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Curso de Especialização Avançada em Intervenção Psicológica com Crianças e Adolescentes Módulo 3 – Modelos de Intervenção Psicológica Ludoterapia SANDRA NUNES – SMRN1980@HOTMAIL.COM “Brincar é uma coisa séria.” (Sandra Kraft do Nascimento) 2 Índice de conteúdos Módulo 1 – O Jogo e o Brincar como diálogo com o mundo – o Desenvolvimento Psicológico Módulo 2 – Enquadramento histórico da Ludoterapia O objeto transicional de Winnicott As teorias dos jogos – Melanie Klein Módulo 3 – O Ludodiagnóstico Definição e Procedimentos Indicadores do Ludodiagnóstico 3 Índice de conteúdos Módulo 4 – A Ludoterapia Definição Objetivos O Papel do Terapeuta Caixa do brincar: brinquedos como mediadores expressivos (metábolos) “Sala do Brincar” O espaço Duração da sessão de ludoterapia A alta Módulo 5 – Técnicas de Intervenção Psicológica Técnicas Diretivas e Técnicas não-diretivas: Ludoterapia Diretiva e Não diretiva Módulo 6 – Discussão de Casos Práticos 4 Módulo 1 – O Jogo e o Brincar como diálogo com o mundo – o Desenvolvimento Psicológico 5 “Uma criança precisa, para existir, de espaço. Para que uma criança crie espaço, precisa de ter mãe: para que um corpo se confronte com o seu, para que nesse espaço se possa desenvolver o gesto, se metam palavras e se organize a linguagem que é basicamente emoção e AMOR. Não basta comunicar pelo gesto ou pela palavra. É necessário que a comunicação se faça num enquadramento de linguagem que é: sistema de referências, RELAÇÃO, espaço entre as pessoas; é no envolvimento da linguagem que se processa a comunicação. A criança precisa de ter ESPAÇO para descobrir e se descobrir, para se ver ao espelho, no OUTRO, nos outros, para que alguém lhe possa estender as mãos, para que ela receba a mensagem de cultura, para que a criança possa adquirir sabedoria, para que possa ter um nome, pôr nomes e criar OBRA que contribua para enriquecer o património cultural da comunidade. A criança precisa de ter espaço para criar tempo. Tempo para brincar, tempo que seja TODO, TEMPO, INTEIRO. Para sentir, aprender, pensar...nas coisas sérias da vida... no brincar. Para que possa ler na Natureza, nas Pessoas e nas Coisas. Antes que seja tarde, antes que chegue à escola.” João dos Santos (2007, p. 311) 6 › Sempre houve curiosidade na capacidade das crianças brincarem (aparentemente sem propósito prático) › A forma como as crianças brincam é sempre um reflexo de si próprias › Mesmo quando não brincam há algo que está a ser comunicado e, como tal, torna-se revelador daquilo que se traduz no seu próprio “EU”. › 1963: Mildred Marshak sugere como verdadeira função do brincar – criar uma identidade através da imaginação, permitindo à criança reconhecer a realidade como distinta dela própria e descobrir significados para as coisas BRINCAR permite o desenvolvimento mental, ligando as experiências entre si, apreendendo o meio como um todo que age e é agido. O Jogo e o Brincar como diálogo com o mundo – o Desenvolvimento Psicológico 7 O Jogo e o Brincar como diálogo com o mundo – o Desenvolvimento Psicológico “Quando brinca, a criança assimila o mundo à sua maneira, sem compromisso com a realidade, pois a sua interação com o objeto não depende da natureza do objeto, mas da função que a criança lhe atribui.“ (Piaget, 1971) 8 Brinquedo Desenvolvimento cognitivo – mundo imaginário Forma de fotografar a realidade – reprodução de uma totalidade social Desenvolvimento e construção do conhecimento infantil Brincar Permite à criança manifestar as suas alegrias, tristezas, desejos ou medos Fornece formas de contornar obstáculos (ex: experiências passadas traumáticas) Meio privilegiado de comunicação e desenvolvimento da capacidade de representação – abertura para o diálogo com o mundo dos adultos Permite desenvolvimento cognitivo, psicomotor e emocional Expande a imaginação – criar fantasias – compensar as pressões da realidade 9 A brincar a criança consegue perceber o que sabe, o que sente e o que quer. Consegue ter a noção do “outro” (dar existência ao objeto externo) Partindo do brincar, desenvolve-se o diálogo social, sempre que haja um parceiro que devolva o gesto ou expressão. Transpõe significados pessoais (mundo interno) para coisas materiais (mundo externo) BRINCAR 10 BRINCAR A apresentação do objeto organiza-se no jogo do “agora eu” – “agora tu” ; “vai-e-vem”. O desenvolvimento do diálogo mental depende da capacidade do bebé através de iniciativas de intercâmbio. O “eu” estrutura-se quando aprende a regular as relações de intercâmbio com o “outro” – na alternância e reciprocidade. Para que a criança seja capaz de manter este sistema de intercâmbio recíproco funcional, precisa de aprender a brincar. 11 › Ponto de vista psicológico formação da personalidade motivações necessidades emoções e valores interações criança/família interações criança/sociedade estão associadas aos efeitos do brincar › Ponto de vista psicoterapêutico – entender a criança nos seus processos de crescimento e de remoção dos bloqueios do desenvolvimento › Ponto de vista da criatividade (Santos, 2011, p.112-115) 12 O Jogo e o Brincar como diálogo com o mundo – o Desenvolvimento Psicológico › Ponto de vista pedagógico estratégia poderosa peça importantíssima na formação da personalidade nos domínios da inteligência na evolução do pensamento de todas as funções mentais superiores meio viável para a construção do conhecimento (Santos, 2011, p.112-115) 13 O Jogo e o Brincar como diálogo com o mundo – o Desenvolvimento Psicológico Criatividade Competências cognitivas e sociais Comunicação Resolução de problemas Aprendizagem da Linguagem Memória Papéis sociais e familiares Raciocínio Brincar – atividade essencial ao desenvolvimento de: 14 Concentração Sociabilidade Equilíbrio físico e emocional Experiências e descobertas Capacidade de expressão Respeito pelas regras Inteligência Autoconfiança Brincar – atividade essencial ao desenvolvimento de: 15 Brincar: Comportamento espontâneo e voluntário Importante para o desenvolvimento cerebral e o desenvolvimento infantil Importante função adaptativa Parte integral do desenvolvimento e da aquisição de competências Fornece um contexto integrativo essencial para o desenvolvimento de uma criança resiliente 16 “O interesse e desejo de brincar com os outros e participar nos jogos de grupo é inato à criança. Assim se formam os grupos de crianças de ambos os sexos e idades variadas. São nestes grupos que a criança aprende a viver; a vencer e ser vencida, a liderar ou obedecer, a respeitar e a ser respeitada, a tomar iniciativa e decisões, a mudar o seu comportamento se necessário, criar respostas novas e tomar consciência do mundo que a rodeia.” (Heylen, 1987, p. 121) 17 O Jogo e o Brincar como diálogo com o mundo – o Desenvolvimento Psicológico Módulo 2 – Enquadramento histórico da Ludoterapia O objeto transicional de Winnicott As teorias dos jogos – Melanie Klein 18 O Objeto Transicional de Donald Winnicott (1896-1971) • Brincar como indicador da saúde, do desenvolvimento e do sentimento de ser do bebé. • É no brincar que a criança estabelece o contacto e intercâmbio (social) com coisas e pessoas. Ponte entre o mundo interno e externo do sujeito. • O animismo é a capacidade da criança se projetar sobre os objetos, dar-lhes vida e absorver as coisas outra vez, como se os objetos se servissem de espelho e, por meio dela própria, procurar a reação das coisas: ser capaz de estabelecer uma ligação! 19 › Somente sendo criativo que a estruturação do self acontece › Transição do subjetivo ao objetivo › A noção de objeto transicional como a primeira posse do “não-Eu” › A noção dos objetos e fenómenos transicionais pode ser conceituada segundo três eixos:– como uma etapa do desenvolvimento afetivo normal da criança, como uma defesa contra as angústias de separação e, por último, como um espaço psíquico, um campo neutro de experiência que não será contestado: é a área da atividade lúdica e da ilusão. (Scheimberg, 2005. In: Mijolla. Dicionário Internacional de Psicanálise, p. 1305) › A criança só pode utilizar o objeto transicional a partir do momento em que o objeto interno “está vivo e é real e suficientemente bom”, o que depende da qualidade dos cuidados maternos. 20 O Objeto Transicional de Donald Winnicott (1896-1971) › Chama-se “mãe suficientemente boa” à mãe cuja harmonização física e emocional consciente e inconsciente com o seu bebé a adapta convenientemente aos diversos estádios dos primeiros anos da infância dele, assegurando assim um ambiente ótimo para a instauração saudável de um ser distinto, capaz de relações de objeto maduras. › O conceito engloba a “mãe dedicada comum” e o “ambiente suficientemente bom”. Ele afirma que não existe bebé sem mãe pois é a mãe que atende as necessidades corporais e emocionais do bebé permitindo o início de seu processo de integração e independência. (Jennifer Jonhs, 2005. In: Mijolla. Dicionário Internacional de Psicanálise, p. 1117) 21 O Objeto Transicional de Donald Winnicott (1896-1971) ▪ M. Klein trouxe uma nova ferramenta: a técnica de brincar. ▪ Klein viu que o brincar da criança poderia representar simbolicamente as suas ansiedades e fantasias. Visto que não se pode exigir de crianças pequenas que façam associação livre, ela brinca como expressão simbólica de seus conflitos inconscientes. (Segal,1975) ▪ Klein entra assim no universo infantil inconsciente. • Através do jogo e das brincadeiras, a criança liberta e manifesta as suas fantasias e dificuldades Freud As Teorias dos Jogos MELANIE KLEIN (1882-1960) 22 ▪ Principal contributo: introdução do brincar como forma de tratamento psicoterapêutico (num contexto próprio). ▪ Para essa técnica utilizou uma mala de ludo com brinquedos (mediadores lúdicos). Mas podem usar-se desenhos, escritas, pinturas, livros, reparar brinquedos, entre outras coisas. ▪ Tudo emerge como indicador importante para o trabalho psicoterapêutico. ▪ Assim, para M. Klein, o jogo assume-se como recurso que permite a fuga momentânea da realidade, permitindo à criança retirar da realidade “apenas o indispensável para aquela hora”. 23 As Teorias dos Jogos MELANIE KLEIN (1882-1960) A atividade lúdica Comunicação através da identificação mental de partes da realidade externa com as vivências internas Permite à criança diferenciar-se como pessoa e desenvolver os contactos com os outros (objetos transitivos - brinquedos) Os objetos são inicialmente parte da criança (objeto interno) que é projetada para o exterior, procurando obter uma resposta à sua iniciativa Esse contacto com o exterior, promovendo o intercâmbio na procura da resposta (agora eu – agora tu; agora está – agora fugiu) 24 › Através da Ludoterapia, o psicólogo consegue despertar um diálogo corporal e o intercâmbio manipulatório com brinquedos › Através do faz de conta a criança traz para perto de si uma situação vivida, adaptando-a à sua realidade e necessidades emocionais: ❖ Representa papéis, recria situações agradáveis ou não ❖ As situações desagradáveis são feitas de um modo capaz de suportar, não correndo riscos reais. A atividade lúdica Brincar: comportamento simbólico a ser descodificado 25 BRINCAR É uma forma de linguagem: permite às crianças comunicarem com as outras pessoas e iniciarem a compreensão desde muito cedo. É uma atividade complexa: envolve competências físicas, mentais, sociais e emocionais, revelando sentimentos, experiências e reações a essas experiências. Permite a construção de significados, assimilação de papéis sociais, compreensão das relações afetivas que ocorrem no seu meio e construção do conhecimento. 26 A atividade lúdica Módulo 3 – O Ludodiagnóstico Definição e Procedimentos Indicadores do Ludodiagnóstico 27 O LUDODIAGNÓSTICO - Definição e Procedimentos Instrumento de investigação clínica no qual o profissional procura estabelecer um vínculo terapêutico com a criança, visando ao diagnóstico de sua personalidade. Por meio da utilização de brinquedos, de forma estruturada/diretiva ou não. › Técnica projetiva expressiva baseada nos princípios da associação livre psicanalítica, aplicada em diagnósticos obtidos sem o depoimento verbal ou por meio da autoexpressão da criança, facilitada pelo contexto clínico lúdico. Avaliação do comportamento lúdico da criança, com o objetivo de inferir o “diagnóstico”. 28 › Parte-se do pressuposto que a técnica lúdica possibilita o diagnóstico da estrutura mental como expressão da brincadeira simbólica. › Identificar o tipo de experiências traumáticas psíquicas que a criança apresenta: angústia de separação, violência doméstica, abuso sexual, dificuldades de aprendizagem, comportamentos agressivos, baixo rendimento escolar, adoção, dependência física, atrasos de desenvolvimento cognitivo/motor… › Realizado através de: – Boa Anamnese; – Entrevista aos pais; – Sessões lúdicas iniciais com criança. Explorar: 1. Atividades lúdicas da criança; 2. Regras e hábitos da criança e da família; 3. Relacionamentos sociais da criança; 4. Questionário específico sobre a queixa. 29 O LUDODIAGNÓSTICO - Definição e Procedimentos › A sua importância reside no facto de percebermos o funcionamento da criança através do brincar. › A criança ao “brincar cá fora organiza lá dentro”, ou seja, brincar é uma expressão da sua elaboração psicológica. › Brincar é um comportamento a simbólico a ser descodificado. › O terapeuta deve tentar identificar, por todos os meios que tem ao dispor - através de todos os registos obtidos e das observações realizadas - qual será a sequência de eventos que antecedem a ocorrência de comportamentos inadequados. › Nas sessões lúdicas iniciais (durante o ludodiagnóstico), o terapeuta deve registar: – O tipo e número de brinquedos com os quais a criança brinca; – Qualidade do brinquedo; – Preferência de brinquedos; – Uso funcional e tempo de permanência em cada brinquedo. 30 O LUDODIAGNÓSTICO - Indicadores › É durante as sessões lúdicas de avaliação que se avalia: – Se a criança reproduz nas sessões os acontecimentos do dia a dia e como o faz; – Alteração no padrão lúdico (tempo de permanência nas atividades lúdicas comparativamente às crianças da mesma faixa etária); – Comportamento assertivo e seguimento das regras estabelecidas na situação lúdica. › O papel do terapeuta é reforçar as situações de autonomia da criança. › Numa 1ª fase os objetivos do ludodiagnóstico são a descoberta da área problemática e a análise das formas de comunicar da criança (desenhar, dialogar, pintar, brincar…), › Posteriormente usando as informações recolhidas, ajuda-se a criança a organizar-se e a adaptar-se (ludoterapia). 31 O LUDODIAGNÓSTICO - Indicadores Módulo 4 – A Ludoterapia Definição Objetivos O Papel do Terapeuta Caixa do brincar: brinquedos como mediadores expressivos (metábolos) “Sala do Brincar” O espaço Duração da sessão de ludoterapia A alta 32 › Play-therapy “Uma relação interpessoal dinâmica entre a criança e um terapeuta treinado que providencia um conjunto variado de brinquedos e uma relação terapêutica segura, de forma a que possa expressar e explorar plenamente o seu self (sentimentos, pensamentos, experiências, comportamentos), através do seu meio natural de comunicação: o brincar”. (Landreth, 2002) A LUDOTERAPIA 33 › A ludoterapia tem como objetivo: – Ajudar a criança, através do brincar, a expressar com maior facilidade os seus conflitos e dificuldades, para que consiga uma melhor integração e adaptação social (tanto no âmbito familiar como na sociedade em geral). Através da ludoterapiaa criança enfrenta os sentimentos de frustração, agressividade, medo, insegurança, confusão, entre outros, aprendendo a controlá-los ou a abandoná-los, ao mesmo tempo que vai percebendo que é uma pessoa autónoma e com direito a sentir todas essas emoções. A LUDOTERAPIA 34 – Por meio da utilização de simbolismos, crianças e pré-adolescentes poderão expressar conteúdos inconscientes, possibilitando que o psicoterapeuta identifique angústias e limitações que serão de suma importância serem trabalhadas para o desenvolvimento destes e para que seja possível a orientação dos seus familiares a fim de facilitar o processo para ambos. – Cabe ao profissional o uso de sua perceção aguçada para escolha correta do material, que, possivelmente, facilitará a comunicação simbólica com a criança, mobilizando conteúdos específicos que sejam relevantes a serem investigados. – A criança por meio do brinquedo tem a possibilidade de projetar o bom e o mal, podendo vivenciar novas experiências para a resolução dos seus conflitos internos. A LUDOTERAPIA – O brinquedo como facilitador do processo terapêutico 35 › Destina-se essencialmente a crianças entre os 3 e os 12 anos de idade. › A ludoterapia pode ser aplicada individualmente ou em pequenos grupos, dependendo da abordagem adotada, bem como do problema a ser resolvido. › Geralmente, as crianças aderem muito bem à ludoterapia. › O espaço lúdico deve ter um ambiente agradável, confortável e apelativo, para que a criança se sinta confiante e relaxada. Ludoterapia 36 “ O papel do terapeuta é o de dever poder tolerar os conflitos do paciente, quer dizer, esperar que eles se resolvam em vez de procurar com ansiedade o modo de os curar”. (Winnicott, 1971) 37 Ludoterapia A MALA DE LUDOTERAPIA 38 › Foi elaborada por Melanie Klein com brinquedos específicos que têm uma representação simbólica › A padronização dos materiais de uma caixa lúdica ainda é alvo de estudo › A necessidade de utilização de materiais é comum porque permitem a observação de fenómenos que não são obtidos pela palavra › Os materiais, estruturados ou não, têm a função de facilitar a expressão, permitindo o acesso à capacidade simbólica da criança expressão da saúde mental infantil A Mala de Ludoterapia • Os objetos da mala devem ser pequenos e simples • Toda a atividade corporal deve ser tida em conta (indicadora de trabalho terapêutico) • “instinto epistemofílico”: desejo de conhecer 39 › A seleção de materiais da mala deve valorizar o fácil contacto e apreensão › Os objetos devem ser simples e do quotidiano da criança › Os objetos devem ser nomeados assim que a criança os for explorando › Podemos analisar o acontecimento lúdico em termos de materiais utilizados para brincar e também da forma como a criança utiliza os materiais › O espaço lúdico também pode conter livros infantis à disposição das crianças de modo a trabalhar algumas questões A Mala de Ludoterapia 40 A mala de ludoterapia – “a caixa lúdica representa o mundo interno da criança” › Um alguidar › Uma pá e uma vassoura › Uma pistola › Um biberão › Um martelo › Uma seringa › Um estetoscópio › Um telefone › Um carro dos bombeiros, táxi, ambulância, polícia › Dois carros normais › Uma família (mãe, pai , avó, avô, filha, bebé) › Plasticina 41 A mala de ludoterapia – “a caixa lúdica representa o mundo interno da criança” › Peças de madeira › Um penico › Animais selvagens › Animais domésticos › Lápis de cor e folhas › Uma manta › Duas almofadas › Soldadinhos › Uma tesoura › Um livro de pano › Um boneco de encaixe (argolas) › Um conjunto de cozinha (pratos, chávenas, colheres, panela) › Um lencinho. 42 Mala de ludoterapia: Proposta de Representação Simbólica › Alguidar: Contentor (por exemplo: da agressão). Movimento inconsciente de precisar de ser acolhido. › Pá e vassoura: representação do restabelecimento, do compor uma situação “limpar as asneiras”. É um reparador. › Pistola: Libertação da agressividade, raiva, zanga etc. › Biberão: necessidade do cuidado, “muito regressivo” › Martelo: pode servir de objeto de agressão, mas também para reparar ou construir algo (papel organizador). › Seringa: para reparar algo mas também pode servir para agredir. Tem uma representação sexual. 43 › Estetoscópio: a curiosidade, saber o que se passa dentro, no entanto pode ter um sentido cuidador. › Telefone: comunicar a relação com o outro › Bombeiros: o amigo, “o apagar o fogo”, das emoções › Ambulância: a cuidadora (a mãe) 44 Mala de ludoterapia: Proposta de Representação Simbólica METÁBOLOS › É um pré-símbolo. › A criança elabora configurações mentais (pré-simbólicas) através da experiência, que lhe vai permitir, numa fase posterior, chegar aos símbolos. › No jogo repetitivo, elabora representações daquilo que capta, atribuindo-lhe um significado. › É na atribuição de significado aos estímulos sensoriais que reside o ponto de partida para atingir o simbólico. 45 Mala de ludoterapia: Proposta de Representação Simbólica › Táxi: o ser útil, o que nos faz um serviço durante um breve instante mas que depois nos deixa, um pouco como o terapeuta › Policia: quem põe as regras e limites (o pai) › Carros normais: relações com os outros › Família: projeção da própria família ou família idealizada › Animais selvagens e domésticos: a criança pode transformar os próprios animais em família. Questões de poder, de submissão e de identificação. Metábolos 46 Mala de ludoterapia: Proposta de Representação Simbólica › Plasticina: construir; mais organizador › Soldadinhos: soltar pulsões agressões, de apaziguamento etc. › A tesoura: o construir, o manusear (observar praxia da criança), pode ser também um objeto de agressão › Livro de pano: representa a elaboração cognitiva, também tem uma função mediadora › Boneco de encaixe: organizador (metábolos) › Conjunto de cozinha: temática alimentar, comportamentos dependentes (mais elaborado que o biberão, implica para a relação e partilha) › Peças de madeira: organizador, impor limites › Penico ou pote: mais regressivo, por vezes deitar fora a ansiedade, contentor. 47 Mala de ludoterapia: Proposta de Representação Simbólica › Lápis, pincéis (objetos pontiagudos): significação fálica; podem transformar-se em armas ou instrumentos agressivos; o uso de cores está relacionado ao afeto › Bacias, cestas, panelas (objetos côncavos): significação do feminino › Família de bonecos: relações familiares › Bola: contacto e troca, no sentido de dar e receber de volta › Fogão: pode estar associado à energia psíquica que pode ser utilizada de forma destrutiva › Jogos de construção (legos): significado depende da produção; indicado para verificar a criatividade da criança e capacidade de estabelecer relações (peças separadas transformadas num objeto novo) O psicólogo deve tentar interpretar os possíveis significados: 48 › Telefone: contacto com o outro; › Borracha: associada à reparação; o uso em excesso pode significar que a criança é exigente, tem uma autocrítica exagerada e baixa autoestima; › Tesoura: pode ser utilizada para manifestar agressividade. O psicólogo deve tentar interpretar os possíveis significados: 49 O espaço lúdico deve ter um ambiente agradável, confortável e apelativo, para que a criança se sinta confiante e relaxada. 50 A SALA DO BRINCAR A terapia realiza-se através de sessões entre 45 e 50 minutos (dependendo da idade da criança). Destina-se essencialmente a crianças a partir dos 3 anos de idade. A SALA DO BRINCAR 51 A ludoterapia pode ser aplicada individualmente ou em pequenos grupos, dependendo da abordagem adotada, bem como do problema a ser resolvido. 52 A SALA DO BRINCAR Geralmente, as crianças aderem muito bem à ludoterapia. 53 A SALA DO BRINCAR › Os motivos mais frequentes que levam os pais a procurarajuda: - baixo rendimento escolar; - dificuldades de aprendizagem; - comportamentos disruptivos (agressivos e antissociais); - alterações nos padrões alimentares e de sono; entre outros... › O terapeuta deve devolver à criança a iniciativa e conduzir o rumo da comunicação, apenas mostrando a sua presença ativa e tentando perceber e mostrar à criança o que vai na sua mente, › Os pais devem ser orientados sobre que aprendizagens inadequadas podem ocorrer ao longo do desenvolvimento da criança – psicodiagnóstico, › A finalidade é promover ou restabelecer o bem-estar da criança, reforçando os seus comportamentos que evidenciam autonomia e assertividade. A intervenção 54 › Brincar é um modo de linguagem tão clara para a criança que ela pensa que o seu significado é igualmente compreensível para os outros e pode pedir para não se contar ou mostrar aos pais o que fez. A intervenção Criança faz um desenho da família com o pai afastado da família num tamanho bem menor dificuldades na dinâmica familiar (criança não se sente “autorizada” a divulgar nem sabe lidar com isso) Ao brincar com os bonequinhos da família, a criança cria uma família em que os pais discutem muito ou batem no filho. O terapeuta deve averiguar se se trata de identificações de histórias/filmes ou se retrata a própria vida 55 › Quando a criança rejeita a atividade projetiva (para não exprimir um conflito), o psicólogo deve estabelecer um vínculo terapêutico adequado e flexível para poder seguir novos caminhos, de acordo com os gostos, necessidades e recursos da criança. › O importante é que o contacto com a emoção aconteça e que a criança partilhe a sua dor, anseios e experiências traumáticas de um modo mais livre de crítica e de autocensura. › Muitas são as possibilidades de intervenção na Ludoterapia: o psicólogo deverá elaborar, juntamente com a criança, o caminho adequado para cada caso, respeitando a individualidade de cada criança. A intervenção 56 › É importante focar a atenção nos seguintes aspetos: ❖A criança brinca? ❖Mostra interesse pelos brinquedos? ❖Finaliza a brincadeira? ❖Pára e começa outra atividade? ❖Repete a brincadeira? › Observar se a repetição acontece pois pode indicar uma situação inacabada. › Se a criança quiser que o psicólogo brinque com ela, perguntar: “Quem é que eu vou ser?”, “Como tenho de brincar?”. A observação do brincar 57 › A melhoria dos sintomas ou mesmo a supressão do quadro inicial é detetada através da evolução das representações da criança: - muda o modo como aborda a tema central numa mesma brincadeira; - O teor dos seus desenhos evoluem; - O seu comportamento em geral melhora. › Ao valorizar a sua própria produção, a criança vai ganhando confiança e internalizando as intervenções feitas, apropriando-se dos insights que surgem, num clima de criatividade e entusiasmo pela atividade que desenvolve. 58 A alta Módulo 5 – Técnicas de Intervenção Psicológica Técnicas Diretivas e Técnicas não-diretivas: Ludoterapia Diretiva e Não diretiva 59 Técnicas de Intervenção Psicológica › Técnicas Diretivas: O terapeuta direciona a criança a desenvolver atividades nas quais ele acredita ser mais facilitada a expressão de um determinado tipo de conflito. › Técnicas Não Diretivas: O terapeuta não é um elemento ativo, permite que a criança “dirija” a sessão, sentindo-se livre para realizar a atividade que preferir e expressar-se do modo que lhe for mais conveniente, sem ser criticada em nada. › Durante o processo terapêutico as crianças tendem a manifestar bastante afetividade em relação ao terapeuta, o que é facilitador da relação. › É importante retribuir o afeto mas promover a independência e autonomia. 60 Técnicas de Intervenção Psicológica › A ludoterapia pode ser diretiva – em que o terapeuta assume a responsabilidade de guiar e interpretar o brincar da criança – ou não diretiva – em que a responsabilidade é atribuída à criança, que guia e dirige a sessão. › Na Ludoterapia centrada na criança assume-se que esta tem a capacidade de resolver os seus próprios problemas e de utilizar essa força para se autorrealizar de uma forma satisfatória. Esta permite à criança ser ela própria a aceitar-se por completo, sem avaliação ou pressão para mudar. › Ao brincar, a criança enfrenta os seus sentimentos de frustração, agressividade, medo, insegurança e confusão, entre outros, e aprende a controlá-los ou a abandoná-los. Ao mesmo tempo vai percebendo que é um indivíduo autónomo, com direito a esses mesmos sentimentos sem culpabilidade, a pensar por si própria e a tomar as suas próprias decisões, aceitando as suas responsabilidades. Este é o caminho para a maturidade que, na Ludoterapia Centrada na Criança, ganha uma nova hipótese de desenvolvimento. 61 Módulo 6 – Discussão de Casos Práticos 62 “A sala de ludoterapia é um bom lugar de crescimento!” O caso de João › O João tinha 12 anos, inteligência acima da média, boa aparência, mas era seriamente desajustado, tanto em contexto escolar como familiar. Foi à consulta de ludoterapia por ser antissocial, agressivo e desculpava-se culpando os outros, dizendo que estes o tratavam mal. › Viveu a maior parte da sua vida com a avó materna, mas dois anos antes de ter ido à consulta, a mãe levou-o para viver com ela, com o padrasto e a meia-irmã. o João não se deu bem com eles nem com as outras crianças da escola, pois não estava habituado a brincar, tendo, portanto, problemas de ajustamento. › Primeira sessão: O João veio para a sala dos brinquedos e evitou o contato ocular com o terapeuta. – João: Aqui estou eu. Vim porque…por curiosidade. Não conseguia perceber o que a minha mãe estava a dizer quando me disse que a psicóloga me ia ajudar com os meus problemas, mas eu não tenho nenhum problema. – Terapeuta: Achas que não tens nenhum problema mas quiseste vir por curiosidade… – J: Sim. Eu sou curioso, e estou sempre a meter o nariz em tudo. Por isso achei que devia vir ver. – T: Queres ver como funciona o aconselhamento… › J: Aconselhamento. Essa é a palavra que não me conseguia lembrar. Ah! Eu não tenho problema nenhum. (Pausa) Exceto que…bem…hummm…o meu pai, padrasto aliás…eu não posso morar com ele nem ele comigo e, quando ele está em casa e eu também há problemas, problemas, problemas… Eu faço muito barulho. Eu estou a atrapalhar. Só sei que não podemos estar juntos. Só consigo estar em casa quando ele não está. › T: Tu e o teu pai não conseguem estar juntos? › J: O meu padrasto. › T: O teu padrasto. › J: Mas eu não tenho nenhum problema. › ….. › T: Vamos falar sobre qualquer coisa que queiras, ou não conversar sobre coisa alguma, se preferires. › J: Como o episódio da bandeira na semana passada, por exemplo? Queres que conte o que aconteceu? Os meninos da escola atacaram-me porque eu disse que cuspi na bandeira, mas eu não cuspi de verdade, só disse isso para eles ficarem com raiva. E consegui. Acredita. › T: Querias enfurecê-los e conseguiste. › J: Eu não sei porque fiz isso. Na verdade sou um bom cidadão e não o fazia. Mas ficaram todos contra mim. › T: Não consegues entender porque fazes coisas dessas às vezes? › J: Nem porque brigo às vezes. Eu só…mas eu não tenho nenhum problema. › T: Não gostas de admitir que tens um problema. › J (ri): Depende do tamanho dele. Eu tenho coisas maiores que problemas. O meu pai adotivo, a nossa professora substituta que é danada…e ninguém gosta de mim. Não sei porquê. Eu acho que não existe nenhuma pessoa que não tenha problemas. › T: Acreditas que toda a gente tem problemas e que por isso não és diferente de ninguém. › J: Só eu é que tenho que admitir que tenho problemas. Os outros não. › ….. › T: Achas que a tua vida é triste? › J: Eu acho que ela é cheia de coisas. Estou sempre em confusões (pega num fantoche). Agora olha aqui. Eu vou-te matar se não fizeres o que estou a dizer (a voz é completamente diferente – baixa, profunda, ameaçadora). › T: Ele sentecomo se estivesse a matar alguém… › J: Eu também, às vezes. Só que não faço de verdade (ri). Da próxima vez que eu vier vou fazer um teatro. Ato 1. A minha vida e os meus problemas. › T: Combinado. Da próxima vez que vieres representas a tua vida e os teus problemas. Desde o início o João usou os fantoches durante a maior parte do tempo na sala dos brinquedos. Ele dramatizou os seus problemas familiares e externalizou os seus sentimentos agressivos dirigidos ao pai, irmã e escola. › Segunda sessão: › O João chegou e fez um teatro com fantoches. Pega num fantoche do sexo masculino. › J: Este é o Rui, o mau menino. Ele é mau, agora está em casa e na cama. O pai está no andar de baixo. Ele quer que o pai suba. O pai do Rui está sempre a mandar nele. Mas ele não vai muito longe com ele como vais ver. › O João dirige este discurso inicial à terapeuta. Durante a sessão ele manipula os fantoches e muda completamente o seu tom de voz cada vez que uma personagem diferente fala. › Na terceira sessão o João admite que pega com a irmã só para chatear os pais. › J: Sabes o que é? É que eu sinto que fui posto em segundo plano. Morei com a minha avó durante muito tempo e não estou acostumado com o meu padrasto. Nem ele comigo. Nós nunca concordamos. Quando eu digo que é seis, ele diz que é meia-dúzia. Às vezes penso que se tivesse ficado com o meu padrasto desde o início….não sei. › T: Achas que as coisas entre ti e o teu padrasto ficaram mal porque não morou contigo desde o início? › J: A minha avó estragou-me. Ela sempre me deixou fazer o que eu queria, eu cresci egoísta. › T: Achas que isso te fez ficar egoísta? Fazeres sempre o que querias… O João começou a consertar os brinquedos. Fez de conta que estavam estragados e começou a consertá-los e a dar um por um à terapeuta. Mostra ressentimento por ter feito um teatro agressivo na última sessão e diz que foi para casa a pensar nisso e escreveu uma carta ao pai biológico. › Este acompanhamento foi realizado numa escola e por isso após estas primeiras três sessões o João pediu para fazer um teatro de fantoches com os amigos e assim trazer alguns colegas da sala (porque dizia que não tinha amigos) para a sessão seguinte. › Após algumas dinâmicas o João diz: “aqui eu sou honesto” e quando avalia o seu comportamento acrescenta: “eu realmente causo a maior parte dos meus problemas”. › Em suma: – Nos primeiros contatos o João precisava que os fantoches fossem anónimos para revelar os seus sentimentos. Após se sentir seguro de que não seria punido pelo que os fantoches dissessem, ele conseguiu aprofundar os seus sentimentos no relacionamento familiar. A terapeuta não interferiu e como ele sentiu que não era o foco da intervenção deixou os sentimentos fluírem. – À medida que a terapia progredia, as peças de teatro de fantoches tornavam-se mais curtas e menos frequentes, até chegarem ao ponto de se extinguirem. Isto porque as peças passaram a ser “de acordo com as regras” e por isso perderam o interesse. – A última peça foi uma mera diversão. – Assim os problemas de ajustamento foram resolvidos e após uma avaliação seis meses mais tarde, o João não apenas se encontrava bem ajustado como era o líder da turma. – A ludoterapia neste caso foi uma combinação entre individual e em grupo. O grupo permitiu que o João superasse a necessidade de manter um comportamento defensivo – antissocial. Bibliografia › Affonso, R. M. L. (2012). Ludodiagnóstico: Investigação Clínica Através do Brinquedo. Artmed. › Almeida, a. C. P. & Shigunov. V. (2000). A atividade lúdica infantil e suas possibilidades. Revista da Educação Física/UEM: Maringá, v. 11, n. 1, pp. 69-76. › Axline, V. M. (1972). Ludoterapia: A dinâmica interior da infância. Belo Horizonte: Interlivros. › Axline, V. M. (1972). Ludoterapia: A dinâmica interior da infância. Belo Horizonte: Interlivros. › Besse, J.M., & Ferrero, M. (1986). A criança e os seus complexos. Editorial Verbo. › Center for Play Therapy, University of North Texas - www.centerforplaytherapy.com › Laurentino, M. C. da S.& Melo, V. B. de (2015). O Brincar nas Perspetivas: Freudiana, Kleiniana e Winnicottiana. Psicologado. Disponível em <https://psicologado.com.br/abordagens/psicanalise/o-brincar-nas-perspectivas- freudiana-kleiniana-e-winnicottiana> › Marcelli, D. (1998). Manual de Psicopatologia da Infância de Ajuriaguerra (5ª Edição). Artes Médicas. 68 Bibliografia › Mijolla, A. (2005). Dicionário Internacional da Psicanálise: conceitos, noções, biografias, obras, eventos, instituições. Imago Editora › Nunes, O., Brites, R. & Hipólito, J. (2018). Psicoterapia centrada no cliente. In I. Leal (Coord.), Psicoterapias (pp. 115-131). Lisboa: Pactor. › Papalia, D.E., Feldman, R.D. & Olds, S.W. (2001). O Mundo da Criança. McGraw-Hill. › Protasio, M.M. (Org.) (1997). Ludoterapia. Fenómeno Psi, ano 1, n. 0. IFEN - Instituto de Psicologia Fenomenológico- Existencial. Papel e Tinta Editora. › Santos, J. S. dos (2007). Ensinaram-me a ler o mundo à minha volta. Assírio & Alvim. › Santos, R. (2018). Intervenção Psicológica com Ludoterapia. Lisboa: Pactor. › Wolff, S. (1999). Psicoterapia Infantil. In S. Bloch (Coord.), Uma introdução às psicoterapias (pp. 267-296). Lisboa: Climepsi Editores. 69 70 71
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