focalizadas no tumor, como ocorre com as nanoterapias (tratamento com nanopartículas quimioterápicas,com nanopartículas magnéticas, etc.). Na medicina veterinária, a experiência nessa área é praticamente inexistente, e o número de estudos publicados é muito menor. Provavelmente, essa será uma linha de pesquisa crescente nos próximos anos também na veterinária (CASTELLÓ et al., 2015). » Reprodutor feminino: nos exames dos órgãos reprodutores, o estudo de pequenos vasos e microcirculação com ultrassonografia Doppler também é muito usado, tanto para reprodutor feminino quanto masculino. Na medicina humana, a obstetrícia é uma área que publica muitas pesquisas com essa técnica, tanto para estudos de reprodução e enfermidades do sistema reprodutor quanto estudos do desenvolvimento e enfermidades fetais. Na medicina 28 UNIDADE I │ ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS veterinária, o Doppler colorido tem sido utilizado para diferenciação de folículo ovariano de cisto ovariano, pois foi relatado que só é possível a identificação dos vasos intraovarianos pelo Doppler colorido durante o ciclo estral (presença do folículo) ou fase lútea (presença de corpo lúteo) em cães, sendo que o fluxo se torna substancialmente diminuído no anestro, possibilitando a identificação do cisto quando associado à ausência de fluxo intraovariano visível (CASTELLÓ et al., 2015). » Reprodutor masculino: a ultrassonografia Doppler é uma técnica útil e não invasiva para identificar qualquer alteração no fluxo sanguíneo de testículos e escroto, e também para realizar o seguimento dos tratamentos. A ultrassonografia Doppler é uma ferramenta importante na avaliação andrológica em seres humanos, porém esse método ainda não está muito extenso na veterinária. Uma das primeiras aplicações foi na diferenciação entre epidídimo-orquite e torção testicular nos casos de escroto agudo. O primeiro caso está relacionado ao aumento do fluxo sanguíneo devido à hiperemia e à inflamação. Já o segundo caso está relacionado à redução do fluxo sanguíneo, podendo até mesmo não ser identificado nenhum sinal de fluxo no Doppler colorido. Em homens, os problemas de fertilidade idiopáticos frequentemente estão relacionados a compressões vasculares. Acredita-se que distúrbios similares poderiam acontecer em garanhões, por isso a ultrassonografia tríplex Doppler representa uma melhora no diagnóstico de desordens testiculares (CASTELLÓ et al., 2015). Souza et al. (2015) apud Castelló et al. (2015) realizaram um estudo de fertilidade em cães e incluíram exame ultrassonográfico em modo Doppler para analisar o fluxo sanguíneo testicular. Houve diferenças subjetivas na ecogenicidade testicular em alguns dos cães inférteis, e diferenças importantes no fluxo de sangue da artéria testicular marginal e artéria intratesticular, que apresentaram uma velocidade de pico sistólico e uma velocidade diastólica final nos cães estéreis, significativamente inferior à dos cães férteis. Os índices de resistência e pulsatilidade não diferiram entre cães inférteis e férteis. Esses resultados relatam diferenças importantes entre cães inférteis e férteis, que podem ser detectados sem um exame invasivo. 29 ULTRASSONOGRAFIA VASCULAR EM PEQUENOS ANIMAIS │ UNIDADE I » Sistema locomotor: o Doppler colorido tem várias utilidades no estudo das lesões do sistema locomotor. É usado para o diagnóstico de lesões que cursam com inflamação e que apresentam aumento do fluxo sanguíneo, bem como para o seguimento do tratamento. Na medicina veterinária, a ultrassonografia com Doppler colorido também é usada para diagnóstico, prognóstico e seguimento de lesões do locomotor, sobretudo na medicina esportiva equina (CASTELLÓ et al., 2015). 30 UNIDADE II ULTRASSONOGRAFIA ARTICULAR EM PEQUENOS ANIMAIS CAPÍTULO 1 Considerações gerais Introdução A ultrassonografia é utilizada como meio de diagnóstico por imagem complementar em ortopedia para avaliar os tecidos moles do sistema locomotor (músculos, cartilagens, tendões e ligamentos). Pode também auxiliar na avaliação dos contornos das superfícies ósseas. Desse modo, complementa a avaliação radiográfica, fornecendo informações morfológicas e estruturais desses componentes anatômicos (CARVALHO; VIANNA, 2016). Os conceitos e as orientações para exame de diferentes articulações de cães e gatos discutidos a seguir estão baseados em Carvalho e Vianna (2016). Considerações técnicas Para garantir boa resolução de imagem, é necessária a utilização de transdutores de alta frequência, entre 10 e 18 MHz, preferencialmente microlineares. Porém, a avaliação das articulações também pode ser realizada com transdutores microconvexos de alta frequência. A irregularidade dos contornos osteoarticulares proporciona falha na superfície de contato da pele com o transdutor, o que pode comprometer a formação da imagem. Isso pode ser amenizado com a utilização de quiteco ou de uma bolsa de gel que, ao mesmo tempo que aumenta a superfície de contato com o transdutor, também aumenta a distância deste à pele, colocando a área de interesse no foco da imagem na tela. Esse recurso pode ser necessário para examinar estruturas superficiais, como tendões e ligamentos. 31 ULTRASSONOGRAFIA ARTICULAR EM PEQUENOS ANIMAIS │ UNIDADE II A região a ser avaliada deve ser amplamente tricotomizada, devendo-se aplicar nela gel em grande quantidade. O posicionamento do animal é fundamental para a avaliação sonográfica adequada, de acordo com a articulação em estudo. Sedação ou anestesia somente é necessária quando há processos dolorosos intensos que impossibilitam o posicionamento do animal. Recomenda-se sempre a avaliação comparativa entre o membro ou a estrutura lesada e a estrutura íntegra no lado oposto. Além disso, por ser um exame dinâmico, é conveniente a avaliação sonográfica da estrutura durante o movimento passivo executado pelo próprio ultrassonografista, com movimentos de flexão e extensão do mesmo. Por fim, deve-se incidir o feixe sonoro perpendicularmente aos componentes articulares, e estes devem ser escaneados em todos os planos de imagem. Para isso, é fundamental o conhecimento da anatomia da estrutura a ser examinada. É importante saber origem, inserção e ação do músculo ou grupo muscular a ser observado. Componentes articulares » Músculos: o músculo normal é hipoecogênico e tem padrão reticular ecogênico característico, no qual as fibras se dispõem paralelas, longitudinal e transversalmente. Alguns grupos musculares apresentam um arranjo de fibras ou estrias finas, oblíquas e de aspecto denominado “espinha de peixe”, por exemplo, o bíceps braquial. Ao exame ultrassonográfico, devem-se observar a disposição e a organização das fibras musculares em camadas primárias e secundárias e a separação entre os grupos musculares por septos ou fáscias. Estas se apresentam como estruturas lineares hiperecogênicas brilhantes e bem delimitadas. Em alguns grupos musculares, podem-se, ainda, observar vasos bem delimitados que apresentam pulso (artérias) ou que alteram o seu lúmen após compressão exercida com o transdutor. As indicações clínicas para o exame da musculatura incluem alterações inflamatórias, degenerativas e traumáticas. Nestes casos podem ser identificados presença de seroma, hematoma, abscessos, calcificações, corpos estranhos, neoplasias, estiramento e ruptura de fibras musculares, além de contratura muscular. » Tendões: o tendão normal apresenta-se com os contornos bem definidos, como uma faixa relativamente hiperecogênica e homogênea 32 UNIDADE II │ ULTRASSONOGRAFIA ARTICULAR EM PEQUENOS ANIMAIS ao plano longitudinal, que deriva de dois ou mais músculos. Os ecos são produzidos pela reflexão das ondas sonoras no nível das interfaces acústicas, das bandas de fibras colágenas e das fibras endotendíneas. Quando a onda sonora incide perpendicularmente ao tendão, este se apresenta formado por ecos longitudinais paralelos, discretamente ondulados. A bainha tendínea aparece como uma linha ecogênica. As alterações detectadas pelo examesão a luxação (deslocamento) de tendão, tendinose, tendinite e tenossinovite, efusão em bainha tendínea, ruptura parcial e total, além de neoplasia. » Ligamentos: os ligamentos em cães e gatos são estruturas pequenas e próximas da superfície óssea, o que geralmente torna difícil sua avaliação sonográfica. As dificuldades podem ser minimizadas com o uso de frequência acima de 12 MHz, transdutores microlineares e incidência perpendicular do feixe sonoro em relação às estruturas em estudo. Os ligamentos aparecem como estruturas lineares hiperecogênicas de ecotextura fibrilar em plano longitudinal semelhante aos tendões, porém de aspecto mais delicado e fino. A maioria dos ligamentos apresenta espessura muito fina, o que dificulta a diferenciação com as estruturas adjacentes e, muitas vezes, até impossibilita a sua identificação em planos transversais. A ruptura do ligamento é a lesão mais comum. Em geral, os indícios dessa lesão são: hematomas, ausência da imagem da estrutura ligamentar e irregularidades da superfície óssea, que podem resultar em diagnóstico de ruptura do ligamento em estudo. » Ossos: a estrutura interna dos ossos não pode ser observada no exame ultrassonográfico, em virtude da intensa reflexão e absorção das ondas sonoras. No entanto, é possível avaliar os contornos ósseos. Isso é possível por causa da incidência perpendicular das ondas sonoras sobre a superfície óssea. Quando incidimos em planos de imagem oblíquos ou tangenciais, as imagens são muito atenuadas, de pouca definição, e produzem muitos artefatos de técnica que podem mimetizar defeitos estruturais. A superfície óssea normal é visibilizada como uma linha hiperecogênica contínua e, abaixo desta, observa-se intensa sombra acústica (RISSELADA; KRAMER; VAN BREE, 2003). O diagnóstico radiográfico da osteomielite e da neoplasia óssea pode ser auxiliado com o uso da ultrassonografia, analisando os tecidos adjacentes e auxiliando na detecção das áreas de osteólise, principalmente guiando biópsias do tecido ósseo lesado. 33 CAPÍTULO 2 Avaliação das articulações A ultrassonografia possibilita a avaliação dos tecidos moles que compõem a articulação, incluindo o próprio espaço articular, cápsula, ligamentos, músculos e tendões. A grande dificuldade está em encontrar o ângulo de varredura ideal para cada articulação. O pequeno tamanho das estruturas que compõem a articulação, a proximidade com o osso e a escolha do transdutor consistem nas limitações desse tipo de exame. A janela acústica deve ser adequada para obter-se boa imagem. Em geral, coloca-se o animal com o membro em flexão para aumentar o espaço articular e possibilitar boa visibilização das estruturas. A ultrassonografia é indicada quando há evidência clínica de alteração dos componentes articulares sem alterações ósseas radiográficas. A superfície óssea normal apresenta-se como uma linha hiperecogênica com sombra acústica posterior. As efusões articulares são detectadas como áreas anecoicas ou hipoecoicas dentro do espaço articular. A cartilagem hialina e o líquido sinovial formam um halo fino hipoecogênico ao redor da superfície óssea articular. A cartilagem fibrosa aparece mais ecogênica do que a hialina, em decorrência das suas características histológicas. Articulação escápulo-umeral Esta articulação pode ser observada por meio da varredura lateral, com o transdutor angulado craniodistalmente. O acrômio pode ser considerado um ponto de orientação referencial. O transdutor é colocado distalmente a essa área. O contorno da cabeça do úmero é arredondado e apresenta-se como uma linha hiperecogênica convexa com sombra acústica posterior. Com o feixe incidindo perpendicularmente, a superfície óssea aparece como uma linha com um halo anecoico central medindo aproximadamente 0,5 a 0,7 mm, que representa a cartilagem articular. 34 UNIDADE II │ ULTRASSONOGRAFIA ARTICULAR EM PEQUENOS ANIMAIS A varredura dessa articulação é limitada, pois o posicionamento cranial do transdutor é difícil em razão da irregularidade da superfície óssea da tuberosidade maior. A posição caudal é impossibilitada, em face do espaço articular mínimo, e a varredura medial não é possível por causa da presença de ligamentos fibromusculares entre a escápula e a parede torácica. Kramer et al. (1997) relatam que as alterações mais comuns na articulação escápulo-umeral são, em ordem decrescente: osteocondrose, artrose, contusão, luxação, tumor e fístula. Articulação umerorradioulnar Em razão da limitação de movimentos desta articulação, o exame ultrassonográfico é muito difícil. O animal pode ser posicionado em decúbito lateral ou colocado em estação, com o membro flexionado. O transdutor é colocado lateral e medialmente a essa articulação, sempre utilizando grande quantidade de gel para aumentar o contato. O espaço articular apresenta-se como uma área anecoica entre a tróclea e o processo coronoide (Figura 4). As estruturas ósseas apresentam-se como linhas hiperecogênicas, produzindo artefatos de reverberação. Figura 4. Plano anatômico transverso e diagrama da articulação umeroulnar esquerda de um cão. U M ULNA a b O transdutor foi colocado no aspecto medial da articulação do cotovelo. Observe a borda hiperecoica (a) do processo medial de coronoide (M) da ulna (ULNA), capturado quando o epicôndilo umeral medial (U) foi incluído no mesmo plano anatômico. Fonte: Knox et al., 2003. O plano caudodistal é obtido com o transdutor disposto lateralmente à articulação flexionada e estendida, paralelo ao úmero no epicôndilo lateral. Quando é obtido um plano perpendicular longitudinal, a porção distal do tríceps aparece como uma estrutura com múltiplas linhas finas paralelas que se inserem no 35 ULTRASSONOGRAFIA ARTICULAR EM PEQUENOS ANIMAIS │ UNIDADE II olécrano. Nesse plano, pode-se observar o processo ancôneo que, em condições normais, apresenta-se como uma interface hiperecogênica e curva (Figura 5). São comuns artefatos de irregularidade na superfície óssea nessa região. Figura 5. Anatomia do aspecto caudal do cotovelo. O Tríceps Tríceps ME ME A B C (A) Imagem ultrassonográfica da inserção do músculo tríceps no olécrano (O). A estrutura ecogênica entre os cursores é o ligamento do olécrano, próximo à sua origem, no epicôndilo medial do úmero (ME). (B) Imagem do cotovelo flexionado com o tríceps sob tensão passiva. O tendão é mais uniforme em ecogenicidade. (C) Imagem da inserção do músculo tríceps no olécrano. A distância entre os cursores é de 6,5 mm. Fonte: Lamb; Wong, 2005. O aspecto cranial do cotovelo somente pode ser visibilizado com a articulação em extensão. Os músculos braquial e bíceps braquial podem ser identificados nessa porção, assim como o músculo extensor carporradial. A cápsula articular não é passível de identificação. No aspecto lateral da articulação, o úmero e o músculo braquial são avaliados. Este pode ser caracterizado sobre o úmero em manobras dinâmicas. A porção distal do músculo tríceps pode ser visibilizada caudolateralmente inserindo-se no 36 UNIDADE II │ ULTRASSONOGRAFIA ARTICULAR EM PEQUENOS ANIMAIS olécrano. O plano transversal da porção distal da região lateral dessa articulação fornece a melhor imagem dos músculos e tendões (Figura 6). A partir desse, cada músculo e tendão pode ser caracterizado em plano longitudinal rotacionando-se o transdutor. O ligamento colateral lateral é muito fino e mais bem visibilizado em porção proximal do epicôndilo lateral umeral. A porção distal do ligamento apresenta-se hipoecogênica, em decorrência da angulação do feixe sonoro em relação ao seu eixo longitudinal (Figura 7). Figura 6. Imagem ultrassonográfica da articulação do cotovelo esquerdo de um cão. O Observe as linhas paralelas hiperecoicas dos feixes de fibra de colágeno no tendão do tríceps no plano dorsal. O olécrano (O) é visto como uma linha hiperecoica. Fonte: Knox et al., 2003. Na região proximal caudomedial, pode-se observara origem do músculo tríceps. Ainda no aspecto medial, é possível identificar o epicôndilo medial na porção distal e medial do úmero. O ligamento colateral medial surge no epicôndilo medial e apresenta-se como uma estrutura fina, linear e hiperecogênica. Porém, devido a seu trajeto curvilíneo, não é possível segui-lo em sua porção distal (Figura 8). Em cães e gatos, a ultrassonografia produz informações diagnósticas mais úteis clinicamente nas articulações diartrodiais maiores (ombro, joelho) em comparação com uma articulação menor, como o cotovelo. No entanto, a aparência ultrassonográfica do cotovelo canino foi relatada por Lamb e Wong (2005). No cotovelo canino normal, o processo coronoide medial aparece como um processo acentuadamente marginalizado ao longo do aspecto medial da articulação. Com o processo coronoide medial fraturado, a superfície do processo coronoide medial é frequentemente irregular, com proliferação ou fragmentação distinta. Quando a alteração do processo coronoide medial resulta de ossificação endocondral incompleta ou anormal, o processo coronoide medial pode ter a ecogenicidade de tecidos fibrosos ou moles, em vez de osso normal com sombreamento acústico distal. 37 ULTRASSONOGRAFIA ARTICULAR EM PEQUENOS ANIMAIS │ UNIDADE II O processo ancôneo pode ser identificado com imagens sagitais e transversais do aspecto caudal da articulação. A não união do processo ancôneo pode ser diagnosticada observando-se uma irregularidade ou “quebra” na margem do osso cortical nessas projeções. As lesões de osteocondrose no cotovelo são difíceis de serem visualizadas com ultrassom devido à sua localização na articulação, em conjunto com a complexidade anatômica das superfícies ósseas corticais sobrepostas e a sombra acústica distal associada (COOK; COOK, 2009). Kramer et al. (1997) relatam que as alterações mais comuns na articulação umerorradioulnar são, em ordem decrescente: fragmentação do processo coronoide medial, não união do processo ancôneo, bursite, artrose, tumores e osteocondrose. Figura 7. Ligamento colateral lateral do cotovelo. R R R R R H H MCP A B C D E (A) A parte proximal do ligamento colateral lateral (cabeça de setas grandes) é mais espessa do que a parte distal (entre cabeças de seta pequenas). Regiões proximal (B) e distal (C) do ligamento colateral lateral (entre os cursores). Imagens ultrassonográficas longitudinais das partes proximal (D) e distal (E) do ligamento colateral lateral em um cão vivo. H – úmero, R – rádio; MCP – processo coronoide medial da ulna. Fonte: Lamb; Wong, 2005. 38 UNIDADE II │ ULTRASSONOGRAFIA ARTICULAR EM PEQUENOS ANIMAIS Figura 8. Imagem e diagrama do ligamento colateral medial da articulação do cotovelo direito. EPI Observe o ligamento colateral medial contendo linhas paralelas hiperecoicas que correspondem a feixes de fibra de colágeno. O ligamento surge (entre as duas setas) do epicôndilo umeral medial (EPI). Fonte: Knox et al., 2003. Articulação femorotibiopatelar A avaliação ultrassonográfica dessa articulação difere das outras em riqueza de detalhes anatômicos passíveis de observação. As superfícies ósseas articulares têm, como descrito, imagens lineares hiperecogênicas que correspondem aos seus contornos, com artefato de sombra acústica posterior e ou reverberação. O espaço articular, tal como nas outras articulações descritas, aparece anecoico e deve ser comparado entre os dois membros do mesmo animal. Os ligamentos observados devem apresentar ecogenicidade maior em relação aos componentes articulares adjacentes, porém homogêneos em quase toda a sua extensão. No plano longitudinal, os ligamentos são observados como um feixe horizontal muito unido de fibras hiperecoicas; no plano transversal, observa-se como uma estrutura arredondada também fortemente ecogênica e homogênea, porém mais difícil de caracterizar. O tamanho varia conforme o porte do animal, e deve ser comparado ao membro contralateral sempre que possível. Para facilitar a avaliação sonográfica, a articulação foi dividida em quatro áreas: suprapatelar; infrapatelar; medial e lateral; e área poplítea. » Área suprapatelar: a varredura dessa área se faz nos planos longitudinal e transversal. É indicada principalmente para se observar a quantidade de líquido sinovial. O plano longitudinal é o mais indicado para avaliar a junção entre o músculo quadríceps femoral e o ligamento patelar. O plano transversal possibilita a avaliação da patela, do recesso patelar, do músculo quadríceps femoral e da cartilagem articular da tróclea femoral, que, geralmente, mede entre 1 e 2 mm de espessura. 39 ULTRASSONOGRAFIA ARTICULAR EM PEQUENOS ANIMAIS │ UNIDADE II » Área infrapatelar: a varredura dessa área também é realizada nos planos longitudinal e transversal, sendo indicada principalmente para observar ruptura de ligamentos (cruzado cranial e patelar). Nessa área, podem-se observar o polo distal da patela, o ligamento patelar, a sua origem no nível da tuberosidade da tíbia, a gordura infrapatelar entre o ligamento e a bursa e a cápsula articular, assim como a cartilagem articular no nível dos côndilos femorais. A anatomia das estruturas articulares não possibilita a visibilização nítida do ligamento cruzado cranial, pois este se encontra mais profundamente na cavidade articular. » Área medial e lateral: com o membro fletido, o transdutor localizado ainda na região infrapatelar deve ser rotacionado medial ou lateralmente cerca de 20º, para obter o plano longitudinal dos ligamentos colateral medial e lateral, respectivamente. Em geral, é difícil a identificação dessas estruturas em relação à gordura e aos tecidos subcutâneos. Essa região é indicada também para se observar grande quantidade de efusão. Ainda nessa região, é possível observar, em cães maiores, os meniscos, os quais aparecem como uma estrutura triangular homogênea e com ecogenicidade mediana localizada entre o côndilo femoral e o plateau tibial (Figura 9). A superfície óssea e os numerosos artefatos de técnica, somados ao espaço limitado da articulação, podem ocasionar falsos diagnósticos. Figura 9. Imagem ultrassonográfica de um menisco normal de um cão com posicionamento normal nas superfícies femoral (F) e tibial (T) articular e meniscal (m). F T m Fonte: Mahn et al., 2005. 40 UNIDADE II │ ULTRASSONOGRAFIA ARTICULAR EM PEQUENOS ANIMAIS » Área poplítea: linfonodos poplíteos, artérias e veias poplíteas com seus ramos auxiliam na orientação dessa área. Os vasos são circundados por tecido gorduroso. A cartilagem articular dos côndilos femorais é particularmente visualizada incidindo o feixe sonoro perpendicularmente. Diogo (2018), ao utilizar a elastografia na avaliação do joelho de cães da raça Beagle, relatou que o ligamento patelar apresenta aumento gradual de sua rigidez em relação à idade. Já o menisco e os ligamentos cruzados são mais rígidos nos filhotes do que nos adultos, mas também revelam suas maiores rigidezes nos animais idosos. Além disso, as fêmeas apresentam todas as estruturas mais rígidas que os machos. Porém, não há correlação entre a rigidez das estruturas e o peso dos cães. A avaliação ultrassonográfica da articulação do joelho pode detectar inflamação e ruptura parcial e/ou total do ligamento e lesões nos meniscos, tais como a fratura e a luxação meniscal. Kramer et al. (1997) relataram que as alterações mais comuns na articulação femorotibiopatelar são, em ordem decrescente: tumor, osteocondrose, artrose, ruptura do ligamento cruzado cranial, ruptura da cápsula articular e calcificação. Em relação aos meniscos, o seu exame ultrassonográfico apresenta alta sensibilidade e especificidade no diagnóstico de lesões, de acordo com Mahn et al.(2005). Gnudi e Bertoni (2001) ressaltam que o exame ultrassonográfico ajuda a estabelecer a presença de sinovite em cães sem sinais radiográficos de osteoartrite, permitindo um diagnóstico precoce desinovite. Em 70% dos cães com grau variável de osteoartrite, há a presença de tecido reativo na articulação próximo ao aspecto cranioproximal da tíbia. Isso pode ser considerado um importante sinal ultrassonográfico instabilidade articular, representando a resposta articular dos tecidos moles. Essa reação dos tecidos moles fornece informações sobre a cronicidade e/ou a intensidade do processo inflamatório. Em estudo recente, Gomes, Bregadioli e Hagen (2019) diagnosticaram a ruptura do ligamento cruzado cranial completa em cães com eficácia semelhante à artrotomia, além de discriminarem articulações com o ligamento hígido. No mesmo trabalho, os autores obtiveram eficácia superior no diagnóstico de alterações em meniscos mediais, tais como alterações de ecogenicidade e morfologia, efusão e extrusão. 41 ULTRASSONOGRAFIA ARTICULAR EM PEQUENOS ANIMAIS │ UNIDADE II Articulação tibiotársica A avaliação ultrassonográfica desta articulação não apresenta muitas dificuldades e deve ser realizada com o membro discretamente fletido. Inicialmente, deve ser realizado o plano longitudinal, colocando-se o transdutor sobre a tuberosidade do calcâneo no local da inserção dos tendões. A superfície óssea aparece como uma linha hiperecogênica convexa produtora de sombra acústica. Nessa região, o transdutor deve deslizar em direção proximal para examinar toda a estrutura articular, assim como os músculos e as junções musculotendíneas. O tendão calcâneo comum é uma estrutura ecogênica homogênea com linhas hiperecogênicas paralelas, ou seja, de ecotextura fibrilar. Os planos transversais são complementares e devem ser realizados em todas as porções, desde a sua origem até o nível de sua inserção. As imagens devem ser obtidas também por meio de manobras dinâmicas para auxiliar na elucidação diagnóstica em suspeitas de rupturas tendíneas e edema na região. Dessa forma, podem ser diagnosticadas ruptura do músculo gastrocnêmio, luxação tendínea e ruptura parcial ou total do tendão calcâneo. Articulação carporradial A avaliação dessa região somente é possível com a utilização de transdutores de alta frequência e resolução acima de 12 MHz. Utiliza-se como referência anatômica o coxim palmar para avaliar a região acima e abaixo dele, seguindo o trajeto dos tendões flexores digitais (superficial e profundo), assim como o nervo mediano. A utilização da ferramenta Doppler auxilia na identificação do nervo mediano que passa adjacente. Os tendões flexores digitais (profundo e superficial) apresentam um halo hiperecogênico e com ecogenicidade mediana em relação aos tecidos adjacentes. A porção interna dos tendões apresenta uma área de ecotextura discretamente mais grosseira. O tendão flexor digital profundo tem formato de vírgula e está localizado quase no centro do canal carpal, enquanto o tendão flexor digital superficial tem formato mais ovalado e está localizado posterior ao canal. A artéria mediana localiza-se posterior ao tendão flexor digital profundo. O nervo mediano é hipoecogênico em relação às demais estruturas e situa-se posteriormente ao tendão flexor digital profundo e posteromedialmente à artéria mediana. 42 UNIDADE II │ ULTRASSONOGRAFIA ARTICULAR EM PEQUENOS ANIMAIS A artéria mediana é a melhor referência anatômica para identificar o nervo, o que se torna mais fácil com a utilização do mapeamento Doppler colorido. Ainda há poucas ocorrências na literatura veterinária quanto aos valores de referência de espessura dessas estruturas (CARVALHO; VIANNA, 2016). As indicações para avaliação desta articulação se limitam a suspeitas clínicas semelhantes às outras articulações. Kramer et al. (1997) relatam que as alterações mais comuns nas articulações carpais/tarsais são, em ordem decrescente: tumor, artrite, contusões e fístula. Nervos periféricos Há poucas situações específicas para avaliação sonográfica de nervos periféricos. Na maioria das vezes, a suspeita clínica envolvendo alterações do sistema locomotor acarreta investigação da integridade de outras estruturas (ossos, músculos, tendões e ligamentos), porém os achados sonográficos podem indicar outras possibilidades diagnósticas. Para a varredura dos nervos periféricos, há a necessidade de se utilizarem transdutores com frequência alta (maior que 10 MHz) para melhor resolução da imagem dessas estruturas que, na maioria das vezes, são pequenas e situam-se superficialmente. O mapeamento Doppler colorido é uma ferramenta muito útil na diferenciação de vasos e nervos periféricos, que se apresentam normalmente como estruturas lineares hipoecogênicas delimitadas por uma linha hiperecogênica muito semelhante aos vasos sanguíneos (Figura 10) (HUDSON et al., 1996). Figura 10. Aspecto normal do nervo tibial de cão ao ultrassom. Fonte: Hudson et al., 1996. 43 ULTRASSONOGRAFIA ARTICULAR EM PEQUENOS ANIMAIS │ UNIDADE II O plexo braquial geralmente é a sede mais frequente de alterações (Figura 11). Pode ocorrer ruptura associada a traumas e fraturas. Os nervos normais são muito pequenos e medem aproximadamente 2 a 3 mm de espessura (HUDSON et al., 1996). Nos casos de ruptura, é comum observarmos edema de tecidos moles adjacentes e descontinuidade ou ausência da imagem das estruturas nervosas. De acordo com Rose et al. (2005) e Costa et al. (2008), os tumores que envolvem a bainha de nervo periférico são descritos como estruturas de aspecto tubular hipoecogênico em plexo braquial, ou com aparência de massa de ecogenicidade mista, de acordo com Carvalho e Vianna (2016). Na literatura, são relatados casos de neoplasias no nervo radial de cão com formato fusiforme e ecotextura mista (PLATT et al., 1999). Figura 11. Imagem transversal da axila canina normal. A B A A V V N N Os vasos são hipoecoicos (A e V, artéria e veia axilares). O nervo é encontrado correndo entre os vasos (N, nervo) e nem sempre é facilmente visualizado. B - Imagem transversal de um tumor do plexo braquial. O tumor hipoecoico está entre a artéria e a veia axilares (comparar com imagem A). Fonte: Rose et al., 2005. A compressão de nervo periférico pode ocorrer por efeito de massa local (neoplasias e hematomas). A síndrome do túnel do carpo provoca edema do nervo mediano, que pode ser visibilizado ao exame ultrassonográfico. A desmielinização também pode ocorrer após traumatismo ou inflamação. Nesses casos, o nervo apresenta-se de contornos pouco definidos e de ecogenicidade diminuída. A comparação com o contralateral é de grande valia para o diagnóstico final. 44 UNIDADE III ULTRASSONOGRAFIA ABDOMINAL EM PEQUENOS ANIMAIS CAPÍTULO 1 Conceitos básicos da ultrassonografia abdominal Interpretação da imagem e terminologia É de grande importância reconhecer ultrassonograficamente a textura dos órgãos e a terminologia usada pelos operadores referente à imagem gerada durante o exame ultrassonográfico. A posição normalmente é descrita observando-se a relação entre órgãos adjacentes e a arquitetura vascular da região. Os contornos dos órgãos são ditos irregulares quando as superfícies demonstram irregularidades diversas, que podem ser descritas como serrilhadas, macro e micronodulares, etc. Quando uma estrutura não tem forma, denomina-se amorfa. As áreas de alta intensidade de ecos são denominadas ecogênicas/hiperecogênicas (ecos brancos e brilhantes, normalmente indicativo de doença em um parênquima homogêneo). As áreas de baixa intensidade de ecos são denominadas hipoecogênicas (imagem cinza). As áreas que não produzem nenhum tipo de eco são denominadas anecoicas/anecogênicas (área negra no monitor). Considera-se uma imagem isoecoica quando a ecogenicidade tecidual é a mesma das estruturas adjacentes similares (KEALY; McALLISTER, 2005). A sequência do aumento de ecogenicidade dos tecidos e substâncias corporais é a seguinte: tecidos e substâncias corporais; bile; urina; medula renal; músculo; córtex renal; fígado; gordura de reserva; baço; próstata; seio renal; gordura
Compartilhar