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NÚCLEO DE SOLUÇÕES DIDÁTICAS RELAÇÃO: PRINCÍPIOS E VALORES Disciplina Código Disciplina 2020FGE030 Nome Disciplina RELAÇÃO: PRINCÍPIOS E VALORES Área Formação Geral e Humanística Apresentação geral Pontuação requerida: 0 Tema(s): Apresentação pessoal, da UC e do PPV. Partilha de expectativas - Inspirações Introdução. Falar de si mesmo. Programa Propósito de Vida (PPV). Tópicos(s): Introdução Tipo: Conteúdo Introdução Nesta introdução, nosso objetivo é apresentar, em linhas gerais, as diretrizes do Programa Propósito de Vida (PPV) e, ao mesmo tempo, estimular a apresentação dos participantes. Quanto a este último objetivo, apesar ser algo trivial que os participantes se apresentem no início de qualquer curso ou atividade desenvolvida com outras pessoas, devemos dizer que, quando visto a partir do PPV, isso assume uma importância que se distancia em muito das apresentações corriqueiras. Para demonstrarmos o peso que aí depositamos, iremos enfatizar um pouco a complexidade com a qual gostaríamos que ela fosse considerada. Falar de si mesmo Tipo: Conteúdo Falar de si mesmo Em geral, falar de si mesmo diante de outros pode ser um pouco difícil e a maior parte de nós evita estender-se além do necessário. Para alguns, falar de si mesmo, além disso, parece ser sempre um acontecimento marcado por certa dose de vaidade, o que tornaria justificável a economia das palavras. Naturalmente, a dificuldade desse ato é minimizada pelo fato de sabermos, de antemão, que mesmo uma breve apresentação deverá satisfazer aos nossos ouvintes. No fim das contas, estamos protegidos pelas “regras de etiqueta” e convenções nas relações sociais. Ficamos mais tranquilos sabendo que não seremos coagidos a revelar mais do que aquilo que estaríamos dispostos. Existem situações, no entanto, tais como as entrevistas de emprego, nas quais precisamos nos apresentar de uma maneira não tão econômica. Nelas, é inclusive recomendável que falemos de modo mais entusiástico sobre nós e, para isso, precisamos superar algumas inibições. Se falamos com um(a) terapeuta, por exemplo, talvez essa preocupação seja menor, embora não deixe de existir. Há, certamente, muitas outras circunstâncias em que somos demandados a falar de nós mesmos e em todas elas a importância de cada aspecto enfocado irá variar. Pode ser que estejamos preocupados com as expectativas a nosso respeito e nos apresentamos de tal maneira que certa impressão seja causada. Não deveríamos, no entanto, circunscrever as dificuldades que envolvem o falar de si mesmo, em uma apresentação, apenas às inibições e reservas de caráter pessoal, pois existe também uma dificuldade com a qual nos deparamos toda vez que o objeto de investigação somos nós mesmos. Programa Propósito de Vida (PPV) Tipo: Conteúdo Programa Propósito de Vida (PPV) No contexto do PPV, devemos enfrentar tal dificuldade e é por isso que a apresentação dos participantes deve ser vista, já em seu início, de uma maneira especial, isto é: como uma tentativa de reflexão e meditação a respeito da pergunta “Quem sou eu?”. Antes de discutirmos a pergunta em si mesma, vale a pena acentuar sua importância metodológica no interior do PPV. No documento Projeto de Vida: a construção da integralidade da pessoa, ela representa a interrogação pela Dimensão Psicoafetiva, a qual representa, juntamente com as dimensões Psicossocial, Política, Espiritual e Técnica, as cinco dimensões constituintes de uma matriz orientadora do PPV. Inicialmente, a questão será introduzida com um caráter pragmático, isto é, ela será apresentada como aquilo que se busca desenvolver durante o curso. As questões que circunscrevem cada uma das dimensões são as seguintes: Dimensões constituintes de uma matriz orientadora do PPV Essa visão inicial nos dá uma indicação daquilo que será desenvolvido à medida que progredirmos em nossas discussões. É importante, então, que você tenha em mente que tais questões estão entrelaçadas e permitirão que, ao final, quando estivermos escrevendo nosso próprio projeto de vida, possamos perceber uma diferença entre nossas tentativas iniciais e o aprofundamento reflexivo alcançado. Em A condição humana Hannah Arendt nos lembra que, entre os gregos, havia um entendimento de que poderia ser mais fácil para os outros do que para eu mesmo responder à pergunta “Quem sou eu?”. Essa forma inusitada de abordar a questão, diz ela, tem a ver com o daimôn de cada indivíduo. Com essa palavra os gregos compreendiam aquilo que torna cada um de nós diferente de todos os demais, o daim ôn seria a identidade de cada um. Ele teria, no entanto, uma característica especial: permaneceria oculto para nós mesmos e apenas se revelaria aos outros, àqueles com os quais nos relacionamos e para os quais aparecemos em nosso agir e falar. Vemos, aqui, que a questão “Quem eu sou?” dependeria, para ser respondida adequadamente, da maneira como nos apresentamos e aparecemos diante dos outros. Dependeria, numa palavra, de como apareço em público, diante daqueles que também agem e falam. Nesse questionamento, ganha importância, então, o modo como nos relacionamos com os demais seres humanos. Essa visão oriunda dos gregos é importante, pois contrasta com a compreensão do ser humano que se inicia na era moderna. Como sabemos, Descartes trouxe para o primeiro plano da reflexão filosófica a investigação da subjetividade [inspectio sui]. Ele acreditava que o conhecimento deveria encontrar no eu pensante seu fundamento absoluto. Essa forma de considerar a subjetividade como a fonte e fundamento de tudo aos poucos foi sendo criticada. No entanto, a filosofia cartesiana ainda possui influência na atualidade. São raros os filmes sobre tais personalidades, sobretudo, em função da ocupação intensa apenas com a vida do espírito. Existem, no entanto, duas produções cinematográficas sobre autores mencionados. A primeira produção é o filme sobre Hannah Arendt e tem título homônimo. E a segunda, Cartesius trata da vida de Descartes. Cartesius é o nome em latim de Descartes. As duas produções são interessantes no sentido de contextualizar historicamente o pensamento e obra dessas personalidades. Elas nos permitem, ao mesmo tempo, aprofundar o entendimento do que eles pensavam e, com isso, ampliar as relações que podemos fazer em nossas discussões. Trazemos essas referências para nossa discussão para mostrar, em primeiro lugar, que desde há muito se discute a questão “Quem sou eu?”. Em segundo lugar, percebemos que, dada sua complexidade, não poderia existir um único enfoque para abordá-la. Não devemos, contudo, sentirmo-nos intimidados por sua longa história e complexidade. Ao contrário, o PPV pretende estimular essa reflexão de maneira que possamos aprofundar nosso entendimento tornando-a uma questão também nossa no momento atual. Nossa discussão começa com tais reflexões e, à medida que progride, introduz novas dimensões de questionamento, indo além da esfera subjetiva e psicoafetiva. É por isso que as ampliaremos para o campo da ética, das possibilidades inerentes à vida acadêmica e de como ela pode ser uma plataforma de realização pessoal que se estende para tornar a presença na comunidade parte da própria existência. O Programa Propósito de Vida, portanto, deve ser visto como uma parada para a reflexão a respeito do caminho de cada participante, um caminho que, de algum modo, fez com que seu olhar se voltasse com algum interesse para o próprio programa. Essa reflexão sobre o caminho percorrido é, ao mesmo tempo, uma reflexão sobre onde cada um se encontra, isto é, naquela posição em que se pode olhar com mais cuidado o impacto de certas escolhas passadas e seguir pensando sobre o que se quer realizar a partir de onde se está. Nesse sentido, o grupo parece ser fundamental, pois oferece um âmbito de apresentação de múltiplas experiências que poderão ser discutidas em benefício mútuo. Tem-se, então, a esperança de que o aprofundamento das relações entre os participantes permita que novas possibilidades sejam aventadas e novos caminhospossam ser percorridos. Diante disso, propomos um itinerário reflexivo em harmonia com o PPV. Em linhas gerais, temos então as quatro unidades intituladas, respectivamente: 1. Projeto de Vida Abordaremos a trajetória de vida e a trajetória acadêmica dos participantes. Nosso objetivo será o de identificar aqueles aspectos e elementos que tiveram alguma coisa a ver com a escolha pela dinâmica que será desenvolvida aqui. Por certo que ninguém poderá dizer que sua trajetória anterior o traria inevitavelmente até aqui, mas deveria ser possível identificar, naqueles aspectos e elementos da trajetória pessoal, alguma familiaridade, relação ou fator que faria despertar o interesse por um itinerário com essa temática. A Unidade 1 termina com uma discussão a respeito da condição humana. Nela, buscaremos ressaltar a importância do caráter relacional próprio ao ser humano e dos elementos constituintes da relação consigo mesmo, com os outros e com o mundo a sua volta. Esse elemento relacional será o elo com a próxima unidade. 2. Valores Aqui a intenção é propor formas de abordarmos esses temas, pois tanto a ética quanto a felicidade são assuntos com os quais inevitavelmente nos debateremos. Se isso fizer algum sentido, podemos ver em uma ou outra discussão novas formas de pensar sobre isso. O mais importante é instaurar um ponto de partida e, ao mesmo tempo, de referência, para que os temas sejam abordados. Isso deve ser visto como uma tentativa que precisa ser avaliada por aqueles que se interessem, já que temos à disposição normas, regras, costumes, etc., para seguirmos. A questão, portanto, diz respeito a como pensá-las quando encontramos dificuldades em compreendê-las. Um exemplo que ilustra esse ponto pode ser visto nos intensos debates a respeito da diferença salarial entre homens e mulheres na atualidade. Deve ficar evidente, nesse ponto, que essa condição de poder compreender e avaliar possibilidades e decidir a respeito daqueles desdobramentos que seriam mais desejáveis do que outros é um traço constituinte fundamental do ser humano. Dito de outra forma, é possível para cada um ter uma relação com seu próprio futuro e que, em certo sentido, podemos decidir em que termos essa relação se dará. Dentro do Programa Propósito de Vida esse aspecto ganha uma caracterização bem precisa, a qual vem somar-se às outras já presentes na tradição. Baseados naquilo que foi discutido até a Unidade 2, deverá ser possível, então, identificar de uma forma mais ou menos acurada as concepções de felicidade que mais se afinam com o projeto pessoal de cada participante. Em razão disso, a questão central do tema 4 da Unidade 2 é a relação entre o conceito de felicidade e o projeto existencial. 3. Competências Na Unidade 3, teremos a oportunidade de pensar sobre a importância da Universidade no interior do projeto existencial. Interessa entender de que maneira os traços que constituem a Universidade têm a ver com as expectativas e anseios dos participantes. Quais seriam, portanto, as condições que norteiam o vínculo com uma instituição de ensino superior? Esse vínculo entre o projeto existencial e a Universidade é um elemento muito importante do modo como o Grupo UBEC expressa seu desejo e compromisso em acolher essa espécie de apelo da sociedade “no sentido de contribuir com a formação de pessoas, com a qualificação profissional e com o desenvolvimento social” (p. 4). É seu propósito de inserção, participação e atuação na vida da comunidade. Na visão do Grupo, portanto, a Universidade não é entendida apenas como um lugar de realização pessoal, mas como o ponto de encontro entre aqueles que perfazem seu dia a dia e as expectativas projetadas sobre si pelas comunidades. Aqui temos, então, um pequeno vislumbre de como se expressa o ideal e o caráter comunitário da Universidade para o Grupo UBEC. 4. Habilidades Na Unidade 4, trataremos daquelas habilidades que são consideradas desejáveis para quem quer dedicar-se à vida acadêmica. Muitos elementos serão discutidos aqui. Por um lado, sustenta-se que o cultivo da leitura, da escrita e da oralidade são componentes irrenunciáveis dessa atividade. Por outro lado, destaca-se a importância de atitudes tais como criatividade, empreendedorismo e inovação como modos de realização do projeto de vida acadêmica. Mais uma vez vale ressaltar que o Programa Propósito de Vida apresenta a importante reivindicação e estímulo para que o lugar onde exercemos a vida acadêmica não seja apenas um lugar e um período de passagem, mas o lugar onde a vida se realiza, onde o próprio projeto de vida se realiza. O PPV incentiva a atitude de ir além dos muros da Universidade, em busca da realização do ideal comunitário e seu vínculo com o projeto existencial. O Programa Propósito de Vida tem origem no modo como a própria instituição compreende a si mesma e afirma seus compromissos com o futuro de indivíduos e comunidades, orientada por valores e propósitos. Ao fazer parte do olhar institucional em direção ao futuro, PPV situa-se na dimensão dos “caminhos que serão percorridos”, sua estrutura fundamental reflete os princípios e valores da instituição. Estes princípios e valores, quando corretamente observados, mostram até que ponto a instituição preserva e promove sua herança cristã e humanista e está totalmente comprometida com o desenvolvimento de pessoas e da comunidade na qual se insere. Com a pergunta “1,Quem sou eu?”, levantada no início, não temos como único objetivo conquistar uma apresentação adequada dos participantes do programa. A questão é também uma espécie de questão guia, pois o PPV é construído, entre outras coisas, com base nesse saber de si que, a cada passo, descobre mais elementos que poderão dar uma orientação para aquela visão de futuro que será aos poucos elaborada. Os envolvidos no PPV encontram, então, uma oportunidade para refletir sobre a própria vida enquanto um caminho repleto de escolhas feitas e escolhas por fazer. O problema com o qual nos defrontamos a cada escolha, no entanto, é o de qual é a melhor delas. Temos que, porém, perguntar: melhor em relação a quê? O que é bom da perspectiva do indivíduo pode não ser bom para a comunidade na qual ele vive e, além dela, para a sociedade. Há dilemas éticos que perpassam nossas escolhas. Precisamos de princípios, critérios e muitas outras referências interiores e exteriores para avaliar a cada uma delas. Façamos o exercício mental de, por exemplo, escolher sempre o que fazer adotando como critério o benefício próprio. Quais as consequências dessa escolha? Como ficam as relações com as outras pessoas? Talvez pudéssemos pensar a respeito das consequências de um agir totalmente altruísta, isto é, deixando os interesses próprios de lado e considerando sempre o benefício dos demais. É possível levar uma vida sem considerar a si mesmo nas inúmeras escolhas? Aristóteles já havia se deparado com essas duas possibilidades extremas e percebeu que no longo prazo elas eram nocivas tanto para o indivíduo quanto para o grupo de indivíduos com o qual ele se relacionava. Daí a expressão que se tornou corrente in medium virtus, quer dizer, o agir virtuoso não está no agir conforme apenas aos próprios interesses e nem em agir de tal forma que eu acabe esquecendo das minhas necessidades. O agir virtuoso se encontraria no meio, consideraria os interesses próprios e os da coletividade. Unidade 1 - Projeto de vida Pontuação requerida: 0 Tema(s): No interior do PPV, as discussões a respeito da dimensão ética de nosso existir levarão em conta uma perspectiva que valoriza o entendimento de si como alguém com um passado, um presente e um futuro. O que isso quer dizer? Quer dizer que uma compreensão de nosso existir no tempo é uma compreensão de como concepções éticas e teóricas determinaram, determinam e determinarão nossas escolhas e o modo como agimos. A perspectiva católica, nesse sentido, vem somar-se a outros enfoques importantes, dada a sua importância em nossa tradição. Deve ser dito, contudo, que o enfoque teológico,na perspectiva do cristianismo católico, apesar de ser norteador do programa, não deve ser visto como um limitador das discussões. Antes de qualquer coisa, ele deve ser visto como um balizador e um importante ponto de apoio. Isso está de acordo não apenas com sua proposta de integração à comunidade, mas também com o importante papel que desempenhou e desempenha em toda a tradição de pensamento ocidental. Percurso da história pessoal de vida Apresentação. Compreender impulsos para o desenvolvimento de um projeto de vida. Tópicos(s): Apresentação Tipo: Conteúdo Apresentação Nesta Unidade, intitulada Projeto de Vida, desenvolveremos uma discussão que tem como primeiro tema o Percurso da história pessoal de vida. Para isso, alguns esclarecimentos devem ser feitos de início. O primeiro diz respeito àquilo que precisamos manter em foco. Queremos que seja discutida a trajetória pessoal sem que seja considerado, ainda, o percurso acadêmico. O percurso acadêmico é certamente um componente muito importante da história de vida dos participantes, mas vamos discuti-lo a seguir, em tópico separado. Em segundo lugar, desejamos que essa discussão possa ser feita ao modo de uma recordação de acontecimentos da história de vida pessoal. Para que a recordação dessa história não tenha um caráter aleatório, acreditamos ser importante que se possa discernir, nessas recordações, um elemento de afinidade com a proposta aqui desenvolvida. Para auxiliar nessa seleção, poderíamos nos perguntar, por exemplo: por que me interessei pelo Programa Propósito de Vida? Seria possível identificar em minha história de vida elementos que possuem alguma conexão com ele? Percebo alguma experiência, algum acontecimento ou alguma relação pessoal fazendo essa conexão? Esse primeiro passo pode ajudar a identificar algum elemento que, em relação à proposta, denote um vínculo. Em terceiro lugar, devemos considerar que essa discussão/recordação faz parte de nossa tentativa de colocar a questão “Quem sou eu?” de uma maneira mais enfática. Recordar acontecimentos da história pessoal que, de alguma maneira, têm a ver com a escolha pelo Programa significa tornar claro para si mesmo elementos e fatores que levaram a essa escolha ou permitiram que ela fosse feita. Compreender impulsos para o desenvolvimento de um projeto de vida Tipo: Conteúdo Compreender impulsos para o desenvolvimento de um projeto de vida Pode ser que, quando escrevemos “levaram a essa escolha”, quem está lendo entenda que ocorreram eventos que a tornaram inevitável. Não é disso que se trata, pois não há aí qualquer tipo de ligação necessária. Antes de tudo, trata-se de compreender esses acontecimentos da história pessoal como impulsos para o tipo de reflexão que buscamos aqui, em específico, e impulsos para o desenvolvimento de um projeto de vida. É nesse sentido que procuramos identificar, na trajetória pessoal, os elementos e fatores que permitiram essa escolha. De certo modo — isso é o mais importante —, alguns acontecimentos de nossa vida podem ter nos levado a colocar de maneira mais ou menos constantes questionamentos que têm em vista analisar e compreender mais profundamente/e o passado e questionar as motivações e justificativas dos projetos pessoais. Não se trata, portanto, de querer ver uma espécie de fio condutor onde ele não existiria, de ver um fio ligando uma escolha à outra e constituindo nossa trajetória de vida. A existência de qualquer ser humano, como devemos saber, está sujeita aos efeitos de eventos que estão fora de controle. E há uma grande diferença entre desejar que uma escolha leve a isso ou aquilo e essa mesma escolha, de fato, levá-lo. Devemos, portanto, prevenir-nos dessa tendência própria ao ser humano de ligar e concatenar eventos aleatórios como se estivessem conectados por um fio invisível. Certamente, nossa existência não é completamente constituída pela sorte e pela aleatoriedade, mas sempre nos causa admiração — quando lemos e ouvimos narrativas autobiográficas, sobretudo, aquelas histórias de sucesso — em como as pessoas podem deixar de fora qualquer tipo de papel para o acaso em suas vidas. Essas pessoas evitam reconhecer que algo possa ter acontecido independentemente de suas escolhas e esforços. A possibilidade de podermos encaixar eventos em uma narrativa deve ser vista, naturalmente, como fundamental para a constituição e compreensão do significado de acontecimentos, mas isso deveria ser feito até o ponto em que as coisas de fato se ligam e não, de modo artificial, consideradas como estando conectadas apenas para que a narrativa pareça grandiosa e totalmente inteligível. Esse processo é muito difícil, pois as pessoas se compreendem por meio de narrativas que elas criam para si. Assim, quando submetemos esses relatos a críticas e confrontos com a realidade, o resultado é que, em pessoas com tendência para a fantasia, por exemplo, aparecerão algumas rachaduras na visão que elas criaram. Em outros casos, contudo, uma visão mais real pode ser altamente benéfica, impulsionando o indivíduo a permanecer em contato com a realidade, deixando pouca margem para ilusões. Entre os gregos já se compreendia esse aspecto das escolhas e das ações que fogem às expectativas. Para eles, no entanto, a vida de cada ser humano também era em parte “contada” segundo a vontade dos deuses. Essa é uma forma de reconhecer que algo acontece para além de minha vontade. Para os gregos, contudo, o acaso e a aleatoriedade aparecem sob o signo da vontade dos deuses. Em algumas circunstâncias, fala-se de destino também, como se aquele curso de acontecimentos estivesse, de algum modo, reservado para o indivíduo. Resistimos, também, em reconhecer uma explicação que apele à noção de destino pelo fato de que, com ela, não nos sentimos mais no controle de nossas ações e, portanto, de nossa vida. Não seríamos, assim, verdadeiramente livres. Como, então, poderíamos estabelecer um ponto de partida adequado para essas reflexões sem cairmos de modo tão frequente nas armadilhas mencionadas? Podemos começar pela história familiar e perguntar coisas do tipo: Talvez aqui seja importante nos voltarmos para os acontecimentos mais significativos em nossas vidas, pois certamente existem pequenos conflitos diários na convivência familiar, mas eles não são, a maior parte das vezes, muito importantes. Poderíamos, também, ampliar as reflexões para além do âmbito familiar e tentar discernir outros tipos de influências e acontecimentos importantes da história pessoal. Pensamos, então, em pessoas e eventos que, de algum modo, foram importantes em nossa trajetória. Entre essas pessoas e eventos, algum deles provocou algum tipo de mudança em nós? Poderíamos pensar em um acontecimento que nos permitiu rever expectativas ou mudar até mesmo o caminho que seguíamos. Podemos pensar em pessoas que mudaram a nossa forma de pensar ou que nos provocaram a refletir sobre o sentido de nossas escolhas e sobre o que gostaríamos que decorresse desses acontecimentos. Dos professores que fizeram parte de minha trajetória, algum deles teve uma importância nesse sentido? O passo seguinte seria, então, perguntarmo-nos, diante de situações de mudança, o que mudou e por que mudou? O que estamos tentando encontrar são as raízes da motivação e apreço por uma reflexão mais profunda sobre questões relativas à nossa existência. Aqui entram em jogo não apenas elementos que poderíamos chamar de existenciais, mas também os que dizem respeito ao modo como nos relacionamos com outros indivíduos, com o ambiente, com a sociedade, com nossos desejos profissionais e com as atividades com as quais estamos envolvidos. De certo modo, portanto, diz respeito à reflexão sobre possibilidades futuras, sobre planos que gostaríamos de tornar concretos, sobre como nos vemos em um futuro não muito distante. Você pode perceber que, ao mesmo tempo queremos nos aproximar do tema propósito de vida, somos impelidos a uma reflexão orientada pela pergunta “Quem sou eu?”. Não é possível dissociar o tema dessa questão, pois,afinal de contas, queremos saber em que medida aquilo que estabelecemos como propósito A trajetória continuada da vida acadêmica Apresentação. A continuidade da trajetória acadêmica. Propósito de vida como objeto de reflexão. Finalizando. Tópicos(s): é algo que se encontra dentro de nossas possibilidades. Isso não quer dizer que o objetivo seja constatar se determinado propósito é algo absolutamente fantasioso ou situado além das capacidades de alguém. Essa avaliação é sempre a própria pessoa que faz e decide se concorda com ela ou não. O objetivo central é saber se o propósito estabelecido por alguém tem a ver de fato com quem ele é ou se ele provém de fatores externos. Parece ser verdade que quanto maior é a compreensão que temos de nós mesmos, mais fácil é decidir se algo tem de fato a ver com quem somos. Sem essa compreensão, podemos estar estabelecendo metas e propósitos que seriam mais para a satisfação de outros ou da imagem que acreditamos que outros têm de nós. Por isso, é tão comum conhecermos pessoas que nos dizem que estão fazendo determinado curso universitário pelo fato de que esse era o desejo de alguém importante para ele, um pai ou uma mãe, por exemplo. Existem também aquelas mudanças nas trajetórias pessoais que são motivadas por reflexões a respeito dos próprios desejos ou reflexões orientadas pela pergunta “Quem sou eu?”. O indivíduo passa a ter uma consciência daquilo que ele realmente quer. O que vemos, em geral, é que nessas escolhas pode estar presente de maneira dominante um dos seguintes fatores: desejo alheio; desejo próprio; sorte, acaso, aleatoriedade. Devemos reconhecer, no entanto, que as escolhas são difíceis também por si mesmas, sobretudo, no caso das escolhas profissionais. Ruth Chang abordou sobre esse assunto no Ted Talk, em uma palestra intitulada Como fazer escolhas difíceis. Assista abaixo ao vídeo com duração de 15 minutos ou sua transcrição. Sorry: we can't play video on this browser. Please make sure it's up to date and that Flash 11.1 or higher is installed. Load this talk on ted.com O passo seguinte de nossas reflexões será direcionar os questionamentos para a trajetória acadêmica e tentar perceber se existe esse vínculo entre as escolhas do passado e as escolhas na vida acadêmica. Talvez se apresente como algo natural a escolha por determinado curso acadêmico como tendo a ver com o conjunto de reflexões e temas que compõem a proposta aqui desenvolvida. Pode ser também que esse vínculo não seja identificável ou talvez nem mesmo exista. Nesse caso, seria possível identificar as razões e as motivações de tais escolhas? Apresentação Tipo: Conteúdo https://www.ted.com/talks/ruth_chang_how_to_make_hard_choices?language=pt-br Apresentação Este tema pode ser visto como um desdobramento dentro daquele conjunto mais amplo de questões sobre a trajetória acadêmica abordada anteriormente. O passo óbvio a ser dado aqui consiste em, primeiramente, compreender se e como a vida acadêmica representou uma continuidade em relação às escolhas anteriores. Em seguida, seria importante que o participante pudesse avaliar qual o impacto que o ingresso na vida acadêmica teve no conjunto de crenças e valores do período anterior. Essas reflexões constituirão o início de nossa discussão. Por fim, queremos pensar sobre a trajetória acadêmica e a escolha pelas dinâmicas aqui desenvolvidas. Existiria uma ligação entre elas? Como poderíamos compreendê-la? Sentimo-nos atraídos por certos temas e, poderíamos dizer, dedicamos boa parte da nossa vida aprendendo mais sobre eles. Nessa compreensão reside um importante indício do modo como nossas experiências anteriores influenciam nossas escolhas e contribuem para a formação de certas expectativas. Tais expectativas poderão ser confirmadas ou frustradas. Em razão disso, reservamos, no final, um espaço no qual será possível avaliá-lo. A continuidade da trajetória acadêmica Tipo: Conteúdo A continuidade da trajetória acadêmica Vamos começar com a questão da continuidade da trajetória acadêmica. Se analisarmos a vida dos participantes comparando os períodos anterior e posterior ao ingresso na Universidade, então, muito provavelmente verificaremos a existência de casos representantes de uma trajetória continuada e casos de rupturas e mudanças de rumo. Os casos em que existe uma continuidade poderiam indicar, por exemplo, uma harmonia entre a compreensão de si e o tipo de curso escolhido. O curso seria concebido como algo desejado. Mas a continuidade não pode ser explicada apenas por essa espécie de harmonia. A continuidade pode ser apenas aparente e superficial, algo que, na verdade, esconde intenções ou desejos de mudanças que não são realizados por diferentes razões e motivações. Em outros casos, a escolha do curso pode não ter a ver com uma compreensão dos próprios desejos. Mesmo assim, não é necessário que uma escolha desse tipo resulte em dificuldades, pois é muito bem possível que se desenvolva um apreço ou se produza uma identificação com o objeto de escolha. Talvez o mais adequado seria falarmos de uma escolha que não foi determinada pelo indivíduo, mas por fatores exteriores. Um exemplo de fator exterior que pode determinar de maneira mais ou menos perceptível nossas escolhas é a pressão social. Em uma dimensão mais restrita, a pressão social pode ser equivalente à pressão que o círculo familiar exerce. Uma família de médicos pode querer ou até mesmo exigir que seus filhos sigam o mesmo caminho. Além desses casos, existem aqueles nos quais a escolha passou a ser compreendida como um equívoco. Existem muitas razões para isso. Um melhor entendimento de si, um vislumbre de novas perspectivas atreladas à mudança ou até mesmo uma perda de significado daquilo que inicialmente era algo desejado. Até mesmo o conjunto de vivências na Universidade pode provocar essa mudança, mas isso não é algo necessário. Seja como for que o participante perceba sua trajetória, ou como contínua ou como contendo rupturas, é importante que ele possa compreender: Essa tentativa de enquadrar a trajetória pessoal em uma categoria já nos obriga a uma reflexão que representa um desdobramento do que foi discutido no tópico anterior. É preciso dizer aqui que experiências que consideramos detentoras de um significado negativo podem ser tão importantes quanto experiências positivas. Sucessos e fracassos podem ser colocados lado a lado para a inspeção e exame, pois estamos interessados em descobrir o que decorre de nossos padrões de escolha e aquilo que teria o acaso como fator determinante. Aqui aparece, mais uma vez, a importância de como narramos nossa trajetória. É essencial sermos honestos e objetivos para compreendermos mais sobre nossos padrões de escolha. Só assim, podemos fazer aqueles ajustes que julgamos necessários. No entanto, não devemos nos iludir, acreditando que temos sempre tudo sob controle. Dificilmente alguém não teria algo de importante para contar sobre sua vida que pudesse atribuir a fatores fora de seu controle ou consequências de seus atos que antecipadamente eram imponderáveis. Naturalmente, a Universidade por si só pode não ser a principal ou a única responsável por certas mudanças em nossas vidas. É possível, no entanto, identificarmos aquelas que ocorreram graças ao ingresso na vida acadêmica. Alguns podem ter até mesmo experimentado mudanças radicais no modo como compreendiam a si mesmos, suas relações e o mundo a sua volta. Nesse caso, o indivíduo experimenta uma mudança no seu sistema de crenças e convicções que pode colocar em suspenso ou em dúvida todos os projetos e perspectivas que estavam a elas atreladas. O indivíduo pode experimentar uma perda de sentido que não encontra facilmente um substituto. De diversas formas podemos lidar com tais situações, não existem regras para isso, pois a maneira de lidar tem muito a ver com elementos da subjetividade, do ambiente e das relações com os outros. Há, na maior parte das vezes, uma diferença entre como o indivíduo se compreende e de como ele gostaria de compreendera si mesmo. Em geral, dizemos que o objetivo é alcançar uma unidade, de tal maneira que ele se compreende exatamente como gostaria de se compreender. É disso que se trata quando falamos de propósito de vida: cada um de nós desenvolve uma concepção de como gostaria de se compreender e direciona seus esforços para de fato se tornar essa pessoa. De certo modo, estamos aqui falando de algo que normalmente designamos como o nosso “sonho”, no sentido de nosso desejo. É por isso que aqui entra a questão de como fazer para que o sonho seja no fim das contas algo factível, trata-se de planejar como ele poderá ser realizado. Esta é propriamente umas das intenções do Programa Propósito de Vida: estimular a reflexão sobre aquilo que constitui o sonho de cada participante e os meios para alcançá-lo. Propósito de vida como objeto de reflexão Tipo: Conteúdo Propósito de vida como objeto de reflexão Se adentrarmos agora o âmbito de reflexões que dizem respeito a uma possível relação entre nosso percurso acadêmico e essa dinâmica que estamos desenvolvendo, podemos explorar um pouco mais uma questão importante: Talvez o leitor diga que essa é uma pergunta sem sentido. Mas, afinal, quem não está preocupado com a vida que quer ter pela frente ou em realizar aquilo que sonhou? Em um sentido específico, a objeção parece ser válida, pois, de fato, estamos preocupados em como realizar nossos desejos. Existem, no entanto, outras preocupações concernentes ao nosso existir e ao modo como nos relacionamos com os outros seres humanos. Tais preocupações podem até não estar no centro de nossas vidas até certo ponto, mas, à medida que nossa existência e nossas relações começam a assumir um grau maior de complexidade e cada um passa a desempenhar um papel, como diz Hannah Arendt, no grande “jogo do mundo”, torna-se inevitável que nos deparemos com questões que não dizem mais respeito apenas à maneira de realizar nossos sonhos. Essas preocupações estarão presentes em nossa vida privada, em nossa vida acadêmica, em nossa vida profissional e em nossa vida pública. Elas permeiam nossas relações e nos afetam independentemente de nossa vontade. Como veremos adiante, estamos aqui diante daquelas preocupações que se transformam em questões fundamentais da ética. Quando levantamos a pergunta “Por que o propósito de vida se tornou objeto de reflexão?”, devemos entendê-la tanto em: Em qualquer sentido da pergunta, contudo, podemos supor que existam dúvidas quanto à forma de articular a multiplicidade de desejos, intenções, crenças, convicções, planos, projetos, expectativas, ideais, etc., de maneira unitária em um planejamento sobre o propósito de vida. É com base nessa suposição de pano de fundo — a suposição fundamental de que nem todos têm como certo e óbvio o modo como irão lidar com aquelas preocupações — que o Programa Propósito de Vida em sua integralidade pretende oferecer uma oportunidade de reflexão. Um exemplo pode ilustrar esse ponto. Apesar de podermos saber antecipadamente em que estágio da formação acadêmica se encontra aqueles que optaram por este curso, sabemos que ao final desta caminhada podemos passar a exercer a profissão que escolhemos. Claro que existem possibilidades de estendermos a formação acadêmica com cursos de pós-graduação ou até mesmo outros cursos de graduação. Aqui poderão surgir preocupações de todos os tipos, por exemplo, como conciliar o desejo de ampliar a formação com as exigências de atuação profissional? Como dar sequência à realização daquilo que cada um considera o seu sonho em termos profissionais? Como pode ser realizado o desejo de uma atuação na comunidade? Aqueles que chegam ao final do curso acadêmico talvez não se deparem com tais questões, mas com outras. Em todo caso, nossa expectativa é a de que a escolha pelo Programa esteja relacionada com questões que dizem respeito tanto a como planejar a trajetória acadêmica e situá-la dentro de uma dimensão ainda maior que é o propósito de vida, quanto às questões sobre as possibilidades que se apresentam ligadas à vida acadêmica e à participação na comunidade. O escopo de nossas reflexões aqui é suficientemente amplo para que as questões possam ser debatidas independentemente do estágio de formação. A importância desse refletir, contudo, só poderá ser apreciada completamente durante o percurso. Nossa expectativa, contudo, é que elas apareçam em toda a sua importância quando discutirmos a respeito das possibilidades de desenvolvimento, planejamento e realização da vida acadêmica. Finalizando Tipo: Conteúdo Finalizando Apresentamos aqui muitos elementos que, de um jeito ou de outro, têm a ver com questões da própria existência e de como gostaríamos que ela se desenrolasse nas esferas profissional, social, subjetiva e A condição humana como um ser de relações Apresentação. Relações com os outros. O caráter relacional do ser humano. Relação com o transcendente. Conceito de relação. intersubjetiva. Estas constituem o conjunto de relações elementares de qualquer ser humano. As relações, no entanto, podem ser de diversos tipos e permeadas por interesses, obrigações e afetos. Dificilmente alguém negaria essa descrição, mas certamente poderia objetar que ela é incompleta. Concordamos com isso. É só pensar que a totalidade do conhecimento humano, que não é pouca coisa, diz respeito a descrever e explicar o que são essas e muitas outras relações. Na tradição ocidental, na antiguidade grega, o estudo dessas relações adquiriu um caráter sistemático sob a designação “filosofia”. Aos poucos, todos aqueles temas que eram inicialmente objeto de investigação filosófica passaram a ser o foco exclusivo das mais diversas unidades curriculares. Na atualidade, as reconhecemos como as ciências que tratam de um recorte da realidade. Esse processo de desmembramento da filosofia em outras ciências ainda não chegou ao fim e não sabemos se ao final restará algo ainda que possa ser designado por esse nome. No próprio âmbito das ciências já percebemos muitas divisões e subdivisões. Algumas assumindo um aspecto tão autônomo que acabamos reconhecendo como outra ciência. Da perspectiva de nosso trabalho, podemos ainda apelar à filosofia para articular certos temas e questões, mas seríamos ingênuos em acreditar que somente nela se encontram as ferramentas adequadas para lidarmos com as questões aqui colocadas. Devemos, portanto, aludir aos campos de pesquisa que podem fornecer respostas mais específicas e, ao mesmo tempo, confiáveis a respeito de várias questões. Dessa forma, não caímos na armadilha, e por que não dizer leviandade, de achar que uma área do saber — ou a nossa própria área de estudos — tem as respostas que são as mais adequadas para cada uma das questões. Na própria ideia de Universidade já reside implícito este estado de coisas, pois é possível perceber a tentativa de sustentar em uma unidade a diversidade do conhecimento. A Universidade, portanto, está aí como uma prova da extensão individualmente inabarcável do conhecimento humano e, ao mesmo tempo, como um convite para nossa formação. A palavra “formação” deve ser aqui entendida para além de tornar alguém apto a exercer uma profissão. Em sua conexão com a ideia de Universidade, a formação é um constante ultrapassar o conhecimento alcançado sobre si mesmo, sobre o mundo e sobre nossas relações com outros seres humanos. Formação é muito mais um ideal e, por isso, não é algo atingível de maneira cabal e definitiva. A formação tem muito mais o sentido de nos tornar capazes de pensar de maneira independente sobre questões, de possibilitar julgar moralmente tendo em vista a vida humana e o ambiente, de reconhecer a própria condição como uma entre outras formas de vida, de respeitar as diferenças e defender certos valores e direitos que denominamos universais. Considerando essa abrangência, podemos perceber imediatamente que ver na Universidade apenas um trampolim, uma rampa de acesso, para o mercado de trabalho constitui uma redução e desfiguração de seu ideal. É uma atitude de virar as costaspara a riqueza do conhecimento humano que está ali à disposição. Nos temas que constituirão os próximos tópicos, aprofundaremos a discussão a respeito desse caráter relacional do ser humano e das relações elementares que dizem respeito ao seu existir. Também iremos mais longe na ideia de Universidade em conexão com os temas do Programa Propósito de Vida. Tópicos(s): Apresentação Tipo: Conteúdo Apresentação. O que tem a ver a discussão anterior da trajetória acadêmica com o tema — A condição humana como um ser de relações? Esta pergunta pode ter surgido para alguns, pois, à primeira vista, parece haver, de fato, uma ruptura entre os temas discutidos, como se a temática da condição humana tivesse sido colocada de maneira um pouco forçada. Devemos lembrar, no entanto, que já na apresentação geral falávamos da importância da relação com os outros seres humanos para alcançarmos uma compreensão mais adequada da complexidade inerente à questão “Quem sou eu?”. Referimo-nos ao escrito de Hannah Arendt no qual se afirmava que, para os gregos, a identidade de cada indivíduo poderia se revelar com muito mais clareza para os outros — aqueles para os quais nos apresentamos em nosso falar e agir no mundo —, do que para si mesmo. Parece-nos que essa compreensão é uma referência direta ao caráter relacional como um traço constituinte da condição humana. Preferimos tratá-lo como um traço e não o traço, pois certamente em uma antropologia filosófica ou uma abordagem de caráter sociológico muitos outros traços deverão ser também considerados. Além disso, quando discutimos a história de vida pessoal e a trajetória acadêmica, respectivamente, procuramos identificar de que maneira pessoas, eventos e fatores externos, com os quais nos relacionamos, têm algum impacto ou influência em nossas vidas. Até agora, portanto, o caráter relacional de nosso existir esteve sempre presente em nossas discussões, apesar de estar implícito, pois não era o que estava no centro do debate. A partir de agora, retomaremos a discussão desse traço essencial da condição humana. Podemos dizer muitas coisas e não há, aqui, pretensão de apresentar uma estrutura e organização teórica completa, pois isso sairia muito do escopo de nosso trabalho, além de ocupar um espaço que não deixaria nada para outras discussões. Algumas referências importantes serão fornecidas na referência bibliográfica para aqueles que tiverem um interesse sobre o assunto. Relações com os outros Tipo: Conteúdo Relação com os outros De início, portanto, vemos que nossas relações com os outros são vias de mão dupla. Essas relações afetam a mim e podem afetar aos outros. As influências que sofremos só são possíveis com base nessas relações. Se pensarmos um pouco mais, perceberemos que nossa relação com o mundo a nossa volta, tanto na dimensão dos objetos mais próximos como o meio ambiente como um todo também revelam que somos afetados e causamos também mudanças nas mais diversas configurações conforme o modo que essas relações assumem. E o que isso nos mostra? Mostra que, por exemplo, as relações são de diversos tipos e podem ter um grau maior ou menor de importância em nossas vidas. Mostra que elas afetam de muitas formas o ambiente, outros seres humanos e a vida de outros seres. Chamamos algumas dessas relações de privadas, outras de públicas, outras de profissionais, outras ainda de cognitivas, de afetivas e assim por diante. Podemos vê-las sobre o enfoque da ética ou da moral, podemos vê-las em seu caráter estético, em termos epistemológicos, lógicos, sociais, religiosos e muitos outros. Parece ser difícil negar que o ser humano é um ser relacional, mesmo alguém que abdique de estar em relação com outros seres humanos não pode, para sobreviver, deixar de se relacionar com o ambiente para nutrir o seu corpo. Parece ser correto, então, aprofundar a descrição do caráter relacional do ser humano e, para isso, vamos nos deter em cada uma das referências acima: ética e moral, estética, epistemológica, lógica, religiosa, social. As relações de caráter profissional serão discutidas mais adiante quando falarmos das perspectivas da vida acadêmica. Você pode perceber que deixamos de lado muitas formas de relação, mas não pretendemos ser exaustivos nas descrições. Queremos apenas destacar alguns aspectos e elementos concernentes ao ser humano como um ser relacional. O caráter relacional do ser humano Tipo: Conteúdo Caráter relacional do ser humano O caráter relacional do ser humano visto sob o enfoque ético e moral foi amplamente discutido em nossa tradição de pensamento ético, político, sociológico, psicológico, filosófico, religioso e outros. Este é o primeiro aspecto que devemos assinalar: a amplitude e abrangência da noção de relação? Como devemos compreendê-la? O fato de podermos falar de relação em um sentido tão amplo nos permite caracterizá-la como: Neste último sentido, a relação designa simplesmente a pressuposição de que duas entidades estão ligadas uma à outra ou não estão isoladas. A partir dessa abstração geral do conceito podemos determiná- lo conforme a natureza das entidades e da ligação. Podemos dizer, por exemplo, que as entidades são, respectivamente, sujeito e objeto e que a relação é de caráter cognoscitivo, quer dizer, tem em vista o conhecimento. A relação pode ser entre seres humanos e vista como ética, moral ou política. A relação pode ser consigo mesmo e ter o caráter de um saber de si ou de uma consciência de si. Pode ser a relação do ser humano com o meio ambiente visando à sua exploração e/ou preservação. Podemos falar também de uma relação entre ser humano e Deus, nesse caso, falamos de uma relação com o transcendente e a relação mesma pode ser caracterizada como pura transcendência. Relação com o transcendente Tipo: Conteúdo Relação com o transcendente É importante perceber que quando discutimos as relações entre entidades devemos, para sairmos do plano abstrato, determinar com maior precisão como compreendemos cada uma das entidades e a natureza da relação. Chamamos isso de delimitação do campo temático ou recorte teórico, cada um é livre para denominá-lo da forma que julgar mais apropriado. Podemos reconhecer nisso as divisões das áreas do conhecimento e comportamento humanos. Aquilo que estrutura a própria organização da Universidade em seus diversos cursos e está refletido nas muitas organizações e instituições de nossa sociedade. O conceito de relação, portanto, parece ser um conceito universal. Se olharmos para aquilo que em um momento é a relação de um médico e um paciente, por exemplo, nos damos conta de que ela é, ao mesmo tempo, também uma relação entre dois seres humanos, os quais são detentores de direitos e obrigações. Os dois, por sua vez, relacionam-se com outros seres humanos em uma comunidade que, ela mesma, relaciona-se com outras comunidades e assim por diante. As relações, portanto, podem ser determinadas com maior ou menor precisão e podem ser mais ou menos abrangentes. Referimo-nos acima à relação com o transcendente e a dimensão da transcendência. Falar de Deus só é possível com base na pressuposição da possibilidade dessa relação. Em geral, essa relação é compreendida como estabelecida com base na fé. Podemos também falar de transcendência e, nesse sentido, estamos falando de algo que não pode ser compreendido apenas como fé. A transcendência, na verdade, é outro nome para relação, pois transcender significa justamente ir além de si mesmo. A frase lapidar de Pascal: “o homem ultrapassa infinitamente o homem”. Muitos filósofos e teólogos tentaram caracterizar essa relação com Deus e em quase todas essas abordagens percebemos um ponto de partida comum: o homem é compreendido como criado por Deus. “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança.” (Gn 1, 36). Para os filósofos que são ateus ou agnósticos, contudo, os pressupostos basilares são outros. Para aqueles que tentaram abordar essa relação, o homem é essencialmente um ente criado [ens creatum], ele é criatura. A partir daí se desdobram muitas possíveisformas de determinação. Pergunta-se, por exemplo: Tornou-se muito influente, como resposta a essas perguntas, a doutrina da participação, que tem suas raízes na filosofia de Platão, mas que foi articulada, de uma maneira a reunir os elementos da doutrina cristã, na concepção de Santo Tomás de Aquino. Na atualidade, essa doutrina foi reabilitada por Cornélio Fabro e ganhou certa notoriedade. Esses são alguns exemplos, outros filósofos tentaram determinar o caráter dessa relação partindo dos atributos de Deus, aquilo que se convencionou chamar de transcendentais [transcendens], quer dizer, as categorias fundamentais de qualquer descrição de Deus. Deus é descrito como bom [bonum], verdadeiro [verum] e uno [unum]. Alguns acrescentam o transcendental belo [pulchum], mas não é livre de controvérsias. Descartes, por exemplo, quando quis estabelecer o fundamento de todo o conhecimento na capacidade da razão, disse que, à medida que o ser humano é criado por Deus, ele participa da inteligência divina e poderia confiar em todo o potencial do próprio intelecto com a certeza de obter conhecimento verdadeiro, pois Deus, sendo bom e perfeito, não criaria um ser imperfeito, quer dizer, não criaria o ser humano sem a capacidade de realmente conhecer as coisas como elas são. Deixando de lado essas discussões que avançam para além de nossos objetivos aqui, talvez seja necessário, fazer uma pergunta adicional. Ela diz respeito à pretensão associada a essa discussão do conceito de relação. Conceito de relação Tipo: Conteúdo Conceito de relação Talvez você não tenha objeções a respeito da importância do conceito de relação e não tenha restrições em considerá-lo como um traço constituinte fundamental da condição humana. A questão, no entanto, é: qual a importância desse conceito para as discussões que virão? Tudo o que será discutido até o final de nossas reflexões pode ser considerado como tentativas de compreender a multiplicidade de desdobramentos possíveis do conceito de relação e, em alguns casos, discuti-las de maneira mais detalhada. Além disso, se pararmos para analisar é o próprio conceito de relação que nos dá a oportunidade de pensar esses temas de modo que alguma ligação seja vista entre eles. Somente se concebermos que as diversas convicções, crenças, conhecimentos, desejos, etc., estão unidos também por relações entre eles é que podemos conceber a ideia de um propósito profissional ou, em um sentido ainda mais amplo, de um propósito de vida. Naturalmente, quanto mais explorarmos cada um deles, mais clara ficará a compreensão de como eles se relacionam. O conceito de relação, portanto, tem um caráter também especulativo, quer dizer, ele nos permite pressupor, antecipadamente, que deve existir alguma ligação entre esses temas, mesmo que esta ligação não esteja completamente clara no momento em que iniciamos a investigação. É oportuno mencionar e indicar a palestra de Jordan Peterson que tem como tema Introdução à ideia de Deus, que explora de uma forma inovadora algumas das principais narrativas bíblicas. Peterson está interessado em descobrir de que maneira essas narrativas revelam traços essenciais dos seres humanos e de suas relações. A indicação diz respeito então não apenas à dimensão estrutural do ser humano, mas explora de que maneira podemos vê-lo em suas múltiplas relações com um enfoque notoriamente psicológico. Assista ao vídeo: Série Bíblica I: Introdução à Ideia de Deus. A elucidação dessas relações pode ser feita de maneira sistemática e teórica, como é o caso das diversas unidades curriculares que tratam de uma maneira ou outra das mais variadas formas de relação. A própria Universidade nos auxilia nisso ao proporcionar uma formação de caráter universal. No entanto, essa não é a única forma possível, pois em nosso existir estamos sempre descobrindo novas relações e novas formas de efetivar as relações que consideramos elementares: consigo mesmo, com os outros, com a natureza e com o transcendente. Na verdade, poderíamos dizer que o propósito de vida consiste em desenvolver essas relações em sua plenitude ou da melhor maneira possível. Se de fato esse pensamento está correto, então podemos pensar que tudo aquilo que se apresenta como algo inibidor ou como um obstáculo, como algo nocivo e desfigurador desse traço relacional intrínseco ao ser humano é também um impeditivo à realização do próprio projeto de vida. Podemos então pensar aqui de maneira inversa, como o algebrista Carl Gustav Jacob Jacobi frequentemente lidava com os problemas matemáticos, e em vez de pensar em como realizar o propósito de vida, passar em pensar naquilo que justamente impede a sua realização. Podemos pensar em evitar aquelas práticas e comportamentos que enfraquecem ou liquidam com as diversas relações que poderiam contribuir para nosso propósito de vida. É difícil de início saber se o mais importante é o que evitar ou o que fazer, mas certamente não faz sentido algum adotar atitudes que prejudicam as relações elementares. Poderíamos elencar muitos exemplos para cada uma das relações elementares, mas vamos apenas ilustrar com algumas referências. Se pensarmos na dimensão pessoal, na relação consigo mesmo, imediatamente perceberemos que qualquer prática que leve a uma deterioração e depreciação do modo como nos vemos afeta de maneira extraordinariamente negativa o projeto de vida. Alguém que acredita que tudo o que faz está errado ou que é culpado por eventos que estão além de seu controle está cultivando uma forma de relacionar-se consigo mesmo que rapidamente se desdobrará em inibições das capacidades criativas, da confiança nas relações interpessoais. Esse indivíduo possivelmente sufocará desejos e sua vontade de empreender e atuar no mundo será vista por ele mesmo como apenas mais uma forma de fracassar. Poderíamos falar muito sobre os desdobramentos negativos dessa forma de relação consigo mesmo, mas o que foi dito é suficiente para termos uma noção da importância de pensarmos de maneira inversa o propósito de vida de tal maneira que possamos evitar essas armadilhas. Uma contribuição importante nesse sentido está no livro da psicóloga e pesquisadora Carol Dweck, intitulado Mindset: a nova psicologia do sucesso. O título obviamente é uma espécie de chamariz e talvez alguns torçam o nariz apenas pelo fato de ver mais um livro falando de sucesso e competição, o mainstream da psicologia norte-americana. No entanto, a autora trata de duas categorias muito elucidativas a respeito da relação consigo mesmo. Ela separa as personalidades em dois tipos de mindset, termo que poderíamos traduzir por estrutura psíquica, ou na versão latina forma mentis. As pessoas podem ter uma estrutura mental fixa ou de crescimento. Quanto à primeira, o aspecto fundamental é que alguns indivíduos que concebem a si mesmos como tendo um conjunto de capacidades inatas, fixas. Para esses, o que não é alcançado com base nesse “talento natural” Biblical Series I: IntroductiBiblical Series I: Introducti…… https://www.youtube.com/watch?v=f-wWBGo6a2w Relação consigo, com os outros, com a natureza e com o transcendente Apresentação. A relação consigo mesmo. A relação consigo mesmo numa perspectiva atual. Finalizando. Atividade. Tópicos(s): é visto como estando para além das capacidades. Para os indivíduos que possuem uma estrutura psíquica de crescimento, as capacidades podem ser desenvolvidas pelo esforço, disciplina, perseverança, etc. Algo que não é alcançado, portanto, muda de estatuto e é classificado como uma coisa que depende para ser realizada ou alcançada de mais dedicação e esforço, precisa de um investimento pessoal, de um sacrifício de tempo, energia e intelecto. Aqui estamos longe da literatura barata de autoajuda e estamos nos aventurando em estruturas que podem ser verificadas exaustivamente no comportamento de indivíduos. Dweck oferece um modo distinto de percebermos esses fenômenos e nos convida, assim, à reflexão sobre a imagem que temos de nós mesmos. Se nos voltarmos para as relações interpessoais, podemosperceber que é tão óbvia a nocividade de, por exemplo, um agir egoísta que imaginamos melhoras significativas em muitos aspectos apenas de interrompermos essa forma de agir. Um agir egoísta compromete a possibilidade de certas relações poderem se perpetuar e aprofundar durante a nossa existência. Basta pensarmos na pouca disposição que alguém terá em nos procurar para um empreendimento se ele de antemão sabe que a pessoa com a qual está lidando está pouco preocupada com o modo como os outros se sentem na ação conjunta, mas está apenas preocupado no benefício próprio. Essas são algumas possibilidades de usarmos o pensamento reverso neste tema das relações vinculado ao propósito de vida. Na discussão que se segue, abordaremos os aspectos positivos de cada uma daquelas relações elementares mencionadas. Apresentação Tipo: Conteúdo Apresentação Vamos abordar agora aquelas relações que chamávamos, anteriormente, de relações elementares: relação consigo mesmo, com os outros, com a natureza e com o transcendente. O que está ao nosso alcance aqui é uma descrição introdutória, um vislumbre de como podemos considerar essas relações e, sobretudo, perceber de que maneira elas são discutidas a partir dos múltiplos enfoques que constituem as diversas unidades curriculares. A relação consigo mesmo Tipo: Conteúdo A relação consigo mesmo A relação consigo mesmo é objeto de estudos de muitas unidades curriculares. Em filosofia, por exemplo, quando se fala da relação consigo mesmo isso pode ser feito tendo em vista o que denominamos como consciência de si. Na história da filosofia, há muita disputa teórica sobre como devemos compreender essa relação e não podemos dizer que existe uma concepção unitária. Uma possível explicação dessa fragmentação teórica pode residir no fato de que o tema sempre aparece relacionado com questões específicas, as quais poderão pertencer a outros domínios de pesquisa. Na filosofia moderna, por exemplo, temos o enfoque epistemológico como um dos mais importantes. Nele se procura definir a consciência de si como a fonte de onde se origina o conhecimento. Quando comparamos esse enfoque epistemológico com os períodos anteriores da filosofia, percebemos que ele não ocupa uma posição tão importante. Isso não quer dizer, contudo, que a questão do conhecimento teria sido negligenciada, senão que fatores referentes ao contexto histórico tornavam outras questões talvez mais importantes. Na antiguidade clássica, entre os gregos, por exemplo, vemos a preocupação de Sócrates em refletir sobre a máxima “Conhece a ti mesmo!”, uma primazia da dimensão ética, isto é, de como o ser humano avalia sua própria vida, comportamento e ações enquanto alguém que vive em uma comunidade. A consciência de si, entendida enquanto relação consigo mesmo, é investigada como consciência de um agir ético virtuoso, quer dizer, um agir cuja avaliação tinha como critério as virtudes. Na Idade Média, a relação consigo mesmo é investigada de maneira um pouco distinta, ela passa a ser considerada em função das diretrizes da visão de mundo cristã, a qual reivindica um olhar mais atento à vida interior, para a dimensão espiritual. Sentimos que a vida pública, tão glorificada entre gregos e romanos, aos poucos perde espaço para preocupações com a vida privada. Além disso, temos nesse período uma supervalorização da dimensão do espírito em relação à dimensão corporal e sensitiva. A mudança é tão grande em relação à antiguidade que boa parte da existência fática do ser humano é reinterpretada segundo a doutrina cristã de maneira a se contrapor ao período anterior. Essa vida espiritual elevada ao primeiro plano da reflexão filosófica e teológica irá espalhar-se por todas as parcelas da sociedade, modificando as formas de organização política, das relações sociais, da dimensão artística e, sobretudo, modificando a forma de compreensão da moral e da ética, as quais passam a ser vistas a partir de uma determinada compreensão da religiosidade e fundamentadas na concepção de um Deus que está na origem de tudo. Nós, enquanto seus filhos, somos, portanto, irmãos. A relação consigo mesmo numa perspectiva atual Tipo: Conteúdo A relação consigo mesmo numa perspectiva atual Na psicologia, por exemplo, a investigação da relação consigo mesmo pode assumir a forma de uma investigação da dimensão afetiva e da estrutura psíquica. Na economia, criou-se um campo de pesquisa inteiramente novo quando se descobriu que o processo de tomada de decisões dos indivíduos não é, como pressupunham as teorias econômicas tradicionais, um processo efetuado por indivíduos absolutamente racionais, que tomam decisões ótimas o tempo inteiro. Descobriu-se que os indivíduos tomam decisões baseados nas emoções na maior parte das vezes e isso levou a novas formas de tratarmos tais temas. As diversas teorias desses campos, portanto, buscam lançar luzes sobre a maneira como compreendemos a nós mesmos e a maneira como nos comportamos e relacionamos uns com os outros e com o ambiente em que vivemos. Em uma palestra curta e profunda, o filósofo Daniel Dennett aborda a questão da consciência de uma maneira muito intrigante, ela pode ser apreciada e, possivelmente, contrastada com aquilo que nós pensamos como sendo a consciência desde uma perspectiva mais natural. Apenas um enfoque, portanto, não pode ser suficiente para responder a certas perguntas. O mais correto parece ser transitar entre os campos em busca de informações que nos permitam aos poucos encaixar as peças desses quebra-cabeças. Tais informações, por vezes, contradizem-se, em outras, complementam- se. No mundo acadêmico, esse procedimento ganha o nome de interdisciplinaridade. Assim, quando falamos da relação que o ser humano tem consigo mesmo, devemos considerar não apenas essa “vida interior”, a “subjetividade”, os “sentimentos”. Não podemos delimitar o campo de investigação àquilo que acontece “dentro” de mim, pois o papel que desempenha tudo aquilo que não pode ser identificado como essa esfera interior também é decisivo. A partir de uma situação concreta de minha existência, por exemplo, posso compreender a mim mesmo como feliz ou infeliz, mas isso também é resultado do modo como compreendo a sociedade na qual vivo. Essa compreensão influenciará meus estados de ânimo, ela me dirá se sou reconhecido e respeitado pelos outros. Também irá se refletir na maneira como eu compreendo como vai minha vida, se estou bem, se estou feliz, etc. Se acredito nos ensinamentos de minha religião e não os coloco em prática, poderei vir a julgar meu comportamento de maneira negativa. Apesar de, em última instância, tratar-se da relação consigo mesmo, não podemos circunscrever os fatores e elementos que servem de parâmetro para essa compreensão como pertencentes apenas à interioridade. É certo que a felicidade tem a ver com o modo como me sinto, mas essa compreensão e os elementos aí envolvidos não são apenas relativos à vida interior, mas vão além dela e em direção à sociedade. Finalizando Tipo: Conteúdo The illusion of consciousnThe illusion of consciousn…… https://www.youtube.com/watch?v=fjbWr3ODbAo Finalizando Na próxima Unidade, intitulada Valores, discutiremos de maneira mais incisiva esse tema. O que podemos perceber diante dessas considerações é que muitas outras unidades curriculares contribuem para a investigação de uma mesma questão. Há, portanto, muita complexidade nessas relações teóricas. Por isso, talvez, seja tão difícil elaborar uma concepção abrangente que dê conta de tantas questões e tantas matrizes teóricas. Quando avançamos da relação consigo mesmo para a relação com os outros seres humanos ampliamos, por assim dizer, nosso campo temático. Ele já podia ser antevisto no fato de que nosso entendimento de como vai a vida depende das minhas relações. Aqui parece ser muito mais evidente a necessidade do recurso a outras unidades curriculares. Naturalmente, nosso itinerário reflexivo é elaborado tendo em vista certas escolhas de caráter teórico e delimitação do quanto iremos avançar em cadatema. No entanto, parece ser impossível, se quisermos ver adequadamente o tema da relação com os outros, ignorar a multiplicidade de unidades curriculares que se dedicam a ele além da filosofia. Não só a psicologia, mas a sociologia, a teoria política, a pedagogia, e outras tantas áreas do conhecimento enfocam o fenômeno segundo aquele aspecto que a elas interessa. Pensemos nas relações entre indivíduos de uma mesma comunidade. Há relações familiares, relações profissionais, relações que ocorrem por pontos de intersecção no conjunto de crenças, valores, preferências, desejos. Cada um desses pontos poderá ser tema de uma ou várias unidades curriculares no caso de as relações comunitárias tornarem-se objeto de estudo. A psicologia social, por exemplo, utilizará recursos teóricos que já são resultados da multidisciplinaridade. Pode ser que o enfoque esteja nas relações afetivas que se dão apenas no ambiente de trabalho. Pode ser que o interesse esteja nas relações afetivas entre membros de uma etnia. Se pensarmos, agora, o que poderia ser dito para além disso, basta introduzirmos o meio ambiente como o centro de gravidade das relações. Não precisamos, a título de ilustração, sair da psicologia social, para tanto podemos abordar o tema do impacto na vida dos indivíduos que são refugiados ou podemos pensar no êxodo rural. Quando o meio ambiente está no centro, existem muitas outras ciências que podemos trazer para a discussão. A teoria política, por exemplo, quer abordar o tema “imigração” de uma perspectiva das relações internacionais. Podemos também sair de nosso planeta e ter como centro do debate o conhecimento do universo pela física. Veja que mesmo aqui se trata de um tipo de relação cognoscitiva do ser humano com o universo, embora não precise ser exclusivamente a física. A mística também aborda a questão da posição do homem na totalidade, e isso não se dá por intermédio de um aparato conceitual equivalente ao da física. Por fim, podemos falar de uma relação com o transcendente. Na tradição da metafísica cristã, Deus foi compreendido, muitas vezes, como o transcendente, o inefável, o incompreensível. Também aqui a complexidade da temática é enorme e com algumas dificuldades adicionais em relação a muitas das ciências acima mencionadas. A tradição da metafísica cristã e da teologia que se ocupam desse tema apresenta um trabalho que supera qualquer esforço pessoal de uma vida. Não é possível dar conta dessa tradição na totalidade. Isso, naturalmente, não é um impeditivo, mas revela, por outro lado, a importância da temática e os esforços dispendidos em relação a ela. A questão de Deus, se podemos assim formular, possui diversas facetas e foi tratada com estratégias diferentes. Não vamos entrar nessa longa tradição, vamos apenas fazer uma breve menção a ela. Filósofos e teólogos se ocuparam, por vez, com a questão da prova da existência de Deus. Em geral, tentativas de comprovação partiam de um estado de coisas ou da realidade fática para, a partir daí, chegar-se à concepção de Deus criador como presente em todas as coisas. Outros trataram da questão tentando abordar a temática pelo viés epistemológico. Este se divide, em geral, na teologia negativa, isto é, aqueles que defendem que não é possível alcançar um conhecimento de Deus, mas de que é possível saber o que ele não é; outros, defenderam que é possível um conhecimento positivo de Deus. Essa é apenas uma pequena parte de uma problemática. Nem entramos em questões que dizem respeito à distinção entre natural e sobrenatural, questões relativas à fé, questões sobre as verdades reveladas, sobre a história salvífica, etc. Essa grande tradição pretende tematizar, de várias formas e a partir de diversos pontos essa relação do homem com Deus enquanto o transcendente por excelência. Talvez no contexto do Programa Propósito de Vida a questão principal não seja de caráter exclusivamente teórico, no que diz respeito a essa temática, mas sim a respeito do lugar que nossas crenças e convicções de caráter religioso ocupam no interior do propósito de vida e como o moldam. Em todas essas relações, no entanto, podemos perceber o elemento ético ou moral de um modo ou de outro como presente. Talvez em algumas delas com maior intensidade e em outras nem tanto. Vamos nos dedicar de maneira mais detida a ele na Unidade 2. Atividade Tipo: Conteúdo Atividade Nossa proposta de atividade privilegiará a expressão escrita. Para isso, gostaríamos que você tomasse como orientação aquelas cinco dimensões referidas na introdução e as respectivas perguntas. Vamos colocá-las aqui para você relembrá-las. De imediato é possível perceber que nem todas as dimensões foram abordadas. Assim, você poderá restringir a escrita apenas àqueles temas que foram abordados e que de um modo ou de outro remetem a uma ou outra dimensão e suas respectivas perguntas. O objetivo é tentar desenvolver, no mínimo, uma página escrita que envolva, no mínimo, uma questão sobre as discussões desenvolvidas durante esta unidade e as suas impressões sobre o tema. É importante que a tarefa não se resuma a reproduzir o que foi dito no texto, mas que consista na expressão de seu processo reflexivo sobre o que foi dito. Em todas as unidades a tarefa será a mesma, mas você perceberá que a intenção é ir aos poucos incorporando na sua escrita os assuntos discutidos. Eles serão estágios preliminares da tarefa que será desenvolvida na conclusão. Dimensões constituintes de uma matriz orientadora do PPV Unidade 2 - Valores Pontuação requerida: 0 Tema(s): Fundamentos da ética Ética e Moral - Origem. Ética e Moral - Ponto de vista teórico. Ética e Moral - Perspectiva atual. Finalizando. Tópicos(s): Ética e Moral - Origem Tipo: Conteúdo Ética e Moral - Origem Na unidade anterior, usamos sempre em conjunto e de maneira indistinta as expressões “ética” e “moral”. Isso se justifica pelo fato de essas expressões serem empregadas dessa forma na comunicação cotidiana. Consideradas historicamente, no entanto, podemos perceber uma diferença quanto àquilo que referiam em suas origens. A partir disso, podemos perceber o enraizamento em nossa compreensão atual de que ética e moral têm a ver tanto com o caráter do indivíduo quanto aos costumes da sociedade em que ele vive. Devemos ter em mente, contudo, que a história da origem das expressões, apesar de ser importante, em muitos casos não é decisiva para o modo como as utilizamos atualmente. A vasta bibliografia sobre ética e moral revela, mesmo em uma análise superficial, que elas são usadas de maneiras distintas, sem obedecer a seus significados originais. O fato de que mesmo hoje temos uma compreensão dessas expressões na qual ainda ecoam os significados originais permite afirmar que já nos movemos em algum conhecimento das questões que elas designam. Não é, portanto, equivocado dizer que todos nós temos uma compreensão do que seja a ética e do que seja a moral. Podemos percebê-lo pelo fato de que diante acontecimentos que envolvem aspectos éticos e morais tomamos posição, julgamos e fazemos afirmações do tipo: “Isto é imoral”, “O que ele fez não é ético”, “Esta pessoa sempre foi moralmente correta em seu agir”, “Isto é certo”, “aquilo é errado”, etc. Podemos, a partir dessa constatação, afirmar que temos desde sempre os critérios para distinguir o que é certo do que é errado em termos éticos e morais? De onde vêm tais critérios? Parte da resposta a essa pergunta é que eles nos são ensinados desde pequenos, mas essa resposta com certeza não pode nos satisfazer totalmente. Queremos saber o que faz com que eles estejam presentes na sociedade e por que consideramos algumas coisas como corretas e outras não. Precisamos sair do automatismo da tradição, quer dizer, precisamos dar um passo atrás e pensar nas razões que nos levam a aceitar algumas coisas como corretas e outras não. A necessidade desse movimento se torna evidente quando pensamos nas mudanças de valores que percebemos de uma época à outra e, também, pelo fato de que queremos nós mesmos agirde maneira refletida, autodeterminada, e não apenas como os outros dizem que deveríamos agir. Ética e Moral - Ponto de vista teórico Tipo: Conteúdo Ética e Moral - Ponto de vista teórico Nossa competência no emprego linguístico dessas expressões é um sinal da existência de um saber e de critérios nele fundamentados, mas não significa que temos deles uma compreensão completa. Do ponto de vista teórico, no entanto, quando queremos compreender um assunto como a ética, não precisamos nos restringir ao registro do modo como empregamos as palavras em nossa linguagem comum. Conhecer o modo de uso das expressões é um bom ponto de partida, mas uma teoria precisa mais cedo ou mais tarde introduzir distinções, fazer questionamentos, apresentar definições que irão se chocar de um modo ou de outro com o uso desses termos na linguagem comum. Para ilustrar esse ponto, vejamos um exemplo de como a investigação poderia proceder da dimensão de nossa compreensão e linguagem naturais para a dimensão teórico-filosófica. O ponto de partida pode ser justamente uma situação em que avaliamos algo como imoral ou como não sendo ético. Vamos imaginar uma situação em que um professor humilha um de seus estudantes diante da classe. O que poderíamos analisar sobre o que ocorreu do ponto de vista ético e moral? Vamos começar com a perspectiva dos estudantes. O que poderiam eles ter sentido ao presenciarem a agressão? Talvez tivessem ficado indignados com a agressão do professor. Por que eles sentiriam isso? Deixemos a questão em aberto e passemos à perspectiva daquele que foi agredido: o que poderia ter sentido a vítima da humilhação? O estudante humilhado provavelmente sentiria indignação, mas não apenas isso. Ele talvez ficasse também ressentido, com raiva, triste. E o professor, o que poderia ter sentido depois da agressão? Deixando de lado aquilo que motivou a agressão, poderíamos talvez até mesmo dizer que o professor, não no momento da agressão, mas em algum momento subsequente, tivesse se sentido culpado por aquilo que fez, percebendo, no fim das contas, o seu equívoco. Se pudéssemos perguntar a um dos estudantes que ficou indignado por que ele se sentiu assim, talvez ele responderia “Meus pais ensinaram-me que isto é errado.” Esta resposta é uma das mais recorrentes e revela aquele apelo à tradição, revela de que maneira já nos movemos em um “saber” sobre o que é certo e o que é errado. Com essa explicação, porém, não temos qualquer tipo de elucidação do critério ou da razão que nos leva a julgar isso como errado. Eu apenas sei que me ensinaram a considerar isto como errado e estou de acordo com este ensinamento. Este estar de acordo não é algo superficial, pois ele é acompanhado de um sentimento. Se perguntássemos para outro estudante, talvez ele dissesse algo do tipo: “Não devemos humilhar a outras pessoas, assim como não queremos ser humilhados.” Aqui damos um passo a mais, existe um critério para julgar. Aquilo que não é bom para mim, pode também ser entendido como não sendo bom para os outros. Minha empatia permite fazer tais inferências e temos aqui uma base também para a importância do que significa o respeito com relação aos outros e as motivações para querer ser respeitado. Essas respostas revelam uma estrutura importante das relações entre os seres humanos: temos expectativas com relação aos comportamentos uns dos outros. Nesse caso, a expectativa de não ser humilhado pelo fato de também não humilhar aos outros. Essa perspectiva acentua o lado pessoal, individualista, mas poderíamos dizer também que a pessoa não quer provocar uma ruptura nas relações ou não gostaria de causar nenhum tipo de sentimento negativo na outra. Ela tem uma atitude de respeito com os outros. Aqui aparece o lado altruísta. Exigimos uns dos outros, portanto, que se comportem deste ou daquele modo, por exemplo, sendo respeitosos nas relações, não humilhando ninguém, etc. Quando alguém humilha a outra pessoa, percebemos que ela rompe com aquelas exigências que fazemos uns aos outros , que são os deveres ou obrigações. Nossos costumes revelam também como esses deveres ganham a forma de comportamentos admitidos ou reprovados socialmente. Na situação imaginada, os sentimentos de indignação, raiva, culpa e arrependimento, que apareceram entre os envolvidos, estão conectados com isso. O que, no entanto, explica que os estudantes espectadores e o estudante vítima do ato tenham tais sentimentos? Por que o professor poderia ter se sentido, posteriormente, culpado e arrependido? A explicação mais natural é a de que vivemos em uma sociedade na qual esses comportamentos são considerados errados. Esses são os nossos costumes e eles revelam algumas das expectativas que temos uns com relação aos outros em termos de agir, comportar-se e falar. Contudo, há um problema aqui que você já deve ter percebido. Os costumes mudam de uma época para a outra. O que é correto, tolerável ou admissível do ponto de vista moral e ético em uma época pode não sê-lo em outra. É por isso que temos que perguntar pelo que significa considerar que um comportamento é correto do ponto de vista ético e moral. Fica fácil perceber que quanto mais analisamos aquela situação imaginada, mais aspectos e elementos vão surgindo e revelando, assim, a alta complexidade do fenômeno ético e moral. Ética e Moral - Perspectiva atual Tipo: Conteúdo Ética e Moral - Perspectiva atual As diversas religiões espalhadas pelo mundo sempre ofereceram orientações sobre o modo de agir, instituindo, de certo modo, parâmetros para o que deveria ser considerado certo ou errado nas relações entre os seres humanos. Na perspectiva atual, no entanto, quando perguntamos pela fundamentação da ética a partir da dimensão religiosa, enfrentamos alguns problemas que são incontornáveis. Isso não significa que aquilo que dizem as religiões a respeito do modo como devemos agir não tenha utilidade. Não é essa a questão. Os ensinamentos religiosos já são partes de nossa tradição e residem de uma forma ou outra em toda a estrutura social. É por isso que nos referimos ao modo como a tradição nos determina de maneira que podemos operar quase que automaticamente a partir dela. Nossa tradição está repleta de teorias, convicções e crenças de origens diversas. Não se trata, portanto, quando falamos do problema da fundamentação da ética a partir das religiões, em afirmar que elas não podem fornecer tal fundamentação. Na verdade, as religiões têm justamente a característica de oferecer uma fundamentação muito clara para questões éticas e morais. Vamos explicar, no que se segue, como o problema se apresenta e talvez possamos deixar claro que, na questão da fundamentação da ética, o ponto central não é se somos ou não adeptos de uma religião. Na obra Lições de ética Ernst Tugendhat aponta para algo importante a ser considerado a respeito disso. Ele diz que quem julga estar agindo corretamente do ponto de vista ético, quando age com base em suas crenças religiosas, é alguém que, antes de tudo, acredita e tem fé naquilo que a sua religião aconselha. Mesmo para quem acredita, no entanto, surge o seguinte problema: “também o crente não pode mais fundamentar suas normas morais em sua crença religiosa, pelo menos se ele leva a sério o não crente e aquele que possui uma crença diferente da sua.” (p. 13). Se, portanto, a moralidade não é uma questão de escolha pessoal, mas algo que podemos exigir de todos os seres humanos, então ela deve estar fundamentada tanto para religiosos quanto para não religiosos, isto é, deveria valer desde uma perspectiva que não é particular. Mas a questão é se de fato podemos alcançar uma tal justificação universal ou se isso é apenas um ideal ou uma especulação teórica. Esse problema não é novo, aqueles filósofos que chamamos de contratualistas, Locke, Kant, Rousseau e Hobbes, apesar de estarem preocupados com a fundamentação do poder em outra base que não a religiosa, depararam-se também com o problema de fundamentar a moral de outra forma. Há ainda um ingrediente adicional em nossa problemática,
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