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ECLESIOLOGIA CURSOS DE GRAUDAÇÃO – EAD Eclesiologia — Prof. Dr. Júlio Endi Akamine Meu nome é Padre Julio Endi Akamine. Sou graduado em Filosofia pela Universidade Católica do Paraná (Curitiba), e Teologia pelo Studium Theologicum de Curitiba. Fiz especialização (mestrado e doutorado) em Teologia sistemática na Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma.Tenho experiência no campo da formação dos padres e de irmãos da Sociedade do Apostolado Católico (SAC- Palotinos) e colaborei, por seis anos, no Secretariado Internacional para a Formação da SAC. Resido atualmente em São Paulo (SP) e exerço a função de Reitor Provincial da Província São Paulo Apóstolo desde janeiro de 2008. Desde 1995 leciono no Instituto de Teologia Studium Theologicum de Curitiba. Lecionei as disciplinas de introdução à teologia, teologia fundamental, sacramentologia geral, sacramentos do Batismo, Crisma e Eucaristia, Eclesiologia. Atualmente leciono a disciplina de Teologia Trinitária. No Centro Universitário Claretiano, sou autor da disciplina Teologia Trinitária. e-mail: jeakamine@tiscali.it ECLESIOLOGIA Prof. Dr. Júlio Endi Akamine Caderno de Referência de Conteúdo © Ação Educacional Claretiana, 2010 – Batatais (SP) Trabalho realizado pelo Centro Universitário Claretiano de Batatais (SP) Cursos: Graduação Disciplina: Eclesiologia Versão: jul./2013 Reitor: Prof. Dr. Pe. Sérgio Ibanor Piva Vice-Reitor: Prof. Ms. Pe. José Paulo Gatti Pró-Reitor Administrativo: Pe. Luiz Claudemir Botteon Pró-Reitor de Extensão e Ação Comunitária: Prof. Ms. Pe. José Paulo Gatti Pró-Reitor Acadêmico: Prof. Ms. Luís Cláudio de Almeida Coordenador Geral de EaD: Prof. Ms. Artieres Estevão Romeiro Coordenador de Material Didático Mediacional: J. Alves Corpo Técnico Editorial do Material Didático Mediacional Preparação Aline de Fátima Guedes Camila Maria Nardi Matos Carolina de Andrade Baviera Cátia Aparecida Ribeiro Dandara Louise Vieira Matavelli Elaine Aparecida de Lima Moraes Josiane Marchiori Martins Lidiane Maria Magalini Luciana A. Mani Adami Luciana dos Santos Sançana de Melo Luis Henrique de Souza Patrícia Alves Veronez Montera Rita Cristina Bartolomeu Rosemeire Cristina Astolphi Buzzelli Simone Rodrigues de Oliveira Revisão Felipe Aleixo Rodrigo Ferreira Daverni Talita Cristina Bartolomeu Vanessa Vergani Machado Projeto gráfico, diagramação e capa Eduardo de Oliveira Azevedo Joice Cristina Micai Lúcia Maria de Sousa Ferrão Luis Antônio Guimarães Toloi Raphael Fantacini de Oliveira Tamires Botta Murakami de Souza Wagner Segato dos Santos Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução, a transmissão total ou parcial por qualquer forma e/ou qualquer meio (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação e distribuição na web), ou o arquivamento em qualquer sistema de banco de dados sem a permissão por escrito do autor e da Ação Educacional Claretiana. Centro Universitário Claretiano Rua Dom Bosco, 466 - Bairro: Castelo Batatais/SP – CEP 14.300-000 cead@claretiano.edu.br Fone: (16) 3660-1777 – Fax: (16) 3660-1780 – 0800 941 0006 www.claretiano.edu.br SUMÁRIO CADERNO DE REFERÊNCIA DE CONTEÚDO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 9 2 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA DISCIPLINA ............................................ 11 3 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 36 UnidAdE 1 – O DESAFIO E A ATUALIDADE DA ECLESIOLOGIA 1 OBJETIVOS ........................................................................................................ 37 2 CONTEÚDOS ..................................................................................................... 37 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE ............................................... 38 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE ............................................................................... 38 5 DIFICULDADES PROVENIENTES DO CONTEXTO SOCIAL ATUAL ................... 38 6 OBJEÇÕES ORIGINADAS DA DIVISÃO ENTRE OS CRISTÃOS E O PLURALISMO RELIGIOSO ................................................................................. 41 7 IGREJA: SUJEITO DA FÉ .................................................................................... 45 8 IGREJA COMO OBJETO DE FÉ .......................................................................... 48 9 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS ........................................................................ 51 10 CONSIDERAÇÕES ............................................................................................. 51 11 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 52 UnidAdE 2 – ANTIGO TESTAMENTO: A IGREJA ANTES DA IGREJA 1 OBJETIVOS ........................................................................................................ 53 2 CONTEÚDOS ..................................................................................................... 53 3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE ............................................... 54 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE ............................................................................... 55 5 POVO E EXÉRCITO DE DEUS ............................................................................. 58 6 POVO dAS dOZE TRiBOS – AS dOZE TRiBOS.................................................. 60 7 RESTO SANTO ................................................................................................... 61 8 DIÁSPORA E EXÍLIO .......................................................................................... 63 9 COMUnidAdE CULTUAL – ASSEMBLEiA ........................................................ 64 10 REINO DE DAVI ................................................................................................. 66 11 REINO DE DEUS ................................................................................................ 68 12 RELAÇÃO COM OS OUTROS POVOS ................................................................ 71 13 AO SERVIÇO DO UNIVERSALISMO DA SALVAÇÃO ......................................... 73 14 SOLIDARIEDADE ENTRE INDIVÍDUO E COLETIVIDADE .................................. 74 15 ECLESIOLOGIA DO NOVO TESTAMENTO ........................................................ 90 16 A IGREJA SEGUNDO MATEUS .......................................................................... 100 17 ESCRITOS DE LUCAS ......................................................................................... 107 18 PALAVRA E FÉ .................................................................................................... 111 19 COMO É A VIDA DESSA IGREJA? ...................................................................... 113 20 IGREJA SEGUNDO O EVANGELHO DE JOÃO ................................................... 115 21 ESTRUTURAS DA IGREJA .................................................................................. 120 22 IGREJA SEGUNDO AS CARTAS PAULINAS ....................................................... 131 23 IGREJA NAS CARTAS PASTORAIS ..................................................................... 140 24 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS ........................................................................ 153 25 CONSIDERAÇÕES .............................................................................................. 153 26 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 153 27 E-REFERÊnCiAS ................................................................................................ 154 UnidAdE 3 – A IGREJA ATRAVÉS DA HISTÓRIA 1 OBJETIVOS ........................................................................................................ 155 2 CONTEÚDOS ..................................................................................................... 155 3 ORIENTAÇÕES PARA ESTUDO DA UNIDADE ...................................................156 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE ............................................................................... 156 5 ECLESIOLOGIA DOS PRIMEIROS SÉCULOS ..................................................... 158 6 LINGUAGEM DOS SÍMBOLOS ......................................................................... 160 7 IGREJA NO REGIME DA CRISTANDADE: MUNDO NA IGREJA ........................ 166 8 REFORMA GREGORIANA ................................................................................. 176 9 MUDANÇAS PROMOVIDAS PELA REFORMA GREGORIANA ......................... 181 10 ECLESIOLOGIA DO CORPO MÍSTICO ............................................................... 183 11 CONCÍLIO DE TRENTO: IGREJA SOCIEDADE ................................................... 185 12 CONCÍLIO DE TRENTO ...................................................................................... 192 13 TEOLOGIA DE CONTROVÉRSIA ........................................................................ 195 14 COnCÍLiO VATiCAnO i (1869-1870): PRiMAdO E iGREJA UniVERSAL ......... 198 15 ECLESIOLOGIA DO CONCÍLIO VATICANO I...................................................... 203 16 PRIMADO NA CONSTITUIÇÃO DOGMÁTICA PASTOR AETERNUS ................ 205 17 VATiCAnO ii (1962-1965): iGREJA POVO dE dEUS ......................................... 210 18 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS ........................................................................ 227 19 CONSIDERAÇÕES .............................................................................................. 228 20 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 228 21 E-REFERÊnCiAS ................................................................................................ 229 UnidAdE 4 – REFLEXÃO SISTEMÁTICA 1 OBJETIVOS ........................................................................................................ 231 2 CONTEÚDOS ..................................................................................................... 231 3 ORIENTAÇÕES PARA ESTUDO DA UNIDADE ................................................... 233 4 INTRODUÇÃO À UNIDADE ............................................................................... 233 5 IGREJA: UMA COMPLEXA REALIDADE ............................................................ 234 6 PROPRIEDADES FUNDAMENTAIS DA IGREJA ................................................. 247 7 UNIDADE ........................................................................................................... 251 8 IGREJA UNIDA E ÚNICA .................................................................................... 252 9 UNIDADE EXTERNA E INTERNA ....................................................................... 256 10 VÍNCULOS DE UNIDADE: VISIBILIDADE E INTERIORIZAÇÃO ......................... 258 11 FÉ: PRINCÍPIO DE UNIDADE ECLESIAL ........................................................... 260 12 VIDA FRATERNA ............................................................................................... 264 13 UNIDADE NA PLURALIDADE E NA TENSÃO ENTRE PARTICULAR E UNIVERSAL ........................................................................................................ 265 14 UNIVERSAL E IGREJAS LOCAIS ......................................................................... 266 15 CONCILIAÇÃO COMPLEMENTAR E INCLUSIVA............................................... 274 16 FERIDAS DA UNIDADE ...................................................................................... 277 17 DISTINÇÃO ENTRE HERESIA E CISMA ............................................................. 278 18 RUMO À UNIDADE ........................................................................................... 288 19 SANTIDADE ....................................................................................................... 290 20 DADOS DA ESCRITURA ..................................................................................... 291 21 PATRÍSTICA ........................................................................................................ 296 22 IDADE MÉDIA E ÉPOCA MODERNA ................................................................. 299 23 NA SUA FORMA HISTÓRICA, A IGREJA É TAMBÉM PECADORA .................... 303 24 A IGREJA É CATÓLICA ....................................................................................... 306 25 MISSÃO ............................................................................................................ 317 26 CATOLICIDADE E INCULTURAÇÃO ................................................................... 321 27 MÉTODO MISSIONÁRIO ................................................................................... 322 28 FINALIDADE DA MISSÃO .................................................................................. 324 29 A IGREJA É APOSTÓLICA .................................................................................. 329 30 APOSTOLICIDADE NA PATRÍSTICA ................................................................... 333 31 APOSTOLICIDADE NA IDADE MÉDIA E MODERNA ........................................ 336 32 TRADIÇÃO APOSTÓLICA E SUCESSÃO APOSTÓLICA ...................................... 337 33 OS BISPOS SÃO SUCESSORES DOS APÓSTOLOS? ........................................... 338 34 SUCESSÃO APOSTÓLICA .................................................................................. 339 35 O PRIMADO ...................................................................................................... 347 36 O BISPO DE ROMA, SUCESSOR DE PEDRO ..................................................... 355 37 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS ........................................................................ 365 38 CONSIDERAÇÕES .............................................................................................. 366 39 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 367 40 E-REFERÊnCiAS ................................................................................................ 367 CRC Caderno de Referência de Conteúdo Ementa ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Identificar e recolher as questões atuais mais importantes sobre a Igreja para mostrar a atualidade e a necessidade da Eclesiologia para a vida cristã. Estudar os fundamentos bíblicos da Eclesiologia do Antigo Testamento e do Novo Testa- mento. Examinar o pensamento eclesiológico em seu desenvolvimento, desde a patrística até a renovação do Vaticano II, e confrontá-lo com as configurações concretas que a Igreja assumiu durante a sua história. Estudar as proprieda- des fundamentais da Igreja, a saber: a unidade, a santidade, a catolicidade e a apostolicidade, procurando expô-las em sua índole escatológica e de complexa realidade. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– 1. INTRODUÇÃO Seja bem-vindo (a) ao estudo da disciplina Eclesiologia, dis- ponibilizada para você em ambiente virtual (Educação a Distância). Como você poderá constatar, nesta parte, denominada Ca- derno de Referência de Conteúdo, encontra-se o conteúdo básico das quatro unidades em que se organiza a presente disciplina. © Eclesiologia10 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO O estudo que agora iniciaremos tem como assunto princi- pal o mistério da Igreja em sua complexidade: a Igreja é objeto e sujeito da fé, instituição e carisma, sociedade visível e comunhão invisível, comunidade fraterna e hierárquica, santa e pecadora, multiplicidade de Igrejas e comunhão delas. Levando em conta essa complexidade da Igreja, começare- mos nosso estudo procurando identificar as questões mais im- portantes que surgem do contexto social, de pluralismo religioso e confessional e da presença do pecado na Igreja. Tais questões irão ajudá-lo a reconhecer a pertinência de nosso estudo. Assim, a atualidade do tema "Igreja" não será apenas uma partedo nosso estudo, mas permeará ele todo. Com tais perguntas, procuraremos levantar os dados bíblicos que fundamentam a Eclesiologia. No Antigo Testamento e no Novo Testamento, estudaremos especialmente as imagens que serviram para exprimir e viver o mistério da Igreja. As imagens mais impor- tantes são: 1) Esposa de Cristo (Ef 5,25-32; Ap 21,2; 22,17). 2) Corpo de Cristo (Rm 12,4-5; 1Cor 12,12-27; Ef 1,22-23; Cl 1,18.24). 3) Povo de Deus (1Pd 2,10; Rm 9,25). 4) Templo do Espírito Santo (1Cor 3,16; 6,19). 5) Família e Casa de Deus (Ef 2,19-22). O estudo continuará com o exame crítico da evolução histó- rica da Igreja tanto no aspecto teórico quanto concreto. As ideias e as doutrinas que a Igreja elaborou influenciaram o modo como ela se configurou institucionalmente. Por outro lado, as configurações concretas da Igreja também condicionaram, de modo decisivo, as doutrinas eclesiológicas. Mas não basta somente catalogar e justa- por doutrinas e modelos eclesiais. O objetivo do estudo histórico é, principalmente, o de avaliar a evolução histórica da Igreja se- gundo o modelo da Igreja apostólica. 11© Caderno de Referência de Conteúdo Por fim, nossa disciplina procurará responder à pergunta "o que é a Igreja?" por meio do estudo das propriedades fundamen- tais da Igreja, a saber: a unidade, a santidade, a catolicidade e a apostolicidade. Fazemos votos que esse percurso o ajude não só a estudar, mas também a amar mais fielmente a Igreja. Bom estudo! 2. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA DISCIPLINA Abordagem Geral da Disciplina Prof. Dr. Pe. Márcio Luiz Fernandez Neste tópico, apresenta-se uma visão geral do que será es- tudado nesta disciplina. Aqui, você entrará em contato com os assuntos principais deste conteúdo de forma breve e geral e terá a oportunidade de aprofundar essas questões no estudo de cada unidade. Desse modo, essa Abordagem Geral visa fornecer-lhe o conhecimento básico necessário a partir do qual você possa cons- truir um referencial teórico com base sólida – científica e cultural – para que, no futuro exercício de sua profissão, você a exerça com competência cognitiva, ética e responsabilidade social. Vamos co- meçar nossa aventura pela apresentação das ideias e dos princí- pios básicos que fundamentam esta disciplina. A disciplina que apresentaremos refere-se ao tratado da Igreja que acabou ocupando lugar privilegiado, especialmente de- pois do Vaticano II, dentro da teologia fundamental para poder fa- lar da Igreja como objeto de fé e do valor do testemunho eclesial. O objetivo principal da eclesiologia para quem estuda teolo- gia é conhecer os aspectos mais relevantes deste tratado e perce- ber as formas como o fato cristão se apresenta na história. Além disso, é importante se aproximar do paradoxo e do mistério da Igreja a fim de superar o famoso e falso dilema: "Cristo sim, a Igre- © Eclesiologia12 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO ja não". Ao aproximarmo-nos deste tratado precisamos compre- ender que a Igreja não só é uma expressão de vida, mas ela é uma vida que nos chega por meio de testemunhas que viveram séculos antes de nós. O poeta inglês Eliot, no sétimo dos seus coros de A Rocha, evoca a história religiosa da humanidade, e descreve a situação dramática do homem contemporâneo no contexto da negação de Deus e do homem que tem de dissimular sua presença: Mas parece que algo aconteceu que antes jamais acontecera, em- bora não saibamos com certeza quando, ou por que, ou como, ou onde. Os homens não renunciaram a Deus por outros deuses, di- zem eles, mas por um deus nenhum; e isto jamais acontecera an- tes: de que os homens renegassem tanto os deuses quanto a sua adoração, professando antes de tudo a Razão, e depois o Dinheiro, o Poder e o que chamamos Vida, ou raça ou dialética. A Igreja re- pudiada, a torre derruída, os sinos emborcados, que haveríamos de fazer senão quedarmo-nos com as mãos vazias e espalmadas para o alto numa idade que avança progressivamente para trás? Ermo e Vazio. Ermo e Vazio. E trevas sobre a face do abismo. Foi a huma- nidade que abandonou a Igreja ou foi a Igreja que abandonou a humanidade? Quando a Igreja não for mais considerada, ou sequer contestada, e houverem os homens esquecido todos os deuses, ex- ceto a Usura, a Luxúria e o Poder (ROCHA, s. n. t.) O poeta aponta, neste trecho, para a impossibilidade de eli- minar a busca – inscrita no coração do ser humano – do relaciona- mento com Deus, pois, de alguma forma haverá a substituição por aquelas realidades que ele chama de Usura, Luxuria e Poder. Es- ses são ‘deuses’ inconscientes não proclamados. E, além disso, faz duas perguntas sugestivas que podem ser o ponto de partida para pensar a missão da Igreja hoje: foi a humanidade que abandonou a Igreja? Ou: foi a Igreja que abandonou a humanidade? Talvez o homem contemporâneo – sentindo-se medida de todas as coisas e concebendo-se fora de uma realidade de comu- nhão tenha se afastado da Igreja. Por outro lado, devemos admitir que há tentativas de congelar o sentido religioso do homem e fa- zê-lo esquecer seu relacionamento com o mistério. Há também a possibilidade, acenada pela pergunta de Eliot da igreja abandonar 13© Caderno de Referência de Conteúdo a humanidade quando favorece a redução do fato cristão a partir da sua essência. Do ponto de vista prático isso significa concreta- mente três coisas: favorecer o subjetivismo na interpretação da Palavra, acentuar o moralismo e, por fim, enfraquecer o princípio de unidade do povo de Deus com a sua tradição e da referência com o próprio bispo e deste com o bispo de Roma. A disciplina de Eclesiologia trata do sujeito histórico que é a Igreja. A Igreja, porém, não pode ser vista como uma mera con- figuração sociológica e nem mesmo pode ser explicada simples- mente como uma comunidade espiritual e invisível. A Igreja é uma realidade, portanto, única e complexa e deve ser descrita como sacramento, ou seja, como uma realidade que torna visível, carnal – na história - uma realidade invisível: a íntima união com deus e a unidade de todo o gênero humano. Ou seja, tratar a igreja supõe reconhecer os polos complementares – a convocação divina para a qual ela convida e a comunidade humana que ela gera. Qual- quer juízo sobre a Igreja deve levar em conta este aspecto: ela é uma realidade composta por homens e que carrega consigo algo excepcional, sobrenatural, cujo objetivo é levar os homens ao rela- cionamento com a divindade. Dessa forma, é uma Igreja paradoxal feita para uma humanidade que também vive de forma paradoxal. Para que o homem de hoje possa experimentar a Cristo pre- cisa encontrar e viver na comunidade daqueles que professam a fé na sua presença. Por isso, segundo alguns autores, como por exemplo, Giussani a Igreja vem definida como a comunidade na qual se encontra a fisionomia de Cristo na história. Após esta introdução, apresentaremos a você os três pontos que vamos seguir nesta primeira parte com a exposição sobre a realidade da Igreja. 1) Origem e fundamento da Igreja. 2) A Igreja primitiva: norma e fundamento da igreja de to- dos os tempos. 3) A Igreja como realidade edificada pelos sacramentos. © Eclesiologia14 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO Vamos nos deter, portanto, sobre o primeiro ponto. A Igreja tem sua origem e fundamento em Jesus Cristo. A nossa preocupa- ção, neste tópico, será a de pensar a relação entre Jesus e a Igreja porque este é um tema de fundamental importância para a fé cris- tã. Temos a esse respeito diversas abordagens ao longo da história da teologia. Nos escritos do Novo Testamento encontramos mui- tos elementos para falar da formação da Igreja: nos evangelhos a pregação e a missão de Jesus e a mediação dos apóstolos; na literatura paulina aparecem elementos teológicos e organizacio- nais da Igreja nascente. O conteúdo, portanto, da autoconsciência da Igreja das origens consistia no fato dela se conceber como a continuidade de Cristo na história. A maneira deexpressar aquilo que os mantinha unidos e o que dava consistência a própria vida era formulado – já nos princípios – por meio das confissões de fé nas quais vinha expressa o conteúdo da fé. As profissões de fé não eram fórmulas abstratas, mas a afirmação da pessoa, da obra e do destino de Jesus Cristo. A mais conhecida e também a mais impor- tante que encontramos é a profissão de fé de I Cor 15,3-5. Já na fase patrística com Inácio, Ireneu, Orígenes, João Cri- sóstomo, Ambrósio e Agostinho teremos a exposição sobre a for- mação da igreja a partir do lado ferido do Crucificado – simbolismo que será retomado na Idade Média. Mas, será apenas a partir do iluminismo e no contexto da controvérsia modernista que se de- baterá a questão da singular fundação da Igreja por parte de Jesus Cristo. No Concílio Vaticano II, nos quatro primeiros números da LG 2-5, se delineia uma visão da instituição da Igreja na perspectiva de um processo e são empregadas as palavras fundação e funda- dor. Se observarmos a história teológica recente sobre a natureza teológica da fundação da Igreja por parte de Jesus encontraremos diferentes abordagens: 1) Uma obra sobre a vida de Jesus, escrita pelo luterano Reimarus (1694-1768), afirmava que o objetivo de Jesus e seus discípulos não era o de fundar uma igreja, e sim o de restabelecer o reino de Davi na Palestina. 15© Caderno de Referência de Conteúdo 2) Já na pesquisa de alguns autores da linha histórico-libe- ral (1932), entre eles R. Bultmann e seus seguidores, a posição é de negar qualquer forma de Igreja organizada no pensamento e na pregação de Jesus. 3) Há ainda a abordagem do protocatolicismo – que teve grande influência sobre vários exegetas protestantes – em que se vê um contraste entre a eclesiologia paulina voltada para os carismas e a eclesiologia mais tardia – nas deuteropaulinas – que se baseia na autoridade dos ministros ordinários e, por isso, é uma eclesiologia de tipo católica que não pode ser mais atribuível a vontade do Jesus histórico. 4) Alguns teólogos católicos – antes do Concílio – já falavam que a manifestação da Igreja depois da Páscoa estava em continuidade com Jesus e com suas obras e palavras, e chegaram a falar de "atos criadores da Igreja por parte de Jesus". nos últimos anos – em âmbito católico – já se fala de uma eclesiologia implícita. O que isto significa? Significa que Jesus não é entendido tanto como funda- dor de uma nova instituição, mas aquele que reuniu o verdadeiro Israel dos últimos tempos: a Igreja. Assim o cristianismo nascente seria primeiro um movimento de renovação do próprio judaísmo e que consumou pouco a pouco sua ruptura com o judaísmo farisaico. Por meio dessa ideia da eclesiologia implícita e processual se de- terminará a instituição por Jesus Cristo. Tal determina- ção se dará a partir da pessoa e da consciência de Jesus, pois a pregação do Reino, iniciada por Jesus permanece, depois da Páscoa, ligado à pregação da Igreja. Continuando, podemos chamar a atenção para outro as- pecto do tratado sobre a Igreja referente à importância da época apostólica da Igreja primitiva como normativa para todos os tem- pos, pois ali temos o momento da revelação plena e definitiva de Jesus Cristo. Esta origem apostólica tem a ver com os escritos do Novo testamento. Do ponto de vista histórico e sociológico pode-se dividir, con- forme nos apresenta o professor Pie Ninot, em três períodos: © Eclesiologia16 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO 1) Período apostólico (30-65). 2) Período sub-apostólico (66-100). 3) Período pós-apostólico (100-150). No período apostólico temos de salientar que os cristãos se tornaram uma comunidade respeitável, sociologicamente identifi- cável, na qual o batismo tinha a função de distinguir os seguidores de Jesus. Tal comunidade se distinguia pela oração; pela fração do pão como atualização da festa pascal judaica em perspectiva euca- rística; pela atenção ao ensinamento dos apóstolos e pela comu- nhão de bens atestada em At. 2,44s; 4, 32-37. Já a partir do ano 66 d.C. temos alguns dados importantes que provocam mudanças na vida dos cristãos: o desaparecimento dos grandes apóstolos (Tiago, Pedro e Paulo); a destruição do tem- plo de Jerusalém e a crescente separação do judaísmo são todos fatores que contribuem para outra configuração da eclesiologia da Igreja nascente. O desaparecimento da geração apostólica, por exemplo, obrigou pouco a pouco a seguir o princípio da tradição por sucessão e elevou a encontrar sucessores do ministério exerci- do pelos apóstolos. Por volta de 110 d.C, Inácio de Antioquia já tes- temunha a presença do tríplice grau do ministério apostólico: bis- pos, presbíteros e diáconos estabelecidos até os confins da terra e, desse modo, passa-se de um apostolado missionário para aquele da comunidade com um colégio de ministros locais. Vemos, então, que com o último escrito do n.T – a 2 carta de Pedro – encerra-se a época apostólica da Igreja primitiva. Existe uma pluralidade de realidades eclesiais fundadas pelos apóstolos e uma progressiva institucionalização da Igreja nascente e na qual emerge a função autoritativa do ministério eclesiástico. Por fim, queremos chamar a atenção para o último ponto no qual se diz que a Igreja vem edificada pelos sacramentos. O que isso quer dizer? Desde o princípio na interpretação patrística apareceu o simbolismo sacramental da edificação da Igreja. Santo Agostinho 17© Caderno de Referência de Conteúdo resume bem o pensamento dos padres da Igreja a este respeito: "Quando o Senhor dormia na cruz, a lança atravessou o seu lado e dele brotaram os sacramentos com os quais a Igreja foi criada. E é assim que a Igreja foi criada da costela de Adão". O vínculo entre o batismo e a eucaristia permanecerá bem articulado durante os séculos. O batismo que distingue o fiel cris- tão é o fundamento do seu sacerdócio comum: o batizado é con- figurado à imagem de Cristo, constituído membro da Igreja, situa- ção que manifesta que ele é sinal distintivo exigindo o testemunho de Jesus Cristo neste mundo. Na primeira parte discutimos sobre alguns eixos de susten- tação do tratado da Igreja. Para poder refletir agora sobre o sig- nificado do que é a Igreja, será útil considerar alguns conceitos utilizados pelo Vaticano II. A realidade paradoxal que é a Igreja, a partir deste Concílio, teve de retomar as fontes da renovação ecle- sial: a Palavra de Deus e a celebração litúrgica para orientar, assim, o rumo ao futuro da missão da Igreja no mundo contemporâneo. A Igreja como sacramento A descrição mais significativa da Igreja é quando ela é apre- sentada como sacramento. Este termo traduz o conceito bíblico de mysterion cujo sentido é equivalente a algo divino manifestado na realidade visível. Por este termo se pode mostrar que a Igreja pode ser explicada como uma realidade paradoxal, na qual os polos apa- rentemente opostos se fundem em unidade. Dizemos que a Igreja é santa e a vemos cheia de pecadores. Se diz que ela tem a missão de tirar os homens das preocupações terrestres para ocupar-se das coisas do céu e a vemos incessantemente ocupada das coisas da terra. Asseguram que é uma realidade universal e constatamos algumas vezes que seus membros, por uma espécie de fatalidade, se colocam em grupinhos fechados. Isso porque a Igreja está casa- da – assume – com todas as características da humanidade, com todas as contradições sem fim que existem no ser humano. © Eclesiologia18 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO A Igreja como povo de Deus A igreja é denominada também como povo de Deus. O ter- mo Igreja em grego designa literalmente assembleia, reunião de pessoas. O termo com o qual as primeiras comunidades denomi- navam suas reuniões – como Ecclesia Dei – a comunidade de deus, expressava a convicção de que eles eram o cumprimento pleno das promessas, por isso, o povo de Yahvé, porque justamente viviam como uma assembleia reunida pelo Deus de Jesus Cristo. Um dadoessencial é o seguinte: o que nutria a comunidade cristã como Igreja não era o fato do número de pessoas que aderiam e nem mesmo o puro fato de estar juntos, mas a consciência de que eram reunidos e convocados pelo próprio Deus. Deus elege e reúne os seus por meio da palavra e dos sacramentos. Enfim, o emprego dessa expressão Povo de Deus faz referência a todos os batizados e acabou por ser a marca essencial da eclesiologia do Vaticano II. A Igreja como comunhão Quando se define a Igreja como comunhão (communio) o significado deve ser procurado em diversas dimensões: a Igreja quer ser sinal básico de comunhão com Deus por meio da partici- pação dos fiéis na Palavra e nos sacramentos. E, como consequên- cia desta participação os homens são chamados a uma comunhão entre si. E, ainda, temos um terceiro nível que é o da comunhão das igrejas locais com a Igreja universal. Comunhão é um termo muito utilizado na igreja primitiva e apreciado, de forma especial, nas Igrejas orientais. De fato, nos primeiros séculos – na época patrística – a eclesiologia era mais vivida como consciência de pertença e comunhão entre os fiéis e os bispos e dos bispos com os fiéis do que propriamente como um tratado teológico sistemático. A vivência em um contexto litúrgico, espiritual e social no qual os fiéis sentiam-se pertencentes à Igreja como o lugar que os conduzia a salvação e, por meio do batismo, renovava a consciência de um novo sujeito era um dado funda- 19© Caderno de Referência de Conteúdo mental. Era muito viva a ideia da maternidade da Igreja: a Ecclesia Mater. O princípio visível desta comunhão, como já observamos, são os bispos que individualmente são o fundamento da unidade nas suas igrejas particulares e sinal de unidade com a Igreja uni- versal. A Igreja como corpo de Cristo O cristianismo é a afirmação de um fato bom para o ser hu- mano, um anúncio, isto é, Cristo nascido, morto e ressuscitado. Não é algo abstrato. Portanto, segundo nos indica o estudioso do fato cristão, Luigi Giussani, ‘o cristianismo é um fator dramatica- mente decisivo para o homem, somente se é considerado nesta sua originalidade, nesta sua densidade de fato, cuja fisionomia, há dois mil anos, era a de um homem singular, mas que já naquela época tinha também o rosto das pessoas que se uniam e iam, duas a duas, fazer aquilo que ele fazia e as mandava fazer, e depois vol- tavam para junto dele. Em seguida, foram por todo o mundo en- tão conhecido, como uma só coisa, para levar aquele fato. O rosto daquele homem é hoje o conjunto dos que creem, que são o sinal no mundo, ou – como disse são Paulo, são o Corpo dele, corpo Misterioso, chamado também povo Deus, Guiado por uma pessoa viva, os bispos em comunhão com o bispo de Roma. A igreja como tradição viva Definir a igreja como tradição viva significa mostrar todo o dinamismo de doutrina, culto, vida e expressão da fé que a mesma Igreja crê. A Dei Verbum usa a palavra tradição em dois sentidos: para descrever o que não está escrito na Escritura, mas, presente na tradição apostólica e, em segundo lugar, fala da tradição como o processo no qual a revelação é transmitida de maneira viva – como expressão do espírito santo – essa força vital que herdamos de nossos pais e que se perpetua é a chamada tradição viva que corre continuamente através dos tempos. © Eclesiologia20 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO A Igreja como sociedade Em vários números da Lumem gentium a Igreja é descrita como uma realidade sociologicamente identificável. É um grupo visível e social, estabelecido e estruturado no mundo com as ca- racterísticas próprias da sociedade. A Igreja como instituição Este conceito está estreitamente relacionado com o de Igre- ja sociedade. A reflexão sobre a instituição revela as formas e ativi- dades que, apesar de serem desenvolvidas dentro de uma história, mantêm traços permanentes nos seus ritos, nas funções de poder, nos símbolos, nas tradições consolidadas, e na unidade de gestos etc. O teólogo Pie Ninot dá três razões com as quais justifica a relevância e a importância da instituição Igreja: em primeiro lu- gar a instituição aparece como sinal identificador do Espírito, isto é, ela ajuda a Igreja a identificar-se com a mensagem originária do Evangelho servindo-se das estruturas institucionais. O risco a ser evitado, evidentemente, será o de achar que a tarefa seria o de uma pura conservação histórica, sem a devida encarnação em cada situação concreta. O segundo aspecto que justifica a institui- ção seria o fato de ser ela sinal da força integradora do Espírito. Cada crente e as diversas igrejas estão em unidade com a Igreja universal e o faz por intermédio das estruturas institucionalizadas da própria Igreja. O Espírito integra uma pluralidade na unidade. Este dado torna possível um sistema aberto ao Espírito, razão últi- ma da unidade da Igreja, mediante os múltiplos dons que lhe são comunicados. O terceiro e último aspecto ressalta que a institui- ção é sinal da força libertadora do Espírito, pois exime os cren- tes de procurar sozinhos a própria salvação. A força libertadora da instituição, por sua vez, deve tornar possível uma participação dos crentes e co-responsabilidade por toda ela por meio de formas sinodais de participação. 21© Caderno de Referência de Conteúdo Quando se fala da Igreja devemos lembrar e examinar todos estes conceitos na sua convergência e complementaridade. Sabe- mos que a Igreja é uma complexa realidade resultante da união do elemento divino e humano e, desse modo, compara-se ao mistério do verbo encarnado. Por isso, todos estes modos de descrever a Igreja são complementares e devem ser lidos à luz do mistério de Cristo. Os principais adjetivos com os quais se mostra as dimensões da Igreja e que estão presentes já no símbolo de Constantinopla do ano de 381 são quatro: 1) Una. 2) Santa. 3) Católica. 4) Apostólica. Trata-se de quatro dimensões nas quais se mostram em sín- tese o mistério da Igreja de Cristo. São categorias que permitem conhecer o ser íntimo da Igreja e revelam a íntima relação dela com Cristo. A Igreja é Una Os padres apresentavam a Igreja como o ícone da Trindade e definiam-na como "o povo reunido na unidade do Pai e do Filho e do Espírito Santo". Dessa forma aparecia claramente a razão e o fundamento de se afirmar que a Igreja era una, pois Deus é uno e único. Contudo, quais seriam as condições para afirmar este víncu- lo de unidade? Quais os elementos que exprimem tal unidade? A unidade na Igreja vem estabelecida por elementos descritos já nos At 2,42 na primeira comunidade dos discípulos: 1) Unidade de fé pelo ensinamento dos apóstolos (vinculum symbolicum). A fé é o princípio de união entre as pessoas que crêem na mesma coisa, este vínculo gera uma unida- de tanto interior como exterior. © Eclesiologia22 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO 2) Unidade na fração do pão e, por isso, os padres vão di- zer que a eucaristia faz a Igreja (vinculum liturgicum). A tradição sempre viu na água – o sacramento do batismo que nos incorpora à igreja – e no sangue – a eucaristia – que brotavam do lado de Cristo crucificado o símbo- lo dos sacramentos que nos unem a Cristo e formam a Igreja. 3) Por fim, a unidade de vida social/comunitária (vinculum sociale/communitarium). As imagens do Novo Testa- mento mostram a realidade eclesial como mútua coope- ração entre bispos, presbíteros, diáconos e os carismas dos fiéis. A Igreja é Santa Já no século 2º encontramos este adjetivo aplicado à Igreja: "Os cristãos são chamados de ‘nação santa’ (I Pd 2,9) em virtu- de da eleição e da aliança de amor com Cristo. Em Ef. 5,25-27 se diz que Cristo amou a Igreja e quis que fosse santa e irrepreensí- vel". Há toda uma tradição teológica na qual aparece a tradição de qualificar a Igreja como Santa e, dessa forma, chega-se ao Concí- lio Vaticano II em que na LG a Igreja é apresentada como a inde- fectivelmente santa, esposa imaculadae digna esposa. Mas uma vez que abriga em seu seio os pecadores, ela é santa, mas sempre necessitada de purificação, de renovação e de reforma. A igreja é peregrina neste mundo, por isso, tem de estar em permanente reforma e como Esposa de Cristo, sob a ação do Espírito Santo, não deve deixar de renovar-se. A Igreja é Universal (católica) Será nos escritos de Inácio de Antioquia que pela primeira vez encontraremos este atributo de ‘católica’ dada a Igreja cujo significado será de universalidade e autenticidade. No símbolo niceno-constantinopolitano – no século 4º – aparecerá de forma definitiva. Santo Isidoro para explicar este conceito diz: "Católica 23© Caderno de Referência de Conteúdo universal significa segundo a totalidade, não como os grupinhos dos heréticos limitados a certas regiões, mas difundida por todo o orbe da terra". Já Tomás de Aquino e Alberto Magno vão sublinhar o sentido qualitativo dessa expressão: se a fé é universal significa que a Igreja anuncia a verdade sobre Deus, princípio e fim de todas as coisas, e desse modo, responde às exigências de totalidade do coração do ser humano. Tal plenitude está contida em Cristo: que para Tomás é sabedoria de Deus e salvador de todo o gênero hu- mano. No Vaticano II se sublinha que esta universalidade da Igreja se evidencia na comunhão – uma espécie de osmose – entre as igrejas locais e a igreja universal. A Igreja é Apostólica O sentido da apostolicidade deve ser visto sob dois aspectos fundamentais. De um lado, a questão da sucessão ministerial e, em segundo lugar, a tradição histórica. O principio da apostolicidade da igreja implica o reconheci- mento do ministério de ensinamento e de direção como institui- ção derivada de Cristo por meio dos apóstolos e por meio deles. A apostolicidade refere-se, portanto, ao fato de que os anunciadores da fé estão ligados à regra da salvação em Cristo: eles não falam em nome próprio, mas são testemunhas daquilo que ouviram e nada na Igreja escapa a esta regra, o que se anuncia é a fé da Igre- ja apostólica, por isso, a regra da fé exige testemunhas enviadas e que não se autorizam por si mesmas. Quanto a tradição histó- rica deve-se afirmar aquilo que é comum em vários documentos ecumênicos: na vida das primeiras comunidades se delineia um desenvolvimento que conduz já no final do século 1º em que te- mos os apóstolos e seus colaboradores no ministério e depois seus sucessores e que culmina no século 2º com a estabilização e leva ao reconhecimento do ministério do bispo. Com isso desejamos a você um ótimo trabalho. © Eclesiologia24 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO Glossário de Conceitos O Glossário de Conceitos permite a você uma consulta rápi- da e precisa das definições conceituais, possibilitando-lhe um bom domínio dos termos técnico-científicos utilizados na área de co- nhecimento dos temas tratados na disciplina Eclesiologia. Veja, a seguir, a definição dos principais conceitos desta disciplina: 1) Regra da fé: "é o critério público e eclesial para discernir a verdadeira revelação comunicada por Cristo à Igreja. Santo Irineu de Lião (130-200) desenvolveu esse con- ceito contra os gnósticos que pretendiam revelações especiais acessíveis a uma elite" (O’COLLINS; FARRUGIA, 1995, p. 308). 2) Tipologia: "é o modo de interpretar eventos, pessoas e coisas como tipos que revelam em modo obscuro os an- titipos do Novo Testamento, que realizam a revelação e a salvação. Assim, Adão e Melquisedec são tipos de Cristo (Rm 5,14; Hb 6,20-7,28). A história do Povo de Deus no êxodo do Egito prefigura as dificuldades que os cristãos devem enfrentar e os sacramentos que recebem (1Cor 10,1-11). O dilúvio prefigura o batismo (1Pd 3,20-21) e o maná no deserto antecipa o pão da vida (Jo 6,48-51). Santo Irineu (130-200) e, depois, a escola de Alexandria foram atentos a esse sentido típico da Escritura que Orí- genes (185-254) desenvolveu em uma direção alegórica. No ocidente, a interpretação tipológica foi adotada por Ambrósio (339-397) e, em seguida, por Santo Agostinho de Hipona (354-430), por meio do qual passou para os latinos da Idade Média" (O’COLLINS; FARRUGIA, 1995, p. 390). 3) Cesaropapismo: é a prática de Estado que interfere con- tinuamente nos negócios da Igreja com o pretexto de defender os interesses dos fiéis. Os imperadores roma- nos tinham sido os pontífices máximos da religião pagã estatal. Quando se converteram ao cristianismo, desres- peitaram, muitas vezes, a autonomia do governo da Igre- ja. Como o Império sobreviveu mais tempo no Oriente, os príncipes bizantinos dominaram os patriarcas, espe- 25© Caderno de Referência de Conteúdo cialmente no período precedente à crise de 1054 entre Oriente e Ocidente (O’COLLINS; FARRUGIA, 1995, p. 51). 4) Cluny: é o mosteiro fundado na Borgonha em 909 em continuidade com a reforma de Bento de Aniane. Uma vez que a decadência da vida religiosa provinha da ma- nipulação de seculares, o fundador (o Duque da Aquitâ- nia, Guilherme) doou esse mosteiro ao papa e aos seus sucessores. A sugestão dessa doação tinha vindo de Ber- none (abade de Baume, de Gigny e, depois, de Cluny). A proteção pontifícia tinha o objetivo de assegurar a li- berdade do mosteiro das intromissões do poder secular. Mais tarde, Cluny foi subtraída também da jurisdição do bispo de Mâcon, pois também ele estava muito sujeito à intromissão dos seculares. Para assegurar a unidade de observância, as três casas (Baume, Gigny e Cluny) rece- beram o mesmo chefe (o abade de Cluny) e os mesmo costumes. Com o tempo Cluny fundou outros mosteiros que foram agregados ao mesmo movimento de reforma. O ideal perseguido foi o retorno ao fervor da Igreja primi- tiva, a antecipação escatológica da Jerusalém celeste e a realização do mistério de Pentecostes. Luta das Investi- duras: no final do século 11 e no início do 12 houve uma controvérsia acerca do papel do imperador e dos prínci- pes na criação dos abades e dos bispos. O abade e o bis- po eleitos recebiam do imperador e do príncipe o anel e o báculo e rendiam homenagem ao senhor secular antes de serem consagrados. O núcleo do problema era o pa- pel da autoridade secular na nomeação dos dignitários eclesiásticos. O primeiro a condenar as investiduras dos leigos foi Nicolau II (1058-1061) em 1059. A condenação foi repetida por muitos papas. Em vários países, chegou- -se a estabelecer diferentes acordos até que a questão foi finalmente resolvida com a concordata de Worms (1122) em um encontro entre Calixto II e o imperador Henrique V. O que estava em jogo já tinha sido exposto por Guido de Ferrara (1086) e, melhor ainda, por Yves de Chartres: os assuntos espirituais (spiritualia) eram domínio da Igreja; os assuntos materiais (temporalia) eram de responsabilidade do poder secular, mas ambos © Eclesiologia26 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO estavam implicados no ofício dos bispos e dos abades. O imperador renunciou ao direito de investidura do anel e do báculo (símbolos do ofício eclesiástico) e concedeu a eleição canônica e a livre consagração. O papa, por sua vez, concedeu ao imperador o direito de estar presente nas eleições alemãs e a entregar o cetro (símbolo do po- der ou potestade secular que o bispo exercia) antes da consagração. A luta das investiduras dos leigos significou um passo adiante no desentranhamento progressivo das relações entre a Igreja (bispos, clérigos e monges) e o Estado (príncipes e leigos) na Idade Média, processo que necessitaria ainda de vários séculos para chegar à sua conclusão (579-581) (O’DONNELL; PIÉ-NINOT, 2001). 5) Confissão de Augsburg: "em 1530, foi apresentada na Dieta de Augsburg, diante o imperador Carlos V, uma profissão de fé. Escrita com a colaboração de Lutero, foi quase inteiramente obra de Philip Melanchon. Tinha a finalidade de responder às acusações de J. Eck (1486- 1543) de que o luteranismo estava fazendo reviver an- tigas heresias. Levava em conta as posições de Zwinglio e se opunhaàs doutrinas anabatistas. Consta de vinte e oito artigos. Os vinte e um primeiros têm um tom con- ciliador: Deus (1); o pecado original (2); o Filho de Deus (3); a justificação (4); o ministério eclesial (5 e 14); a nova obediência (6); a Igreja (7-8); os sacramentos (9-13); os ritos eclesiásticos (15); os assuntos civis (16); a escato- logia (17); o livre arbítrio (18); a causa do pecado (19); a fé e as boas obras (20), a veneração dos santos (21). A segunda parte, escrita primeiro, é mais dura e trata dos abusos percebidos na Igreja do tempo: a comunhão sob as duas espécies (22); o matrimônio dos sacerdotes (23); a missa (24); a confissão (25); os alimentos, os jejuns e a abstinência (26); os votos monásticos (27) e o poder eclesiástico (28). Os teólogos do imperador, na Dieta, redigiram uma réplica, a Confutatio pontificia, que apro- vava integralmente nove artigos, aceitava parcialmente e com observações seis, e rejeitava treze. Melanchton elaborou uma réplica ou Apologia, que o imperador não quis aceitar. A confissão de Augsburg é o documento 27© Caderno de Referência de Conteúdo básico do luteranismo. Por volta da década de 1950, no movimento luterano Die Sammlung, foi proposta uma interpretação mais católica do texto, mesmo que, na realidade, sem grandes consequências. Por ocasião do 450º aniversário da Confissão, foram celebrados con- gressos e apareceram numerosos estudos. Alguns cató- licos começaram a perguntar se o documento poderia ser aceito como expressão autêntica de uma fé comum sobre a Igreja. Uns responderam positivamente, mas logo recuaram dessa posição; outros deram também uma resposta positiva, mas acrescentaram diferentes matizes; outros responderam negativamente. Também outras Igrejas estudaram suas implicações. A Eclesiolo- gia da Confissão encontra-se principalmente nos Artigos 5, 7, 8, 14 e 28, apesar de a palavra ‘ecclesia’ aparecer 83 vezes no texto latino, e Kirche e seus cognatos, 54 vezes. A principal afirmação sobre a Igreja está no Artigo 7: ‘A Igreja una e santa permanecerá para sempre. Com efeito, esta Igreja é a congregação dos santos, na qual o evangelho é ensinado retamente (pure docetur / rein gepredigt) e os sacramentos são retamente (recte / ge- reicht) administrados. Para essa unidade da Igreja, basta coincidir na doutrina do evangelho e na administração dos sacramentos. Não é necessário que as tradições dos homens, ou os ritos, ou as cerimônias instituídas pelos homens sejam em toda parte os mesmos [...]’. O signifi- cado da expressão ‘santos’ é o do Novo Testamento (por exemplo, Fl 1,1) e o do credo. Quando diz no Artigo 8, referindo-se diretamente ao donatismo: ‘A Igreja é pro- priamente (proprie sit / eigentlich nicht anders ist dann) a congregação dos santos e dos verdadeiros crentes [...] que estão mesclados com os hipócritas e os pecadores (admixit sunt / bleiben)’, não é claro se Melanchton que- ria dizer mais do que disse LG 15, que afirma que, para a plena comunhão, são necessárias a graça e a fé. Por ou- tro lado, as palavras ‘na qual’ do Artigo 7 implicam uma Igreja visível, da qual não está excluído o ministério. Em relação à ordenação eclesiástica, a Confissão exige que o candidato seja chamado à ordem para ensinar e adminis- trar os sacramentos (14). Em conclusão, há uma grande © Eclesiologia28 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO seção absolutamente negativa em relação ao abuso do poder episcopal, especialmente em assuntos seculares (28), mesmo que Melanchton defendesse uma jurisdi- ção episcopal claramente delimitada. Dado o desejo de unidade e o fato de o texto pertencer aos primeiros anos da Reforma, é compreensível que o documento guarde silêncio sobre matérias que mais tarde serão causa de divisão como: o papado, a transubstanciação, o purga- tório e a Virgem Maria. Por outro lado, é preciso admitir que são possíveis duas leituras do texto: uma mais pro- testante e outra mais católica. Mas, diferentemente dos documentos posteriores da Reforma, ‘este admite cla- ramente um cristianismo no qual a salvação é mediada pela Igreja e não unicamente pelo evangelho’. Também é verdade que as leituras evangélicas da Confissão, em relação, por exemplo, ao aspecto fiducial da fé, tende- ram em geral a não levar em conta a teologia católica polêmica dos séculos posteriores. Como apresentação católica do cristianismo evangélico, ainda hoje continua tendo valor para o diálogo ecumênico. Dado o lugar sim- bólico de Augsburg, nesta mesma cidade foi assinada a Declaração conjunta católico-luterana sobre a doutrina da justificação em 31 de outubro de 1999" (O’DONNEL; PIÉ-NINOT, p. 216-219). 6) Deísmo: termo genérico para indicar as teorias de mui- tos escritores ingleses, europeus e americanos dos sé- culos 17 e 18 os quais, em várias maneiras, sublinhavam o papel da razão no fato de religião e negavam a revela- ção, os milagres e qualquer ação providencial na nature- za e na história dos homens (O’COLLINS, G.; FARRUGIA, 1995, p. 103). 7) Por Igreja como "societas inaequalis" se entende uma sociedade: "na qual deveria haver alguns que presidis- sem aos outros, chefes a quem competisse zelar pela observância exata de leis salutares, juízes que julgassem as variadas ações de seus subordinados segundo a pres- crição da razão e de prescrições tradicionais, mestres que estivessem aptos a examinar casos duvidosos, de- terminar os graves, retificar os cotidianos, prevenir os 29© Caderno de Referência de Conteúdo perigosos; administradores dos remédios tornados efi- cientes no sangue do Redentor, para fornecê-los aos que estejam preparados e negá-los devidamente aos outros" (FEINER; LOEHRER, 1975). 8) Galicanismo: é um movimento que durou muito tempo na França e teve tendências análogas em outros países. Reivindicava uma forte independência do papado. A sua forma clássica é expressa nos Quatro Artigos Galicanos: eles foram redigidos pelo bispo de Meaux, Jacques- -Bénigne Bossuet (1627-1704) e aprovados por uma as- sembleia do clero de Paris em 1628; entre outras, afir- mava-se que os concílios gerais tinham uma autoridade superior à do papa (DS 2281-2285). Apesar de esses ar- tigos terem sido revogados pelo rei Luis XIV e pelo clero em 1639, a sua influência continuou no século 19 até que um papado enérgico e o ensinamento do Vaticano I puseram fim ao Galicanismo (O’COLLINS; FARRUGIA, 1995). 9) Conciliarismo: "teoria que surgiu no tempo do Grande Cisma (1378-1417), enquanto o Ocidente estava dividi- do, quanto à fidelidade, entre dois papas e até mesmo entre três. Essa teoria sustentava que a máxima autori- dade compete a um concílio ecumênico independente- mente do papa. O Concílio Vaticano II coloca, porém, o Colégio episcopal com e sob o papa" (O’COLLINS; FAR- RUGIA, 1995, p. 66). 10) Epônimo (que dá o nome): é um termo usado na litera- tura exegética para indicar uma pessoa, cujo nome pas- sou para uma tribo, um clã, uma família, ou uma cidade. Nas narrativas, essa relação apresenta-se como uma ge- nealogia; por exemplo, Judá é o ancestral dos judaítas, os "filhos" de Judá. 11) Montanismo e novacianismo: Montano apresentava-se como porta-voz do Espírito Santo. O montanismo carac- terizou-se por um rigorismo extremo, pelo entusiasmo, pela profecia extática e pela glossolalia. Rechaçavam a hierarquia, pois apelavam para a autoridade do Espíri- to Santo. Como movimento apocalíptico esperava o fim iminente. Somente os espirituais (pneumáticos) faziam © Eclesiologia30 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO parte da Igreja. Somente eles podiam batizar valida- mente. A experiência do montanismo levou ao declínio da presença dos carismas, especialmente da profecia na Igreja primitiva. Os carismas apareceram como uma ameaça para a Instituição. Por isso, a instituição não mais os fomentou. 12) Novaciano negou comunhão aos que haviam apostata- do da fé durante a perseguição de Décio (249-250). Por isso fundou uma seita rigorista. O lema deles: "A Igreja éo povo que não renegou o nome de Cristo e mantém o evangelho em sua totalidade" (O’COLLINS; FARRUGIA, 1995). 13) Gnosticismo é um sistema filosófico e religioso no qual a salvação se alcança mediante a comunicação de um conhecimento secreto transmitido aos iniciados. Esse conhecimento é uma preparação para a separação final do princípio espiritual do corpo. Hoje, pensa-se que o gnosticismo teve origem da deformação do cristianismo. Muito sincretista, mesclava elementos da filosofia grega, do judaísmo, do cristianismo, de diversas fontes pagãs, de magia e das religiões orientais. 14) Chamam-se hussitas "os seguidores de João Hus (aprox. 1369-1415), um sacerdote da Boêmia que ensinava filo- sofia e teologia na Universidade de Praga. Conheceu as ideias da reforma de João Wycliffe (aprox. 1330-1384) e as difundiu. Foi julgado e condenado à fogueira pelo Concílio de Constança (cf. DS 1201-1230; 1247-1279; FCC 7.075-7.086; 9.096-9.098), tornando-se assim um herói nacional tcheco. Os hussitas adotaram as suas posições, entre as quais a predestinação e a Escritura como a única norma da fé. A herança hussita continua em várias Igrejas da Moravia espalhadas pelo mundo. Em 1920, a Igreja Tchecoslovaca hussita, que afirmava ser a sua representante, separou-se da Igreja Católica, depois de ter pedido uma liturgia em língua vulgar, o ce- libato livre para o clero e a participação dos leigos no governo da Igreja. Esses pedidos não foram aceitos. Hus rejeitou erroneamente a validade dos sacramentos ad- ministrados por padres simoníacos. A prioridade que ele 31© Caderno de Referência de Conteúdo deu para a Escritura como única norma da fé fez dele um precursor dos Reformadores (cf. DS 1480; FCC 7098). Ele sustentou que os leigos podiam comungar sob as duas espécies. Isso foi admitido no Concílio Vaticano II (cf. DS 1725; FCC 9.160; SC 55)" (O’COLLINS; FARRUGIA, 1995, p. 164). Com a palavra "indefectível", exprime-se em forma negativa o mesmo conceito que em forma posi- tiva é definido com o termo "santo". "Quando se afirma que a Igreja é indefectível, deseja-se dizer que ela nunca perderá a graça de Cristo que a consagra inteiramente a Deus e que, portanto, não perderá jamais a sua amizade, a inabitação do Espírito Santo e a incorporação a Cristo. A Igreja nunca poderá cair sob o jugo do Maligno. Essa é uma promessa explícita que Jesus fez a Pedro, chefe da comunidade apostólica e da Igreja nascente: ‘Tu és Pe- dro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as por- tas do inferno nunca prevalecerão sobre ela’ (Mt 16,16)" (MONDIN, 1993, 194-195). 15) Tiago é o nome próprio de muitas pessoas no NT. Tiago, filho de Zebedeu, chamado por Jesus juntamente com seu irmão João quando ambos estavam no barco de pes- ca com o pai (Mt 4,21; Mc 1,19). Tiago, filho de Alfeu, outro membro dos Doze mencionados nas listas (Mt 10,3; Mc 3,18; Lc 6,15; At 1,13). Tiago, irmão do Senhor (Mt 13,55; Mc 6,3), foi o chefe da primeira comunidade de Jerusalém (At 12,17). Esquema dos Conceitos-chave Para que você tenha uma visão geral dos conceitos mais im- portantes deste estudo, apresentamos, a seguir (Figura 1), um Es- quema dos Conceitos-chave da disciplina. O mais aconselhável é que você mesmo faça o seu esquema de conceitos-chave ou até mesmo o seu mapa mental. Esse exercício é uma forma de você construir o seu conhecimento, ressignificando as informações a partir de suas próprias percepções. © Eclesiologia32 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO É importante ressaltar que o propósito desse Esquema dos Conceitos-chave é representar, de maneira gráfica, as relações entre os conceitos por meio de palavras-chave, partindo dos mais com- plexos para os mais simples. Esse recurso pode auxiliar você na or- denação e na sequenciação hierarquizada dos conteúdos de ensino. Com base na teoria de aprendizagem significativa, entende-se que, por meio da organização das ideias e dos princípios em esque- mas e mapas mentais, o indivíduo pode construir o seu conhecimen- to de maneira mais produtiva e obter, assim, ganhos pedagógicos significativos no seu processo de ensino e aprendizagem. Aplicado a diversas áreas do ensino e da aprendizagem es- colar (tais como planejamentos de currículo, sistemas e pesquisas em Educação), o Esquema dos Conceitos-chave baseia-se, ainda, na ideia fundamental da Psicologia Cognitiva de Ausubel, que es- tabelece que a aprendizagem ocorre pela assimilação de novos conceitos e de proposições na estrutura cognitiva do aluno. Assim, novas ideias e informações são aprendidas, uma vez que existem pontos de ancoragem. Tem-se de destacar que "aprendizagem" não significa, ape- nas, realizar acréscimos na estrutura cognitiva do aluno; é preci- so, sobretudo, estabelecer modificações para que ela se configure como uma aprendizagem significativa. Para isso, é importante con- siderar as entradas de conhecimento e organizar bem os materiais de aprendizagem. Além disso, as novas ideias e os novos concei- tos devem ser potencialmente significativos para o aluno, uma vez que, ao fixar esses conceitos nas suas já existentes estruturas cog- nitivas, outros serão também relembrados. Nessa perspectiva, partindo-se do pressuposto de que é você o principal agente da construção do próprio conhecimento, por meio de sua predisposição afetiva e de suas motivações internas e externas, o Esquema dos Conceitos-chave tem por objetivo tor- nar significativa a sua aprendizagem, transformando o seu conhe- 33© Caderno de Referência de Conteúdo cimento sistematizado em conteúdo curricular, ou seja, estabele- cendo uma relação entre aquilo que você acabou de conhecer com o que já fazia parte do seu conhecimento de mundo (adaptado do site disponível em: <http://penta2.ufrgs.br/edutools/mapascon- ceituais/utilizamapasconceituais.html>. Acesso em: 11 mar. 2010). Eclesiologia Questões Introdutórias à Cristologia e à Eclesiologia Reino de Deus Missão de Jesus: anúncio do Reino de Deus Reino de Deus e sua transformação na Terra Sociedade econômica e política da época de Jesus Igreja no contexto histórico atual: Eclesiologia – Introdução: - Processo de socialização da fé. - Fé no ato coletivo da Igreja. - Definição de eclesiologia. - Como fazer a eclesiologia. A morte e ressurreição de Jesus: Sentido da morte de Jesus. Ressurreição de Jesus Mistério da encarnação e unidade do Pai e do Filho em Cristo histórico atual: desafios e respostas -Pós -Modernidade. - Globalização, crise ecológica. Modelos de Igreja na História: -Paradigma. -Vaticano I e II. -Conferência latino- americana. -Eclesiologia latino- americana. Figura 1 Esquema dos Conceitos-chave da disciplina Eclesiologia. Como pode observar, esse Esquema oferece a você, como dissemos anteriormente, uma visão geral dos conceitos mais im- portantes deste estudo. Ao segui-lo, será possível transitar entre os principais conceitos desta disciplina e descobrir o caminho para construir o seu processo de ensino-aprendizagem. O Esquema dos Conceitos-chave é mais um dos recursos de aprendizagem que vem se somar àqueles disponíveis no ambien- te virtual, por meio de suas ferramentas interativas, bem como àqueles relacionados às atividades didático-pedagógicas realiza- das presencialmente no polo. Lembre-se de que você, aluno EaD, deve valer-se da sua autonomia na construção de seu próprio co- nhecimento. © Eclesiologia34 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO Questões Autoavaliativas No final de cada unidade, você encontrará algumas questões autoavaliativas sobre os conteúdos ali tratados, as quais podem ser de múltipla escolha, abertas objetivas ou abertas dissertativas. Responder, discutir e comentar essas questões, bem como relacioná-las com a prática do ensino de Eclesiologia pode ser uma forma de você avaliar o seu conhecimento. Assim, mediante a re- solução de questões pertinentes ao assunto tratado, você estará se preparando para a avaliação final, queserá dissertativa. Além disso, essa é uma maneira privilegiada de você testar seus conhecimentos e adquirir uma formação sólida para a sua prática profissional. As questões de múltipla escolha são as que têm como respos- ta apenas uma alternativa correta. Por sua vez, entendem-se por questões abertas objetivas as que se referem aos conteúdos matemáticos ou àqueles que exigem uma resposta determinada, inalterada. Já as questões abertas dissertativas obtêm por res- posta uma interpretação pessoal sobre o tema tratado; por isso, normalmente, não há nada relacionado a elas no item Gabarito. Você pode comentar suas respostas com o seu tutor ou com seus colegas de turma. Bibliografia Básica É fundamental que você use a Bibliografia Básica em seus estudos, mas não se prenda só a ela. Consulte, também, as biblio- grafias complementares. Figuras (ilustrações, quadros...) Neste material instrucional, as ilustrações fazem parte inte- grante dos conteúdos, ou seja, elas não são meramente ilustra- tivas, pois esquematizam e resumem conteúdos explicitados no texto. Não deixe de observar a relação dessas figuras com os con- teúdos da disciplina, pois relacionar aquilo que está no campo vi- sual com o conceitual faz parte de uma boa formação intelectual. 35© Caderno de Referência de Conteúdo Dicas (motivacionais) O estudo desta disciplina convida você a olhar, de forma mais apurada, a Educação como processo de emancipação do ser humano. É importante que você se atente às explicações teóricas, práticas e científicas que estão presentes nos meios de comunica- ção, bem como partilhe suas descobertas com seus colegas, pois, ao compartilhar com outras pessoas aquilo que você observa, per- mite-se descobrir algo que ainda não se conhece, aprendendo a ver e a notar o que não havia sido percebido antes. Observar é, portanto, uma capacidade que nos impele à maturidade. Você, como aluno do curso de Graduação na modalidade EaD, necessita de uma formação conceitual sólida e consistente. Para isso, você contará com a ajuda do tutor a distância, do tutor presencial e, sobretudo, da interação com seus colegas. Sugeri- mos, pois, que organize bem o seu tempo e realize as atividades nas datas estipuladas. É importante, ainda, que você anote as suas reflexões em seu caderno ou no Bloco de Anotações, pois, no futuro, elas pode- rão ser utilizadas na elaboração de sua monografia ou de produ- ções científicas. Leia os livros da bibliografia indicada, para que você amplie seus horizontes teóricos. Coteje-os com o material didático, discu- ta a unidade com seus colegas e com o tutor e assista às videoau- las. No final de cada unidade, você encontrará algumas questões autoavaliativas, que são importantes para a sua análise sobre os conteúdos desenvolvidos e para saber se estes foram significativos para sua formação. Indague, reflita, conteste e construa resenhas, pois esses procedimentos serão importantes para o seu amadure- cimento intelectual. Lembre-se de que o segredo do sucesso em um curso na modalidade a distância é participar, ou seja, interagir, procurando sempre cooperar e colaborar com seus colegas e tutores. © Eclesiologia36 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO Caso precise de auxílio sobre algum assunto relacionado a esta disciplina, entre em contato com seu tutor. Ele estará pronto para ajudar você. 3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FEINER, J.; LOEHRER, M. Mysterium Salutis, IV/1. Petrópolis: Vozes, 1975. MONDIN, B. As novas eclesiologias. São Paulo: Paulus, 1984. O’DONNELL C; PIÉ-NINOT, S. Diccionario de eclesiología. Madrid: San Pablo, 2001. O’COLLINS, G.; FARRUGIA, E. Dizionario sintético di teologia. 1995, p. 103 EA D 1 O Desafio e a Atualidade da Eclesiologia 1. OBJETIVOS • Refletir e compreender a Igreja de maneira significativa. • Identificar as faces do mal-estar causado pelo pecado. • Analisar os desafios da Eclesiologia. • Compreender a Eclesiologia na atualidade. 2. CONTEÚDOS • Dificuldades provenientes do contexto social atual. • Objeções originadas da divisão entre os cristãos e do plu- ralismo religioso. • Igreja: sujeito da fé. • A Igreja como objeto de fé. © Eclesiologia38 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO 3. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE Antes de iniciar o estudo desta unidade é importante que você leia as orientações a seguir: 1) Tenha sempre a mão o significado dos conceitos explici- tados no Glossário para o estudo desta e de todas as uni- dades deste CRC. Isso poderá facilitar sua aprendizagem e seu desempenho. 2) Não se prenda somente as obras citadas na bibliografia dessa unidade. Fique à vontade para pesquisar em livros e sites confiáveis sobre o assunto abordado. 3) Além dos temas estudados nesta unidade, observe no seu cotidiano como estes temas são abordados nas di- versas mídias formadoras de opiniões e compare com sua visão crítica sobre o assunto. 4. INTRODUÇÃO À UNIDADE A Igreja, como tema teológico, parece sofrer certa desafei- ção. E, tal desafeição, se enfrentada com seriedade, ajuda a refletir e a falar sobre a Igreja de maneira mais pertinente e significativa. Assim, procuraremos, inicialmente, identificar as várias fa- ces do mal-estar que esse tema provoca e, com base nessa cons- tatação, mostraremos a importância da disciplina que estamos iniciando. Depois de mostrar a atualidade da presente disciplina, voltaremos nossa atenção para a dupla perspectiva em que o tema “Igreja” será tratado. 5. DIFICULDADES PROVENIENTES DO CONTEXTO SO- CIAL ATUAL Do ponto de vista sociológico, a relação dos cristãos com a Igreja tem-se tornado difícil e exige da Teologia uma resposta. 39© O Desafio e a Atualidade da Eclesiologia Atualmente, a Igreja está lançada no mercado da sociedade pluralista: a religião passou a ser considerada um bem de consumo de livre escolha, sujeita à lei da oferta e da procura como qualquer outro produto. A Igreja numa sociedade fragmentada ––––––––––––––––––– Miranda (2006) descreve a situação hodierna da sociedade vendo nela não somente os problemas, mas também as oportunidades que se abrem para a missão da Igreja. “O imperativo cultural predominante em nossos dias é a busca da realização pesso- al. Cada um se acha no direito de viver a seu modo, procurando o que lhe parece construir sua felicidade, seja do ponto de vista afetivo, material, comportamental e até religioso. Cada um quer ser considerado e respeitado em sua singularidade, em suas aspirações, interesses, afeições e conflitos, contrapondo-se, assim, à pas- teurização cultural e à penúria de relações sociais consistentes que caracterizam as sociedades ocidentais afluentes, burocratizadas e atomizadas. Igualmente cada um reivindica sua capacidade própria de refletir, julgar e decidir sobre suas opções concretas, mesmo as de cunho religioso, e mesmo sem ponderar reflexamente os critérios utilizados. Ninguém quer ser considerado apenas uma concretização anôni- ma de norma geral, aplicada igualmente a outros. Mesmo reconhecendo essa busca de autorrealização permeada por ideais consumistas e hedonistas, seria possível aproveitá-la para apresentar hoje a fé cristã?” (MIRANDA, M. A igreja numa socieda- de fragmentada. São Paulo: Loyola, 2006, p. 201-202). –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Nesse contexto de mercado, muitos fiéis não vivem mais seu afastamento da Igreja Católica como um abandono público de oposição, mas como uma desvinculação tranquila. A desvinculação institucional da Igreja não se dá mais de forma dramática, mas é o resultado de um distanciamento discreto e quase espontâneo. Também o modo como os cristãos aderem à Igreja sofreu mutações importantes. Muitos, que se consideram católicos “pra- ticantes”, nutrem formas bastante seletivas e parciais de fazer par- te da Igreja. Na verdade, muitos católicos identificam-se não tanto com “a Igreja”, mas com determinadas comunidades, com movi- mentos particulares e, até mesmo, com alguns padres. A adesão parcial e seletiva garante,de um lado, uma sintonia muito estreita de linha de pensamento e de ação e, de outro, a exclusão daqueles com os quais não se identificam. Diversificaram-se, também, as posições diante da Igreja. Po- demos identificar, ao lado de uma virulenta oposição laicista da © Eclesiologia40 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO Igreja, uma aceitação acrítica e tradicionalista dela. Nesse contex- to, cresce igualmente a exigência de que a adesão à Igreja seja fru- to de uma opção livre e responsável e não tanto de uma tradição recebida. Há, também, os que lutam por uma reforma da Igreja e aqueles que defendem o slogan “Jesus sim, Igreja não!” e, por isso, veem tal reforma como completamente inútil. Jesus sim, Igreja não! ––––––––––––––––––––––––––––––––– Pelo menos no começo, os seguidores do programa “Jesus sim, Igreja não” nor- malmente não desejam se situar expressamente contra a Igreja, mas apenas sem a Igreja. O que está na base de tal posição é o postulado de que Jesus pode e deve ser buscado fora da Igreja. P. G. Muller combate tal postulado como exegeticamente insustentável. “A tradição do que é propriamente ‘Jesus’ não pode ser pensada sem o fator ‘Igreja’, porque esse ‘Jesus’, como conteúdo da tradição de Jesus, só foi conservado de maneira permanente pela Igreja, devido ao interesse eclesial por ‘Jesus’. Um ‘Jesus’ sem ou fora da Igreja nunca existiu e em última instância nunca poderá existir, porque com a perda da ‘Igreja’ também se perde a única instância que é capaz de testemunhar quem é ‘Jesus’ e o que ele significa. Isto porque toda linguagem do NT é uma ‘linguagem testemunhal’, inclusive os logia de Jesus. Quem, portanto, não ouve essa linguagem do tes- temunho eclesial também não ouve ‘Jesus’”. Além disso, a contraposição entre Cristo e a Igreja não esvazia só a Igreja. Esvazia, também, o Cristo: constrói-se um Jesus à imagem e semelhança dos homens e dos seus interesses. Com efeito, o acesso a Jesus Cristo, o encontro pessoal com ele e a fé nele só são possíveis através da igreja (BARREIRO, 2001, p. 33). –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Também do ponto de vista sociopolítico, nota-se que a pre- sença da Igreja na vida pública tem encolhido rapidamente e que os seus representantes oficiais perdem espaço no desenvolvimen- to da sociedade. Sintomas desse encolhimento são as críticas que acusam a Igreja de ser atrasada, repressora das liberdades pes- soais e obstáculo do progresso científico. Nesse sentido, as seitas parecem estar mais adaptadas, sociologicamente falando, às ne- cessidades do homem pós-moderno. Além do afastamento dos fiéis, a Igreja institucional parece também se tornar cada vez mais distante deles. Por causa do alto grau de sua organização, a Igreja torna-se para muitos de seus fiéis uma instituição cada vez mais burocratizada e centralizada. Ela se distancia, assim, da experiência religiosa do indivíduo e tem cada vez menos impacto na vida das pessoas. 41© O Desafio e a Atualidade da Eclesiologia Outro grande desafio que surge do contexto social é a função política que a Igreja desempenha. A Teologia da Libertação, distin- guindo e articulando fé e política, teve o mérito de evidenciar que não há fé, Igreja e religião sem função política. Nesse sentido, a Eclesiologia é instada a articular essas duas realidades no contexto social atual, procurando, assim, evitar tanto o perigo e a crueldade de uma política sem fé quanto a opressão do fanatismo de uma religião politizada e instrumentalizada. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– A respeito da relação que há entre religião e vida pública, o papa Bento XVI es- creveu recentemente na encíclica Caritas in veritate, 56: “A exclusão da religião do âmbito público e, na vertente oposta, o fundamentalis- mo religioso impedem o encontro entre as pessoas e a sua colaboração para o progresso da humanidade. A vida pública torna-se pobre de motivações, e a polí- tica assume um rosto oprimente e agressivo. Os direitos humanos correm o risco de não ser respeitados, porque ficam privados do seu fundamento transcendente ou porque não é reconhecida a liberdade pessoal. No laicismo e no fundamen- talismo, perde-se a possibilidade de um diálogo fecundo e de uma profícua co- laboração entre a razão e a fé religiosa. A razão tem sempre necessidade de ser purificada pela fé; e isto vale também para a razão política, que não se deve crer onipotente. A religião, por sua vez, precisa sempre de ser purificada pela razão, para mostrar o seu autêntico rosto humano. A ruptura deste diálogo implica um custo muito gravoso para o desenvolvimento da humanidade (BENTO XVI. Carta encíclica caritas in veritate. Disponível em: <http://www.vatican.va/holy_father/ benedict_xvi/encyclicals/documents/hf_ben-xvi_enc_20090629_caritas-in-veri- tate_po.html>. Acesso em: 23 fev. 2010. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– 6. OBJEÇÕES ORIGINADAS DA DIVISÃO ENTRE OS CRISTÃOS E O PLURALISMO RELIGIOSO A divisão entre os cristãos e tudo o que ela provocou e pro- voca parecem desacreditar o tema “Igreja”. Será que vale a pena, então, dedicar tempo e esforço para estudar uma realidade que se fragmentou em confissões e comunidades separadas e que, na história, guerrearam entre si, foram perseguidas mutuamente e, reciprocamente, excomungaram-se? É possível elaborar uma ecle- siologia que não esteja voltada unilateralmente para a defesa da própria confissão e para o ataque das demais? Em vez da divisão, a © Eclesiologia42 Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO Eclesiologia pode promover e estar a serviço da unidade dos cris- tãos? Ela pode ajudar no diálogo ecumênico e na busca da unidade de todos os cristãos na única Igreja de Cristo? Veja o que diz Dianich e Noceti (2007, p. 45-46) sobre tais questionamentos: Depois das divisões, hoje, no plano conceitual, todo aquele que crê em Cristo se entende na interação de três perspectivas de identifi- cação. Como acontecia no primeiro milênio, um cristão é definido antes de tudo pela “identidade cristã”, como a união com Cristo, fundada sobre o dom do batismo, vivida na fé trinitária, alimentada pela palavra de Deus e, finalmente, pela “identidade eclesial”, como é apresentada no Símbolo. Esses dois traços permanecem comuns e unitários quanto à essência em todas as igrejas cristãs; contudo, no segundo milênio, configura-se um terceiro plano de definição para o cristão: a “identidade confessional”, que diz respeito à forma específica com que cada igreja confessa sua fé e, portanto, o modo particular – historicamente, culturalmente, doutrinalmente defini- do – de viver a identidade cristã e eclesial, que a distingue com respeito às outras. Nessa modalidade existem diferenças quanto ao modo de conhecer a relação entre Credo Ecclesiam e formas de existência histórica da igreja, com consequente diversidade na maneira de institucionalizar as relações (estruturas sinodais, papa- do, acentuação no elemento local ou do universal) e na individua- lização dos princípios constitutivos da igreja (Eucaristia, Escritura, Tradição). Diversificaram-se os modelos de agregação e de perma- nência (batismo dos recém-nascidos ou de adulto, celebração uni- tária da iniciação eucarística ou dilação da celebração do batismo, crisma, eucaristia) e dos papéis e funções (ministério, participação dos leigos). O caráter necessário desses elementos é reconhecido por todos, mas interpretado diferentemente. Além da ferida da sua divisão, a Igreja está lançada em um mundo em que as religiões se encontram e se desencontram con- tinuamente. Essa situação inevitavelmente acaba despertando perguntas decisivas para a Eclesiologia: todas as religiões condu- zem à salvação? Se isso é verdade, a Igreja tornou-se inútil para a salvação? Pode a Igreja aprender algo do diálogo inter-religioso? Como você pode notar, refletir teologicamente sobre a Igreja não é mera atividade intelectual desligada da realidade dos cris- tãos, mas procura se colocar a