Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 Khilver Doanne Sousa Soares Clínica Integrada VI - Dermatologia Carcinoma Basocelular Trata-se de um tumor constituído de células morfologicamente semelhantes às células basais da epiderme, de crescimento muito lento, com capacidade invasiva localizada, embora destrutiva, sem, no entanto, provocar metástases (exceção a raríssimos casos relatados na literatura); é, portanto, a neoplasia maligna de melhor prognóstico. Epidemiologia Já foram vistos inúmeros dados no capítulo da carcinogênese; acentuaremos aqui que é a neoplasia maligna mais comum (cerca de 50% com relação à totalidade das neoplasias malignas); no que concerne aos cânceres de pele, sua frequência é a maior (cerca de 70%). Incide preferencialmente na idade adulta (mais de 90% acima dos 30 anos de idade), sendo discretamente mais usual no sexo feminino (58%:42%). Etiopatogenia Ressaltam-se como fatores etiológicos: radiações de todos os tipos, desde as calóricas até as ionizantes, certas substâncias químicas, como os derivados do alcatrão e o arsênico e, em escala quase desprezível, cicatrizes antigas (raro quando comparado ao carcinoma espinocelular). Como fatores relevantes, temos ainda a cor da pele e profissões de maior exposição às radiações (médicos, técnicos, marinheiros e lavradores). Histopatologia Trata-se de proliferação celular com as características basocelular, que se dispõem em paliçada na periferia das massas tumorais. Em geral, os núcleos são grandes, uniformes, pouco anaplásicos e com raras mitoses; as células não apresentam pontes intercelulares. São características e frequentes as lacunas contíguas às massas tumorais (retração justatumoral). O tumor pode apresentar diferenciação ou não. Quando indiferenciado, é dito sólido e é a apresentação mais frequente; neste caso, ser denominado indiferenciado não guarda nenhuma relação com agressividade, ao contrário de todas as demais neoplasias. A diferenciação ocorre no sentido dos anexos: pelo (ceratótico), glândulas sudoríparas (adenoide) e glândula sebácea (cístico). É interessante notar que a neoplasia é estroma-dependente, ou seja, necessita de tecido conjuntivo para seu crescimento. A cultura de células tumorais, na ausência do tecido conjuntivo, mostra a conversão dessas células em células basais normais, inclusive com capacidade de ceratinização. Tal fato talvez explique a raridade de metástase. A velocidade de crescimento do tumor é lenta, mas a multiplicação das células neoplásicas é rápida bem como a velocidade de morte dessas células. Clínica A lesão mais característica do CBC é a lesão “perolada”, ou seja, lesão papulosa translúcida e brilhante de coloração amarelo-palha, que é frequente em quase todas as suas manifestações clínicas. Às vezes, a lesão papulosa perolada de dimensões pequenas (alguns milímetros) é a única manifestação do CBC; outras vezes, a pérola ocorre na borda da lesão, que cresce centrifugamente; em outras, ainda, a pérola cresce como tal, tornando-se uma lesão globosa, em cuja superfície há discretas telangiectasias – essa lesão globosa acaba, mais cedo ou mais 2 Khilver Doanne Sousa Soares tarde, por ulcerar-se; de outras vezes, a lesão é vegetante ou ulcerovegetante. Em torno das lesões, não há inflamação, ou seja, as lesões estão encastoadas em pele sã. A localização preferencial é na região cefálica (cerca de 90%), seguida do tronco e, finalmente, dos membros. Em nossa estatística, encontramos 83% na cabeça e pescoço, e a região nasal foi a mais acometida (27% do total dos casos). Papulonodular, globosa ou nodulocística; + comum Na realidade, a pápula é a lesão inicial (alguns milímetros, com aspecto perolado); seu crescimento, após anos, leva à forma globosa ou nodular, que pode medir vários centímetros e que, se não for tratada, certamente ulcerará. Forma papulonodular . Observe o “brilho perolado” da lesão. Forma noduloulcerada. Observe, além da perolação da lesão, numerosas telangiectasias. Ulcerada Pode iniciar-se já como pequena úlcera ou em consequência do crescimento da forma globosa; a inflamação é mínima, e a secreção serosa é praticamente inexistente; a borda, no entanto, é sempre perolada. A. CBC – forma terebrante. B. CBC – forma terebrante – ressonância magnética mostrando invasão da tábua óssea e meninge; paciente em A. CBC – forma terebrante. 3 Khilver Doanne Sousa Soares Terebrante (ulcus rodens) É uma forma ulcerada com invasão rápida, provocando grande destruição do maciço central da face, reunindo em um só orifício boca e fossas nasais; instala-se, assim, a síndrome da gangosa. Outras vezes, a forma terebrante destrói o globo ocular, podendo invadir até mesmo a calota craniana. Plano cicatricial É relativamente superficial e cresce centrifugamente, de modo que a parte central apresenta um aspecto cicatricial e a periferia é sempre perolada. Na lesão, podem ocorrer microulcerações com cicatrização posterior e, assim, ir crescendo. É relativamente comum na região orbitária (lembra a recidiva em um paciente submetido a um retalho). CBC – forma plano cicatricial. Superficial, eritematosa ou pagetoide É representada por área geralmente oval, eritematoescamosa ou superficial, lembrando o lúpus eritematoso; a borda é nítida, no entanto, delimitada por um cordão muito fino, nem sempre perceptível. É mais frequente no tronco; tem certa correlação com a ingestão de arsênico; lembra a doença de Bowen (DB). É a apresentação do CBC própria dos pacientes submetidos à radioterapia, porém sem evidências clínicas de radiodermite. CBC – forma superficial. A. Observe discreta pigmentação na periferia. B. Localização rara (região palmar). Esclerodermiforme, fibrosante ou morfeia-símile Assemelha-se a uma placa de esclerodermia, e a borda não é nítida nem perolada; a superfície é lisa e brilhante, de cor amarelada; à palpação, sente-se certo grau de dureza devido à fibrose; é uma forma rara, de limites pouco definidos e infiltrativa. Na patologia, encontram-se poucas camadas de células tumorais por entre as fibras colágenas, tornando- o mais infiltrativo. É altamente recidivante. Pigmentada Trata-se de uma lesão papulosa, globosa ou ulcerada, com grande quantidade de melanina, o que provoca certa confusão com o melanoma. É mais comum em negros. 4 Khilver Doanne Sousa Soares CBC – forma pigmentada. CBC – forma pigmentada. CBC – pigmentado com recidiva, localizado em plano de fusão. Vegetante É muito rara. CBC – forma vegetante . Observe o “brilho perolado” da lesão. CBC – forma vegetante. Fibroepitelial ou fibroepitelioma de Pinkus Caracteriza-se por lesões solitárias ou múltiplas, moles, muitas vezes pedunculadas, localizadas no dorso, lembrando fibromas. Síndrome do nevo basocelular (síndrome de Gorlin-Goltz) Caracteriza-se pelo aparecimento, já na infância, de tumores que, com a idade, aumentam consideravelmente em número e tamanho. Os tumores podem lembrar nevos ou fibromas. Outras manifestações clínicas são: depressões puntiformes na região palmoplantar, cistos odontogênicos na mandíbula, anormalidades nas costelas, espinha bífida, calcificação da foice do cérebro e eventual retardo mental. 5 Khilver Doanne Sousa Soares Síndrome do nevo basocelular. A. Observe, além das lesões bem estabelecidas, inúmeras outras em franco desenvolvimento. B. Paciente idoso com múltiplos tumores agressivos. Diagnóstico É realizado com base na idade adulta do paciente e na morfologia da lesão, que é de crescimento lento, em geral na face e com aspecto perolado. Devemos suspeitar quando qualquer lesão passa a sangrar espontaneamente ou por mínimos traumas, crescimento súbito ou sintomatologia local. O exame histopatológico é decisivo. Evolução e prognóstico A evolução é extremamente lenta (até vários anos); o prognóstico só passa a ser ruim dependendo da localizaçãoe da manifestação clínica (destruição da órbita ou do maciço central da face nas formas terebrantes). Na síndrome do nevo basocelular, temos recorrências frequentes, assim como novas lesões. Áreas de fusão embrionária da face (“H da face”), portanto, com maior probabilidade de recidivar - Tumores localizados nos planos de fusão da pele tem maior chance de recidivar. Carcinoma Espinocelular Trata-se de uma neoplasia maligna, isto é, com capacidade de invasão local e de metastatizar, originária das células epiteliais do tegumento (pele e mucosa), com certo grau, maior ou menor, de diferenciação no sentido da ceratinização; são exceções a este último aspecto os carcinomas espinocelulares (CEC), altamente indiferenciados. Relaciona-se de maneira direta com exposição solar e é o mais frequente dos tumores relacionados com a imunossupressão. Algumas síndromes genéticas estão associadas ao seu aparecimento, tais como xeroderma pigmentoso, albinismo oculocutâneo, epidermodisplasia verruciforme. Clínica Pode surgir em pele sã, embora origine-se mais frequentemente em pele alterada por um processo anterior. Dentre as lesões que originam os CEC, destacamos ceratoses actínicas e tóxicas, radiodermites, úlceras crônicas, doenças 6 Khilver Doanne Sousa Soares cutâneas crônicas (lúpus vulgar, lúpus eritematoso), cicatrizes antigas, sobretudo de queimaduras (úlceras de Marjolin) e certas genodermatoses (xeroderma pigmentoso, albinismo). Quer se instale em pele sã ou em pele previamente comprometida, a lesão inicial surge como uma pequena pápula com certo grau de ceratose. Seu crescimento é mais rápido do que nos CBC, isto é, se processa em função de semestres: ocorre no sentido vertical para fora (vegetante) ou para dentro (invasão para a derme e hipoderme). Além do crescimento, um ponto de referência importante é o sangramento discreto, embora frequente. Como resultado, temos lesões ulceradas de crescimento contínuo, ulcerovegetantes, vegetações verrucosas (secas) ou condilomatosas (úmidas), infiltrações e, menos frequentemente, nódulos. Em geral e com certo valor prático, verifica- se que os carcinomas acima da linha que vai da comissura labial ao lóbulo da orelha são CBC, enquanto os abaixo são CEC; ao contrário dos CBC, os CEC surgem, com certa frequência, nas mucosas e semimucosas (boca, lábio inferior, glande e vulva). CEC – lesão ulcerada com ceratose central em pele fotoenvelhecida. CEC – pé. CEC – lábios. CEC – lábios. Infiltração é uma característica importante quando de localização mucosa. 7 Khilver Doanne Sousa Soares CEC – língua. CEC – pênis. O CEC apresenta maior capacidade de metastatizar quando localizado em superfície mucosa do que em semimucosa, e nesta maior do que na pele. No CEC do lábio, glande ou vulva, a ocorrência de metástase ganglionar é precoce; os gânglios crescem de volume, tornam-se duros, inicialmente móveis; contudo, depois, aderem entre si aos planos superficial e profundo, terminando em ulceração. Posteriormente, surgem metástases, por via hematogênica, em vários órgãos (pulmões, fígado, SNC, pele e ossos). Diagnóstico Lesão ceratósica de crescimento progressivo, que se instala em pele sã e/ou, preferencialmente, em pele já comprometida, em pessoas adultas, leva à suspeita de CEC, impondo- se o exame histopatológico. A biopsia deve ser realizada, sem nenhum inconveniente, o mais rapidamente possível. CEC – lesão ulcerovegetante no pênis, acompanhada de metástase bilateral. CEC metastático. CEC – com metástase ganglionar. O paciente tinha epidermólise bolhosa distrófica. ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ 8 Khilver Doanne Sousa Soares ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ AZULAY, Rubem David. et. al. Azulay Dermatologia. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017.
Compartilhar