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AULA 5 - DO MODELO MANICOMIAL À REFORMA PSIQUIÁTRICA

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Atuação da Psicologia 
no âmbito da Saúde 
Mental
Profa. Mestra Ana Carolina Peck
Psicanalista – CPPA/Psicóloga CRP: 10/04906
Especialista em Psicologia da Saúde e 
Hospitalar - IEPS
Mestra em Psicologia - UFPA
A CULTURA 
MANICOMIAL: O 
ASILAMENTO E 
CONTROLE DOS 
CORPOS NO 
MODELO ASILAR
Sendo as instituições uma divisão
explícita de detenção de poder,
entre aqueles que dominam e os
dominados, Franco Basaglia
(1985) denuncia a violência e a
exclusão como características
mantenedoras dessa base de
opressão que permeia a
sociedade.
Quando se trata de hospitais
psiquiátricos ou manicômios, o ato
dito terapêutico destas
instituições visa atenuar as
reações do excluído sobre o
excludente, submetendo-o à
institucionalização, que vai
tornando-o cada vez mais distante
do laço social
Assim, vai se constituindo a carreira
de um sujeito cronificado, como um
objeto destituído de valor, enquanto
a figura do médico vai angariando
poder, premissa que serviu de
sustentáculo para a classificação da
loucura como doença mental.
Nessas condições, o sujeito
classificado como doente mental
carece de poder contratual, tanto
pelo teor de enquadramento do
diagnóstico, quanto por ter sido,
primariamente, posto à margem do
sistema capitalista, estando isento
de condições econômicas que
poderiam ser capazes de lhe
sustentar alguma nomeação e
importância no meio social.
A reinserção social é dificultada pelo
percurso histórico da carreira
cronificada desses sujeitos, pois
foram internados em manicômios
que corroboraram com sua
discriminação social e econômica,
por já terem sido relegados na
sociedade e depositados como
indigentes nas celas dos hospitais
psiquiátricos.
Isto é, o encarceramento dos loucos,
pobres, negros, mulheres,
homossexuais, presos políticos e todo
o conjunto de sujeitos que
perturbavam a lógica social
predominante funcionou com o intento
primeiro de proteger a sociedade das
contradições que seu próprio sistema
econômico criou e, não sendo capaz
de superá-las, passou a apelar à
cultura manicomial como forma de
afastar de seu seio os sujeitos que
denunciavam uma longa trajetória de
exclusão e violência.
.
Para tanto, propôs o tratamento moral
como forma de correção dos hábitos e
reeducação afetiva desses sujeitos,
caracterizando um tratamento normativo,
no intento de valorizar a conduta regular
e considerada normal.
Para caracterizar a lógica manicomial, é
importante trazer à tona a denúncia de
quem sofreu seus danos. Maura Lopes
Cançado denunciou em seu diário
Hospício é Deus, escrito a partir de sua
experiência nos hospitais psiquiátricos do
Rio de Janeiro e Minas Gerais:
“Se me tornar escritora, até mesmo
jornalista, contarei honestamente o que é
um hospital de alienados. Propagam uma
série de mentiras sobre estes hospitais:
que o tratamento é bom, tudo se tem
feito para minorar o sofrimento dos
doentes. E eu digo: É MENTIRA!”
Sobre as práticas divulgadas como terapêuticas,
ela ainda relata sua arbitrariedade e utilidade
enquanto castigo diante de qualquer desvio na
norma de conduta imposta por aqueles que
detinham o poder dentro do hospital:
“O senhor é arbitrário e irresponsável. Deu-me
um eletrochoque quando fui sua paciente, sei
que há contraindicação no meu caso. Possuo
dois eletroencefalogramas anormais, fui vítima
de crises convulsivas até quinze anos. Um dos
eletros está dentro da minha papeleta, ou ficha.
Como meu médico, o senhor devia ter-se
inteirado antes, e o respeitado. Fez o
eletrochoque por vingança e para castigar-me.
Este método é muito usado pelos psiquiatras,
sei. Eletrochoque devia ser tratamento, e não
instrumento de vingança em mãos
irresponsáveis. Mas, aqui, até as guardas
ameaçam doentes com eletrochoques, trazendo-
as em constante estado de tensão nervosa.”
Podemos observar, então, o uso de métodos
agressivos para tentar devolver à norma
estabelecida aquele que perturbava o ambiente.
Segundo Foucault (2004), a função do hospital
ficou centrada na descoberta da verdade sobre
a doença mental, para tentar restabelecer um
padrão ortodoxo dos comportamentos que, na
loucura, passaram a ser incompreensíveis sob
essa ótica normatizante.
A dedicação passou a ser à produção de
classificações diagnósticas e de um acirramento
das tensões de poder entre o médico e o sujeito,
que ficava submetido às ordens daquele.
Todas as técnicas ou procedimentos
efetuados no asilo do século XIX –
isolamento, interrogatório particular ou
público, tratamentos – punições como a
ducha, pregações morais, encorajamentos
ou repreensões, disciplina rigorosa,
trabalho obrigatório, etc.,tudo isto tinha
por função fazer do personagem do
médico o ‘mestre da loucura’; aquele que
a faz se manifestar em sua verdade
quando ela se esconde, aquele que a
domina, a acalma e a absorve depois de
ter sabiamente desencadeado.
Dentro desta instituição, portanto, toda
ordem de tratamento funcionava como
uma espécie de mecanismo iatrogênico
(refere-se a qualquer alteração
patológica provocada no paciente pela
má prática médica), adoecendo aqueles
que foram internados por
estigmatização social, ou agravando os
quadros de quem já estava em um
processo de sofrimento psíquico. Assim,
as doenças tratadas pelo médico eram
também produzidas pelo próprio
ambiente hospitalar e manicomial.
Em 2013, a jornalista Daniela Arbex publicou o
livro Holocausto Brasileiro, fruto de sua pesquisa
sobre o Colônia de Barbacena, em Minas Gerais.
Esta autora comenta o momento em que Franco
Basaglia visitou este manicômio em 1979, o qual
divulgou na imprensa a afirmação de que esteve
em um campo de concentração nazista travestido
de hospital e que em nenhum outro local do
mundo havia presenciado uma tragédia daquele
porte.
Nesse mesmo hospital Maria de Jesus foi
internada porque se sentia triste, Antônio da Silva
porque era epiléptico, e Antônio Gomes ficou 21
anos dos 34 que passou no Colônia sem falar
porque ninguém lembrou de perguntar se ele
falava.
Pelo menos 60 mil pessoas morreram vítimas
das práticas normatizantes que hoje são
reconhecidas como de tortura: os
eletrochoques chegavam a ser tão intensos
que costumeiramente sua sobrecarga
derrubava a rede de energia do município; os
corpos que vinham a óbito eram
transformados em ácido na frente dos demais
internos, enquanto as ossadas eram
comercializadas; as camas foram substituídas
por capim, pois com capacidade para abrigar
200 pessoas, 5 mil se encontravam ali no
mesmo período de tempo (ARBEX, 2013).
Longe de querer comparar os genocídios,
interrogamos: por que conhecemos a tragédia
dos campos de concentração alemães, mas a
maioria dos brasileiros jamais ouviu falar dos
horrores de Barbacena?
Em um contexto em que os direitos desses
sujeitos foram usurpados em nome de uma
indústria de morte, fica um apontamento: a
finalidade de um campo de concentração é
matar, é extinguir, e devemos lembrar, com
muita desconfiança, que o hospital se dizia
agir com medidas terapêuticas.
Pode ser caracterizado como um serviço de
saúde um lugar como esse? O que faz com
que os alemães tentem reparar a história de
morte inscrita nos campos de concentração,
e nós, brasileiros, sequer conheçamos o que
aconteceu nos hospitais psiquiátricos? O
que fez com que o Brasil reproduzisse os
horrores dos campos de concentração
nazistas da Segunda Guerra Mundial em
menos de duas décadas de seu fim?
Assim, as consequências desse processo
atravessam os processos de subjetivação
do louco que, confinado no manicômio,
pode passar a se identificar à lógica
desta instituição: Coagido a um espaço
onde mortificações, humilhações e
arbitrariedades são a regra, o homem,
seja qual for o seu estado mental, se
objetiviza gradualmente nas leis do
internamento, identificando-se com elas.
Assim, de acordo com Basaglia (1985),
sua couraça de apatia, desinteresse e
insensibilidade não seria mais do que o
seu último ato de defesa contra um
mundo que primeiro o exclui e depois o
aniquila: é o último recurso pessoal que
o doente, assim como o internado,opõe,
para proteger-se da experiência
insuportável de viver conscientemente
como excluído.
Além disso, vítimas dessa cultura
manicomial, os sujeitos que passaram
pelo processo de institucionalização
encontram grandes dificuldades de
reinserção social: não encontram
emprego, são rejeitados pela família,
pelos vizinhos e pela população da
cidade, não são atendidos nos demais
serviços de saúde e sofrem contínuas
tentativas de reinternação por aqueles
que têm como assertiva a ideia de que o
lugar do louco é no hospício.
Nesse sentido, qualquer reforma das leis
psiquiátricas que não leve em
consideração a superação das
contradições sociais e a ruptura com a
lógica manicomial no cerne da sociedade
está fadada a reproduzir o hospital
psiquiátrico como local de tratamento
para os variados sofrimentos psíquicos.
Por este motivo, o trabalho da equipe de
saúde mental com os usuários e com os
familiares é importante para fortalecer
os vínculos e laços sociais, bem como
para suscitar a participação política a fim
de construir um engajamento na luta por
essas mudanças estruturais que
interferem na manutenção da lógica
manicomial, rompendo com a exclusão e
violência causadas pela própria
sociedade e alimentada pela instituição
manicomial.
Portanto, se a instituição do manicômio
revelou o caráter profundamente
antiterapêutico de suas estruturas,
qualquer transformação que não se
acompanhe de um trabalho interno que a
coloque em discussão a partir da base
torna-se inteiramente superficial e de
fachada.
Na conjuntura de nossos tempos, a lógica
manicomial ainda sobrevive e corremos o
risco de reproduzi-la nos novos
mecanismos de assistência à saúde
mental, se não formos capazes de exercer
uma contínua crítica da prática
profissional e de atuar no núcleo da
estigmatização da loucura: a sociedade.
O processo de desinstitucionalização,
portanto, ultrapassa a desospitalização.
Sendo assim, o objetivo não é mais a cura,
uma vez que a doença deve ser destituída
da centralidade do tratamento, sendo
colocada em seu lugar a emancipação do
sujeito, visando a produção de vida no
bojo da sociedade
A REFORMA 
PSIQUIÁTRICA NO 
BRASIL 
O início do processo de Reforma
Psiquiátrica no Brasil é contemporâneo
da eclosão do “movimento sanitário”,
nos anos 70, em favor da mudança dos
modelos de atenção e gestão nas
práticas de saúde, defesa da saúde
coletiva, equidade na oferta dos serviços,
e protagonismo dos trabalhadores e
usuários dos serviços de saúde nos
processos de gestão e produção de
tecnologias de cuidado.
Embora contemporâneo da Reforma
Sanitária, o processo de Reforma
Psiquiátrica brasileira tem uma história
própria, inscrita num contexto
internacional de mudanças pela
superação da violência asilar.
Fundado, ao final dos anos 70, na crise
do modelo de assistência centrado no
hospital psiquiátrico, por um lado, e na
eclosão, por outro, dos esforços dos
movimentos sociais pelos direitos dos
pacientes psiquiátricos.
A Reforma Psiquiátrica é processo
político e social complexo, composto de
atores, instituições e forças de diferentes
origens, e que incide em territórios
diversos, nos governos federal, estadual
e municipal, nas universidades, no
mercado dos serviços de saúde, nos
conselhos profissionais, nas associações
de pessoas com transtornos mentais e
de seus familiares, nos movimentos
sociais, e nos territórios do imaginário
social e da opinião pública.
Compreendida como um
conjunto de transformações de
práticas, saberes, valores
culturais e sociais, é no
cotidiano da vida das
instituições, dos serviços e das
relações interpessoais que o
processo da Reforma
Psiquiátrica avança, marcado
por impasses, tensões, conflitos
e desafios.
Histórico da 
Reforma: crítica 
do modelo 
hospitalocêntrico 
(1978-1991) 
O ano de 1978 costuma ser identificado
como o de início efetivo do movimento
social pelos direitos dos pacientes
psiquiátricos em nosso país. O Movimento
dos Trabalhadores em Saúde Mental
(MTSM), movimento plural formado por
trabalhadores integrantes do movimento
sanitário, associações de familiares,
sindicalistas, membros de associações de
profissionais e pessoas com longo histórico
de internações psiquiátricas, surge neste
ano.
É sobretudo este Movimento, através de
variados campos de luta, que passa a
protagonizar e a construir a partir deste
período a denúncia da violência dos
manicômios, da mercantilização da
loucura, da hegemonia de uma rede
privada de assistência e a construir
coletivamente uma crítica ao chamado
saber psiquiátrico e ao modelo
hospitalocêntrico na assistência às
pessoas com transtornos mentais.
A experiência italiana de
desinstitucionalização em psiquiatria e sua
crítica radical ao manicômio é inspiradora,
e revela a possibilidade de ruptura com os
antigos paradigmas, como, por exemplo,
na Colônia Juliano Moreira, enorme asilo
com mais de 2.000 internos no início dos
anos 80, no Rio de Janeiro.
Passam a surgir as primeiras propostas e
ações para a reorientação da assistência. O
II Congresso Nacional do MTSM (Bauru,
SP), em 1987, adota o lema “Por uma
sociedade sem manicômios”. Neste mesmo
ano, é realizada a I Conferência Nacional
de Saúde Mental (Rio de Janeiro).
Neste período, são de especial importância o
surgimento do primeiro CAPS no Brasil, em São
Paulo, no ano de 1987, e o início de um
processo de intervenção, em 1989, da
Secretaria Municipal de Saúde de Santos (SP)
em um hospital psiquiátrico, a Casa de Saúde
Anchieta, local de maus-tratos e mortes de
pacientes. É esta intervenção, com repercussão
nacional, que demonstrou de forma inequívoca
a possibilidade de construção de uma rede de
cuidados efetivamente substitutiva ao hospital
psiquiátrico.
Neste período, são implantados no município de
Santos Núcleos de Atenção Psicossocial (NAPS)
que funcionam 24 horas, são criadas
cooperativas, residências para os egressos do
hospital e associações.
A experiência do município de Santos passa a
ser um marco no processo de Reforma
Psiquiátrica brasileira. Trata-se da primeira
demonstração, com grande repercussão, de
que a Reforma Psiquiátrica, não sendo apenas
uma retórica, era possível e exequível.
Também no ano de 1989, dá entrada no
Congresso Nacional o Projeto de Lei do
deputado Paulo Delgado, que propõe a
regulamentação dos direitos da pessoa com
transtornos mentais e a extinção progressiva
dos manicômios no país. É o início das lutas do
movimento da Reforma Psiquiátrica nos campos
legislativo e normativo.
Com a Constituição de 1988, é criado o SUS –
Sistema Único de Saúde, formado pela
articulação entre as gestões federal, estadual e
municipal, sob o poder de controle social,
exercido através dos “Conselhos Comunitários
de Saúde”.
Histórico da 
Reforma: começa 
a implantação da 
rede extra-
hospitalar (1992-
2000) 
A partir do ano de 1992, os movimentos
sociais, inspirados pelo Projeto de Lei Paulo
Delgado, conseguem aprovar em vários estados
brasileiros as primeiras leis que determinam a
substituição progressiva dos leitos psiquiátricos
por uma rede integrada de atenção à saúde
mental.
É a partir deste período que a política do
Ministério da Saúde para a saúde mental,
acompanhando as diretrizes em construção da
Reforma Psiquiátrica, começa a ganhar
contornos mais definidos.
É na década de 90, marcada pelo compromisso
firmado pelo Brasil na assinatura da Declaração
de Caracas e pela realização da II Conferência
Nacional de Saúde Mental, que passam a entrar
em vigor no país as primeiras normas federais
regulamentando a implantação de serviços de
atenção diária, fundadas nas experiências dos
primeiros CAPS, NAPS e Hospitais-dia, e as
primeiras normas para fiscalização e
classificação dos hospitais psiquiátricos
Neste período, o processo de expansão dos
CAPS e NAPS é descontínuo. As novas
normatizações do Ministério da Saúde de 1992,
embora regulamentassem os novos serviços de
atenção diária, não instituíam uma linha
específica de financiamento para os CAPS e
NAPS. Do mesmo modo, as normas para
fiscalização e classificação dos hospitais
psiquiátricosnão previam mecanismos
sistemáticos para a redução de leitos.
Ao final deste período, o país tem em
funcionamento 208 CAPS, mas cerca de 93%
dos recursos do Ministério da Saúde para a
Saúde Mental ainda são destinados aos
hospitais psiquiátricos.
A Reforma 
Psiquiátrica 
depois da lei 
nacional (2001 -
2005) 
É somente no ano de 2001, após 12 anos de
tramitação no Congresso Nacional, que a Lei
Paulo Delgado é sancionada no país. A
aprovação, no entanto, é de um substitutivo do
Projeto de Lei original, que traz modificações
importantes no texto normativo.
Assim, a Lei Federal 10.216 redireciona a
assistência em saúde mental, privilegiando o
oferecimento de tratamento em serviços de base
comunitária, dispõe sobre a proteção e os
direitos das pessoas com transtornos mentais,
mas não institui mecanismos claros para a
progressiva extinção dos manicômios. Ainda
assim, a promulgação da lei 10.216 impõe novo
impulso e novo ritmo para o processo de
Reforma Psiquiátrica no Brasil.
É no contexto da promulgação da lei 10.216 e da
realização da III Conferência Nacional de Saúde
Mental, que a política de saúde mental do
governo federal, alinhada com as diretrizes da
Reforma Psiquiátrica, passa a consolidar-se,
ganhando maior sustentação e visibilidade.
Linhas específicas de financiamento são criadas
pelo Ministério da Saúde para os serviços
abertos e substitutivos ao hospital psiquiátrico e
novos mecanismos são criados para a
fiscalização, gestão e redução programada de
leitos psiquiátricos no país.
A partir deste ponto, a rede de atenção diária à
saúde mental experimenta uma importante
expansão, passando a alcançar regiões de
grande tradição hospitalar, onde a assistência
comunitária em saúde mental era praticamente
inexistente.
Neste mesmo período, o processo de
desinstitucionalização de pessoas longamente
internadas é impulsionado, com a criação do
Programa “De Volta para Casa”. Uma política de
recursos humanos para a Reforma Psiquiátrica é
construída, e é traçada a política para a questão
do álcool e de outras drogas, incorporando a
estratégia de redução de danos.
Realiza-se, em 2004, o primeiro Congresso
Brasileiro de Centros de Atenção Psicossocial,
em São Paulo, reunindo dois mil trabalhadores e
usuários de CAPS. Este processo caracteriza-se
por ações dos governos federal, estadual,
municipal e dos movimentos sociais, para
efetivar a construção da transição de um modelo
de assistência centrado no hospital psiquiátrico,
para um modelo de atenção comunitário.
O período atual caracteriza-se assim por dois
movimentos simultâneos: a construção de uma
rede de atenção à saúde mental substitutiva ao
modelo centrado na internação hospitalar, por
um lado, e a fiscalização e redução progressiva e
programada dos leitos psiquiátricos existentes,
por outro. É neste período que a Reforma
Psiquiátrica se consolida como política oficial do
governo federal.
A III 
Conferência 
Nacional de 
Saúde Mental e 
a participação de 
usuários e 
familiares 
Merece destaque a realização, ao final do ano
de 2001, em Brasília, da III Conferência
Nacional de Saúde Mental. Dispositivo
fundamental de participação e de controle
social, a III Conferência Nacional de Saúde
Mental é convocada logo após a promulgação
da lei 10.216, e sua etapa nacional é realizada
no mesmo ano, em dezembro de 2001.
As etapas municipal e estadual envolvem cerca
de 23.000 pessoas, com a presença ativa de
usuários dos serviços de saúde e de seus
familiares, e a etapa nacional conta com 1.480
delegados, entre representantes de usuários,
familiares, movimentos sociais e profissionais
de saúde.
Durante todo o processo de realização da III
Conferência e no teor de suas deliberações,
condensadas em Relatório Final, é inequívoco
o consenso em torno das propostas da
Reforma Psiquiátrica, e são pactuados
democraticamente os princípios, diretrizes e
estratégias para a mudança da atenção em
saúde mental no Brasil.
Desta forma, a III Conferência consolida a
Reforma Psiquiátrica como política de governo,
confere aos CAPS o valor estratégico para a
mudança do modelo de assistência, defende a
construção de uma política de saúde mental
para os usuários de álcool e outras drogas, e
estabelece o controle social como a garantia do
avanço da Reforma Psiquiátrica no Brasil.
É a III Conferência Nacional de Saúde Mental,
com ampla participação dos movimentos sociais,
de usuários e de seus familiares, que fornece os
substratos políticos e teóricos para a política de
saúde mental no Brasil.
REFERÊNCIAS
ARBEX, D. Holocausto Brasileiro. São Paulo: Geração Editorial, 2013.
ALMEIDA, D. Assistência em saúde mental: da lógica manicomial à reforma
psiquiátrica. ECOS | Estudos Contemporâneos da Subjetividade | Ano 8 |
Volume 2, 2017.
BARBOSA, G. C; SILVEIRA, J. P; LEBROGO, A. M. Saúde mental no Brasil: da
lógica manicomial à reforma psiquiátrica. In: Saúde em Foco: Temas
Contemporâneos. Editora Científica digital, Volume 2, 2020.
BASAGLIA, F. As instituições da violência. In: BASAGLIA, F. A Instituição
negada: relato de um hospital psiquiátrico. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1985,
p. 99-133.
Foucault, M. História da Loucura. (J. T. C. Neto, trad., 7 a ed.). São Paulo:
Perspectiva, 2004.
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Reforma Psiquiátrica e política de Saúde Mental no
Brasil. Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental.
Brasília, 2005.

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