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UNIDADE I Administração Pública: Tópicos Fundamentais Me. Marcio Lopes Cançado Dr. Ricardo Gonçalves da Silva Drª. Sueli Menelau de Novais Administração Pública e Estado em uma Concepção Contemporânea Prezado(a) estudante, bem-vindo a esta aula. Aqui, estudaremos como a sociedade, em sua evolução, tem passado por momentos de grandes transformações, exigindo cada vez mais dos governantes e de sua equipe de trabalho. Aula 01 A satisfação das necessidades da população é o motivo principal da existência de um governo, e este deve esforçar-se para atender ao povo que legitimou esse poder. Houve descobrimentos de terras e civilizações que desapareceram; períodos de escravatura e revoluções de libertação. Enfim, a história humana é rica em acontecimentos, mas sempre a Administração Pública esteve presente, adaptando-se à vontade e, muitas vezes, à necessidade do governo. É importante lembrar que já na Pré-História a Administração Pública já existia, conforme Quadro 1: Período Característica Paleolítico Vida nômade e organização para alimentação e segurança. Neolítico Vida sedentária e trabalho em grupo com distinção sexual do trabalho, sociedade comunista. Metais Surgimento da civilização, regras e cidade em comum, propriedade privada e o surgimento de classes sociais. Nascimento do Estado A partir do período conhecido como Metais, surgiu a civilização, que é o estabelecimento dos seres humanos sobre uma área continuamente possuída e cultivada, vivendo em construções habitadas, com regras e uma cidade comum. Começaram a surgir as primeiras cidades, com populações que se aproximavam de 2 mil habitantes. Nas sociedades civilizadas, aparecem as propriedades privadas, e aqueles que possuem propriedade se tornam ricos, e os que nada acumulam passam a depender dos ricos e ser explorados. A Administração Pública que até então era exercida por todos, na organização e controle sobre a alimentação e segurança contra os animais selvagens e os invasores, deu espaço para o surgimento: de classes sociais: passaram a existir ricos e pobres, senhores e escravos; e do Estado: estabelecimento de um governo que administra para o povo e controla a força militar (exército) sob determinado território. Nesse sentido, antes mesmo de se falar sobre Administração Pública, cabe ressaltar que não se pode iniciar um texto sobre esta seara sem uma definição inicial sobre três importantes conceitos: Estado, governo e a própria Administração Pública. Nesse contexto, vamos abordar alguns temas que se situam na relação de causalidade entre os poderes político, econômico e social atuais. Com base nesse escopo, cabe dizer aqui que nada é mais difícil, haja vista a pluralidade de enfoques advinda de diferentes opções políticas, tanto de quem escreve, como de quem lê. Grosso modo, o Estado existe, essencialmente, para realizar o bem-comum. Seu conceito surgiu da concepção antiga de cidade, da polis grega e da ciuitas romana. No século XVI, o termo Estado passou a ser usado com o significado moderno de força, poder e direito. Modernamente, segundo Matias-Pereira (2010), os estudiosos da finalidade do Estado dividem-se nas seguintes linhas de pesquisa: os que estudam a justiça, os que analisam o bem- SAIBA MAIS Leia o texto e saiba mais sobre as diferenças entre os conceitos de Estado, nação e governo. Clique aqui. http://www.brasilescola.com/geografia/estado-nacao-governo.htm estar e os que avaliam a segurança. Atualmente, o Estado é definido como um agrupamento de pessoas que coabitam um mesmo território com limites definidos, organizado em um conjunto de regras, pessoas e organizações, que se separam da sociedade para organizá-la. O Estado também pode ser compreendido como o local no qual o cidadão exerce a cidadania. Em ambos os sentidos, observe que o Estado passa a ser entendido a partir das ideias de separação entre público e privado e de representação. Por conseguinte, a concepção moderna de Estado apoia-se em três elementos justificativos, a saber: Povo: coletividade humana unida para constituir o Estado. [...] é a população do Estado, considerada sob o aspecto puramente jurídico, é o grupo humano encarado na sua integração numa ordem estatal determinada, é o conjunto de indivíduos sujeitos às mesmas leis, são os súditos, os cidadãos de um Estado. Nesse sentido, o elemento humano do Estado é sempre um povo, ainda que formado por diversas raças, com interesses, ideais e aspirações diferentes. (AZAMBUJA, 1982, p. 31) Território: base física do Estado à qual se impõe o limite físico de sua Jurisdição e da ação da soberania. Em outras palavras, é o definidor de competência dos órgãos do Estado. Poder político: que é a possibilidade do Estado de obrigar indivíduos a fazer – ou não fazer – algo, ou melhor, é o poder soberano atribuído ao Estado, portanto, o poder de seus órgãos deriva desse poder. o Legislativo, cuja função preferencial é elaboração de leis a serem seguidas por uma sociedade (papel normativo); o Executivo, no qual a função preferencial é conversão da lei em ato individual e concreto, por meio de fiscalização e implementação de políticas públicas (papel administrativo); e o Judiciário, tendo como função preferencial aplicação correta e forçada da lei e das penas correspondentes aos litigantes (papel judicial). Quanto a sua organização, observamos diferenças relevantes entre objetivos e estruturas administrativas de cada país. Existem, em linhas gerais, duas formas de Estado, ou melhor, dois modos de se dividir o poder em um determinado território: unitário – se houver apenas um centro de poder. federativo – com mais de um centro de poder. Montesquieu. Fonte: http://tinyurl.com/qzgpzg5 Na clássica classificação de tripartição de Montesquieu, o Estado é integrado por três poderes independentes e harmônicos entre si, que correspondem às três funções básicas preferenciais conforme Art. 2º da Constituição Brasileira ( BRASIL, 1988): Vamos entender melhor. Diferentemente da administração empresarial, na qual os modelos de gestão adotados são mundialmente válidos, a articulação do Estado se materializa: na primeira forma, no Estado unitário, em um governo central que detém a autoridade, ou seja, os Estados dentro de uma mesma nação não possuem autonomia; no segundo modo, em um Estado federativo, que traduz-se na reunião de um conjunto de unidades federativas (estados) autônomas internamente, mas cujo poder obedece aos termos de uma Constituição. Como forma de Estado, o Brasil adotou o federalismo. Os estados-membros, o Distrito Federal e os municípios são suas entidades federativas componentes, enquanto os territórios não são considerados membros da federação, mas sim simples descentralização administrativo- territorial da União A União, como diz o próprio nome, é a entidade política formada pela reunião das partes componentes, autônoma em relação aos estados e a que cabe exercer as prerrogativas da soberania do Estado brasileiro., sendo também chamados de autarquias territoriais. Para Costin (2010), o Estado contém um conjunto de entidades de decisão (governo) e de execução (Administração Pública). Falemos, inicialmente, sobre as primeiras entidades. Por governo, entendemos um agrupamento temporário de pessoas responsável pela execução do projeto de Estado por meio de um regime de governo. A finalidade do governo é melhorar a qualidade da prestação dos serviços públicos, com eficiência (na perspectiva de quem o usa), objetivando satisfação das necessidades coletivas. Assim, ao levarmos em consideração a multiplicidade de aspectos, o governo exerce função política que implica em atividade referida à direção soberana e universal do Estado em seu conjunto e sua unidade, dirigida a determinar os fins de sua ação e a assinalar diretrizes às outras funções. De tal modo, o governo se distingue do Estado por se limitar ao comando direto e à sanção da desobediência, objetivando a aplicação de leis estabelecidas em um país. Encontramos os seguintes sistemas degoverno: presidencialista: no qual o chefe de Estado também é o chefe de governo e, portanto, da Administração Pública (sistema adotado no Brasil pela Constituição de 1988, confirmado pelo plebiscito de 1993); parlamentarista: o comando de Estado é exercido por um presidente, ou um rei, sendo que a chefia de governo fica a cargo de um gabinete de ministros, nomeados pelo Parlamento e liderados pelo primeiro-ministro; semipresidencialista: o chefe de governo e o chefe de Estado exercem a Administração Pública (também chamado de sistema híbrido); diretorial: a Administração Pública é exercida por um órgão colegiado escolhido pelo Parlamento (ao contrário do parlamentarismo, não há possibilidade de destituição do diretório pelo Parlamento). No escopo do Estado, especificamente falando sobre as entidades de execução, o conceito de Administração Pública pode ser entendido sob duas perspectivas: funcional e organizacional. Em um sentido formal, amplo, subjetivo e orgânico, se referindo ao Estado como um todo, alude aos agentes públicos (órgãos) incumbidos de concretizar as atividades administrativas em qualquer um dos três Poderes, pois representa um conjunto de atividades do Estado que auxiliam as instituições políticas de cúpula no exercício de funções de governo, que organizam a realização das finalidades públicas postas por tais instituições e que produzem serviços, bens e utilidades para a população, como, por exemplo, ensino público, calçamento de ruas, coleta de lixo. (MEDAUAR, 2010, p. 48, grifo nosso) Observamos que, nessa primeira concepção, o propósito da Administração Pública é a gestão de bens e interesses da população nas três esferas de governo (federal, estadual ou municipal). Por outro ponto de vista, a concepção de Administração Pública em sentido objetivo, material ou funcional, designa a natureza da atividade administrativa exercida pelo Estado como um todo, não estando restrita apenas ao Poder Executivo. Assim, na acepção organizacional, de acordo com Medauar (2010, p. 48, grifo nosso), a Administração Pública “representa o conjunto de órgãos e atividades estatais que produzem serviços, bens e utilidades para população, coadjuvando as instituições políticas de cúpula no exercício das funções de governo”. Nesse escopo, a Administração Pública abarca os seguintes pontos: fomento, incluindo a ação administrativa de incentivo à iniciativa privada; polícia administrativa, abrangendo a atividade de execução de restrições impostas por lei ao exercício da liberdade e da propriedade em benefício do interesse coletivo; intervenção administrativa, compreendendo regulamentação e fiscalização da atividade econômica de natureza privada, bem como a própria atuação direta do Estado na atividade econômica [...], normalmente por meio de empresas públicas e sociedades de economia mista. (ALEXANDRINO; PAULO, 2008, p. 17-18) serviço público, incluindo-se aqui toda utilidade material que a Administração Pública executa, direta ou indiretamente, para satisfazer necessidades coletivas. Há ainda outra distinção que os estudiosos da matéria costumam fazer, a partir da ideia de que administrar compreende as atividades de planejar e executar: em sentido macro, a Administração Pública compreende tanto órgãos governamentais, aos quais incumbe traçar planos de ação, dirigir, comandar, quanto órgãos administrativos, subordinados, dependentes, aos quais incumbe executar planos governamentais; e, em sentido estrito, a Administração Pública compreende apenas os órgãos administrativos, enquanto função administrativa, quem as executa. Após estudarmos essas definições, podemos afirmar que a Administração Pública é a soma de todo o aparelho do Estado, ou seja, a estrutura organizacional em seus três Poderes (o Executivo, o Legislativo e o Judiciário) e em três níveis (união, estados e municípios). De acordo com a Constituição Federal brasileira, a Administração Pública pode ser ainda direta ou indireta. Utiliza-se a expressão Administração Pública direta quando as ações são realizadas diretamente pela estrutura administrativa dos órgãos públicos. Por sua vez, emprega-se e expressão Administração Pública indireta quando os atos são realizados por entidades jurídicas dotadas de personalidade jurídica e estrutura administrativa própria. SAIBA MAIS Saiba mais sobre a Administração Pública no Brasil. Clique aqui. http://www.brasil.gov.br/governo/2012/04/autarquias Organização e Controle da Administração Pública Brasileira A Administração moderna evidencia três abordagens teóricas abrangentes, brevemente faladas em sequência. Primeiramente, com a Administração Científica, houve direcionamento ao conhecimento sobre instrumentos e técnicas gerenciais, que se configuraram como um sistema de normas e procedimentos voltados para acompanhamento de atividades de trabalho, tais como: distribuição de tarefas e especialização das funções e cargos administrativos. Esses procedimentos e normas eram pensados a partir de modelos conceituais, que incorporavam ideais sobre gestão, podendo ser aplicados tanto em organizações públicas quanto privadas. Em segunda instância, passa-se na área a disseminação de pressupostos ligados às áreas funcionais da administração (principalmente Finanças, Marketing, Gestão de Pessoas e Produção). Esse momento simboliza o advento de especializações diversificadas da prática administrativa, contribuindo para que o próprio sentido da gestão na atualidade migrasse de percepções generalistas para percepções específicas de administrar. A terceira orientação da Administração corresponde aos debates suscitados no seio de estudos organizacionais que, por sua vez, redireciona o foco da gestão à organização como unidade de análise ( PAULA, 2005). Aula 02 Prezado(a) estudante, bem-vindo a nossa segunda aula! Iniciaremos nossa reflexão do ponto de vista epistemológico, conforme o qual a administração, em linhas gerais, e a Administração Pública, de maneira singular, encontram-se ligadas à Teoria Geral da Administração. Nas últimas décadas, a Administração Pública brasileira passou por grandes transformações, sobretudo como parte do trânsito para a democracia. Devemos destacar sua Administração. Desenvolveram-se novas práticas e expectativas de modernização, mas muitas de suas características tradicionais não foram removidas, como veremos no decorrer desta disciplina. A experiência histórica revelou que simplesmente expandir atividades do Estado e funções serviu menos ao propósito de alcançar maior equidade e eficácia na Administração Pública do que ao desenvolvimento de formas de inserção de novos grupos preferenciais. Em grande parte, a expansão do Estado se fez sem alterar substancialmente suas relações com a sociedade. Por ter ainda alicerces frágeis na sociedade, o Estado brasileiro, como organização, consiste ainda em uma superestrutura que flutua sobre os cidadãos. De todo modo, para que a administração do Estado seja conseguida, é preciso uma conexão entre funções administrativas (estabelecidas originalmente por Henri Fayol) e entidades públicas. Veja no Quadro 2 as funções da administração. Esta conexão entre funções administrativas e entidades públicas se dá por meio do controle, que, no Estado, deve ser entendido como instrumento de democracia, pois é por meio dele que será garantido o bom desempenho das atividades estatais realizadas no interesse do bem público. É necessário ressaltar que a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, datada de 1789, já estabelecia que a sociedade tem o direito de exigir a prestação de contas das ações praticadas pelos gestores públicos sobre a sua administração. Nesse sentido, dois tipos de sistemas de controle são exigidos: o externo e o interno. O sistema de controle externo fundamenta-se no controle social e democratização do Estado. Assim, o pressuposto é que as ações sejam exercidas com transparência e possibilidade de acesso pelos cidadãos à informação governamental, de modo a exercerem fiscalização contábil,financeira e orçamentária do Estado. Além do controle social, o Estado brasileiro Planejamento Processo de definir objetivos, atividades e recursos Processo de definir objetivos, atividades e recursos Processo de definir o trabalho a ser realizado e as responsabilidades pela realização; é também o processo de distribuir os recursos disponíveis segundo algum critério Direção Processo de realizar atividades e utilizar recursos para atingir os objetivos. O processo de execução envolve outros processos, especialmente o processo de direção, para acionar os recursos que realizam as atividades e os objetivos Controle Processo de assegurar a realização dos objetivos e identificar a necessidade de modificá- los PROCESSO OU FUNÇÃO DESCRIÇÃO também garante alguns mecanismos de controle externo por suas próprias instituições: “é o exercício da função fiscalizadora do povo sobre a Administração Pública” (MATIAS-PEREIRA, 2010, p. 192). Essa função é exercida pelo Poder Legislativo por meio dos Tribunais de Contas. Quanto ao controle interno, podemos entendê-lo como a ação exercida, sobre si própria, pela entidade responsável pelo desempenho da atividade controlada. Ou seja, é o controle administrativo direto da entidade nela mesma, cujo objetivo reside em apoiar o controle externo. O órgão central das funções de controle interno – e também de correição, ouvidoria e prevenção e combate a corrupção – do Estado brasileiro é a Controladoria-Geral da União. São objetos de controle: contas de gestores de recursos públicos e do governo; arrecadação e renúncia de receita; gestão de recursos orçamentários e extraorçamentários; contratos administrativos; aplicação de recursos descentralizados/repassados; desestatizações; transferências constitucionais e legais; atos de pessoal e declarações de bens/rendas; programas de governo e políticas públicas; cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal; e obras e patrimônio público. Não há hierarquia entre os sistemas de controle externo e interno: há complementariedade. O controle das atividades desenvolvidas pelo Estado consiste tanto no acompanhamento da evolução dessas atividades anteriormente relatadas quanto no confronto do desempenho observado com padrões anteriormente definidos. Essa compreensão faz com que a atividade estatal esteja sujeita ainda ao controle político. Esse tipo de controle visa manter o equilíbrio entre os poderes e se baseia no sistema de freios e contrapesos, cujas origens remontam à Constituição dos Estados Unidos da América. São exemplos de controle político: o veto de leis SAIBA MAIS A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão é um documento culminante da Revolução Francesa, que define direitos individuais e coletivos dos homens (tomada a palavra na acepção de ‘seres humanos’) como universais. Influenciada pela doutrina dos "direitos naturais", os direitos dos homens são tidos como universais: válidos e exigíveis a qualquer tempo e em qualquer lugar, pois pertencem à própria natureza humana. Para acessar o texto dessa declaração clique aqui. http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Documentos-anteriores-%C3%A0-cria%C3%A7%C3%A3o-da-Sociedade-das-Na%C3%A7%C3%B5es-at%C3%A9-1919/declaracao-de-direitos-do-homem-e-do-cidadao-1789.html aprovadas no Congresso Nacional pelo Chefe do Poder Executivo (art. 66, § 1º, da Constituição Federal – BRASIL, 1988) e o controle de constitucionalidade das leis pelo Poder Judiciário. Destacamos ainda mais duas observações sobre a função de controle presente na Administração Pública. A primeira se refere ao fato de que deve ser orientada pelos seguintes princípios: Universalidade, Totalidade, Legalidade, Imparcialidade, Autonomia e Independência. E a segunda alude a supremacia do interesse público, melhor dizendo, instrumentos distintos como demonstrações contábeis, financeiras, orçamentárias, patrimoniais e de natureza operacional são empregados para se obter amplo conhecimento da gestão da coisa pública. Esses pressupostos, a partir da perspectiva sistêmica, ficam, então, alocados segundo dois enfoques mostrados na Figura 1, a seguir: Figura 1: Enfoques de Controle. Fonte: Matias-Pereira (2010, p. 199). Não podemos perder de vista que, no debate que envolve o fortalecimento da democracia, é fundamental ter como referência o nível de confiança que a sociedade deposita nas instituições públicas e nos seus dirigentes. Assim, a credibilidade de instituições e agentes públicos se transforma em um elemento essencial para dar legitimidade ao sistema político. Nesse contexto, o esforço governamental para controlar a corrupção, externa e interna, é uma medida indispensável no processo de recuperação das instituições (MATIAS-PEREIRA, 2010). No Brasil, o controle estatal é um direito fundamental do cidadão e está consagrado na Carta Magna (BRASIL, 1988) em diversas passagens: direito de petição (art. 5º, XXXIV); direito de receber dos órgãos públicos informações de interesse geral (art. 5º, XXXIII); ação popular (art. 5º, LXXIII) e direito de denunciar aos Tribunais de Contas (art. 74, § 2º). Portanto, aqui, no nosso país, os estudos sobre sua Administração Pública uma hora ou outra envolvem elementos diversificados e dimensões herdadas de crenças e práticas advindas da formação sócio-política e cultural do país. Esses fatores têm se manifestado em traços característicos que prevalecem até os dias atuais, seja na maneira de gerir, seja no modo de se apropriar do aparato público institucional. Concomitantemente, a trajetória histórica da Administração Pública brasileira revela alguns modelos marcantes da gestão pública de órgãos e instituições (nos níveis federal, estadual e municipal), podendo ser destacados, como será visto mais adiante nesta disciplina, o patrimonialismo, o burocratismo e o gerencialismo. Evolução da Administração Pública no Brasil Conforme esse autor, as ideias que fomentam mudanças na Administração Pública não são assunto novo, pois “a partir das escolhas da sociedade quanto à configuração do Estado que se deseja, são direcionados os limites e as possibilidades da gestão pública, seu modelo, suas práticas e seus valores.” (MATIAS-PEREIRA, 2010, p. 3MATIAS-PEREIRA, J. Curso de Administração Pública: foco nas instituições e ações governamentais. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2010.). Parte-se do pressuposto de que não é possível entender as recentes transformações do Estado, da organização governamental e da administração pública brasileira sem tentar reconstruir os processos de formação e diferenciação histórica do aparato estatal Propriedade Aula 03 Prezado(a) estudante, bem-vindo a nossa terceira aula, sobre a evolução da Administração Pública no Brasil. Iniciaremos nosso diálogo na trilha do pensamento de José Matias-Pereira. Boa aula! VÍDEO Assista ao vídeo que aborda a evolução da Administração Pública no Brasil. pública subordinada ao Estado. que se constituiu no Brasil, desde que a empresa da colonização aqui aportou, no alvorecer do século XVI, ou, pelo menos, desde que o príncipe regente dom João VI transferiu a sede da Coroa portuguesa para o Rio de Janeiro e instituiu o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves. Como vimos até agora, o estudo da Administração Pública está intrinsecamente relacionado com o Estado e também com suas funções e limitações. Nesse sentido, no Brasil, observam-se em linhas gerais, algumas ocasiões relevantes na gestão pública, destacadas no Quadro 3 a seguir. Desde que o Brasil foi descoberto em 1500 até a transferência da sede do governo português para o país em 1808, vigorou na Administração Pública brasileira o modelo de gestão colonial. Esse modelo destacava-se pela indistinção do patrimônio público do privado, já que não há uma clara distinção legal e normativa (constitucional) entre res privada e a res pública. Dessa forma existiu, devido à distância de Portugal, uma descentralização administrativa e de poder que abria espaço para medidas públicas nas quais se entrava com facilidade a motivação privada. A participaçãoda vida política era apenas permitida aos “homens bons”, pessoas ricas, proprietárias de terras, que definiam rumos políticos das capitanias, e aos representantes do governo português, por meio de órgãos do governo criados na Colônia, que tinham a função de fiscalização. PERÍODO GESTÃO PÚBLICA 1500-1807 Administração colonial 1808-1821 Sede do governo de Portugal 1822-1889 Império 1889-1930 República Velha 1930-1946 Governo Getulio Vargas 1946-1985 Desenvolvimentismo e ditadura militar 1995 Nova Gestão Pública Em 1807, devido ao agravamento dos conflitos internacionais (resultado da Revolução Francesa), a repercussão em Portugal finda na vinda de D. João VI ao Brasil, quando teve seu território invadido pelo exército francês. Com a chegada da família real, dá-se o processo de separação política de Portugal e posterior formação do Estado brasileiro, sendo este um momento em que se operaram grandes transformações. Para a Administração Pública brasileira, a época de D. Joao VI destaca-se por implementações importantes dos elementos essenciais de um Estado soberano: alto escalão das hierarquias civil, militar e religiosa, membros da alta sociedade e da classe de profissionais. Além destes, que compunham a alta hierarquia administrativa portuguesa, vinham também outros elementos, do segundo escalão, mas de grande destaque na Administração Pública. Em 1822 tem origem o Brasil como nação independente de Portugal, adquirindo o Estado outra feição. Proclamada a independência política do Brasil, por Pedro I, a fase de modernidade e de progresso experimentada durante esse período do Império foi superior ao que a colônia obteve nos três séculos. A Constituição – em vigor de 1824 a 1889 – estabeleceu o voto censitário e dá continuidade à influência que sobre o país exercia a aristocracia rural. No que tange ao aspecto de gestão, a estrutura centralizada da burocracia imperial permitia um acúmulo de funcionários e atividades administrativas no nível do governo central. No final do século XIX, a figura do coronel já estava consolidada, de forma que, entre 1889 e 1930, foram D. João VI. Fonte: http://tinyurl.com/ms7hwlt firmadas as bases para o estabelecimento da República Velha, período conhecido também como a República dos Coronéis. A proclamação da República significou, assim, a ascensão dos coronéis ao “[...] primeiro plano da cena política” (VASCONCELLOS, 1995, p. 59). Nessa fase, permanece a continuidade da confusão entre o público e o privado. Os empregos públicos, sejam os municipais ou os estaduais, obedeciam às indicações dos coronéis. Entretanto, no curso dos anos de 1920, o coronelismo daria sinais claros de esgotamento político e de gestão, pois se mostrava pouco viável mantê-lo numa sociedade urbana que se modernizava. Nesse sentido, a distinção mais clara entre o público e o privado vai modificar o conjunto de práticas políticas e administrativas do Estado brasileiro. A racionalização da gestão proposta na Era Vargas vai tentar imprimir nova direção com relação a essa problemática. Como se viu no parágrafo anterior, até 1930 os arrolamentos estabelecidos pela Administração Pública no Brasil caracterizavam-se por imbricados relacionamentos entre o público e o privado. O fim da república oligárquica foi marcado pela Revolução de 30, que inaugurou a etapa decisiva do processo de constituição do Estado brasileiro, com a ascensão de Vargas ao poder. O período que se começa a partir dessa data lança as bases do Estado Administrativo brasileiro, iniciando-se a formação de um corpo de funcionários especializados. Entretanto, a elite que comandava o país na República velha ainda se fazia presente em relações clientelistas. Esse novo Estado subordina a si as forças, através dos novos códigos, leis e aparelhos administrativos. Nesse sentido, Draibe (1985, p. 60-61) afirma que “se processou uma estatização Termo dado ao estabelecimento de monopólio estatal sobre a exploração de determinado recurso natural ou à aquisição, eventualmente compulsória, pelo Estado, de empresas privadas ou da totalidade de setores da economia, anteriormente controlados pelo setor privado, de modo que passem a ser de propriedade pública. das relações sociais” e um reordenamento institucional que fez avançar a construção do arcabouço jurídico-político estatal, com o sentido fundamental de estabelecer novos suportes organizacionais e normativos para a expressão do poder do Estado como poder unificado, genérico e abstrato. Essa reforma administrativa foi conduzida pelo Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP) e buscou implementar princípios de Administração Científica nos moldes taylorista-fayolista-weberiano. Nessa direção, a Era Vargas institucionalizou o voto universal e secreto, unificou códigos judiciários e elaborou uma legislação sobre riquezas, saúde e educação. Isso fez com que o interesse geral ganhasse concretude no formalismo da lei. Foi, assim, edificado um aparelho burocrático-administrativo de intervenção e de controle, organizando em novas bases o “interesse geral”. O governo Getulio Vargas, por meio do DASP, também procurou imprimir à Administração Pública aspecto de agente de modernização, criando uma elite burocrática desvinculada da política partidária e que se identificasse com os princípios do governo. Nesse sentido, houve certo esforço para estabelecer uma carreira de funcionário público, em que o mérito era a qualificação básica para ingresso. Entretanto, a própria legislação limitou a possibilidade de formação de um grande estrato burocrático, submetido a regras formais de ingresso e promoção, de acordo com o mérito, pois, na cúpula do aparelho burocrático, a maioria das indicações para os cargos de confiança continuaram a ser feitas de acordo com preferências do presidente da República ou de seus ministros. Portanto, a escolha não era realizada, necessariamente, entre elementos da carreira de serviço público, limitando, assim, os novos critérios modernizadores de entrada no serviço público. Getúlio Vargas. Fonte: http://tinyurl.com/nyhz53p A transição entre a gestão de Vargas e a que lhe sucedeu dependeu da iniciativa militar, mas não representou, sob muitos pontos de vista, ruptura com o passado: apenas uma mudança para novos rumos na gestão pública em meio a muitas continuidades. Desse modo, no reordenamento político-jurídico do Estado procurou-se garantir o respeito às regras básicas do sufrágio universal e secreto, como também o controle político realizado por toda uma estrutura centralizada e burocrática do Estado ( DRAIBE,1985). Esse período, conhecido como Desenvolvimentismo, ocorreu após a Segunda Guerra Mundial, inicialmente no governo Dutra, colocando-se em prática a Constituição democrática de 1946. Envolveu, para o setor público, apoio estrangeiro em assistência técnica, organização de novos órgãos públicos e formação de um quadro de administradores profissionais. Também na época do Desenvolvimentismo, nas eleições realizadas em 1950, Vargas retorna ao poder na condição de Presidente da República. Nesse novo governo, promove medidas destinadas a incentivar o desenvolvimento econômico, com ênfase na industrialização. Entretanto, a característica dominante dessa gestão, nessa época, é a visão clientelista e populista das políticas públicas (MATIAS-PEREIRA, 2010). No período que se estende até a queda do governo Goulart em 1964, a gestão de Kubitschek é destacada. Sua política, definida em 31 objetivos no Programa de Metas, representou estímulo, fortalecimento e modernização Juscelino Kubitschek. Fonte: http://tinyurl.com/ny5b4b5 do funcionalismo público, com ações como: reestruturação de órgãos, execução e controle orçamentário, expansão do sistema de mérito e fortalecimento da autoridade do DASP (essas ações foram propostas pela Comissão de Estudos e Projetos Administrativos, instituída no governo de Juscelino Kubitschek. O período iniciado em 1964, do ponto de vista do poder, caracterizou-se pela ampliação das atribuições do Executivo e, consequente,diminuição dos demais poderes. Ocorreu também uma crescente participação do Estado na economia. A partir dessa data, tem início uma nova fase da ordenação do Estado no Brasil, quando concedeu-se ao Poder Executivo militar amplos poderes, sobrepondo-o ao do Poder Legislativo, evidenciando a impotência de cargos eletivos. Do ponto de vista administrativo, o governo militar assimila a máquina burocrática em todos os seus escalões. De importância central nessa nova ordem, o Ministério do Planejamento, por meio dos militares, estabelece medidas indicativas de um novo padrão de gerenciamento da máquina estatal, observado, sobretudo, o novo e importante papel atribuído às organizações estatais. Nas décadas do período militar, a reforma do Estado atinge a dimensão da garantia da governabilidade Múltiplas condições que determinam o espaço de possibilidade do exercício do poder e as condições de maior ou menor eficácia dentro do qual o poder é exercido nesse espaço. , devido: ao caráter intervencionista do Estado, ao seu tamanho e à ausência de condição para perfeito funcionamento do mercado. Diferentemente do que ocorria nas décadas de 1970 e início de 1980, o Estado começa então a ser entendido apenas como interlocutor e parceiro nas políticas, e não como aquele que ditatorialmente promulga leis e fiscaliza, devendo ser organizado com a função de executar serviços destinados ao interesse público. VÍDEO Não deixe de assistir ao documentário, cuja primeira parte está disponível no link a seguir, que mostra os fatos que culminaram na deposição do presidente João Goulart, em 1964, e na ditadura militar no Brasil. Estilos de Administração Pública Assim, na gestão do Estado brasileiro, de acordo com Bresser-Pereira (1998), há três estilos de se administrar o Estado. São eles: patrimonial, burocrático e gerencial. Aula 04 Prezado(a) estudante, vimos anteriormente que a Administração Pública traspôs-se, com algumas modificações, com diferentes lógicas de governo. Nesta aula, nosso foco estará voltado para os diferentes estilos de Administração Pública. Boa aula! O modelo de gestão patrimonialista entende o Estado como propriedade de grupos de interesses privados. No Brasil, essa forma de pensar é herança da monarquia portuguesa, que entendia que o patrimônio do rei se confundia com o aparelho do Estado, sendo uma extensão do poder do monarca. Cargos e o patrimônio público em si eram distribuídos como recompensas à lealdade ao rei. Essa forma de administrar associou-se a outros contextos, mas mostrou-se incompatível com a democracia que vai se instalando no país. Surgida na segunda metade do século XIX, na época do Estado liberal, com o objetivo de combater a apropriação do Estado e também combater a corrupção endógena ao patrimonialismo, ao separar a res pública da privada, nasce a gestão pública burocrática. Constituem princípios orientadores de seu desenvolvimento: a profissionalização, a ideia de carreira, a hierarquia funcional, em síntese, o poder racional legal. Os controles administrativos visando evitar a corrupção e o nepotismo são sempre a priori. Há uma desconfiança prévia nos administradores públicos e nos cidadãos que a eles dirigem demandas. Por isso, são sempre necessários controles rígidos dos processos, como na admissão de pessoal, nas compras e no atendimento a demandas. Essa gestão burocrática, associado à dominação legal-racional de Weber, tem como princípios: formalismo – regras exaustivas para evitar a imprevisibilidade e abusos; impessoalidade – o foco é o cargo e a norma e não a pessoa com seus interesses particulares; hierarquização – cadeia de comando clara, em que decisões obedecem a uma lógica prescrita em regulamentos, que permitem reduzida autonomia do servidor; e rígido controle dos meios – monitoramento dos procedimentos adotados pelos membros da administração no cotidiano de suas atividades. Por conseguinte, nesse modelo, um Estado pequeno não tem dificuldade em executar serviços sob sua responsabilidade. Entretanto, para atender as crescentes pressões e demandas sociais, a gestão burocrática passa a ser vista como incapaz e torna-se, à medida que atender suas regras passa a ser mais importante do que atender aos interesses da população, inadequada. Nesse contexto, o controle – a garantia do poder do Estado – transforma-se na própria razão de ser do funcionário. Em consequência, o Estado volta-se para si mesmo, perdendo a noção de sua missão básica, que é servir à sociedade. A qualidade fundamental da Administração Pública burocrática é a efetividade no controle dos abusos; seu defeito, a ineficiência, a autorreferência, a incapacidade de voltar-se para o serviço aos cidadãos vistos como clientes. Esses defeitos, entretanto, não se revelaram determinantes na época do surgimento da administração pública burocrática, porque os serviços do Estado eram muito reduzidos. O Estado se limitava a manter a ordem e a administrar a justiça, a garantir os contratos e a propriedade. Entretanto, com seu crescimento e as inoperâncias citadas no parágrafo anterior, assomam-se: a crise das finanças públicas; fortalecimento de governança pública; possibilidades abertas com tecnologias de informação; pressões por maior competitividade; e preocupações com ética, transparência e imputabilidade de dirigentes e políticos. Com essa convergência de elementos, surge a gestão pública gerencial, também chamada de Nova Gestão Pública (NGP) ( BRESSER-PEREIRA, 2007). Portanto, como vimos anteriormente, da perspectiva administrativa o Estado brasileiro era patrimonial até os anos de 1930, prevalecendo, então, a confusão intrínseca, ou inerente, ao patrimonialismo entre patrimônio público e privado. Já a administração na era do Desenvolvimentismo, seguindo até o período militar, segundo Bresser-Pereira (2007, p. 12) BRESSER-PEREIRA, L. C. Burocracia pública e classes dirigentes no Brasil. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, n. 28, p. 9-30, jun. 2007., passa a ser burocrática ou weberiana, preocupada principalmente com a efetividade da ação pública. A partir de 1995, quando começa a Reforma gerencial ou da Gestão Pública, a administração assume caráter crescentemente, gerencial na medida em que o critério da eficiência torna-se decisivo. O conceito de NGP abarca uma série de objetivos e formas administrativas que foram colocadas em prática a partir dos anos 1980. Seus primeiros passos foram dados pelo governo de Margaret Thatcher, na Inglaterra. Contudo, ao longo dos últimos trinta anos, houve muitas revisões dos propósitos originais, mais relacionados à ideia de Estado mínimo. Hoje, países com grande quantidade de gastos públicos em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) ou com forte intervenção estatal, como as nações escandinavas, utilizam-se das ideias do gerencialismo sem nenhuma ligação com o ideário neoliberal. Cabe frisar que a ideia de um SAIBA MAIS Aproveite para ler o artigo já citado nesta disciplina de Luiz Carlos Bresser-Pereira, “Burocracia pública e classes dirigentes no Brasil”, disponível clicando aqui. https://iesb.blackboard.com/bbcswebdav/institution/Ead/_disciplinas/EADG589/nova/documents/texto1U3E589.pdf modelo único de gerencialismo não é verdadeira, pois o que há são certos princípios vinculados às duas questões. A primeira diz respeito às críticas ao desenvolvimento da administração burocrática tradicional, argumentos que têm sido arrolados desde as décadas de 1940 e 1950, pelo menos. Autores como Merton (1977) e Crozier (1981),argumentam contra o excesso de padronização presente nas burocracias. que cria um mundo procedimental que ganha autonomia sobre os próprios objetivos da organização. A administração pública gerencial constitui avanço e, até certo ponto, quebra com a administração pública burocrática. No entanto, a gestão gerencial não rompe com os princípios estabelecidos anteriormente pela gestão burocrática, mas decorre da necessidade de modernização do Estado, de modo a atender necessidades igualmente plurais, atuais e relevantesda sociedade. Pelo contrário, a administração pública gerencial está apoiada na anterior, da qual conserva, mesmo flexibilizando, alguns de seus princípios fundamentais. Os mais importantes traços da forma de gestão burocrática mantidos pelo modo de gestão gerencial da Administração Pública são: estruturação de carreiras; ingresso no serviço público via concursos; exigência de procedimentos estruturados e previstos em lei; regulamentos para elaboração, movimentação e arquivamento de documentos oficiais; mecanismos de proteção aos servidores contra perseguições políticas; e estruturas de controle interno e externo. A diferença fundamental entre a NGP e a burocracia está na forma de controle, que deixa de basear-se nos processos para concentrar-se nos resultados, e não na rigorosa profissionalização da administração pública, que continua um princípio fundamental. Em linhas gerais, as características mais importantes do modelo de gestão gerencial, de acordo com Costin (2010) e Matias-Pereira (2010), podem ser sumarizadas em oito pontos principais: sistemas de gestão e controle centrados em resultados (e não mais em procedimentos); maior autonomia gerencial do gestor público; confiança limitada e permanentemente controlada por resultados (em contraste com o modo burocrático, em que não existe confiança); avaliação e divulgação de efeitos e resultados (tornando-se chaves para identificar políticas e serviços públicos efetivos); estruturas de poder menos centralizadas e hierárquicas; contratualização de resultados a serem alcançados; incentivos ao desempenho superior (inclusive financeiros); e criação de novos atores institucionais para realização de serviços que não configuram mais como atividades exclusivas do Estado. Na NGP a estratégia se volta: 1. para a definição precisa dos objetivos que o administrador público deverá atingir em sua unidade; 2. à garantia de autonomia do administrador na gestão dos recursos humanos, materiais e financeiros que lhe forem postos à disposição para que possa atingir os objetivos contratados; e 3. para o controle ou cobrança a posteriori dos resultados. Afinal, a NGP vê o cidadão como contribuinte de impostos e como cliente de seus serviços. Os resultados da ação do Estado são considerados bons não porque os processos administrativos estão sob controle e são seguros, como quer a administração pública burocrática, mas porque as necessidades do cidadão-cliente estão sendo atendidas. Na NGP (ou gestão gerencial) o Estado permanece o responsável último pelas políticas públicas, cabendo-lhe o papel de dar as condições de financiamento, indução e regulação para que os serviços sejam adequadamente prestados. No entanto, a permanência de fortes relações com grupos preferenciais faz a Administração Pública do Brasil ser retratada ainda como de grande base patrimonialista. As relações patrimoniais contradizem não somente as possibilidades de uma administração modernizada no sentido mais amplo do interesse público como também as práticas liberais tão proclamadas como a opção política dos últimos anos. Podemos observar, então, como a administração pública e a cultura tradicional são ainda bastante interligadas, apesar dos progressos na modernização institucional. Os relatos cotidianos na mídia, por exemplo, ainda demonstram forte ligação da coisa pública com interesses privados de grupos preferenciais. Assim, a Administração Pública brasileira ainda carrega tradições seculares de características semifeudais e age como um instrumento de manutenção do poder tradicional. Apesar do progresso em muitas instâncias de governo, as formas de ação obedecem menos a razões técnico-racionais e mais a critérios de loteamento político, para manter coalizões de poder e para atender a objetivos de grupos preferenciais. A modernização efetiva do Estado brasileiro somente poderá advir de formas que alterem o sistema de poder e o aglomerado político que o constitui; em outras palavras, reformas que redistribuam os recursos de poder e alterem os canais de comunicação entre o público e sua administração. SAIBA MAIS Aproveite para ler o texto de Sabrina Addison Baracchini, “A inovação presente na administração pública brasileira”, disponível clicando aqui. https://iesb.blackboard.com/bbcswebdav/institution/Ead/_disciplinas/EADG589/nova/documents/texto2U1E589.pdf Governança e Governabilidade Prezado(a) estudante, bem-vindo a nossa quinta aula. A princípio, faremos aqui uma pequena revisão em perspectiva sobre os conceitos de governabilidade e governança, evidenciando suas origens e evolução. Os conceitos de governabilidade e governança, embora tenham existido de forma embrionária desde o surgimento dos Estados modernos no século XIX, apenas em um período mais próximo começaram a integrar o debate nos meios acadêmico e político. Atribui-se, geralmente, a Huntington, um cientista político norte-americano contemporâneo, a primeira citação desses conceitos, ainda nos anos 1960. Somente após a crise do Estado nos anos 1970 e o aprofundamento do processo de integração ou internacionalização das economias – chamado de globalização – que esses termos passaram a ser encarados como um instrumental analítico importante à compreensão de todo esse período de transformação sem precedentes e, sobretudo, da reforma do Estado e de seu aparelho. O atual debate em torno do novo Estado tem se voltado para questões políticas, societais, organizacionais e gerenciais que o torne eficaz e eficiente, capaz de enfrentar os desafios que se impõem e os dilemas que se apresentam. Os conceitos de governabilidade e governança incorporam essas preocupações, sendo tratadas de forma diferenciada pela literatura recente. A discussão em torno do Estado constitui-se em um elemento central nas formulações estratégicas das diferentes agências e diversos órgãos que constituem seu aparelho. Aula 05 A governabilidade se refere às condições do exercício da autoridade política e a governança qualifica o modo de uso dessa autoridade, ultrapassando o marco do modus operandi das políticas e englobando questões relativas a padrões de coordenação e colaboração entre atores sociais. Entendemos governabilidade como as múltiplas condições que determinam o espaço de possibilidade do exercício do poder e as condições de maior ou menor eficácia dentro do qual o poder é exercido nesse espaço. Portanto, a governabilidade prelimita o espaço e determina a margem de eficácia com que dentro desse espaço o poder é exercido ( MELO, 1995). Governabilidade e pobreza no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1995.). Cabe salientar que a governabilidade não é um fenômeno completo, porém é um processo em andamento, formulando relações complexas entre componentes de um sistema político ( GIULIANI, 2010). Na mesma concepção, Huntington (2010) interpreta a crise de governabilidade como fruto dos excessos da participação e sobrecarga de demandas, pois o funcionamento adequado dos sistemas políticos depende do equilíbrio entre as instituições de input, agregadoras de interesses (sobretudo os partidos políticos), e as instituições governamentais de output, que regulam e implementam as políticas públicas. Por governabilidade geralmente se alude às condições sistêmicas mais gerais, sob as quais se dá o exercício do poder numa dada sociedade. Nesse sentido, as variações dos níveis de governabilidade sofrem o impacto das características gerais do sistema político, como a forma de governo, as relações entre os poderes, os sistemas partidários, o sistema de intermediação de interesses ( GIANFRANCO, 2010). Assim, em uma definição genérica, podemos dizer que a governabilidade refere-se às próprias condições substantivas e ou materiais de exercício do poder e de legitimidade do Estado e do seu governo derivadas da sua postura diante da sociedade civil e do mercado. Pode ser concebida como a autoridade política do Estado em si, entendida como a capacidade que este tem para agregar os múltiplos interesses dispersospela sociedade e apresentar-lhes um objetivo comum para curto, médio e longo prazos. Essas condições podem ser sumarizadas como o apoio obtido pelo Estado às suas políticas e à sua capacidade de articular alianças e coalizões e pactos entre os diferentes grupos sociopolíticos para viabilizar o projeto de Estado e sociedade a ser implementado. Já a governança pode ser entendida como a outra face de um mesmo processo, ou seja, como os aspectos instrumentais da governabilidade. Em geral, entendemos governança como a capacidade que um determinado governo tem para formular e implementar as suas políticas. Essa capacidade pode ser decomposta analiticamente em financeira, gerencial e técnica, todas importantes à consecução de metas coletivas definidas que compõem o programa de um determinado governo, legitimado pelas urnas. Avulta-se que, diferente da governabilidade, a fonte da governança não são os cidadãos ou a cidadania organizada em si mesma, mas sim um prolongamento desta, ou seja, são os próprios agentes públicos ou servidores do Estado que possibilitam a formulação e ou implementação correta das políticas públicas e representam a face deste diante da sociedade civil e do mercado, no setor de prestação de serviços diretos ao público. Cabe salientar também que a governança tem como postulado fundamental condições mínimas de governabilidade. Supondo, em uma circunstância de caos, crise, ruptura ou reversão institucional, será muito difícil (por melhor preparado no sentido técnico que seja o aparelho do Estado), senão impossível, atingir a governança strictu sensu, dado seu caráter, por definição, instrumental, como enfatizado no parágrafo anterior, e a indefinição de fins típica de situações dessa natureza. O máximo possível seria a manutenção de condições mínimas que garantam a transição de um contexto para outro, como, aliás, tem sido o caso brasileiro em certas épocas. Destacamos, neste contexto, as capacidades de comando, coordenação, intervenção e implementação como componentes fundamentais da governança, além do reforço dos mecanismos formais de prestação de contas e a institucionalização da cobrança por parte dos usuários dos serviços do Estado, introduzindo a accountability. Accountability é um conceito novo na terminologia ligada à reforma do Estado no Brasil, entretanto, já é bastante difundido na literatura internacional, em geral pelos autores de língua inglesa. Não existe uma tradução literal para o português, correspondendo à expressão “capacidade de prestar contas” ou “uma capacidade de se fazer transparente”. SAIBA MAIS Leia o texto “Governabilidade, governança e democracia: Criação de capacidade governativa e relações executivo-legislativo no Brasil pós-constituinte”, de Maria Helena de Castro Santos, disponível clicando aqui. https://iesb.blackboard.com/bbcswebdav/institution/Ead/_disciplinas/EADG589/nova/documents/texto17U1E589.pdf Entretanto, nesta disciplina, importa mais o significado que está ligado à responsabilidade objetiva ou à obrigação de responder por algo ou à transparência nas ações públicas. Ao observar as alterações políticas, sociais e institucionais ocorridas no Brasil nos últimos 20 anos constata-se que, embora muitos passos importantes tenham sido dados em direção à accountability, com criação de novas instituições, fortalecimento institucional em geral, a caminhada promete ser longa, principalmente porque ficou caracterizado que, no Brasil, o surgimento de um novo valor não necessariamente implica extinção do tradicional. De acordo com Bresser-Pereira (1998), sem governabilidade plena é impossível obter governança, mas esta pode ser muito deficiente em situações satisfatórias de governabilidade. Assim, é importante lembrar, mais como um elemento distintivo com a governança, que a fonte ou origem principal da governabilidade são os cidadãos e a cidadania organizada, ou seja, é a partir deles (e de sua capacidade de articulação em partidos, associações e demais instituições representativas) que surgem e se desenvolvem as condições citadas como imperativas à governabilidade plena. Nesse sentido, governabilidade e governança devem ser conceitos empregados de modo complementar. Ao final desta aula, convém ressaltarmos que se trata de aspectos distintos, porém interligados pela ação estatal. Contudo, não existem fórmulas mirabolantes para assegurar níveis excelentes de governabilidade. Governança, entretanto, no sentido aqui utilizado, diz respeito à capacidade de ação estatal na consecução das metas coletivas, referindo-se à capacidade de inserção do Estado na sociedade. Continuaremos, na aula seguinte, estudando os processos de reformas e mudanças no estado brasileiro. Até lá. VÍDEO Não deixe de assistir ao vídeo “Governança Pública: entenda o que é”, do canal do Tribunal de Contas da União (TCU). A Reforma do Aparelho do Estado Brasileiro e Seu Plano Diretor Prezado(a) estudante, bem-vindo à última aula desta unidade. Continuaremos nossos estudos observando a reforma do aparelho do Estado brasileiro. Continue estudando para desenvolver as competências e habilidades necessárias a essa área de atuação e do conhecimento. Boa aula! Prezado(a) estudante, bem-vindo à última aula desta unidade. Continuaremos nossos estudos observando a reforma do aparelho do Estado brasileiro. Apesar de só ter adquirido importância maior no governo de Fernando Henrique Cardoso, nos anos 1990, essa reforma esteve presente por muitas ocasiões no debate político, como, por exemplo, logo após a Revolução de 30, no período desenvolvimentista e, posteriormente, na ditadura militar, como elucida Matias-Pereira (2010). Mas, entre os impactos do fenômeno da globalização sentidos na esfera política, na década de 1990, se destacam as mudanças no papel do Estado, nomeadamente no que diz respeito à capacidade de prover um sistema de proteção social que minimize os efeitos do processo de acumulação. No centro do debate mais amplo, encontra-se o questionamento da capacidade e da responsabilidade que hoje tem o Estado de implementar políticas públicas. Aula 06 Primeiramente, cumpre dizer o que não é a reforma do Estado. Determinadas mudanças administrativas, praticadas nos anos 1980 e 1990, não o são, ainda que tenham recebido o nome de reformas administrativas. Não podemos dizer que as tentativas de despolitizar o Estado e as políticas públicas, quer dizer, de transformar questões políticas, conflituosas, distributivas, em questões técnicas, seja um projeto de reforma do Estado. Também não podemos afirmar que a reforma do Estado seja a solução definitiva para todos os problemas sociais. Recursos, por definição, são escassos, e os Estados trabalham com menos recursos do que necessitam. Sempre haverá mais necessidades do que disponibilidades. Assim, sempre será necessário estabelecer prioridades e decidir aonde alocar os recursos. A reforma do Estado não é tampouco uma simples mudança de estruturas organizacionais, o desmonte da máquina pública ou a redução de pessoal. Frequentemente, acredita-se que a extinção de umas poucas agências, algumas fusões ou incorporações de um organismo por outro possam mudar o papel do Estado ou aumentar a efetividade das políticas públicas. E, por fim, a reforma do Estado também não é a veiculação de uma ideologia gerencialista que se pretende pragmática ( PEIXOTO, 2000). A reforma, qualquer reforma, é pragmática para uns e ideológica para outros. Na verdade, a reforma do Estado é muito mais do que esses três elementos expostos. É uma mudança qualitativa nas relações do Estado com a sociedade, tendo a cidadania como ponto de referência. É também uma mudança nas regras de inserção e jogo dos atores na competição política, de sorte a assegurar mais elegibilidade. Não basta que haja inclusão e debate público; é necessário que as pessoas participem do jogo e sejam verdadeiramente elegíveis, estejam incluídas e participem não só da competição política, mas também da gestão das políticas públicas e de seu controle. A reforma do Estado tambémpode mudar as políticas da extração e alocação de recursos, quer dizer, o modo como o Estado arrecada os recursos das pessoas e como os distribui. E, nesse mesmo contexto, pelo menos no caso brasileiro, é redefinir o pacto federativo, estabelecer como são distribuídos os encargos e recursos entre as regiões e os diferentes níveis do governo, vale dizer, como o poder é repartido regionalmente. Assim, como dito por Prates (2000), a discussão sobre a reforma do Estado precisa se dar pelo enfoque de sua finalidade: Para quê, qual o sentido de se reformar e qual o resultado final que se quer obter, uma vez que o Estado esteja reformado? A partir daí, é que se sabe o que se deseja. A seguir, o Quadro 4 apresenta os principais aspectos históricos das reformas administrativas no Brasil. Quadro 4: Principais atos históricos das reformas administrativas no Brasil. Fonte: Jund (2002, p. 21). DATA ASPECTO HISTÓRICO 1936 Criação do DASP 1964 Lei nº 4.320 (estabelece Normas Gerais de Direito Financeiro, Orçamentos e Balanços da União, dos Estados, Municípios e do Distrito Federal; Lei nº 4.401 (Instituto das Licitações Públicas no Brasil) 1967 Decreto-Lei nº 200 – Organização da Administração Federal, estabelece diretrizes para reforma Administrativa; Decreto-Lei nº 201 – Dispõe sobre a responsabilidade dos prefeitos e vereadores 1986 Decreto-Lei nº 2.300 – Considerado o Estatuto Jurídico das Licitações e Contratos administrativos; Criação do Sistema Integrado de Administração Financeira Federal (SIAFI) 1988 Constituição Federal 1993 Lei nº 8.666 – regulamenta o art. 37, inc. XXI da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública 1995 Reforma Administrativa. Criação do Ministério da Administração e Reforma do Estado (MARE), responsável pela última Reforma Administrativa Gerencial 1998 Emenda Constitucional nº 19 – Modifica o regime e dispõe sobre princípios da Administração Pública, servidores e agentes políticos, controle de despesas e finanças públicas e custeio de atividades a cargo do Distrito Federal; Projeto Piloto TCU – dando sequência ao projeto iniciado com a EBAPE/FGV, e outras instituições o TCU desenvolve os primeiros trabalhos de Auditoria de Desempenho Governamental, por meio de projetos-piloto 2000 Lei Complementar nº 101 – Lei de Responsabilidade Fiscal, estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal; Lei nº 10.028 – Acrescenta os art. 359-A a 359-H, ao Código Penal brasileiro, tipificando os crimes de responsabilidade fiscal praticados contra a Administração Pública; Plano Avança Brasil – Lei do Plano Plurianual, incorpora os projetos e investimentos previstos de realização, segundo os preceitos definidos pela Reforma Administrativa Gerencial 2001 Instrução Normativa nº 01/2001 – Define as Normas de Auditoria e Fiscalização, sob a responsabilidade da Secretaria Federal de Controle, jurisdicionada ao Ministério da Fazenda, visando à auditoria dos gastos públicos realizados pelo Governo Federal No entanto, ainda que examinados sob novas perspectivas, os problemas que suscitaram as reformas estudadas nesta unidade continuam a desafiar governantes e governados. De fato, nenhuma reforma realizada nos últimos anos parece ter logrado superar as contradições entre a reconhecida necessidade de reduzir a interferência do Estado na vida de empresas e indivíduos e a urgência de resgatar sua governabilidade em sentido amplo. Alguns desses problemas, de variada natureza – conceitual, histórica, econômica, sociopolítica e mesmo cultural, sobretudo aqueles de natureza teórica –, são de difícil enfrentamento, seja porque não possuem uma estrutura de referência universalmente reconhecida e aceita (um paradigma), seja porque, de saída, evocam questões ideológicas de largas consequências. Os problemas relacionados às peculiaridades do contexto brasileiro, embora suficientemente conhecidos e analisados, muitas vezes não são adequadamente situados no contexto da reforma do Estado para subsidiar diagnósticos e propostas de mudança. A versão mais aceita é a que foi propagada por Bresser-Pereira (1998, 2007). Segundo o ponto de vista exposto pelo autor, o Estado brasileiro tornara-se incapaz de administrar as crescentes expectativas por benefícios sociais. Se, por muitas vezes, o Estado socorreu o mercado, a partir deste momento passou a ser necessário trazer o mercado para “desafogar” o Estado em crise, quer dizer, o Estado é o ator deficitário e gerador de desequilíbrios no sistema econômico. A crise do Estado é definida, então, em três dimensões: uma crise fiscal, caracterizada pela crescente perda de crédito por parte do Estado e pela poupança pública que se torna negativa; o esgotamento da estratégia estatizante de intervenção do Estado, a qual se reveste de várias formas: o Estado do bem-estar social nos países desenvolvidos, a estratégia de substituição de importações no terceiro mundo e o estatismo nos países comunistas; SAIBA MAIS Não deixe de ler na íntegra o texto da Lei nº 8.666, que institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências, disponível clicando aqui. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm a superação da forma de administrar o Estado, isto é, a superação da administração burocrática. Entretanto, existem muitas evidências de causas exógenas à crise do Estado, em geral, e à crise do Estado brasileiro, em particular. Portanto, o tema da reforma do Estado continua atual e oportuno. Sociedades mudam, Estados se transformam e reformas se sucedem. Presentemente, muitos países conduzem processos importantes de mudanças institucionais que terão impactos significativos sobre os limites de intervenção do Estado na vida social, a organização governamental e as práticas de gestão. No Brasil, não obstante, inexista uma iniciativa oficial nesse sentido, várias medidas legislativas e governamentais continuam alterando a conformação do aparelho do Estado e instituindo novos mecanismos de operação. Plano Diretor da reforma do aparelho do Estado O tema da reforma do Estado ganhou espaço nos debates políticos e intelectuais durante a década de 1980. Os países que iniciaram as reformas foram: Inglaterra, Estados Unidos, Nova Zelândia, Austrália e, ainda, vários outros países europeus, como Alemanha e Itália. Na América Latina, Chile, México e Argentina foram os países que iniciaram as experiências de reforma do Estado ainda na década de 1980. Como visto anteriormente, em 1995 teve início, no Brasil, a reforma da gestão pública ou reforma gerencial do Estado, com a publicação, nesse ano, do Plano Diretor da Reforma do Estado (PDRAE). Nos primeiros quatro anos do governo de Fernando Henrique Cardoso, enquanto Bresser- Pereira foi o ministro, a reforma foi executada ao nível federal, no Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado (MARE). Com a extinção do MARE, a gestão passou para o Ministério do Planejamento e Gestão, ao mesmo tempo em que estados e municípios passaram também a fazer suas próprias reformas. Um dos princípios fundamentais do PDRAE é o de que o Estado, embora conservando e, se possível, ampliando sua ação na área social, só deve executar diretamente as tarefas que são exclusivas de Estado, que envolvem o emprego do poder de Estado ou que apliquem os recursos do Estado. Entre as tarefas exclusivas de Estado devem-se distinguir as tarefas centralizadas de formulação e controle das políticas públicas e da lei, a serem executadas por secretarias ou departamentos do Estado, das tarefas de execução, que devem ser descentralizadas para agências executivas e agências reguladoras autônomas. Fernando Henrique Cardoso. Fonte: http://tinyurl.com/m9x73b8 Todos os demais serviços que a sociedade decide prover com os recursos dos impostos não devem ser realizados no âmbito da organização do Estado, por servidores públicos, mas devem ser contratados com terceiros. Os serviços sociais e científicos,para os quais os respectivos mercados são particularmente imperfeitos, devem ser contratados com organizações públicas não estatais de serviço, as organizações sociais , enquanto os demais podem ser contratados com empresas privadas. Assim, a reforma do Estado nessas áreas não implica necessariamente privatização, mas publicização, ou seja, transferência para o setor público não estatal (neologismo publicização foi criado para diferenciar esse processo de reforma do expediente de privatização). As três formas gerenciais de controle – controle social, controle de resultados e competição administrada – devem ser aplicadas tanto às agências quanto às organizações sociais. Assim, conclui-se que o PDRAE, em se tratando de reforma administrativa, tem dois principais marcos. O primeiro é a perspectiva de renovação da proposta de implementar um “novo paradigma” de organização administrativa (a gestão gerencial), que vem introduzir a perspectiva do desenvolvimento de uma nova cultura nas organizações estatais. O segundo marco é considerar que a reforma do Estado é tarefa para o conjunto da sociedade, tendo em vista que o papel do Estado, a partir da Reforma de 95, seria tão somente o de promover e regular o desenvolvimento econômico e social. Nesse sentido, a lógica governamental passa a discutir junto à sociedade que os atores no processo de reforma não se restringem aos setores exclusivos do Estado, ou seja, a responsabilidade deve passar a ser compartilhada com a sociedade e com o mercado. capa1 capa-modelo1 Aula 1-1 Aula 1-2 Aula 1-3 Aula 1-4 Aula 1-5 Aula 1-6
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