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SUMÁRIO 1. Introdução. ................................................................... 3 2. Reconhecimento ........................................................ 7 3. Cardiopatias acianóticas .......................................10 4. Cardiopatias cianóticas ..........................................25 5. Cardiopatias congênitas que se manifestam com arritmia ....................................................................43 6. Testes de oximetria .................................................44 Referências bibliográficas ........................................46 3CARDIOPATIAS CONGÊNITAS 1. INTRODUÇÃO. Cardiopatia congênita é qualquer anormalidade na estrutura ou fun- ção do coração que surge nas pri- meiras oito semanas de gestação quando se forma o coração do bebê. As cardiopatias congênitas mais co- muns incluem alteração em alguma válvula cardíaca, que influencia no fluxo sanguíneo dificultando ou im- pedindo sua passagem, alterações nas paredes do coração levando a comunicações cardíacas que não de- veriam existir e mistura do sangue oxigenado com o não oxigenado ou ainda a formação de um único ventrí- culo. Pode ainda haver a combinação de malformações. CONCEITO: A cardiopatia congênita pode ser definida como uma alteração estrutural do coração ou dos grandes vasos da base que representa signifi- cante perda funcional real ou potencial. FUNCIONAIS ANORMALIDADES Genética Uso de substâncias psicoativas Infecções virais ANATÔMICAS Sabe-se que manifestação clínica da cardiopatia congênita ocorre prin- cipalmente nos primeiros meses de vida, mas vale ressaltar que o reco- nhecimento da doença pode ser feito em qualquer fase da vida, tan- to no período fetal como no paciente adulto, como acontece com os diag- nósticos de comunicação interatrial em alguns casos. A cardiopatia congênita pode se dizer como uma doença da neonatologia pois dentre aqueles que são interna- dos no primeiro ano de vida (maioria dentro dos números de casos), grande parte dos casos ocorrem no primei- ro mês de vida e, dentro do primeiro mês, ocorrem na primeira semana. As doenças mais prevalentes nesse perí- odo são dependentes do canal arterial, 4CARDIOPATIAS CONGÊNITAS cujo fechamento agrava o quadro clíni- co. Hipoplasia de ventrículo esquerdo, coarctação da aorta, transposição das grandes artérias, tetralogia de Fallot extrema e atresia pulmonar são exem- plos dessas doenças. A programação do nascimento é fundamental, como local, assistên- cia neonatal e equipe especializada, já que podem ser fatores preditores para evitar complicações graves e desfechos fatais, caso o diagnóstico dessas patologias ocorra em perío- do fetal. Os pacientes internados em período maior que 1 mês e inferior a 6 meses apresentam enfermidades cujas manifestações clí- nicas dependem da queda da resistência vascular pulmonar, como a comunicação interventricular (CIV), a persistência do ca- nal arterial (PCA) e o defeito do septo atrio- ventricular (DSAV). O pediatra, assim como o obstetra e o médico generalis- ta que trabalha com atendimento ao par- to e/ou neonatais tem função importante na mudança do curso natural da cardiopa- tia congênita, principalmente no que tange ao reconhecimento dessas enfermidades, assim, é necessário que ele suspeite essa alteração, reco- nheça as condições que necessitam de tratamento com urgência e saiba aplicar a melhor conduta clínica antes de encaminhar o paciente a um cen- tro especializado em tratamento da cardiopatia congênita (normalmente hospitais com UTI neonatais e centro cirúrgicos neonatais). Isto posto, devemos, então, relembrar a formação embriológica do coração fisiologicamente normal, já que essa condições recaem principalmente para anomalias anatômicas. Figura 1. Modelo anatômico fisiológico do coração sem anormalidades. Disponível em: pngflow.com 5CARDIOPATIAS CONGÊNITAS O coração primitivo começa a se de- senvolver como um único tubo des- dobrado. O tubo cardíaco recebe sangue do corpo embrionário, que passa pelos segmentos dele na se- guinte sequência: • Seio venoso: recebe todo o retor- no venoso do corpo embrionário e da placenta. • Átrio: no início é uma câmara única que recebe sangue do seio venoso e o passa para o ventrículo. • Ventrículo: no início é uma câmara única que recebe sangue atrial e o passa para o bulbo cardíaco. • Bulbo cardíaco: recebe sangue ventricular e o passa para o tronco arterioso. • Tronco arterioso: recebe sangue do bulbo cardíaco e o passa para o sistema do arco aórtico para dis- tribuição nos pulmões e no corpo. Este tubo cardíaco primitivo logo co- meça a dobrar-se em uma “curva em S”. A câmara ventricular única se do- bra para baixo e para a direita, e o átrio e o seio veneno se dobram para cima, posteriormente e para a esquerda, formando assim as posições definiti- vas das futuras câmaras do coração (átrios superiores aos ventrículos). As quatro câmaras do coração (dois átrios e dois ventrículos) são forma- das pela septação interna do único átrio e ventrículo do tubo cardíaco pri- mitivo. Como a maior parte do sangue não perfunde os pulmões no útero (os pulmões estão cheios de líquido am- niótico e estão parcialmente colapsa- dos), a maior parte do sangue no átrio direito passa diretamente para o átrio esquerdo através de uma pequena abertura no septo interatrial chamada forame oval. O septo interatrial é formado pela fusão de um septo primário e de um septo secundário (o septo secundá- rio se desenvolve no lado atrial direito do septo primário). Logo após o nas- cimento, quando a pressão do átrio esquerdo excede a pressão do átrio direito (o sangue passa agora para os pulmões e retorna ao átrio esquerdo, aumentando a pressão no lado es- querdo), os dois septos são empurra- dos juntos e se fundem, formando a fossa oval do coração pós-natal. Enquanto o septo interatrial está se formando, o septo ventricular se for- ma a partir do crescimento superior do septo interventricular muscular da base do ventrículo comum do coração em direção ao crescimento descen- dente de um septo membranoso fino da almofada endocárdica. Simultaneamente, o bulbo cardíaco e o tronco arterioso formam as vias de saída dos ventrículos, tronco pulmonar e aorta. A crista neural desempenha um papel fundamental na septação e desenvolvimento do tronco arterioso, 6CARDIOPATIAS CONGÊNITAS à medida que se torna o tronco pul- monar e a aorta ascendente. O padrão de circulação fetal é o de troca gasosa e troca de resíduos de nutrientes/metabólicos pela placenta com o sangue materno (mas não a troca de células sanguíneas) e a dis- tribuição de oxigênio e sangue rico em nutrientes para os tecidos do feto. Vários desvios permitem que o san- gue fetal ignore amplamente o fígado (não é necessário para o processa- mento metabólico no útero) e os pul- mões (não é necessário para as tro- cas gasosas no útero), para que o sangue possa ter acesso direto ao lado esquerdo do coração e ser bom- beado para o sistema arterial fetal. No momento ou logo após o nascimento, essas derivações fecham, resultan- do no padrão normal de circulação pulmonar e sistêmica observada no pós-natal. Figura 2. Septação atrial. Disponível em: Netter clinical ana- tomy, 4ed 7CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Figura 3. Septação ventricular. Disponível em: Netter clinical anatomy, 4ed e síncope, se tratar de crianças maio- res e adolescentes. Os sintomas dos pacientes são ma- nifestações de distúrbios hemodinâ- micos e estão relacionados funda- mentalmente às alterações no fluxo pulmonar. É por esse motivo que as cardiopatias congênitas são classi- ficadas funcionalmente em cardio- patia de hipofluxo, hiperfluxo e normofluxo pulmonar. Além dessa divisão, podemos agrupá-las como acianóticas ou cianóticas, como foi feito nesse módulo. Dentre os exames possíveis para identificação de alguma anormalida- de, temos o ecocardiograma (ECO) bidimensional com Doppler,que é o exame mais importante no diag- nóstico e na avaliação funcional, a radiografia de tórax e o eletrocar- diograma (ECG), que são exames mais acessíveis e contribuem na ESTRUTURA DERIVADOS Tronco arterioso Aorta Tronco pulmonar Bulbo cardíaco Parte lisa do VD (cone arterioso) Parte lisa do VE (vestíbulo da aorta) Ventrículo primitivo Parte trabeculada do VD Parte trabeculada do VE Átrio primitivo Músculos pectinados do AD Músculos pectinados do AE Seio venoso Parte lisa do AD (seio venarum) Seio coronário Veia oblíqua do AE Tabela 1. Estruturas derivadas do coração primitivo. Fonte: Netter clinical anatomy, 4ed. 2. RECONHECIMENTO As principais alterações clínicas dos neonatos e dos lactentes que justifi- cam seus encaminhamentos são cia- nose, insuficiência cardíaca, sopro e arritmia. Outros sintomas podem estar associados às anomalias con- gênitas, como dor precordial, tontura 8CARDIOPATIAS CONGÊNITAS formulação de uma hipótese de diag- nóstico, mas não são determinantes para diagnóstico. Além desses, a TC, angioTC, ressonância magnética e estudo eletrofisiológico (nas arritmias) podem ser utilizados para avaliar o coração hemodinamicamente. A cianose da criança com cardiopatia congênita é do tipo central e qua- se sempre generalizada, mas em alguns casos ela pode ser evidente nos membros inferiores e ausente nos membros superiores e mucosas ou vice-versa – a qual é denominada cianose diferencial. As três causas da cianose são a presença de uma lesão obstrutiva direita com shunt da direita para esquerda, a conexão ven- trículo-arterial discordante e a pre- sença de uma mistura comum, como ocorre no ventrículo único. Vale pon- tuar que a cianose pode ser leve ou mesmo ausente nos casos com fluxo pulmonar aumentado e grande mis- tura arteriovenosa. SE LIGA! O aparecimento da cianose ocorre quando a concentração da hemo- globina reduzida no sangue circulante é maior que 5 g/dL, por isso ela pode estar ausente em crianças com anemia. É necessário ainda que nos alertemos sobre a diferenciação entre a cianose de causa cardíaca e a não cardía- ca (pulmonar, hematológica e neu- rológica) e pode ser feito com ajuda do ECO. Após reconhecer a cianose como de origem cardíaca é necessá- rio que se defina morfologicamente a anomalia responsável. A cianose jamais deve ser menos- prezada ou apenas observada em nenhuma condição clínica, já que em algumas doenças, a criança aparenta estar normal nos primeiros dias, mas pode piorar subitamente e evoluir para óbito em poucas horas ou minutos. É por conta disso que se recomenda fazer uma investigação de urgên- cia caso haja suspeita de cardiopatia congênita cianótica. No esquema a seguir, está exposto raciocínio diag- nóstico das principais cardiopatias congênitas cianóticas, utilizando a clí- nica, a radiografia de tórax e o ECG. A Insuficiência cardíaca (IC) pode ser uma evolução de diversas des- sas doenças, mas as principais são as cardiopatias congênitas de hiperfluxo pulmonar com hipertensão venoca- pilar pulmonar e as doenças obstru- tivas, nas quais predominam as obs- truções esquerdas. O quadro clínico é de IC com taquipneia, cansaço e interrupções às mamadas, sudorese, taquicardia, cardiomegalia e hepato- megalia, quadro já conhecido e bem genérico da própria IC. Dois fatores são fundamentais para o desencadeamento da IC. O primei- ro é o fechamento do canal arterial, que ocorre funcionalmente durante as primeiras horas ou dias iniciais de vida, e o segundo é a diminuição da 9CARDIOPATIAS CONGÊNITAS resistência vascular pulmonar, que ocorre ao longo dos primeiros me- ses de idade. Como o débito sistêmi- co em doenças obstrutivas depende do fluxo da artéria pulmonar para a aorta através do canal arterial, ao fe- char o canal, o fluxo sistêmico diminui abruptamente, ocorrendo IC e cho- que cardiogênico. Fica claro, então, que as manifestações clínicas decor- rem das alterações fisiológicas e por conta disso a idade do aparecimento da IC pode ser um fator de diferencia- ção diagnóstica da doença. SAIBA MAIS! A passagem de sangue da circulação sistêmica para a circulação pulmonar depende de uma diminuição significativa da resistência vascular pulmonar, o que ocorre a partir do final do 1º mês de vida. O aparecimento da anemia fisiológica contribui para essa diminuição. IDADE DIAGNÓSTICO < 48 horas Doença de Ebstein Hipoplasia do VE 1ª semana Estenose aórtica valvar grave Drenagem anômala total das veias pulmonares 2ª e 3ª semana Coarctação de aorta > 3ª semana CIV PCA Defeito do septo atrioventricular total Origem anômala da artéria coronária E. Ventrículo único sem estenose pulmonar Transposição das grandes artérias com CIV Tronco arterioso Dupla via de saída do VD sem estenose pulmonar Tabela 2. Principais cardiopatias que desenvolvem com insuficiência cardíaca O sopro cardíaco é o sinal clínico mais identificável nessas doenças. Quando ocorre em consulta de rotina, sem outros sintomas cardíacos as- sociados, a cardiopatia normalmente é leve e de bom prognóstico. Nessa categoria, estão as cardiopatias com shunt da esquerda para direita e as cardiopatias obstrutivas isoladas. Como já visto, quando essas doenças apresentam repercussão hemodinâ- mica, a causa de encaminhamento, em geral, é por IC. A arritmia, por sua vez, é uma ma- nifestação rara de cardiopatia con- gênita e normalmente se dá por um bloqueio atrioventricular. 10CARDIOPATIAS CONGÊNITAS 3. CARDIOPATIAS ACIANÓTICAS e uma maior porção muscular, sendo que o muscular possui 3 componen- tes: entrada, trabecular (ou muscular) e de saída. Assim, acaba por ser divi- dida em quatro tipos de acordo com sua posição anatômica. CARDIOPATIAS ACIANÓTICAS Normofluxo Coarctação da aorta Estenose pulmonar Estenose aórtica Hiperfluxo Comunicação interventricular Comunicação interatrial Persistência de canal arterial Defeito do septo atrioventricular totalComunicação interventricular (CIV) A CIV é a cardiopatia mais frequen- te e consiste num orifício/defeito no septo interventricular (SIV), sendo responsável por cerca de 40% do to- tal dessas enfermidades. Pode ocor- rer em qualquer parte do mesmo, podendo ser único ou múltiplo, com tamanho e forma variável, sendo responsável, en- tão, por uma passagem de sangue entre os dois ventrículos. Pode ocor- rer também isoladamente ou associar-se a outras alterações condicionan- do uma cardiopatia mais complexa. O septo interventricular é dividido numa peque- na porção membranosa Figura 4. Modelo anatômico simples de CIV. Disponível em: hospitalinfantilsabara.org.br 11CARDIOPATIAS CONGÊNITAS • CIV perimembranosa (membra- nosa): o septo membranoso é uma pequena área do SIV adjacente à válvula aórtica (lado esquerdo) e ao lado da válvula tricúspide (lado direito). É a mais comum. • CIV muscular (septo trabecular): é o defeito cuja margem é total- mente composta por tecido mus- cular, portanto, sem relação com as valvas cardíacas e o feixe de His. São subdivididas em apical (a mais comum), mesosseptal (cen- tral), anterior (superior) e posterior, essas CIV são muitas vezes múlti- plas (SIV tipo “queijo suíço”) ou as- sociada a outros defeitos. • CIV duplamente relacionada (in- fundibular, subpulmonar ou su- barterial): localizam-se no septo de saída sendo as suas margens constituídas pelo anel pulmonar e aórtico, podendo haver prolapso de um das válvulas da valva aórtica e regurgitação da mesma associada. • CIV justatricuspídea: É o defeito localizado abaixo da valva tricús- pide não relacionada com o septo membranoso. Nesse caso, o feixe de His passa na borda anterior do defeito. Suas margens são consti- tuídas pelo anel da valva tricúspide e pelas bordas musculares do sep- to muscular da via de entrada do ventrículo direito. Na vida fetal, as pressões nos ventrí- culos são iguais, por isso a passagem de sangue pela CIV é irrelevante, mas, após o nascimento, com o fechamen-to dos shunts fisiológicos (placenta, forame oval e canal arterial), ocorre queda da pressão pulmonar e au- mento da pressão sistêmica com a passagem de sangue da esquerda para a direita. Ou seja, a quantida- de de sangue que passa através da CIV aumenta gradualmente, à medi- da que diminui a resistência vascu- lar pulmonar, mas fica claro que esse shunt pode ser limitado pelo tamanho do defeito. Resumindo, a resistência vascular pulmonar e o tamanho do defeito ditam a repercussão hemo- dinâmica da CIV. O fluxo aumentado na circulação pul- monar chega ao átrio esquerdo e ao ventrículo esquerdo, dilatando-os e elevando a pressão diastólica e, por conseguinte, aumentando a pressão capilar pulmonar retrogradamente. O aumento da pressão venocapilar é responsável pelos sintomas de ta- quipneia, dispneia aos esforços e in- terrupções às mamadas. SE LIGA! Todas as cardiopatias com hi- perfluxo pulmonar e aumento da pres- são de átrio esquerdo apresentam esse mesmo mecanismo fisiopatológico. A persistência crônica do fluxo pul- monar aumentado e da hipertensão venocapilar provoca uma reação das 12CARDIOPATIAS CONGÊNITAS arteríolas pulmonares, com espessa- mento e fibrose da média e aumento da pressão da artéria pulmonar e do ventrículo direito. Se não houver uma correção da cardiopatia ocorre uma progressão dessa lesão arteriolar, com proliferação da íntima e obstru- ção total da luz, causando uma hiper resistência vascular pulmonar com consequente aumento da hiperten- são pulmonar, o que provoca shunt invertido pela CIV, da direita para es- querda, e aparecimento da cianose. Esse estágio, conhecido como sín- drome de Eisenmenger, impede de- finitivamente a correção do defeito. Como já dito, o quadro clínico varia de acordo com o tamanho da CIV. Na CIV pequena as crianças são as- sintomáticas e acianóticas, apresen- tando um crescimento e desenvol- vimento normal. Percebemos sopro sistólico nas primeiras semanas de vida e a segunda bulha é normal, não havendo sopros diastólicos. Na CIV moderada a grande, percebemos um atraso no crescimento e desen- volvimento, diminuição da tolerância ao exercício, infeções respiratórias de repetição e sinais de IC ocorrem du- rante a infância. Na CIV moderada, na ausculta cardíaca, observam-se a 2ª bulha hiperfonética na área pulmo- nar e o sopro sistólico de regurgita- ção (holossistólico). Na CIV grande, observa-se aumento do diâmetro anteroposterior do tórax, a 2ª bulha na área pulmonar é intensa e o sopro sistólico de regurgitação geralmente está presente. Já na hipertensão pulmonar de lon- ga duração podemos encontrar cia- nose e diminuição do nível de ativida- de física (Síndrome de Eisenmenger), como já explicado, e no exame físico cianose central e generalizada, a 2ª bulha na área pulmonar é intensa, palpável, e não se ausculta mais o so- pro da CIV. O Raio-X na CIV pequena é normal, na CIV moderada observa-se au- mento da circulação pulmonar com cardiomegalia à custa das cavidades esquerdas, e na CIV grande há impor- tante aumento da circulação pulmo- nar, com sinais de hiperfluxo e con- gestão venosa e uma cardiomegalia significativa, com consequente do aumento das cavidades esquerdas, da artéria pulmonar e do ventrículo direito. Na hiper-resistência vascular pulmonar, os vasos dos hilos pulmo- nares ficam proeminentes, com au- sência de vasos na periferia, e a área cardíaca pode estar normal ou discre- tamente aumentada, com grande au- mento da artéria pulmonar O ECG mostra-se normal na CIV pe- quena, na CIV moderada existe sobre- carga ventricular esquerda e na CIV grande a sobrecarga é biventricular. Na hiper resistência pulmonar, obser- va-se sobrecarga ventricular direita. O ECO é sempre o exame padrão ouro e o cateterismo pode ser utilizado 13CARDIOPATIAS CONGÊNITAS pelos mesmos motivos das outras cardiopatias. O tratamento clínico com diuréticos é indicado para pacientes com sinais de IC, e aqueles com sinais leves po- dem ser tratados com o uso apenas de digital. Em casos mais graves, po- demos fazer um vasodilatador tam- bém, como um IECA. O tratamento cirúrgico por meio de uma correção total é indicado em qual- quer idade para aqueles que mantem sinais de IC mesmo com tratamento clínico. O tratamento eletivo deve ser feito quando o Qp/Qs (relação fluxo pulmonar/fluxo sistêmico por meio do ecocardiograma) for maior que 1,5, a partir do 10º mês de vida e até 2 anos. Também é uma indicação im- portante quando a CIV se encontra na via de saída, com potencial de de- senvolvimento de insuficiência aórti- ca. Além desses, a bandagem da ar- téria pulmonar (tratamento cirúrgico paliativo) está indicado nos casos em que há múltiplas CIV ou não existem condições clínicas de correção total, com desnutrição importante e/ou si- nais de hipertensão artéria pulmonar importante com muito baixo peso. Comunicação interatrial (CIA) A CIA se apresenta isoladamente ou associada a outras anomalias congê- nitas e pode ser classificada em qua- tro tipos anatômicos: • CIA ostium secundum (OS): é o defeito mais comum e ocorre na região da fossa oval, sendo, por isso, também conhecida como CIA tipo fossa oval; • CIA ostium primum (OP): é co- nhecida atualmente como defeito do septo atrioventricular parcial e está localizada junto às valvas atrioventriculares; quase sempre está associada a fenda no folheto anterior da valva mitral; • CIA seio venoso (SV): está lo- calizada junto à desembocadura da veia cava superior e, em geral, está associada à drenagem anô- mala parcial de veias pulmonares direitas; • CIA seio coronário (SC): é um de- feito raro, decorrente da presença de orifício no teto do seio coroná- rio, permitindo passagem do átrio esquerdo para o átrio direito atra- vés do óstio do seio coronário. Na CIA, ocorre desvio do sangue do átrio esquerdo para o átrio di- reito (sem turbilhonamento, ou seja, sem sopro identificável) em virtude da maior capacidade de distensão das paredes do átrio direito, da me- nor resistência vascular pulmonar e da maior complacência do ventrículo direito. 14CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Figura 5. Modelo anatômico simples de CIA. Disponível em: https://bit.ly/2YQwEc2 No RN esse shunt ainda é mui- to leve devido a elevada resistên- cia vascular pulmonar e da menor complacência do ventrículo direito, assim, conforme a pressão diminui e a complacência ventricular direita au- menta, o shunt aumenta. Por causa da passagem do sangue da esquerda para a direita pela CIA, há hiperfluxo pulmonar e retorno de sangue au- mentado para o átrio esquerdo. Aqui o esvaziamento para o átrio direito ocorre e a pressão desse sistema não se eleva e é por isso que os pacientes não apresentam sinais de taquipneia, dispneia aos esforços e interrupções às mamadas, que são sintomas e si- nais típicos de hipertensão venocapi- lar pulmonar. Com o volume aumentado nas cavi- dades direitas, há dilatação do átrio e do ventrículo direito e da artéria pulmonar, e um prolongamento no tempo de esvaziamento do ventrícu- lo direito, denotado clinicamente pelo desdobramento fixo da 2ª bulha, que é o atraso no fechamento da val- va pulmonar. Se não houver correção da CIA, o paciente pode desenvolver, em idade adulta, IC, arritmia e hiper- tensão pulmonar. SE LIGA! Quando em casos de CIA há sopro, esse sopro se justifica por ex- cesso de volume passando pela válvu- la pulmonar (sopro sistólico ejetivo em foco pulmonar), e não pela passagem do sangue pela CIA. A maioria dos pacientes é assinto- mática, mas algumas vezes podem apresentar fadiga, infecções respira- tórias de repetição e palpitações. Nas CIA OP, os sintomas normalmente são mais graves e precoces na infân- cia, com sinais de IC, atraso no de- senvolvimento peso/altura e sopro de insuficiência mitral. A impulsão sistó- lica do ventrículo direito é palpável na borda esternal esquerda por causa de sua dilatação. No Raio-X notamos cardiomegalia à custa do átrio e do ventrículodireitos e da artéria pulmonar. A circulação 15CARDIOPATIAS CONGÊNITAS pulmonar está aumentada sem sinais de congestão pulmonar, ou seja, não vemos vasos predominantes na por- ção apical. O padrão característico no ECG é a presença de complexo QRS tipo Rsr’ (distúrbio de condução do ramo di- reito) nas derivações precordiais di- reitas, por sobrecarga ventricular di- reita, mas o exame pode ser normal no caso de CIA pequena. Na metade dos casos, observa-se mudança na onda P, sugerindo aumento atrial di- reito. Na CIA grande, evidenciam-se hipertrofias atrial e ventricular direitas com desvio do eixo para a direita. Na CIA OP, além das alterações já men- cionadas, observam-se hemibloqueio anterior esquerdo e sobrecarga ven- tricular esquerda. O ECO confirma o diagnóstico e ca- racteriza a CIA pela visualização di- reta. A repercussão pode ser medida pelo aumento das cavidades direitas e pelo fluxo pulmonar, com o cálculo de Qp/Qs (relação do fluxo pulmonar com o fluxo sistêmico, em que o nor- mal é 1:1). O cateterismo, raramente indicado para diagnóstico, é utiliza- do quando há suspeita de drenagem anômala parcial das veias pulmona- res ou para avaliação de pressões. SAIBA MAIS! Atualmente, a indicação de cateterismo é como objetivo terapêutico, para fechamento da CIA com dispositivos, nos casos de CIA OS com bordos bem delimitados. O fechamento da comunicação está indicado quando Qp/Qs > 1,5:1 e pode ser feito por cirurgia ou catete- rismo em CIA OS e correções da fen- da na valva mitral e das anomalias de drenagem pulmonar devem ser rea- lizadas concomitantemente. A corre- ção cirúrgica eletiva tem de ser rea- lizada por volta de 2 anos de idade, para evitar aumento crônico do átrio e do ventrículo direitos, que são causa de arritmia e de IC no adulto. Persistência do canal arterial O canal arterial está patente na vida fetal, como um curto e largo vaso co- nectando a artéria pulmonar à aorta descendente, logo abaixo do istmo aórtico. É uma estrutura fundamen- tal na circulação fetal e, após o nasci- mento, seu fechamento funcional co- mumente ocorre entre 12 e 15 horas de vida, e o anatômico é completado entre o 5º e o 7º dia de vida, prolon- gando-se, em alguns casos, até o 21º dia. Em algumas situações, a PCA é a condição obrigatória para a manuten- ção da vida do paciente. 16CARDIOPATIAS CONGÊNITAS SAIBA MAIS! Essa condição está associada à rubéola na gestação! atingindo o padrão de adulto em tor- no de 6 meses de vida. Se houver a PCA, o shunt passa a se direcionar da esquerda para a direita, levando a um desequilíbrio hemodinâmico, com au- mento do fluxo na circulação pulmo- nar e nas cavidades esquerdas. Assim, o aumento de volume nas ca- vidades esquerdas provoca aumen- to das pressões diastólicas e, con- sequentemente, da pressão capilar, desencadeando todo o processo fi- siopatológico descrito na CIV. A re- percussão hemodinâmica dependerá, portanto, do diâmetro do canal arte- rial e da resistência vascular pulmo- nar. Nos prematuros, como a resis- tência vascular é muito baixa, o shunt da aorta para a artéria pulmonar pode ser precoce e acentuado, provocando um quadro clínico muito importante e diferente do que ocorre no recém- -nascido a termo. Assim como na CIV, a persistência crônica dessa do- ença é capaz de levar à síndrome de Eisenmenger. O quadro clínico da criança nascida a termo assemelha-se ao descrito para a CIV, mas com o desenvolvi- mento da hiper resistência vascular pulmonar (síndrome de Eisenmenger) há inversão do shunt no canal arte- rial, com aparecimento de cianose em Figura 6. Modelo anatômico simples de PCA. Disponí- vel em: https://smart.servier.com/ Na circulação fetal, quase todo débito do ventrículo direito passa pelo canal arterial para a aorta descendente em direção ao dimídio inferior e à placen- ta, e somente uma pequena porção desse sangue vai para os pulmões, enquanto que o débito do ventrículo esquerdo direciona-se principalmen- te ao cérebro. Com o nascimento, eli- minam-se os shunts fisiológicos (pla- centa, forame oval e canal arterial) e a circulação torna-se em série. A pres- são sistêmica se eleva e a pressão pulmonar diminui progressivamente, 17CARDIOPATIAS CONGÊNITAS membros inferiores (cianose diferen- cial). No exame físico, o sopro típico é contínuo na sístole (maior) e diástole (menor), com 2ª bulha hiperfonética e os pulsos periféricos são amplos. A PCA pode estar associada ao quadro da síndrome da angústia respirató- ria e piorar o padrão respiratório, au- mentando a taquicardia, a taquipneia e desenvolvendo edema pulmonar e nesses quadros o sopro pode es- tar ausente. Precórdio hiperdinâmi- co, pulsos amplos e sinais de edema pulmonar são significativos para o diagnóstico. SE LIGA! PA divergente ocorre quando a pressão sistólica é maior despropor- cionalmente a queda da pressão diastó- lica (quando há a passagem do sangue pelo canal arterial) O Raio-X no canal arterial pequeno é normal, mas quando há repercussão hemodinâmica, observa-se aumento da circulação pulmonar e da área car- díaca, à custa das cavidades esquer- das, da aorta e da artéria pulmonar. O ECG é normal na PCA pequena e nos casos com grande shunt da esquerda para a direita, observa- se sobrecarga ventricular esquerda. Com o desen- volvimento da hipertensão pulmonar, ocorre sobrecarga ventricular direi- ta, que predomina com a progressão para a síndrome de Eisenmenger. O ECO com Doppler é o exame-padrão para o diagnóstico dessa anomalia, pois, além de visualização do canal, é possível medir o seu diâmetro, ob- servar a direção do shunt, quantificar a repercussão hemodinâmica pelas dimensões das câmaras cardíacas e estimar a pressão na artéria pulmo- nar. O cateterismo deve ser evitado para diagnóstico, mas em raros ca- sos, como na hipertensão pulmonar, a sua realização é importante. Todas as PCA evidentes ao exame fí- sico devem ser fechadas, mesmo as pequenas, em razão do risco de en- docardite infecciosa. Em prematuros, a 1ª opção para os casos que neces- sitam de fechamento é o tratamento medicamentoso, com a indometacina (inibidor de prostaglandina) e o ibu- profeno, que ambos têm-se mostrado úteis. A cirurgia está indicada quando houver falência no fechamento medi- camentoso ou em condições em que o prematuro não possa receber a dro- ga e em crianças não prematuras, o fechamento está indicado em qual- quer idade para IC congestiva. Obstrução na via de saída do ventrículo esquerdo (estenose aórtica) Essa cardiopatia ocorre nas regiões subvalvar, valvar e supravalvar e elas podem ser progressivas, mesmo ten- do fisiopatologia e clínica iguais. A es- tenose subvalvar mais frequente é a subaórtica fixa, que se manifesta em três tipos: membranosa, fibromuscular 18CARDIOPATIAS CONGÊNITAS e túnel fibroso. Epidemiologicamente, a estenose valvar é a mais frequente. A hipertrofia concêntrica do ventrí- culo esquerdo, redução da cavidade e diminuição do débito do ventrículo esquerdo são consequências da es- tenose importante no período fetal e, por conta disso, após o nascimento a criança pode apresentar quadro de IC grave com o fechamento do canal ar- terial, similar ao quadro clínico da sín- drome de hipoplasia do ventrículo es- querdo. Vale pontuar que na estenose aórtica moderada, a cavidade ventri- cular esquerda é capaz de sustentar um débito sistêmico adequado. O pa- ciente pode ser assintomático, mas, com o seu crescimento, começam a aparecer sinais de congestão pulmo- nar e baixo débito sistêmico, devido a disfunção diastólica, que decorre do aumento da hipertrofia, desenca- deado pela progressão da estenose. A estenose aórtica leve não provoca distúrbio no desenvolvimento e na to- lerância ao exercício físico. Figura 7. Modelo anatômico simples de estenose aórtica. Disponível em: News-medical.net Na estenose crítica do RN, o quadro clínico é semelhante ao da hipoplasia do ventrículo esquerdo e em alguns casos, aIC desenvolve-se mais tar- de, no 2º mês de vida, quando há um aumento da demanda para o débito cardíaco. O sopro cardíaco pode ser leve ou, em alguns casos, inaudível, em razão do baixo fluxo pela valva. A 2ª bulha é hiperfonética. A estenose aórtica, que não se ma- nifesta clinicamente nos primeiros meses de vida, evolui bem, sendo em geral assintomática. Em crianças maiores, podem aparecer sinais de 19CARDIOPATIAS CONGÊNITAS dor precordial, tontura e síncope. O sopro cardíaco sistólico com irradia- ção para fúrcula e faces laterais de pescoço é o sinal mais importante e que leva os pacientes à investigação cardiológica. No RN com IC, observamos impor- tante cardiomegalia com congestão pulmonar. O ECG nos mostra sobre- carga de câmaras direitas com alte- ração de repolarização (alterações da onda T e do segmento ST). Nos as- sintomáticos, o Raio-X é normal e o ECG mostra sobrecarga ventricular esquerda, mas pode parecer normal mesmo com gradiente grave. O ECO permite avaliar o local e a natureza da lesão, a morfologia da valva aórtica, a gravidade da obstrução, o tamanho e a espessura do ventrículo esquer- do, o fluxo no canal arterial, as altera- ções no padrão de fluxo e as lesões associadas. A dilatação com cateter-balão ou a ci- rurgia estão indicadas nos pacientes sintomático, enquanto que nos assin- tomáticos, a indicação deve ser feita quando houver fluxo sistêmico canal- -dependente ou um gradiente sistóli- co maior que 60 mmHg. Nas crianças maiores, a dilatação com balão está indicada como primeira opção quan- do o gradiente transvalvar for maior que 60 mmHg nos pacientes assin- tomáticos e maior que 50 mmHg nos sintomáticos ou com alterações de ECG. A cirurgia deve ser realiza- da quando esse procedimento não for efetivo ou em condições como hi- poplasia do anel, displasia da valva e anomalias associadas. Coarctação da aorta É o estreitamento da Aorta e pode ser localizada ou segmentar, e se apre- sentar nas regiões pré-ductal (entre a subclávia esquerda e a junção aorto- ductal), paraductal e pós-ductal, sen- do a pré-ductal a mais comum. SAIBA MAIS! A ocorrência de lesões obstrutivas múltiplas esquerdas, associadas à coarctação de aorta, é chamada de síndrome de Shone. Quando a coarctação da aorta é muito importante, o débito sanguíneo para o dimídio inferior do corpo é feito pelo canal arterial, e com o fechamento do canal há súbito aumento no retorno venoso pulmonar e na pós-carga do ventrículo esquerdo, ou seja, gerando a falência do ventrículo esquerdo com sinais de IC grave. Já a coarctação não crítica evolui com hipertrofia do 20CARDIOPATIAS CONGÊNITAS ventrículo esquerdo e hipertensão ar- terial na parte superior do corpo, po- dendo ainda desenvolver circulação colateral se a obstrução for desenvol- vida gradualmente. Figura 8. Modelo anatômico simples de coarctação da aorta. Disponível em: https://smart.servier.com/ O RN com coarctação grave desen- volve clínica de IC e, algumas vezes, choque cardiogênico, na 2ª ou na 3ª semana de vida. Há ausência de pul- sos em membros inferiores e normal- mente não se ouve sopro. Crianças maiores podem ser assintomáticas, e a suspeita diagnóstica é feita pela di- ferença de pulsos entre os membros superiores e os inferiores e hiperten- são arterial. Outras queixas como fadiga, cefaleia, epistaxe e dor em membros inferiores são frequentes. O sopro pode ser ouvido em algumas situações. No Raio-X do RN com IC, há cardio- megalia com congestão pulmonar. O ECG mostra, na maioria dos ca- sos, sobrecarga ventricular direita. O Raio-X nas crianças maiores pode ser normal com dilatação da aorta ascen- dente. Em escolares e adolescentes, observam-se o “sinal de 3” e erosões nas superfícies inferiores das coste- las e o ECG apresenta-se normal ou com sobrecarga ventricular esquer- da. O ECO com Doppler é um exa- me importante no auxílio diagnóstico, pois há necessidade de demonstrar a coarctação já que o gradiente de pressão pode estar ausente ou sub- dimensionado nas coarctações gra- ves. A ressonância magnética ou a tomografia helicoidal são exames que demonstram com mais clareza o tipo de lesão. Em alguns pacientes, o ca- teterismo pode ser necessário para confirmação diagnóstica ou para es- clarecer outras anomalias associadas. Em RN com choque cardiogênico, a conduta inicial é o uso de prostaglan- dina, enquanto que a indicação para tratamento invasivo (dilatação ou ci- rurgia) deve ser feita em todos os pa- cientes sintomáticos e nos pacientes assintomáticos que apresentarem hi- pertensão arterial ou sinais de reper- cussão hemodinâmica nos exames complementares. 21CARDIOPATIAS CONGÊNITAS O tratamento deve ser de urgência nos RN e lactentes com IC, e eletivo nos pacientes assintomáticos em tor- no do 1º ano de vida. A abertura da coarctação é feita pelo cateterismo cardíaco ou por cirurgia, sendo a ci- rurgia a melhor escolha para crianças pequenas. Estenose pulmonar A EP está associada a rubéola con- gênita e pode ser infundibular, valvar e supravalvar e a estenose valvar re- presenta 90% dos casos. A valva pul- monar estenótica clássica apresenta espessamento das lacíneas, com fu- são comissural e abertura em cúpula que se projeta para a artéria pulmo- nar durante a sístole ventricular. Ou- tra forma de estenose é a displasia da valva, caracterizada por espessa- mento mucoide, imobilidade da lací- nea e ausência de fusão comissural. Essa displasia está frequentemente presente na síndrome de Noonan. SAIBA MAIS! A estenose pulmonar associada à estenose aórtica supravalvar é um defeito cardíaco fre- quente nos pacientes com Síndrome de Williams-Beuren. Essa é uma rara síndrome de deleção de genes contíguos que se caracteriza por fácies peculiar, anomalias oculares, den- tárias, cardiovasculares, renais e esqueléticas, deficiência mental e, ocasionalmente, hipercal- cemia na lactância. A EP provoca uma hipertrofia do ven- trículo direito, com aumento da pres- são nessa cavidade, mas o fluxo pul- monar, apesar da estenose, é normal. Em situações em que a estenose é crítica, pode haver dificuldade no en- chimento do ventrículo direito, com elevação da pressão no átrio direito e shunt da direita para a esquerda por meio do forame oval, e por conta dis- so o paciente torna-se cianótico com hipofluxo pulmonar. Figura 9. Modelo anatômico simples de estenose pulmonar. Disponível em: https://bit. ly/2VBSHlO 22CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Na maioria dos casos, o paciente é assintomático, mas sintomas como dispneia aos esforços, fadiga, dor precordial e síncope são referidos. Na estenose crítica, pode haver cianose central e ocorrer morte súbita. A ca- racterística da ausculta é o estalido protossistólico, sopro sistólico de eje- ção na borda esternal esquerda alta com 2ª bulha hipofonética. O Raio-X nos mostra área cardíaca normal com circulação pulmonar tam- bém normal, e a artéria pulmonar é pro- eminente, devido a dilatação pós-es- tenótica. Vale pontuar que nos casos com estenose crítica, a área cardíaca pode estar aumentada e a circulação pulmonar, diminuída. O ECG pode ser normal nos casos leves ou mostrar sobrecarga ventricular direita. O ECO nos mostra a lesão e a quantifica. O tratamento de escolha é a dilata- ção com cateter-balão, devendo ser indicado em todos os pacientes sin- tomáticos e nos assintomá- ticos quando o gradiente transvalvar for maior que 50 a 60 mmHg. O trata- mento de escolha é a abertura cirúrgica em ca- sos que resultado pode ser insignificante (casos de valva displásica). Defeito do septo atrioventricular total (DSAVT) Esta é uma anormalidade do desen- volvimento dos coxins endocárdicos, resultando em uma comunicação in- teratrial (CIA), uma comunicação in- terventricular (CIV) e uma única valva. A alteração morfológica básica aqui é a presença de uma junção atrioven- tricular comum, ou seja, uma valva comum entre as cavidades atriais e ventriculares, associada a umaco- municação atrial e a uma CIV. O shunt acontece da esquerda para a direita, seja no átrio ou no ventrículo, mas também existe uma passagem de sangue do ventrículo esquerdo para o átrio direito, por causa da in- competência ou da anormalidade da valva atrioventricular. Figura 10. Modelo anatômico simples de DSAVT. Disponível em: https://bit. ly/2BjuCcI 23CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Figura 11. Modelo anatômico simples de defeito no septo atrioventricular. Disponível em: https://smart. servier.com/ O quadro clínico segue com dispneia, baixo desenvolvimento pondero- -estatural e infecção respiratória de repetição. Em crianças com insufici- ência importante da valva atrioven- tricular, a IC pode ser mais precoce e muitas vezes elas são refratárias ao tratamento clínico. No exame físico, por causa das pres- sões equilibradas nos átrios e nos ventrículos, o sopro pode ser discreto ou até mesmo ausente, e, além disso, na presença de regurgitação impor- tante da valva atrioventricular, aus- culta-se um sopro sistólico de regur- gitação em borda esternal esquerda. A 2ª bulha é hiperfonética, algumas vezes com desdobramento fixo. Com o desenvolvimento de hipertensão pulmonar com hiper resistência vas- cular pulmonar, há o aparecimento de cianose generalizada, cuja alteração é mais precoce na síndrome de Down. SAIBA MAIS! O sopro na CIA é sistólico ejetivo em foco pulmonar e não ocorre devido ao fluxo nos átrios. O fluxo de sangue entre os átrios tem um gradiente de pressão baixo o qual não é o suficiente para gerar sopro audível. O que ocorre é que há um hiperfluxo de sangue nas câmaras direi- tas e este pode causar sopro em foco pulmonar devido ao excesso de sangue que passa pela valva pulmonar na sístole. Em alguns casos pode-se também auscultar um sopro diastólico em foco tricúspide devido ao hiperfluxo através desta valva. O Raio-X nos mostra aumento da cir- culação pulmonar e da área cardíaca. O ECG mostra hemibloqueio anterior esquerdo e no paciente sem hiper- tensão pulmonar importante, obser- vamos sobrecarga biventricular com padrão de distúrbio de condução do ramo direito. O ECO com Doppler é o padrão-ouro para o diagnóstico des- sa lesão e nos mostra tamanho da CIA, tamanho da CIV, tipo da valva atrioventricular, balanceamento dos 24CARDIOPATIAS CONGÊNITAS ventrículos, via de saída do ventrículo direito, via de saída do ventrículo es- querdo, anomalias da valva atrioven- tricular e outras anomalias associa- das, como a PCA. O cateterismo está indicado para o estudo das pressões. O tratamento sempre é cirúrgico e a correção definitiva deve ser feita em torno dos 6 meses de vida, principal- mente nos pacientes com síndrome de Down. Além disso, a bandagem da artéria pulmonar está indicada em pacientes de baixa idade com IC re- fratária ao tratamento clínico, e em outras situações que não permitem a correção total, como o desbalancea- mento dos ventrículos. Interrupção do arco aórtico A interrupção do arco aórtico é uma doença rara, com frequência de 0,04% entre as cardiopatias congê- nitas. Existem três tipos morfológicos: • tipo A: interrupção distal à artéria subclávia esquerda; • tipo B: interrupção entre a artéria subclávia esquerda e a carótida esquerda; • tipo C: interrupção entre o tronco braquiocefálico e a artéria carótida esquerda. O quadro clínico é semelhante ao da coarctação da aorta e o tratamento ci- rúrgico é obrigatório, pois a evolução natural mostra óbito em todos os ca- sos dentro dos primeiros 6 meses de vida. Origem anômala da coronária esquerda A origem anômala da coronária es- querda é condição na qual a artéria coronária esquerda emerge da artéria pulmonar. Geralmente é do seu tron- co, e, em raras ocasiões, do seu ramo esquerdo. Nesse caso a criança nasce bem e começa a apresentar sintomas no fi- nal do 1º mês, com queda da resis- tência vascular pulmonar e diminui- ção da perfusão coronariana, e, por isso, ocorre isquemia miocárdica e aparecimento de sintomas, como a irritabilidade intensa, com sudorese e palidez. Em razão da isquemia do músculo papilar pode ocorrer IC, di- ficuldade para se alimentar e sopro cardíaco de insuficiência mitral. Al- guns casos apresentam poucos sin- tomas, por causa do desenvolvimento de circulação colateral pela coronária direita, e nesses pacientes o diagnós- tico é mais tardio. O ECG é típico e nos mostra infarto na região lateral e sinais de isquemia difusa de ventrícu- lo esquerdo. No ECO, identificamos a origem anômala da coronária esquer- da e os sinais de isquemia do múscu- lo papilar. O tratamento é cirúrgico e o prognóstico é bom. 25CARDIOPATIAS CONGÊNITAS 4. CARDIOPATIAS CIANÓTICAS São as cardiopatias que se manifestam principal- mente com cianose. O es- quema a seguir mostra as principais características dessas condições. CARDIOPATIAS ACIANÓTICAS Persistência do canal arterial Prematuridade Sopro em locomotiva Coarctação de aorta Queda dos pulsos em membros inferiores Sopro mesotelesistólico Defeito do septo atrioventricular Total ou parcial Desdobramento da 2ª bulha Comunicação interventricular Frêmito em BEE baixo Membranoso Muscular Defeito no septo interventricular Comunicação interatrial Ostium primium Ostium secundum • Forame oval patente Desdobramento da 2ª bulha Sopro sistólico ejetivo CARDIOPATIAS CIANÓTICAS Hipofluxo Tetralogia de Fallot Dupla via de saída do VD com estenose pulmonar Normofluxo Transposição das grandes artérias com forame oval Hiperfluxo Drenagem anômala total das veias pulmonares Transposição das grandes artérias com CIV Atresia tricúspide Atresia Pulmonar Dupla via de saída do VD sem estenose pulmonar Tronco arterioso 26CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Transposição das grandes artérias Também conhecida como TGA, esta é a cardiopatia cianótica mais comum em recém-nascidos, e de forma am- pla, há uma relação anormal entre as grandes artérias e os ventrículos, de modo que a aorta se origina do ven- trículo direito, e a artéria pulmonar, do ventrículo esquerdo, ou seja, a circu- lação pulmonar e sistêmica estão em paralelo. SAIBA MAIS! A transposição das grandes artérias (TGA) é um termo amplo que inclui tanto dextroTGA (d-TGA) como um defeito mais raro chamado levoTGA (l-TGA). • d-TGA: uma variação mais comum na qual a aorta é posicionada à direita e na frente da artéria pulmonar, originando-se do ventrículo direito em vez do esquerdo. • l-TGA: uma variação menos comum na qual a aorta é posicionada à esquerda e na frente da artéria pulmonar. O sangue venoso sistêmico que che- ga ao átrio direito passa para o ven- trículo direito e dele para a aorta, levando sangue insaturado para a cir- culação sistêmica. Paralelamente, no lado esquerdo, o sangue oxigenado que chega ao átrio esquerdo passa para o ventrículo esquerdo e retorna para a circulação pulmonar. Você deve se perguntar como o pa- ciente ainda nasce vivo com essa con- dição, e isso pode ser justificado pela existência do forame oval patente, ou comunicação interventricular (CIV), ou de um canal arterial persistente, que comunicam os corações defeitu- osos direito e esquerdo e possibilitam uma mistura do sangue saturado e o não saturado. Figura 12. Modelo anatômico da TGA simples. Disponí- vel em: https://smart.servier.com/ Com o fechamento fisiológico do ca- nal arterial e do Forame Oval na TGA simples, inicia-se um processo de 27CARDIOPATIAS CONGÊNITAS hipóxia progressiva, em função da mistura insuficiente, que pode levar ao óbito do paciente. Na TGA com CIV isso não ocorre, por causa da manutenção constante da mistura de sangue. Na TGA simples, o fluxo pulmonar é normal ou discretamente aumentado, e a clínica predominante é a cianose. Na TGA com CIV, o fluxo pulmonar está aumentado e a clínica é de IC com cianose leve. Acerca das manifestações clíni- cas, o RN pode se apresentar bem ao nascimento por possuir o forame oval patente, mas com cianose leveou discreta, piorando de forma pro- gressiva e acentuada à medida que ocorre o fechamento do canal arte- rial, gerando posteriormente hipóxia e acidose metabólica. Essa sequência resulta em disfunção miocárdica e por isso começam a surgir os sinais de IC: taquipneia, cansaço às mama- das, gemência e palidez cutânea. Não se ausculta sopro e a 2ª bulha é única e alta, em virtude da posição anterior da aorta. Dentro dos casos de TGA com CIV podemos observar cianose leve que piora ao choro ou a mamada, sem ou- tros sinais clínicos. Após a 1ª semana, quando a diminuição mais importan- te da resistência vascular pulmonar acontece (hipofluxo pulmonar), o pa- ciente pode desenvolver IC. Há sinais de aumento da área cardíaca com im- pulsões sistólicas na borda esternal esquerda, a 2ª bulha é alta e não se ausculta sopro também. SAIBA MAIS! Nos pacientes com CIV e obstrução na via de saída do ventrículo esquerdo, o quadro clínico predominante é a cianose com sopro sistólico de ejeção desde o nascimento. O diagnóstico pré-natal modifica o prognóstico dos pacientes que apresentam essa patologia com comuni- cação interatrial (CIA) e persistência do canal arterial (PCA), com a instituição de medicamen- tos que mantêm o canal arterial patente, evitando o quadro de hipóxia e acidose metabólica, com correção cirúrgica precoce, diminuindo a morbimortalidade. Para diagnóstico, sobre o Raio-X da TGA simples, a área cardíaca ge- ralmente é normal, porém podemos ver leve cardiomegalia, e a circulação pulmonar é normal ou discretamente aumentada. O mediastino superior é estreitado em virtude da posição das grandes artérias e podemos ver o co- ração como se fosse um ’’ovo deita- do’’. Sabe-se que em casos com CIV, a área cardíaca e a circulação pulmo- nar se encontram aumentadas. 28CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Figura 13. Radiografia de tórax em caso de TGA. Dis- ponível em: https://bit.ly/3eRsEyv O ECG no paciente com TGA simples mostra uma sobrecarga ventricular direita com sobrecarga ventricular, e biventricular em casos com CIV. SAIBA MAIS! Encontramos no ECG um desvio de eixo para a direita, sobrecarga ventricular direita e V1 com morfologia Rs e R’ com onda T positiva em V1 e V2. Além disso, o ECO pode ser utilizado para nos mostrar os aspectos anatô- micos anormais: relação espacial das grandes artérias, tamanho dos ven- trículos, medida dos anéis das valvas aórtica e pulmonar, origem das arté- rias coronárias, dimensão da CIA e da CIV, permeabilidade do canal arterial e identificação de defeitos associados. O tratamento divide-se em clínico e cirúrgico. Sobre o tratamento clínico, pode-se fazer: • Infusão de Prostaglandina E1 (que retarda o fechamento do canal arterial); • Oxigenioterapia; • Atriosseptostomia de Rashkind (com cateter-balão); • Corrigir distúrbios acidobásicos e/ ou hidroeletrolítico; • Digoxina e diuréticos caso haja IC. SE LIGA! A infusão de PGE1 geralmen- te é útil na TGA, mas pode ser prejudicial se o forame oval patente é pequeno. A PGE1 pode ter o efeito oposto no forame oval patente com uma pequena abertu- ra porque o aumento no retorno de san- gue ao átrio esquerdo pode fechar a aba do forame oval, levando à uma mistura diminuída. Além disso, a abertura do ca- nal pode diminuir o fluxo sanguíneo sis- têmico. Assim, deve-se utilizar a PGE1 com precaução e deve-se monitorar os pacientes atentamente. 29CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Figura 15. Modelo das alterações anatômicas da Tetra- logia de Fallot. Disponível em: pediatriaufcspa.wix.com Figura 14. Septostomia atrial por balão (procedimento de Rashkind). Nesse procedimento, avança-se um cateter revestido com balão até o átrio esquerdo através do forame oval patente. O balão é inflado e abruptamente desviado para o átrio direito, ampliando assim a abertu- ra no septo atrial. O procedimento melhora imediatamente a satura- ção arterial sistêmica de oxigênio. Disponível em: https://msdmnls. co/38u7TH3 Sobre o tratamento cirúrgico: • Cirurgia de Jatene (a troca arterial patológica para a fisiológica) nas 2 primeiras semanas de vida. Se for com CIV pode ser feita após isso, já que a CIV equaliza as pressões entre ventrículos. Tetralogia de Fallot É um conjunto de anormalidades que envolve: comunicação interventri- cular (CIV), estenose pulmonar, dextroposição (ou cavalgamento) da aorta e hipertrofia do ventrículo direito e que fazem o sangue circular pelo corpo sem oxigênio suficiente. 30CARDIOPATIAS CONGÊNITAS A quantidade de sangue desviado do ventrículo direito para a circulação sistê- mica depende do tamanho da estenose pulmonar, ou seja, quanto mais esteno- se mais cianose e mais alto o sopro e o oposto é verdadeiro. Nos casos de RN em que há uma obstrução grave na via de saída do ventrículo direito (cianose grave desde o nascimento), a circula- ção pulmonar pode ser dependente da persistência de um canal arterial. Crian- ças maiores podem apresentar baque- teamento digital e adotar a posição de cócoras para melhora da hipóxia, que acaba sendo um opção de tratamento. A crise de hipóxia é comum e nessa situação o paciente apresenta ciano- se intensa, acompanhada por taquip- neia e, frequentemente, alterações de consciência. A crise geralmente ocor- re pela manhã, precipitada por ati- vidades como defecar ou chorar e é mais frequente em lactentes, entre 2 e 6 meses de idade. É preciso intervir rapidamente nessas crises. SE LIGA! Lactentes com pouca cianose são propensos a episódios mais graves, são os chamados de ‘’Pink Fallot’’. O que ocorre é que esses pacientes não estão adaptados (não possuem uma policite- mia ) para remediar a crise de hipóxia. No exame físico não se observa hi- peratividade do precórdio e pode não haver frêmito. A 1ª bulha tem inten- sidade normal ou pouco aumentada, a 2ª bulha é única e o sopro varia de intensidade e duração de acordo com o grau da estenose pulmonar, como já dito. É válido pontuar que os sinais de IC raramente estão presentes. SE LIGA! O sopro tende a diminuir ou até mesmo desaparecer, refletindo a di- minuição da passagem de sangue pela valva pulmonar. Obstrução da saída do ventrículo direito Hipertrofia do VD Tetralogia de Fallot Comunicação interventricular Dextroposição da aorta ALTERAÇÕES ANATÔMICAS NA TETRALOGIA DE FALLOT 31CARDIOPATIAS CONGÊNITAS O diagnóstico é obtido intraútero na maioria dos casos, mas após o nas- cimento, o ECO é o exame mais efi- ciente para detecção dessa condição. O Raio-X pode nos mostrar uma área cardíaca normal ou aumentada, mas principalmente o chamado ‘’coração bota’’. O ECG evidencia alterações elé- tricas que justificam a hipertrofia ven- tricular direita, com onda T ascendente em V1 com onda R pura e sem onda S. Figura 16. Radiografia de tórax em caso de Tetralogia de Fallot. Disponível em: biomed.com.br Acerca do tratamento clínico, deve- mos oferecer um suporte de oxigê- nio para evitar piora cianose e evitar crise de hipóxia, como no esquema a seguir: • Fornecer oxigênio; • Morfina para supressão de centro respiratório e evitar taquipneia; • Posição joelho-tórax e uso de va- soconstritores (epinefrina) para aumentar a resistência vascular periférica; • Bicarbonato de sódio intravenoso; • Betabloqueadores para relaxa- mento de musculatura infundibular (propranolol); • Cetamina para sedar e aumentar a resistência vascular periférica. FÁRMACO VIA DE ADMINISTRAÇÃO DOSE INICIAL DOSE MÁXIMA Esmolol IV 100–500 mcg/kg por 1 min Proceder com infusão de 25–100 mcg/kg/min 500 mcg/kg/min Morfina IV, IM ou SC 0,1 mg/kg 0,1 mg/kg Fenilefrina IV 5–20 mcg/kg a cada 10–15 min, conforme necessário Proceder com Infusão de 0,1–0,5 mcg/kg/min Bolo máximo, 500 mcg Infusão máxima, 5 mcg/ kg/min Propranolol IV 0,015–0,02 mg/kg, escalonada para efeito 0,1–0,2 mg/kg Tabela 3. Fármacos para crises hipercianóticas. Fonte: https://msdmnls.co/2VEvWxx A cirurgia de correção total vem sen- do realizada nos grandes centros aos6 meses e consiste no fechamento da CIV e na ampliação da via de saída do VD. Além dessa, pode ser feita o Shunt sistêmico pulmonar (Blalock -Taussig). 32CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Figura 17. Shunt de Blalock-Thomas-Taussig (também chamado de shunt de Blalock-Taussig). (A) derivação clássica de Blalock-Thomas-Taussig do lado direito. (B) derivação de Blalock-Thomas-Taussig modificada do lado direito, que utiliza um tubo de Dacron para criar a comunicação entre a artéria subclávia e a artéria pulmonar. Na era moderna, a derivação modificada é preferida. O shunt atua para aumentar o fluxo sanguíneo e a saturação da artéria pulmonar e é realizado como procedimento paliativo em pacientes cianóticos com fluxo sanguíneo pulmonar reduzido. Esses des- vios podem ser realizados no lado esquerdo ou direito. Disponível em: 2020, UpToDate Inc. quantidade de fluxo sanguíneo pul- monar. Nos casos com estenose pul- monar é evidente que o fluxo pulmo- nar é menor e é por conta disso que a mistura na cavidade principal contém mais sangue venoso, ou seja, mais cianose; e o oposto é verdadeiro. Vale pontuar que nesses casos, o quadro predominante é insuficiência cardíaca (devido a queda da resistência vascu- lar) com sua clínica já conhecida. Dupla via de entrada (ventrículo único) Como o nome já diz, é a situação anô- mala que corresponde ao recebimen- to do sangue atrial para apenas uma cavidade ventricular, podendo se dar pelas duas válvulas ou apenas uma. Além dessa situação, pode ocorrer pelo fato de o coração possuir uma ca- vidade hipoplásica e uma dominante de qualquer um dos lados, ou seja, se for posterior seria um ventrículo único do tipo direito e se for anterior, do tipo esquerdo. O que ocorre nessa modalidade é que o sangue arterial e o sangue venoso são misturados na câmara ventricular principal, de forma que a saturação da aorta sempre será dependente da 33CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Figura 18. Modelo de ventrículo único. Disponível em: https://bit.ly/38hnTfc Falando em clínica, o quadro clínico do RN sempre vai depender das lesões que estão associadas. Ao exame físico, observa-se 2ª bulha única com sopro sistólico de ejeção referente a este- nose pulmonar, e observam-se ainda taquipneia, bulha hiperfonética e, às vezes, não se auscultam sopros. Es- ses casos podem evoluir para doença vascular pulmonar, com aparecimento de cianose importante com baquetea- mento digital em crianças maiores. Para diagnóstico, pode ser feito Raio-X, que mostram uma possível cardiome- galia e um ECO, que é o padrão ouro. O ECG fornece achados inespecíficos. Para tratamento clínico deve-se fazer prostaglandina para aqueles com este- nose pulmonar severa e ionotrópicos e diuréticos para aqueles com sintomas de IC. O tratamento cirúrgico é com- posto pela cirurgia de Blalock-Taussig (shunt sistêmico pulmonar) para aque- les com fluxo pulmonar diminuído, e bandagem da artéria pulmonar caso esteja com fluxo pulmonar aumentado. A cirurgia definitiva, que é a cirurgia de Fontan é feita posteriormente. Tronco arterioso Anomalia rara que corresponde a sa- ída de um tronco arterial único do co- ração que supre as circulações sistê- mica, pulmonar e coronariana, sendo obrigatório apresenta de uma CIV, ou seja, esse tronco recebe sangue tanto do ventrículo direito como do esquer- do. Esse tronco arterial dá origem a aorta ascendente e a artéria pulmo- nar e suas saturações de oxigênio são iguais, o que configura um tipo de lesão com mistura total de sangues (e vão para circulações pulmonar, sistê- mica e coronariana) e por conta disso as pressões das cavidades são iguais. Sabe-se ainda que a valva desse vaso único é chamada de valva truncal e ela cavalga o septo interventricular. SE LIGA! Caso haja hiperfluxo pulmo- nar, ocorre maior retorno de sangue oxigenado para o ventrículo esquerdo e a mistura sanguínea na aorta conterá maior taxa de sangue oxigenado. O con- trário ocorrerá quando houver hipofluxo pulmonar. 34CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Figura 19. Modelo anatômico de tronco arterioso. Dis- ponível em: https://smart.servier.com/ Essa cardiopatia possui quatro tipos: • Tipo I: existe tronco pulmonar, que se origina da porção posterolateral do vaso único, pouco acima da val- va truncal; • Tipo II: não existe tronco pulmonar, as artérias pulmonares nascem separadamente da porção póste- ro-lateral desse vaso único; • Tipo III: não existe tronco pulmo- nar, as artérias pulmonares nas- cem separadamente, cada uma de um lado do vaso truncal; • Tipo IV: a nutrição pulmonar acon- tece por colaterais da aorta des- cendente. Essa forma tem sido descrita como uma variante da atresia pulmonar com CIV. Os sintomas clínicos, como é de se imaginar, dependem do fluxo sanguí- neo pulmonar e da presença ou não de regurgitação da valva truncal, ou seja, durante as primeiras semanas de vida, como a resistência vascular pulmonar ainda é alta, a única mani- festação clínica é a cianose e após a queda da resistência vascular pulmo- nar, em torno de 4 semanas de vida, o fluxo pulmonar aumenta com melho- ra da cianose, entretanto surgem os sinais de hiperfluxo e de congestão pulmonar, como taquipneia, cansa- ço às mamadas, sudorese e palidez. Ainda podem surgir sinais de IC pre- coces nos casos de insuficiência da valva truncal importante. Os pulsos periféricos geralmen- te possuem amplitude aumentada e a 2º bulha é única e hiperfonética, podendo haver um sopro diastólico audível ao longo de toda a borda es- ternal esquerda, que fala a favor de insuficiência da valva ventrículo-arte- rial principalmente. Na Raio-X a área cardíaca e a circula- ção pulmonar estão aumentadas e no ECG observamos sobrecarga biven- tricular. O ECO nos mostra as defor- midades anatômicas, e o cateterismo cardíaco é apenas indicado quando o ECO não definir bem a anatomia. 35CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Precisamos encaminhar os pacientes urgentemente para correção cirúrgica (o fechamento da CIV e o estabele- cimento de uma continuidade entre o ventrículo direito e as artérias pulmo- nares) já que há um risco alto de de- senvolverem hipertensão pulmonar grave precocemente. Atresia pulmonar com septo interventricular íntegro A atresia pulmonar é caracterizada por uma valva pulmonar completa- mente fechada ou tão rudimentar, que é como se ela não existisse e houves- se um músculo fechando a passagem de sangue do ventrículo direito para a artéria pulmonar, ou seja, não vai san- gue do lado direito do coração para os pulmões. Na atresia pulmonar com septo inter- ventricular íntegro, geralmente, todo o lado direito do coração está acome- tido. A valva tricúspide pode ser pe- quena ou não funcionar bem e, prin- cipalmente, o ventrículo direito pode ser tão pequeno e subdesenvolvido (hipoplásico) que não ajuda no movi- mento global do coração. O sangue chega aos pulmões, então, através de um caminho alternativo, o canal arterial. Além disso, precisa existir uma comunicação interatrial ou mesmo um forame oval, permitin- do a passagem de sangue do átrio direito para o átrio esquerdo e, poste- riormente, para o ventrículo esquerdo e aorta. Nesses casos, o septo que separa os ventrículos é íntegro, sem comunicações. Figura 20. Modelo anatômico de atresia pulmonar sem CIV. Disponível em: https://bit.ly/3gks8ts A cianose é central, precoce, e a sua intensidade depende do diâmetro do canal arterial, e com o início do fecha- mento do canal arterial, a cianose in- tensifica-se, aparecendo taquipneia e palidez. Na ausculta, a 2ª bulha é úni- ca e o sopro cardíaco pode estar au- sente, ou ser discreto. Pode-se aus- cultar, também, um sopro sistólico de regurgitação tricúspide. O Raio-X mostra o coração de tama- nho normal nos casos com hipoplasia do ventrículo direito e hipofluxo pulmo- nar, mas o órgão pode apresentar um grande aumento quando a cavidade ventricular direita está aumentada, com importante regurgitação tricúspide. No ECG, o eixo do QRS estádesvia- do para a esquerda, sem hemiblo- queio anterior esquerdo como ocorre 36CARDIOPATIAS CONGÊNITAS na atresia tricúspide. Há aumento do átrio direito e sobrecarga ventricular esquerda. Alterações no segmento ST sugerem isquemia. O ECO serve para avaliar a CIA, o ta- manho e a morfologia do ventrículo direito, a valva tricúspide, o tronco e as artérias pulmonares e o canal arterial. Além desses, o cateterismo cardíaco é indicado para avaliação da pressão do ventrículo direito, para definição precisa dos sinusoides coronarianos (conexão ventrículo coronária) e para avaliação das artérias pulmonares. Em casos com forame oval restritivo, há necessidade de atriosseptostomia com balão. O tratamento clínico consiste em instalar prostaglandina assim que possível para manter o canal arterial aberto, além de corrigir os distúrbios acidobásicos e hidroeletrolíticos, e ventilação mecânica para os pacien- tes graves. O tratamento cirúrgico é realizado em casos de ventrículo direito pequeno ou de coronária ventrículo dependen- te, no qual a indicação é de cirurgia univentricular. Pacientes com grandes malformações coronarianas podem necessitar de transplante cardíaco. Drenagem anômala total das veias pulmonares (DATVP) A DATVP é mais frequente no sexo masculino e caracteriza-se quando as quatro veias pulmonares estão drenando anormalmente no átrio di- reito ou em uma das veias sistêmicas, assim, a CIA é imprescindível para a manutenção do débito sistêmico. De acordo com o local de drenagem, a DATVP é classificada em quatro tipos, em ordem decrescente de frequência: • Tipo supracardíaco: a drenagem é feita para a veia inominada ou veia cava superior; • Tipo cardíaco: pode ocorrer a dre- nagem direta no átrio direito ou no seio coronário. Raramente, ob- serva-se obstrução nesse tipo de drenagem; • Tipo infracardíaco: a drenagem, em geral, é infradiafragmática e é realizada para os seguintes locais: veia cava inferior, sistema porta, ducto venoso, veias hepáticas ou veia gástrica esquerda. Obstrução à drenagem venosa pulmonar é frequente nesse tipo morfológico; • Misto: as veias drenam em dois ou mais locais diferentes dos já citados. De forma resumida, então, toda dre- nagem venosa, sistêmica e pulmonar chega ao átrio direito e esse sangue é, portanto, uma mistura do sangue oxigenado pulmonar com o sangue venoso sistêmico. A maior parcela é direcionada para o ventrículo direito e para a circulação pulmonar, o que 37CARDIOPATIAS CONGÊNITAS justifica o hiperfluxo pulmonar. Uma parte menor alcança a circulação sistêmica após passar por uma CIA. O fluxo pulmonar aumentado gera taquipneia, dispneia e interrupções às mamadas, e a cianose normalmente é leve. Figura 21. Modelo anatômico de DATVP. Disponível em: https://bit.ly/3eRRezs Ao exame físico, verificam-se cianose central moderada a intensa e sinais de desconforto respiratório grave, além de palidez, sudorese, gemência e dificuldade para mamar. No exame precordial, os achados são inespecí- ficos. O ritmo cardíaco pode ser em galope, em razão da presença de 3ª bulha. O sopro cardíaco geralmen- te está ausente ou, quando presen- te, é discreto. Nesses pacientes, há sempre hepatomegalia, podendo ser acompanhada de edema periférico e de crepitações na ausculta pulmonar. Nos casos sem obstrução à drenagem venosa pulmonar, o Raio-X mostra moderada a importante cardiomega- lia com sinais de aumento da circula- ção pulmonar e em crianças maiores com drenagem supracardíaca, pode- -se observar uma imagem típica de ‘’boneco de neve’’. Na obstrução à drenagem venosa pulmonar, a área cardíaca mostra-se normal ou discre- tamente aumentada, com sinais de marcante congestão pulmonar. 38CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Figura 22. Radiografia de tórax de paciente com DAT- VP. Disponível em: https://bit.ly/2D0yG1S O ECG apresenta sinais de sobrecar- ga do ventrículo direito e do átrio di- reito. O ECO permite avaliar a CIA, a confluência das veias pulmonares, o tamanho das câmaras cardíacas e as artérias pulmonares. O cateterismo cardíaco é indicado quando há neces- sidade de elucidação diagnóstica e de estudo das pressões. A correção ci- rúrgica deve ser indicada assim que o diagnóstico clínico esteja confirmado. Atresia tricúspide A atresia tricúspide se define pela au- sência completa da conexão atrioven- tricular direita, ou seja, não há qual- quer comunicação entre átrio direito e ventrículo direito. Como a valva tricús- pide está ausente, o assoalho do átrio direito é completamente muscular (fechado) e o ventrículo direito, hipo- plásico. De forma lógica, comunica- ção interatrial ou forame oval paten- te, e comunicação interventricular ou permanência de canal arterial são le- sões associadas obrigatórias para a manutenção do fluxo pulmonar. Todo o sangue do retorno venoso sis- têmico passa para o átrio esquerdo por meio da CIA e mistura-se com o san- gue oxigenado proveniente da circula- ção pulmonar antes de atingir o ventrí- culo esquerdo. Essa mistura de sangue que chega ao ventrículo esquerdo é di- recionada tanto para a circulação sistê- mica como para a circulação pulmonar. O fluxo pulmonar, portanto, depende do diâmetro dessas comunicações e do grau da estenose pulmonar e pode ser controlado exclusivamente pelo grau de comprometimento da valva pulmonar. Figura 23. Modelo anatômico de atresia tricúspide. Disponível em: https://smart.servier.com/ 39CARDIOPATIAS CONGÊNITAS O principal sintoma é a cianose cen- tral, que surge no 1º dia de vida e está diretamente relacionada com o fluxo sanguíneo pulmonar, sendo mais in- tensa nos casos com CIV restritiva e estenose pulmonar. Crises hipoxêmi- cas podem ocorrer até os 6 meses de vida e têm como causas a diminuição ou o fechamento da CIV, a piora da estenose ou o fechamento do canal arterial e o sinais de IC são comuns nos casos com fluxo sanguíneo pul- monar aumentado. No exame físico, observa-se cianose em todas as faixas etárias e em crian- ças maiores, também há baquetea- mento digital, déficit de peso/altura e abaulamento precordial. O frêmito sistólico pode estar presente nos ca- sos com estenose pulmonar e a 2ª bulha é única e um sopro sistólico de regurgitação ou ejeção é audível em toda a borda esternal. O Raio-X nos pacientes com fluxo sanguíneo pulmonar diminuído mos- tra área cardíaca normal ou pouco aumentada, mas nos pacientes com fluxo sanguíneo pulmonar aumenta- do, a área cardíaca está aumentada e a circulação pulmonar exibe sinais de congestão venosa importante. O ECG mostra hemibloqueio anterior esquerdo, sobrecarga atrial direita e sobrecarga ventricular esquerda. O ECO nos mostra a atresia tricúspide, além de se observar a ausência da valva tricúspide, tamanho do ventrí- culo direito, as dimensões das CIV e CIA, a relação das grandes artérias, o tamanho e a confluência das arté- rias pulmonares, a presença do canal arterial e as anomalias associadas. A indicação do cateterismo cardíaco é imprescindível antes da correção de- finitiva, para estudo das pressões. O tratamento de recém-nascidos com atresia tricúspide e cianose gra- ve deve ser imediato e o uso de pros- taglandina é essencial para manter a permeabilidade do canal arterial. Após a confirmação diagnóstica, a atriosseptostomia com cateter-balão pode ser necessária nos casos com CIA restritiva. O tratamento cirúrgico é obrigatório para todos os tipos de atresia tricús- pide e em crianças com menos de 3 meses de vida com hipoxemia impor- tante, indica-se a cirurgia de Blalock- -Taussig modificada, que consiste na colocação de um tubo entre a artéria subclávia e a artéria pulmonar direita ou esquerda. Após 3 meses da cirur- gia, o paciente deve ser submetido à anastomose da veia cava superior com o ramo direito da artéria pul- monar (cirurgia de Glenn ou Fontan). Após 6 a 12 meses da cirurgia de Glenn ou Fontan, indica- se a cone- xão da veia cava inferior com a artéria pulmonar,derivando-se, dessa ma- neira, todo o sangue venoso sistêmi- co para a circulação pulmonar (cirur- gia de Fontan). 40CARDIOPATIAS CONGÊNITAS SE LIGA! Nos pacientes com hiperfluxo pulmonar e IC, a primeira cirurgia a ser realizada é a bandagem da artéria pul- monar, a fim de se evitar o desenvolvi- mento de hipertensão pulmonar, o que inviabiliza as correções futuras. Anomalia de Ebstein Uma alteração no tamanho do átrio direito (muito grande) que mergulha no ventrículo direito e isso favorece a passagem direta do sangue para o ventrículo esquerdo por meio do Fo- rame Oval (FO). Além disso, essa con- dição é piorada pois a válvula tricús- pide é regurgitante e ainda obstrui a saída de sangue do VD, ou seja, mui- to sangue vai para o átrio esquerdo, desce para o ventrículo esquerdo, se- gue para a Aorta e por meio do canal arterial o sangue chega nas artérias pulmonares. Figura 24. Modelo anatômico de anomalia de Ebstein. Disponível em: https://bit.ly/38igc8B Em neonatos, a clínica pode ser de IC com importante cardiomegalia e cia- nose central, mas a cianose diminui à medida que a resistência vascular pulmonar também reduz. Em crianças maiores, os sinais clínicos mais fre- quentes são dispneia, fadiga, palpita- ção e cianose, falta de ar e emagreci- mento. Na ausculta, os achados são desdobramento de bulhas, presença 41CARDIOPATIAS CONGÊNITAS de 4ª bulha e sopro sistólico. Arritmia cardíaca é frequente. A Raio-X nos mostra cardiomegalia e o sinal mais típico no ECG é o blo- queio do ramo direito, mas é o ECO que define o diagnóstico. O tratamen- to clínico consiste em PGE1 (prosta- glandina) para neonato para manter o Canal Arterial aberto e o cirúrgico ba- seia-se num shunt aorto-pulmonar. Síndrome de hipoplasia do ventrículo esquerdo (HVE) Síndrome definida por um conjunto de anormalidades: atresia ou estenose das valvas aórtica e mitral, hipoplasia das câmaras esquerdas, hipoplasia da aorta ascendente e canal arterial persistente. Ou seja, o coração es- querdo é quase que inútil para com suas funções. SAIBA MAIS! O septo interventricular pode ser íntegro ou apresentar uma CIV e a comunicação entre os átrios está presente, mas existem casos com septo íntegro. Figura 25. Modelo anatômico de anomalia de hipopla- sia de VE. Disponível em: https://smart.servier.com/ A hipoplasia do ventrículo esquerdo não traz qualquer prejuízo para o de- senvolvimento do feto, pois o débito sistêmico é mantido pelo ventrículo direito. O sangue que vem do pulmão passa para o AE, vai para o AD pela CIA e chega ao VD, onde é bombe- ado e passa para a aorta pelo canal arterial. Após o nascimento, ocorre queda da resistência vascular pulmo- nar, aumento da resistência sistêmica e fechamento do canal arterial e, con- sequentemente, inviabilidade da vida. 42CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Enviado ao canal arterial Bandagem das artérias pulmonares Balão para atriosseptostomia Ventrículo direito Tronco pulmonar Ventrículo esquerdo Aorta Figura 26. Modelo anatômico de anomalia de hipoplasia de VE corrigida. Disponível em: https://bit. ly/2YO6BmM cardíaco pode ser usado para coloca- ção de stent no canal arterial ou para abertura do septo atrial. O tratamento clínico visa a estabilizar o doente para a cirurgia, utilizando prostaglandina para manter o canal arterial pérvio. A técnica mais utili- zada é a cirurgia de Norwood no 1º estágio, seguida pelas cirurgias de hemi-Fontan e Fontan. Pode-se utili- zar também a abordagem híbrida ou até mesmo esperar pelo transplante cardíaco. SE LIGA! Oxigênio não deve ser utiliza- do. Algumas vezes, o uso de CO2 ajuda a manter o equilíbrio hemodinâmico, ao aumentar a resistência vascular pulmo- nar e proporcionar maior fluxo à aorta. Quando nasce, o RN parece estar normal, mas após 24 horas de vida, a criança desenvolve quadro de bai- xo débito, com uma coloração de pele acinzentada, taquipneia, dificuldade respiratória e hipotermia, e, assim, aparecem sinais de acidose metabó- lica, hipoglicemia, anúria e choque, no qual leva a óbito se não for tratado. As bulhas cardíacas são nítidas, com 2ª bulha única e clique de ejeção pul- monar e os pulsos estão reduzidos ou ausentes nos quatro membros. O Raio-X mostra cardiomegalia leve a moderada com aumento da trama vascular pulmonar, enquanto que o ECG é inespecífico. O ECO define o diagnóstico pela demonstração das lesões da síndrome. O cateterismo 43CARDIOPATIAS CONGÊNITAS 5. CARDIOPATIAS CONGÊNITAS QUE SE MANIFESTAM COM ARRITMIA A arritmia cardíaca pode estar presen- te na evolução de várias cardiopatias congênitas, mas, em geral, está asso- ciada às alterações hemodinâmicas. Na doença de Ebstein e na transpo- sição corrigida das grandes artérias (TCGA), a arritmia pode ser a primeira manifestação clínica. Transposição corrigida das grandes artérias A transposição corrigida dos grandes vasos da base é uma cardiopatia rara, na qual as conexões atrioventricular e ventrículo- arterial são discordantes. O átrio direito está conectado com o ventrículo esquerdo, que se liga à ar- téria pulmonar. O átrio esquerdo co- necta-se com o ventrículo direito, que, por sua vez, liga-se à aorta. Portanto, do ponto de vista funcional, a circula- ção é normal. As crianças sem anomalias cardíacas associadas, em geral, são assintomá- ticas. A arritmia cardíaca pode ser a manifestação inicial da doença e na CARDIOPATIAS CIANÓTICAS Tetralogia de Fallot Estenose pulmonar Hipertrofia de VD CIV Transposição das Grandes Artérias Hiperfluxo pulmonar Relação anormal entre grandes artérias e ventrículos Diagnóstico • Sopro sistólico com B2 única e hiperfonética • Radiografia de tórax • “ovo deitado” • Hipóxia • Acidose • ICC Tratamento • Clínico • Cirúrgico até o 25º dia de vida Dextroposição da aorta Hipofluxo pulmonar Diagnóstico • Baqueteamento digital • Sopro sistólico ejetivo • Radiografia de tórax • “coração bota” Tratamento cirúrgico 44CARDIOPATIAS CONGÊNITAS ausculta, observa-se somente uma 2ª bulha hiperfonética em área pul- monar, por causa do posicionamento anterior da aorta. Complicações como insuficiência tricúspide, IC e arritmia são comuns na evolução clínica do paciente, e decorrem da disfunção do ventrículo direito, que está conectado com a circulação sistêmica. 6. TESTES DE OXIMETRIA O teste da oximetria consiste em um exame não invasivo realizado com um aparelho chamado oxímetro, en- costando-se o sensor, que mede a oxigenação do sangue. O local de aferição é no membro superior direito e um dos membros inferiores e faze- mos a aferição entre 24 e 48 horas de vida, antes da alta hospitalar. O resultado normal: saturação peri- férica de oxigênio (SpO2) ≥ 95% em ambas as medidas (membro superior direito e membro inferior) e diferença < 3% entre as medidas do membro superior direito e membro inferior. O resultado anormal: caso qualquer medida da SpO2 seja < 95% ou haja uma diferença ≥ 3% entre as medi- das do membro superior direito e do membro inferior, uma nova aferição deve ser realizada após 1 hora. Caso o resultado seja confirmado, uma eco- cardiografia deve ser realizada dentro das 24 horas seguintes, antes da alta hospitalar. A realização desse teste não descar- ta a necessidade de exame físico mi- nucioso e detalhado em todo recém- -nascido, antes da alta hospitalar. OXIMETRIA DE PULSO Membro superior direito e um dos membros inferiores entre 24h e 48h de vida, antes da alta hospitalar SpO2 < 95% ou uma diferença ≥ 3% entre as medidas SpO2 ≥ 95% e uma diferença < 3% entre as medidas Segmento neonatal de rotina SpO2 < 95% ou uma diferença ≥ 3% entre as medidas SpO2 ≥ 95% e uma diferença < 3% entre as medidas Realizar outra oximetria dentro de 1h Realizar ecocardiograma e não dar alta até esclarecimento 45CARDIOPATIAS CONGÊNITAS Diagnóstico ECO fetal Teste do coraçãozinho • Oximetria de pulso no RN Exame físico Manifestações clínicas Cianose
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