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Universidade do Minho Licenciatura em Engenharia Biológica Q U Í M I C A – F Í S I C A João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 Índice 1. SISTEMAS COM REACÇÃO QUÍMICA............................................................................1 1.1. Estequiometria e combustão........................................................................................1 1.1.1. Balanço de massa em reacções de combustão.......................................................... 3 1.1.2. Composição dos combustíveis.................................................................................... 5 1.1.3. Composição dos fumos a partir da estequiometria................................................. 7 1.2. Termoquímica...............................................................................................................9 1.2.1. Estado-padrão e estado de referência....................................................................... 9 1.2.2. Convenções termoquímicas...................................................................................... 10 1.2.3. Reacções de formação e de combustão ................................................................... 11 1.2.4. Determinação de entalpias de reacção.................................................................... 12 1.2.5. Temperatura de reacção adiabática........................................................................ 16 2. EQUILÍBRIO DE FASES E FUGACIDADE .....................................................................17 2.1. Gases ideais .................................................................................................................17 2.2. Gases reais...................................................................................................................19 2.2.1. Factor de compressibilidade, z................................................................................. 20 2.2.2. Equação de virial ....................................................................................................... 20 2.2.3. Equação de van der Waals e PEC........................................................................... 21 2.3. Equilíbrio de fases ......................................................................................................24 2.3.1. Energia livre de Gibbs e potencial químico ........................................................... 26 2.4. Fugacidade ..................................................................................................................30 2.5. Cálculo da fugacidade ................................................................................................30 2.5.1. Fase de vapor com p e T como variáveis independentes....................................... 31 2.5.2. Fase de vapor com cartas e tabelas generalizadas ................................................ 31 2.5.3. Fase de vapor com V e T como variáveis independentes ...................................... 32 2.5.4. Fugacidade de líquidos ou sólidos puros ................................................................ 33 2.5.5. Fase de vapor com a equação de virial ................................................................... 33 3. CÁLCULO DOS DADOS DE EQUILÍBRIO EM SISTEMAS IDEAIS............................37 3.1. Misturas simples .........................................................................................................37 3.1.1. Propriedades parciais ............................................................................................... 37 3.1.2. Equilíbrio de fases ..................................................................................................... 40 3.1.3. Propriedades coligativas........................................................................................... 43 3.2. Regra das fases ........................................................................................................... 47 3.3. Sistemas binários ideais ............................................................................................. 48 3.3.1. Diagramas de fases .................................................................................................... 49 3.3.2. Cálculo das propriedades p, T, x e y e traçado de diagramas............................... 54 3.3.3. Cálculo das propriedades p, T, x e y de misturas de hidrocarbonetos com Ki ... 56 4. DADOS DE EQUILÍBRIO EM SISTEMAS NÃO-IDEAIS .............................................. 59 4.1. Desvios à lei de Raoult ............................................................................................... 59 4.2. Azeotropia................................................................................................................... 59 4.2.1. Azeotropia heterogénea ............................................................................................ 62 4.2.2. Imiscibilidade total .................................................................................................... 65 4.3. Propriedades de excesso ............................................................................................ 67 4.4. Coeficientes de actividade ......................................................................................... 68 5. DADOS DE EQUILÍBRIO EM SISTEMAS LÍQUIDOS TERNÁRIOS........................... 70 5.1. Diagramas triangulares ............................................................................................. 70 Bibliografia ................................................................................................................................. 73 Anexos ........................................................................................................................................ 73 Anexo 1. Exercícios TP, Formulário e Conversão de Unidades ........................................... 73 Anexo 2. Tabelas de Propriedades .......................................................................................... 73 Anexo 3 Cartas ....................................................................................................................... 127 1. SISTEMAS COM REACÇÃO QUÍMICA 1.1. Estequiometria e combustão A estequiometria permite estabelecer as relações mássicas ou molares (coeficientes estequiométricos) existentes entre os reagentes e os produtos duma reacção. Conhecidas estas relações é possível calcular, a partir delas, as quantidades de todos os intervenientes, depois de estabelecida uma base de cálculo. Os reagentes originam produtos e a reacção acertada fornece informação quantitativa e qualitativa. O princípio ou lei da conservação da massa, não havendo transformações de massa em energia por reacções nucleares, afirma que a massa total de reagentes iguala a massa total de produtos. Efectuar um balanço às espécies químicas nem sempre é fácil, mas é sempre simples aplicar a lei aos átomos presentes (ou mesmo iões se for o caso), pois os átomos permanecem inalterados em toda a reacção. Pode-se afirmar que a quantidade de matéria (número de moles), ou a massa, do átomo X no início (reagentes) é igual à sua quantidade no fim da reacção. As reacções químicas exigem contacto entre espécies e/ou trocas de energia. Se o contacto for insuficiente por falta de tempo (tempo de contacto), ou devido à presença de substâncias estranhas à reacção que dificultam o contacto, as reacções podem ser incompletas. Parte dos reagentes vão permanecer no reactor sem originar os produtos pretendidos. A turbulência facilita o contacto. Substâncias que não sofrem qualquer reacção mas se encontram presentes misturadas com os reagentes denominam-se inertes. A água nas reacções em fase líquida, e o azoto no ar são muitas vezes inertes para as reacções em que estão presentes. As reacções em que se estabelecemequilíbrios entre produtos e reagentes também não são completas. Para levar a reacção até um ponto mais adiantado tem-se de proporcionar condições adequadas que desloquem o equilíbrio no sentido pretendido. Fornecer calor nas reacções endotérmicas (retirar nas exotérmicas), remover os produtos formados ou aumentar a quantidade de reagentes são algumas manobras habituais. Além dos equilíbrios também podem ocorrer reacções diferentes das pretendidas – reacções concorrentes (secundárias) – que preju- dicam o rendimento da reacção. Diz-se que um reagente se encontra em excesso quando a sua quantidade em relação ao(s) outro(s) é maior que a relação estequiométrica. O reagente que se encontra em excesso é 2 escolhido com base na conversão pretendida, no produto desejado e nos custos dos reagentes. Habitualmente usa-se excesso dum reagente barato para obter um quantidade maior do produto desejado. Se um reagente está em excesso, o(s) outro(s) estão em deficiência pelo que definem o passo limitante da reacção. Reagente limitante é aquele cuja quantidade é inferior à relação estequiométrica. Se a reacção prosseguir até à extinção dum dos reagentes, ele é o primeiro a desaparecer do reactor. O reagente limitante é normalmente o mais caro ou mais difícil de recuperar. Define-se percentagem de excesso, ou simplesmente excesso, dum reagente, pela equação 1.1. Nesta, nesteq é a quantidade de matéria exacta para reagir usando todos os reagentes presentes, ou seja, a quantidade na proporção estequiométrica. Sendo ninicial = nesteq não há excesso de reagente. 100 % esteq. esteq.inicial × − = n nnExcesso (1.1) A percentagem de reagente que se gasta na reacção, dividida pela quantidade inicial do mesmo reagente, denomina-se conversão. Para o seu cálculo usa-se a equação 1.2. Também se chama grau de conversão quando é referida ao reagente limitante. 100100 % inicial reagidas inicial finalinicial ×=× − = n n n nnConversão (1.2) A eficiência de conversão (produtos) é definida pela equação 1.3, sendo o rendimento (no produto desejado) calculado com a equação 1.4: 100 % possívelmáx. produzido ×= n nEC (1.3) inicial reagente doou produto doou p nm nmR = (1.4) Quando num exercício não é especificada a quantidade dum reagente (ou da mistura reagente), ou produto (ou da mistura produzida), ou caudal, é sempre necessário definir uma base de cálculo, em relação à qual se fazem os cálculos. A base é usualmente o caudal de alimentação (ou produzido), ou a massa ou quantidade de matéria de reagente(s) ou produto(s). Se a composição é dada em percentagens ou fracções (mássicas ou molares), a base natural é 100 kg (ou 100 mol), ou 1. Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 3 Os inertes, apesar de não reagirem, têm de ser contabilizados pois também entram nos cálculos das fracções mássicas ou molares, diluem tanto reagentes como produtos, interferindo na reacção, e separam-se em correntes diferentes. Quanto aos balanços energéticos, os inertes podem mudar de estado (p, T e fase), consumindo (ou fornecendo) calor (entalpia) para serem aquecidos (arrefecidos), e para mudarem de estado (calores latentes de fusão/congelamento e de condensação/vaporização). 1.1.1. Balanço de massa em reacções de combustão Combustões são reacções químicas, mais ou menos rápidas, normalmente com chama, em que o combustível é oxidado pelo comburente. Este pode ser oxigénio puro – soldaduras –, ou ar, ou quimicamente combinado – foguetes, explosivos. A reacção é exotérmica (∆rH < 0), e pode ocorrer de forma espontânea, desde que se atinjam dados valores de p e T. O carvão entra em combustão espontânea a cerca de 400 oC, para p = 101.3 kPa. O ar seco, considerado ideal nas aplicações a pressão normal, tem a composição dada na tabela 1.1. Nos cálculos usam-se habitualmente as relações dadas pelas equações 1.5 e 1.6, a primeira para a relação de quantidade de matéria, e a segunda para a relação mássica: mol mol76.3 21 79 2 2 O N == n n (1.5) kg kg29.3 3221 2879 2 2 O N = × × = m m (1.6) Além do combustível e do comburente ainda é necessário assegurar uma temperatura mínima para que a combustão, uma vez iniciada, se mantenha (auto-manutenção). Denomina-se temperatura de ignição – Tignição. O seu valor depende das condições da reacção, incluindo a pressão. Em condições normais, com ar, para o enxofre o valor da Tignição é de cerca de 245 oC, situando-se entre 575 oC e 610 oC, para o hidrogénio; entre 400 oC e 600 oC, para o carvão; entre 650 oC e 760 oC, para o metano; entre 250 oC e 430 oC, para a gasolina comum; e entre 650 oC e 670 oC, para o monóxido de carbono. Os limites de inflamabilidade, superior e inferior, referem-se às razões ar/combustível. Estas devem ser tais que o calor produzido seja suficiente para manter a Tignição. Se há demasiado ar, a energia libertada também é usada no aquecimento do excesso de ar, e pode ser insuficiente para manter a Tignição. Um défice de ar (excesso de combustível) tem o mesmo efeito porque a reacção vai ser incompleta, baixando a entalpia da reacção, e havendo, por isso, menor Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 4 quantidade de calor disponível. Considerando percentagens volumétricas, os limites de inflamabilidade vão de 4.0 % a 75 % para H2, 5.0 % a 15 % para CH4, 2.0 % a 10 % para C3H8, 4.9 % a 15 % para gás natural, e 1.5 % a 7.5 % para gasolina comum. Tabela 1.1. Composição do ar seco na atmosfera (p=101 kPa) c Componente dm3/m3 Azoto, N2 780.850 Oxigénio, O2 209.500 Árgon, Ar 9.300 Dióxido de carbono, CO2 0.320 Néon, Ne 0.018 Hélio, He 0.005 2 Metano, CH4 0.001 5 Monóxido de carbono, CO 0.000 1 Ozono, O3 0.000 02 Kr, H2, N2O, Xe, NH3, NOx, SO2, H2S, ... 0.005 18 A oxidação de compostos com hidrogénio leva à formação de água. Nas condições da reacção a água forma-se no estado gasoso (vapor). Na análise em base seca considera-se que todo o vapor de água é condensado e removido dos produtos da combustão (fumos). Na base húmida o vapor de água é apenas mais um componente dos produtos. A análise dos produtos pode ser ponderal (mássica) ou volumétrica. A análise volumétrica é idêntica à molar, quando os gases tenham comportamento próximo da idealidade. Consumo teórico de oxigénio, ou oxigénio teórico, é a quantidade mínima para a combustão completa dos elementos oxidáveis. Todo o carbono é oxidado até CO2 e o todo o hidrogénio até H2O. Ar teórico é o que fornece o oxigénio teórico. Se o oxigénio presente for suficiente e as condições da reacção o permitirem, todo o carbono é oxidado. Havendo oxigénio insuficiente, parte do carbono é oxidado apenas até monóxido de carbono, ou não sofre qualquer oxidação. Chama-se relação teórica ar/combustível (equações 1.7 e 1.8) a razão entre a quantidade de matéria (ou massa) de ar teórico e a quantidade de matéria (ou massa) de combustível. Em base molar usa-se a equação 1.7, e em base mássica a 1.8. lcombustíve ar teórico ar/comb. n n RT = (1.7) Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 5 lcombustíve ar teórico ar/comb. m m RT = (1.8) Chama-se percentagem de ar teórico (equações 1.9 e 1.10) a razão entre a quantidade de matéria (ou massa) de ar fornecido e a quantidade de matéria (ou massa) de ar teórico, multiplicada por cem. No ar, as quantidades de matéria (moles) de azoto e oxigénio são adicionadas, tal como as massas. No caso de misturas combustíveis, somam-se também todas as contribuições. 100 ar teórico fornecidoar ar teórico ×= n n P (1.9) 100 ar teórico fornecidoar ar teórico ×= m m P (1.10) Mais dois parâmetros importantes na análise de combustões são a percentagem de excesso de ar – PEar – e a riqueza (ou força) da mistura – RM. Como o nome indica, a percentagem de excesso dá-nos o excesso em relação à quantidade teórica (equação1.11), enquanto a riqueza (usada em motores de combustão) mede a relação entre o ar teórico e o ar fornecido (equação 1.12). A riqueza refere-se à maior quantidade relativa de combustível (menos ar, mais combustível, mistura mais rica). Ambos os conceitos podem ser definidos em termos de quantidade de matéria e, equivalentemente, em base mássica. 100 ar teórico ar teóricofornecidoar ar × − = n nn PE = Par teórico – 100 (1.11) 100 % fornecidoar ar teórico ×= n nRM (1.12) A mistura diz-se rica se RM > 100 %, ou pobre se RM < 100 %. Exemplo 1.1. Escrever a combustão completa do metano com 150 % de ar teórico. Escrever a mesma equação mas considerando que 10 % da quantidade de matéria do metano se convertem em CO e 10 % não reagem. Exemplo 1.2. Calcular a razão teórica ar/combustível para as combustões do n-butano e do n-hexano. (Solução: 30.94 mol/mol ou 15.38 kg/kg para o butano; 45.22 mol/mol ou 15.17 kg/kg para o hexano) 1.1.2. Composição dos combustíveis Em termos elementares, a maior parte dos combustíveis são formados por carbono e hidrogénio. Além desses, temos elementos reactivos como o enxofre (nocivo) e não-reactivos como o azoto, a água e minerais inorgânicos. Estes minerais, sobretudo na forma de óxidos (SiO2, Al2O3, CaO, MgO, K2O, Na2O), são os principais constituintes das cinzas. O enxofre e os Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 6 óxidos resultantes da sua combustão representam um problema ambiental, pelo que o seu conteúdo é indesejável. O carvão, com cerca de 4 %, é o combustível com maior quantidade de enxofre. Segue-se o fuel (entre 1.2 % e 2.1 %), o gasóleo (0.9 %) e a gasolina (inferior a 0.1 %). Com combustíveis líquidos – petróleo – usa-se análise de composição ponderal elementar, em base seca ou húmida. Com combustíveis sólidos, como o carvão, é semelhante. Com gasosos usa-se análise de composição volumétrica de cada gás ou hidrocarboneto presente. O gás de cidade é formado sobretudo por H2 (53.6 %) e CH4 (25 %). O gás natural é predominantemente composto por CH4 (acima de 80 %), contendo também C2H6, e outros hidrocarbonetos em menor quantidade. A partir do petróleo, por destilação fraccionada, dos mais aos menos voláteis, obtém-se: gás do petróleo → essências leves → gasolinas especiais → gasolinas comuns → óleo diesel → óleo combustível (fuel oil). Para analisar gases e vapores usam-se hoje métodos como a espectrometria de massa, EM (MS do inglês), a cromatografia gasosa, CG ou GC, acoplada ou não a espectrometria de massa, que usam detectores cada vez mais sofisticados. O Aparelho de Orsat, esquematizado na figura 2, é o método clássico de quantificação dos fumos, na base seca. Com o esquema da figura, havendo absorvedores para monóxido de carbono, oxigénio e dióxido de carbono, consegue-se quantificar as moléculas mais habituais nos fumos. O azoto obtém-se por diferença. Figura 1.1. O Aparelho de Orsat. O processo de quantificação com o Aparelho de Orsat baseia-se na variação do volume do gás amostrado, decorrendo o processo de forma isotérmica e isobárica. Nestas condições, a variação do volume é proporcional à variação da quantidade de matéria da espécie absorvida. Em cada etapa um dos componentes é removido. Conhecendo-se o volume de amostra antes da remoção, é possível calcular a fracção molar pela fracção de volume removido. O resultado é Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 7 obtido na base seca porque em todo o processo a mistura está saturada com água, o que, a temperatura e pressão constantes, implica que a água tem sempre a mesma pressão parcial (ou fracção molar), não influenciando as fracções dos outros elementos da mistura. 1.1.3. Composição dos fumos a partir da estequiometria Quando temos apenas um combustível, é fácil determinar os produtos da combustão através da equação química da combustão. Havendo misturas, mais ou menos complexas, pode- -se partir duma equação global, desde que se conheçam as quantidades de matéria de cada reagente, bem como a conversão e as reacções de cada um. Fazendo-se um balanço de massa aos átomos intervenientes, obtém-se o resultado desejado. Em qualquer dos casos, e sobretudo se houver hidrocarbonetos que entram em reacções diferentes (combustões ou conversões incompletas), é preferível esquematizar o processo de cálculo de acordo com o exemplo da tabela 1.2. Consideram-se separadamente todas as reacções e depois somam-se os efeitos. Mesmo parecendo mais complicado, é de facto o processo mais simples e mais seguro. Para cada componente da mistura escrevem-se as equações de combustão em que entra, completas ou incompletas, e deixa-se a parte que não reage em linha própria. Escreve-se cada equação de combustão para 1 mol de combustível, e multiplicam-se os coeficientes estequiométricos pela quantidade de matéria total, para calcular o oxigénio consumido e os produtos formados. A parte do combustível que não reage é transferida directamente para a respectiva coluna de produtos. Qualquer componente da mistura que seja inerte aparece, na íntegra, como produto, como é o caso do azoto neste exemplo. O caso particular de haver oxigénio na mistura combustível costuma ser tratado de duas maneiras, quanto ao cálculo do oxigénio estequiométrico (consumido na reacção real) e teórico (o necessário para a reacção completa): ao oxigénio estequiométrico (ou ao teórico) pode-se subtrair ou não o oxigénio presente na mistura. Aqui consideraremos a primeira hipótese e no cálculo do oxigénio subtrair-se-á o oxigénio fornecido com a mistura combustível. Depois de calculado o oxigénio (ou ar) teórico, pelas equações completas, e subtraída a quantidade que acompanha a mistura combustível, acrescenta-se o excesso. A diferença entre o oxigénio fornecido pelo ar e o oxigénio estequiométrico dá a quantidade de oxigénio que sai com os fumos. Definida a quantidade de oxigénio, calcula-se a quantidade de azoto que entra com o ar e pela relação nN2/nO2, e soma-se qualquer quantidade que possa ter entrado com a mistura combustível. Depois de somadas as várias contribuições fica-se com as quantidades de matéria de todos os componentes dos fumos. A composição molar obtém-se dividindo cada Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 8 quantidade individual pelo somatório de todas as quantidades presentes. Na base seca a quantidade de matéria de água presente nos fumos é simplesmente ignorada. Na base húmida a água é contabilizada como mais um componente da mistura e tratada de forma igual. Exemplo resolvido: Calcule a composição dos fumos, na base seca e na base húmida, da combustão duma mistura combustível com a seguinte composição molar: 50 % de etano, 20 % de metano, 20 % de oxigénio e 10 % de azoto. A mistura é queimada com 20 % de excesso de ar, sendo 60 % de cada hidrocarboneto completamente oxidado, 20 % de ambos oxidados até monóxido de carbono e os restantes 20 % não sofrem qualquer conversão (ver a resolução na tabela 1.2). Tabela 1.2. Exemplo de cálculo da composição dos fumos Base: 100 mol de combustível Ar Produtos Reag. n Reacção O2 N2 CO2 H2O CO C2H6 CH4 O2 N2 C2H6 30 C2H6 + 3.5 O2 → 2CO2 + 3 H2O 105 --- 60 90 --- --- --- --- --- 10 C2H6 + 2.5 O2 → 2 CO + 3 H2O 25 --- --- 30 20 --- --- --- --- 10 --- --- --- --- --- --- 10 --- --- --- CH4 12 CH4 + 2 O2 → CO2 + 2 H2O 24 --- 12 24 --- --- --- --- --- 4 CH4 + 1.5 O2 → CO + 2 H2O 6 --- --- 8 4 --- --- --- --- 4 --- --- --- --- --- --- --- 4 --- --- O2 20 --- – 20 --- --- --- --- --- --- --- --- N2 10 --- --- --- --- --- --- --- --- --- 10 O2 estequiométrico → 140i --- --- --- --- --- --- --- --- O2 teórico → 195ii --- --- --- --- --- --- --- --- Com 120 % de ar teórico → 234iii 880iv --- --- --- --- --- --- 880 Total 100 72 152 24 10 4 94v 890 i ii iii iv v → → → → → 105 + 25 + 24 + 6 – 20 = 140 50 x 3.5 + 20 x 2 – 20= 195 195 x 1.2 = 234 234 x 79/21 ≅ 234 x 3.76 = 880 234 – 140 = 94 mol 1094mol )890944102472( BS =+++++=∑ in mol 1246mol )1521094(OH BSBH 2 =+=+= ∑∑ nnn ii Exemplo na base seca: 066.0 1094 722 2 CO CO === ∑ in n x Exemplo 1.3. Determinar a composição dos fumos, na base seca e húmida, da combustão completa de n-hexano, com ar teórico. Repetir, só em base húmida, com 20 % de excesso de ar. (Solução: combustão completa e BH, xCO2 = 0.1232, xH2O = 0.1437, xN2 = 0.7331; BS, xCO2 = 0.1438, xN2 = 0.8562; BH com 20 % de excesso de ar, xCO2 = 0.1038, xH2O = 0.1211, xO2 = 0.0329, xN2 = 0.7422) Exemplo 1.4. Quando se queima metano com ar, a composição (molar) dos fumos na base seca é: 9.8 % de CO2, 1.3 % de CO, 1.6 % de O2 e 87.3 % de N2. Calcular a percentagem de ar teórico utilizada. (Solução: 104.5 %) Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 9 1.2. Termoquímica A termoquímica estuda a energia térmica (calor) requerida ou produzida nas reacções químicas. Genericamente estuda as variações de energia que ocorrem durante as reacções químicas. As reacções dizem-se endotérmicas, quando absorvem calor (q > 0 J), e exotérmicas, se libertam calor (q < 0 J). Sendo propriedades de estado, a entalpia e a energia interna, h e u, têm valores que só dependem dos estados inicial e final, dos reagentes e dos produtos, e não da forma como decorre o processo. Nos processos isobáricos, os mais frequentes, a energia térmica transferida iguala a variação da entalpia (equação 1.16), enquanto que a variação da energia interna do sistema é igual ao calor transferido nos processos isocóricos (equação 1.17). As duas propriedades relacionam-se entre si pela equação 1.18. 1kphq =∆= (1.16) 2kVuq =∆= (1.17) pvuh += ou (1.18) pVUH += 1.2.1. Estado-padrão e estado de referência As variações de energia durante uma reacção dependem da temperatura e da pressão a que ela ocorre. Por isso é necessário definir um estado-padrão (também denominado normal ou standard). O expoente o identifica esse estado-padrão. Para uma dada substância à temperatura T, num determinado estado, o seu estado-padrão é a sua forma pura, a essa temperatura e nesse estado, com a pressão a 100 kPa (1 bar). Desta forma, podemos escrever: po = 100 kPa. Para a água líquida a 298 K, o estado-padrão é líquido puro a 298 K e 100 kPa. Para o hidrogénio gasoso a 500 K, é o estado gasoso, puro, a 500 K e 100 kPa. Chama-se entalpia-padrão, ∆Ho, à variação de entalpia dum processo em que as substâncias iniciais e finais estão no estado-padrão, à temperatura T. Para a maioria dos dados termodinâmicos existentes (ver tabelas, no anexo 2), T = 298 K = 25 oC. Se o processo for uma reacção química, temos uma entalpia de reacção padrão (calor normal de reacção), ∆rH o, à temperatura T, sendo as substâncias iniciais e finais, neste caso, os reagentes e os produtos, respectivamente. Sendo a reacção esquematizada na equação 1.19, a entalpia da reacção no sentido directo será igual diferença dos somatórios das entalpias dos produtos e dos reagentes: Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 10 ∆rH o = HP – HR, sendo e i p i i hnH P1P ∑== j r j j hnH R1R ∑ == . Note-se que a entalpia da reacção inversa é simétrica da entalpia da reacção directa. Quando HP – HR < 0 J ⇔ HP < HR , a reacção é exotérmica, verificando-se variação de igual sinal na energia interna. A reacção é endotérmica se HP – HR > 0 J ⇔ HP > HR. Apesar das entalpias e energias internas variarem com a temperatura a que ocorre a reacção, pequenas oscilações da temperatura não implicam alterações significativas nas variações daquelas propriedades. 21 o r o r 21 PPRR dc H H ba +⎯⎯⎯⎯ ⎯← ∆− ⎯⎯⎯ →⎯∆ + (1.19) Tratando-se duma combustão, a entalpia da reacção é denominada entalpia ou calor de combustão – ∆cH –, igualmente designada, em módulo, poder calorífico do combustível a pressão constante. O poder calorífico denomina-se superior, quando toda a água formada é condensada e arrefecida até à temperatura ambiente. Diz-se poder calorífico inferior quando a água fica na fase de vapor. A diferença entre estes dois calores é o calor latente de condensação da água – ∆condH (H2O). Sabendo que o calor trocado, a pressão constante, é igual à variação da entalpia, e da relação entre entalpia e energia interna, pode-se definir o poder calorífico em relação a ambas as propriedades pela equação 1.20. Para sólidos e líquidos incompressíveis, p∆V ≅ 0 J, enquanto que para gases ideais (reagentes e produtos gasosos, temperatura constante), p ∆V = ∆n RT. Qp = ∆Hp = ∆Up + ∆(pV) = ∆Up + p∆V (1.20) Estado de referência duma substância (elemento, composto, etc.), à temperatura T, é o estado mais estável dessa substância, à temperatura especificada, a 100 kPa. A 298 K, o estado de referência da água é líquido; do carbono é a grafite; do etanol é o líquido; do oxigénio e do azoto é o gás. 1.2.2. Convenções termoquímicas Sem prejuízo das convenções sobre calores de formação padrão e calores de combustão padrão, na definição de entalpias de reacção, as seguintes são convenções gerais: – Não havendo outra indicação, as quantidades são as estequiométricas; – Deve-se indicar sempre o estado de agregação dos reagentes e produtos: g (gás ou vapor), l (líquido), s (sólido); aq (solução aquosa), aq, n (solução aquosa com n moles de água por mole de soluto) ou ∞ (diluição infinita); c (cristalino, α, β, ...), formas alotrópicas Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 11 (alótropos). Ex.: o carbono apresenta três formas alotrópicas: grafite, diamante e carbono amorfo, todas em fase sólida, nas condições habituais. – Se não for água, deve-se indicar qual é o solvente. Em soluções indica-se sempre a fracção molar (ou equivalente) dos solutos. Ex.: HCOOH (C2H6O, x = 0.2) – Indicar sempre a pressão e a temperatura dos reagentes e produtos, excepto se a reacção ocorrer com os reagentes e os produtos no estado de referência (100 kPa sempre e, habitualmente, 298.15 K). 1.2.3. Reacções de formação e de combustão Em termoquímica, as reacções de maior interesse são as reacções de formação e as combustões completas dum único combustível. São as entalpias-padrão destes dois tipos de reacções, a 298.15 K, que se encontram largamente compiladas e disponíveis em tabelas na literatura e bancos de dados (ver anexo 2, tabela A4). Muitos dados referem 1.00 atm (101 kPa), em vez de 100 kPa (1.00 bar), que é a pressão-padrão actual. Esta diferença mínima não produz variações significativas nos valores das entalpias. Reacção de formação dum composto é a que conduz à formação de 1 mol, a partir dos elementos constituintes. A entalpia envolvida, a temperatura constante, diz-se entalpia (ou calor) de formação – ∆fH. Se a pressão for 100 kPa, temos ∆fH o – calor normal ou padrão de formação. Por convenção, os reagentes e os produtos devem ser estáveis a 25 oC e 100 kPa, podendo a reacção ser fictícia ou real. Para todos os elementos no estado de referência, fica ∆fH o = 0 J/mol. Pode-se escrever Ho (O2) = H o (N2) = H o (C) = 0 J/mol, mas, no caso do carbono, deve-se escrever Ho [C(grafite)] = 0 J/mol, porque a grafite é a forma alotrópica de referência para o carbono. Logo, teremos ∆fH o [C(amorfo)] ≠ 0 J/mol e ∆fH o [C(diamante)] ≠ 0 J/mol. Para o composto XmYn, cuja entalpia de formação padrão é ∆fH o (XmYn), a equação de formação é dada pela equação 1.21. Pode-se escrever, a partir da equação 1.21, a equação 1.22, ficando evidente que a entalpia de formação padrão dos elementos X e Y (entre parêntesis rectos) é nula. m X + n Y → XmYn (1.21) ∆rH o = Qr = ∆fH o (XmYn) – [m ∆fH o (X) + n ∆fHө(Y)] (1.22) É evidente que não há variação de entalpia quando o azoto (sempre no estado de referência, gás molecular) sofre a seguinte ”transformação”: 2r2 N J/mol0N O ⎯⎯⎯⎯⎯⎯ →⎯ =∆ H . Tal Química-FísicaJoão Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 12 como o azoto (inerte nas combustões), os inertes e os reagentes que não reagem não são contabilizados no cálculo de ∆fH o porque entram e saem todos à mesma pressão e temperatura. Entalpia (ou calor) de combustão padrão – ∆cH o – duma substância é a variação de entalpia ocorrida na combustão de 1 mol de substância, com reagentes e produtos estáveis, no estado-padrão (298 K e 100 kPa). A combustão é completa (até CO2, H2O e N2). Havendo S ou outras substâncias oxidáveis, como Cl, é preciso definir, sendo possível, o estado final dos produtos nas condições-padrão. Exemplo (cloreto de etilo, ∆cH o = – 1241.14 kJ/mol): C2H6Cl (g) + 3 O2 (g) → 2 CO2 (g) + 2 H2O (l) + HCl (aq) (1.23) O estado-padrão refere-se apenas aos produtos da combustão no estado de referência. Não usar, por isso, ∆cH o e ∆fH o simultaneamente, em cálculos de calores de reacção, pois têm referências diferentes. Exemplo 1.5. Sabendo que a entalpia de combustão do CO é ∆cH o(CO) = – 282.99 kJ/mol, calcular a respectiva energia interna, ∆cU o(CO). (Solução: – 281.75 kJ/mol) Exemplo 1.6. Escrever as equações de formação e combustão do etano. Exemplo 1.7. Conhecendo ∆cH o(S), calcular ∆fH o(SO2). 1.2.4. Determinação de entalpias de reacção As reacções com compostos puros são, muitas vezes, difíceis de conseguir, devido à ocorrência de reacções concorrentes e sucessivas e à formação de outros produtos que obrigam a processos de separação. Desse modo, é difícil determinar de forma directa, experimental, a entalpia de muitas reacções. Quando é possível, usam-se os seguintes métodos: i) Calorímetro de fluxo Dispositivo que funciona isobaricamente, em sistema aberto, sem variação de energia cinética, nem potencial e sem trabalho externo. Havendo regime estacionário e conhecendo-se as entalpias molares (ou específicas) dos reagentes e produtos, calcula-se ∆rH com: HhnhnQ ri R i ii P i ip ∆=−= ∑∑ == R1P1 (1.24) ii) Bomba Calorimétrica Este sistema é fechado e isocórico, e não isobárico, como o anterior. Mantêm-se as outras características. Nestas condições: UQ rV ∆= (1.25) Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 13 Como alternativa aos métodos directos, usam-se os indirectos. Com as tabelas de ∆fH o e ∆cH o, ou de outras ∆rH o conhecidas, recorre-se à Lei de Hess (aditividade dos calores de reacção, corolário da 1.a lei): numa reacção, ∆rH depende da temperatura, da pressão, e do estado de agregação e combinação, apenas do início e do fim da reacção; é independente do número de reacções intermédias que nela ocorrem. A ∆rH o da reacção global é a soma das ∆rH o das reacções individuais em que ela se pode dividir. Todas as reacções, tanto a global como as individuais, podem ser hipotéticas, desde que estejam correctas estequiometricamente. Exemplo 1.8. Usando a lei de Hess, a partir da entalpia normal de formação do CO2 (– 393.516) e da entalpia normal de combustão do CO (– 282.99), calcular a entalpia normal de formação do monóxido de carbono (Solução: – 110.53 kJ/mol) Exemplo 1.9. Conhecendo as entalpias das duas reacções, calcule a entalpia de formação da água no estado gasoso. i) H2 (g) + 0.5 O2 (g) → H2O (l), com ∆rH o = – 285.840 kJ/mol; ii) H2O (l) → H2O (g), sendo neste caso, ∆rH o = + 44.016 . (Solução: – 241.824 kJ/mol) i) Determinação de ∆rH o a partir das ∆fH o Escreve-se a equação química da reacção, acertam-se os coeficientes estequiométricos (ni e nj), retiram-se das tabelas as entalpias de formação padrão de cada reagente e produto, substituem-se nos somatórios e calcula-se a entalpia, pela equação 1.26. A entalpia-padrão da reacção é a diferença entre o somatório das entalpias de formação normais dos produtos e o somatório das entalpias de formação normais dos reagentes (todas multiplicadas pelos coeficientes estequiométricos respectivos). ∑∑ == ∆−∆=∆ R j j P i ir jHniHnH 1 o mf o mf1 o )()( (1.26) ii) Determinação de ∆rH o a partir das ∆cH o Partindo dos valores de ∆cH o conhecidos, é possível calcular entalpias-padrão de reacções, incluindo ∆fH o. Usa-se a equação 1.27. A entalpia-padrão da reacção é agora a diferença entre o somatório das entalpias de combustão normais dos reagentes e o somatório das entalpias de combustão normais dos produtos (todas multiplicadas pelos coeficientes estequio- métricos respectivos, como no caso anterior). )()()R()P( o mc11 o mc o mc o mc o r iHnjHnHHH P i i R j j ∆−∆=⎥⎦ ⎤ ⎢⎣ ⎡ ∆−∆−=∆ ∑∑ == (1.27) iii) Cálculo de ∆rH, a partir de ∆cH o ou ∆fH o, em condições não-padrão Nestes casos, calcula-se primeiro ∆rH o por um dos métodos anteriores, conforme os dados disponíveis. Tratando-se de reacções de combustão, e havendo dados completos de ∆cH o, Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 14 é usualmente mais simples o cálculo com estes. Depois é necessário quantificar a variação de entalpia para “aquecer” os reagentes entre as condições-padrão (298 K) e a temperatura real a que ocorre a reacção (∆H1, no esquema da figura 1.3). Da mesma forma, calculam-se as variações de entalpia para aquecer os produtos entre 298 K e a temperatura real dos produtos, TP (∆H2, na figura 1.3). Substituir o caminho directo pela soma dos três processos da figura 1.3 é a aplicação da lei de Kirchhoff, definida pela equação 1.28. ∆rH(T) Figura 1.3. Esquema para aplicação da lei de Kirchhoff no cálculo de ∆rH. ∆rH = ∆rH o + ∑ ∆H (P) – ∆H (R) (1.28) ∑ Mantém-se a ordem entalpias de produtos menos entalpias de reagentes, se a integração for feita entre To e TR, que é a ordem inversa da realidade, trocando, por isso, o sinal na parcela dos reagentes. Para calcular ∑ ∆H (R) = a ∆H (A) + b ∆H (B) + ..., integra-se a equação 1.29. Tomemos como exemplo o cálculo para o reagente A. TcH T T p d)A( R o )A(∫=∆ (1.29) Dependendo da substância, sobretudo do estado em que se encontra, a capacidade calorífica, cp, pode ser obtida de diversas formas. Pode ser considerada constante, como no caso de líquidos e sólidos, e ainda gases perfeitos, mas na maioria dos casos, quando há grandes variações de temperatura, ela é função da temperatura. As relações existentes na literatura (além do recurso a tabelas e gráficos) são várias, sendo as mais habituais: i) cp = a + b T + c T 2 ou cp = a + b T + c T 2 + d T 3 (ver anexo 2, tabela A4) ii) cp = α + β T + γ T –2 iii) cp = x + w T + y T –2 + z T 2 Entalpia-padrão ∆H2 → ∑ ∆H (P) entre To e TP, à pressão p ∆H1 → – ∆H (R) ∑ entre To e TR, à pressão p ∆rH o aA + bB To (298 K) cC + dD To (298 K) aA + bB (TR) cC + dD (TP) Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 15 O uso da cp média, pc , é uma forma artificial de usar um valor constante, facilitando bastante os cálculos. Calcula-se, para a primeira relação cp(T), com a equação 1.30. of 3 o 3 f of of 2 of 3 )( 2 dd f o f o TT TTcTTba TT TcTbTa TT Tc c T T T T p p − − ×+++= − ⎟ ⎠ ⎞⎜ ⎝ ⎛ ++ = − = ∫∫ (1.30) Quer se use cp constante, pc , ou cp(T), não havendo mudanças de estado entre To e TR, calcula-se ∆H (A) com a equação 1.31, na opção correspondente. ⎪⎩ ⎪ ⎨ ⎧ ++ −− =∆ ∫ R o d)() )(ou )( ) )A( 2 AAAA oR)A(AoR)A(A T T pp TTcTbanii TTcnTTcni H (1.31) Havendo mudanças de estado, entre To e TR (ou TP), têm de se somar os calores latentes, correspondentes às mudanças de estado, às temperaturas de transição. Na equação 1.32, λ1 e λ2 são os calores latentes de mudança de estado às temperaturas TME1 e TME2. Como cada fase tem uma cp diferente, há tantos integrais quantos as fases e tantos calores latentes quantas as mudanças de fase. Em notação mais actual, os calores latentes (ou entalpias de transição de fase) mais habituais são: ∆fusH o (fusão), ∆vapH o (vaporização, evaporação, ebulição), ∆sublH o (sublimação). As entalpias das transições inversastêm o mesmo valor numérico e sinais contrários. Verifica-se também que ∆sublH o = ∆fusH o + ∆vapH o. ⎟ ⎠ ⎞⎜ ⎝ ⎛ +++++=∆ ∫ ∫∫ ME1 o R MER ME2 ME1 d...dd)A( )AR(2)A2(1)A1(A T T T T p T T pp TcTcTcnH λλ (1.32) Depois de escritas todas as equações, recorre-se a integração analítica, numérica ou gráfica. Enquanto que no cálculo de ∆rH o, os inertes e os excessos são excluídos, só interessando o que realmente reage, o mesmo não se passa agora. Inertes e excedentes que não reajam, sempre que entrem no processo a temperatura diferente de 298 K, tal como os produtos, têm de ser incluídos nos cálculos de entalpia, pois é gasta energia térmica para os aquecer e/ou arrefecer. No entanto, se entrarem e saírem à mesma temperatura, não é necessário inclui-los porque os efeitos de aquecimento e arrefecimento são simétricos e anulam-se. Em reacções com muitos reagentes e muitos produtos, o processo de cálculo pode gerar equações bastante extensas, cuja resolução pode ser difícil de conseguir. O recurso a máquinas de calcular, e/ou computadores, facilita bastante os cálculos, desde que se domine o seu uso. Exemplo 1.10. Com as capacidades térmicas médias dos gases/vapores [ pc (H2O, g) = 33.58 J mol –1 K–1; pc (H2, g) = 28.84 J mol –1 K–1; pc (O2, g) = 29.37 J mol –1 K–1], e a entalpia normal de formação da água gasosa [∆fH o(H2O, g) = – 241.826 kJ/mol], calcular a entalpia de formação do vapor a 100 oC. (Solução: – 242.6 kJ/mol) Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 16 1.2.5. Temperatura de reacção adiabática Promovendo condições adiabáticas na câmara de reacção, através do isolamento perfeito das suas paredes, a reacção química acontece sem troca de calor com o exterior. Nestas condições, a temperatura atingida depois de completada a reacção denomina-se temperatura de reacção adiabática, TRA, sendo ∆rH = Q = 0 J. Tratando-se duma combustão, a TRA também se chama temperatura teórica de chama. O conhecimento da TRA é muito importante, sobretudo nas reacções exotérmicas, sejam combustões ou outras, por causa da selecção dos materiais da câmara de reacção, e dos cuidados inerentes. No caso das combustões, a TRA é máxima com as quantidades teóricas de reagentes (oxigénio teórico, sem azoto), e reacção completa (conversão de 100 %), sem inertes, e em condições perfeitamente adiabáticas. Estas condições reflectem uma situação extrema, pois na realidade há sempre perdas de calor, as combustões com ar contêm sempre azoto como inerte, e a conversão completa é difícil de atingir. A altas temperaturas, acontecem equilíbrios entre CO, O2 e CO2, formam-se radicais livres, e dá-se ionização das espécies presentes, tudo isso implicando consumos de entalpia e redução da temperatura. Seguem-se exemplos de algumas TRA, de reacções de combustão com ar teórico, de combustíveis usuais: TRA (H2) = 2155 oC; TRA (gás natural) = 1960 oC; TRA (CO) = 2120 oC; TRA (propano comercial) = 1980 oC; TRA (butano comercial) = 1990 oC. A determinação da TRA passa pela resolução da equação da lei de Kirchhoff, sendo o limite superior de integração, TP, a variável pretendida. É o zero da equação 1.33. ∆rH = ∆rH o + ∑ ∆H (P) – ∆H (R) = 0 J (1.33) ∑ Sendo a incógnita o limite de integração, o processo de cálculo é ainda mais complexo do que o cálculo de ∆rH, em condições não-padrão. Recorre-se a métodos numéricos e/ou processos iterativos. Começa-se por arbitrar uma temperatura, TP, para a primeira iteração e calcula-se ∆rH, conforme descrito anteriormente. Se o valor encontrado for nulo, ou próximo de zero com um erro aceitável, encontrou-se a solução. Se não for, arbitra-se outro valor de temperatura e repete-se o processo. Quando o erro for aceitável, o valor da temperatura da última iteração é a solução pretendida. O conhecimento da ordem de grandeza das temperaturas adiabáticas de chama permite, desde o início, arbitrar valores que não sejam demasiado afastados da solução pretendida. Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 17 2. EQUILÍBRIO DE FASES E FUGACIDADE 2.1. Gases ideais O estado físico duma substância é definido pelas suas propriedades físicas. Uma equação de estado é uma relação matemática entre a pressão, p, o volume (total, específico, molar), V, v, Vm, e a temperatura do sistema, T. Expressa o facto de que essas propriedades não são independentes umas das outras. A figura 2.1 mostra o comportamento dum fluido que obedece à equação dos gases perfeitos, ou ideais. A constante dos gases, R, é a constante universal da equação de estado dos gases perfeitos: R = 8.314 510 J mol–1 K–1. p V = n R T ou p Vm= R T ou TRmTM RmVp == ou TRvp = (2.1) Um gás verifica um comportamento ideal se o espaço ocupado por cada molécula e as interacções mole- culares forem desprezáveis. A pressão, p, é a força por unidade de área. Exprime-se em Pascal, Pa (1 Pa = 1 N/m2), no SI, sendo 101.325 kPa = 1 atm e 100 kPa = 1 bar. As diferenças de pressão são as responsáveis pelo movimento dum fluido, que se desloca sempre das altas para as baixas pressões, até se atingir o equilíbrio. A escala SI de temperatura termodinâmica, absoluta, é escala de Kelvin. A escala relativa correspon- dente é a escala Celsius. A 0 oC corresponde o ponto normal de fusão da água, e a 100 oC o ponto normal de ebulição. As duas escalas relacionam-se pela equação 2.2. Figura 2.1. Superfície p-V-T. t/ oC = 15.273 K − T (2.2) As leis de Boyle, Charles e Dalton estão representadas na figura 2.2. São casos particulares da lei dos gases ideais, tal como o princípio de Avogadro. Esta e as duas primeiras são correlações obtidas a partir da equação dos gases ideais, quando duas das quatro variáveis (p, V, n e T) permanecem constantes. A lei de Dalton refere-se a misturas de gases ideais. Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 18 Permanecendo a temperatura constante, a pressão duma certa quantidade de gás perfeito é proporcional ao inverso do volume: p ∝ 1/V. O produto p V mantém-se constante. Esta relação constitui a lei de Boyle: p = k / V ou p V = k (figura 2.2, a e b). Figura 2.2. Relações de gases ideais: a) Isotérmicas p V (hipérboles); b) Lei de Boyle; c) Lei de Charles; d) Lei de Dalton. Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 19 Nos processos a pressão constante, o volume duma dada quantidade de matéria aumenta linearmente com a temperatura. É esta a expressão da lei de Charles: V = k1 x T (figura 2.2, c). De acordo com esta lei, quando a temperatura se aproxima do zero absoluto, o volume do gás tende também para zero. Nos processos isocóricos é a pressão que é directamente proporcional à temperatura, desde que a quantidade de matéria seja constante: p = k2 x T. O princípio de Avogadro relaciona o volume e a quantidade de matéria quando a pressão e a temperatura se mantêm constantes: V = k3 x n. A lei de Dalton (figura 2.2, d), diz que a pressão total numa mistura gasosa é igual à soma das pressões parciais, pi, dos componentes da mistura. O componente i, de fracção molar xi, é responsável pela pressão pi = xi p. Se o gás for perfeito, então a pressão parcial de cada componente seria a pressão que a mesma quantidade de cada gás exerceria no estado puro, nas mesmas condições. 2.2. Gases reais As interacções moleculares originam desvios ao comportamento ideal, dando características reais aos gases. Forças intermoleculares são forças de atracção ou repulsão que actuam entre as espécies. Algumas dessas forças são não específicas, no sentido em que actuam indepen- dentemente da composição das moléculas. As forças atractivas incluem ião-dipolo, dipolo-dipolo, dipolo induzido-dipolo, dipolo induzido-dipolo induzido. Estas interacções implicam desvios, que podem ser positivos ou negativos. Quando duas moléculas se aproximam, saem da zona onde a energia potencialé, tal como as interacções, praticamente nula (figura 2.3). Na região antes do contacto dominam as atracções, e a energia potencial atinge o seu mínimo. Na região de contacto, a energia potencial sobe bruscamente e as repulsões dominam. Figura 2.3. Energia potencial intermolecular vs distância e zonas de atracção e repulsão. Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 20 2.2.1. Factor de compressibilidade, z A equação 2.3 define o factor de compressibilidade. Este factor traduz o grau de desvio relativamente ao comportamento ideal. Para um gás perfeito, z = 1. A diferença para a unidade mede o desvio. Aproxima-se da unidade, a baixas pressões, mas com diferentes declives para os diferentes compostos (figura 2.4, a), ou para cada composto a diferentes temperaturas (figura 2.4, b). À temperatura de Boyle o fluido tem um comportamento ideal numa gama mais alargada de pressões. RT pVz m= (2.3) Figura 2.4. Variação de z com a pressão: a) Para diferentes gases reais; b) Para diferentes temperaturas (incluido a de Boyle) do mesmo gás real. 2.2.2. Equação de virial O desvio ao comportamento ideal pode ser expresso analiticamente, pela equação de virial. Para pressões próximas de zero, todos os gases se comportam como perfeitos e z = 1. À medida que a pressão aumenta, os desvios tornam-se cada vez mais significativos. Com a equação de virial, são quantificados somando séries de potências do inverso do volume (equação 2.4, forma de Kammerling-Onnes ou Leiden) ou séries de potências da pressão (equação 2.5, forma de Berlim). Os coeficientes B e C (B’e C’) são os coeficientes de virial. O segundo Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 21 coeficiente de virial, B, relaciona-se com o potencial intermolecular e dá conta da interacção de pares de moléculas (a mais importante). O terceiro, C, traduz as interacções trimoleculares, e assim sucessivamente. À temperatura de Boyle, B = 0. Os valores de B aumentam (relativos) com a temperatura e dependem apenas desta propriedade. As equações de virial têm uma firme base teórica, apoiada na Termodinâmica Estatística. ...1 2 mm m +++== V C V B RT pVz (2.4) ...''1 2m +++== pCpB RT pVz (2.5) Os segundos e terceiros coeficientes das duas formas da equação de virial relacionam-se pelas equações 2.6. RT BB =' e 2 2 )( ' RT BCC −= (2.6) 2.2.3. Equação de van der Waals e PEC Nas zonas de transição de fases, verifica-se um desvio significativo ao comportamento ideal. A superfície ideal (figura 2.1) tem agora o aspecto das figuras 2.5 e 2.6. No ponto crítico (cr na figura 2.6), a linha de equilíbrio líquido-vapor (L-V) termina. À temperatura crítica, Tc, líquido e vapor possuem a mesma densidade, pelo que deixa de ser visível a superfície que separa as fases. Acima da temperatura crítica não é possível, por compressão, obter uma fase líquida. À fase que se obtém a temperaturas superiores à crítica chama-se fluido supercrítico ou hipercrítico. O princípio dos estados correspondentes, PEC, baseia-se no uso de propriedades reduzidas: razão entre as propriedades de estado e os respectivos valores no ponto crítico. Como exemplo, Tr = T / Tc. O ajuste das isotérmicas a sistemas em equilíbrio L-V pode ser conseguido usando a equação de van der Waals (equações 2.7 e 2.8). Esta equação expressa o efeito das forças intermoleculares em função dum pequeno número de variáveis. a traduz as forças atractivas e b as repulsivas. 2 mm 2 2 V a bV RT V an nbV nRTp − − =− − = ou RTbV V ap =−⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ + )( m2 m (2.7) Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 22 Figura 2.5. Isotérmicas reduzidas de gás real, pressão reduzida vs volume reduzido, (à esquerda) e superfície p-V-T (à direita), pela equação de van der Waals, mostrando a região do ponto crítico e a zona de equilíbrio L-V. Figura 2.6. À esquerda, diagrama p-Vm do dióxido de carbono, mostrando as isotérmicas (horizontais na zona de equilíbrio L-V). À direita, diagrama de fases, p-T, duma substância pura, com as regiões de maior estabilidade de cada fase. Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 23 A equação de van der Waals é cúbica no volume (equação 2.8). Por isso, na zona de equilíbrio L-V, tem três raízes para o volume, para um dado valor de temperatura e pressão. A maior das três é o volume molar do gás (a que interessa), enquanto a menor se refere a líquido saturado. A raiz intermédia não tem significado físico. 0m 2 m 3 m =−+⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ +− p abV p aV p RTbV (2.8) Nas regiões próximas das mudanças de fase, os vapores têm sempre grandes desvios em relação ao comportamento de gás ideal. As isotérmicas que atravessam a zona de equilíbrio L-V são horizontais em diagrama p-V, ao contrário do previsto pela equação de van der Waals. A isotérmica crítica tem um ponto de inflexão horizontal no ponto crítico. Logo, a primeira e segunda derivadas são nulas nesse ponto. Aplicando à equação de van der Waals, obtêm-se as relações 2.9. bV Rb aT b ap V p V p TT 3e 27 8, 27 0 cc2c der Waalsvan 2 m 2 m cc ===→=⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ ∂ ∂ =⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ ∂ ∂ (2.9) Como vimos atrás, o valor das variáveis termodinâmicas reduzidas obtém-se dividindo cada variável, p, Vm e T, pelos correspondentes valores críticos: pr = p / pc, Vr = V / Vc e também Tr = T / Tc, sendo c cc c nRT Vp z = . Aplicando estas definições e as relações 2.9, obtém-se a equação 2.10, que é a equação de van der Waals escrita em termos de variáveis reduzidas. Esta equação é genérica pois não contém as constantes características da equação de van der Waals. Para equações como a de van der Waals, os parâmetros específicos do gás são eliminados. 2 rr r r 3 13 8 VV Tp − − = (2.10) Dois gases quaisquer, que estejam à mesma pressão reduzida e volume reduzido, têm de estar também à mesma temperatura reduzida. É este o princípio (ou teoria) dos estados correspondentes. Quando vários gases se encontram com as mesmas propriedades reduzidas, diz-se que se encontram em estados correspondentes. Gases em estados correspondentes têm todos o mesmo factor de compressibilidade. É este facto que se pode observar na figura 2.7, para quatro gases diferentes. Muitos outros seguem este princípio, embora seja necessário aplicar algumas correcções para se poder generalizar com mais rigor estas conclusões. Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 24 Figura 2.7. Factor de compressibilidade, z, em função da pressão reduzida, pr, para três valores de temperatura reduzida, de quatro gases reais. O cálculo do factor de compressibilidade está generalizado, por recurso a cartas (anexo 3, cartas A1) e tabelas, baseadas no PEC. No anexo 2, tabela A5, encontram-se os valores que permitem calcular z, a partir dos valores de pressão e temperatura reduzida. Os valores de z estão tabelados considerando zc = 0.27, que é o valor médio de zc, para a maioria dos gases reais. Se o gás concreto tiver zc ≠ 0.27, corrige-se o valor lido de z (na coluna central) com a equação 2.11. Nesta expressão substitui-se D por Da se zc > 0.27, e por Db se zc < 0.27. )27.0(' c −+= zDzz (2.11) Exemplo 2.1. Calcular o volume molar da água, a 1.5 MPa e 200 oC (vapor sobreaquecido), com a equação dos gases ideias, com a equação de van der Waals e com o factor de compressibilidade (PEC com zc como terceiro parâmetro). Comparar com o valor tabelado (Vm = v x M = 132.38 dm3/kg x 0.0180 kg/mol = 2.38 dm3/mol). 2.3. Equilíbrio de fases Há equilíbrio macroscópico quando as propriedades macroscópicas não variam (ou a variação não é detectável com a aparelhagem disponível). As acções sobre o sistema não existem ou estão compensadas. Pode haver equilíbrio parcial, apenas para alguma das alterações possíveis. O equilíbrio depende da diferença de potencial. Esta motiva a transferência querestabelece o equilíbrio. O tempo que demora depende da velocidade do processo, da sua cinética. Na realidade não há equilíbrios. Equilíbrios são limites ideais de processos reais, como são exemplos os processos de extracção e destilação. A pressão duma fase condensada (figura 2.8) é a exercida pelo próprio vapor, quando Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 25 está em equilíbrio dinâmico com essa fase, a uma dada temperatura. Denomina-se pressão de vapor. A temperatura normal de ebulição é aquela à qual a pressão de vapor é 101.3 kPa (1 atm). Um diagrama de fases, que pode ser muito complexo, é um diagrama que mostra regiões de propriedades intensivas (T, p), onde cada fase é termodinamicamente mais estável. As linhas do diagrama mostram as condições em que duas fases estão em equilíbrio (figura 2.9). O ponto triplo duma substância é o ponto no diagrama de fases no qual as três fases estão em equilíbrio mútuo. A regra das fases (mais adiante) implica que o ponto triplo é invariante. Figura 2.8. Pressão de vapor: pressão do vapor em equilíbrio com a fase condensada. Figura 2.9. Diagrama de fases da água, com as várias formas sólidas, líquido e vapor, linhas de separação de fases, ponto triplo e ponto crítico (nota: a linha horizontal mais larga representa mudança de escala). As especificações que devem ser satisfeitas por um sistema em equilíbrio são os critérios de equilíbrio. Para equilíbrio termodinâmico, o critério é: dStotal = 0. Só podem ocorrer Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 26 processos reversíveis infinitesimais, para se poder afirmar que o sistema está em equilíbrio. Para o equilíbrio térmico (ausência de transferência de calor, como previsto pela lei zero da termodinâmica), é melhor referir temperatura constante em todo o sistema: dT = 0. O equilíbrio químico (entre fases), adopta um critério que se relaciona com o potencial químico e a fugacidade, que agora se passa a analisar. 2.3.1. Energia livre de Gibbs e potencial químico A equação 2.12 define a energia livre de Gibbs, expressa tanto em relação à entalpia como à energia interna. Por combinação da 1.a e 2.a lei (processo reversível, sistema fechado, só com trabalho de volume), pode-se expressar as alterações de U e G, pelas equações 2.13 e 2.14. G = H – T S = U + p V – T S (2.12) VpSTU ddd −= (2.13) TSpVG ddd −= (2.14) Da equação 2.14 deduzem-se facilmente as derivadas incluídas nos gráficos da figura 2.10. A entropia do gás é maior que a entropia do líquido, e esta é maior que a entropia do sólido. Por isso, o decréscimo da energia livre, por efeito do aumento isobárico da temperatura, é mais evidente no gás, e mais suave na fase sólida. O declive de G vs T é sempre negativo e determinado pela entropia do sistema. S T G p −=⎟ ⎠ ⎞ ⎜ ⎝ ⎛ ∂ ∂ V p G S =⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ ∂ ∂ Figura 2.10. Variação da energia de Gibbs com a temperatura, a pressão constante (à esquerda) e com a pressão na isentrópica (à direita). Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 27 Mantendo a entropia constante (processo isentrópico), a variação da energia livre com a pressão é igual ao volume. Aumentando a pressão, há um aumento pronunciado da energia livre do gás, porque este tem um volume molar bastante mais elevado do que o das fases condensadas. A diferença entre o líquido e o sólido é mais ligeira, porque os volumes molares do líquido e do sólido não são muito diferentes. Para uma espécie pura, o declive de G vs p é sempre positivo e determinado pelo volume do sistema. A dependência de G com p é dada pela equação 2.15, onde po é a pressão de referência, à qual a energia livre de Gibbs é, arbitrariamente, igual a G(po). ∫+= p p pVpGpG o d)()( o (2.15) O cálculo de variações de energia livre, G(p) – G(po), a partir da equação 2.15, exige que se integre o volume entre po e p. Para sólidos e líquidos (figura 2.11, esquerda), se considerados incompressíveis, o integral é a área do rectângulo, V ∆p. Tratando-se dum gás perfeito (figura 2.11, direita), sendo V = nRT/p, o integral é igual a )/ln( oppnRT . Figura 2.11. Variação da energia de Gibbs com a pressão (área dos gráficos), para sólidos e líquidos (à esquerda) e para gases perfeitos (à direita). G é uma função de estado, que pode ser vista como uma função da temperatura, T, da pressão, p, e da composição do sistema, ni, descrita pela equação 2.16. Nesta, µi, é o potencial químico de cada espécie, definido como a energia de Gibbs parcial molar (equação 2.17). ∑+−= ii nTSpVG dddd µ (2.16) jnTpi i n G ,, d d ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ =µ (2.17) Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 28 dG = 0 é um critério geral de equilíbrio para processos reversíveis infinitesimais, a p e T constantes, apenas com trabalho de volume. Se num processo ∆G < 0, o processo é espontâneo; se for ∆G > 0, o processo é impossível. O critério termodinâmico de equilíbrio (dG=0) implica que o potencial químico duma espécie deve ser uniforme, em cada fase e nas várias fases em equilíbrio (figura 2.12). Uma fase é uma forma de matéria uniforme, química e fisicamente. A temperatura de transição duma espécie pura é aquela à qual o potencial químico é igual nas duas fases, e em que estas se encontram em equilíbrio. A uma determinada temperatura, a fase com potencial químico mais baixo é a mais estável (figura 2.13). Figura 2.12. Critério de equilíbrio: igual potencial químico em todas as fases. Figura 2.13. Potencial químico em função da temperatura. O potencial decresce de sólido para líquido e de líquido para gás (vapor). Às temperaturas de transição, os potenciais são iguais nas duas fases. O potencial químico dum gás perfeito é: ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ += o o ln p pRT iii µµ (2.18) G pode ser expressa em função da composição da fase gasosa, yi. A ∆G que ocorre quando se dilui um gás desde pT até pi será: iyRTG ln=∆ (2.19) Também, para uma solução ideal, pode considerar-se a ∆G quando se dilui um composto do estado puro (Gi o, xi = 1), até uma composição xi: iii xRTGG ln o += (2.20) Uma substância tenderá a escapar-se da fase (ou parte do sistema) em que a sua energia livre molar seja maior, para a fase (ou parte do sistema) em que ela seja menor. Desta forma a Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 29 energia livre molar constitui o potencial químico (governa a transferência de massa) da substância. A condição de equilíbrio de fases duma substância pura é representada pelas relações 2.21. mVp T =⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ ∂ ∂µ T1 = T2 = ... p1 = p2 = ... µ1 = µ 2 = ... (2.21) Quando a pressão tende para zero, a temperatura constante, o potencial químico tende para – ∞ (figura 2.14). Tal como acontece com o volume, que tende para + ∞, quando a pressão se aproxima de zero, também o potencial químico tende para infinito, ficando difícil aproveitar as baixas pressões, que são de grande interesse na generalização do comportamento ideal dos gases. Este interesse nas baixas pressões levou à expressão (por Lewis) do potencial químico com uma função auxiliar: a fugacidade, f. Como veremos, a fugacidade não tem o inconveniente do potencial químico. −∞= → µ 0 lim p Figura 2.14. Variação isotérmica do potencial químico com a pressão. Exemplo 2.2. Calcular ∆Gm , entre a base e o topo duma coluna de mercúrio (dados: M = 200.59 g/mol e ρ = 13.6 g/cm3), num manómetro, à pressão normal. (Solução: – 1.49 J/mol) Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 30 2.4. Fugacidade Conservando a forma da equação do potencial químico dum gás ideal, a equação 2.22 define o potencial químico dum gás real, à pressão p. A fugacidade tem unidades de pressão (Pa) e traduz o desvio (na medida em que difere de p), relativamente ao ideal (figura 2.15). ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ += o o ln i i ii p fRTµµ(2.22) Para um processo químico na fase gasosa, a constante de equilíbrio exacta deve ser calculada usando valores de f e não de pressão parcial de reagentes e produtos. O estado-padrão dum gás real é um estado hipotético em que o gás está à pressão po e se comporta “perfeitamente”. f relaciona-se com p através do coeficiente de fugacidade: p f =φ . Figura 2.15. Comparação das curvas do potencial químico vs pressão de gás perfeito e gás real, com as zonas de predomínio de atracções e repulsões. 2.5. Cálculo da fugacidade O valor de f pode ser obtido experimentalmente, fazendo p variar isotermicamente, e usando a definição: ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ =∆=∆ 1 2 m ln f fRTGµ (2.23) Alternativamente, integra-se a equação 2.24 e obtém-se a equação 2.25. Esta última, integrada para gás ideal (Vm = RT/p), leva ao resultado da equação 2.26. m m V pp G TT =⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ ∂ ∂ =⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ ∂ ∂ µ (2.24) ∫=∆ 2 1 m d pVµ (2.25) 1 22 1 lndRT p pRTp p ==∆ ∫µ (2.26) Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 31 As convenções para a fugacidade são: i) 1lim 0 = → p f p ; ii) µo é o potencial químico do gás quando f = 100 kPa (ou 1.00 bar); iii) pө é a pressão-padrão, 100 kPa (ou 1.00 bar). Usando estas convenções, a temperatura constante, chega-se às equações 2.27 e 2.28, que permitem calcular, respectivamente, φln à pressão p, e φln quando o volume molar é Vm. ∫∫ − =⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ −= pp p pp zp pRT V 00 m d1d1lnφ (2.27) ∫∫ ∞∞ ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ − +−−=⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ −+−−= mm m m m m d1ln)1(d1ln)1(ln VV V V zzzV VRT pzzφ (2.28) Para um gás ideal, fica apenas: bar lno pRT+= µµ , sendo 0ln =φ , porque f = p e 1=φ . A fugacidade não apresenta o inconveniente do potencial químico, uma vez que quando a pressão decresce até zero, a fugacidade tende para um valor finito: o da pressão. 2.5.1. Fase de vapor com p e T como variáveis independentes Integra-se, gráfica ou numericamente, a equação 2.27, se houver valores de z–1 em função de p, e obtém-se pφln , ou, ainda, analiticamente, se tivermos z vs p (equação de virial, van der Waals, e outras). Exemplo 2.3. Calcular f de N2 a 273 K, a 500 atm e a 800 atm, conhecendo os dados da tabela: p/atm 1 10 50 100 150 200 300 400 600 800 1000 [(z–1)/p] x 106 – 450 – 430 – 300 – 146 20 181 451 641 874 995 1070 [Solução: f500 atm =57.6 MPa (568 atm); f800 atm = 120.5 MPa (1189 atm)] Exemplo 2.4. Calcular f, a T, em função de p, para um gás que obedeça à equação de virial, truncada após o 2.o coeficiente. {Solução: f = p exp[B´ p]} Exemplo 2.5. Calcular f, a 1.00 atm e 100 K, dum gás (árgon) que obedeça à equação de virial, truncada após o 3.o coeficiente, sendo B = – 21.13 cm3 mol–1 e C = 1054 cm6 mol–2. Repetir para etileno a 200 oC e 7 MPa (B = – 40 cm3 mol–1 e C = – 200 cm6 mol–2). [Solução: 101.0 kPa (0.997 atm); 6.50 MPa] 2.5.2. Fase de vapor com cartas e tabelas generalizadas Obtém-se φ , a partir de Tr e pr, em cartas, ou a partir de valores tabelados (anexos, cartas A2 e tabelas A6 e A7). As cartas são do tipo das apresentadas na figura 2.16. Um processo usa o zc como terceiro parâmetro. Para a maioria dos compostos verifica-se que 0.26 < zc < 0.28. As tabelas dão valores para zc = 0.27, tal como as cartas. Porém, com as tabelas, os desvios de zc = 0.27 podem ser corrigidos com D (Da se zc > 0.27 e Db se zc < 0.27). Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 32 A equação usada é: )27.0( c10' −×= zDφφ (2.29) No outro processo é o factor acêntrico, ω, definido mais adiante, que é usado como terceiro parâmetro. As tabelas dão os valores dos logaritmos de base 10 (lg), da equação 2.30. )1()0( lglglg φωφφ += (2.30) Figura 2.16. Cartas generalizadas de coeficiente de fugacidade. Zona de baixas pressões à esquerda e altas pressões à direita. Os valores interiores são temperaturas reduzidas. Exemplo 2.6. Estimar f, de N2, a 502.5 atm e – 20.8 oC, com PEC e ω. (Solução: 55.0 MPa ou 543 atm) Exemplo 2.7. Calcular f, de CH4 gasoso, a 323 K e 50 atm, com PEC, cartas e tabelas, usando zc e depois ω, como terceiro parâmetro. (Solução: 4.86 MPa, 4.84 MPa e 4.77 MPa) Exemplo 2.8. Calcular f de N2 a 0 oC e 500 atm, com cartas e tabelas, primeiro com zc e depois ω. Repetir para etileno a 200 oC e 7 MPa. (Solução: 53.7 MPa, 55.2 MPa e 57.2 MPa; 6.58 MPa, 6.59 MPa e 6.42 MPa) 2.5.3. Fase de vapor com V e T como variáveis independentes Calcula-se, desde que se conheça z como função de Vm, com a equação 2.28. Exemplo 2.9. Mostrar que, para um gás que obedeça à equação de virial, truncada após o 2.o coeficiente, se obtém a seguinte expressão: ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ −= z V B ln2exp m φ . Exemplo 2.10. Para um gás que obedeça à equação de Reddlich-Kwong, , )( mm 5.0 m bVVT a bV RTp + − − = mostrar que se obtém: bV V bRT a bV Vzz + + − +−−= m m 5.1 m m lnlnln)1(lnφ . Nota: mxxmxx m + −= + 11 2 . Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 33 2.5.4. Fugacidade de líquidos ou sólidos puros Integrando a equação 2.31, obtém-se a equação 2.32. f c é a fugacidade da fase condensada e f sat é a fugacidade na saturação. O coeficiente de fugacidade na saturação é, evidentemente: sat sat sat p f =φ . Substituindo obtém-se a equação 2.33. ,ln m RT V p f T =⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ ∂ ∂ (2.31) ∫= p p pV f fRT sat dln msat c (2.32) ∫= p p p RT Vpf sat dexp msatsatc φ (2.33) A exponencial denomina-se factor ou correcção de Poynting e corrige o efeito da compressão do líquido ou sólido. φ sat corrige o desvio da idealidade do vapor saturado. O vapor é ideal para psat < 100 kPa, ficando f sat = psat = p de vapor e φ sat = 1, ou ligeiramente abaixo de 1. Exemplo 2.11. Calcule a fugacidade de H2O (l) a 100 bar e 300 oC, se Vm = 25.29 cm3/mol, psat = 85.93 bar e f sat = 67.42 bar. (Solução: 6.793 MPa) Exemplo 2.12. Calcule f de H2O (l) a 1000 atm e 25 oC, se psat = 0.0312 atm e o volume molar for função da pressão pela equação: atm 101.807.18 /molcm 4 3 m pV −×−= . (Solução: 6.51 kPa = 0.0642 atm) 2.5.5. Fase de vapor com a equação de virial Com a equação de virial, truncada a partir do 2.o coeficiente, obtém-se: )/(ln RTBp=φ . A equação de virial tem uma sólida fundamentação teórica, sem hipóteses arbitrárias, sendo os coeficientes relacionáveis com a função de potencial intermolecular, e apenas função de T. Os valores de B e C podem ser calculados a partir de dados p, V, T, ou utilizando o PEC. Cálculo dos 2.o e 3.o coeficientes, com dados p, V, T Truncar a partir do 2.o coeficiente é válido apenas quando se verifique a relação: cT pTp c 2 ⋅≤ . Truncada, a equação fica, na forma de Leiden, m 1 V Bz += , ou, em alternativa, na forma de Berlim, pBz '1+= . Estas duas equações são rectas, z = f (1/Vm) e z = f (p), sendo B e B’ o declive em cada caso. Calculam-se a partir de um ou vários pontos experimentais. O 2.o coeficiente é um indicador da força de atracção entre moléculas, pelo que, à mesma temperatura, será significativamente mais elevado (em módulo) para moléculas de grandes Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 34 dimensões e/ou fortemente polares. Truncada no 3.o coeficiente fica: m m 1)1( V CBVz +=− . Trata-se também duma recta, sendo B e C, respectivamente, ordenada na origem e declive. Obtidos B e C, determina-se f com: z V B ln2ln m −=φ ou z V C V B ln 2 32ln 2 mm −+=φ . Exemplo 2.13. Considerar os valores da tabela, para etano a 298 K. Calcular, a partir deles, os valores de B e C, da equação de virial. Calculados B e C, determinar f, a 298 K e 10 atm. p/atm 0 1 5 10 15 20 25 30 35 40 41 41.3 42 Vm/(cm3/mol) ∞ 24 268 4699 2248 1426 1010 755 579 445 326 300 292 270 (Solução: B = – 186.4 cm3/mol, C = 11 129 cm6/mol2 e f = 937 kPa = 9.25 atm) Cálculo dos 2.o e 3.o coeficientes, com PEC Para moléculas simples (gases raros mais pesados, como Ar, Kr, Xe; e, comboa aproximação, CH4, O2, N2, CO) basta usar dois parâmetros. Para moléculas mais complexas usam-se três ou mais. i) Correlação de Mc Clashan e Potter Para CH4, Ar, Kr, Ne e moléculas pequenas não polares: 2 r 1 r c 694.0886.0430.0 −− −−= TT V B ii) Correlações de Mc Clashan, Potter e Wormand Para alcanos e α-olefinas, até 8 átomos de carbono, n: 5.4 r 2 r 1 r c )1(0375.0694.0886.0430.0 −−− −−−−= TnTT V B Também para n-alcanos (n átomos de carbono): 5 r 5.12 r c )1(0057.0345.1145.0 −− −−−= TnT V B Sugeriram ainda, para n > 4: 2 3 c 479.038.5007.25 /molcm nnV ++= Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 35 iii) Correlações com o factor acêntrico de Pitzer, ω, como 3.o parâmetro O factor acêntrico de Pitzer, ω, mede o desvio da função potencial intermolecular duma substância em relação àquela das moléculas esféricas simples. Basicamente, dá informação sobre a acentricidade (ou não-esfericidade), e sobre a polaridade das moléculas. Existe tabelado para muitas substâncias (anexo 2, tabela A1). Para calcular ω, sugerem-se aqui três correlações possíveis (a primeira proposta por Pitzer). psat é a pressão de vapor, calculável com a equação de Antoine (anexo 2), ou retirada de diagramas ou tabelas. Trata-se da pressão de vapor para a temperatura à qual Tr = 0.7. Nas outras duas correlações, Tb é a temperatura normal de ebulição e θ é a razão entre a temperatura normal de ebulição e a temperatura crítica. pc é a pressão crítica. 0.1lg c sat −−= p pω 0.1 atm lg 17 3 c −⋅ − ⋅= p θ θω ; c b T T =θ 61 61 c 77435.0ln1472.135687.158251.15 347169.0ln62288.148096.656216.8MPa)/ln( θθθ θθθω +−− −++−− = − −p – Correlação de Pitzer e Curl (compostos apolares sem associação) [ ])1()0( c c ff p RTB ω+= 3r 2 r 1 r )0( 0121.01385.0330.01445.0 −−− −−−= TTTf 8 r 3 r 2 r 1 r )1( 0073.0097.050.046.0073.0 −−−− −−−+= TTTTf – Modificação de Tsonopoulos (compostos apolares sem associação) 8 r 3 r 2 r 1 r )0( 607000.00121.01385.0330.01445.0 −−−− −−−−= TTTTf 8 r 3 r 2 r )1( 008.0423.0331.00637.0 −−− −−+= TTTf Exemplo 2.14. Usar esta modificação para calcular B (comparar com o valor obtido com a correlação de Pitzer e Curl) e f do etano, a 298 K e 10 atm. (Solução: B = – 186.4 cm3/mol, – 188.3 cm3/mol; 936 kPa = 9.24 atm) – Equação de Abbot (modelo mais simplista) 6.1 r )0( 422.0083.0 −−= T f e 2.4 r )1( 172.0139.0 T f −= – Modificação de Tsonopoulos (compostos polares e com associação) [ ])2()1()0( c c fff p RTB ++= ω 8 r 6 r )2( T b T af −= f (0) e f (1) calculados como antes. Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 36 Os valores de a e b existem tabelados, para alguns fluidos (anexo 1, formulário) que formam pontes de hidrogénio (H2O, álcoois, ...). Para os restantes (cetonas, aldeídos, éteres, ...): b = 0 e , sendo: 8r 21 r 4 10308.410140.2 µµ −− ×−×−=a ( ) ( ) atmK/ D/10 c2 c 2 P5 r p T ×= µµ – Modificação de O’Connell (compostos polares e com associação) µr é o momento dipolar reduzido; λ é a constante de associação; ωH é o factor acêntrico do homomorfo (molécula apolar, da mesma forma e tamanho da molécula polar). [ ])(),()()( r)3(rr)2(r)1(Hr)0( c c TfTfTfTf p RTB λµω +++= – Modificação de Vetere (não se aplica à água, metanol ou etanol) [ )2(P)1()0( c c fff p RTB ωω ++= ] f (0) e f (1) de Pitzer e Curl 8 r 43 r 2 r 1 r )2( 10502.10716.02388.02717.01042.0 −−−−− ×+−+−= TTTTf 263 1.72 b P −= M Tω Sendo ωP < 0, considera-se igual a zero – Correlação de Chueh e Prausnitz (gases não-polares) Esta e as que se seguem para o 3.o coeficiente, C, são correlações aproximadas. ( ) [ ] [ ])2.702.30-(-2.49)1.89-(15-r0.25-r2 c 2 rr 2 r ee1468.00232.0 TTT dTT V C ++−+= d só é importante quando Tr é próximo de 1. Para temperaturas mais elevadas vem d = 0. Para temperaturas mais baixas pode-se truncar após o 2.o coeficiente. – Correlações de Pope (duas correlações) A primeira para fluidos simples, e outra, para fluidos normais, sendo C (0), C (1) e C (2) funções bastante complexas de Tr. Esta última só é válida para fluidos com 105.0≤ω . )0(2 c C V C = )2(2)1()0(2 c CCC V C ωω ++= Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 37 3. CÁLCULO DOS DADOS DE EQUILÍBRIO EM SISTEMAS IDEAIS 3.1. Misturas simples Aqui, misturas simples são as misturas binárias (ou mesmo multicomponentes) cujos elementos não reagem entre si, nem têm características electrolíticas, não havendo formação de iões. 3.1.1. Propriedades parciais Além da pressão parcial, podem definir-se outras propriedades parciais, para caracterizar misturas. O volume parcial molar de A, numa mistura, é a alteração do volume, por mole, que ocorre quando se adiciona uma quantidade infinitesimal de A a um largo volume de mistura. É expresso como o declive em V = f (nA), o declive das tangentes na figura 3.1, e definido pela equação 3.1. O potencial químico é também, como vimos, uma propriedade parcial molar, definida pela equação 2.17, e também apresentado na figura 3.1. B,,A A d d nTpn VV ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ = (3.1) Figura 3.1. O declive das tangentes às curvas representam as propriedades molares parciais (volume à esquerda, e potencial químico à direita). A energia livre depende da composição, n, da temperatura, T, e da pressão, p, de acordo com a equação 2.16 ( ∑+−= ii nTSPVG dddd µ ). Para a energia livre, e genericamente para qualquer outra grandeza, conhecendo o potencial químico (energia livre molar) das espécies Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 38 numa mistura, podem-se escrever a equações 3.2: o valor total da propriedade é o somatório das contribuições de cada espécie da mistura. BBAA µµ nnG += , BBAA VnVnV += , etc. (3.2) A equação 3.3, de Gibbs-Duhem, estabelece a relação entre as trocas que ocorrem entre as quantidades molares parciais numa mistura, a p e T constantes. Esta equação implica que as propriedades molares parciais, numa mistura, não podem variar independentemente. Se uma aumenta, a outra diminui, como se observa na figura 3.2, para o volume molar parcial (VA e VB na equação 3.2) duma mistura binária de água e etanol. ∑ = 0d ii Xn (3.3) Figura 3.2. Volume molar parcial de água e etanol, em função da composição. A dependência entre a energia de Gibbs de uma mistura e a composição da mistura é dada pela equação 3.2. Um exemplo de um processo espontâneo de mistura é o de dois gases colocados no mesmo recipiente. A mistura dos dois gases é espontânea e, por isso, deve corresponder a uma diminuição de G. Recordemos a equação 2.18, ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ += o o ln p pRT iii µµ , onde oµ é o potencial químico padrão, ou seja, o potencial químico do gás puro, à pressão de 1 bar. Simplificando, por omissão da pressão correspondente ao estado padrão, na equação, vem a energia de Gibbs dos gases não misturados (equação 3.4). )ln()ln( oBB o AAi pRTnpRTnG +++= µµ (3.4) Química-Física João Peixoto e Miguel Gama 2005/2006 39 Depois da mistura dos dois gases, as pressões parciais são pA e pB, cuja soma será igual a p. Após a mistura, Gf será definida pela equação 3.5. A diferença Gf – Gi, energia de Gibbs da mistura, será dada pela equação 3.6. Finalmente, substituindo ni por nxi, e (pi/p)= xi (lei de Dalton), a variação da energia livre, ∆mistG, entre Gi e Gf, devida à mistura de gases perfeitos ou de soluções ideais, ambos a p e T, é definida pela equação 3.7. Como se vê, a variação é proporcional à temperatura e independente da pressão. xA e xB são as fracções molares das espécies na mistura. Como 0 < x < 1 e, por isso, ln x < 0, pode-se concluir que os gases perfeitos e os líquidos ideais se misturam espontaneamente, pois 0mist <∆ G . )ln()ln( B o BBA o AAf pRTnpRTnG +++= µµ (3.5) ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ ++⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝
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